Processo nº 1018360-08.2022.8.11.0003
ID: 316762025
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1018360-08.2022.8.11.0003
Data de Disponibilização:
04/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GLEICIANE PEREIRA
OAB/MG XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1018360-08.2022.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Homicídio Qualificado, Crimes do Sistema Nacional de …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1018360-08.2022.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Homicídio Qualificado, Crimes do Sistema Nacional de Armas, Promoção, constituição, financiamento ou integração de Organização Criminosa] Relator: Des(a). MARCOS MACHADO Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). WESLEY SANCHEZ LACERDA, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI] Parte(s): [LUCAS SOARES DIAS - CPF: 055.476.851-86 (APELANTE), GLEICIANE PEREIRA - CPF: 095.389.366-98 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), MARCO AURELIO DA SILVA - CPF: 040.088.771-18 (VÍTIMA), GABRIEL VIEIRA DA COSTA - CPF: 073.431.441-89 (TERCEIRO INTERESSADO), MOACIR JUNIOR FERREIRA PIRES - CPF: 051.049.741-11 (TERCEIRO INTERESSADO), HENRIQUE AQUINO DOS SANTOS - CPF: 705.128.061-95 (TERCEIRO INTERESSADO), DOUGLAS VIEIRA DA COSTA - CPF: 707.757.181-57 (TERCEIRO INTERESSADO), BRUNO DE ARAUJO MARTINS - CPF: 072.529.701-83 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). WESLEY SANCHEZ LACERDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Homicídio qualificado [pelo motivo torpe e emboscada], organização criminosa armada e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido. Nulidade por ausência de laudo pericial e de fundamentação da decisão de pronúncia. Preclusão. Ofensa ao princípio da dialeticidade. Rejeitadas. Decisão manifestamente contrária às provas dos autos. Autoria e qualificadora da emboscada. Ação criminosa do apelante registrada por câmeras de segurança. Jurados optaram por uma das correntes de prova. Soberania dos veredictos. Ausência de quesito ou insurgência da defesa sobre o princípio da consunção [entre o homicídio e o porte ilegal de arma de fogo]. Preclusão. Condenações mantidas. Circunstâncias Judiciais. Disparos em via pública e uso de arma [homicídio] e circunstâncias do crime [porte ilegal de arma de fogo]. bis in idem. Circunstâncias do crime [homicídio], motivação e consequências [organização criminosa] não baseadas em elementos concretos. Inidoneidade. Reincidência. fração reajustada para um sexto. Recurso conhecido em parte. Provimento parcial. I. Caso em exame Apelação criminal interposta contra sentença do Tribunal do Júri que o condenou por homicídio qualificado (motivo torpe e emboscada), organização criminosa armada e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, visando a absolvição, submissão a novo julgamento ou a redução da pena. II. Questão em discussão Há seis questões: (1) nulidade da ação penal e/ou da decisão de pronúncia; (2) decisão dos jurados manifestamente contraria a prova dos autos; (3) ausência de provas da emboscada; (4) consunção entre o homicídio qualificado e o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido; (5) bis in idem na pena-base; (6) fração da reincidência desproporcional. III. Razões de decidir 1. A realização de perícia na mídia – vídeo com imagens da câmera de segurança – e nulidade da ação penal [pela ausência de laudo pericial e/ou fundamentação da decisão de pronúncia] não arguidas na resposta à acusação, ou alegações finais, tampouco nas razões do Recurso em Sentido Estrito ou na sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, mas apenas em suas razões de apelação, a evidenciar a preclusão da matéria; 2. Ausência de especificação de qual trecho do vídeo teria sido adulterado a justificar realização de exame pericial, tampouco qual conclusão da pronúncia não estaria fundamentada de modo a ofender o princípio da dialeticidade, pois não é possível inferir sob qual aspecto a pretensão se assentaria no presente caso; 3. A autoria e emboscada não estão sustentadas por reconhecimento fotográfico, mas tem suporte em vídeo captado por câmeras de segurança que registraram a ação criminosa, com proximidade e nitidez, corroborado por testemunhas em Juízo. 4. Os jurados optaram por uma das correntes de interpretação da prova, não se afigura decisão contrária à provas dos autos, a prevalecer a soberania do veredicto popular. 5. A consunção entre o homicídio qualificado [pelo motivo torpe e a emboscada] e o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido está preclusão por não ter sido objeto de quesitação aos jurados, tampouco de insurgência por parte da Defesa durante a sessão plenária. 6. A motivação utilizada para valorar as circunstâncias do crime não pode ser considerada, ao mesmo tempo, para justificar a culpabilidade, de modo a caracterizar bis in idem. 7. As circunstâncias judiciais não podem ser desvaloradas mediante fundamentação vaga, mas deve estar motivada em elementos concretos. 8. Aplicável a fração de um sexto pela agravante da reincidência. IV. Dispositivo e tese Recurso conhecido em parte e provido parcialmente. Teses de julgamento: 1. O mesmo fundamento concreto não pode servir para a negativar mais de uma circunstância por configurar bis in idem. 2. As circunstâncias judiciais não podem ser desvaloradas mediante fundamentação vaga, mas devem estar motivadas em elementos concretos. 3. A fração de um sexto por agravante é proporcional. Dispositivos relevantes citados: art. 121, § 2º, I, IV, c/c art. 29, ambos do CP, c/c art. 2º, § 2º, da Lei nº 12.850/2013, c/c art. 14, da Lei nº 10.823/2003; Jurisprudência relevante: STJ, HC nº 644.690/BA – Relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 26.4.2021; HC nº 24270/MG – relator Min. Paulo Galloti – 3.8.2009; AgRg no AREsp 916.829/SP – relator Min. Felix Fischer – 14.3.2018; HC 358.963/PR – relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 8.6.2017; AgRg no AREsp nº 723.537/ES – Relator Min. Jorge Mussi –15.6.2018; AgRg no REsp 1524253/RS – Relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 1º.5.2016; REsp nº 1388668/SP – relatora Minª. Laurita Vaz – 10.10.2013; REsp nº 1582632/SP – relator Min. Rogerio Schietti Cruz – 11.5.2017; AgRg no AREsp 1144831/MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, 24.4.2018; AgRg no REsp nº 2.827.133/SP – Relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 26.2.2025; AgRg no HC nº 921.713/ES, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, 25.9.2024; HC nº 845.042/MG, Rel.ª Min.ª Daniela Teixeira, Quinta Turma, 4.12.2024; AgRg no HC nº 933899/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, 17.9.2024; REsp 2.086.897/PR, Rel. Min. Daniela Teixeira, Quinta Turma, 25.2.2025; AgRg no AREsp 721441/PA – relator Min. Joel Ilan Paciornik – Quinta Turma – 14.10.2016; TJMT, AP 0001755-37.2009.8.11.0000 – Relator Des. Gilberto Giraldelli – 22.2.2023; AP 0035922-03.2017.8.11.0042 – relator Des. Paulo da Cunha – Primeira Câmara Criminal – 24.5.2021; AP 0002906-92.2019.8.11.0105 – relator Des. Gilberto Giraldelli – Terceira Câmara Criminal – 9.3.2023; HC 1001168-13.2018.8.11.0000 – Relator Des. Juvenal Pereira da Silva – 20.3.2018; AP 0001648-92.2006.8.11.0011 – relator Des. Rui Ramos Ribeiro – Primeira Câmara Criminal – 16.9.2014; Enunciado Criminal 13 e 49; AP 1001497-21.2020.8.11.0108 – Primeira Câmara Criminal – 25.10.2022; AP 0003068-21.2016.8.11.0064 – relator Des. Orlando Perri – Primeira Câmara Criminal – 17.7.2018; P 0010810-89.2016.8.11.0002 – Primeira Câmara Criminal – 30.11.2021; AP 0010785-76.2016.8.11.0002 – Primeira Câmara Criminal – 8.6.2021; AP 1001609-48.2021.8.11.0045 – Relator Des. Orlando de Almeida Perri – Primeira Câmara Criminal – 21.10.2022; AP 0009501-56.2018.8.11.0004 – Relator Des. Pedro Sakamoto – 15.10.2020; AP 0001139-63.2009.8.11.0042 – Relator Des. Luiz Ferreira da Silva – Terceira Câmara Criminal – 23.9.2024; Doutrina relevante: GUEDES. Clarissa Diniz, O Reconhecimento Criminal de Pessoa a Partir de Vídeo de Vigilância. Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Rio de Janeiro. Ano 16. Volume 23. Número 1. Janeiro a Abril de 2022; NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri, Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 398. R E L A T Ó R I O PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1018360-08.2022.8.11.0003 – COMARCA DE RONDONÓPOLIS APELANTE: LUCAS SOARES DIAS APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO R E L A T Ó R I O Apelação criminal interposta por LUCAS SOARES DIAS contra sentença condenatória proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis, decorrente de veredito do Tribunal do Júri, nos autos de ação penal (nº 1018360-08.2022.8.11.0003), que o condenou por homicídio qualificado [pelo motivo torpe e emboscada], organização criminosa armada e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, em concurso material, a 43 (quarenta e três) anos de reclusão e 110 (cento e dez) dias-multa, em regime inicial fechado– art. 121, § 2º, I, IV, c/c art. 29, ambos do CP, c/c art. 2º, § 2º, da Lei nº 12.850/2013, c/c art. 14, da Lei nº 10.823/2003 – (ID 273203032). O apelante suscita a nulidade: 1) da ação penal por ausência de “laudo pericial” da mídia contendo imagens da ação criminosa [captadas pela câmera de segurança da empresa Operário Modas]; b) da sessão de julgamento por “inexistência de fundamentação [...] para a decisão de pronúncia”. No mérito, sustenta que: 1) a decisão dos jurados seria manifestamente contraria a prova dos autos por estar “fundada em reconhecimento realizado exclusivamente por meio de vídeos e fotografias, sem observância das formalidades legais”; 2) a vítima [Marco Aurélio da Silva] estaria “armada e ciente do risco iminente, a descaracterizar a surpresa ou impedimento à sua reação”; 3) o “porte ilegal de arma de fogo” constitui “crime-meio” para o homicídio, a incidir o princípio da consunção; 4) a exasperação da pena-base de homicídio estaria motivada por “elementos próprios do tipo penal”, a configurar bis in idem; 5) o agravamento de “três anos” pela reincidência seria desproporcional. Pede provimento para que seja “absolvido” ou “anulada a decisão condenatória”, com submissão do apelante a novo julgamento. Subsidiariamente, “o afastamento da qualificadora da emboscada e a revisão da dosimetria da pena” (ID 273203038). A 6ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL DE RONDONÓPOLIS pugna pelo desprovimento do apelo (ID 273203040). A i. 3ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo desprovimento, em parecer assim sintetizado: “Recurso de Apelação – Crime de homicídio qualificado – Recurso defensivo – Preliminares – Nulidade do reconhecimento fotográfico – Inexistência – Prova da materialidade e indícios razoáveis da autoria delitiva – Nulidade por ausência de fundamentação – Inexistência – Provas dos autos estão em plena harmonia com a decisão proferida pelo Tribunal do Júri – Condenação deve ser mantida – Soberania dos veredictos do Conselho de Sentença – Mérito – Afastamento das qualificadoras – Inviabilidade – Dentre as versões verossímeis que formam o acervo probatório, os jurados reconheceram as qualificadoras do emboscada, vez que a vítima foi surpreendida por disparos de arma de fogo na rua, sem chance de reação - Redução da Dosimetria – Impossibilidade – A exasperação no patamar estabelecido pelo Juiz Presidente do Conselho de Sentença na primeira fase da dosimetria, ante o reconhecimento das circunstâncias judiciais da culpabilidade, afigura-se idôneas – Pelo conhecimento e desprovimento do recurso defensivo.” (Roberto Aparecido Turin, procurador de Justiça – ID 283266367) É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO (PRELIMINAR DE NULIDADE DA AÇÃO PENAL POR AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O apelante suscita a nulidade da ação penal por ausência de “laudo pericial” da mídia contendo imagens da ação criminosa [captadas pela câmera de segurança da empresa Operário Modas, localizada esquina da Rua Agostinho de Figueiredo com a Rua Costa e Silva, bairro Vila Mariana, em Rondonópolis/MT]. Ocorre que, na primeira fase do procedimento escalonado do Júri, a Defesa do apelante não requereu a realização de perícia nesse vídeo [com imagens do homicídio de Marco Aurélio da Silva, em 29.10.2021, por volta das 15h30min, em via pública, na rua Presidente Costa e Silva, bairro Vila Mariana, em Rondonópolis/MT – ID 273203025], seja na resposta à acusação (ID 153244355), seja em suas alegações finais (ID 153244383) ou nas razões do Recurso em Sentido Estrito (ID 182598347). Destaque-se que, em 13.6.2024, a Defesa foi intimada para “apresentar rol de testemunhas que irão depor em plenário [...], juntar documentos e requerer diligência – CPP, art. 422 –” (ID 273202978), mas não pugnou pela realização de perícia (ID 273202979) tampouco formulou registro na Ata Sessão de Julgamento pelo Tribunal do Júri (ID 273203032), tendo suscitado a suposta nulidade apenas em suas razões de apelação (ID 273203038), a evidenciar a preclusão da matéria (TJMT, AP 0001755-37.2009.8.11.0000 – Relator Des. Gilberto Giraldelli – 22.2.2023). No caso, o “atendimento ao pleito defensivo resultaria em implícita aceitação da chamada ‘nulidade de algibeira’ – aquela que, podendo ser sanada pela insurgência imediata da defesa após ciência do vício, não é alegada, como estratégia, numa perspectiva de melhor conveniência futura. Ressalta-se, a propósito, que tal atitude não encontra ressonância no sistema jurídico vigente, pautado no princípio da boa-fé processual, que exige lealdade de todos os agentes processuais” (STJ, HC nº 644.690/BA – relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 26.4.2021). No mesmo sentido: TJMT, AP 0035922-03.2017.8.11.0042 – relator Des. Paulo da Cunha – Primeira Câmara Criminal – 24.5.2021; AP 0002906-92.2019.8.11.0105 – relator Des. Gilberto Giraldelli – Terceira Câmara Criminal – 9.3.2023). Noutro giro, o apelante sequer especificou qual trecho do vídeo teria sido adulterado a justificar realização de exame pericial, de modo a “ofender o princípio da dialeticidade, pois não é possível inferir sob qual aspecto a pretensão se assentaria no presente caso” (TJMT, HC 1001168-13.2018.8.11.0000 – Relator Des. Juvenal Pereira da Silva – 20.3.2018). Sendo assim, não se verifica nulidade alguma. Com essas considerações, REJEITA-SE a preliminar. VOTO (PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO DE PRONÚNCIA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMETAÇÃO) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O apelante suscita a nulidade da pronúncia por ausência de fundamentação. Esse argumento não foi deduzido nas razões do Recurso em Sentido Estrito nº 1018360-08.2022.8.11.0003 (ID 182598347), oportunidade na qual a Defesa limitou-se a despronúncia ou aplicação do princípio da consunção entre o homicídio qualificado e o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido. Com efeito, as nulidades constantes da pronúncia devem ser arguidas no momento processual oportuno e por meio do recurso próprio, sob pena de preclusão (STJ, HC nº 24270/MG – relator Min. Paulo Galloti – 3.8.2009; AgRg no AREsp 916.829/SP – relator Min. Felix Fischer – 14.3.2018; HC 358.963/PR – relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 8.6.2017). O v. acórdão transitou em julgado em 21.5.2024 (ID 216427162). Nesse quadro, não se reconhece a nulidade suscitada. Adota-se aresto desta e. Câmara: “A alegação de nulidade da decisão de pronúncia por falta de fundamentação [...] deve ser analisada antes da decisão condenatória pelo Tribunal do Júri, sob pena de preclusão da matéria. Ademais, ressalta-se que nas razões do Recurso em Sentido Estrito, momento processual adequado para análise do pretextado, não houve qualquer alegação de nulidade” (AP N.U 0001648-92.2006.8.11.0011 – relator Des. Rui Ramos Ribeiro – Primeira Câmara Criminal – 16.9.2014) Com essas considerações, REJEITA-SE a preliminar. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O recurso é cabível (CPP, art. 593, III, “d”), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107). Consta da denúncia que: “1º FATO [...] no dia 29/10/2021, por volta das 15h30min, em via pública, na Rua Presidente Costa e Silva, nº 1219, Bairro Vila Mariana, nesta cidade e Comarca de Rondonópolis/MT, a vítima MARCO AURÉLIO DA SILVA, vulgo ‘LERINHO’, fora vítima de diversos disparos de arma de fogo, causando-lhe ferimentos que foram a causa eficiente de sua morte. Apurou-se que os denunciados Gabriel Vieira da Costa, Lucas Soares Dias, Moacir Júnior Ferreira Pires, Bruno de Araújo Martins, Henrique Aquino dos Santos e Douglas Vieira da Costa, acima qualificados, agindo com nítida vontade assassina (animus necandi), concorreram para o crime praticado em face da vítima. [...] 2º FATO [...] na data de 04/01/2021, os denunciados GABRIEL VIEIRA COSTA, LUCAS SOARES DIAS, MOACIR JÚNIOR FERREIRA PIRES, BRUNO DE ARAÚJO MARTINS, HENRIQUE AQUINO DOS SANTOS E DOUGLAS VIEIRA DA COSTA, portaram e transportaram arma de fogo, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. [...] 3º FATO [...] em data e horário não precisados, porém, até o dia 29/10/2021, nesta cidade e comarca de Rondonópolis, os denunciados GABRIEL VIEIRA COSTA, LUCAS SOARES DIAS, MOACIR JÚNIOR FERREIRA PIRES, BRUNO DE ARAÚJO MARTINS, HENRIQUE AQUINO DOS SANTOS E DOUGLAS VIEIRA DA COSTA integraram e promoveram pessoalmente organização criminosa armada autodenominada ‘Comando Vermelho’. [...] Diante do exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO denuncia GABRIEL VIEIRA COSTA, LUCAS SOARES DIAS, MOACIR JÚNIOR FERREIRA PIRES, BRUNO DE ARAÚJO MARTINS, HENRIQUE AQUINO DOS SANTOS E DOUGLAS VIEIRA DA COSTA, como incursos no crime tipificado no artigo 121, §2º, incisos I (motivo torpe) e IV (emboscada), nos moldes do art. 29 do Código Penal, art. 14 da Lei nº 10.826/03 e art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/13, nos moldes do art. 69 do Código Penal, com implicações da Lei nº 8.072/90 [...]” (Marcelo Domingos Mansour, promotor de Justiça – ID 153243683). O processo fora desmembrado em relação ao recorrente LUCAS SOARES DIAS por não ter comparecido em Juízo, embora intimado (ID 91387265). Os jurados responderam aos seguintes quesitos: “Série 1. Homicídio. 1) No dia 29 de outubro de 2021, por volta das 15h30min, em via pública, na Rua Presidente Costa e Silva, nº 1219, Bairro Vila Mariana, nesta cidade de Rondonópolis/MT, a vítima Marco Aurélio da Silva sofreu os ferimentos proveniente de disparo de arma de fogo - conforme laudo? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO 2) Lucas Soares Dias quem concorreu para os disparos de arma de fogo? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO 3) Os jurados absolvem o réu? ( 0 ) SIM ( 4 ) NÃO 4) O crime foi praticado em motivo torpe, uma vez que a vítima integrava a facção criminosa denominada ‘Comando Vermelho’ e teria desviado valores, motivo pelo qual foi punido com pena de morte? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO 5) O crime foi cometido com meio de emboscada, vez que ocorreu uma tocaia, com o fito de matar a vítima? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO Série 2. Porte Ilegal de arma de fogo 1) No dia 29 de outubro de 2021, por volta das 15h30min, em via pública, na Rua Presidente Costa Silva, nº 1219, Bairro Vila Mariana, nesta cidade de Rondonópolis/MT, portou-se arma de fogo de forma ilegal? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO 2) Lucas Soares Dias quem portou arma de fogo em desacordo legal? ( 4 ) SIM ( 1 ) NÃO 3) Os jurados absolvem o réu? ( 1 ) SIM ( 4 ) NÃO Série 3. Organização Criminosa 1) No dia 29 de outubro de 2021, por volta das 15h30min, em via pública, na Rua Presidente Costa e Silva, nº 1219, Bairro Vila Mariana, nesta cidade de Rondonópolis/MT, integrou-se e promovesse pessoalmente organização criminosa autodenominada ‘Comando Vermelho’? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO 2) Lucas Soares Dias quem integrou e promoveu pessoalmente organização criminosa autodenominada ‘Comando Vermelho’? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO 3) Os jurados absolvem o réu? ( 0 ) SIM ( 4 ) NÃO 4) A organização criminosa se empregava arma de fogo? ( 4 ) SIM ( 0 ) NÃO” (ID 273203032-fls.19/20) O Juiz-Presidente dosou as penas nos seguintes termos: “Assim, obediente à soberana decisão do Colendo Conselho de Sentença, hei por bem, JULGAR PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para CONDENAR LUCAS SOARES DIAS pela prática dos delitos tipificados nos art. 121, §2º, I e IV do Código Penal, art. 14 da Lei nº 10.826/2003 e art. 2º, §2º, da Lei nº 12.850/13, em concurso material. 4. Dosimetria. 4.1. Homicídio. [...] O motivo torpe qualificará o delito. a) primeira fase (pena-base, circunstâncias judiciais do art. 59, CP): A culpabilidade, conforme a doutrina e jurisprudência, consiste no grau de reprovação do delito praticado pelo acusado. Neste sentir, vislumbro maior reprovação, pois se trata de crime cometido com uso de arma de fogo, instrumento que deveria ser usado tão somente para defesa pessoal, justificando o incremento da pena, aumento em 02 (dois) anos a pena. O crime foi perpetrado em concurso de pessoas, o que merece maior reprimenda, diante da facilitação de sua consumação em decorrência do conluio criminoso. Neste sentido STJ - AgRg no REsp: 1960385 MT 2021/0295524-6, Relator: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, que prescreve que: (...) 2. O fato de o delito ter sido praticado em concurso de agentes demonstra uma maior reprovabilidade da conduta, justificando a exasperação da reprimenda basilar.(...). Acrescento, portanto, mais 02 anos de reclusão à pena-base. Também, justifica o incremento da pena em razão da premeditação que se afigura em circunstância idônea pra a aumentar a pena-base, diante da intensa culpabilidade do agente. Ademais, conforme o julgado do Superior Tribunal de Justiça HC n. 413.618/AP, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 3/9/2018, o crime cometido com a premeditação deve ter maior reprovabilidade. Neste ponto, é inegável que o réu, conforme das provas dos autos, junto com outros agentes combinaram a prática delitiva com a divisão hierarquizada das tarefas. Assim, com o planejamento do delito, deve ser aumentada a pena em 02 (dois) anos. O réu possui anotações criminais antecedentes, mas não será considerado como maus antecedentes, mais sim reincidência. Quanto aos elementos de conduta social e personalidade, nada foi apurado neste sentido. No que tange as circunstâncias do crime, trata-se do “modus operandi”, devendo ser levado em consideração o modo de execução que já qualificou o presente delito (emboscada), bem como o local, no caso, via pública, colocando em risco transeuntes [...]. Portanto, alavancada pela reprovabilidade, aumento em 02(dois) anos a pena. Quanto ao motivo qualificou o delito e não será levado em conta nas circunstancias judiciais para evitar o bis in idem. O delito deixou consequências. São as mais desastrosas para a sociedade, em especial para o vigoroso e vertiginoso aumento dos crimes violentos, em especial o narco-homicídio). Neste especial, temos que, segundo levantamento realizado pela Polícia Militar de Mato Grosso, 4° Comando Regional, no ano de 2022 foram promovidos 58 (cinquenta e oito) homicídios nesta urbe e, destes, 27 (vinte e sete) foram praticados com indícios de autoria por integrantes do Comando Vermelho. Já no ano de 2023, somente nos primeiros 04 (quatro) meses, foram registrados 12 (doze) homicídios, sendo 06 (seis) destes com indícios de ser praticado por integrantes do “Comando Vermelho”, razão pelo qual exaspero a pena em 02 (dois) anos. Entendo que a vítima nada contribuiu para o crime. Desta forma, fixo a pena-base em 22 (vinte e dois) anos de reclusão. b) segunda fase (atenuantes e agravantes): Não há atenuantes. Desloco a qualificadora de emboscada, para agravar a pena, nos termos do art. 61, II, ‘c’, do CP. Agravo a pena em 04 (quatro) anos de reclusão. Neste sentir, colaciono o entendimento jurisprudencial: Havendo pluralidades de qualificadoras, necessário se faz o reconhecimento de uma para qualificar o crime e as demais para agravar a pena, se previsto em lei, conforme entendimento jurisprudencial STJ (AgRg no REsp n. 1.644.423/MG, relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 7/3/2017, Dje 17/3/2017). Presente a agravante de reincidência, art. 61, I do CP, tendo condenação na ação penal nº. 0013803-45.2018.8.11.0064, que tramitou na Segunda Vara desta Comarca, em que foi condenado à pena de 3 (três) anos de reclusão, pelo crime de porte ilegal de arma de fogo (art. 14, da Lei 10426/03) cometido em 01/10/2018, com trânsito em julgado em 30/01/2019. Entretanto, entendo que o acréscimo não pode superar a pena outrora fixada, sob pena de violar o princípio da proporcionalidade, razão pelo qual agravo a pena em 03 (três) anos. Fixo a pena-intermediária em 29 (vinte e nove) anos de reclusão. c) terceira fase (diminuição e aumento da pena): Não há causas especiais de aumento ou diminuição. Fixo a pena final em 29 (vinte e nove) anos de reclusão. 4.2. Dosimetria do porte ilegal de arma de fogo de uso permitido [...]. a) primeira fase (pena-base, circunstâncias judiciais do art. 59, CP): A culpabilidade, normal ao tipo. O réu não possui maus antecedentes criminais. Sobre a conduta social, não há nada neste sentido nos autos. Quanto à personalidade não há elementos para que possa ser melhor aferida. No que tange as circunstâncias do crime extrapola o tipo penal, vez que a arma foi utilizada para integrar organização criminosa, bem como atentar contra a vida. Majoro a pena em 06 (seis) mês e 10 dias-multa. O motivo não foi identificado. O delito deixou consequências inerentes ao tipo penal. Entendo que a vítima nada contribuiu para o crime. Desta forma, fixo a pena-base do condenado em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, 30 (trinta) dias-multa. b) segunda fase (atenuantes e agravantes): Não há atenuantes. Presente a agravante de reincidência, art. 61, I do CP, tendo condenação na ação penal nº. 0013803-45.2018.8.11.0064, que tramitou na Segunda Vara desta Comarca, em que foi condenado à pena de 3 (três) anos de reclusão, pelo crime de porte ilegal de arma de fogo (art. 14, da Lei 10426/03) cometido em 01/10/2018, com trânsito em julgado em 30/01/2019, razão pelo qual agravo a pena em 01 (um) ano e 20 (vinte) dias-multa. Desta forma, fixo a pena-base do condenado em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, 50 (cinquenta) dias-multa. c) terceira fase (diminuição e aumento da pena): Não há causas especiais de aumento ou diminuição. Fixo a pena-final em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão, 50 (cinquenta) dias-multa, correspondente a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato. 4.3. Dosimetria do crime de organização criminosa [...]. a) primeira fase (pena-base, circunstâncias judiciais do art. 59, CP): A culpabilidade é normal do tipo. O réu possui anotações criminais antecedentes, mas não será considerado como maus antecedentes, mais sim reincidência. Conduta social e a personalidade não há elementos nos autos para que possam ser aferidos. No que tange as circunstâncias do crime, nada a valorar. Os motivos estão associados à vários fatores, como ganho de poder e respeito perante a organização criminosa, razão pelo qual somo à pena-base em 01 (um) ano e 10 (dez) dias-multas. O delito deixou consequências. São as mais desastrosas para a sociedade, em especial para o vigoroso e vertiginoso aumento dos crimes violentos, em especial o narco-homicídio, razão pelo qual exaspero a pena em 01 (um) ano e 10 (dez) dias-multas. A vítima é a sociedade, que em nada contribuiu para a conduta criminosa. Desta forma, fixo a pena-base do condenado em 05 (cinco) anos meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multas. b) segunda fase (atenuantes e agravantes): Presente a agravante de reincidência, art. 61, I do CP, tendo condenação na ação penal nº. 0013803-45.2018.8.11.0064, que tramitou na Segunda vara desta Comarcam, em que foi condenado à pena de 3 (três) anos de reclusão, pelo crime de porte ilegal de arma de fogo (art. 14, da Lei 10426/03) cometido em 01/10/2018, com trânsito em julgado em 30/01/2019, por isso agravo a pena em 2 (dois) anos e 20 (vinte) dias-multas. Alcanço a pena intermediária em 07 (sete) anos de reclusão e 40 (quarenta) dias-multas. c) terceira fase (diminuição e aumento da pena): Não há causa de diminuição. Presente a causa de aumento. Lei de Organização Criminosa. Art. 2º. § 2º As penas aumentam-se até a metade se na atuação da organização criminosa houver emprego de arma de fogo. Em se tratando de organização criminosa armada, aumento a pena em metade, diante da dimensão da Organização Criminosa apontada, fixo a pena-final pelo crime de organização criminosa em 10 (dez) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 60 (sessenta) dias-multas. 4.1.3. Do concurso material: Nos moldes do art. 69, do Código Penal, deve haver a soma das penas, ou seja, resultando: 43 (quarenta e três) anos de reclusão, 110 (cento e dez) dias-multas, dias multa no valor de 1/30 do valor do salário-mínimo vigente à época dos fatos. 4.1.4. Regime inicial da pena. Conforme preceitua o art. 33, § 2º, “a”, do Código Penal, o regime inicial é o fechado, posto que a pena é superior a 08 (oito) anos.” (Leonardo de Araujo Costa Tumiati, juiz de Direito – ID 273203031) Pois bem. A materialidade delitiva do homicídio está comprovada pelos Boletins de Ocorrência nº 2021.283648 e nº 2021.283488 (ID 153243673-fls.3/5), Relatórios de Investigação nº 2021.13.26273-2ºDP/DHPP/RONDONÓPOLIS (ID 153243673-fls.9/12, 24/45), Relatório de Investigação nº 2021.13.36845-2ºDP/DHPP/RONDONÓPOLIS (ID 153243674-fls.34/76), Certidão de Óbito nº 065292 01 55 2021 4 00088 113 0018801 05 (ID 153243673-fls.55), Laudo Pericial de Confronto Balístico nº 200.2.03.2021.012630-01 (ID 153243673-fls.70/74), Boletim Necropapiloscópico nº 321/2021 (ID 153243675-fls.8/10) e Laudo de Necróposia nº 200.1.01.2021.029786-01 (ID 273203023), os quais não sofreram qualquer impugnação. Na fase policial, realizaram-se as oitivas de Welington Mauricio de Castro (ID 153243673-fls.14/15), Maria José de Souza, mãe da vítima (ID 153243673-fls.19/20; ID 153243675-fls.1/2), Edmilson Fernandes dos Santos, policial militar (ID 153243673-fls.22/23), Jheinifer Rodrigues Pessoa, companheira da vítima (ID 153243673-fls.52/53), Welington Mauricio de Castro (fls. 26/27), Lindomar Silveira Aquino (ID 153243673-fls.60/61), Wescley Roberto dos Santos, testemunha (ID 153243674-fls.26), Luiz Inácio Brandão (ID 153243674-fls.28/29) e Roney Marques Castro, testemunhas (ID 153243674-fls.31/32), Luzia Dias da Silva, tia do recorrente (ID 153243675-fls.3/4), Fábio de Souza Silva, irmão da vítima (ID 153243675-fls.5/6), e interrogados os corréus Bruno de Araújo Martins (ID 153243673-fls.84/86), Renato Rufino da Silva (ID 153243673-fls.87/88), Moacir Junior Ferreira Pires (ID 153243673-fls.89/90; ID 153243674-fls.1). Em Juízo, colheram-se os depoimentos da delegada de polícia Karla Cristina Peixoto Ferraz; dos policiais militares Tony Jackson de Alcântara e Edmilson Fernandes dos Santos; dos investigadores de Polícia, Claudionor Messias Rodrigues e João Batista Inocêncio Soares; do irmão da vítima, Fábio Souza Silva; da companheira da vítima, Jheinifer Rodrigues Pessoa, bem como os interrogatórios dos corréus Moacir Junior Ferreira Pires, Henrique Aquino dos Santos, Bruno de Araújo Martins. O recorrente LUCAS SOARES DIAS permaneceu em silêncio (relatórios de mídias – ID 153244261; ID 153244262; ID 153244319; ID 153244327; ID 153244367). Na sessão plenária, foram inquiridos Karla Cristina Peixoto Ferraz, Wescley Roberto dos Santos e o apelante (relatório de mídias – ID 273203033). Dito isso, vejamos. Verifica-se que o Conselho de Sentença reconheceu que [“no dia 29 de outubro de 2021, por volta das 15h30min, em via pública, na Rua Presidente Costa e Silva, nº 1219, Bairro Vila Mariana, nesta cidade de Rondonópolis/MT”] Marco Aurélio da Silva “sofreu ferimentos [...] de disparos de arma de fogo” (Série 1 – Primeiro Quesito – materialidade); o apelante “concorreu para os disparos” (Série 1 – Segundo Quesito – autoria) e não o absolveram (Série 1 – Terceiro Quesito – Genérico), tendo considerado a motivação torpe – a vítima “integrava a facção criminosa denominada ‘Comando Vermelho’ e teria desviado valores, motivo pelo qual foi punido com pena de morte” – (Série 1 – Quarto Quesito), bem como o “crime foi cometido com meio de emboscada, vez que ocorreu uma tocaia, com o fito de matar a vítima” (Série 1 – Quinto Quesito). A autoria e a emboscada tem suporte em vídeo captado por câmeras de segurança [da empresa Operária Modas – localizada na esquina da Rua Agostinho de Figueiredo com a Rua Presidente Costa e Silva, Vila Mariana, em Rondonópolis/MT – ID 273203025] que registraram a ação criminosa, com muita proximidade e nitidez, inclusive o apelante [LUCAS SOARES DIAS] correndo “a pé”, segurando uma arma de fogo na mão direita, com o rosto totalmente a mostra e efetuando disparos de arma de fogo na vítima (mídia – ID 273203025). Frise-se que, em Juízo, a delegada de Polícia Karla Cristina Peixoto Ferraz, responsável pelas investigações, asseverou que o homicídio foi gravado [por câmeras de segurança] e que “as imagens são claras, pois ele não usou nenhum artifício para tentar esconder sua identidade e foi identificado como sendo o LUCAS SOARES, conhecido como ‘Luquinha’” (relatório de mídias – ID 153244261). Essa narrativa está corroborada pelos depoimentos prestados, em Juízo, pelos investigadores de polícia Roberto Rogério dos Santos, João Batista Inocêncio Soares e Claudionor Messias Rodrigues, os quais confirmaram a identificação do apelante LUCAS SOARES DIAS como sendo um dos executores do crime (relatório de mídias – ID 153244261). O “reconhecimento por vídeo de vigilância possui peculiaridades que o fazem distinto do procedimento previsto para o reconhecimento presencial de pessoa, sendo inaplicáveis as mínimas garantias epistemológicas estabelecidas nos arts. 226 a 228 do CPP” (GUEDES. Clarissa Diniz, O Reconhecimento Criminal de Pessoa a Partir de Vídeo de Vigilância. Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Rio de Janeiro. Ano 16. Volume 23. Número 1. Janeiro a Abril de 2022). No caso, identifica-se que os jurados optaram por uma das correntes de interpretação da prova (NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri, Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 398). Se condenação está inserida numa das possíveis vertentes da prova, a soberania do veredicto popular deve prevalecer (TJMT, AP 1001497-21.2020.8.11.0108 – Primeira Câmara Criminal – 25.10.2022). Com efeito, o “Conselho de Sentença não optou pela versão trazida pela defesa, tendo acolhido tudo o que foi sustentado pelo Ministério Público, em plenário, cuja versão está [...] fundamentada na prova dos autos”, conforme bem pontuado pelo órgão ministerial, em suas contrarrazões (Ludmilla Evelin de Farias Santana Cardoso, promotora de Justiça – ID 273203040). Destaque-se que não se configura “como manifestamente contrária à prova dos autos a decisão que, optando por uma das versões trazidas a plenário do Tribunal do Júri, não se encontra inteiramente divorciada do conjunto fático-probatório existente no processo” (TJMT, Enunciado Criminal 13). Adota-se premissa do c. STJ: “No procedimento relativo aos crimes contra a vida, ao órgão recursal se permite apenas a realização de um juízo de constatação acerca da existência de suporte probatório para a decisão tomada pelos jurados integrantes do Tribunal do Júri, somente se admitindo a cassação do veredicto caso este seja flagrantemente desprovido de elementos mínimos de prova capazes de sustentá-lo”. (AgRg no AREsp nº 723.537/ES – Relator Min. Jorge Mussi –15.6.2018) No tocante ao princípio da consunção entre o homicídio qualificado [pelo motivo torpe e a emboscada] e o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, verifica-se não ter sido objeto de quesitação aos jurados, tampouco de insurgência por parte da Defesa durante a sessão plenária. Se não houve irresignação “quanto à ausência do quesito atinente à consunção de crimes, não pode o Tribunal ad quem reconhecê-la em sede de apelação, sob pena de ofensa ao princípio da soberania dos vereditos, bem como em razão da ocorrência da preclusão da matéria” (TJMT, AP 0003068-21.2016.8.11.0064 – relator Des. Orlando Perri – Primeira Câmara Criminal – 17.7.2018). No mesmo sentido: STJ, AgRg no REsp 1524253/RS – Relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 1º.5.2016; REsp nº 1388668/SP – relatora Minª. Laurita Vaz – 10.10.2013. Nesse quadro, os pleitos de absolvição, submissão a novo julgamento ou afastamento da qualificadora da embosca afiguram-se improcedentes. Passa-se à revisão da dosimetria. Do homicídio qualificado [pelo motivo torpe e emboscada]: Na primeira fase, o Juiz-Presidente utilizou o motivo torpe para qualificar o homicídio e fixou a pena-base 22 (vinte e dois) anos de reclusão [10 (dez) anos acima do mínimo legal] ao valorar a culpabilidade [“crime cometido com uso de arma de fogo”, “concurso de pessoas” e “premeditação”], as circunstâncias [“disparos foram efetuados em via publica, colocando em risco os transeuntes”] e consequências do crime [“vigoroso e vertiginoso aumento dos crimes violentos, em especial o narco-homicídio”]. A premeditação e o concurso de pessoas extrapolam o tipo penal e constituem fundamentos idôneos para majoração da pena-base em decorrência da maior culpabilidade da ação delituosa (TJMT, Enunciado Criminal 49; AP 0010810-89.2016.8.11.0002 – Primeira Câmara Criminal – 30.11.2021; AP 0010785-76.2016.8.11.0002 – Primeira Câmara Criminal – 8.6.2021; AP 1001609-48.2021.8.11.0045 – Relator Des. Orlando de Almeida Perri – Primeira Câmara Criminal – 21.10.2022; AP 0009501-56.2018.8.11.0004 – Relator Des. Pedro Sakamoto – 15.10.2020; AP 0001139-63.2009.8.11.0042 – Relator Des. Luiz Ferreira da Silva – Terceira Câmara Criminal – 23.9.2024). Outrossim, “a prática do delito em local público e na presença de diversas pessoas são elementos que, analisados em conjunto, fundamentam a valoração desfavorável” (STJ, REsp nº 1582632/SP – relator Min. Rogerio Schietti Cruz – 11.5.2017) das circunstâncias do crime. Todavia, a motivação utilizada para valorar as circunstâncias do crime [“disparos foram efetuados em via publica, colocando em risco os transeuntes”], não pode ser considerada, ao mesmo tempo, para justificar a culpabilidade [“crime cometido com uso de arma de fogo”], de modo a caracterizar bis in idem. O c. STJ possui entendimento de que “o mesmo fundamento concreto não pode servir para a valoração negativa de mais de uma circunstância” sob pena de bis in idem” (AgRg no AREsp 1144831/MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Sexta Turma, 24.4.2018). Em sua vez, as consequências do crime, utilizadas pelo juiz da causa para exasperar a pena basilar [“aumento dos crimes violentos”, em Rondonópolis/MT, “no ano de 2022 (...) 58 – cinquenta e oito – homicídios e (...) no ano de 2023 (...) 12 – doze –”], não estão diretamente relacionados ao homicídio de Marco Aurélio da Silva [“no dia 29 de outubro de 2021, por volta das 15h30min, em via pública, na Rua Presidente Costa e Silva, nº 1219, Bairro Vila Mariana, nesta cidade de Rondonópolis/MT”], afigurando-se inidônea. Sobre o patamar de aumento, o c. STJ considera razoável a fração adotada pelo Juiz-Presidente – 1/6 (um sexto) sobre a pena mínima, equivalente a 2 (dois) anos por circunstância judicial desfavorável – (AgRg no REsp nº 2.827.133/SP – Relator Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 26.2.2025). Assim sendo, redimensiona-se a pena basilar para 18 (dezoito) anos de reclusão. Na segunda fase, não há atenuantes. O Juiz-Presidente reconheceu as agravantes da reincidência e da emboscada (CP, art. 61, I e II, ‘c’) e elevou a pena para 29 (vinte e nove) anos de reclusão [equivalente à 1/3 (um terço) por agravante]. De fato, o apelante registra condenação definitiva por porte ilegal de arma de fogo, cometido em 1.10.2018 e julgado em 30.1.2019 (Ação Penal 0013803-45.2018.8.11.0064 – SEEU 0002708-81.2019.8.11.0064), apta a configurar a reincidência (CP, art. 61, I). A existência de 2 (duas) qualificadoras reconhecidas pelos jurados [motivo torpe e emboscada] permite que uma delas [torpeza] seja utilizada na primeira fase para elevação da pena-base e a outra [emboscada] como agravantes genéricas (STJ, AgRg no HC nº 921.713/ES, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, 25.9.2024; HC nº 845.042/MG, Rel.ª Min.ª Daniela Teixeira, Quinta Turma, 4.12.2024). Ocorre que o c. STJ firmou entendimento de que a fração de 1/6 (um sexto) deve ser aplicada para cada agravante (STJ, AgRg no HC nº 933899/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, 17.9.2024; REsp 2.086.897/PR, Rel. Min. Daniela Teixeira, Quinta Turma, 25.2.2025). Consequentemente, a pena provisória deve ser readequada a 24 (vinte e quatro) anos de reclusão. Na terceira fase, inexistem causas de aumento ou diminuição, de modo que a pena intermediária [24 (vinte e quatro) anos de reclusão] torna-se em definitiva. Da organização criminosa armada: Na primeira fase, o Juiz-Presidente fixou a pena-base em 5 (cinco) anos de reclusão e 30 (trinta) dias-multa ao valorar os motivos [“ganho de poder”] e as consequências do crime [“vigoroso e vertiginoso aumento dos crimes violentos, em especial o narco-homicídio”], na fração de 1/3 (um terço) para cada. Ocorre que essas circunstâncias judiciais [motivação e consequências do crime] “não pode ser desvaloradas mediante fundamentação vaga” [“ganho de poder” e “aumento de crimes violentos”], mas deve estar motivada em “elementos concretos” (STJ, AgRg no AREsp 721441/PA – relator Min. Joel Ilan Paciornik – Quinta Turma – 14.10.2016). Assim sendo, redimensiona-se a pena-base ao mínimo legal [3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa] Na segunda fase, reconheceu a agravante da reincidência e elevou a pena em 2/5 (dois quintos) pela reincidência (CP, art. 61, I). Por idênticas razões à fundamentação lançada na segunda fase da dosimetria de homicídio qualificado, aplicável a fração à 1/6 (um sexto), de modo a redimensionar a pena intermediária a 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Na terceira fase, mantém-se a majorante do emprego de arma de fogo (Lei nº 12.850/2013, Art. 2º, § 2º), na fração legal [½ – metade –] e readéqua-se a pena definitiva a 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa, por inexistirem causas de diminuição. Do porte ilegal de arma de fogo de uso permitido: Na primeira fase, a pena-base fora fixada em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, ao considerar as circunstâncias do crime [“a arma foi utilizada para integrar organização criminosa, bem como para” o homicídio]. Porém, essas circunstâncias foram valoradas na primeira fase da dosimetria do homicídio e na segunda fase da organização criminosa, a caracterizar bis in idem, de modo que a pena basilar deve redimensionada ao mínimo legal [2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa] Na segunda fase, não há agravantes. O juiz da causa agravou em 1 (um) ano de reclusão e 20 (vinte) dias-multa [equivalente à aproximadamente ¼ – um quarto –] pela reincidência (CP, art. 61, I). Adota-se a mesma motivação constante da segunda fase da dosimetria de homicídio qualificado para agravar a pena na fração de 1/6 (um sexto) – pela reincidência –, de modo a redimensionar a pena provisória a 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Na terceira fase, conserva-se a pena definitiva em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, por inexistirem causas de aumento ou diminuição. Por força do concurso material (CP, art. 69) entre o homicídio qualificado [pelo motivo torpe e emboscada], a organização criminosa armada e a posse irregular de arma de fogo de uso permitido, totaliza-se a pena definitiva do apelante LUCAS SOARES DIAS em 31 (trinta e um) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 27 (vinte e sete) dias-multa. Quanto ao regime, a pena imposta – superior a 8 (oito) anos – e a reincidência autorizam o inicial fechado (CP, art. 33, § 2º, ‘a’). Com essas considerações, recurso conhecido em parte e PROVIDO PARCIALMENTE para readequar a pena do apelante a 31 (trinta e um) anos e 7 (sete) meses de reclusão e 27 (vinte e sete) dias-multa., mantido o regime inicial fechado. Por efeito, COMUNIQUE-SE ao Juízo da Execução Penal de Rondonópolis para readequação do cálculo da pena imposta ao apelante [SEEU 0002708-81.2019.8.11.0064]. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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