Processo nº 0907414-58.2022.8.20.5001
ID: 260660260
Tribunal: TJRN
Órgão: Gab. Desª. Berenice Capuxú na Câmara Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0907414-58.2022.8.20.5001
Data de Disponibilização:
25/04/2025
Polo Passivo:
Advogados:
BRUNO HENRIQUE SALDANHA FARIAS
OAB/RN XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0907414-58.2022.8.20.5001 Polo ativo L. L. B. Advogado(s): BRUNO HENRIQUE SALDANH…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0907414-58.2022.8.20.5001 Polo ativo L. L. B. Advogado(s): BRUNO HENRIQUE SALDANHA FARIAS Polo passivo UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO Advogado(s): RODRIGO MENEZES DA COSTA CAMARA APELAÇÃO CÍVEL Nº 0907414-58.2022.8.20.5001 APELANTE: L. L. B. ADVOGADO: BRUNO HENRIQUE SALDANHA FARIAS APELADO: UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO ADVOGADO: RODRIGO MENEZES DA COSTA CAMARA Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. PLANO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. FORNECIMENTO EM AMBIENTE ESCOLAR. NEGATIVA DE COBERTURA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que negou pedido de obrigação de fazer e indenização por danos morais em razão da recusa do plano de saúde em custear tratamento multidisciplinar para paciente com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no ambiente escolar. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) determinar se o plano de saúde deve cobrir tratamento multidisciplinar para paciente com TEA no ambiente escolar; (ii) verificar se a recusa configura prática abusiva ensejadora de indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O plano de saúde deve fornecer o tratamento prescrito pelo médico, desde que esteja dentro do escopo dos serviços médico-hospitalares contratados, não podendo impor limitações arbitrárias. 4. O tratamento multidisciplinar para pacientes com TEA é contemplado pelo rol da ANS, mas sua aplicação deve ocorrer em ambiente clínico, não sendo obrigatória a cobertura em ambiente escolar ou domiciliar. 5. A exigência de custeio de atendentes terapêuticos em ambiente escolar extrapola a finalidade do contrato de plano de saúde, pois se trata de serviço de natureza pedagógico-educacional, não médica. 6. O entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte é no sentido de que a negativa de cobertura para atendimento terapêutico em ambiente escolar não configura prática abusiva. 7. A recusa do plano de saúde não caracteriza dano moral, pois decorre do exercício regular de um direito contratual e legalmente respaldado. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: 1. O plano de saúde não é obrigado a custear tratamento multidisciplinar para pacientes com Transtorno do Espectro Autista (TEA) em ambiente escolar, pois se trata de serviço de natureza pedagógico-educacional. 2. A negativa de cobertura para atendimento terapêutico em ambiente escolar não caracteriza prática abusiva nem enseja indenização por danos morais. Dispositivos relevantes citados: Código de Defesa do Consumidor, arts. 14 e 51, IV e §1º; Lei nº 9.656/1998, art. 10, §4º; Código de Processo Civil, art. 85, §11, e art. 1.026, §2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 2038651/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJ 09/12/2022; TJRN, AC 0820090-69.2023.8.20.5106, Rel. Des. Virgílio Macêdo, Segunda Câmara Cível, julgado em 21/06/2024; TJRN, AC 0821881-34.2022.8.20.5001, Rel. Des. Ibanez Monteiro, Segunda Câmara Cível, julgado em 16/04/2024; TJRN, AC 0823802-91.2023.8.20.5001, Rel. Des.ª Lourdes Azevedo, Segunda Câmara Cível, julgado em 10/02/2025. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima nominadas, ACORDAM os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por maioria de votos, conhecer da apelação cível e negar-lhe provimento, nos termos do voto do redator para o acórdão, parte integrante deste. Vencida a relatora Desembargadora Berenice Capuxú. RELATÓRIO Apelação Cível (Id. 28927135) interposta por L. L. B, representado por sua genitora GLAUCIA FERREIRA LEITE, contra sentença (Id. 28927130) proferida pelo Juízo da 18ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN que, nos autos da ação de obrigação de fazer em epígrafe, movida em desfavor da UNIMED NATAL – SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, julgou improcedente os pedidos autorais, nos seguintes termos: “Afirma a parte autora, em petição inicial (ID 90760687), que é usuária do plano de saúde da parte ré sob o n. 0 062 003001263746 0, estando com o pagamento em dia. Aduz que foi diagnosticada com TEA (Transtorno do Espectro Autista), e que os médicos assistentes prescreveram tratamento: PSICOLOGIA pelo método ABA – 20h semanais com auxílio de assistente terapêutico (AT) em ambiente clínico (2h por dia) e ambiente escolar (2h por dia) com supervisão semanal do profissional certificado no método ABA, FONOAUDIOLOGIA pelo método PECS (2x na semana), TERAPIA OCUPACIONAL (2x na semana), PSICOMOTRICIDADE (2x na semana) e PSICOPEDAGOGIA (2x na semana), os quais vêm sendo realizados desde o início das investigações. (…) Ao final, requer: a) a justiça gratuita; b) a inversão do ônus da prova; c) a concessão de medida liminar, determinando que a ré promova, de forma imediata, a autorização e custeio do tratamento multidisciplinar do Autor com profissionais especialistas, nos termos da prescrição médica acostada aos autos, incluindo a Terapia ABA em ambiente clínico e escolar, com o auxílio de assistente terapêutico, nos termos da prescrição médica, sob pena de multa; d) a procedência da ação, cominando ao réu a obrigação de autorizar e custear a terapia indicada, com o fornecimento dos materiais e insumos necessários, sem imposição de limites de sessões, nos termos da prescrição médica; e) a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais) em favor do autor, acrescido de correção monetária e juros moratórios. (…) É entendimento consolidado que não compete ao Poder Judiciário obrigar os planos de saúde a ofertarem profissional que terá sua atuação restrita a outras áreas, que não a da saúde propriamente dita. Em outras palavras, o plano de saúde deve restringir-se a cumprir com a realização do tratamento em ambiente clínico, posto que tal realização no seio domiciliar e escolar extrapola os limites da responsabilidade da seguradora de saúde. Isto, porque, muito embora o TEA (transtorno do espectro autista) esteja previsto como doença de cobertura obrigatória no Rol da ANS, e por ser o autor uma criança, que deve ter proteção integral, a pretensão autoral extrapola o âmbito do contrato de plano de saúde, de modo que a parte ré não está obrigada, nem por lei, nem pelo contrato, a arcar com esse custo. Não está a negar, esta julgadora, a importância dessa medida para uma evolução do quadro clínico do menor, apenas que, eventual concessão para os espaços domiciliares e escolares, não se coaduna com os serviços de assistência à saúde contratados pelo promovente junto à UNIMED. (…) Ante o exposto, julgo improcedente a pretensão autoral, declarando extinto com resolução do mérito o presente processo, nos termos do que rege o artigo 487, I, do CPC. Custas e honorários pela parte demandante, aquelas na forma regimental e estes que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, de conformidade com o que prevê o art. 85, § 2º do CPC, cuja cobrança fica suspensa por ser beneficiária da gratuidade judiciária.” Em suas razões, o recorrente sustentou a necessidade de realização da terapia ABA em ambiente escolar, informando para tanto que o “objeto de estudo que é o comportamento, o profissional analista do comportamento, realiza através de avaliações com protocolos o mapeamento com o levantamento de dados sobre os déficits e excessos comportamentais. Essa avaliação é realizada em todos os ambientes naturais em que o paciente frequenta: domicílio, escola, clínica, dentre outros. A importância de ser em um ambiente natural é devido a fidelidade dos dados obtidos, então o profissional responsável pela avaliação acompanha o paciente em todos esses locais, e observa como este interage no meio inserido, e como é a interação do meio com este.”. Dessa forma, alegou que o assistente terapêutico é o responsável por fazer toda a implantação do que foi planejado pelo analista do comportamento, tendo este profissional a função de manejar comportamentos adequados para que os pacientes possam ter uma melhor qualidade de vida da criança. Logo, entende que a limitação da terapia restrita ao ambiente clínico incorre em uma perda significativa para o desenvolvimento do infante. Portanto, pugnou, ao final, a reforma da sentença para julgar totalmente procedente o pleito autoral. Gratuidade de justiça deferida na origem. Contrarrazões apresentadas, rebatendo os argumentos autorais (Id. 28927137). O Ministério Público, por meio do seu 17º Procurador de Justiça, Dr. Herbert Bezerra, apresentou parecer pelo conhecimento e provimento do apelo, tendo em vista a necessidade de aplicação da Lei nº 14.454/22 ao caso concreto, por se tratar de pessoa autista (Id. 29158817). É o que importa relatar. VOTO Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade do recurso, dele conheço, ressaltando que se evidenciam o cabimento do recurso, a legitimação para recorrer, o interesse recursal, a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, bem como a tempestividade e a regularidade formal, tratando-se de recorrente beneficiário da gratuidade da justiça (Id 92974392). Cinge-se a controvérsia em saber se o plano de saúde deve ser compelido a custear o tratamento prescrito pelo médico, para tratamento de paciente com transtorno do espectro autista, em ambiente escolar, bem como se, em caso de recusa indevida, é cabível indenização por danos morais. Nos termos da sentença recorrida, o pedido autoral versa tão somente a respeito da negativa de autorização de tratamento no ambiente natural da criança, qual seja, o escolar. Compulsando os autos, observa-se que o autor é pessoa com diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA), não se contestando seu diagnóstico ou a necessidade de tratamento, mas apenas se este deve ser fornecido fora do ambiente clínico. Conforme entendimento pacífico dos Tribunais pátrios, somente ao médico que acompanha o caso é dado estabelecer qual o tratamento adequado para alcançar a cura ou amenizar os efeitos da enfermidade que acometeu o paciente, não estando o plano de saúde habilitado, tampouco autorizado a limitar as alternativas possíveis para o restabelecimento da saúde do usuário, sob pena de colocar em risco a vida do consumidor. Ou seja, o plano de saúde não pode determinar o tipo de tratamento utilizado para a cura de cada enfermidade. No que concerne especificamente ao tratamento multidisciplinar requerido, a ANS contempla este método terapêutico nas sessões de psicoterapia constantes no rol de saúde complementar, além de outros tipos existentes para tratar pessoas com diagnóstico de transtornos globais do desenvolvimento. Contudo, não obstante esse entendimento, o plano de saúde não deve ser obrigado a custear serviços que fogem à finalidade de sua natureza contratual, a exemplo do fornecimento de atendentes terapêuticos em ambientes escolar e domiciliar, por não guardarem pertinência com objeto contratual, de maneira que seu fornecimento constitui providência que extrapola o escopo do contrato firmado entre as partes. Nessa linha é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme excerto ora colacionado: (…) Nas razões do recurso especial (e-STJ, fls. 1.007-1.029), a recorrente alega violação aos arts. 1.022 do CPC; 10, § 4º, e 12, VI, da Lei 9.656/1998; 421 e 421-A; 51, IV, do CDC. Sustenta, além de negativa de prestação jurisdicional, que o tratamento prescrito pelo médico não está previsto no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, não havendo, desse modo, nenhuma obrigação legal ou contratual para o seu custeio. Defende a taxatividade do rol de procedimentos elaborado pela ANS, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. O Tribunal de origem admitiu o processamento do recurso especial, ascendendo os autos a esta Corte Superior (e-STJ, fls. 1.076-1.077). Brevemente relatado, decido. A recusa de cobertura do tratamento prescrito pelo plano de saúde não pode ser confirmada, excetuado o acompanhamento terapêutico conforme será abordado adiante. Com efeito, não é dado à ré, salvo em situações excepcionais, não caracterizadas no caso concreto, o direito de interferir na prescrição médica. (...) [...] Embora a ré sustente que o tratamento prescrito à autora carece de cobertura contratual e não consta do rol da ANS, a referida regulamentação administrativa possui somente natureza de diretriz, constituindo referência básica aos operadores de planos e seguros de saúde na prestação de seus serviços, não tendo o condão de limitar direitos estipulados contratualmente, de modo que a recusa de cobertura se mostra abusiva, sob a perspectiva dos artigos 14 e 51, IV e § 1º do Código de Defesa do Consumidor. Ademais, os precedentes invocados pela ré de que o rol dos procedimentos da ANS tem caráter taxativo não são vinculantes e, portanto, não geram o dever de reforma da sentença com base no entendimento lá externado. [...] Não bastasse, em 17/02/2021 entrou em vigor a Resolução nº 469 da ANS, de acordo com a qual é obrigatória a cobertura de sessões com psicólogos, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos para o tratamento do transtorno do espectro autista, sem qualquer limitação. Por outro lado, está consolidado no âmbito desta Corte o entendimento de que eventuais despesas com acompanhantes terapêuticos, seja em ambiente escolar ou domiciliar, possuem natureza educacional e não integram o escopo dos contratos de planos e seguros saúde, não sendo, assim, de cobertura obrigatória, conforme já decidido por esta Câmara: (...) Neste panorama, a sentença comporta reforma para incluir a obrigação de custeio das sessões de musicoterapia e equoterapia, ficando excluída apenas a cobertura de atendimento terapêutico em ambiente escolar. (REsp 2038651 - SP (2022/0363069-3), Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Publicação: DJ de 09/12/2022). (Destaques acrescidos). Desse modo, embora exista todo um arcabouço legal no intuito de proteger não apenas o consumidor, mas também as pessoas acometidas por doenças, transtornos ou condições que requerem uma maior atenção do legislador, no que toca especificamente a obrigatoriedade de fornecimento de terapias multidisciplinares no ambiente natural da criança, ou seja, com aplicação nos ambientes escolares e domiciliar, tem-se que essas coberturas fogem da responsabilidade do plano de saúde. Isso porque esses atendimentos não guardam correlação com os atendimentos e serviços médicos que devem ser prestados pelo plano de saúde, possuindo natureza de serviços pedagógico-educacionais, cujo fornecimento extrapola os limites do contrato e a finalidade do plano de saúde. Sobre o tema, veja-se o entendimento desta Corte de Justiça: EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. APLICAÇÃO DO CDC NOS CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA QUANTO AO FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. APELANTE ACOMETIDO DE AUTISMO. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE NA NEGATIVA DA COBERTURA DO PLANO DE SAÚDE QUANTO À REALIZAÇÃO DO TRATAMENTO EM AMBIENTE DOMICILIAR OU ESCOLAR. PEDIDO QUE EXTRAPOLA OS SERVIÇOS MÉDICO-HOSPITALARES CONTRATADOS. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. 1. In casu, resguarda-se o direito do apelante à assistência multidisciplinar a ser prestada em ambiente clínico oferecido pela operadora de saúde. Entretanto não se revela abusiva a negativa da cobertura do plano de saúde quanto à realização do tratamento na escola e na residência do recorrente. 2. Precedente do TJRN (AC, 0804753-64.2023.8.20.5001, Dra. Martha Danyelle Barbosa substituindo Des. Amilcar Maia, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 10/04/2024, PUBLICADO em 11/04/2024; AC 0821881-34.2022.8.20.5001, Des. Ibanez Monteiro, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 16/04/2024, PUBLICADO em 16/04/2024).3. Apelo conhecido e desprovido. (TJRN, AC 0820090-69.2023.8.20.5106, Des. Virgílio Macêdo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 21/06/2024, PUBLICADO em 23/06/2024). EMENTA: DIREITOS CONSTITUCIONAL, CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO EM AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE LIMINAR INAUDITA ALTERA PARS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. PACIENTE PORTADOR DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). COBERTURA PELO PLANO DE SAÚDE DO TRATAMENTO POR MEIO DE ANÁLISE DO COMPORTAMENTO APLICADA (ABA) NO AMBIENTE CLÍNICO. PRETENSÃO DE EXTENSÃO DO CUSTEIO PARA O CONTEXTO ESCOLAR E DOMICILIAR. AUSÊNCIA DE AMPARO LEGAL. ASSISTENTE TERAPÊUTICO. PROFISSÃO NÃO REGULAMENTADA. IMPOSSIBILIDADE DE CREDENCIAMENTO. PLEITO PELO RECONHECIMENTO DE DANOS MORAIS INDENIZÁVEIS. DESCABIMENTO. PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO DESPROVIDO. (TJRN, AC 0821881-34.2022.8.20.5001, Des. Ibanez Monteiro, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 16/04/2024, PUBLICADO em 16/04/2024). EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). FORNECIMENTO DE TERAPIAS EM AMBIENTES DOMICILIAR E ESCOLAR. NATUREZA EDUCATIVO-PEDAGÓGICA. EXCLUSÃO DE COBERTURA CONTRATUAL. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. RECURSO DESPROVIDO. (TJRN, AC 0823802-91.2023.8.20.5001, Des. ª Lourdes Azevedo, Segunda Câmara Cível, julgado em 10/02/2025, publicado em). Nesse sentido, entende-se que a negativa do plano de saúde em fornecer o tratamento pretendido, especificamente nos ambientes naturais da criança, não é abusiva, pois a referida cobertura foge à obrigação contratada, devendo o recorrido ser obrigado a fornecer o tratamento multidisciplinar apenas em ambiente clínico, inexistindo, portanto, o dever de indenizar. Diante do exposto, conheço da apelação e nego-lhe provimento, confirmando a sentença por seus próprios fundamentos. Majoro os honorários advocatícios em 2% (dois por cento), nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, suspensa sua exigibilidade em razão da gratuidade da justiça. Por fim, dou por prequestionados todos os dispositivos indicados pelo recorrente nas razões recursais, registrando que se considera manifestamente procrastinatória a interposição de embargos declaratórios com intuito nítido de rediscutir a decisão, nos termos do art. 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil. É como voto. Natal/RN, data de registro no sistema. Juiz Convocado Roberto Guedes Redator para o acórdão 15 VOTO VENCIDO VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço o recurso. A controvérsia reside na obrigação da operadora de saúde de custear os tratamentos específicos indicados para o autor, diagnosticado com Transtorno do Espectro do Autismo - TEA e requer terapias constantes e especializadas. Inicialmente, cabe destacar que, nos termos da Lei nº 9.656/1998 e do Código de Defesa do Consumidor, os contratos de planos de saúde devem ser interpretados à luz dos princípios da boa-fé e da função social, de modo a garantir o pleno atendimento das necessidades dos consumidores. Quanto à cobertura do tratamento, o Superior Tribunal de Justiça tem posicionamento consolidado de que o rol da ANS é de taxatividade mitigada, conforme julgados a seguir: “RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. NATUREZA TAXATIVA, EM REGRA, DO ROL DA ANS. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR PRESCRITO PARA BENEFICIÁRIO PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. MUSICOTERAPIA. COBERTURA OBRIGATÓRIA. REEMBOLSO INTEGRAL. EXCEPCIONALIDADE. 1. Ação de obrigação de fazer, ajuizada em 23/10/2020, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 06/04/2022 e concluso ao gabinete em 15/12/2022. 2. O propósito recursal é decidir sobre: (i) a negativa de prestação jurisdicional; (ii) a obrigação de a operadora do plano de saúde cobrir as terapias multidisciplinares prescritas para usuário com transtorno do espectro autista, incluindo a musicoterapia; e (iii) a obrigação de reembolso integral das despesas assumidas pelo beneficiário com o custeio do tratamento realizado fora da rede credenciada. 3. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação do art. 1.022, II, do CPC/15. 4. Embora fixando a tese quanto à taxatividade, em regra, do rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS, a Segunda Seção negou provimento ao EREsp 1.889.704/SP da operadora do plano de saúde, para manter acórdão da Terceira Turma que concluiu ser abusiva a recusa de cobertura de sessões de terapias especializadas prescritas para o tratamento de transtorno do espectro autista (TEA). 5. Ao julgamento realizado pela Segunda Seção, sobrevieram diversas manifestações da ANS, no sentido de reafirmar a importância das terapias multidisciplinares para os portadores de transtornos globais do desenvolvimento, dentre os quais se inclui o transtorno do espectro autista, e de favorecer, por conseguinte, o seu tratamento integral e ilimitado. 6. A musicoterapia foi incluída à Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde, que visa à prevenção de agravos e à promoção e recuperação da saúde, com ênfase na atenção básica, voltada para o cuidado continuado, humanizado e integral em saúde (Portaria nº 849, de 27 de março de 2017, do Ministério da Saúde), sendo de cobertura obrigatória no tratamento multidisciplinar, prescrito pelo médico assistente e realizado por profissional de saúde especializado para tanto, do beneficiário portador de transtorno do espectro autista. 7. Segundo a jurisprudência, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento, e, nessas circunstâncias, poderá ser limitado aos preços e às tabelas efetivamente contratados com o plano de saúde. 8. Distinguem-se, da hipótese tratada na orientação jurisprudencial sobre o reembolso nos limites do contrato, as situações em que se caracteriza a inexecução do contrato pela operadora, causadora de danos materiais ao beneficiário, a ensejar o direito ao reembolso integral das despesas realizadas por este, a saber: inobservância de prestação assumida no contrato, descumprimento de ordem judicial que determina a cobertura do tratamento ou violação de atos normativos da ANS. 9. Hipótese em que deve ser mantido o tratamento multidisciplinar prescrito pelo médico assistente para o tratamento de beneficiário portador de transtorno do espectro autista, inclusive as sessões de musicoterapia, sendo devido o reembolso integral apenas se demonstrado o descumprimento da ordem judicial que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, observados os limites estabelecidos na sentença e no acórdão recorrido com relação à cobertura da musicoterapia e da psicopedagogia. 10. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp n. 2.043.003/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 21/3/2023, DJe de 23/3/2023.)” “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA DE TERAPIA MULTIDISCIPLINAR. EQUOTERAPIA. HIDROTERAPIA. PACIENTE DIAGNOSTICADO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA - TEA. 1. Controvérsia pertinente à cobertura de terapia multidisciplinar a paciente diagnosticado com transtorno do espectro autista. 2. Existência de manifestação técnica da ANS sobre a autonomia do terapeuta na escolha do método de terapia a ser aplicado a pacientes diagnosticados com transtornos globais do desenvolvimento. Parecer Técnico ANS 39/2021 e RN ANS 593/2022. 3. Desnecessidade de previsão específica do método terapêutico no Rol da ANS. 4. Superveniência de norma regulatória (RN ANS 541/2022) excluindo a limitação do número de sessões cobertas de fisioterapia, terapia ocupacional e psicoterapia. 5. Precedente específico da Segunda Seção no sentido da obrigatoriedade de cobertura de terapia multidisciplinar, sem limitação do número de sessões, mitigando a taxatividade do Rol da ANS. 6. Superveniência da Lei n. 14.454/2022, revigorando, com temperamentos, a tese do caráter exemplificativo do aludido rol. 7. "Na linha da manifestação do Conselho Federal de Medicina e do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, o legislador editou a Lei 13.830/2019, na qual reconheceu a equoterapia como método de reabilitação que utiliza o cavalo em abordagem interdisciplinar nas áreas de saúde, educação e equitação voltada ao desenvolvimento biopsicossocial da pessoa com deficiência (§ 1º do art. 1º), cuja prática está condicionada a parecer favorável em avaliação médica, psicológica e fisioterápica" (REsp n. 2.049.092/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 11/4/2023, DJe de 14/4/2023). Agravo interno improvido. (AgInt no REsp n. 2.049.888/SP, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 13/11/2023, DJe de 17/11/2023.) Além do mais, a Resolução Normativa nº 539 da ANS estabeleceu a obrigatoriedade, a partir de 1º de julho de 2022, da “cobertura de método ou técnica indicados pelo médico assistente” para tratar a doença ou agravo do paciente diagnosticado com algum dos transtornos que compõem o CID F84, a exemplo do espectro autista (TEA). Feitas tais considerações, destaco que os pareceres médicos anexados aos autos (Id’s. 28926091, 28926092 e 28926093) evidenciam a necessidade da criança em ter, de forma contínua e integrada, as terapias prescritas, cabendo exclusivamente aos médicos que o acompanham definir quais procedimentos são mais adequados, sem que o plano de saúde possa interferir ou limitar o número de sessões necessárias. Além disso, mesmo que possam limitar as doenças cobertas, uma vez inserida uma enfermidade no contrato, é inadmissível que a operadora restrinja ou condicione o acesso a tratamentos fundamentais. O argumento da ausência no rol da ANS ou da alegação de que o tratamento tem caráter experimental não se sustenta. A negativa de cobertura (Id. 28926094), nesse contexto, configura prática abusiva e viola a boa-fé objetiva e a função social do contrato, previstos no art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). O contrato de plano de saúde, por sua natureza, deve atender às finalidades de proteção à vida e à saúde dos beneficiários, sendo vedadas cláusulas que frustrem essas finalidades. A Lei nº 12.764/12 assegura às pessoas com Transtorno do Espectro Autista - TEA o direito ao atendimento multiprofissional e integral, conforme dispõe seu art. 3º, inciso III. O tratamento indicado para o menor está respaldado por laudo médico, que deve ser respeitado pelo plano de saúde, conforme o art. 10, § 13, da Lei nº 9.656/98, alterada pela Lei nº 14.454/22, que reforça o caráter exemplificativo do rol de procedimentos da ANS. A Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS, por sua vez, ao determinar a cobertura obrigatória dos métodos prescritos para pacientes diagnosticados com transtornos globais do desenvolvimento, veda qualquer limitação quantitativa ou qualitativa que comprometa a efetividade do tratamento. Dessa forma, compete ao médico assistente a definição do tratamento mais adequado ao paciente, sendo abusiva qualquer ingerência da operadora do plano de saúde nesse sentido. Ademais, no caso específico de tratamentos voltados para pacientes com TEA, é amplamente reconhecido que abordagens multidisciplinares, como o método ABA, Assistente Terapêutico, Psicopedagogia e acompanhamento nutricional, são essenciais para a promoção da qualidade de vida e desenvolvimento da criança. A jurisprudência recente desta Câmara reforça esse entendimento, conforme julgados: “EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). LIMITAÇÃO DE SESSÕES NUTRICIONAIS. PRESCRIÇÃO MÉDICA. NECESSIDADE DE ACOMPANHAMENTO POR EQUIPE MULTIDISCIPLINAR, ESPECIFICAMENTE NUTRICIONISTA ESPECIALIZADA EM SELETIVIDADE ALIMENTAR. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE COMO GARANTIA CONSTITUCIONAL. DANO MORAL QUE MERECE SER MANTIDO NOS TERMOS DA SENTENÇA. APELOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.1. Recurso de apelação em que se discute a limitação, por plano de saúde, de consultas nutricionais para criança diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA).2. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC), com base no artigo 14 e Súmula 608 do STJ.3. O direito à saúde, previsto na Constituição Federal de 1988, garante a cobertura de tratamentos necessários, conforme indicação médica especializada, não cabendo às operadoras limitar os tratamentos prescritos para doenças cobertas pelo contrato.4. Rol da ANS com natureza taxativa mitigada, conforme entendimento consolidado pelo STJ e Lei nº 14.454/2022.5. Dano moral que deve ser mantido, nos termos arbitrados m sentença (R$ 2.000,00), em observância aos princípios de razoabilidade e proporcionalidade.6. Manutenção da sentença de origem.7. Recursos conhecidos e desprovidos.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0861817-66.2022.8.20.5001, Desª. Berenice Capuxú, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 18/09/2024, PUBLICADO em 26/09/2024) “EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR AO QUE TEM TRANSTORNO DO ESPECTO AUTISMO (TEA). TERAPIA OCUPACIONAL, FONOAUDIOLOGIA, PSICOLOGIA E PSICOMOTRICIDADE. MÉTODO ABA. TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA NA ORIGEM. IRRESIGNAÇÃO. PRETENSÃO RECURSAL PARA EXCLUSÃO/LIMITAÇÃO DO CUSTEIO DO TRATAMENTO. NÃO ACOLHIMENTO. NEGATIVA DE COBERTURA. ROL DA ANS. NATUREZA TAXATIVA MITIGADA. IMPOSSIBILIDADE DAS RESTRIÇÕES IMPOSTAS. PRESCRIÇÃO MÉDICA EXPRESSA. NECESSIDADE DO TRATAMENTO. PREVALÊNCIA DO DIREITO À SAÚDE. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES.” (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0806953-75.2024.8.20.0000, Desª. Berenice Capuxú, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 27/09/2024, PUBLICADO em 30/09/2024) “EMENTA: CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO LIMINAR INAUDITA ALTERA PARS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUTOR PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA – TEA. CONCESSÃO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. TERAPIA ABA, ASSISTENTE TERAPÊUTICO, FONOAUDIOLOGIA, PSICOMOTRICIDADE, NATAÇÃO TERAPÊUTICA, PSICOPEDAGOGIA E PROCEDIMENTO OCUPACIONAL COM INTEGRAÇÃO SENSORIAL DE AYRES. SUSPENSIVIDADE NÃO CONCEDIDA. NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DOS CUIDADOS MÉDICOS PRESCRITOS. AGRAVO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0806817-78.2024.8.20.0000, Desª. Berenice Capuxú, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 18/09/2024, PUBLICADO em 19/09/2024) “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. DIREITO DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. CUSTEIO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. REABILITAÇÃO PELO MÉTODO PADOVAN DE REORGANIZAÇÃO NEUROFUNCIONAL, FONOAUDIOLOGIA PAC LINGUAGEM, PSICOLOGIA ABA, TERAPIA OCUPACIONAL COM INTEGRAÇÃO SENSORIAL, INTENSIVO E MANUTENÇÃO PEDIASUIT, PSICOLOGIA COM INTERVENÇÃO COGNITIVO COMPORTAMENTAL E PSICOMOTRICIDADE. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. NULIDADE DE SENTENÇA, POR CERCEAMENTO DE DEFESA, SUSCITADA PELA PROCURADORIA DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DAS PARTES PARA SE MANIFESTAREM SOBRE A SUPERVENIÊNCIA DE NOVA LEGISLAÇÃO. REJEIÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA DE PREJUÍZO. LITIGANTES QUE ENFATIZAM A FALTA DE INTERESSE EM NOVAS PROVAS, APESAR DE REFERIDA NORMA. RECURSO DO PLANO DE SAÚDE. FALTA DE OBRIGATORIEDADE DE CUSTEIO DO TRATAMENTO. AUSÊNCIA DE INCLUSÃO NO ROL DA ANS. REJEIÇÃO. LISTA EXEMPLIFICATIVA. RECUSA ABUSIVA. INTERPRETAÇÃO FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. DIREITOS FUNDAMENTAIS À VIDA E À SAÚDE. PREVALÊNCIA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. E DA PRESCRIÇÃO MÉDICA. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA MANTIDA. ABALO EMOCIONAL EVIDENTE. BASE DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS QUE NÃO MERECE ALTERAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER AFERÍVEL. PRECEDENTE DO STJ. RECURSO DA PARTE AUTORA. TRATAMENTO PSICOLÓGICO EM DOMICÍLIO E AMBIENTE ESCOLAR, COM ASSISTENTE TERAPÊUTICO. MÉTODO ABA. NECESSIDADE DEMONSTRADA. MELHOR TRATAMENTO CLÍNICO OU MÉDICO INDICADO PELOS PROFISSIONAIS QUE ACOMPANHAM O CASO. PRECEDENTES. MAJORAÇÃO DOS DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE. AUMENTO PARA VALOR COMPATÍVEL COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA 2ª CÂMARA CÍVEL. RECURSOS CONHECIDOS, MAS PROVIDO APENAS EM RELAÇÃO À REQUERENTE.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0801969-07.2021.8.20.5124, Desª. Berenice Capuxú, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 17/05/2024, PUBLICADO em 21/05/2024). Portanto, considerando o conjunto probatório constante dos autos, em principal os pareceres dos médicos que o assistem, as disposições legais aplicáveis e o entendimento consolidado nesta Corte e em tribunais superiores, concluo que a negativa da operadora de plano de saúde configura prática abusiva, incompatível com os princípios da boa-fé contratual e do direito fundamental à saúde, razão pela qual o Plano de Saúde ré deve promover Por fim, em relação aos danos morais, verifica-se que a negativa de cobertura causou aflição psicológica à autora e seus responsáveis, sendo inegável o impacto negativo em sua saúde e dignidade. É inegável que a parte autora, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista, amparada por laudo médico, buscou a assistência da operadora de saúde, mas teve o seu pleito negado de forma ilegítima. Assim, considerando que a falta de assistência em casos como esse implicam em angústia e sofrimento, forçosa a obrigação da operadora de saúde de reparar os danos a que deu ensejo, valendo dizer que se encontram devidamente caracterizados, também, a conduta e o nexo causal com o aventado prejuízo. Em idêntico sentir, o precedente a seguir: “PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTEGabinete do Desembargador Vivaldo Pinheiro - 3ª Câmara Cível Apelação Cível n° 0817191-98.2023.8.20.5106.Apelante: Unimed Natal – Sociedade de Cooperativa de Trabalho Médico.Advogado: Rodrigo Menezes Da Costa Câmara.Apelado: T. M. C., representado por Priscila Medeiros Moura.Advogada: Vivian Victória Pinheiro Valença de Albuquerque.Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro.Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E SAÚDE SUPLEMENTAR. RECURSO. PLANO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. COBERTURA OBRIGATÓRIA. EXCEÇÃO DA MUSICOTERAPIA. DANOS MORAIS CONFIGURADOS.I. CASO EM EXAME1. Paciente menor de idade, diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), teve prescrição médica para tratamento multidisciplinar incluindo psicopedagogo, fonoaudiólogo, psicólogo, terapeuta ocupacional com especialização em integração sensorial, musicoterapia e técnicas de psicomotricidade. A operadora do plano de saúde negou parte da cobertura, alegando existência de rede credenciada e contestando especificamente a obrigatoriedade da musicoterapia.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a operadora de plano de saúde tem obrigação de cobrir integralmente o tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com TEA; (ii) estabelecer se a negativa de cobertura configura dano moral indenizável.III. RAZÕES DE DECIDIR3. Aplica-se o CDC aos contratos de plano de saúde, conforme Súmula nº 608 do STJ.4. A RN ANS nº 539/2022, que modificou o art. 6º, § 4º, da RN nº 465/2021, determina que para portadores de transtornos globais do desenvolvimento, incluindo TEA, a operadora deve oferecer atendimento conforme método ou técnica indicados pelo médico assistente.5. A alegação genérica de disponibilidade de rede credenciada, sem comprovação específica dos prestadores aptos ao tratamento, não garante acesso efetivo ao tratamento necessário.6. A musicoterapia não se enquadra no rol de procedimentos médicos, extrapolando o objeto contratual e o escopo de cobertura obrigatória previsto na regulamentação da ANS.7. A negativa ilegítima de cobertura a paciente com TEA, amparado por laudo médico, configura dano moral indenizável.IV. DISPOSITIVO E TESE8. Recurso parcialmente provido apenas para afastar a obrigação de cobertura da musicoterapia.Tese de julgamento: “1. O plano de saúde deve fornecer cobertura integral do tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com TEA, conforme indicação do médico assistente, excetuando-se procedimentos que não se enquadrem como médicos, como a musicoterapia. 2. A negativa ilegítima de cobertura a tratamento prescrito para TEA configura dano moral indenizável.”Dispositivos relevantes citados: CDC; RN ANS nº 539/2022; RN ANS nº 465/2021, art. 6º, § 4º.Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula nº 608; STJ, EREsp 1886929; STJ, EREsp 1889704.ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0817191-98.2023.8.20.5106, Des. Vivaldo Pinheiro, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 29/11/2024, PUBLICADO em 29/11/2024) Passando à análise do quantum indenizatório, lembro que, no momento do arbitramento, o julgador utiliza do critério que melhor possa representar os princípios de equidade e de justiça, levando-se em conta as condições do ofensor e ofendido, como também a potencialidade do prejuízo, a sua permanência e seus reflexos no presente e no futuro. É certo, também, que o valor fixado a título de indenização deve compensar a dor sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular a ocorrência de outros episódios dessa natureza, e não pode gerar enriquecimento ilícito, tampouco ser ínfimo ao ponto de não atender ao seu caráter preventivo, tudo isso considerando, óbvio, os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Assim, seguindo julgados semelhantes desta Corte em casos análogos, arbitro em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a condenação para compensar o abalo moral experimentado pela autora, à luz das peculiaridades do caso e dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Diante do exposto, conheço e dou provimento ao apelo, para reconhecer o direito da criança ao tratamento vindicado, nos exatos termos determinados pelos médicos que o acompanham (Id’s. 28926091, 28926092 e 28926093), bem como, diante da negativa expressa do plano de saúde, condená-lo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por danos morais. Sobre a indenização, em virtude da relação contratual existente entre as partes, correrão juros de mora desde a citação, pelo INPC, até a data do arbitramento, quando a quantia passará a ser atualizada unicamente pela SELIC, englobando também a correção monetária. Com o resultado do julgamento, redistribuo o ônus sucumbencial a ser integralmente arcado pela parte demandada. Consideram-se prequestionados todos os dispositivos apontados pelas partes em suas respectivas razões. Será manifestamente protelatória eventual oposição de embargos de declaração com o propósito exclusivo de rediscutir a decisão da Câmara (art. 1.026, § 2º do CPC). É como voto. Desembargadora BERENICE CAPUXÚ RELATORA Natal/RN, 1 de Abril de 2025.
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