Aparecida Calmon Ribeiro x Banco Pan S.A.
ID: 333802710
Tribunal: TJES
Órgão: Vila Velha - Comarca da Capital - 4ª Vara Cível
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5025992-65.2023.8.08.0035
Data de Disponibilização:
24/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GIOVANNA VALENTIM COZZA
OAB/SP XXXXXX
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FABIO OLIVEIRA DUTRA
OAB/SP XXXXXX
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CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES
OAB/PR XXXXXX
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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Vila Velha - Comarca da Capital - 4ª Vara Cível Rua Doutor Annor da Silva, 161, Fórum Desembargador Afonso Cláudio, Boa Vista II, VILA VELHA - ES - …
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Vila Velha - Comarca da Capital - 4ª Vara Cível Rua Doutor Annor da Silva, 161, Fórum Desembargador Afonso Cláudio, Boa Vista II, VILA VELHA - ES - CEP: 29107-355 Telefone:(27) 31492563 PROCESSO Nº 5025992-65.2023.8.08.0035 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: APARECIDA CALMON RIBEIRO REQUERIDO: BANCO PAN S.A. Advogado do(a) REQUERENTE: GIOVANNA VALENTIM COZZA - SP412625 Advogados do(a) REQUERIDO: CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES - PR19937, FABIO OLIVEIRA DUTRA - SP292207 SENTENÇA Refere-se à Ação Revisional de Contrato de Financiamento c/c Pedido de Antecipação de Tutela, proposta por Aparecida Calmon Ribeiro em face de Banco Pan S.A. Alegou a parte autora que firmou com o réu contrato de financiamento para aquisição de um veículo automotor, modelo Hyundai HB20, ano 2016/2016, placa PPJ1E52, mediante pagamento de entrada no valor de R$ 13.100,00 (treze mil e cem reais) e mais 60 (sessenta) parcelas mensais no valor de R$ 1.686,88 (um mil, seiscentos e oitenta e seis reais e oitenta e oito centavos). Sustentou que, após o início da execução do contrato, constatou a existência de diversas cláusulas abusivas e encargos financeiros excessivos, entre eles juros remuneratórios de 2,98% ao mês (42,24% ao ano), capitalização diária de juros, multa moratória de 2%, juros de mora de 1% ao mês e diversas tarifas que somaram R$ 3.654,50 (três mil, seiscentos e cinquenta e quatro reais e cinquenta centavos), sendo: tarifa de cadastro no valor de R$ 823,00 (oitocentos e vinte e três reais), tarifa de avaliação do bem no valor de R$ 458,00 (quatrocentos e cinquenta e oito reais), tarifa de registro de contrato no valor de R$ 403,50 (quatrocentos e três reais e cinquenta centavos) e seguro prestamista no valor de R$ 1.970,00 (um mil, novecentos e setenta reais). Arguiu que a cobrança destas tarifas não observa os limites legais e fere o direito à informação do consumidor, configurando-se inclusive venda casada, dada a ausência de opção pela escolha da seguradora. Relatou ainda que os juros pactuados estão em desacordo com a taxa média de mercado praticada à época da contratação, que era de 27,64% ao ano, conforme dados do Banco Central, requerendo a aplicação desta média ou, alternativamente, a limitação dos juros ao patamar de 12% ao ano. Argumentou que houve capitalização de juros de forma indevida e não informada de maneira clara e específica, violando dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, especialmente os artigos 6º, III; 46 e 52, II, motivo pelo qual pediu a revisão das prestações mediante aplicação de juros simples, pelo método de Gauss. Afirmou que a forma como foram estruturados os encargos em caso de inadimplemento leva à configuração de comissão de permanência disfarçada, o que se mostra ilegal, especialmente quando cumulada com juros moratórios, multa e juros remuneratórios, contrariando entendimento consolidado do STJ e as súmulas 30, 294 e 296. Além disso, apontou que não houve prestação adequada de contas por parte do réu quanto aos valores efetivamente destinados às tarifas cobradas, em especial quanto ao registro de contrato, o que, conforme jurisprudência do STJ (tema 958), exigiria a comprovação de que o serviço foi efetivamente prestado, sob pena de devolução em dobro. Em relação ao seguro prestamista, a autora apontou que a contratação obrigatória configura venda casada, vedada pelo artigo 39, I do CDC, e já reconhecida como abusiva no julgamento do Tema 972 do Superior Tribunal de Justiça. Assim, diante das irregularidades contratuais apresentadas, requereu a concessão da gratuidade de justiça, o que justificou com documentos comprobatórios de sua hipossuficiência econômica; a concessão de tutela de urgência para que lhe fosse autorizado o depósito judicial das parcelas, com base nos valores revisados, evitando a inscrição de seu nome em cadastros de inadimplentes e a apreensão do veículo; a revisão do contrato, com recálculo das prestações e exclusão das tarifas abusivas; a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente; e a inversão do ônus da prova, dada a sua condição de hipossuficiente e a complexidade técnica da prova pericial contábil. A decisão de ID 36258342 indeferiu o pedido de tutela de urgência e determinou a citação do réu. Apresentou o Banco Pan S.A. contestação, registrada no ID 39162555, arguindo, inicialmente, que a parte autora não faria jus à gratuidade de justiça, por estar representada por advogado particular. No mérito, alegou que o contrato foi firmado regularmente, com cláusulas claras, e que os encargos praticados respeitam os limites legais e os entendimentos consolidados nos tribunais superiores. Sustentou que os juros remuneratórios foram livremente pactuados, que a capitalização mensal é permitida desde que expressa, nos termos da MP 2.170-36/2001, e que as tarifas cobradas foram previstas em contrato e informadas adequadamente à contratante. Defendeu a validade da cobrança do seguro prestamista e negou a existência de venda casada. Argumentou ainda que os encargos cobrados em caso de inadimplemento não configuram comissão de permanência disfarçada, pois estão discriminados no contrato e são permitidos por lei. Por fim, concluiu pela improcedência da ação, e a condenação da parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. Intimada a parte autora em réplica, conforme ID 46074276, reiterou suas alegações, reforçando a abusividade dos encargos contratuais, a ilegalidade das tarifas impostas, a ausência de informação adequada e a configuração de comissão de permanência velada. Defendeu a aplicação da taxa média de mercado e a revisão das cláusulas contratuais para restabelecimento do equilíbrio contratual, conforme jurisprudência do STJ. Intimadas as partes em fase de saneamento cooperativo (ID 51258258), ambas pugnavam pelo imediato julgamento da lide, conforme manifestação no ID 53257222 e 53344187. É o relatório. DECIDO. IMPUGNAÇÃO À CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA Referenciou o demandado que não restara comprovada a hipossuficiência alegada pela parte autora, anunciando que possui esta, condições de arcar com as custas do processo. Registro que em eventual impugnação deve, conforme preceitua o art. 100 do Código de Processo Civil, estar provado, de forma consistente, a capacidade do beneficiário em arcar com as despesas processuais sem que isso prejudique seu próprio sustento ou de sua família, portanto, simples alegação, não pode, por si só, implicar no indeferimento da benesse. Em suma, não se pode privar alguém do benefício da justiça gratuita sem prova da verdadeira condição de suportar os ônus do processo. Nesse contexto, colhe-se da jurisprudência do e. Tribunal de Justiça: “EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPUGNAÇÃO À CONCESSÃO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE NÃO INFIRMADA. 1. - A declaração de pobreza, para efeito de obtenção do benefício da gratuidade de justiça, goza de presunção relativa de veracidade, o que significa que deve prevalecer se não houver prova idônea em contrário. Nesse sentido orienta a jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça (EDcl no AREsp 571.737/SP, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 02-10-2014, DJe 07-10-2014). 2. - O Código de Processo Civil estabelece que Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural (art. 99, §3º) e que a assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça (art. 99, §4º). 3. - Os elementos de prova constantes nos autos deste agravo de instrumento não infirmaram as declarações de pobreza subscritas pelos agravantes. 4. - Recurso provido. Incidente de impugnação à assistência judiciária gratuita julgado improcedente. (TJES, Classe: Agravo de Instrumento, 12179002279, Relator: DAIR JOSÉ BREGUNCE DE OLIVEIRA, Órgão julgador: TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 20/03/2018, Data da Publicação no Diário: 28/03/2018)” (Negritei). Portanto, mantém-se hígido o deferimento da assistência judiciária gratuita à requerente, sobretudo, porque previamente intimada a requerente para comprovação, o que resultou registrada na documentação de ID 396993788, o que implicou no deferimento da benesse. Assim, comprovou o autor sua hipossuficiência nos termos do art. 98 e seguintes do Código de Processo Civil. DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E PEDIDO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA Vale ressaltar que no contrato celebrado entre as partes se aplica o Código de Defesa do Consumidor, no que couber, conjuntamente com a Lei 4.595/64, que regula os contratos e as atividades financeiras. Isso porque, do contrato se verifica as figuras do fornecedor e do consumidor, a teor dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, que dispõem: “Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. A Súmula 297 do c. Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, pacificou a matéria: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." Assim, havendo a verossimilhança das alegações ou a hipossuficiência poderá o juiz inverter o ônus da prova a favor do consumidor. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a inversão do ônus da prova fica a critério do juiz, segundo apreciação dos aspectos de verossimilhança da alegação do consumidor e de sua hipossuficiência, conceitos intrinsecamente ligados ao conjunto fático-probatório dos autos delineado nas instâncias ordinárias, cujo reexame é vedado em sede especial. (AgRg no REsp 1335475/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe 06/11/2012). Consoante bem registrado por Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira (in, Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, Ed. Podivm, p. 83) o Código de Defesa do Consumidor só autoriza a inversão ope judicis do ônus da prova nos litígios que versem sobre relações de consumo: a) quando verossímil a alegação do consumidor, segundo as regras de experiência; b) quando o consumidor for hipossuficiente. A verossimilhança, no caso, é a coerência, a aparência da verdade da alegação de cobrança que se sustenta indevida, como ensina o Prof. Humberto Theodoro Júnior, em Curso de direito processual civil, 36. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, vol. II, p. 572: “Quanto à verossimilhança da alegação', refere-se ao juízo de convencimento a ser feito em torno de todo o quadro fático invocado pela parte”. Já a hipossuficiência é a dificuldade que a parte terá para produzir a prova pretendida. Destarte, ainda que admitida hipoteticamente a inversão, resta desautorizada quando falta verossimilhança na alegação do autor e/ou inexistência de prova de hipossuficiência. À guisa de conclusão, crave-se que, a despeito de a relação jurídica envolver a aplicação do Código Consumerista (Súmula 297 do STJ), tal peculiaridade, por si só, não é capaz de promover, automaticamente, a inversão do ônus probante. Realça Rizzatto Nunes, verbis: “Consigne-se que em matéria de produção de prova o legislador, ao dispor que é direito básico do consumidor a inversão do ônus da prova, o fez para que, no processo civil, concretamente instaurado, o juiz observasse a regra. E a observância ficou destinada à decisão do juiz, segundo seu critério e sempre que se verificasse a verossimilhança das alegações do consumidor ou sua hipossuficiência” (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 2ª edição, São Paulo: Saraiva, p. 150). Na particularidade dos autos, tal inversão não se aperfeiçoou, máxime porque ausentes questões de ordem técnica cuja complexidade colocasse os consumidores em dificuldade extrema relacionada à produção de prova e ainda diante da ausência de verossimilhança da alegação. Seguindo e mesma linha, ao analisar o artigo 6º, VIII, do CDC, aclara Cecília Matos, verbis: “A inversão do ônus da prova é direito de facilitação da defesa e não pode ser determinada senão após o oferecimento e valoração da prova, se e quando o julgador estiver em dúvida. É dispensável caso forme sua convicção (...) Cada parte deverá nortear sua atividade probatória de acordo com o interesse em oferecer as provas que embasam seu direito. Se não agir assim, assumirá o risco de sofrer a desvantagem de sua própria inércia (...)” (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto, 3 ª edição, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 151). In casu, o julgamento da causa dependia somente da exegese da legalidade do negócio jurídico, cuja compreensão não demanda notório saber técnico, sendo alcançada por esta magistrada com o simples exame do contrato, o qual se encontra juntado aos autos, sendo certo ainda, que intimadas as partes para especificação das prova, a parte autora restou silente, ID 61528470. À sombra dessas ideias, não se vislumbra qualquer circunstância de hipossuficiência técnico-jurídica ou de outra natureza que justificasse a inversão do onus probandi. Outrossim, inexistem também, aprioristicamente, verossimilhança das teses autorais já que em sua maioria foram enfrentadas pelo c. Superior Tribunal de Justiça, consoante se demonstrará adiante. DO JULGAMENTO Não havendo preliminares ou irregularidades a ser analisadas, possível o ingresso imediato na análise do mérito. Especificamente com relação a revisão do contrato bancário, pretende a parte autora expurgar a ilicitude na incidência juros remuneratórios acima do percentual previsto no contrato, bem como da média de mercado, juros de mora cumulado com comissão de permanência, capitalização indevida (diária), cobrança de seguro e tarifas. Tal indicação se revela pertinente, considerando que impõe os limites a serem analisados por este Juízo, uma vez que dispõe a Súmula 381 do Superior Tribunal de Justiça que “nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas”. (Negritei). A incidência desta Súmula ocorre ainda quando se está em voga a análise do contrato à luz do Código de Defesa do Consumidor, consoante remansosa jurisprudência: "Não cabe ao Tribunal de origem revisar de ofício cláusulas contratuais tidas por abusivas em face do Código de Defesa do Consumidor." (AgRg no Ag 807.558/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 30/06/2011). (Negritei). Passo, por conseguinte, a apreciação das teses contidas na peça de ingresso, e, para tanto, ressalto que a revisão contratual encontra previsão legal nos arts. 6º e 51, § 1º, III do Código de Defesa do Consumidor, assim redigidos: "Art. 6º São direitos básicos do consumidor: V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;" "Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que: III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso." Tais dispositivos preveem a possibilidade de revisão contratual em três situações distintas: 1 – Quando as cláusulas contratuais estabelecem prestações desproporcionais; 2 – Ainda, em decorrência de fatos supervenientes, as disposições contratuais tornarem-se onerosas; 3 – Por último, se contiver cláusula excessivamente onerosa. Portanto, não há se falar em necessidade apenas de um evento superveniente e imprevisível para se autorizar a revisão contratual porque, em tese, esta pode ser embasada na desproporção e na onerosidade excessiva. Ressalto que a proteção ao consumidor é norma constitucional e o Código de Defesa do Consumidor tem status de lei complementar, sendo que, por força dele, há muito a jurisprudência tem mitigado o princípio pacta sunt servanda. Convém ponderar, no entanto, que a intervenção estatal, em ação que tais, se faz com o intuito de realizar, de concretizar a justiça comutativa, sim, mas também de possibilitar a efetivação da justiça distributiva, através da razoabilidade da troca de bens e serviços. Ao reverso dos contratos de comum acordo (contrat de gré à gré), os contratos de adesão ostentam cláusulas já aprovadas por autoridade competente ou estabelecidas sem possibilidade de discussão ou modificação. Daí não decorre, mesmo que, por amor ao debate, incidisse as normas consumeristas, a nulidade das cláusulas contratuais restritivas ou tidas, em tese, por desfavoráveis ao aderente. Há que se comprovar, efetivamente, a nulidade pretendida. Mercê de tais alinhamentos constato que no contrato entre as partes entabulado, em linha de princípio, é válido, muito embora se tenha arguido a existência de cláusulas contratuais nulas/abusivas, que se pretende, com esta demanda, revisionar, o que se enfrentará nos itens adiante, desde que expressamente requerido, reiterando-se, outrossim, o que fora acima já referenciado, tocante ao conteúdo da Súmula 381 do Superior Tribunal de Justiça que veda a análise, de ofício, de cláusulas contratuais, ainda que se refira a demanda de natureza consumerista. Nessa toada, passo ao exame paulatino e pontual dos itens de insurgência, na forma acima enumerada, porquanto neles se inserem a pretensão revisional. DA ALEGAÇÃO DE INCIDÊNCIA DE JUROS REMUNERATÓRIO EM DESCOMPASSO COM O CONTRATUALMENTE PREVISTO E ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO Consoante já registrado no preâmbulo deste comando, alegou o requerente que não fora observado o contrato no que diz respeito a composição do valor efetivamente cobrado. Entrementes, descurou de juntar aos autos qualquer instrumento hábil a comprovar sua alegação, não servindo ao mister pretendido o cálculo elaborado no ID 30775100, o qual fora, de plano, impugnado pelo réu em contestação, ID 39162555. Ademais, sensível ao argumento lançado pelo requerente, não se pode confundir Custo Efetivo Total (CET), devidamente registrado no contrato, sendo que estes percentuais não se confundem com os juros remuneratórios: enquanto o primeiro (CET) é composto pela taxa de juros pactuadas, tributos, tarifas, seguros, emolumentos e todas as despesas que o consumidor arcar no curso do contrato, o segundo é englobado por àquele, e se refere aos juros cobrados em operações de empréstimo, financiamento ou crédito, que tem por objetivo remunerar a instituição credora pelo serviço fornecido. Portanto, não podem ser confundidos como in casu, conforme muito bem deslindado pelo e. Tribunal de Justiça, “O apelante parece confundir o Custo Efetivo Total CET, com o juros nominal cobrado, que deve ser próximo à taxa média praticada” (TJES, Classe: Apelação, 035170248153, Relator: EWERTON SCHWAB PINTO JUNIOR, Órgão julgador: PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 30/07/2019, Data da Publicação no Diário: 09/08/2019). (Negritei). No mesmo sentido: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE FINANCIAMENTO – CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – CÁLCULO DA PRESTAÇÃO – INDICAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS MENSAIS, ANUAIS E CUSTO EFETIVO TOTAL – RECURSO DESPROVIDO. 1. Para a formação da parcela mensal devida como pagamento de financiamento de veículo não basta o cálculo que leva em consideração, única e exclusivamente, a taxa de juros remuneratórios mensal constante do título de crédito. Devem ser considerados, também, a taxa de juros anual, os encargos também financiados e, por óbvio, o custo efetivo total (CET). 2. Não comprovados os fatos constitutivos do direito da autora, ora apelada, o que leva, necessariamente à improcedência de sua pretensão. 3. Recurso desprovido” (TJ-ES, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Órgão julgador: 3ª Câmara Cível, Número: 5001249-29.2021.8.08.0045, Magistrado: CARLOS SIMOES FONSECA, Data: 03/Jun/2024). Consequentemente, não se tem como acolher a tese arguida de que a ré promover cobrança de valores com inobservância do contratualmente previsto, até porque, a taxa de juros remuneratórios no caso concreto, encontra-se dentro dos limites da média de mercado estabelecida pelo Banco Central, nos termos da fundamentação a seguir. Registro que os juros remuneratórios, também chamados de compensatórios, são aqueles devidos ao credor com objetivo de remunerar o empréstimo do capital. Nas palavras de NELSON NERY JR: "são os interesses devidos como compensação pela utilização do capital alheio" (Código Civil Comentado. 6. Ed. São Paulo: RT, 2008. p. 483). Cumpre-me destacar que a Lei 4.595/64 deu azo para que as instituições financeiras estipulassem, sempre que necessário, as taxas de juros, derrogando, em relação a elas, as disposições do Dec. 22.626/33 (Lei da Usura) que qualificam como usura a cobrança de taxa de juros superior a 12%, inclusive a contumácia da interpretação dessa decisão levou o STF a redigir a súmula 596 que estabelece: "As disposições do Dec. 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional". Destarte, não há que se limitar a taxa de juros remuneratórios a 12% ao ano, podendo o réu cobrar a taxa contratada, desde que não demonstrada a abusividade excessiva. Neste contexto, verifico que: a alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado. (AgRg no Ag 1018134/SE, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 17/05/2010). A fim de dirimir a controvérsia o Superior Tribunal de Justiça ao editar a Súmula 382: “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. (Negritei). Nesse sentido, recente decisão do c. Superior Tribunal de Justiça: “A jurisprudência desta Corte firmou-se, em recurso repetitivo, no sentido de que a fixação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano não evidencia, por si só, abusividade em face do consumidor, de modo que os juros remuneratórios afiguram-se abusivos e devem ser limitados à média de mercado quando haja, no caso concreto, significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa média praticada em operações da mesma espécie (REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Segunda Seção, j. em 22/10/2008, DJe 10/3/2009)” (AgInt no REsp n. 2.082.731/MT, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 8/4/2024, DJe de 11/4/2024). No entanto, segundo a orientação adotada no julgamento do REsp 1.061.530/RS, julgado sob o rito dos recursos repetitivos, “é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto (REsp n. 1.061.530/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009.”). No referido recurso repetitivo, os precedentes levados em consideração no julgamento afastaram a taxa pactuada em hipóteses em que superior a uma vez e meia (150%), ao dobro (200%) ou ao triplo (300%) da taxa média. Muito embora a proposta da eminente Relatora Min. Nancy Andrighi para a padronização do limite de juros tenha sido rejeitada, os patamares em apreço foram, de fato, destacados. No caso sub examen, do cotejo dos documentos entranhados aos autos, verifico que o contrato estabeleceu taxa de juros remuneratórios de 42,24 a.a. / 2,98% a.m. – em 25/07/2022. De se ver que estas taxas se apresentam razoáveis aos padrões de mercado em 25/07/2022 uma vez que não superior a metade (50%) do percentual estabelecido pelo Banco Central como média de mercado, senão vejamos: 27,64% a.a. / 2,05% a.m.: As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada (desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, cheque especial, crédito pessoal, entre outros. A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade. Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros. A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, Dje de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. O e. Tribunal de Justiça assim também já se pronunciou: “I - Conceitua-se juros remuneratórios como os valores pagos pelo mutuário ao mutuante, em decorrência do negócio jurídico entre eles; representando, assim, o preço da disponibilidade monetária. II - Quanto à estipulação dos juros remuneratórios esta Corte Estadual de Justiça já firmou sua posição no sentido de que “conforme entendimento do c. STJ, os juros remuneratórios devem ser limitados à taxa média de mercado quando comprovada, no caso concreto, a significativa discrepância entre a taxa pactuada e a taxa de mercado para operações similares” (TJ-ES - AC: 00273895920188080024, Relator: ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 25/10/2021, QUARTA CÂMARA CÍVEL). III - A abusividade vem sendo reconhecida pelos Tribunais Pátrios nas hipóteses em que a divergência ultrapassa em mais de 50% (cinquenta por cento) a média nacional. IV - Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida. Honorários advocatícios majorados”. (TJ-ES, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Órgão julgador: 3ª Câmara Cível, Número: 5012896-89.2022.8.08.0011, Magistrado: DEBORA MARIA AMBOS CORREA DA SILVA, Data: 08/Aug/2024). (Destaquei). Em verdade, esse percentual é variável consoante já assentou o Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONCLUSÃO PELA EXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE NA TAXA DE JUROS PACTUADA. REQUISITOS PARA CONFIGURAÇÃO DA ABUSIVIDADE NÃO PREENCHIDOS. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO ÀS SÚMULAS 5 E 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que o abuso fique cabalmente demonstrado. A jurisprudência tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia; ao dobro ou ao triplo da média - o que não ocorreu no caso em análise. 2. Para infirmar as conclusões a que chegou o acórdão recorrido, não foi necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos e das cláusulas do contrato firmado, não havendo incidência dos óbices das Súmulas 5 e 7/STJ. 3. A aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 não é automática, porquanto a condenação da parte agravante ao pagamento da aludida multa - a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada - pressupõe que o agravo interno mostre-se manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja de tal forma evidente que a simples interposição do recurso possa ser tida, de plano, como abusiva ou protelatória, o que não se verifica na hipótese examinada. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 2.386.005/SC, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 20/11/2023, DJe de 22/11/2023.) AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE VERIFICADA NO CASO CONCRETO. TAXA ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO ESTIPULADA PELO BACEN. SÚMULA 83/STJ. NECESSIDADE DE ANÁLISE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULAS 5 E 7/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. Conforme destacado pela Ministra Relatora do REsp 1.061.530/RS, a jurisprudência "tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (REsp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos" (AgInt no AREsp 657.807/RS, Rel. Ministro Lázaro Guimarães, Desembargador convocado do TRF 5ª Região, Quarta Turma, julgado em 21/6/2018, DJe 29/6/2018). 2. De acordo com a orientação do Superior Tribunal de Justiça, não há como acolher a pretensão recursal que demande o reexame dos aspectos fáticos e probatórios da causa e/ou a interpretação de cláusulas contratuais, com vistas a modificar a conclusão exarada pelo Tribunal de origem, ante os óbices dispostos nas Súmulas 5 e 7 do Superior Tribunal de Justiça. 3. Agravo interno improvido. (AgInt no REsp n. 2.002.576/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 17/10/2022, DJe de 20/10/2022.) Nestes termos, levando em consideração as taxas de juros de mercado no dia, mês e ano, tem-se que àquela constante do contrato não se revela abusiva. DA CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS Cumpre-me registrar que a capitalização anual de juros sempre foi permitida para todos os contratos, sejam ou não celebrados com instituições financeiras. É o que dispõe o art. 4º (parte final) do decreto 22.626/33 (Lei de Usura) e art. 591 do Código Civil, portanto, o que é proibida é a capitalização mensal de juros, salvo para contratos bancários celebrados a partir de 31.03.2000, ou as Cédulas de Crédito que já possuíam regramento próprio - Lei nº 6.840/80 e Decreto-Lei 413/69. A partir de 31.03.2000 passou a ser possível a capitalização de juros nos contratos celebrados por instituições financeiras, mesmo que não supedaneada em Cédulas de Crédito. Nestes termos, de se pôr em destaque a redação da MP 2.170-36/2001: “Art. 5º. Nas operações realizadas pelas instituições financeiras integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”. Por sua vez, o c. Superior Tribunal de Justiça confirma essa possibilidade, inclusive em julgamento do REsp nº 1.251.331, em sede de recurso repetitivo, trouxe, contudo, as suas condicionantes: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DIVERGÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. RECURSOS REPETITIVOS. CPC, ART. 543-C. TARIFAS ADMINISTRATIVAS PARA ABERTURA DE CRÉDITO (TAC), E EMISSÃO DE CARNÊ (TEC). EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL. COBRANÇA. LEGITIMIDADE. PRECEDENTES. MÚTUO ACESSÓRIO PARA PAGAMENTO PARCELADO DO IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS (IOF). POSSIBILIDADE. 1. "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada" (2ª Seção, REsp 973.827/RS, julgado na forma do art. 543-C do CPC, acórdão de minha relatoria, DJe de 24.9.2012).(REsp 1251331/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe 24/10/2013)”. (Negritei). A questão, inclusive, fora sumulada pelo c. Superior Tribunal de Justiça – Súmula 539: “É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada”. (Negritei). Desse modo, os bancos podem fazer a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano, desde que expressamente pactuada, observando-se que a previsão no contrato de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada – Súmula 541 do c. Superior Tribunal de Justiça. Neste cotejo, há que ser mantida a incidência da capitalização mensal, posto que posterior a normatização acima e em razão de possuir cláusula específica possibilitando tal prática – CLÁUSULA 2 (ID 30775093). Nestes termos, não se tem como acolher a tese invocada pela parte autora. DOS ENCARGOS DA MORA X COMISSÃO DE PERMANÊNCIA Diferentemente dos juros remuneratórios (os quais encontram limite tão somente na taxa média de mercado), os juros moratórios não podem ser cobrados, em regra, em percentual superior a 1% (um por cento) ao mês. Senão vejamos o entendimento do Superior Tribunal de Justiça já, inclusive, sumulado – nº 379: “Nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês”. Por sua vez, a comissão de permanência encontra previsão na Resolução nº 1.129⁄86 do Conselho Monetário Nacional, editada com fundamento no art. 4º, inc. VI e IX, da Lei nº 4.595⁄64, que faculta aos "bancos comerciais, bancos de desenvolvimento, bancos de investimento, caixas econômicas, cooperativas de crédito, sociedades de crédito, financiamento e investimento e sociedades de arrendamento mercantil cobrar de seus devedores por dia de atraso no pagamento ou na liquidação de seus débitos, além de juros de mora na forma da legislação em vigor, ''comissão de permanência'', que será calculada às mesmas taxas pactuadas no contrato original ou à taxa de mercado do dia do pagamento." Verifica-se, dessa forma, que se trata a comissão de permanência de instituto jurídico previsto em normas do Banco Central do Brasil, o que torna sua cobrança legal. Entrementes, tal encargo não pode ser cumulado com encargos moratórios, nos termos já amealhados pelas Súmulas nº 294 e 472, ambas do Superior Tribunal de Justiça: “Súmula 294 – Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa de contrato”. “Súmula 472 – “A cobrança de comissão de permanência – cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato – exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual”. Convém salientar que conforme se depreende da leitura da Súmula nº 294 acima transcrita, a forma da aplicação da comissão de permanência não é ilimitada, uma vez que tal encargo tem natureza jurídica tríplice, ou seja: destina-se à remuneração do capital emprestado, à atualização monetária do saldo devedor e à sanção pelo descumprimento do contrato. Por essa razão, a comissão de permanência não pode ser cobrada em conjunto com quaisquer outros encargos, tais como juros remuneratórios, juros de mora, correção monetária ou multa contratual. Ocorrendo esta hipótese, haveria incidência dupla de remuneração do capital, dupla composição do valor emprestado e dupla sanção ao devedor, o que é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Inúmeras foram as decisões judiciais a respeito da matéria, o que ensejou a edição das Súmulas 30 e 296 pelo Superior Tribunal de Justiça, que assim enunciam: “Súmula 30. A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis”. “Súmula 296. Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado”. Conclui-se, assim, pela impossibilidade de cumulação de comissão de permanência com qualquer outro encargo moratório. Estabelecidas as conceituações acima, há que se verificar que não há previsão de cobrança de comissão de permanência cumulada com multa, mas apenas de multa e juros de mora – item 14 do contrato de ID 30775093, pag. 06 – portanto, improcedente se revela o pedido em tela. DA VEDAÇÃO DE REVISÃO, DE OFÍCIO, DE CLÁUSULAS NÃO IMPUGNADAS ESPECIFICAMENTE Repise-se que o comando sentencial se restringirá ao exame da legalidade/abusividade ou não daquelas tarifas sobre as quais pendam pedido expresso de análise, havendo que se desprezar outras, ainda que existente do contrato, mas que não fora objeto de pedido autoral, uma vez que já sedimentado pelo c. Superior Tribunal de Justiça concluiu pela “impossibilidade do reconhecimento, de ofício, de nulidade de cláusulas contratuais consideradas abusivas, sendo, para tanto, necessário o pedido expresso da parte interessada”(EREsp 720.439/RS, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/03/2011, DJe 29/03/2011). Outrossim, não se analisará também tarifas que, embora requeridas na inicial, não encontram resguardo na relação contratual, ou seja, não foram previstas no contrato, haja vista que exame de sua legalidade ou não, em hipótese alguma traria qualquer proveito para a parte autora, nos termos do acima já fora exposto. Neste contexto, impugnou o autor a inclusão das seguintes tarifas: seguro, registro de contrato, avaliação e cadastro. TARIFA DE CADASTRO Com relação à tarifa de cadastro – no contrato, intitulada ainda, como “cesta de serviços”, consigno que o Conselho Monetário Nacional editou regras a fim de disciplinar a questão da cobrança de tarifas bancárias pelas instituições financeiras. Dentre elas podemos citar o que dispõe o art. 1º da Resolução nº 3.518/2007, com a redação advinda pela Resolução nº 3.919/2010, que assim nos indica: “A cobrança de tarifas pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário”. Ao que se vê, essa medida teve por finalidade dar mais transparência nas cobranças de tarifas para pessoas físicas, assegurando dessa forma que o consumidor tenha ciência plena dos valores que lhe estão sendo cobrado. Neste particular, o Resp 1.251.331 julgado nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil – recursos repetitivos – concluiu-se que o serviço de confecção de cadastro continua a ser passível de cobrança, no início do relacionamento, desde que contratado expressamente, por meio da “Tarifa de Cadastro”. Como se não bastasse, colhe-se da Súmula recentemente editada pelo c. Superior Tribunal de Justiça – nº 566: “Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira”. In casu, o contrato é posterior a vigência da sobredita resolução, a autorizar, por conseguinte, a cobrança de tal tarifa, revelando-se, assim, a improcedência do pedido inaugural. REGISTRO DE CONTRATO E AVALIAÇÃO No tocante à cobrança de tarifas atinente registro de contrato e avaliação, no bojo do RECURSO ESPECIAL REPETITIVO Nº 1.578.553 SP, foi fixada a seguinte tese: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 958/STJ. DIREITO BANCÁRIO. COBRANÇA POR SERVIÇOS DE TERCEIROS, REGISTRO DO CONTRATO E AVALIAÇÃO DO BEM. PREVALÊNCIA DAS NORMAS DO DIREITO DO CONSUMIDOR SOBRE A REGULAÇÃO BANCÁRIA. EXISTÊNCIA DE NORMA REGULAMENTAR VEDANDO A COBRANÇA A TÍTULO DE COMISSÃO DO CORRESPONDENTE BANCÁRIO. DISTINÇÃO ENTRE O CORRESPONDENTE E O TERCEIRO. DESCABIMENTO DA COBRANÇA POR SERVIÇOS NÃO EFETIVAMENTE PRESTADOS. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA ABUSIVIDADE DE TARIFAS E DESPESAS EM CADA CASO CONCRETO. 1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. (REsp 1.578.553/SP, a Segunda Seção do Col. STJ, Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j, 28.11.18, DJe 06.12.18). (Destaquei). No caso concreto, a ré não juntou aos autos o documento a atestar que promoveu o registro do contrato, ou ainda, procedeu com a avaliação do bem, a possibilitar a cobrança de valores para tais serviços, portanto, devida a restituição almejada, no valor, respectivamente, de R$ 403,50 (quatrocentos e três reais e cinquenta centavos) de R$ 458,00 (quatrocentos e cinquenta reais): “É abusiva a cobrança de "Tarifa de Avaliação do Bem", “Tarifa de Registro de Contrato” e “Tarifa de Serviços de Terceiros” quando não há comprovação da efetiva prestação do serviço. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CPC, art. 1.040; CDC, arts. 6º, IV, e 39, V. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1578553/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª Seção, julgado em 28.11.2018; TJES, AC nº 0008789-54.2014.8.08.0048, Rel. Des. Raphael Americano Câmara, julgado em 11.10.2023”. (TJ-ES, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Órgão julgador: 2ª Câmara Cível, Número: 0012895-05.2012.8.08.0024, Magistrado: RAPHAEL AMERICANO CAMARA, Data: 13/Nov/2024) (Destaquei). À guisa de conclusão: devida a restituição exclusivamente do valor desembolsado a título de serviço de avaliação e cadastro. SEGURO Outrossim, também no julgamento do "Tema 972" nos autos do REsp 1.639.320/SP, afetado ao rito dos recursos repetitivos e, portanto, precedente de observância obrigatória nos termos do art. 927, III, do Código de Processo Civil, submeteu-se a julgamento a seguinte questão: (ii) validade da cobrança desseguro de proteção financeira”, firmando-se a seguinte tese: "nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada". No caso concreto, a ré sequer juntou aos autos a proposta de adesão assinada ou comprovou a existência do seguro, mediante a juntada de apólice do seguro, sendo aplicável a orientação hodierna em situações que tais: “O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 972, estabelece que, nos contratos bancários, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada, caracterizando tal prática como abusiva. Não foi apresentada prova da dispensa do seguro prestamista, sendo possível verificar, por meio dos documentos constantes nos autos, que o seguro foi vinculado obrigatoriamente ao contrato de empréstimo pessoal, caracterizando venda casada. A sentença de primeiro grau concluiu corretamente pela nulidade do contrato de seguro prestamista, haja vista a abusividade comprovada. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: O consumidor não pode ser compelido a contratar seguro prestamista com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada, conforme o Tema 972 do STJ. A vinculação obrigatória de seguro ao contrato de empréstimo configura prática abusiva de venda casada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 170, V; CDC, art. 39, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.639.320/SP, Tema 972, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 12.12.2018; TJES, Apelação Cível nº 024151633930, Rel. Des. Walace Pandolpho Kiffer, j. 09.11.2020” (TJ-ES, APELAÇÃO, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Número: 0002674-16.2019.8.08.0024, Magistrado: ARTHUR JOSE NEIVA DE ALMEIDA, Data: 18/Nov/2024). Portanto, faz jus o autor a restituição no valor de R$ 1.970,00 (um mil, novecentos e setenta reais). DA RESTITUIÇÃO EM DOBRO Aferida a ilegalidade das cobranças indicadas como seguro, registro e avaliação, ressalto a hodierna orientação jurisprudencial: “No que diz respeito a restituição em dobro do indébito, o Superior Tribunal de Justiça quebrou os paradigmas então vigorantes em sua jurisprudência a respeito da restituição em dobro prevista no art. 42, do CDC, quando a Corte Especial, no julgamento de Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial nº 664.888, assentou o entendimento de que é desnecessária a demonstração do elemento volitivo (má-fé) para que o consumidor seja ressarcido em dobro pelo fornecedor, bastando, para tanto, a demonstração de conduta contrária à boa-fé objetiva” (TJ-ES, Data: 14/Jun/2024, Órgão julgador: 3ª Câmara Cível, Número: 5003335-93.2023.8.08.0047, Magistrado: JORGE HENRIQUE VALLE DOS SANTOS). No caso concreto, considerando que o contrato é posterior a modulação (contrato firmado em 25/07/2022, enquanto a modulação ocorreu em março 2021), a restituição deverá ser implementada de forma simples: “Declarada a ilegalidade ou abusividade da cobrança das tarifas, constituiu ônus da instituição comprovar a conduta compatível com a boa-fé objetiva, que não se demonstra com a mera alegação de que o procedimento e valores estariam em conformidade com o contrato ou regulamento, que é justamente o ponto de questionamento judicial, devendo a repetição de indébito deve ser de forma simples sobre as parcelas cobradas até a data de publicação do EAREsp 676608/RS e em dobro, após a publicação” (TJ-ES, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Data: 30/Apr/2024, Órgão julgador: 1ª Câmara Cível, Número: 5000890-05.2023.8.08.0047, Magistrado: JANETE VARGAS SIMOES). Desta forma, de se acolher o pedido de restituição em dobro. DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA Diante do reconhecimento da abusividade na contratação da referida tarifa/seguro, impõe-se (i) determinar à instituição financeira o recálculo do valor das prestações devidas, considerando-se o montante mutuado com a exclusão das rubricas indevidas, bem como (ii) determinar a repetição dos valores efetivamente pagos a maior pela parte autora, correspondentes à diferença entre o valor da prestação efetivamente devida, recalculada nos termos retro, e aqueles efetivamente pagos, sobre os quais deverão incidir correção monetária pela tabela prática da Corregedoria Geral da Justiça deste Estado, desde a data do efetivo pagamento, bem como juros de mora de 1% ao mês, desde a citação. D I S P O S I T I V O Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos deduzidos pelo autor exclusivamente para declarar a ilegalidade na cobrança de Registro de Contrato, Avaliação e Seguro, respectivamente, R$ 403,50 (quatrocentos e três reais e cinquenta centavos), R$ 458,00 (quatrocentos e cinquenta reais) e R$ 1.970,00 (um mil, novecentos e setenta reais), condenando a requerida à repetição em dobro dos valores pagos indevidamente, com correção monetária e juros nos termos descritos anteriormente – tópico “da correção monetária e juros de mora”. Mercê de sucumbência recíproca do autor e réu, condeno-os a suportarem custas e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação, tomando por base as disposições constantes do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil, na seguinte proporção: 1. O autor – 60%, e 2. A ré – 40%; suspensa a exigibilidade tocante ao autor, considerando o deferimento da gratuidade, ID 36258342. Intimem-se. Transitada em julgado, cobradas as custas e não havendo requerimentos pendentes de apreciação, arquivem-se estes autos. Vila Velha-ES, data da assinatura eletrônica. MARIA IZABEL PEREIRA DE AZEVEDO ALTOÉ Juíza de Direito
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