Processo nº 1012816-53.2021.8.11.0042
ID: 257680046
Tribunal: TJMT
Órgão: 13ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 1012816-53.2021.8.11.0042
Data de Disponibilização:
16/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
SUZANA SIQUEIRA LEAO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 13ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ SENTENÇA Ação Penal n. 1012816-53.2021.8.11.0042 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO Réu: LUIS FELIPE CAMPOS DE AMORI…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 13ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ SENTENÇA Ação Penal n. 1012816-53.2021.8.11.0042 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO Réu: LUIS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE Vistos, etc. Trata-se de Ação Penal proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em desfavor de LUÍS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE, brasileiro, solteiro, comerciante, natural de Cuiabá/MT, nascido em 16/10/1992, inscrito no CPF 025.391.321-70, filho de Claudionel de Campos de Leite e Dilma Pereira de Amorim Leite, residente na Rua Presidente Leite Figueiredo, nº. 542, bairro Dom Aquino, Cuiabá-MT - preso por outro processo na Penitenciária Central do Estado -, como incurso pela prática, em tese, do crime previsto no artigo 33, “caput”, e art. 40, inciso III, ambos dada Lei n. 11.343/06. Diz a peça acusatória, em síntese que: “Conforme Inquérito Policial, no dia 20 de agosto de 2021, às 16h00min, na distribuidora “Plim Delivery”, localizada na Rua General Camisão, nº 410, Bairro Dom Aquino, nesta cidade, o denunciado Luis Felipe Campos de Amorim Leite tinha em depósito, 10 (dez) porções de maconha, com massa total de 12,24 g (doze gramas e vinte e quatro centigramas), para outros fins que não o consumo pessoal, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (laudo definitivo nº 3.14.2021.78473-01).” “Na referida data, a equipe de investigação da Delegacia Especializada em Roubos e Furtos da Capital, em cumprimento ao mandado de busca e apreensão nº 1001250-44.2020.8.11.0042, expedido pela 7ª Vara Criminal da Capital, no endereço supracitado, realizou a prisão em flagrante do denunciado Luis Felipe, que foi surpreendido no interior do estabelecimento comercial com entorpecentes.” “Diante do exposto, foi lavrado o auto de prisão em flagrante 1012116-77.2021.8.11.0042, que resultou no presente inquérito, no intuito de que fossem apurados os fatos quanto ao delito de tráfico de drogas.” “No cumprimento da diligência, os agentes localizaram no interior do comércio de responsabilidade do denunciado, 01 (uma) balança de precisão da cor prata, 01 (um) rolo de papel filme, diversos pacotes transparentes, 09 (nove) porções de maconha em um quarto nos fundos do estabelecimento encima de uma raque envoltas em plástico filme e 01 (uma) porção em um sachê transparente, 01 (uma) porção grande de maconha dentro de um pote plástico colorido com tampa, embaixo de uma pia, além da importância de R$ 598,00 (quinhentos e noventa e oito reais).” “Os itens foram encontrados em um quarto dos fundos do estabelecimento, em cima de um raque, dentro de um pote plástico e embaixo da pia.” “Perante a autoridade policial, o denunciado permaneceu em silêncio.” “Destaca-se que o denunciado é reincidente específico, haja vista que possui condenação definitiva por tráfico de drogas (processo 1070- 26.2012.811.0042 – trânsito em julgado em 12/07/2018), cuja pena ainda não foi integralmente cumprida (processo executivo de pena 0035637-73.2018.811.0042/SEEU) (...)”. A denúncia de Id. 65112179 veio instruída do inquérito policial de Id. 64635623, fl. 01 e do laudo definitivo da droga n. 3.14.2021.78473-01 (Id. 64635630). O acusado foi preso em flagrante delito no dia 20/08/2021 e na audiência de custódia, a prisão em flagrante foi relaxada, conforme decisão no APF n. 1012116-77.2021.8.11.0042 (Id. 67944030, fls. 66/71), estando, pois, respondendo ao processo em liberdade. A folha de antecedentes foi juntada no Id. 186492533 e 186587851. A Defesa Prévia foi protocolada na data de 29/08/2022, oportunidade em que arrolou as mesmas testemunhas da acusação (Id. 93792332). A denúncia foi recebida na data de 23/08/2024 (Id. 166606367), oportunidade que designou a audiência de instrução e julgamento para o dia 26/11/2024, às 15:20 horas. Na audiência de instrução e julgamento realizada pelo sistema de videoconferência no dia 26/11/2024 (Id. 177344947), procedeu-se com o interrogatório do réu e a oitiva de uma testemunha arrolada pela acusação em comum com a defesa. As partes desistiram da oitiva de uma testemunha, o que foi homologado e, consequentemente, encerrada a instrução processual. O Ministério Público apresentou seus memoriais finais, onde pugnou pela procedência integral da ação, com condenação do denunciado nas penas do art. 33, “caput”, da Lei n.º 11.343/06, com afastamento da causa de diminuição do art. 33, §4º da referida lei, por ser reincidente especifico (Id. 180503912). A Defesa do réu ofertou os memoriais finais no Id. 186380375, onde requereu pela absolvição do acusado nos termos do art. 386, incisos IV e VII, do Código de Processo Penal, e subsidiariamente pela desclassificação para o delito do art. 28 da lei de drogas. Em caso de condenação, pugnou pelo reconhecimento da causa de diminuição de pena descrita no artigo 33, §4º, da Lei de Drogas. Em seguida, vieram-me os autos conclusos para sentença em 11/03/2024. Eis a síntese do necessário relatório. FUNDAMENTO. DECIDO. DAS PRELIMINARES E QUESTÕES PREJUDICIAIS Não há preliminares ou questões prejudiciais a serem decididas, razão pela qual, passo à análise de mérito da causa. DO MÉRITO Pretende-se, nestes autos, atribuir a LUIS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE a prática dos delitos capitulados artigo 33, “caput”, e art. 40, III, ambos da Lei de Drogas, porque no dia 20/08/2021, mantinha em depósito, nas dependências de estabelecimento de diversão, substância entorpecente de uso proscrito no país, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Em análise aos procedimentos realizados durante a persecução criminal, nada há que se possa ter comprometido o bom andamento processual, ou mesmo, que porventura tenha gerado alguma nulidade passível de observância ex officio. A materialidade do crime tipificado na Lei de Tóxicos (art. 33, “caput”) encontra-se comprovada inicialmente pelo auto de apreensão (Id. 67944030, fl. 11) e, em seguida, pelo laudo toxicológico definitivo n. 3.14.2021.78473-01 (Id. 64635630), não restando dúvidas que a substância apreendida se tratava de maconha, a qual era ao tempo do fato e ainda é de uso, porte e comercialização proibidos no Brasil, em conformidade com RDC n° 13 de 26.03.2010, o qual regulamenta a Portaria n° 344/98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, sendo inclusa nas listas “E”/“F2” de substâncias proscritas. No que concerne à autoria delitiva vejamos o que as provas colhidas na audiência instrutória subsidiam a respeito: O acusado LUÍS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE ao ser interrogado em juízo relatou o seguinte: “(...) O senhor estava no comércio, os policiais chegaram, para cumprir o mandado da sétima vara criminal, e como é que foi esse entorpecente que o senhor tinha mesmo? (...) Eu estava na distribuidora, eu e meus funcionários quando eu fui surpreendido pela abordagem da policia civil com mandado de busca e apreensão (inaudível) e na abordagem eles acharam lá uma pequena porção de maconha, não tinha nem dez gramas. E a balança, e esses apetrechos aqui que foram encontrados? Não, esses apetrechos, lá funcionava como uma distribuidora e local de lanche também que tinha uma cozinha para fazer comida (inaudível) fora as coisas de tabacaria, narguilé e essas coisas ai, e a balança não me recordo como estava mas era da minha mãe que usava para fazer comida (inaudível) e essa porção que foi achada lá inclusive era minha (...)” (Id. 177344941). A testemunha IPC ZANIL FERREIRA GOMES afirmou o seguinte em seu depoimento judicial: “(...) Como é que foi cumprir esse mandado, Zanil? E aí? Chegando lá, como é que vocês acharam essa droga, foi feita uma busca no local ou ele acabou falando, como é que foi encontrado o balança de precisão ou não, o que o senhor pode dizer? Perfeito. Nós tivemos a ordem de cumprimento de busca, né? Nesse endereço, no qual fui eu e mais outros investigadores, demais investigadores chegamos no local, né? Adentramos na residência onde se encontrava o Luis Felipe, né? Assim que nós entramos na residência, já começamos a ver vários vestígios, tipo vestígios por papeis que enrola droga, né? Então, esses que as pessoas usam para comercialização. E numa revista mais minusiosa, né? Foi quando nós começamos a encontrar, a gente teve que encontrar uma balança de precisão, já com resquícios, né? De entorpecente. Aí os demais colegas fizeram busca no recinto, ali no estabelecimento, foram encontrando em várias locais substâncias análogas à maconha. Ele alegou que essa droga seria para uso dele? A princípio sim, mas pela quantidade ali que tinha, a balança de precisão, já com resquícios de drogas também, então, não tem como a pessoa pesar para consumir, enfim. (...) Essa busca e apreensão estava direcionada a roubo de furtos? Sim, era uma operação, nós fomos apenas cumprir esse mandado. Mas estava direcionada ao acusado aqui, o Luis? Exatamente, advogada. O senhor se recorda da quantidade que foi apreendida no dia de entorpecentes? Foram várias porções, né? Foram porções, várias porções pequenas de droga, nove porções, né? Uma porção grande, avulsa que estava dentro de um pote plástico. Certo? E demais, né? Rolo filme né e balança de precisão. O senhor se recorda que espécie de droga era? Análogo é a maconha e depois foi constatado pela perícia que realmente era maconha (...).” (Id. 177344944). Do delito descrito no artigo 33, “caput”, da Lei de Drogas: Da análise dos autos, denota-se que em seu interrogatório judicial o acusado LUIS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE confirmou a propriedade do entorpecente apreendido, todavia, afirmou que não estava comercializando e que referida droga se destinava ao seu exclusivo consumo. Embora o denunciado tenha negado seu envolvimento com o tráfico de drogas, é certo que assumiu a propriedade da maconha, não deixando dúvida quanto a sua vinculação com narcótico apreendido. O investigador de polícia ZANIL, em seu depoimento prestado em juízo, afirmou que integrava a equipe que foi cumprir um mandado de busca e apreensão oriundo da delegacia de roubos e furtos. Afirmou que durante a revista domiciliar foi encontrado várias porções de entorpecentes e apetrechos utilizados para o tráfico. Corroborando a prova testemunhal, consta do termo de apreensão de Id. 67944030, fl. 11 e, em seguida, pelo laudo toxicológico definitivo n. 3.14.2021.78473-01 (Id. 64635630), a apreensão de 10 (dez) porções com massa de 12,24g (doze gramas e vinte e quatro centigramas) de substância que apresentou resultado positivo para MACONHA, bem como a apreensão de uma balança de precisão com resquícios de maconha, um rolo de papel filme, pacotes tipo saches transparente e R$ 598,00. A quantidade de drogas apreendida: 12,24g (doze gramas e vinte e quatro centigramas) de MACONHA, no contexto dos autos que se apurava uma delação de troca de produtos oriundo de roubo por entorpecente, aliado à apreensão de dinheiro em espécie e diversos petrechos relacionados a traficância (balança de precisão, rolo de plástico filmes e pacotes tipos saches), são circunstâncias que corroboram a finalidade mercantil. A propósito, valho-me do seguinte ensinamento de Alexandre de Moraes e Gianpaolo Poggio Smanio: “Lembremo-nos de que a noção de grande ou pequena quantidade varia de substância para substância. Por exemplo, no caso da cocaína consumida por via endovenosa, uma dose equivale a 0,01 grama, enquanto por aspiração a dose corresponde a 0,1 grama; diferentemente, em um cigarro de maconha há 0,33 gramas da citada substância entorpecente.” (MORAES, Alexandre de, & SMANIO, Gianpaolo Poggio, Legislação Penal Especial, Atlas, 8ª ed., 2005, fls. 137) (negritei). Logo, a quantidade de 12,24g (doze gramas e vinte e quatro centigramas) de MACONHA, no contexto da abordagem, está bem acima do quantum sugerido pelo art. 28, §2º, da Lei n. 11.343/06, demonstrando, por si, a finalidade mercantil. Conquanto em recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 506 de repercussão geral que deu provimento ao Recuso Extraordinário n. 635659, tenha fixado a quantidade de até 40 gramas de canais sativa como sendo indicador de usuário, é certo que referida presunção é de natureza relativa, permitindo o reconhecimento da traficância, quando presentes circunstâncias que indiquem o intuito de mercancia: “(...) 4. Nos termos do §2º do artigo 28 da Lei 11.343/2006, será presumido usuário quem, para consumo próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito. 5. A presunção do item anterior é relativa, não estando a autoridade policial e seus agentes impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo para quantidades inferiores ao limite acima estabelecido, quando presentes elementos que indiquem intuito de mercancia, como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes (...)”. No caso dos autos, verifico que a maconha foi encontrada fracionada em várias porções [10 porções], além de balança de precisão com resquícios de maconha, papel filme e vários pacotes tipo saches, que são utilizados para embalar entorpecentes. Assim, mesmo que o réu seja usuário nada impede que, simultaneamente, pratique o comércio de drogas, circunstâncias não incompatíveis entre si, e comum, muitas vezes utilizadas como forma de manter o próprio vício. Assim, não há como se conceber uma eventual desclassificação do delito, como pretende a Defesa em seus memoriais finais. A propósito, a simples condição de usuário do réu não exclui a de traficante, como reiteradamente tem se posicionado nossa Jurisprudência. Destaco aresto deste e. Tribunal (TJ/MT): “[...] a alegada condição de usuário de substância estupefaciente não exclui, de nenhuma forma, a caracterização do tráfico ilícito de entorpecentes, pois, como é sabido, a desclassificação para o crime descrito no art. 28 da Lei Antidrogas exige prova robusta acerca da propalada dependência química e verificação inequívoca de que o alucinógeno apreendido em poder do insurgente não se destinava ao tráfico, mas, sim, ao consumo próprio.” (Apelação Criminal nº 84764/2011 – Relator: Des. Luiz Ferreira de Souza – 28.11.2012). E mais. Enunciado nº. 3. “A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, “caput”, da Lei n. 11.343/06” (enunciado aprovado no incidente de uniformização de jurisprudência n. 10532/2015 – TJMT). Ora, o simples argumento de que o réu é somente usuário de drogas, não autoriza, por si só, o afastamento do delito de tráfico, tampouco pode desprezar a figura tão comum de traficante/usuário. É que geralmente, a realidade tem demonstrado que, em muitos casos, é extremamente difícil identificar se a conduta típica configura hipótese de porte para consumo pessoal ou de tráfico de pequena quantidade, já que as quadrilhas do tráfico comercializam a droga em doses ou porções reduzidas e utilizam, para a execução desse sinistro, pequenos traficantes que são também consumidores, pagando, estes, o preço de seu vício com o trabalho sujo de repassar a droga a outros. Destarte, a negativa vazia do denunciado acerca de seu envolvimento com o tráfico de drogas não restou devidamente comprovada nos autos. Aliás, vai de encontro com o conteúdo probatório encartados nos autos. Ademais, a folha de antecedentes do acusado revela que o mesmo ostenta duas condenações com transito em julgado, além de uma condenação provisória por fato posterior todas pelo mesmo delito de tráfico de droga, revelando, destarte, sua imersão neste tipo de prática delituosa. Diante disso e não havendo sequer informações de que os policiais que participaram do flagrante fossem desafetos do acusado, tivessem hostil prevenção contra ele ou quisesse indevidamente prejudicá-lo, a eficácia probatória dos seus testemunhos não pode ser desconsiderada. Nesse esteio, os depoimentos dos policiais merecem crédito, até porque não há qualquer restrição na lei processual penal quanto ao valor probante em razão de exercerem a função pública de policial. Portanto, não é de se afastar o depoimento de qualquer pessoa autorizada pela lei a depor, ainda mais quando as declarações apresentadas pelo réu não invalidam os depoimentos dos agentes policiais que, em cumprimento de seu dever legal buscam a ordem e a paz social, não tendo nenhum interesse em incriminar inocentes (ao menos não restou provado pela defesa – ônus de prova). Por outro lado, o acusado sim, tem interesse em provar sua inocência a todo custo e não está compromissado a falar a verdade a luz do princípio “nemo tenetur se detegere”, que garante a não autoincriminação. Além disso, não se pode olvidar que no processo penal brasileiro vigora o princípio do livre convencimento, em que o julgador pode decidir pela condenação do acusado, desde que sua decisão esteja fundamentada nos elementos probatórios coligidos nos autos. Conclui-se, pois, que os depoimentos prestados pelos policiais estão em perfeita harmonia e consonância com as provas dos autos, devendo, pois, serem recebidos como meio idôneo de prova, máxime quando não há indícios de que estes tenham interesse em prejudicar o réu, como ocorre in casu. Lembro que os depoimentos dos policiais não servem para descrédito pelo simples fato de serem policiais, ainda mais quando não há prova em contrário, trazendo outra verdade para os fatos. Nesse sentido é como ensina o mestre NUCCI: “(...) para a comprovação da prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes (e de outros tipos penais previstos nesta Lei), exigia-se, no passado, prova testemunhal considerada isenta, vale dizer, distinta dos quadros da polícia, pois esta, através dos seus agentes, seria a responsável pela prisão ou investigação, logo teria interesse em mantê-la, justificando seus atos e pretendendo a condenação do réu. Não mais vige esse pensamento, como majoritário, nos tribunais brasileiros. Preceitua o art. 202 do CPP que ‘toda pessoa poderá ser testemunha’, logo, é indiscutível que os policiais, sejam eles os autores da prisão do réu ou não, podem testemunhar, sob o compromisso de dizer a verdade e sujeitos às penas do crime de falso testemunho (...)” (Nucci, Guilherme de Souza - Leis penais e processuais penais comentadas -, 7. Ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 319). E mais: “Nos chamados ‘crimes de tóxicos’, que têm início com flagrante lavrado por policiais, a palavra desta tem força probante, salvo comprovação em contrário”. ((TJMT – Ac 255/79 – Relator Desembargador MILTON FIGUEIREDO FERREIRA MENDES) – RT 54/408). Enunciado n°. 08-TJMT: “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal”. (TJMT - Turma de Câmaras Criminais Reunidas- Incidente de Uniformização de Jurisprudência n°. 101532/2015 – Classe CNJ – 433). Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabelece que “os depoimentos dos agentes policiais, colhidos sob o crivo do contraditório, merecem credibilidade como elementos de convicção, máxime quando em harmonia com os elementos constantes dos autos” (HC 262.582/RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 10/03/2016, DJe 17/03/2016) Por isso, entendo que sobejam elementos para a condenação do réu LUÍS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE pelo crime de tráfico ilícito de entorpecente, pois infringiu o núcleo do art. 33, “caput”, da Lei de Drogas, no que se refere à conduta de ter em depósito droga de uso proscrito no país, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Da causa de aumento prevista no artigo 40, inciso III, da Lei n. 11.343/06: Concernente à majorante descrita no artigo 40, inciso III, da Lei de Drogas, diversamente do que entendeu o “Parquet”, não vislumbro cabimento no caso em análise. Isso porque, embora os autos revelem que os entorpecentes foram encontrados dentro da distribuidora “Plim Delivery”, o certo que comercialização de drogas em distribuidora/bar localizado em via pública, não se insere no rol dos locais descritos na majorante do artigo 40, inciso III, da Lei n. 11.343/06. Nesse sentido, é o julgado do nosso egrégio Tribunal de Justiça: “APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – CONDENAÇÃO NAS SANÇÕES DO ART. 33, CAPUT, C/C ARTIGO 40, INCISO III, AMBOS DA LEI Nº 11.343/06 – PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO – INADMISSIBILIDADE – TESTEMUNHOS DE AGENTES POLICIAIS SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO – APELANTE TRAZIA CONSIGO DROGA COM FINALIDADE DE MERCANCIA – CRIME DE AÇÃO MÚLTIPLA – CONDENAÇÃO MANTIDA – VENDA DE DROGAS EM BAR LOCALIZADO NA VIA PÚBLICA – LOCAL NÃO INSERIDO NO ROL DO ART. 40, INCISO III, DA LEI N° 11.343/06 – CAUSA DE AUMENTO AFASTADA – TRÁFICO PRIVILEGIADO – PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS – REDUÇÃO NO PATAMAR MÁXIMO DE 2/3 – QUANTIDADE DA DROGA – 1,74 GRAMAS DE COCAÍNA – PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL – REGIME INICIAL ABERTO – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS – RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE” (Ap 167631/2016, DES. PAULO DA CUNHA, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 16/05/2017, Publicado no DJE 22/05/2017). Diante disso, entendo que, no caso em questão, a causa especial de aumento de pena disposta no art. 40, inciso III, da Lei n. 11.343/06, deve ser afastada. ISTO POSTO e por tudo mais que dos autos consta, com as fundamentações necessárias, nos moldes do art. 5º, inciso IX, da Constituição Federal, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A DENÚNCIA e CONDENO o denunciado de LUÍS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE, brasileiro, solteiro, comerciante, natural de Cuiabá/MT, nascido em 16/10/1992, CPF 025.391.321-70, filho de Claudionel de Campos de Leite e Dilma Pereira de Amorim Leite, residente na Rua Presidente Leite Figueiredo, nº. 542, bairro Dom Aquino, Cuiabá-MT - preso por outro processo na Penitenciária Central do Estado -, nas sanções do art. 33, “caput”, da Lei n. 11.343/06. Dosimetria do art. 33, “caput”, da Lei de Drogas: Primeira fase: Destaco que, a pena cominada para o crime do art. 33, caput, da Lei de Drogas, é de 05 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) dias-multa. De acordo com o artigo 68 do Código Penal, a aplicação da pena ocorre em três fases. Na primeira delas, deve o Magistrado avaliar as circunstâncias judiciais trazidas no artigo 59 do mesmo codex (culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do sentenciado; motivos, circunstâncias e consequências do crime; e o comportamento da vítima) e fixar a pena-base, a qual, por sua vez, servirá de marco inicial para a próxima fase da dosimetria. Em se tratando de tráfico de drogas, o Magistrado também deverá observar o art. 42 da Lei 11.343/06, que orienta: "O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e quantidade da substância ou do produto, personalidade e a conduta social da agente". Observando, pois, com estrita fidelidade, as regras do art. 42 da Lei nº 11.343/06, que impõe ao Juiz levar em consideração, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza, a quantidade de droga ou do produto, na fixação da pena base, in casu, não se justifica majoração da pena, já que apreendido apenas 12,24 g (doze gramas e vinte e quatro centigramas) de MACONHA. Quanto a culpabilidade, tem-se, que nesta etapa, deve-se abordar o menor ou maior índice de reprovabilidade do agente, não só em razão de suas condições pessoais, mas também levando-se em consideração a situação em que o fato delituoso ocorreu. Após um estudo detalhado dos autos, entendo que a conduta do condenado não deve ser tida com grande reprovabilidade, sendo, pois, normal, à espécie. No que tange aos antecedentes criminais, in casu, não se recomenda a majoração da pena base, já que a condenação que pesa em desfavor do réu pela prática do crime de tráfico de drogas nos autos de n. 0019362-54.2015.8.11.0042, com trânsito em julgado em 07/10/2019, conforme executivo de pena n. 0035637-73.2018.8.11.0042 – SEEU, será valorada na segunda fase, como reincidência especifica, nos termos da Súmula 241 do STJ; Registre-se que a condenação oriunda dos autos n. 0001070-26.2012.8.11.0042 foi declarada a prescrição punitiva retroativa, ou seja, houve extinção dos efeitos da sentença condenatória, conforme decisão no executivo de pena do apenado; já a referente aos autos n. 1005672-91.2022.8.11.0042 por ser uma condenação provisória não serve como maus antecedentes ou reincidência. Acerca da conduta social e personalidade do agente, não há elementos e respaldo técnico apto a lastrear consideração em prejuízo do condenado. As demais circunstâncias judiciais (motivos, circunstâncias e consequências do crime e comportamento da vítima), são peculiares ao delito em comento e nada influenciou para prática do crime em apreço, por isso, DEIXO de pronunciar a respeito. Diante desses fatos, FIXO a pena-base em 05 (anos) anos de reclusão e em 500 (quinhentos) dias-multa. Segunda Fase: Nesta fase, não há circunstância atenuante a ser considerada. Por outro lado, pesa em desfavor do condenado a agravante da reincidência especifica, porquanto ostenta condenação definitiva pelo delito tipificado no art. 33 Lei n. 11.343/06 (autos de 0019362-54.2015.8.11.0042), com trânsito em julgado em 07/10/2019, conforme executivo de pena n. 0035637-73.2018.8.11.0042 - SEEU. Assim sendo, com fulcro no disposto pelo art. 63 do Código Penal, MAJORO a pena em 01 (um) ano e 100 (cem) dias-multa, para fixá-la nesta fase em 06 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. Terceira fase: Concernente ao redutor do §4º, do art. 33, da Lei n.º 11.343/06, o condenado não faz jus a essa benesse, visto que não é primário, não ostenta bons antecedentes e ainda, se dedica às atividades criminosas, ressaltando que já possui uma condenação definitiva pelo mesmo delito de tráfico de drogas (executivo de pena n. 0035637-73.2018.8.11.0042- SEEU). Neste sentido, é como se posiciona a Corte Superior: “(...) Em se tratando de réu reincidente, não é possível a aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas, ante o não preenchimento dos requisitos legais”. (Ap 80492/2014, DES. RUI RAMOS RIBEIRO, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 08/11/2016, Publicado no DJE 11/11/2016). “(...) “A reincidência, seja ela específica ou não, constitui óbice à aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, tendo em vista que um dos requisitos para a incidência do benefício é que o paciente seja primário.” (STJ, HC nº 393.862/DF) (...)” (N.U 0001827-15.2019.8.11.0029, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 01/12/2020, Publicado no DJE 03/12/2020) (negritei). Concluo, por fim, que a causa especial de redução de pena regulada no §4º, do art. 33, da Lei n. 11.343/2006, para fazer jus ao benefício, deve a ré satisfazer a todos os requisitos cumulativamente, isto é, ser primária, de bons antecedentes, não se dedicar às atividades criminosas nem integrar organização criminosa. Por essa razão e não vislumbrando causa de aumento de pena a ser considerada, TORNO A PENA CONCRETA E DEFINITIVA em desfavor de LUÍS FELIPE CAMPOS DE AMORIM LEITE, brasileiro, solteiro, comerciante, natural de Cuiabá/MT, nascido em 16/10/1992, CPF 025.391.321-70, filho de Claudionel de Campos de Leite e Dilma Pereira de Amorim Leite, residente na Rua Presidente Leite Figueiredo, nº. 542, bairro Dom Aquino, Cuiabá-MT - preso por outro processo na Penitenciária Central do Estado, no patamar de 06 (seis) anos de reclusão. Levado pelos mesmos critérios, APLICO a pena de multa em 600 (seiscentos) dias que atento ao art. 60, caput, do Código Penal e ponderando a situação socioeconômica do réu, fixo valor do dia-multa em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1052700/MG, referente ao tema 972 da repercussão geral, cuja publicação se deu em 01/02/2018, declarou a inconstitucionalidade do §1º, do art. 2º, da Lei n. 8.072/90, faço a fixação do regime inicial para cumprimento da pena de acordo com o disposto pelo art. 33 do Código Penal Brasileiro. Em observância aos critérios previstos no art. 59 c/c art. 33, §2º, alínea “b” e §3º, ambos do Código Penal e art. 42 da Lei de Drogas e ainda, considerando reincidência especifica, FIXO o regime prisional de início no FECHADO. Considerando que o condenado responde ao processo em liberdade, PERMITO-LHE aguardar também em liberdade o processo e julgamento de eventual recurso. DETERMINO a incineração das substâncias entorpecentes apreendidas, bem como a destruição do rolo de plástico filme, balança de precisão e dos saches. Ainda, como efeitos da condenação (CP, art. 91, inciso II, “b”, art. 243, parágrafo único da CF e art. 63 da Lei de Tóxico) e com fundamento no Tema 0647 - STF[1], DECRETO o perdimento em favor do Fundo Estadual sobre Drogas - FUNESD, da quantia de R$ 598,00 (quinhentos e noventa e oito reais), a ser creditada na conta do Banco do Brasil (001), agência: 3834-2, Conta Corrente: 1042841-0; CNPJ: 03.507.415/0028-64. Com relação aos três aparelhos celulares apreendidos, DECRETO o perdimento em favor em favor da União, posto que não comprovada a origem lícita e, ademais, claramente demonstrado serem oriundos de atos de tráfico ilícito de entorpecentes. Caso a União manifeste seu desinteresse, desde já, determino a destruição, a ser realizada pela Delegacia. Considerando que o condenado aguardará em liberdade o julgamento de eventual recurso, nos termos do art. 8ª da Resolução nº. 113/2010 do CNJ, DEIXO de determinar a expedição de Guia de Execução Provisória. Da sentença, intimem-se o Ministério Público e a Defesa, assim como do condenado pessoalmente, por encontrar-se preso por outro processo, nos termos do que dispõe o art. 392, inciso I, do Código de Processo Penal. Certificado o trânsito em julgado: 1) Proceda-se o recolhimento do valor atribuído a título de pena de multa em conformidade com os artigos 50 do CP e 686 do CPP; 2) Oficie-se ao Cartório Distribuidor Local; 3) Oficie-se ao Instituto de Identificação Estadual e Federal; 4) Oficie-se ao TRE/MT; 5) DETERMINO, primeiramente, a expedição de mandado de prisão e, só então, depois de seu cumprimento, deverá ser expedida a Guia de Execução Penal Definitiva, nos termos do art. 518 da CNGC e art. 675 e 105, respectivamente, do CPP e da LEP, encaminhando-a ao Juízo Competente; 6) Encaminhem-se as drogas apreendidas para fins de destruição, nos termos dos artigos 32, §1º e 72 da Lei n. 11.343/06. Nos termos do art. 804 do CPP, CONDENO o réu ao pagamento das custas e despesas processuais, não cobráveis no momento, na forma do art. 98, §3º, do Novo Código de Processo Civil. P.R.I.C. Cuiabá/MT, data e hora do sistema. Francisco Alexandre Ferreira Mendes Neto JUIZ DE DIREITO (documento assinado digitalmente) [1] “É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal.”
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