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Processo nº 1502068-34.2023.8.26.0197

ID: 307026533

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Francisco Morato - 2ª Vara Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO Nº Processo: 1502068-34.2023.8.26.0197

Data de Disponibilização: 25/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

SÍLVIO SEVERINO DE LIMA

Intimação

Advogados:

JULIA PEREIRA DE MORAES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Processo 1502068-34.2023.8.26.0197 - Ação Penal - Procedimento Sumário - Fato Atípico - SÍLVIO SEVERINO DE LIMA - SILVIO SEVERINO DA SILVA, qualificado nos autos, foi denunciado como incurso no artig… Processo 1502068-34.2023.8.26.0197 - Ação Penal - Procedimento Sumário - Fato Atípico - SÍLVIO SEVERINO DE LIMA - SILVIO SEVERINO DA SILVA, qualificado nos autos, foi denunciado como incurso no artigo 241-D, caput e parágrafo único, inciso I, da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), porque, em meados do ano de 2023, neste município e comarca de Francisco Morato/SP, aliciou e instigou, por meio de comunicação via internet, Tayná Cristina da Silva Jesuíno, menor de 14 anos (nascida em 17/04/2014), com o fim de com ela praticar ato libidinoso, bem como facilitou o acesso à vítima a material contendo cena pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso. Recebida a denúncia em 18 de janeiro de 2024 (fls. 71/72). Citação (fls.79). Defesa preliminar (fls.83/85). Foi ratificado o recebimento da denúncia às fls. 89/90. Em regular instrução, foram ouvidas a vítima e uma testemunha. Ato contínuo, o réu foi interrogado (mediante gravação por método audiovisual, com transcrição dispensada nos termos do parágrafo segundo do art. 405 do Código de Processo Penal). Em memoriais de fls. 211/217, o Ministério Público pleiteou a condenação nos termos da denúncia, com exasperação da pena base na primeira fase e regime inicial semiaberto de cumprimento de pena. A Defesa, a seu turno, pugnou pela absolvição do réu, argumentando para tanto: nulidade das provas consistentes em "prints" do aplicativo Whatsapp, cuja coleta teria violado a cadeia de custódia prevista no art. 158 do CPP; ausência de tipicidade por o réu ter estabelecido comunicação com a genitora, e não com a menor; que o réu é primário e possui residência fixa, de forma que seria caso de, em eventual condenação, fixação de pena no mínimo legal e regime aberto de cumprimento (fls. 138/150). É o RELATÓRIO. Fundamento e decido. A preliminar de nulidade da prova levantada pela defesa não pode ser acolhida. Embora seja imprescindível garantir a idoneidade de provas obtidas por meio de aparelhos eletrônicos, não há nos autos qualquer elemento que indique adulteração do conteúdo probatório. Além disso, as fotos de fls. 06/30 não constituem a única evidência do caso, havendo outros elementos que corroboram a veracidade das imagens, bem como a materialidade do crime e a autoria do réu. Cumpre registrar que o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é de que a inobservância do procedimento decadeiadecustódiaprevisto no Código de Processo Penal não acarreta, automaticamente, a imprestabilidade das provas colhidas. Desse modo, a consequência processual dependerá da análise do conjunto probatório, conforme estabelecido pela Sexta Turma no HC n. 653.515/RJ, julgado em 23/11/2021. É importante destacar que, em interrogatório judicial, o réu, em momento algum negou os fatos, tendo se reservado ao direito de permanecer em silêncio. Entretanto, em sede policial, o réu confessou que enviou uma foto em que estava pelado para a criança, mas que o fez por suposta insistência dela, atribuindo tal conduta a ter "problemas de cabeça" (fls. 50). Dessa forma, não há qualquer indício de que a confissão naquela ocasião não tenha sido voluntária. Somado a isso, há os relatos da vítima e da genitora desta, que apresentaram versões consistentes e harmônicas entre si. Logo, não há que se falar em nulidade a este respeito. Ao final da instrução criminal, restou inegável que é caso procedência da ação, pois a prova coligida para o bojo dos autos oferece respaldo suficiente para embasar uma decisão condenatória ao réu imputado na denúncia. A Autoria é induvidosa. Interrogado em juízo, o réu Silvio se recusou a responder às perguntas do juízo e do Ministério Público. Indagado pela Douta Defensora, disse que tem filhos, trabalha e é responsável pela manutenção da mãe do interrogando. Todavia, a negativa de autoria não há de prosperar no cotejo com os demais elementos constantes dos autos. A vítima Heloysa relatou em juízo que não tinha celular à época, mas que de vez em quando usava o aparelho da avó para conversar via "Facebook". Declara que, em certa ocasião, apareceu uma homem mais velho e começou a mandar mensagens para a depoente, iniciando uma conversa. Relata que deu continuidade a essa conversa por uns dois dias, mas que o homem começou "falar besteira", fazendo com que a depoente revelasse sobre aquelas conversas à mãe. Não conhecia o réu. Afirma que as "besteiras" que incomodaram a depoente eram perguntas sobre namorar, sobre marcar um encontro, sobre ele ir buscar a depoente onde ela estivesse, inclusive na escola, dentre outras coisas como elogiar a beleza da depoente. Acredita que os fatos se deram em meados do ano anterior. Esclarece que este homem - o réu - sempre dizia para que aquela conversa não fosse revelada à mãe da depoente. Afirma que, em determinado momento, o réu mandou uma mensagem com uma foto do rosto dele, dizendo que trabalhava em uma padaria. Nega que o réu tenha mandado alguma foto dele nu, bem como que ele tenha feito com a depoente chamadas de telefone ou de vídeo. Após reveladas as conversas, a mãe da depoente, passando-se pela depoente, continuou a conversar com o réu até que entendeu que era o caso de imprimir as mensagens e levar à delegacia. Não sabe o conteúdo do que a mãe e o réu conversaram, mas acredita que isso durou uns dois meses. Recorda-se, ainda, que foi convidada pelo réu para se encontrarem numa sorveteria, mas este encontro não ocorreu de fato. O relato da vítima encontra amplo respaldo nos demais elementos de prova contido nos autos. Senão vejamos. Também em juízo, a genitora da vítima, Tayná, disse que a vítima não tem "Facebook", mas às vezes usa o perfil da avó dela para se comunicar com amigas. Afirma que o perfil usado tem como foto a vítima e a irmã ainda mais nova. Recorda-se que, em certa ocasião, a vítima chegou em casa e, nervosa, relatou que havia um homem mais velho querendo namorar com ela. Quando isso chegou ao conhecimento da depoente, o réu já sabia a idade da vítima e onde ela estudava. Afirma que o réu perguntava à vítima se a depoente - como mãe dela - já sabia que os dois vinham conversando. Assevera que, quando o réu mostrou uma foto dela, resolveu que era o caso de levar os fatos ao conhecimento da delegacia, motivo pelo qual encaminhou prints das conversas havidas entre o réu e a vítima. Esclarece que a avó da vítima chegou a pegar o celular e a responder o réu com respostas simples como "sim" e "não", mas que tal somente ocorreu quando ele já tinha ciência da idade da vítima e de onde ela estudava. Não sabe por quanto tempo o réu conversou com a vítima, mas acredita que por cerca de quinze dias, tendo cessado apenas porque a vítima passou a perceber qual era o real interesse do réu. Adiciona que o réu pedia à vítima para que ela apagasse as mensagens que eles trocavam. Disse que, após o ocorrido, a vítima ficou com muita vergonha por estar naquela situação e hoje tem receio de andar na rua, já que o réu mora em local próximo. Pois bem. Por tudo quanto exarado, tem-se por absolutamente inconteste a configuração dos elementos objetivos, subjetivos e normativos do tipo em comento, porquanto restou comprovado que o réu aliciou, assediou e constrangeu a vítima, que tinha apenas 9 (nove) anos de idade àépoca dos fatos, com o fim de com ela praticar ato libidinoso. Isso porque o depoimento da vítima e da testemunha são condizentes com as circunstâncias que envolvem o caso. Ademais, não há qualquer indício de que a vítima ou a testemunha teriam criado uma situação com o propósito de acusar falsamente o réu, a quem sequer conheciam de antanho, tampouco existe demonstração de que teriam algum proveito com a mentira, motivo pelo qual não há razões para se lançar dúvida sobre a credibilidade de seus depoimentos. Em que pesem os esforços para a elisão da culpa, inclusive eximindo-se de se pronunciar em juízo, fato é que, em solo policial, o réu admitiu que enviou uma foto dele nu à vítima, já que ela teria "insistido". Ainda, é assente nos Tribunais Superiores o entendimento de que os relatos da vítima merecem especial valoração quando se trata de crimes contra a dignidade sexual os quais, na maioria das vezes, são praticados sob a égide da clandestinidade. Em razão da ausência de vestígios que é inerente à espécie, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem entendido que a palavra da vítima tem valor probante diferenciado. A propósito, confira-se: PROCESSO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PALAVRA DA VÍTIMA. VALOR PROBANTE DIFERENCIADO. 2. Nos crimes de natureza sexual, os quais nem sempre deixam vestígios, a palavra da vítima tem valor probante diferenciado. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no AREsp 934.573/MT, julgado em 16/02/2017). ESTUPRO. ATOS LIBIDINOSOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO CARNAL.PALAVRAS DAS VÍTIMAS. VALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. [...] 4. "A jurisprudência pátria é assente no sentido de que, nos delitos de natureza sexual, por frequentemente não deixarem vestígios, apalavra da vítima tem valor probante diferenciado (STJ, HC 301.380/SP,julgado em 14/06/2016, DJe 21/06/2016) Aliás, mesmo diante da situação extremamente aflitiva vivenciada em decorrência do aliciamento e da abordagem realizada pelo réu, os relatos da criança permaneceram inalterados quando foi submetida à presença de diferentes profissionais. A tenra idade da vítima fez com que seu depoimento fosse colhido na forma de escuta especializada, seguindo os ditames da lei nº 13.431/2007. Segundo estudos, a possibilidade de relatar a situação abusiva num ambiente neutro, seguro, confiável e com técnicos capacitados para evitar possíveis sugestões e abusos, pode constituir uma experiência extremamente benéfica para a vítima, que se torna parte ativa do processo e consciente de seus direitos (Silva Júnior, em dano psíquico em crianças vítimas de abuso sexual sem comprovação de ato libidinoso ou conjunção carnal, 2006). Logo, a versão da vítima possui ainda mais crédito, sobretudo diante da atuação exemplar dos profissionais do setor técnico, os quais elaboraram perguntas abertas, não tendenciosas, de forma a não influenciar nas conclusões do depoente. Por oportuno, esclareço que o delito do artigo 241-D do ECA é formal, ou seja, dispensa qualquer resultado naturalístico, de modo que a simples realização da conduta descrita no tipo penal é suficiente para adequação típica, sendo prescindível o efetivo envolvimento sexual da criança. Aliás, por ser crime de aplicação subsidiária, se a vítima fosse alcançada pelas propostas e se comportasse de modo a satisfazer a lascívia do réu - o que representa o resultado naturalístico -, estar-se-ia diante do crime de estupro de vulnerável, o qual é apenado com reclusão de 8 (oito) a 15 (quinze) anos (217-A do Código Penal). Ainda atento à tese defensiva, entendo que restou comprovada que a conduta do réu, praticada de forma consciente e voluntária, esteve voltada à finalidade de praticar ato libidinoso com a criança, porquanto é absolutamente inconcebível a ideia de que a intenção do réu era estabelecer laços de amizade ao convidá-la para ir clandestinamente ao encontro dele. Diante desse cenário, verifico que os elementos objetivos, subjetivos e normativos do tipo estão tranquilamente comprovados nos autos, mormente porque indícios múltiplos, concatenados e impregnados de elementos positivos de credibilidade são suficientes para dar base a uma decisão condenatória, máxime quando excluem qualquer hipótese favorável ao acusado" (MIRABETE, Júlio F., in Processo Penal - 17ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 344). Por fim, não há que se falar em atipicidade da conduta do réu, tampouco em flagrante preparado por ter havido intervenção paterna. Isso porque, de acordo com a prova acima reproduzido, conclui-se que houve a consumação do delito quando o réu já tinha ciência da idade da vítima e, mesmo assim, continuou as conversas com ela. Denota-se dos documentos de fls. 06/30 que desde o início o réu tinha ciência a este respeito, tanto que a todo momento dizia à menor para que não contasse nada sobre as conversas aos pais dela. E, pelo que se extrai da prova oral, a intervenção paterna se deu posteriormente inclusive ao momento em que o réu enviou à vítima uma foto dele nu. Destarte, o conjunto probatório é suficientemente harmônico e coeso a ponto de legitimar o decreto de condenação pelo crime descrito no artigo 241-D do Estatuto da Criança e do Adolescente. Dosimetria da pena Na primeira fase da dosimetria da pena e atento aos critérios do art. 59 do Código Penal, observo que o réu é tecnicamente primário, mas agiu com culpabilidade acima da média à espécie delitiva, já que aliciou e assediou a vítima de forma insistente por meio de diversas mensagens. Além disso, exibiu uma fotografia dele nu e se valia do expediente de constantemente instar a vítima a nada revelar para os parentes, a indicar que pretendia perpetrar aquela conduta por tempo indefinido. Com isso, fixo a pena-base acima do mínimo legal: 2 anos de reclusão. Na segunda fase, não incidem circunstâncias agravantes ou atenuantes. Por fim, na terceira fase da pena, não há causas de aumento ou de diminuição da pena. Fixo o regime inicial de cumprimento como sendo o aberto, com base na regra art. 33, do Código Penal, em vista da primariedade do agente e do montante da pena. Ausentes os requisitos para a substituição por pena restritiva de direitos, tendo em vista que o crime é de violência contra a pessoa (vedação expressa do incido I do art. 44 do Código Penal). No entanto, o réu faz jus à suspensão da pena pelo prazo de 2 anos, com a obrigação, no primeiro ano da suspensão, da prestação de serviços à comunidade, em tarefa a ser designada pelo juízo da execução penal (art. 78, caput e parágrafo primeiro, do Código Penal). Dispositivo Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para condenar SILVIO SEVERINO DA SILVA como incurso nos crimes previstos no artigo 241-D, caput, da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), devendo cumprir pena privativa de liberdade de 2 anos de reclusão em regime aberto, porém concedido o benefício da suspensão condicional da pena privativa de liberdade (sursis) por 02 anos, nos termos acima descritos. Inalteradas as circunstâncias e ausentes os requisitos para a custódia cautelar, defiro o direito a eventual recurso em liberdade. Deixo de fixar indenização mínima, nos termos do art. 386, IV, do Código de Processo Penal, pela falta de elementos probatórios para tanto. Transitada em julgado, realizem-se anotações de praxe e expeçam-se as comunicações necessárias, em seguida remetendo-se ao arquivo. P.I.C. - ADV: JULIA PEREIRA DE MORAES (OAB 465535/SP)

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