Processo nº 1010832-69.2023.8.26.0196
ID: 311685898
Tribunal: TJSP
Órgão: Foro de Franca - Vara da Fazenda Pública
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 1010832-69.2023.8.26.0196
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOSE LUIZ MATTHES
OAB/SP XXXXXX
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Processo 1010832-69.2023.8.26.0196 - Procedimento Comum Cível - Anulação de Débito Fiscal - Democrata Calçados e Artefatos de Couro Ltda - Vistos. Processo em ordem. DEMOCRATA CALÇADOS E ARTEFATOS DE…
Processo 1010832-69.2023.8.26.0196 - Procedimento Comum Cível - Anulação de Débito Fiscal - Democrata Calçados e Artefatos de Couro Ltda - Vistos. Processo em ordem. DEMOCRATA CALÇADOS E ARTEFATOS DE COURO LTDA, com qualificação e representação nos autos (fls.36/48), com fundamento nos preceitos legais indicados, ajuizou a presente Ação Anulatória, com trâmite pelo rito ordinário [Vara da Fazenda Pública] contra a FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, igualmente com qualificação e representação (fls. 105). Empresa que tem por objeto "a exploração da atividade de indústria, exportação, importação, comércio atacadista e varejista de calçados e acessórios,bolsas, malas, couros e pele em geral, artigos de cama, mesa e banho, vestuário e complementos, perfumaria, cosméticos e de higiene pessoal, óculos, relógios, artigos esportivos,produtos de limpeza e conservação para calçados, embalagens e brindes em geral', foi fiscalizada no âmbito tributário, com a lavratura do auto de infração [AIIM 4.120.264-8], responsabilizando-a pelo creditamento indevido do tributo [ICMS], junto ao negócio jurídico. A fiscalização anotou o recebimento e armazenamento de calçados desacompanhados de nota fiscal hábil pela empresa no mês de novembro de 2018. Alegou-se a nulidade do auto de infração pela capitulação incorreta, pois não há incidência do ICMS na operação de transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. Pediu-se a suspensão da exigibilidade tributária, a expedição de certidão positiva com efeitos de negativa, a impossibilidade da inscrição na dívida ativa, o impedimento da inscrição e seu apontamento. A petição inicial veio formalizada com os documentos (fls. 1/76) das alegações pelo sistema eletrônico. Aceita a competência da Vara da Fazenda Pública [artigo 2º da Lei nº12.153/2009 I Lei do Juizado da Fazenda Pública], foi recepcionada a inicial (fls 85/88) e deferiu-se a medida de tutela antecipada. Defesa ofertada contra a pretensão, impugnando-a, pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo (fls. 105/122). Réplica (fls. 126/128). Momento processual para especificação e justificação das provas pretendidas para a produção. Feito saneado (fls. 485/487). Laudo pericial (fls. 1426/1462), com manifestações e encerramento da instrução processual (fls. 1494), formalizando-se as alegações finais pelas partes (fls. 1504/1507 e 1508/1516). O processo foi preparado pela serventia e veio para conclusão - decisão. É o relatório. Fundamento e decido. [I] Julgamento É possível o julgamento da lide, porque foi realizada a instrução do processo. Foi permitida a produção da prova. Exerceu-se o direito ao contraditório. É desnecessária a produção de provas complementares para o pronunciamento. [II] Pedido e defesa Empresa que tem por objeto "a exploração da atividade de indústria, exportação, importação, comércio atacadista e varejista de calçados e acessórios,bolsas, malas, couros e pele em geral, artigos de cama, mesa e banho, vestuário e complementos, perfumaria, cosméticos e de higiene pessoal, óculos, relógios, artigos esportivos,produtos de limpeza e conservação para calçados, embalagens e brindes em geral', foi fiscalizada no âmbito tributário, com a lavratura do auto de infração [AIIM 4.120.264-8], responsabilizando-a pelo creditamento indevido do tributo [ICMS], junto ao negócio jurídico. A fiscalização anotou o recebimento e armazenamento de calçados desacompanhados de nota fiscal hábil pela empresa no mês de novembro de 2018. Alegou-se a nulidade do auto de infração pela capitulação incorreta, pois não há incidência do ICMS na operação de transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. Pediu-se a suspensão da exigibilidade tributária, a expedição de certidão positiva com efeitos de negativa, a impossibilidade da inscrição na dívida ativa, o impedimento da inscrição e seu apontamento. Defesa ofertada. A Fazenda Estadual rebateu a pretensão, defendendo a regularidade do auto de infração lavrado. Informou que a parte requerente "possuía estabelecimento empresarial clandestino no qual ela recebia e estocava mercadorias adquiridas desacompanhadas de nota fiscal" (fls. 109). Afirmou haver incidência do imposto, ICMS, nas operações de transferência de mercadoria entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, sem boa-fé na conduta da empresa e que há juricidade na aplicação da multa e dos juros. [III] Análise Partes legítimas e bem representadas. Existe interesse no prosseguimento do processo. Estão presentes os pressupostos processuais. Estão presentes os elementos condicionais da ação anulatória. Vamos ao mérito. Discute-se a higidez do auto de infração lavrado e certidões emitidas, pretendendo-se a sua anulação. A higidez do ato administrativo tem pressuposto de legalidade, ou seja, tem presunção de legitimidade. "Todo ato administrativo, de qualquer forma ou Poder, para ser legítimo e operante, há que ser praticado em conformidade com a norma legal pertinente (princípio da legalidade), com a moral da instituição (princípio da moralidade), com a destinação pública própria (princípio da finalidade), com a divulgação oficial necessária (princípio da publicidade) e com presteza e rendimento funcional (princípio da eficiência). Faltando, contrariando ou desviando-se destes princípios básicos, a Administração Pública vicia o ato, expondo-o a anulação por ela mesma ou pelo Poder Judiciário, se requerida pelo interessado" [Hely Lopes Meirelles]. Quanto à eficácia, salienta o mesmo mestre, "é a idoneidade que se reconhece ao ato administrativo para produzir seus efeitos específicos. Pressupõe, portanto, a realização de todas as fases e operações necessárias à formação do ato final, segundo o Direito Positivo vigente". "É, em suma: a consagração da ideia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei" [Celso Antônio Bandeira de Mello, "Curso de Direito Administrativo", Malheiros Editores]. Porém, a presunção de legalidade é relativa, e poderá ser elidida pela produção de provas em contrário, robustas e hígidas, sempre com a aplicação do princípio do ônus probatório, ou seja, quem faz a impugnação, faz a prova de sua assertiva. A lide tem como ponto controvertido dois pontos essenciais: (i) a discussão sobre a possibilidade da incidência do ICMS nas operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, e, (ii) a legalidade ou não da multa e dos juros aplicados no caso. Em primeiro plano, necessário discorrer sobre a possibilidade da incidência do tributo, ICMS, nas operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. A petição inicial relatou que os valores cobrados nos referidos autos referem-se às operações realizadas entre estabelecimentos do mesmo contribuinte. A alegação foi rebatida pela Fazenda Estadual quando destacou que as infrações referem-se ao recebimento e estocagem de mercadorias sem documentação fiscal idônea e não a tributação do entre estabelecimentos de mesma titularidade. Sobre o tema existe dissonância jurisprudencial ao longo do tempo, firmando-se Súmula no curso do tempo: "Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte" [Súmula 166 do C. Superior Tribunal de Justiça]. Depois, o trema da transferência entre estabelecimentos de propriedade do mesmo contribuinte, mas situados em estados distintos, foi analisada pelo C. Supremo Tribunal Federal em sistemática de repercussão geral, com a seguinte tese firmada: "Não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia" [Tema nº 1099]. "DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. ICMS. DESLOCAMENTO FÍSICO DE BENS DE UM ESTABELECIMENTO PARA OUTRO DE MESMA TITULARIDADE. INEXISTÊNCIA DE FATO GERADOR. PRECEDENTES DA CORTE. NECESSIDADE DE OPERAÇÃO JURÍDICA COM TRAMITAÇÃO DE POSSE E PROPRIDADE DE BENS. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. 1. Enquanto o diploma em análise dispõe que incide o ICMS na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, o Judiciário possui entendimento no sentido de não incidência, situação esta que exemplifica, de pronto, evidente insegurança jurídica na seara tributária. Estão cumpridas, portanto, as exigências previstas pela Lei n. 9.868/1999 para processamento e julgamento da presente ADC. 2. O deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS, ainda que se trate de circulação interestadual. Precedentes. 3. A hipótese de incidência do tributo é a operação jurídica praticada por comerciante que acarrete circulação de mercadoria e transmissão de sua titularidade ao consumidor final. 4. Ação declaratória julgada improcedente, declarando a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho "ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular", e 13, §4º, da Lei Complementar Federal n. 87, de 13 de setembro de 1996" [ADC 49, Relator(a): Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 19-04-2021, Processo Eletrônico Dje-084 DIVULG 03-05-2021 PUBLIC 04-05-2021]. Inexistem dúvidas: entre as mercadorias que circulam pelas empresas da mesma propriedade (matriz e filial), não se configura fato gerador do imposto ICMS. No entanto, no caso, que se pretende a análise, a atuação do fisco não está relacionada com a tributação na transferência de mercadorias, mas sim na falta de documentação fiscal hábil nas mercadorias encontradas. É inclusive, como se infere, o relato do perito: "d) Poderia o Sr. Perito informar, a partir das constatações trazidas pelo relatório fiscal que acompanhou o lançamento fiscal, se ocorreu operação de circulação jurídica (venda) das mercadorias localizadas no barracão locado pela DEMOCRATA CALÇADOS? Resposta: A resposta ao presente quesito é negativa. Conforme consta do AIIM n. 4.120.264-8, lavrado em 29/01/2019, juntado nas fls. 155/480 dos autos, a autora foi autuada pelo fisco paulista, sob acusação de que no mês de novembro/18, teria recebido e estocado na Av. Alberto Pulicano, 4881, Distrito Industrial de Franca/SP, imóvel locado pela autora, mercadorias tributadas (calçados) desacompanhadas de documentação fiscal hábil, culminando-se no lançamento fiscal representado pelo Auto de Infração e Imposição de Multa AIIM N. 4.120.264-8, inscrito em dívida ativa (CDA n. 1359454047)" (fls.1438) (grifei). Nota-se, nesse caso, que não cabe nem discussão sobre a modulação da incidência do tributo (ICMS) entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, pois, frisa-se, não ser este o fundamento do auto de infração lavrado pelo ente público. Deste modo, não cabe a alegação da cobrança pelo fisco do tributo sobre estabelecimentos de sua mesma titularidade. A discussão se verte a legalidade do ato de infração imposto com base na ausência de documentação fiscal hábil. Há previsão na legislação sobre a necessidade da apresentação da documentação fiscal regular das mercadoriais: "O destinatário da mercadoria ou do serviço é obrigado a exigir documento fiscal hábil, com todos os requisitos legais, de quem o deva emitir, sempre que obrigatória a emissão (Lei 6.374/89, art. 67, § 1º, Convênio de 15-12-70 - SINIEF, art. 14, e Convênio SINIEF-6/89, art. 89, "caput") [artigo 203 do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo]. E nesta perspectiva, a perícia é clara quando afirma a regularidade do auto de infração e a sua correta capitulação da situação fática: "f) Constatou-se ainda, que a requerente deixou de emitir os documentos fiscais de transferência dos (19.382 pares de calçados) entre a matriz da DEMOCRATA CALCADOS E ARTEF DE COURO LTDA situada na Av. Wilson Sábio De Mello, 2750, Distrito Industrial de Franca/SP para o galpão locado pela requerente situado na Av. Alberto Pulicano, 4881, Distrito Industrial de Franca/SP, conforme determina a legislação em vigor. g) Portanto, considerando tudo quanto foi exposto, nos termos da legislação vigente a requerente infringiu o Art. 203, do RICMS (Dec. 45.490/00), culminando na aplicação das penalidades descritas Art. 85, inc. III, alínea "a" c/c §§ 1°, 9° e 10, da Lei 6.374/89. Dessa forma, considerando o ponto de vista técnico, sob a ótica da ciência contábil, a perícia técnica conclui, que o Fisco Estadual procedeu de forma regular ao lavrar o Auto de Infração (AIIM N. 4.120.264-8) contra a requerente" (fls. 1444, grifei). Neste sentido, também é clara a jurisprudência: "AÇÃO ANULATÓRIA. ICMS. Pretensão da autora de anular o AIIM referente à obrigação de emissão de nota fiscal acerca de transferência de bens entre estabelecimentos (matriz e filial). Descabimento. Atos administrativos que gozam da presunção de legalidade, legitimidade e veracidade. Penalidade aplicada por infração à obrigação acessória, convertida em principal por força do § 3º do artigo 113 do Código Tributário Nacional Multa prevista na legislação de regência, não tendo caráter confiscatório. Aplicabilidade do disposto no artigo 527-A do RICMS/2000, para reduzir a penalidade, de forma objetiva, para 25%. Sentença parcialmente reformada para tal finalidade Recurso parcialmente provido" [Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Apelação Cível nº 0001769-64.2012.8.26.0053, Des (a): Wanderley José Federighi, Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Público, Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 13ª Vara de Fazenda Pública, Data do Julgamento: 18/09/2013] (grifei). Mais recentemente. "ICMS. Auto de infração e imposição de multa. Falta de escrituração em livro de Registro de Entradas por empresa de pequeno porte, enquadrada em regime jurídico tributário especial. Art. 214 do RICMS/00 e art. 79, § 2º da Resolução do CGSN nº 94/2011. Aplicação do art. 527-A do RICMS/00. Não se discute nos autos a infração em si: a autora deixou de escriturar notas fiscais; o descumprimento de obrigação acessória implica em cominação de sanção; as obrigações não são dispensáveis e visam à fiscalização do fisco; todavia, a legislação autoriza que se proceda com a redução do valor ou mesmo que se releve o auto de infração lavrado. Não obstante cause estranheza as notas fiscais não escrituradas serem todas emitidas pelo mesmo estabelecimento e haver aquelas cujos valores destoam das notas fiscais escrituradas no período, em sede administrativa o próprio fisco reconheceu a inexistência de dolo, fraude ou simulação, bem como o pagamento do imposto; reafirma que o caso é de negligência e, apenas posteriormente, alega a existência de dolo. Não há comprovação nos autos de que a não escrituração teve por desiderato a manutenção da empresa no regime tributário especial. Preenchidos os requisitos do art. 527-A do RICMS/00, que são a inexistência de dolo, fraude ou simulação, bem como a não implicação de falta de pagamento de imposto, passível de redução a multa aplicada para 1% do valor das operações. Improcedência. Apelo da autora provido" [Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Apelação Cível nº 1059255-31.2016.8.26.0576, Des (a): Torres de Carvalho, Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Público, Foro de São José do Rio Preto - 1ª Vara da Fazenda Pública, Data do Julgamento: 03/09/2018] (grifei). "Na transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, deve ser emitida NF-e discriminando todos os itens, NCM, unidade de medida, valor e valor total, e utilizando o CFOP de transferência" (fls. 1439, consulta tributária 30159/2024). Há regularidade na autuação e sua capitulação. Ademais, denota-se, e isto é muito claro, utilizava-se a empresa de estabelecimento clandestino, não inscrito nos órgãos competentes, conforme assevera a perícia: "Outrossim, em se tratando de depósito fechado a requerente deveria ter realizado previamente a inscrição do estabelecimento perante os órgãos competentes" (fls. 1439). Desta maneira, descabe a aplicação do artigo 527-A do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo: "A multa aplicada nos termos do artigo 527 poderá ser reduzida ou relevada por órgão julgador administrativo, desde que a infração tenha sido praticada sem dolo, fraude ou simulação, e não implique falta de pagamento do imposto (Lei 6.374/89, art. 92 e § 2º, na redação da Lei 10.619/00, art. 1º, XXXI, e Lei 10.941/01, art. 44). (Acrescentado o art. 527-A pelo inciso I do art. 2º do Decreto 46.676 de 09-04-2002; DOE 10-04-2002; efeitos a partir de 01-05-2002)". Não há possibilidade de presumir a boa fé. A primeira questão se mostra sem procedência, e resta discussão sobre a legalidade da incidência da multa e dos juros aplicados, seus valores e percentuais. As taxas cobradas pelo Fisco Paulista são superiores à taxa federal estabelecida e o valor da multa tem natureza de confisco. Estas são as alegações. Com efeito, a legislação estadual incidente [Lei nº 13.918/2009 | "Dispõe sobre a comunicação eletrônica entre a Secretaria da Fazenda e o sujeito passivo dos tributos estaduais, altera a Lei nº 6.374, de 1º de março de 1989, que instituiu o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, e dá outras providências correlatas"], instituiu nova sistemática de composição dos juros da mora para os tributos e multas estaduais (englobando a correção monetária), estabelecendo taxa de 0,13% ao dia. Como a questão envolve Direito Financeiro e/ou Tributário, pois o tema incide sobre os juros moratórios e a correção monetária dos créditos tributários fiscais, a competência para legislar sobre a matéria é concorrente [artigo 24, inciso I, da Constituição Federal]. É o texto: "Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico" [artigo 24 da Constituição]. Dessa forma, pela observância do regramento Constitucional, o Estado de São Paulo, pela legislação estadual, estabeleceu os limites das incidências. Mas, e aqui reside um dos pontos da controvérsia, deveria ter seguido os limites impostos pela legislação federal [Lei Federal nº 9.250/1995 | "Altera a legislação do imposto de renda das pessoas físicas e dá outras providências"], pois no âmbito da legislação concorrente, as normas estaduais devem limitar-se às suas particularidades, restando à norma da União as características gerais. Não foi a ocorrência. Na hipótese, o percentual estabelecido pela legislação estadual, excedeu àquele imposto para a taxa SELIC, pela lei federal. É inclusive, a conclusão da análise pericial (fls. 1.440/1.441), utilizando-se a tabela comparativa: "Poderia o Sr. Perito confirmar se os juros considerados no lançamento fiscal em questão extrapolam a taxa Selic? Resposta: A resposta ao presente quesito é afirmativa. Vejamos abaixo os índices da taxa SELIC, acumulados de forma simples, referente ao período sob análise". Não houve simetria e respeito ao regramento da legislação federal. Cito v. acórdão do Órgão Especial do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo sobre a matéria: "Incidente de Inconstitucionalidade. Arts. 85 e 96 da Lei Estadual n° 6.374/89, com a redação dada pela Lei Estadual n° 13.918/09. Nova sistemática de composição dos juros da mora para os tributos e multas estaduais (englobando a correção monetária) que estabeleceu taxa de 0,13% ao dia, podendo ser reduzida por ato do Secretário da Fazenda, resguardado o patamar mínimo da taxa SELIC. Juros moratórios e correção monetária dos créditos fiscais que são, desenganadamente, institutos de Direito Financeiro e/ou de Direito Tributário. Ambos os ramos do Direito que estão previstos em conjunto no art. 24, inciso I, da CF, em que se situa a competência concorrente da União, dos Estados e do DF. §§ 1º a 4° do referido preceito constitucional que trazem a disciplina normativa de correlação entre normas gerais e suplementares, pelos quais a União produz normas gerais sobre Direito Financeiro e Tributário, enquanto aos Estados e ao Distrito Federal compete suplementar, no âmbito do interesse local, aquelas normas. STF que, nessa linha, em oportunidades anteriores, firmou o entendimento de que os Estados-membros não podem fixar índices de correção monetária superiores aos fixados pela União para o mesmo fim (v. RE n" 183.907- 4/SP e ADI n° 442). CTN que, ao estabelecer normas gerais de Direito Tributário, com repercussão nas finanças públicas, impõe o cômputo de juros de mora ao crédito não integralmente pago no vencimento, anotando a incidência da taxa de 1% ao mês, "se a lei não dispuser de modo diverso". Lei voltada à regulamentação de modo diverso da taxa de juros no âmbito dos tributos federais que, destarte, também se insere no plano das normas gerais de Direito Tributário/Financeiro, balizando, no particular, a atuação legislativa dos Estados e do DF. Padrão da taxa SELIC que veio a ser adotado para a recomposição dos créditos tributários da União a partir da edição da Lei n° 9.250/95, não podendo então ser extrapolado pelo legislador estadual. Taxa SELIC que, por sinal, já se presta a impedir que o contribuinte inadimplente possa ser beneficiado com vantagens na aplicação dos valores retidos em seu poder no mercado financeiro, bem como compensar o custo do dinheiro eventualmente captado pelo ente público para cumprir suas funções. Fixação originária de 0,13% ao dia que, de outro lado, contraria a razoabilidade e a proporcionalidade, a caracterizar abuso de natureza confiscatória, não podendo o Poder Público em sede de tributação agir imoderadamente. Possibilidade, contudo, de acolhimento parcial da arguição, para conferir interpretação conforme a Constituição, em consonância com o julgado precedente do Egrégio STF na ADI n° 442. Legislação paulista questionada que pode ser considerada compatível com a CF, desde que a taxa de juros adotada (que na atualidade engloba a correção monetária), seja igual ou inferior à utilizada pela União para o mesmo fim. Tem lugar, portanto, a declaração de inconstitucionalidade da interpretação e aplicação que vêm sendo dada pelo Estado às normas em causa, sem alterá-las gramaticalmente, de modo que seu alcance valorativo fique adequado à Carta Magna (art. 24, inciso I e § 2º). Procedência parcial da arguição" [Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Arguição nº 0170909-61.2012.8.26.000, Des (a): Paulo Dimas Mascaretti]. Descabe, pois, a incidência do percentual estabelecido pela legislação estadual para cobrança dos juros de mora, quando extrapolou os limites da lei federal. Não se olvide a autorização do Supremo Tribunal Federal [ADI nº 442] para que os Estados-membros legislem sobre índices de correção monetária. Pois, mesmo assim, tais índices não podem ser fixados em patamares maiores que àqueles fixados pela União. Cita-se decisão. "Com efeito, o E. STF, no precedente aludido, entendeu que os índices de correção de débitos fiscais federais, em se tratando de norma de direito financeiro, funcionam como norma geral em relação aos Estados, in verbis: SÃO PAULO. UFESP. ÍNDICES FIXADOS POR LEI LOCAL PARA CORREÇÃO MONETÁRIA. ALEGADA OFENSA AO ART. 22, II E VI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Entendimento assentado pelo STF no sentido da incompetência das unidades federadas para a fixação de índices de correção monetária de créditos fiscais em percentuais superiores aos fixados pela União para o mesmo fim. Ilegitimidade da execução fiscal embargada no que houver excedido, no tempo, os índices federais. Recurso parcialmente provido. (RE 183907, Relator(a): Min. Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, julgado em 29/03/2000, DJ 16-04-2004 PP-00054 EMENT VOL-02147-14 PP-02659). Assim, a Lei Estadual Paulista deveria adotar fator de correção e/ou taxas de juros iguais ou inferiores aos utilizados pela União, o que efetivamente não ocorreu no dispositivo legal ora em comento. Ademais, "o Código Tributário Nacional, definidor das normas gerais de Direito Tributário, expõe, no §1º do artigo 161, que os juros de mora serão calculados à taxa de 1% ao mês, se não houver lei que disponha de maneira diversa. Ora, considerando que o CTN estabelece princípios gerais a serem seguidos no âmbito da matéria, conclui-se que qualquer disposição que regulamente as taxas de juros deve respeitar o limite de 1% ao mês do artigo 161." (TJSP. 6ª Câmara de Direito Público. Apelação n. 0005079-42.2014.8.26.0495. Rel. Des. Reinaldo Miluzzi. J. 04.04.2016). Por fim, com relação ao argumento de ausência de aplicação do decidido na ADI n. 442 e na Arguição de Inconstitucionalidade n. 0170909-61.2012.8.26.0000 ao presente caso, tem-se que "o juízo sobre a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade do preceito normativo questionado constituirá, apenas e tão somente, um juízo de natureza incidental, tomado como motivo ou fundamento para o julgamento do pedido propriamente dito. Nessas circunstâncias, a decisão do incidente não produz coisa julgada material, (...). E, ainda que o fizesse, a eficácia subjetiva da decisão não seria erga omnes, pois limitar-se-ia aos partícipes da relação jurídica processual em que o referido incidente tenha sido julgado" (AgR. nos ED na AR nº 2.482, Pleno, rel Min. Teori Zavascki, j. em 11.5.2016). Contudo, nos termos do art. 949, parágrafo único, Novo CPC, "os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão especial a arguição de inconstitucionalidade quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão", o que implica a observância pelos órgãos fracionários ao decidido pelo Órgão Especial, lembrando que o artigo 97 da Constituição Federal impede que eles próprios declarem inconstitucionalidade. Assim, "a existência de anterior suscitação de incidente de inconstitucionalidade da mesma legislação estadual impugnada evidencia o fenômeno processual da litispendência, impedindo a instauração de novo incidente, mesmo porque o julgamento do Órgão Especial tem efeito vinculante em relação aos órgãos fracionários do Tribunal, segundo o par. único do art. 481 do CPC" (Arguição de Inconstitucionalidade nº 0247524-92.2012.8.26.0000, Órgão Especial, rel. Des. Itamar Gaino, j. em 12.12.2012). Por essas razões, não se há de cogitar de afronta à cláusula de reserva de plenário nem de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal, uma vez que as decisões supracitadas se amoldam ao caso concreto" [Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Apelação nº 1044904-70.2016.8.26.0053, Comarca de São Paulo, 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, Des (a): Maurício Fiorito, Data do Julgamento: 15/08/2017]. Diante da situação, determina-se a suspensão da exigibilidade do crédito tributário lavrado, AIIM nº 4.120.264-8 (fls. 49/73), advindo da autuação realizada, com a aplicação dos juros no percentual da legislação estadual, deferindo-se a retificação da certidão de dívida ativa. É imperioso ressaltar o fato que a exclusão dos juros moratórios fixados com base na legislação estadual [Lei nº 13.918/2009] não torna as certidões de dívida ativa inexigíveis, nem implica na declaração de sua nulidade (raciocínio que serve para o procedimento administrativo de autuação). Existe apenas a necessidade da apresentação pela Fazenda de um novo cálculo do valor do crédito tributário devido, com a correta incidência (Taxa SELIC), retificando a certidão, permitindo-se a realização do pagamento ou mesmo do parcelamento. Esta é a lei. "Artigo 203. A omissão de quaisquer dos requisitos previstos no artigo anterior, ou o erro a eles relativo, são causas de nulidade da inscrição e do processo de cobrança dela decorrente, mas a nulidade poderá ser sanada até a decisão de primeira instância, mediante substituição da certidão nula, devolvido ao sujeito passivo, acusado ou interessado o prazo para defesa, que somente poderá versar sobre a parte modificada" [Código Tributário Nacional]. De igual modo. "§ 8º. Até a decisão de primeira instância, a Certidão de Dívida Ativa poderá ser emendada ou substituída, assegurada ao executado a devolução do prazo para embargos" [Lei de Execução Fiscal]. A jurisprudência tem decidido sobre o tema da nulidade da certidão: "Execução fiscal. ICMS. Exceção de pré-executividade. Acolhimento parcial para efeito de aplicação da Taxa Selic, com negativa de extinção do processo por nulidade do título ou de suspensão até trânsito em julgado da sentença na ação anulatória ajuizada. Agravo de instrumento. Pedido de gratuidade judiciária indeferido na falta de demonstração do direito ao benefício, que não decorre automaticamente do processo de recuperação judicial. Correção do título executivo com substituição da aplicação da Lei Estadual n. 13918/09 pela da taxa Selic que não implica nulidade da CDA ou extinção da execução fiscal, nem seu sobrestamento pela existência de ação de nulidade sem prova de decisão de suspensão da exigibilidade. Agravo de instrumento não provido. Inexistência de omissão no acórdão. Embargos de declaração rejeitados" [Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, 10ª Câmara de Direito Público, Embargos de Declaração nº 2003478-94.2014.8.26.0000, Des (a): Antônio Celso Aguilar Cortez, Data do Julgamento: 07/04/2014]. Resta a multa. A multa incide se e quando não adimplida a obrigação tributária, com nítido caráter preventivo e inibitório. No entanto, conforme citação inserta no v. acórdão [Recurso de Apelação / Remessa Necessária nª 1000112-15.2018.8.26.0068], o Colendo Supremo Tribunal Federal vem compreendendo pela limitação na cobrança das multas moratórias, com esteio na Constituição Federal [artigo 150, inciso VI], quando se veda a utilização do tributo com efeito de confisco, reconhecendo a inconstitucionalidade das multas fixadas com índice superior a duzentos por cento do valor do tributo devido (AgRg no AI nº 830.300-SC, 1ª Turma, 06/12/2011, Ministro Luiz Fux), índice superior a cem por cento ou mais do valor do tributo (AgRg no RE nº 657.372-RS, 2ª Turma, 28/05/2013, Ministro Ricardo Lewandowski), ou quantia que supere o valor do próprio tributo (AgRg no RE nº 754.554-GO, 2ª Turma, 22/10/2013, Ministro Celso de Melo). Aqui, verifica-se que a multa moratória punitiva corresponde a 732% do valor do imposto cobrado, conforme aperícia (fls. 1.441), com a presença de gráfico comparativo: "i) Pode o Sr. Perito confirmar se a multa cobrada no auto de infração supera o montante do imposto reclamado? Se sim, qual o percentual cobrado a título de multa? Resposta: A resposta ao presente quesito é afirmativa. Conforme consta do AIIM n. 4.120.264-8, lavrado em . 155/480 dos autos, o valor da multa aplicada corresponde ao percentual de (732%) se comparada ao valor original do tributo (...)", O valor da multa deverá ser reduzido para o limite de cem por cento (100%) do valor devido, conforme entendimento adotado pela Suprema Corte. Quanto à aplicação dos juros de mora e multa, não se verifica nenhuma irregularidade; não se trata de "bis in idem". A situação encontra amparo no Código Tributário Nacional. "O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição de penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária" [artigo 161] (grifei). Ressalta-se ainda que os acréscimos legais incidentes sobre o crédito fiscal são institutos de natureza diversa, pois a multa é imposta como penalidade pelo não cumprimento da obrigação tributária no prazo estipulado e os juros moratórios mostram-se como uma espécie de indenização devida ao credor pela demora no pagamento. Nesse sentido, o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, citado no acórdão proferido pela 14ª Câmara de Direito Público do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo [Agravo de Instrumento nº 2268956-26.2018.8.26.0000]: "É legítima a cumulação da multa fiscal com os juros moratórios" [REsp 261116/SC, Ministro Francisco Peçanha Martins, 2ª Turma, j. 20.11.2003], e não configura "bis in idem" [REsp 624880/RS, Ministro João Otávio de Noronha, 2ª Turma, Data do Julgamento: 12/12/2006]. Finalmente, para efeito de julgamento, e nos limites da legislação [artigo 489 do Código de Processo Civil], todos os outros argumentos deduzidos no processo não são capazes, em tese, de infirmar a conclusão adotada. Este o direito. [IV] Dispositivo Em face de todo o exposto, com fundamento nos preceitos incidentes [artigo 355, inciso I, artigo 487, inciso I, artigo 927, todos do Código de - ADV: JOSE LUIZ MATTHES (OAB 76544/SP)
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