Processo nº 0001109-06.2024.8.13.0508
ID: 322551037
Tribunal: TJMG
Órgão: Vara Única da Comarca de Piranga
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0001109-06.2024.8.13.0508
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CAMILO PRATES
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Piranga / Vara Única da Comarca de Piranga Rua Santa Efigênia, 0, Piranga - MG - CEP: 36480-000 PROCESSO Nº: 000110…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Piranga / Vara Única da Comarca de Piranga Rua Santa Efigênia, 0, Piranga - MG - CEP: 36480-000 PROCESSO Nº: 0001109-06.2024.8.13.0508 CLASSE: [CRIMINAL] AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) ASSUNTO: [Crime de Descumprimento de Medida Protetiva de Urgência] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: MARIO JOSE FANTICELE CPF: 070.196.077-99 SENTENÇA I. RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS por seu representante legal, no uso das suas atribuições legais, ofereceu denúncia em desfavor de MARIO JOSÉ FANTICELE, brasileiro, divorciado, taxista, nascido aos 26/08/1970, em Nova Venecia-ES, filho de Rita Marcheti Fanticele e Alcides Fanticele, inscrito no RG sob o nº 1304503, com endereço à Rua Sargento Santana, nº 871, Vila do Carmo, Piranga/MG, dando-o como incurso nas sanções previstas no art. 24-A da Lei 11.340/06 em face de Edma da Conceição Gonçalves e art. 147 do Código Penal em face de José Pedro de Sena, na forma do art. 69 do Código Penal. Narrou a peça acusatória que: Noticiam os autos que, no dia 12 de julho de 2024, por volta das 10:30hrs, na Rua Guarapiranga, n° 59, Centro, Município de Piranga/MG, 0 denunciado, com consciência e vontade para a prática do ilícito, descumpriu decisão judicial que deferiu medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha em favor da sua ex-companheira Edma da Conceição Gonçalves. Foi apurado que o denunciado ostentava contra si medidas protetivas da Lei Maria da Penha em razão de comportamento agressivo com sua ex-companheira, sendo que, dentre as medidas, constava a proibição de se aproximar da requerente no limite máximo de 500 (quinhentos) metros, bem como proibição de se aproximar da residência da vítima. Consta nos autos que, no dia e local acima descritos, a vítima compareceu a Delegacia de Polícia dizendo que o denunciado passa com frequência em frente a sua residência, assim corno declarou sobre um print do perfil de Mario no aplicativo Whatsapp em que ha urna foto de um caixão e os dizeres 'fim da linha" no status, causando-lhe medo, conforme fls. 8/9. Foi apurado que, o denunciado descumpriu as medidas protetivas de urgência que constam na decisão de fls. 12/13, cuja ciência decorre do mandado e certidão de intimação de fl. 14 acostados aos autos. Noticiam os autos, também, que no mesmo dia, o denunciado, com consciência e vontade, ameaçou causar mal injusto e grave a vítima José Pedro de Sena. Contextualizando as fatos, a vítima estava estacionando seu carro quando Mario se aproximou de forma agressiva com um papel na mão e a ameaçou dizendo: "Se você testemunhar contra mim no processo contra minha ex-mulher, quando sair da cadeia você vai ver o que vai acontecer com você". A vítima José Pedro manifestou a seu desejo de representar em face do denunciado, conforme termo de representação nas fls. 22. Boletins de ocorrência ao ID10284366935, pág. 03-07 e pág. 23-25. Termo de declaração da vítima Edma da Conceição Gonçalves ao ID10284366935, pág. 08. Decisão e sentença deferindo medidas protetivas contra a vítima Edma ao ID10284366935, pág. 10-17. Termo de declaração da vítima José Pedro de Sena ao ID10284366935, pág. 26. Termo de representação da vítima José Pedro de Sena ao ID10284366935, pág. 27. Denúncia recebida no dia 25 de agosto de 2024, conforme ID10287545462. Resposta à acusação ao ID10322681796, por intermédio de advogado dativo. Decisões mantendo a segregação do acusado ao ID10324532558, ID10359407449 e ID10407665551. A defesa manifestou pela substituição da prisão preventiva por internação provisória em estabelecimento psiquiátrico adequado ao ID10335303129. A audiência de instrução e julgamento foi realizada no dia 01 de novembro de 2024, com o depoimento das vítimas e da testemunha arrolada pelo Ministério Público: Sandro José Alfeu da Silva, bem como pelas testemunhas arroladas pela defesa: José Geraldo Milagres, Ivo Ferreira Suares, João Batista Gomes e João Bosco Rosa. Após, procedeu-se ao interrogatório do réu. Os depoimentos e manifestações das partes foram gravados pelo sistema audiovisual, em videoconferência (ID10339877174). Acórdãos denegando a ordem de habeas corpus ao ID10397502144 e ID10442861402. O réu constituiu procurador ao ID10405551799. O Ministério Público apresentou alegações finais por memoriais ao ID10453307536. Requereu a condenação do réu nos termos da denúncia, a fixação de valor mínimo a título de reparação aos danos morais causados à vítima em valor não inferior a R$3.000,00 e a suspensão dos direitos políticos do réu. A defesa apresentou alegações finais por memoriais ao ID10457709612. Requereu a absolvição do réu, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Alternativamente, pugnou pela aplicação da Lei 13.641/18, conforme prevê art. 5º, XL da Constituição; fixação da pena no mínimo legal; regime inicial aberto; detração da pena; improcedência do pedido de danos morais e reconhecimento da justiça gratuita. FAC do réu ao ID10457742246. CAC do réu ao ID10457708190, 10457736152 e autos nº 0000150-35.2024.8.13.0508, ID10265859721. É o relatório, passo a fundamentar e decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO A ação penal encontra-se apta ao julgamento, estando presentes a justa causa, as condições da ação, bem como os pressupostos processuais, inexistindo, prefaciais a serem analisadas. Dito isso, passa-se ao exame do mérito. Impende observar, de início, que o processo penal pátrio adota, como regra, o sistema do livre convencimento motivado do juízo, sem que existam elementos probatórios absolutos ou com valores pré-determinados pela legislação (prova tarifada). É o que se extrai da dicção do art. 155 do Código de Processo Penal, no sentido de que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Assim, passo à análise da prova oral colhida em juízo. A vítima E. C. G., em juízo, relatou que ocorreram diversas situações de descumprimento de medidas protetivas por parte do réu, de variadas formas. Informou que uma das medidas impunha ao réu a proibição de frequentar a rua onde reside sua mãe, local onde ela costuma permanecer grande parte do tempo. Afirmou que o réu foi visto diversas vezes naquela via, inclusive em uma ocasião em que, ao sair da residência de sua genitora, foi fechada pelo réu com um veículo. Disse que, quando tentou filmar o ocorrido com o celular, o réu arrancou com o carro e fugiu do local. Disse ainda que o réu era visto circulando pela referida rua, inclusive em horários noturnos, após a meia-noite. Afirmou acreditar que o réu frequentava o local com o intuito de vê-la ou confirmar sua presença ali. Mencionou que dois vizinhos a alertaram para que tomasse cuidado, pois o réu estava frequentemente naquela rua e seria perigoso. Aduziu que um terceiro vizinho contou que o réu o abordou perguntando se a mãe da depoente ainda era viva. Narrou ter participado de uma convenção na Câmara Municipal e que a presença do réu no evento lhe causou incômodo, em razão da necessidade de distanciamento imposta pela medida protetiva. Acrescentou que o réu publicou uma fotografia contendo a imagem de um caixão com a frase "fim da linha", e que, posteriormente, recebeu ligação de um barbeiro, que a aconselhou a registrar boletim de ocorrência. Disse que esse barbeiro relatou que o réu o procurou solicitando que raspasse seu cabelo, pois pretendia matar a depoente naquele mesmo dia, e não queria dar trabalho à polícia. Relatou que várias pessoas a procuraram dizendo que o réu estaria fazendo ameaças contra ela. Narrou que no ano anterior recebeu uma ligação do réu, ocasião em que este a ameaçou afirmando que “iria meter um tiro em sua cabeça”. Afirmou que o réu já declarou pessoalmente que “não tem medo de promotora ou delegado”. Disse que o relacionamento que mantinha com o réu sempre foi muito conturbado, embora tenha perdurado por muito tempo. Informou que parou de realizar transporte de crianças para aulas de natação, pois alguns pais a alertaram de que taxistas estavam comentando que seus filhos corriam risco, uma vez que o réu dizia que iria matá-la. Relatou que, em determinado momento, estava na casa de sua mãe quando José Pedro, em estado de desespero e tremores, a procurou pedindo que retirasse seu nome como testemunha, pois havia sido ameaçado de morte pelo réu. Disse que orientou José Pedro a registrar boletim de ocorrência. Esclareceu que não presenciou a ameaça, mas que José Pedro já havia lhe relatado que o réu teria afirmado a intenção de matar quatro pessoas, inclusive a filha que tem com a depoente. Ressaltou que no dia 12 de julho o réu não cometeu nenhuma ação diretamente contra ela, mas que, dias antes, foi necessário acionar a polícia. Acredita que a ameaça a José Pedro tenha ocorrido no ponto de táxi. Relatou ainda acreditar que o réu seja portador de esquizofrenia, embora nunca tenha se submetido a avaliação médica, chamando os profissionais de “loucos” quando tal possibilidade era mencionada. Disse que o réu permaneceu recluso em um quarto por dois anos e, durante a pandemia, recusava-se a sair, afirmando que adoeceria. Afirmou que o réu e José Pedro eram muito próximos e que, certa vez, o réu chegou a mandar José Pedro vigiar sua residência. Segundo ela, José Pedro revelou tal fato após ter sido ameaçado. Disse que registrou também boletim de ocorrência após tomar conhecimento de que, em uma roda de taxistas, o réu narrava detalhes íntimos do relacionamento conjugal entre ambos, sendo informações que apenas ele poderia conhecer. Disse que, em outra oportunidade, enquanto comprava um marmitex em um restaurante, o réu entrou no local e, diante da situação, o dono do estabelecimento solicitou à depoente que se retirasse e voltasse no dia seguinte para efetuar o pagamento. Quando retornou, foi informada pelo proprietário que o réu nunca havia frequentado aquele local anteriormente, mas que, ao vê-la, desceu do carro e entrou no restaurante. Afirmou que o réu já provocou seu atual companheiro por meio de um bilhete com seu número de telefone e ameaças escritas, além de ter proferido diversas ofensas de baixo calão. Disse que seu companheiro chegou a telefonar para o réu, em razão das provocações constantes. Em certa ocasião, seu companheiro parou na praça para deixar uma passageira, que desceu para comprar pão, e o réu se aproximou com um envelope, mostrando-o para a câmera. Depois, soube que se tratava de um boletim de ocorrência, e que no envelope constava o nome e o telefone de seu atual companheiro. Por fim, afirmou que, durante a convivência, encontrou uma arma de fogo na residência, escondida dentro do sofá, quando tentava rearranjar os móveis. Disse que a família do réu não reconhece a possibilidade de ele possuir algum distúrbio mental. Em certa ocasião, o réu chegou a ser internado, mas evadiu-se do hospital. A vítima José Pedro de Sena, em juízo, relatou que estava encostado em seu veículo quando o réu se aproximou e lhe disse: “Se você falar que foi ela que falou, você salva minha cara, eu não vou preso, nem você. Agora, se você falar que eu sei o que você faz, cê vai preso e eu vou preso, mas no dia em que eu sair de lá, você sabe pra onde você vai”. Afirmou que, no ponto de táxi, ouviu o réu afirmar a terceiros que mataria a mãe e a filha, e que ainda havia mais pessoas que pretendia matar, totalizando quatro vítimas. Esclareceu que, pela conversa, entendeu que a “mãe” mencionada pelo réu seria Edma, vítima com quem este mantivera relacionamento anterior. Informou que tem ciência da existência de medidas protetivas de urgência concedidas em favor de Edma contra o réu. Negou que o réu, em algum momento, tenha solicitado que vigiasse a vítima. Disse ainda que, certa vez, o réu lhe mostrou um papel que teria pegado no fórum e pediu que o lesse. Em seguida, afirmou que havia uma viatura no local e que iriam buscá-lo, ao que José Pedro reagiu questionando se ele estava em seu juízo normal. Por fim, esclareceu que, no momento em que foi ameaçado, não havia outras pessoas nas proximidades. A testemunha Sandro José Alfeu da Silva, policial militar, confirmou, em juízo, o histórico da ocorrência registrada. Relatou recordar-se de que a vítima solicitou o registro do fato e estava acompanhada, na ocasião, por uma testemunha que foi devidamente relacionada no boletim de ocorrência. A testemunha José Geraldo Milagres, em juízo, declarou conhecer o réu há aproximadamente 14 anos. Informou que já ouviu o réu falar mal da vítima, embora sem abordar questões de cunho íntimo. Esclareceu que o réu e José Pedro mantinham relação de amizade, tendo presenciado o réu repreendê-lo após este prestar depoimento à Polícia Civil, chamando-o de “futriqueiro”, porém sem proferir ameaças. Relatou que, certa manhã, no ponto de táxi, presenciou o momento em que Alberto passou pelo local e fez um gesto obsceno ao réu, mostrando o dedo médio. Disse que o réu reagiu com xingamentos. Em seguida, Alberto desceu do veículo e dirigiu-se em direção ao réu, ocasião em que este exibiu uma folha de papel com a inscrição “ameaça” e um número de telefone, afirmando que vinha recebendo ligações ameaçadoras daquele número. Afirmou que o réu permaneceu por três a quatro anos sem exercer atividade laboral, tendo ouvido dizer que tal afastamento se deu em razão de quadro depressivo. Declarou ainda que o réu adota uma alimentação natural diferenciada. Acrescentou que, após ser liberado de uma internação no hospital de Piranga, o réu apresentou significativa mudança de comportamento, tornando-se mais assíduo no trabalho e tratando todos com cordialidade. Informou que a polícia já esteve no ponto de táxi para averiguar denúncia de que o réu estaria portando arma de fogo e, na ocasião, os policiais realizaram revista no veículo, mas nada foi encontrado. A testemunha Ivo Ferreira Suares, em juízo, declarou que exerce a atividade de taxista há 15 anos e que conhece o réu. Informou que nunca ouviu o réu falar da vítima em termos de cunho íntimo. Relatou que, em uma ocasião, ao chegar ao ponto de táxi, presenciou uma discussão entre o réu e Alberto, tendo visto o réu exibindo um envelope, mas não soube precisar quem teria iniciado o desentendimento. Esclareceu que, anualmente, o réu apresenta quadros de crise, ocasiões em que se afasta do trabalho, retornando depois visivelmente magro e com dificuldade para caminhar. Afirmou que o réu já comentou, em certa oportunidade, que estaria sendo ameaçado. Acrescentou que chegou a se desentender com o réu em uma ocasião, em razão deste se recusar a retirar o veículo para dar passagem a outro carro. Por fim, disse ter ouvido que o réu já foi internado. A testemunha João Batista Gomes, em juízo, declarou ser vizinho do réu, afirmando que este apresenta diversos comportamentos considerados estranhos. Relatou que o réu costuma deixar o carro aberto por vários dias no meio da rua e que, em certa ocasião, permaneceu trancado em casa por um longo período, sendo necessário que seus irmãos, vindos de outra localidade, o amarrassem para que pudesse ser conduzido ao hospital. Disse que o réu frequentemente se tranca dentro da residência e, por vezes, deixa a coberta do cachorro pendurada na porteira. Informou já tê-lo visto retirando medicamentos para depressão no posto de saúde, embora o réu evite comentar sobre o assunto. Acrescentou que, certa vez, presenciou a vítima tentando ajudar o réu durante o período em que ele permaneceu recluso em casa. A testemunha João Bosco Rosa, em juízo, declarou que conhece o réu desde sua chegada à cidade de Piranga. Afirmou acreditar que o réu sofre de depressão, pois, em conversas com ele, percebe que não aparenta estar bem psicologicamente. Relatou que, ao sugerir ao réu que procurasse tratamento, este interrompeu o contato e permaneceu sem lhe dirigir a palavra por cerca de 40 dias. Aduziu que, posteriormente, o réu o procurou informando que faria uma viagem e lhe pediu que cuidasse de seus cães, solicitando, inclusive, que deixasse uma caixa de som ligada ininterruptamente para que os animais ouvissem música e que mantivesse o portão da rua aberto para que os cães pudessem cumprimentar as pessoas que passassem. Afirmou que jamais presenciou o réu ameaçando a vítima, ressaltando que já trabalhou na residência do casal e que, à época, o relacionamento entre eles era aparentemente normal. Disse que, durante o casamento, o réu chegou a permanecer recluso por aproximadamente três anos. Declarou que nunca viu arma de fogo na residência do réu e que tem conhecimento de que ele já foi internado. Relatou ter presenciado o indivíduo chamado Alberto proferindo xingamentos ao réu, chamando-o de “corno”. Em seu interrogatório judicial, o réu negou ter ameaçado José Pedro, afirmando que tal acusação é falsa e que apenas discutiu com ele em razão de fatos que, segundo alegou, teriam sido inventados por ele. Declarou que, por exercer a profissão de taxista, transita por todas as ruas de Piranga, mas negou que tenha procurado ou se aproximado intencionalmente da vítima. Relatou que recebeu uma ligação telefônica, que atendeu por acreditar se tratar de um passageiro, mas a pessoa do outro lado da linha apenas afirmou que iria matá-lo e desligou. Diante disso, informou que procurou a Polícia Civil, ocasião em que o policial Felipe teria rastreado o número e identificado como sendo de Alberto. Afirmou que Alberto constantemente o ameaça e, ao vê-lo na rua, faz gestos simulando o uso de arma de fogo com as mãos. Esclareceu que, em determinado momento, exibiu um envelope com a palavra “ameaça” escrita, bem como o número de telefone de Alberto, com o intuito de demonstrar que havia comunicado o fato à polícia e evitar que viesse a ser morto. Alegou ter tomado conhecimento de que a polícia realizou diligência na residência da mãe da vítima, sob a justificativa de que Alberto estaria envolvido com drogas. Afirmou que a vítima realizava transporte de alunos para aulas de hidroginástica que ocorriam em frente à sua residência, e que, se tivesse intenção de lhe causar algum mal, teria tido oportunidade para tanto, o que não ocorreu. Em relação à imagem de um caixão com a expressão “fim da linha” publicada em suas redes sociais, esclareceu tratar-se de uma superstição, justificando que acredita que todos passarão por isso. Alegou que a imagem estava em seu aparelho celular há cerca de dois anos e foi publicada quando adquiriu o dispositivo. Por fim, afirmou que já brincou com um barbeiro dizendo que era para raspar seu cabelo, pois seria preso, mas negou ter feito qualquer menção a matar alguém naquela ocasião. II. 1. Quanto ao crime previsto no art. 24-A da Lei 11.340/06 em face da vítima E. C. G. No que se refere ao crime previsto no art. 24-A da Lei nº 11.340/06, que incrimina a conduta de descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência, não há nos autos prova segura e específica quanto à prática, pelo réu, de conduta violadora especificamente no dia 12 de julho de 2024, data apontada pela denúncia. Consoante se extrai do depoimento da própria vítima, E. C. G., embora tenha relatado diversas situações pretéritas em que o réu supostamente teria violado as medidas impostas — como frequentar reiteradamente a rua onde reside sua mãe ou aproximar-se de estabelecimentos em que ela estava —, afirmou expressamente que, no dia 12 de julho de 2024, o réu não cometeu nenhuma ação diretamente contra ela. Esse dado é corroborado pelo depoimento da testemunha José Pedro, que indicou ameaça própria, mas não relatou nenhum ato de aproximação do réu em relação à vítima E. C. G. naquela data específica. É certo que a vítima expôs um histórico conflituoso e episódios que, se isolados, poderiam indicar desrespeito às ordens judiciais, a exemplo de circulação em locais frequentados por ela. Contudo, tais condutas, ainda que preocupantes e possivelmente incompatíveis com as medidas de proteção, não foram individualizadas de modo suficiente ao ponto de permitir a condenação por fato determinado. O tipo penal do art. 24-A da Lei 11.340/06 exige a comprovação inequívoca de conduta dolosa, dirigida à inobservância de medida protetiva específica, o que demanda a prova da ciência do réu quanto ao teor da decisão judicial, da eficácia da medida à época dos fatos e da prática voluntária e consciente de ato que a contrarie. No caso em apreço, a ausência de prova cabal quanto ao descumprimento doloso da medida judicial em data certa (12 de julho), somada à vaga delimitação temporal dos episódios anteriores, conduz à aplicação do princípio do in dubio pro reo. Ademais, ainda que os relatos da vítima tragam uma narrativa detalhada sobre o temor causado pela postura do acusado ao longo do tempo, tais elementos, por si só, não substituem a certeza necessária para a prolação de decreto condenatório penal. Dessa forma, à míngua de prova suficiente e específica quanto à prática, pelo réu, de conduta típica em violação a medida protetiva vigente, impõe-se a absolvição, com fulcro no art. 386, II e VII, do Código de Processo Penal. II. 2. Quanto ao crime previsto no art. 147 do Código Penal em face da vítima José Pedro de Sena A materialidade restou demonstrada por meio do boletim de ocorrência (ID10284366935, pág. 23-25), termo de declaração da vítima (ID10284366935, pág. 26), termo de representação da vítima (ID10284366935, pág. 27), sem descurar dos elementos probatórios produzidos em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, como consectários do devido processo legal (art. 5º, LV, da Constituição Federal), em um sistema acusatório. A autoria, da mesma forma, é inconteste e recai sobre a pessoa do acusado, ante o robusto acervo probatório. Configura o crime do art. 147, caput, do Código Penal, a promessa de causa mal futuro, sério e verossímil, capaz de incutir na vítima justificável receio, de modo que é irrelevante a ausência de ânimo calmo e refletido por parte do agente. A ameaça é um crime formal, isto é, consuma-se ainda quando, no caso concreto, não se verifique o resultado (intimidação) pretendido pelo agente desde que a ameaça considerada em si mesma seja idônea a atemorizar um homem comum. A vítima, em sede policial e em juízo, relatou a ameaça praticada pelo réu, bem como representou contra o réu pela ameaça. A narrativa da vítima revelou-se coerente, detalhada e harmônica com os demais elementos de prova colhidos, especialmente com o depoimento da E. C. G., que também declarou ter sido procurada por José Pedro em estado de desespero, tremendo, dizendo ter sido ameaçado de morte pelo réu. Afirmou ainda que ele lhe pediu que retirasse seu nome como testemunha e que teria ouvido do réu a intenção de matar quatro pessoas, inclusive a filha que têm em comum. Embora não tenha presenciado a ameaça, a vítima E. C. G. confirmou os efeitos psicológicos causados à testemunha José Pedro, o que corrobora sua versão. Logo, ao se confrontar os depoimentos colhidos com o objeto da presente demanda, verifica-se que a ação do acusado é típica, antijurídica e culpável. O crime restou consumado, com a positivação de suas elementares, nos termos do art. 14, I, do Código Penal. Ademais, a vontade (elemento volitivo) e a consciência (elemento cognitivo) de praticar o tipo penal objetivo são incontestes, a caracterizar o dolo direto, na forma do art. 18, I, do Código Penal. Conclui-se que, nos termos e limites expostos, a prova é certa e segura, apta a chancelar a prolação de um decreto condenatório, a partir de um juízo de certeza, em cognição exauriente, considerando-se o livre convencimento motivado deste juízo (art. 155 do Código de Processo Penal). Não há agravantes ou atenuantes de pena. Não há causas de aumento ou de diminuição de pena. III. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão acusatória para: a) ABSOLVER o acusado MÁRIO JOSÉ FANTICELE das sanções previstas no art. 24-A da Lei 11.340/06, na forma do art. 386, II e VII, do Código de Processo Penal; b) CONDENAR o acusado MÁRIO JOSÉ FANTICELE como incursos nas sanções do art. 147 do Código Penal. Passo à dosimetria da pena, à luz do princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da Constituição Federal), sem descurar das diretrizes fixadas no art. 68 do Código Penal. IV. DOSIMETRIA 1ª fase Atenta à dicção do art. 59 do Código Penal, verifico que a culpabilidade, entendida como juízo de reprovabilidade da conduta, não desbordou do ordinário. O réu não registra maus antecedentes. A conduta social não foi desabonada. Não há elementos nos autos acerca da personalidade do agente, de forma que se entende normal, não possuindo tons dissonantes. O motivo do crime merece valoração negativa, pois visou obstruir a instrução criminal por meio do medo, em evidente afronta à função jurisdicional do Estado. O acusado objetivou evitar o depoimento da vítima em processo que envolve pessoa de interesse do réu, o que demonstra desprezo pelas instituições públicas e tentativa de frustrar a aplicação da lei penal. As circunstâncias do crime são ínsitas ao tipo penal. As consequências do crime não foram de maior monta. Não há que se falar em comportamento da vítima. Observados os oito vetores presentes no art. 59 do Código Penal, tendo-se em vista a existência de uma vetorial negativa e a adoção de fração para cada circunstância judicial no patamar de 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima, fixo a pena-base em 01 mês e 18 dias de de detenção. 2ª fase Não há agravante ou atenuante. Assim, mantenho a pena intermediária em 01 mês e 18 dias de detenção. 3ª fase Ausentes causas de aumento ou diminuição de pena. Fixo a pena definitiva em 01 mês e 18 dias de de detenção. Considerando a natureza e o quantitativo da pena privativa de liberdade aplicada, bem como o fato de ser primário, estabeleço o REGIME ABERTO para início de cumprimento da pena (art. 33, caput, §1º, “c” e §2º, “c”, combinado com art. 59, III, todos do Código Penal). Consta dos autos nº 5001337-90.2024.8.13.0508, que o réu se encontra preso desde 12 de agosto de 2024, perfazendo, até a presente data (09/07/2025), aproximadamente 11 meses de custódia cautelar V. DISPOSIÇÕES FINAIS Deixo de fixar valor mínimo indenizatório, conforme dispõe o art. 387, IV, do Código de Processo Penal, por ausência de pedido expresso do Ministério Público quanto a vítima José Pedro de Sena. O réu poderá recorrer em liberdade se por outro motivo não estiver preso. Expeça-se alvará de soltura. Condeno o réu ao pagamento das custas na forma do art. 804 do Código de Processo Penal. Transitada em julgado esta sentença: a) lance-se o nome do réu no rol de culpados; b) oficie-se ao TRE/MG, na forma do art. 15, III, da Constituição Federal; c) oficie-se ao órgão responsável pelo cadastro de antecedentes; d) expeça-se guia de execução definitiva. Publique-se. Registre-se. Intimem-se, inclusive a vítima. Certificado o trânsito em julgado, retornem os autos para julgamento para fins de declaração de extinção da punibilidade, considerando que o tempo de custódia cautelar supera a pena ora aplicada. Piranga, data da assinatura eletrônica. CLARA MACIEL ANTUNES BARBOSA Juiz(íza) de Direito Vara Única da Comarca de Piranga
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