Processo nº 5083031-24.2023.4.04.7000
ID: 306511055
Tribunal: TRF4
Órgão: 14ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 5083031-24.2023.4.04.7000
Data de Disponibilização:
24/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DIOGO FERRARI
OAB/RJ XXXXXX
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IVAN LUIZ CAMARGO DOS SANTOS
OAB/PR XXXXXX
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PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITÓXICOS Nº 5083031-24.2023.4.04.7000/PR
ACUSADO
: LUIZ AUGUSTO LOPES
ADVOGADO(A)
: IVAN LUIZ CAMARGO DOS SANTOS (OAB PR061367)
ACUSADO
: CAIO CARVALHO REIS
ADVOGADO(…
PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITÓXICOS Nº 5083031-24.2023.4.04.7000/PR
ACUSADO
: LUIZ AUGUSTO LOPES
ADVOGADO(A)
: IVAN LUIZ CAMARGO DOS SANTOS (OAB PR061367)
ACUSADO
: CAIO CARVALHO REIS
ADVOGADO(A)
: DIOGO FERRARI (OAB RJ248167)
DESPACHO/DECISÃO
I – RELATÓRIO
O Ministério Público Federal ofereceu denúncia imputando a
CAIO CARVALHO REIS
o crime previsto no art. 33, "caput" c/c art. 40, inciso I, ambos da Lei n.º 11.343/06, por 11 vezes; e a
LUIZ AUGUSTO LOPES
o crime previsto no artigo 33, "caput" c/c art. 40, inciso II, ambos da Lei 11.343/06, por 2 vezes (
1.1
).
Os acusados foram notificados (
21.2
/
25.2
) e ofereceram defesa prévia (
23.1
/
26.1
).
A denúncia foi recebida no dia 20/03/2024 (
32.1
).
Em razão do interesse da Defesa no acesso aos elementos da Operação Mar Aberto, houve o deferimento de prazo para a complementação das defesas prévias a contar do momento do recebimento integral das provas e elementos dessa operação (
54.1
/
67.1
).
A decisão do evento
97.1
determinou o prosseguimento do feito, considerando que as Defesas, apesar de intimadas sobre os elementos de prova e informações requeridos, não complementaram as manifestações anteriormente apresentadas (
97.1
).
O pedido da Defesa de declarar ilícita e de desentranhar provas obtidas mediante quebra de sigilo telemático foi indeferido pela decisão do evento
110.1
, ocasião em que novamente foi reaberto o prazo para defesa prévia.
Houve a suspensão processo em razão de decisão proferida no HC n. 5039103-37.2024.4.04.0000/PR (
126.1
):
[...]
Tendo em vista a decisão liminar proferida nos autos do Habeas Corpus nº 5039103-37.2024.4.04.0000/PR (cuja cópia foi juntada nestes autos no
evento 124, DESPADEC1
), suspendo o andamento do presente procedimento especial da lei antitóxicos, até o julgamento definitivo do Habeas Corpus Nº 5039103-37.2024.4.04.0000/PR.
[...]
Também para efetivar a concessão da ordem obtida no HC, foi solicitado ao Juízo Federal da 1ª Vara Federal de Itajaí e à Polícia Federal em Itajaí a disponibilização de todos os elementos de prova da Operação Mar Aberto de possível interesse da Defesa (
141.1
):
[...]
2.
Nos termos do voto condutor, a ordem de acesso concedida em sede de HC tem o seguinte recorte:
Elementos de prova e informação a serem disponibilizados:
"todos os elementos de prova de possível interesse"
da Defesa de
CAIO CARVALHO REIS
, derivados da
Operação Mar Aberto
.
Cláusula de exceção à disponibilização de acesso:
"elementos informativos concernentes à
investigação de outros fatos delituosos ainda em curso na esfera policial
".
Destinatário do acesso deferido
:
a Defesa de
CAIO CARVALHO REIS
.
Órgãos destinatários do dever de conferir acesso: o Juízo da 1ª Vara Federal de Itajaí (autos n. 50107105120204047208/SC) e a Delegacia de Polícia Federal em Itajaí (IPL n. 2020.0107832-DPF/IJI/SC).
Efeito suspensivo: o cumprimento da diligência de disponibilização de acesso à Defesa foi imposto com
condição
à retomada desta persecução penal
.
Diante disso,
em estrito cumprimento
da ordem concessiva parcial proferida pela 7ª Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região no HC n. 50391033720244040000,
determino
a expedição de ofícios de solicitação e de requisição de acesso a elementos de prova derivados da Operação Mar Aberto.
2.1.
Oficie-se
ao Juízo Federal da 1ª Vara Federal de Itajaí
(autos n. 50107105120204047208/SC),
solicitando
a disponibilização de acesso para a Defesa de
CAIO CARVALHO REIS
a todos os elementos de prova de possível interesse dela,
nos termos e conforme as ressalvas expostas pelo e.TRF4 no julgamento do HC n. 50391033720244040000
.
Cópia desta decisão servirá como ofício n. 700017539744-A.
2.2. Oficie-se
também à
Delegacia de Polícia Federal em Itajaí
, requisitando ao Delegado de Polícia Federal a quem foi atribuído o IPL n. 2020.0107832-DPF/IJI/SC a disponibilização de acesso para a Defesa de
CAIO CARVALHO REIS
a todos os elementos de prova de possível interesse dela,
nos termos e conforme as ressalvas expostas pelo e.TRF4 no julgamento do HC n. 50391033720244040000
.
Cópia desta decisão servirá como ofício n. 700017539744-B.
Para servir de suporte à definição de quais são os elementos de prova de possível interesse da Defesa, encaminhem-se em anexo aos ofícios
cópia desta decisão, do acórdão concessivo do HC (
140.1
/
140.2
), da denúncia destes autos (
1.1
) e das petições dos eventos
44.1
e
52.1
.
Informem-se aos destinatários dos ofícios que o impetrante
CAIO CARVALHO REIS
encontra-se preso preventivamente, motivo pelo qual se aguarda
o cumprimento urgente
na disponibilização de acesso aos elementos probatórios, pois sem a efetivação da diligência, esta persecução permanecerá obstada.
[...]
A decisão do evento
162.1
constatou que o Juízo detentor da prova havia associado a Defesa ao IPL n. 50107105120204047208 e presumiu que essa conduta teria sido suficiente para viabilizar o acesso aos elementos de prova requeridos pela Defesa:
[...]
1.
CAIO CARVALHO REIS
alegou que, ao contrário do determinado pelo e. TRF4 no Habeas Corpus nº 5039103-37.2024.4.04.0000, o Juízo da 1ª Vara Federal de Itajaí/SC limitou o acesso da Defesa unicamente ao inquérito policial, deixando de permitir quanto aos feitos relacionados, em especial o pedido quebra de sigilo telemático e telefônico que fundamentaram a denúncia do presente feito.
Assim, requereu a manutenção da suspensão dos presentes autos até o acesso a todos os elementos probatórios, com posterior concessão de prazo para que para nova manifestação da Defesa (ev. 160).
2.
Verifico que foi concedido, pelo Juízo da 1ª Vara Federal de Itajaí/SC, acesso à Defesa aos autos de IPL nº 5010710-51.2020.4.04.7208, que ostentam nível 1 de sigilo. Pela imagem juntada na petição do ev. 160, os autos de quebra de sigilo nº 5010712-21.2020.4.04.7208 também possuem igual nível de sigilo.
Portanto, mesmo que não associado aqueles autos, basta a Defesa, por meio do
link
nos processos relacionados na capa do autos de Inquérito Policial, acessá-los em sua íntegra.
Assim, a fim de que tenha acesso a todos os elementos produzidos, mantenho a suspensão do presente feito pelo prazo adicional de 15 dias.
3.
Após, reabra-se o prazo para defesa prévia dos Denunciados, considerando a manifestação favorável do MPF juntada do
evento 108, PET1
e os documentos juntados nos eventos 80 e 81.
[...]
A Defesa alegou deficiências em relação ao acesso a parte das provas (
169.1
).
O pedido foi analisado na decisão do evento
174.1
:
[...]
CAIO CARVALHO REIS
requereu
"o reconhecimento do status de prejuízo defensivo e a manutenção do sobrestamento do presente feito"
. Afirmou que o Juízo dos autos n. 5010710- 51.2020.4.04.7208/SC não lhe outorgou pleno acesso aos registros que deseja conhecer (
169.1
).
2.
Indefiro o pedido formulado.
Este Juízo ocupa posição de horizontalidade frente ao Juízo Federal de Itajaí, motivo pelo qual não o subordina e nem dispõe de competência para escrutiná-lo.
Tais poderes pressupõem ascendência vertical, de forma que o controle jurisdicional acerca das deliberações daquela Autoridade demandam a veiculação de eventual insurgência junto ao Tribunal competente.
Além disso, a obrigação
de meio
que o e.TRF4 determinou a este Juízo (
140.1
) foi cumprida (
141.1
/
147.1
-
148.1
) e o Juízo Federal da 1ª Vara Federal de Itajaí (autos n. 50107105120204047208/SC), em resposta, atestou a disponibilização jurídica de acesso aos elementos de prova (
processo 5010710-51.2020.4.04.7208/SC, evento 162, DESPADEC1
):
[...]
Em atenção ao ofício do Juízo Federal da 14ª Vara Federal de Curitiba/PR (
evento 160, DESPDECOFIC6
) e em cumprimento a decisão proferida pela 7ª Turma do E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região no julgamento do HC 50391033720244040000 (
evento 160, ACOR4
,
evento 160, RELVOTO5
), disponibilizo o acesso da Defesa Técnica de
CAIO CARVALHO REIS
a todos os elementos de prova de possível interesse dela, derivados da Operação Mar Aberto.
Promova-se a habilitação da Defesa Técnica de
Caio Carvalho Reis
nos autos 50107105120204047208 (
evento 93, PROC1
), após intime-a sobre a presente decisão.
[...]
Por fim, as dificuldades técnicas de acesso que a Defesa relatou ainda enfrentar demandam solução junto ao Juízo de destino, o qual se prontificou em recepcionar as queixas sobre qualquer intercorrência sistêmica dificultadora do acesso, caso informada pelo interessado (
processo 5010710-51.2020.4.04.7208/SC, evento 179, DESPADEC1
):
[...]
Conforme sugerido pelo juízo da ação penal, a defesa técnica possui pleno acesso aos procedimentos correlatos, por meio do
link
nos processos relacionados na capa do autos de Inquérito Policial.
Quaisquer intercorências sistêmicas que dificultem o seu acesso deverão ser informadas, no prazo de 5 (cinco) dias.
[...]
Embora essa decisão tenha sido proferida no dia 11/02/2025, com intimação eletrônica comandada no dia 12/02/2025,
a Defesa ainda não providenciou a abertura do evento e nem informou adequadamente àquele Juízo a dificuldade operacional que relatou aqui
.
Assim, se há alguma restrição atual ao conhecimento de outros elementos de prova que deseja acessar, são unicamente de ordem procedimental e só não foram superados porque a Defesa ainda não levou esse fato a conhecimento da Autoridade competente para disponibilizá-los.
[...]
Renovado o prazo de defesa prévia, no dia 17/03/2025,
CAIO CARVALHO REIS
a complementou para requerer a declaração de nulidade das provas e atos subsequentes à denúncia em razão da impossibilidade de a Defesa ter a integral disponibilização das provas que subsidiaram a denúncia (
181.1
).
Fez um relatório das ocorrências processuais evidenciadas até o dia 11/02/2025, mencionou um "link" de vídeo que utilizou como fundamento para demonstrar a inviabilidade de acesso ao conteúdo desejado, citou uma decisão do Juízo da 1ª Vara Federal de Itajaí em relação a um ofício remetido pela 13ª Vara Federal de Curitiba, realçou os aspectos da decisão proferida pelo e.TRF4 em HC anterior, respeitante ao direito de acesso à prova e, ao final, formulou o seguinte pedido:
[...]
16. Assim, considerando o despacho proferido por V. Exa., bem como, preconizando o que foi decidido na ocasião do julgamento do habeas corpus nº 5039103-37.2024.4.04.0000/PR em que se condicionou o prosseguimento dos presentes autos à disponibilização dos elementos de prova requeridos inúmeras vezes, requer-se em complemento à defesa prévia já apresentada, e em estrita observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, requerse: a) o reconhecimento do cerceamento de defesa, reputando-se nulas todas as provas e atos processuais subsequentes à denúncia em razão da impossibilidade do direito de defesa de CAIO sem a integral disponibilização das provas que consubstanciaram a acusação.
[...]
No dia 21/03/2025, a Defesa impetrou o HC n. 50084736120254040000 (ev. 184).
Nesse mesmo dia, o pedido de declaração nulidade formulado pela Defesa foi indeferido pela decisão do evento
185.1
:
[...]
2.
A declaração de nulidade pressupõe a demonstração de prejuízo concreto (art. 563 do CPP) e a Defesa não demonstrou no que o atraso de acesso aos elementos de prova de informação da Operação Mar Aberto a prejudicou.
Conforme se evidencia do processo, a reabertura do prazo de defesa foi comandada repetidamente para garantir o exercício pleno do contraditório e da defesa.
Porém, mesmo após a confirmação a efetiva disponibilização de acesso ao conteúdo da Operação Mar Aberto e do prazo manifestação conferido à Defesa, não houve a apresentação de nenhuma tese substancial para inquinar as razões originalmente expostas para o recebimento da denúncia.
Ante o exposto,
não acolho
o pedido de declaração de nulidade formulado pela Defesa de
CAIO CARVALHO REIS
(
181.1
).
[...]
Após, foi noticiado o deferimento de medida liminar no HC n. 50084736120254040000 (
192.1
), no seguinte sentido:
[...]
Portanto, o MM. Juízo
a quo
afirma, na decisão supramencionada, que
"
após a confirmação a (sic) efetiva disponibilização de acesso ao conteúdo da Operação Mar Aberto e do prazo manifestação conferido à Defesa
, não houve a apresentação de nenhuma tese substancial para inquinar as razões originalmente expostas para o recebimento da denúncia."
Há dissonância, portanto, entre o que afirma a defesa
(que ao menos quanto à Medida Cautelar nº 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, não houve acesso integral aos autos)
e o que reporta o despacho judicial
.
4.
Do decidido pelo juízo detentor da prova.
Analisando-se o andamento do Inquérito Policial nº 5010710-51.2020.4.04.7208, pertinente à Operação Mar Aberto, conduzido pela 1ª VF de Itajaí/SC, constata-se que houve determinação, por aquele juízo, em 10/03/2025, do
"encaminhamento à 13ª e à 14ª Vara Federal de Curitiba da integralidade dos procedimentos correlatos",
dentre os quais os processos de nºs
5010712-21.2020.4.04.7208
, 5017072-35.2021.4.04.7208 e 5010324-84.2021.4.04.7208, segundo decisão assim proferida (
processo 5010710-51.2020.4.04.7208/SC, evento 193, DESPADEC1
):
Compulsando os autos, constato que desde a decisão que deferiu o acesso aos elementos de prova pleiteados pela defesa técnica, muito já decorreu.
Durante o período supramencionado, verifica-se o envio contínuo, de forma fracionada, dos dados considerados pertinentes; pontuo que tal acesso já foi objeto de duas decisões em
Habeas Corpus
que, inclusive, já determinaram a sua disponibilização. Outrossim, cabe destacar que a remessa sequencial dos documentos, embora prolongada, foi julgada insuficiente para a plena satisfação dos pedidos formulados pela defesa.
Tal contexto evidencia a necessidade de assegurar que todos os elementos essenciais ao pleno exercício do direito de defesa sejam efetivamente disponibilizados, conforme determinado por ambos
Habeas Corpus
outrora impetrados.
Nessa senda, na forma da decisão do
evento 148
, o acesso das informações pretendidas deverá ser dado mediante encaminhamento à 13ª e à 14ª Vara Federal de Curitiba da integralidade dos procedimentos correlatos cujo acesso é agora autorizado, cabendo àqueles juízos deliberarem a respeito do modo de disponibilização dos arquivos às partes, respeitado em todo o caso o sigilo a eles associado.
Esclareço, para tanto, que a presente decisão inclui os seguintes processos: 5010712-21.2020.4.04.7208, 5017072-35.2021.4.04.7208 e 5010324-84.2021.4.04.7208.
Oficie-se ambos os juízos a respeito do teor desta decisão, servindo a presente como ofício.
Cumpra-se, com a urgência necessária.
Preclusa esta decisão, arquivem-se os autos.
Portanto, parece não haver empecilho para que o juízo originário disponibilize o acesso aos documentos requeridos,
se tal acesso já não ocorreu, o que não resta claro
, ante a dissonância entre o que afirma a decisão do
evento 185, DESPADEC1
, na origem, e o manifestado pela defesa na inicial do
writ
.
5.
Conclusão.
Não estando claro
se houve ou não a disponibilização do acesso para a defesa do conteúdo dos autos da Medida Cautelar nº 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, deve ser
expedido ofício ao MM. Juízo
a quo
(Juízo Substituto da 14ª VF de Curitiba) para que esclareça
tal ponto, bem como para que,
em se constatando o descumprimento do acórdão da 7ª Turma
, nos termos suprarreferidos,
se lhe dê imediato cumprimento,
ante a noticiada remessa da documentação à vara de origem (
processo 5010710-51.2020.4.04.7208/SC, evento 193, DESPADEC1
), restituindo-se o prazo de defesa prévia a
CAIO CARVALHO REIS
.
6.
Dispositivo.
Ante o exposto,
defiro parcialmente a liminar
, nos termos supramencionados.
[...]
Em cumprimento à medida liminar deferida, a decisão do evento
194.1
tornou
sem efeito
as decisões dos eventos
162.1
,
174.1
e
185.1
e
restabeleceu a suspensão processual
, tal como foi originalmente determinada pelo HC n. 50391033720244040000. Alem disso, solicitou
ao Juízo da 1ª Vara Federal de Itajaí (autos n. 50107105120204047208) urgência no cumprimento da decisão proferida por ele no
processo 5010710-51.2020.4.04.7208/SC, evento 193, DESPADEC1
. Em fechamento, prestou os esclarecimentos requisitados pelo e.TRF4.
O Juízo da 1ª Vara Federal de Itajaí, atendendo à solicitação reiterada, disponibilizou a este Juízo cópia digital integral dos autos n. 5010712-21.2020.4.04.7208, 5017072-35.2021.4.04.7208 e 5010324-84.2021.4.04.7208, sendo os arquivos anexados no evento 207.
Intimada, a Defesa do acusado
CAIO CARVALHO REIS
peticionou no evento
216.1
. Requereu a inadmissão das provas emprestadas originadas da denominada "Operação Mar Aberto", afirmando, em síntese, o quanto segue:
A Defesa argumentou que as medidas de quebra de sigilo telefônico e telemático (incluindo contas de e-mail e nuvem iCloud) e as sucessivas prorrogações das interceptações foram autorizadas com base em indícios insuficientes e genéricos, configurando
"fishing expedition"
, em violação aos requisitos da Lei nº 9.296/96 e ao art. 93, IX, da Constituição Federal.
Sustentou, ainda, que a obtenção de dados como registros de Estação Rádio Base (ERB) e extratos telefônicos, que subsidiaram os pedidos de interceptação, ocorreu sem a devida observância da reserva de jurisdição e de fundamentação legal, o que eivaria de nulidade as provas delas derivadas.
Argumentou, por fim, que a decisão que autorizou a quebra do sigilo da conta de nuvem Apple careceu de fundamentação idônea, baseando-se apenas em mera localização geográfica sem elementos concretos de ilicitude vinculada à conta.
Diante disso, a Defesa postulou a rejeição da recepção e exclusão das provas da Operação Mar Aberto dos autos, com o consequente reconhecimento da ausência de justa causa para a ação penal e a absolvição do acusado com fulcro no art. 397, III, do Código de Processo Penal, ante a alegada invalidade da denúncia fundamentada em tais elementos probatórios.
O
Ministério Público Federal
foi intimado da postulação da Defesa, manifestando-se contrariamente ao pedido, alegando, em suma, o quanto segue:
Afirmou a validade das provas utilizadas no presente feito, argumentando que as medidas de quebra de sigilo e interceptação foram devidamente fundamentadas e autorizadas pelo Juízo de origem, atendendo aos requisitos legais e constitucionais.
Sustentou que a inclusão do acusado na investigação se deu em razão de um encontro fortuito de provas lícitas ("serendipidade"), validado pela jurisprudência pátria, e que o compartilhamento desses elementos informativos com o Juízo competente para processar os fatos apurados em Paranaguá/PR foi regular e autorizado judicialmente.
Adicionou que a obtenção de dados de ERB e extratos telefônicos, que indicaram o trânsito do acusado em diferentes localidades, não se confunde com interceptação de conteúdo e estava amparada por autorização judicial prévia.
Refutou também a alegação de
"fishing expedition"
, afirmando que as diligências buscaram esclarecer condutas específicas no âmbito da investigação original.
Por fim, acrescentou que eventuais atrasos na análise de dados ou erros materiais em relatórios não possuem o condão de macular a licitude das provas.
Diante do exposto, manifestou-se pelo acolhimento das provas da Operação Mar Aberto que foram compartilhadas nestes autos, requerendo o prosseguimento da ação penal.
II – FUNDAMENTAÇÃO
1. Admissibilidade da prova emprestada
A admissibilidade da prova emprestada pelo Juízo destinatário é sempre incidental e indireta. Limita-se a verificar os critérios mínimos para sua admissão nos autos. Assim, o Juízo de destino não revisa a decisão do Juízo de origem que produziu a prova. Seu papel é assegurar a validade do uso da prova no novo contexto, verificando, incidentalmente e em contraditório, se sua produção ou transferência não incorreu em vício de ilicitude ou legalidade que a torne inadmissível.
2. Delimitação da prova emprestada efetivamente utilizada nesta persecução
O Ministério Público Federal imputou a
CAIO CARVALHO REIS
11 fatos tipificados como tráfico internacional de drogas. A acusação baseou-se em provas digitais, especificamente fotografias, capturas de tela e vídeos, todas armazenadas na nuvem e vinculadas à conta "ironnmann888@icloud.com". Não foram utilizados como prova dados de estações de rádio base (ERB), mensagens SMS, diálogos ou registros telefônicos (
1.1
).
O acesso a essas provas digitais foi autorizado por dois juízos distintos, conforme se expõe a seguir:
— dados armazenados entre 19/01/2021 e 05/07/2021: a autorização judicial para acesso a esses dados foi concedida pela 1ª Vara Federal de Itajaí/SC
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 267, DESPADEC1
/
evento 376, DESPADEC1
/
evento 442, DESPADEC1
/
evento 460, DESPADEC1
). O compartilhamento da prova foi posteriormente autorizado na ação penal n.
5001055-84.2022.4.04.7208/SC, evento 7, DESPADEC1
;
— dados armazenados entre julho de 2021 e outubro de 2022: o acesso a esses dados foi autorizado por este Juízo, conforme consta dos autos de
processo 5055187-36.2022.4.04.7000/PR, evento 30, DESPADEC1
.
Conforme o exposto, qualificam-se como prova emprestada apenas as fotografias, capturas de tela e vídeos, compartilhados pela 1ª Vara Federal de Itajaí/SC, que estavam indexados à conta "ironnmann888@icloud.com" até 05/07/2021. As demais provas digitais mencionadas na denúncia são nativas desta persecução penal.
3.
Liame de causalidade no acesso aos dados da conta "ironnmann888@icloud.com"
A descoberta dos terminais (41) 99279-2041 e (13) 99664-9101, e o consequente deferimento de acesso aos dados da conta ironnmann888@icloud.com, teve início com a
interceptação do terminal (77) 99928-5763
.
As investigações da "Operação Mar Aberto" incluíram a interceptação telefônica e telemática de diversas linhas, dentre as quais o terminal (77) 99928-5763. A equipe de investigação identificou essa linha como uma "linha velada" utilizada para atividades criminosas por um dos investigados (FÁBIO), motivando a análise minuciosa de seus extratos de WhatsApp (
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 192, INF2
, pp. 16–20):
[...]
Em 26/03/2021 FABIO volta a utilizar o seu terminal velado (77) 99928-5763. No diálogo a seguir observa-se que FABIO provavelmente tentou realizar uma chamada e recebeu a mensagem da operadora informando a insuficiência de créditos.
[...]
Através de seu terminal velado, FABIO realiza diversas chamadas não atendidas para o terminal (41) 99279-2041, habilitado a pouco mais de um mês atrás possivelmente em nome de um laranja, visto que a linha é de prefixo 41 e o CPF cadastrado é da cidade de Mossoró/RN. Além das chamadas não atendidas, FABIO troca algumas mensagens com o referido terminal, e também pede que um indivíduo chamado “JUNINHO” coloque créditos para ele no telefone (41) 99279-2041, dizendo que precisa se comunicar urgente com esse terminal, que seria de Natal, referente a um “cabo”.
[...]
FABIO ligou insistentemente durante os dias 27 e 28/03/2021 para o terminal (41) 99279-2041, tendo inclusive enviado SMS’s na noite de 28/03, pedindo para o usuário responder as chamadas.
[...]
A análise dos extratos de WhatsApp da linha (77) 99928-5763, atribuída a FÁBIO, revelou que ele e o interlocutor da linha
(41) 99279-2041
passaram a utilizar o aplicativo como meio exclusivo de comunicação (
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 192, INF2
, p. 20):
[...]
Foi possível identificar nos extratos fornecidos pelo WhatsApp diversas trocas de mensagens entre (77)99928-5763 e (41)992792041, indicando que os interlocutores passaram a se comunicar pelo aplicativo após a insistência de FABIO.
[...]
Paralelamente, a análise dos extratos da operadora telefônica para a linha (41) 99279-2041 (habilitada em 21/02/2021) indicou que,
"com exceção das ligações de telemarketing e de operadoras de telefonia, a única chamada completada desse terminal foi para o telefone
(13) 99664-9101
"
. Esta linha (13) 99664-9101, por sua vez, também havia sido habilitada recentemente (16/01/2021) e seu prefixo 13 (região de Santos/SP) divergia do endereço de cadastro (Curitiba/PR),
sugerindo registro em nome de interposta pessoa ("laranja")
(
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 192, INF2
, pp. 20-21):
[...]
Observa-se no cadastro que o terminal (41)992792041 foi habilitado em 21/02/2021. Foi solicitado o extrato desta linha junto a operadora Vivo, e a sua análise permitiu identificar que, com exceção das ligações de telemarketing e de operadoras de telefonia, a única chamada completada desse terminal foi para o telefone (13)99664-9101, cujo cadastro apresentamos a seguir:
[...]
Este terminal foi habilitado recentemente (16/01/2021), é de prefixo 13 (região de Santos/SP), porém habilitado com um CPF da cidade de Curitiba/PR, sinais claros de estar cadastrado em nome de um laranja. Analisamos as antenas desse terminal (13)99664-9101, verificando que ele é baseado principalmente no Guarujá/SP, já tendo transitado desde a sua habilitação nas cidades de Paranaguá/PR, Salvador/BA e inclusive Natal/RN, onde o GP5 está atracado. Diante das informações apresentadas sugerimos a interceptação dos terminais (41)992792041 e (13)99664-9101.
[...]
Após o deferimento judicial das interceptações telefônica e telemática do último terminal (
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 198, DESPADEC1
), confirmou-se a divergência entre os dados cadastrais e o verdadeiro usuário da linha. O terminal era de fato utilizado por uma pessoa de nome CAIO, com vínculos em Paranaguá/PR (
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 233, INF2
, pp. 36-37):
[...]
III.3.4.2. GREGORY – linha VIVO 13 99664-9101 O usuário dessa linha se identificou como CAIO e solicitou reparos de internet em nome de CARLOS ADRIANO DAS GRAÇAS, indiciamento por tráfico de drogas, conversa em que se identificou e maiores dados qualificativos a seguir.
Alvo: CAIO PGN/PR LIG 2041 Nº Interceptado: (13)99664-9101 Assunto: Caio/Carlos x Claro - Problema Internet - Identificação Nº Contato: 10621 ID: 56927089 Direção: Originada Data:
07/04/2021
10:44:44 Duração: 00:07:47 Arquivo: 01_177_56927089_20210407104444_20366737Tipo: Áudio Degravação: Interlocutor se identificou como Caio, mas informou cadastro de internet em nome de Carlos Adriano das Graças, CPF 877.944.469-53, DN 24/09/1975, com endereço da Reclamação na Cidade Paranaguá Rua Açai, 209. Outro endereço RUA ARTHUR BERNARDES 1248 (ou 2788 filho) CASA - CEP 83221-640 - PARANAGUA/PR. A pessoa identificada já foi presa por tráfico em 27/06/1997 (IPL 00032/1997-DPF/PNG/PR).
[...]
Além disso, o registro histórico de mensagens por WhatsApp denotaram o uso da linha para comunicações com terminais habilitados no exterior, localizados nos Estados Unidos, Argentina, Chile, Bolívia e Paraguai (
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 259, INF2
). Tal vestígio, embora não revelasse importância caso fosse analisado de forma isolada, ao informar a manutenção de contatos com terminais variados da Bolívia e Paraguai (países notoriamente utilizados por organizações criminosas para a internalização clandestina de drogas), somou-se às demais evidências anteriormente catalogadas, incrementando a suspeita sobre o possível envolvimento do alvo com os atos de traficância internacional investigados.
Prosseguindo com as investigações nesse mesmo período de amostragem, a equipe de investigação, com base em análise cadastral, identificou- que o telefone (13) 99664-9101 estava vinculado ao e-mail Google
ironnmann888@gmail.com
(
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 259, INF2
, pp. 35–36):
[...]
Também foi identificado que o telefone 13 99664-9101 está vinculado ao e-mail do Google ironnmann888@gmail.com e CPFs 460.968.738-04 e 384.478.508-62. O CPF 460.968.738-04 pertence à
CAIO CARVALHO REIS
, data nascimento 23/10/1997 e filho de EIDE MARIA DE CARVALHO, confirmando a prévia identificação transcrita no RAPJ7 (abaixo).
[...]
Deste modo acredita-se que as eventuais informações vinculadas as contas Google bmwx10077@gmail.com, izidorio.manoel.1212@gmail.com, ricardojoias10@gmail.com, 324561jk@gmail.com e ironnmann888@gmail.com possam auxiliar na elucidação dos fatos em apuração.
[...]
A partir dessa informação, da evolução da suspeita sobre o envolvimento do usuário da linha com os atos investigados e da relevância dos dados para a elucidação dos fatos investigados, foi requerido e deferido o acesso aos dados informáticos mantidos em nuvem, indexados à mencionada conta (
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 267, DESPADEC1
).
A análise preliminar dos dados dessa nuvem revelou que o usuário do terminal (13) 99664-9101 esteve em Santa Cruz de La Sierra, Bolívia, em janeiro de 2021. Adicionalmente, descobriu-se que o
"e-mail ironnmann888@gmail.com está vinculado a uma
conta Icloud da Apple
"
, o que motivou a solicitação de autorização de acesso aos dados de nuvem correspondentes à conta Apple
(
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 371, INF2
, pp. 28-30):
[...]
III.12.1 Nuvem Google ironnmann888@gmail.com Numa análise preliminar da nuvem recebida do usuário ironnmann888@gmail.com (vinculado ao terminal 13 99664-9101) – provedor google - foi identificado que ele esteve em SANTA CRUZ DE LA SIERRA/BOLIVIA no final do mês de janeiro deste ano, conforme emails abaixo.
[...]
Também foi identificado que este e-mail ironnmann888@gmail.com está vinculado a uma conta Icloud da Apple. Para uma melhor identificação deste usuário, recomenda-se também solicitar os dados de nuvem da conta Apple vinculada ao e-mail ironnmann888@gmail.com.
[...]
A Representação da Autoridade Policial foi então encaminhada ao Juízo competente, que deferiu o acesso aos dados informáticos indexados à conta ironnmann888@icloud.com (e variações como @gmail.com) –
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 376, DESPADEC1
, com novas autorizações judiciais para diferentes periodicidades nas decisões dos eventos
442, DESPADEC1
e
460, DESPADEC1
desses autos.
Em resumo, a cadeia causal de descoberta e deferimento da prova impugnada iniciou-se com a interceptação de um número utilizado por um alvo principal (FÁBIO), levando à identificação de um segundo número de interesse. Este, por sua vez, foi vinculado a um e-mail do Google. A análise desse e-mail revelou a conexão com a conta iCloud, cujo acesso foi subsequentemente deferido pelo Juízo com base nos indícios de uso por membros da organização criminosa investigada.
4. Autorização judicial prévia para acessar registros telefônicos históricos e dados de ERBs
A análise e pesquisa de dados dos terminais (41) 99279-2041 e
(13) 99664-9101 foram precedidas pela decisão do
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 177, DESPADEC1
.
No tocante à linha nº (77) 99928-5763, essa decisão não apenas autorizou a prorrogação das interceptações telefônica e telemática, mas também deferiu o acesso às ERBs e aos dados dos interlocutores que contataram esse terminal:
[...]
Quanto ao acesso, pela Autoridade Policial, a
dados cadastrais de interlocutores que tenham feito contatos com os terminais telefônicos monitorados, também o defiro.
Primeiramente, porque é medida útil, inclusive, à melhor compreensão das comunicações interceptadas, o que contribui para esclarecimento dos fatos até mesmo em benefício das pessoas investigadas, evitando suposições equivocadas pelas quais possa por vezes ser formado juízo desfavorável às mesmas, em razão, justamente, de algum mal-entendido.
Também, porque contribui para agilidade da investigação sem grande invasividade, já que as informações acessadas já foram exteriorizadas pelas pessoas afetadas às operadoras de telefonia, não havendo fornecimento de informações que estejam ainda acobertadas ao núcleo de intimidade pessoal daquelas por não terem ainda sido exteriorizadas. O núcleo da intimidade ainda acoplada à própria pessoa atingida persistirá sem afetação, alcançando a medida apenas dados que a própria pessoa já exteriorizou a terceiros.
Por fim, porque a jurisprudência vem reconhecendo a possibilidade, conforme se vê dos precedentes seguintes:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. QUADRILHA. DENÚNCIAS ANÔNIMAS IMPUTANDO A PRÁTICA DE ILÍCITOS. REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIAS PRELIMINARES PARA A APURAÇÃO DA VERACIDADE DAS INFORMAÇÕES. CONSTRANGIMENTO INEXISTENTE.
1. (...).
NULIDADE DA DECISÃO QUE PERMITIU O ACESSO AOS DADOS CADASTRAIS, HISTÓRICO E EXTRATOS DE CHAMADA TELEFÔNICOS. INAPLICABILIDADE DA LEI 9.296/1996. PROVIMENTO JUDICIAL FUNDAMENTADO. MÁCULA NÃO CONFIGURADA.
1. De acordo com a jurisprudência pacífica desta Corte Superior de Justiça, a quebra do sigilo de dados telefônicos, consistentes no histórico de chamadas, dados cadastrais e extratos de ligações, não se submete à disciplina da Lei 9.296/1996, que trata da interceptação das comunicações telefônicas.
2. Na espécie, o magistrado singular justificou a quebra do sigilo dos dados telefônico dos recorrentes com base, essencialmente, nas informações coletadas pela autoridade policial e pelo Ministério Público indicativas da prática criminosa atribuída aos investigados, inexistindo, assim, qualquer nulidade apta a contaminar as provas dela decorrentes.
3. (...).
(STJ, RHC 53541, Processo 201402976730, rel Min. Jorge Mussi, julgamento em 12.09.2017).
PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL. DADOS CADASTRAIS OBTIDOS JUNTO AO BANCO DE DADOS DO SERPRO. INEXISTÊNCIA DE SIGILO FISCAL OU BANCÁRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I - (...).
III - Não estão abarcados pelo sigilo fiscal ou bancário os dados cadastrais (endereço, n.º telefônico e qualificação dos investigados) obtidos junto ao banco de dados do Serpro. (...).
(STJ, EDROMS 25375, Processo 2007702410579, rel. Min. Felix Fischer, julgamento em 18.11.2008).
DIREITO PROCESSUAL PENAL. MANDADO DE SEGURANÇA. REQUISIÇÃO DIRETA PELA AUTORIDADE POLICIAL DE DADOS CADASTRAIS DE RAMAL TELEFÔNICO. LEGALIDADE. VIOLAÇÃO AO SIGILO DE DADOS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. DESNECESSIDADE DE CONTROLE JURISDICIONAL PRÉVIO.
A requisição, efetuada por autoridade policial, à empresa de telefonia, objetivando acesso aos registros aptos a identificarem a ocorrência de ligações entre determinados terminais telefônicos e a identidade de seus titulares, sem que, com isso, seja franqueado o acesso aos conteúdos das respectivas conversas, constitui medida investigativa ordinária legítima que prescinde de intervenção judicial prévia.
(TRF4, Processo 50263064120164047200, rel. Des. Fed. Leandro Paulsen, julgamento em 23.08.2017).
Defiro, ainda, o pedido formulado na representação, determinando que, nos ofícios destinados às operadoras de telefonia, seja incluída também ordem de fornecimento da ERB (Estação Rádio Base)
dos números interceptados em tempo real.
Essa medida é necessária ao desenvolvimento das investigações, eis que possibilita a constatação, em tempo real, da localização geográfica e dos deslocamentos dos suspeitos, permitindo aos investigadores melhor conhecimento do
modus operandi
dos agentes e da participação de cada um no esquema criminoso. É medida adequada, eis que não se vislumbra maneira diversa de discernir a localização dos suspeitos, mormente quando da eventual realização dos procedimentos delituosos, sem que possa haver risco ao sigilo das investigações. Por fim, é também medida proporcional, já que a localização dos investigados será monitorada de forma restrita, apenas no âmbito das investigações, em favor tão-só daqueles que têm contato direto com o processo, o que diminui a afetação à intimidade das pessoas atingidas, estando isso a ocorrer, frise-se, não de um modo inconsequente, injustificado, mas sim em face do relevante interesse de propiciar a persecução penal pela prática de crime grave, punido com reclusão, cuja elucidação interessa a toda a coletividade.
Deverá a Secretaria expedir ofício-mandado
que contenha as informações indicadas no art. 11 da Resolução nº 59/2008 do Conselho Nacional de Justiça, e
determine
, nos termos do art. 6º,
caput
, da Lei nº 9.296/96,
ações tendentes a que, com a prorrogação da interceptação ora deferida,
sejam fornecidas as informações especificadas nas alíneas
"a"
até
"h"
do item 2.1.
da representação da Autoridade Policial
(Processo 50107122120204047208, evento 169, REPRESENTACAO_BUSCA1).
[...]
2.1
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
Nos termos e fundamentos das representações anteriores, repisam-se os fundamentos jurídicos para continuidade das interceptações telefônicas propostas, motivo pelo qual represento pelas seguintes medidas investigativas,
solicitando que sejam expedidos ofícios distintos para cada operadora
:
[...]
(g) que os policiais constantes do ofício judicial tenham
acesso aos
dados cadastrais
(qualificação do titular, endereço, local de instalação, local de envio da fatura do serviço, data da habilitação da linha e eventual desligamento, número e serial vinculado ao usuário nos casos de tecnologia CDMA)
e
históricos (extrato/bilhetagem) de linhas/IMEIs, SMS, conexões e de ERBs, inclusive em tempo real,
tanto dos alvos
como de seus interlocutores, além de pessoas de interesse para a investigação
, em arquivos com extensão .pdf e .xls, enviados para o e-mail ua.iji.sc@pf.gov.br ou disponibilizados por senha de acesso a sistemas das respectivas operadoras, desde 01/11/2019, inclusive para interlocutores com linhas internacionais em roaming em território nacional;
[...]
Assim, não prospera a alegação da Defesa de inexistência de autorização judicial para o acesso aos dados do terminal (13) 99664-9101. O Juízo de origem autorizou expressamente o direcionamento das atividades de pesquisa e análise de dados aos interlocutores dos alvos e também às pessoas de interesse para a investigação (item "g" da Representação, que foi integralmente deferido).
A decisão judicial alongou-se na demonstração da legitimidade jurídica e da proporcionalidade concreta das autorizações de acesso, modulando-as para não agredir o núcleo essencial da intimidade das pessoas alcançadas pela medida. Em relação aos interlocutores e pessoas de interesse para a investigação, foi autorizado apenas o acesso aos dados cadastrais, históricos, de conexões e de ERBs,
vedando-se a interceptação das comunicações (o que inclui o acesso ao conteúdo registrado das comunicações)
:
[...]
Fica desde já expressamente consignada a vedação à interceptação das comunicações de outros números de telefone, ou de outros terminais de comunicação, que não aqueles discriminados na presente decisão
(há cumprimento, aqui, do disposto no inciso IX
do art. 10 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça)
.
[...]
Dessa forma, a diligência empregada pela equipe de investigação, ao pesquisar os dados cadastrais e históricos do terminal (41) 99279-2041 (interlocutor direto) e, consequentemente, da linha (13) 99664-9101 (interlocutor indireto, qualificado como de interesse para a investigação), observou estritamente o escopo da autorização judicial previamente deferida.
A progressão da pesquisa até o terminal atribuído a "CAIO" foi plenamente justificada pela equipe de investigação, conforme demonstrado no relatório de análise. O usuário da linha qualificava-se como "pessoa de interesse para a investigação" pelos seguintes elementos:
— a linha em questão, prefixo 13 (região de Santos/SP), foi habilitada em 16/01/2021 e cadastrada em nome de um CPF da cidade de Curitiba/PR, configurando claros indícios da utilização de "laranja" para ocultar a real identidade do usuário;
— a análise do rastreamento por Estação Rádio Base (ERB) do terminal (13) 99664-9101 revelou sua circulação por diversas localidades estratégicas, incluindo Paranaguá/PR e Natal/RN. A presença em Natal/RN é particularmente relevante, uma vez que coincide com o local de atracação da embarcação GP5, que se encontrava sob monitoramento da investigação;
— o exame do extrato de chamadas do terminal (41) 99279-2041, habilitado em 21/02/2021, evidenciou que a única chamada completada dessa linha, excluindo-se as de telemarketing e operadoras, foi direcionada ao terminal (13) 99664-9101 (atribuído a CAIO);
— a proximidade nas datas de habilitação dos terminais —
(13) 99664-9101 em 16/01/2021 e (41) 99279-2041 em 21/02/2021
— sugeriu uma conexão operacional entre as linhas;
— além disso, o terminal (41) 99279-2041 foi intensamente utilizado para comunicação com o alvo FÁBIO, estabelecendo uma ligação entre as linhas investigadas e um dos principais alvos da operação.
Esses elementos, em conjunto, configuravam fundados indícios sobre o possível envolvimento do usuário do terminal (13) 99664-9101 (CAIO) com a organização criminosa investigada, corroborando,
à época
, a necessidade e a legalidade da quebra de sigilo de suas comunicações e dados.
5. Autorização da interceptação das comunicações telefônicas e telemáticas do terminal (13) 99664-9101
A autorização judicial para realizar a interceptação das comunicações telefônicas e telemáticas do terminal
(13) 99664-9101
foi deferida no dia 06/04/2021, pela decisão do
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 198, DESPADEC1
:
Eis o recorte da decisão que tratou da matéria:
[...]
02.
A interceptação das comunicações telefônicas e telemáticas
junto às operadoras de telefonia
.
Pleiteia-se a prorrogação da interceptação de comunicações telefônicas e de dados de terminais telefônicos já alcançados por decisões anteriores (Processo 50107122120204047208, evento 15, DESPADEC1, evento 36, DESPADEC1; evento 63, DESPADEC1; evento 111, DESPADEC1; evento 130, DESPADEC1; evento 142, DESPADEC1; evento 177, DESPADEC1).
A primeira decisão em que deferida a interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas apresentou resumo do contexto fático observado no início das investigações:
(...).
Em apertada síntese, sustenta-se que a embarcação denominada
"Golfo Pesca V"
estaria sendo utilizada para transporte de entorpecentes no interesse de organização criminosa. Essa conclusão é respaldada, sobretudo, pela constatação de que rotas empreendidas pela embarcação seriam atípicas para a realização do tipo de pesca para a qual estaria ela autorizada, havendo efetuado, inclusive, estranho e suspeito deslocamento até a região nordeste brasileira, na qual teria sido avistada atracada em porto de onde já teriam partido outras embarcações junto às quais teriam sido apreendidas grandes quantidades de cocaína.
Segundo a Autoridade Policial, embora constasse de registros oficiais como sob a propriedade de Jorge Roberto da Silva Marques, o uso da embarcação seria controlado, de fato, pelo casal Fabio Adriani Oliveira de Souza e Bianka Pereira Arseno, estes que atuariam em organização criminosa voltada ao tráfico transnacional de entorpecentes, entre outros delitos.
(...).
(Processo 50107122120204047208, evento 15, DESPADEC1)
O pedido foi formulado pela Autoridade Policial, a Delegada de Polícia Federal Anelise Wollinger Koerich (cumpre-se aqui o disposto no inciso I do art. 10 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça).
Ao apresentar o pedido, a autoridade requerente apresentou o seguinte relato (adiante se passa a cumprir o disposto no inciso II do art. 10 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça):
(...).
1. SINTESE DO QUANTO APURADO NO PERÍODO INTERCEPTADO
Durante esta nova quinzena de interceptações foi confeccionado relatório circunstanciado - RAPJ 06/2021, além de informação policial RDP 02 e 03/2021, onde são detalhados eventos que corroboram as hipóteses criminais levantadas até o período anterior e que justificam a prorrogação das medidas investigativas ao final requeridas.
1.1 NUCLEO OCEANO BRASIL
Na representação anterior descrevemos o intenso acompanhamento do deslocamento da embarcação OCEANO BRASIL, gerenciada por ISAIAS FERREIRA SANTIAGO (vulgo “SANTIAGO”/“PELÉ), pilotada por JOSE CARLOS BENEVIDES DA ROCHA (vulgo “CACAU”) e tripulada por parentes seus residentes no Espírito Santo (todos de sobrenome “BENEVIDES”), além do marinheiro REINALDO FERREIRA DE SOUZA, radicado na cidade de Itajai/Navegantes-SC.
Foram também detalhados indícios veementes de que o barco poderia estar carregado com substância ilícita. Como relatado anteriormente, houve duas tentativas frustradas de localização do material à bordo, possivelmente por conta de “desova” em alto mar provocada pela percepção da tripulação de que seriam abordados por um navio patrulha da Marinha do Brasil.
Em síntese cronológica detalhada na representação anterior, a embarcação OCEANO BRASIL promoveu as seguintes movimentações: saída de NATAL/RN na noite de 27/02/2021; navegação rente à costa até chegada em RECIFE/PE na noite de 28/02/2021, quando promoveu redução drástica de velocidade por pouco mais de uma hora; deslocamento na madrugada do dia 28 para 29 até alto mar (águas internacionais) em rota irregular até 1ª abordagem por navio patrulha na tarde de 04/03/2021; deslocamento de volta à costa brasileira, com rumo inicial para VITÓRIA/ES e redefinição de proa para enseada de ITAIPAVA/ES, onde se aproximou na tarde de 08/03/2021, com abordagem frustrada por equipe policial e imediata fuga; deslocamento pela costa carioca até 2ª abordagem por equipe policial no fim da tarde de 09/03/2021, sendo conduzida até ARRAIAL DO CABO/RJ para inspeção completa.
Em diálogo captado no dia 08/03/21 (ID54798747), SANTIAGO e CACAU conversam sobre levar o barco para Itajai, “
a nossa cidade”,
onde a OCEANO BRASIL iria precisar de reparos, sendo que SANTIAGO mandaria a tripulação de volta para casa de avião, mantendo tudo parado por no mínimo 60 dias.
De fato, no atual período de monitoramento – RAPJ 06/2021, verificou-
se in loco
que o barco OCEANO BRASIL está atracado na localidade da Volta Grande, Rio Itajai Açú-Navegantes/SC:
(Imagem)
O monitoramento telefônico do presente período também demonstra o anteriormente combinado.
O tripulante REINALDO (“NALDO”, agora também identificado como “CAVERNA”) conversa com um mestre de embarcação chamado DANIEL. Ambos estão na região de Navegantes, e comentam que nesse período de espera vão arrumar algum serviço de “pesca” em embarcações alternativas enquanto aguardam contato de SANTIAGO, que não responde as chamadas de DANIEL. Inclusive REINALDO afirma para DANIEL que “
não vou ficar no qta esperando esse troço aí não, sô
’ (ID 55880464).
Em outra ligação DANIEL e REINALDO comentam que este último trouxe o barco OCEANO do Rio e como o OCEANO “vai demorar” estão embarcando em outras embarcações (ID 55970418).
Após toda a situação de abordagem ao OCEANO BRASIL no último mês, SANTIAGO trocou de linha telefônica, sendo que em ligação realizada com uma pizzaria local registra seu endereço: Rua Silveira, n. 236, apartamento 404, Camboriú/SC (ID 56107335). Como de praxe em atividades ligadas ao tráfico, a linha está registrada em nome de terceiro, com endereço em outro estado da federação.
1.2 NUCLEO GOLFO PESCA V
Durante as últimas quinzenas de interceptação, o casal FABIO e BIANKA segue prospectando ações de venda de patrimônio para obtenção de liquidez e prosseguimento dos planos para saída com a embarcação GOLFO PESCA V.
No presente período de monitoramento, verifica-se que FABIO intensifica os indicativos de que realmente deve sair com o GOLVO PESCA V, atracado há meses e sem funcionamento junto ao porto de Natal/AM (rememoramos que a embarcação está com equipamento de geo rastreamento e escuta ambiental instalados, conforme decisão judicial pretérita).
Em diálogo do dia 26/03/21, FABIO se comunica com um mestre de embarcação chamado MANOEL (o qual naquele momento estava em Santos/SP). Ambos conversam em montar uma equipe para saída e mencionam o nome de GORDINHO, o qual liga todos os dias para ambos. FABIO avisa que já tem gente que “
corre o rolo
” e apresenta os nomes de CLAUDIO, JEFERSON (cozinheiro), IZIDORO (motorista), RAFAEL (gelador, de Rio Grande, primo de FABIO), NANDO (segundo motorista). FABIO diz que precisa colocar mais gente – teria que ter 17 pessoas, sendo que MANOEL reforça ter mais uns sete tripulantes (ID 55982271).
Em paralelo, FABIO mantém outros diálogos onde demonstra muitos preparativos suspeitos e estranhos à atividade de pesca, inclusive com modificações estruturais na embarcação GOLFO PESCA.
Também algumas conversas estranhas são trocadas entre FABIO e BIANKA (ID 55486141), quando parecem ansiosos por conversar com um telefone “
que está desde o dia 26 de janeiro sem falar”
. Logo após a finalização desse diálogo, trocado as 16h58 do dia 18/03/21, equipe policial empreendeu vigilância sobre FABIO e identificou que o mesmo se encontra com um homem ainda não identificado no Shoping Itaguaçu, São José/SC, cerca de uma hora após a ligação. Detalhamento do encontro e fotos dos envolvidos foram registrados no RDP 03/2021. Ainda nesse mesmo dia, logo após esse encontro no shoping, em outra ligação com mulher não identificada, FABIO diz que terá uma reunião CAMBORIU e logo após vai para Itajai (ID 55490528): “
FABIO - Agora que eu entrei na BR aqui... eu não... eu não tinha nada pra fazê la em ITAJA... em CAMBORIU, ai o CARA me ligou: FABIO, tem uma REUNIÃO aqui (inaudível).”
Um personagem que retorna nesse período é o tripulante JEFFERSON ROBERTO DOS SANTOS, em uma ligação típica do tráfico onde FABIO entra em contato com o terminal daquele e pede para JEFFERSON olhar rapidamente seu aplicativo WhatsApp pois irá “apagar” a mensagem que enviou (ID 55746712). JEFFERSON havia sido registrado como tripulante da GPV e teve passagem custeada aérea custeada por FABIO para retorno de Natal para Navegantes (registro no RDP 01/2021). Ao final, representaremos pela interceptação de sua linha telefônica (48) 98463-6003.
Outra ligação peculiar foi realizada com HNI no dia 25/03/21, quando FABIO conversa com vendedor de loja de material náutico em Itajai e refere um “
sócio que está fora do país
”, o qual aprovaria o pagamento antecipado de 8 mil metros de “cabo 32”, e para tanto vai precisar também de carregadeiras para subir o material (peso total de 4 toneladas). FABIO também pergunta se é possível entregar o material “lá no porto de NATAL”, o que é confirmado (ID 55917979).
No período FABIO volta a utilizar sua linha velada (77) 99928-5763 (ID 55979526).
Por meio dessa, FABIO realiza diversas chamadas não atendidas para o terminal (41) 99279-2041, (habilitado recentemente, em 21/02/2021) com endereço de cadastro em Mossoró/RN. Por meio de SMS, troca várias mensagens com o usuário desse terminal, inclusive informando que está sem crédito (ID 55915954, ID 55989528, ID 55989635, ID 55997092, 55997177, ID 55998075)
FABIO conversa com outra linha, na pessoa de “JUNINHO” e determina seja providenciado o crédito no terminal do novo operador, pois seria urgente e referente a
“um cabo lá de Natal”
(ID 55997653). Portanto, trata-se de meio de comunicação de um novo comparsa, com o FABIO tenta falar insistentemente (ID 55998075, 56149555, ID 56149555, ID 56149581), e cuja interceptação será solicitada ao final.
Dados whatsapp da linha de FABIO demonstram que ele e o interlocutor da linha (41) 99279-2041 passaram a utilizar essa ferramenta como meio exclusivo de comunicação. Análise dos extratos dessa última linha junto à operadora de telefonia revela que, salvo telemarketing, o único número com o qual se comunicou no período foi o (13) 99664-9101, cuja interceptação também será requerida ao final.
Com relação a essa última linha telefônica, análise cadastral demonstra que também foi habilitado recentemente (16/01/21), que o prefixo 13 é da região de Santos/SP, embora o endereço de cadastro (possivelmente falso) seja de Curitiba/PF. Análise de extratos de ERBs identifica que tal terminal transita entre as idades de Paranagua/PR, Salvador/BA e inclusive Natal/RN, onde o GOLFO PESCA continua atracado. Pela relevância, também será requisitada a interceptação desse novo terminal.
Uma outra “encomenda” que levanta sérias suspeitas com relação ao tipo de atividade a ser desenvolvido por FABIO junto a GOLFO PESCA é a busca de uma “CENTOPEIA”, espécie de corrente com ganchos. Em ligação telefônica com seu preposto ESTEFANIO e com NINO fala do dispositivo utiliza justificativa incompatível com o uso desse equipamento e fala em acoplar uma “câmera para ver o fundo do mar”.... ‘as espécies que tem”. (ID 56056459 e ID 56056720).
Com “NINO”, FABIO também revela que pretende fazer modificações no GOLFO PESCA, reduzindo a capacidade de estocagem os porões de pesca para aumentar (triplicar ou quadruplicar) a capacidade de combustível da embarcação (ID 56056720, ID 56056860).
Um outro contato de relevo que surgiu durante o último monitoramento é a pessoa de “GORDÃO”, usuário do terminal (47)99957-7534. Novamente, como é típico de atividades ligadas ao tráfico, os interlocutores comentam que é mais seguro se comunicar via SMS, a qual seria mais segura que Whatsapp (ID 56428779, 56431240, 56431239, 56431235, 56431236, 56431302, 56431306, 56431301, 56431456, 56493578, 56494471, 56531507, 56531667, 56531593, 56531592, ETC). Por tal motivo, ao final também representamos pela interceptação dessa linha.
Também o tripulante IZIDORO, anteriormente descrito no RDP 01/2020, é contado por FABIO que marca uma reunião para a próxima segunda (05/04/2021), quando precisam tratar
pessoalmente
de uma “
pescaria boa”
(ID 56472399). Por tal motivo, a partir do momento presente se torna necessária a interceptação da linha (48) 99979-8283 utilizada por IZIDORO.
Com relação à linha velada de FABIO, o terminal 77-99285763, o qual voltou a ser utilizado no período (embora sem ligações telefônicas), análise dos extratos WhatsApp em minuciosa busca por suspeitos, chegou-se a quatro novos terminais, todos habilitados à pouco tempo e com falsos cadastros de endereço se comparado com o DDD de habilitação, portanto cadastrados em nome de laranjas. Portanto, torna-se extremamente necessário a interceptação dos terminais 55(48)84926916, 55(48)84926916, 55(11)963987408, 55(47)97234047.
Na presente quinzena, com relação ao investigado DUDU (Eduardo Hamilton Fernandes) não houve captação de diálogos relevantes. Entretanto, pela importância do alvo, equipe policial acompanhou veladamente um pouco da rotina do mesmo, sendo os dados registrados no RDP 02/2021 (anexo), com deslocamentos entre o Rio Tavares (Fpolis/SC) e Balneário Camboriú/SC.
Por fim, e conforme já demonstrado acima e ao longo das demais representações de continuidade das interceptações telefônicas, é extremamente dificultoso o pleno êxito investigativo com relações a grupos criminosos, especialmente ligados ao tráfico de drogas, por meio tão somente das ferramentas tradicionais de investigação como vigilâncias e interceptação telefônica.
Investigados em crimes de tráfico, experientes e cautelosos, evitam ao máximo o uso de telefone convencional optando sempre pela utilização de conversas via aplicativos em relação aos quais têm ciência de que ainda não é possível a interceptação pela polícia. Já se verificou também por parte dos investigados a estratégia de tratar de assuntos importantes apenas presencialmente.
Por fim, registro que anteriormente a equipe de investigação havia desistido da instalação de escuta ambiental no veículo I/LR ROVER SDV8 VOGUE cor preta, placa OKB7J77, uma vez que o mesmo havia manifestado desejo de venda do veículo. Entretanto, acompanhamentos recentes demonstram que o mesmo desistiu da ideia de venda do veículo e efetivamente está utilizando o mesmo (RAPJ 02/21 e 03/21).
Portanto, renovamos nosso pedido de autorização judicial para instalação de escuta ambiental, inclusive nos mesmos moldes já anteriormente autorizados em sede policial, informando agora que o número a ser acoplado no equipamento de escuta, operado pela Polícia Federal, é o terminal 48 98839-0722, pelo qual também representaremos ao final por sua interceptação.
Ressaltamos apenas que, na prática, o equipamento de interceptação ambiental funciona como um telefone celular em modo “viva voz”, recebendo ou efetuando chamadas de forma dissimulada e captando os sons do ambiente onde se encontra. Para a execução da medida requerida, da mesma forma que um terminal celular, ele necessita de um chip de telefonia, cujos sinais serão devem ser interceptados e transmitidos para os canais próprios de análise policial, do mesmo modo como ocorre nas interceptações telefônicas ordinárias.
Esclarecemos também que uma vez deferido o pedido,
a colocação do equipamento discreto ficará na dependência do surgimento de oportunidade segura para a polícia
, respeitado o período de 15 dias de gravação, findos os quais será produzido o respectivo auto circunstanciado de transcrição, contendo também todas as especificidades da execução da diligência.
(...).
(Processo 50107122120204047208, evento 192, REPRESENTACAO_BUSCA1).
Considerando ser este o oitavo pedido de interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas apreciado no curso dos presentes autos, incluindo um pleito de natureza suplementar, ressalto que já foram apresentados, pela Autoridade Policial, outros sete relatos referentes ao andamento das investigações, já colacionados nas decisões proferidas nos eventos 15, 36, 63, 111, 130, 142 e 177.
A ênfase da descrição dos fatos contida nos autos é para a prática, em tese, pelo menos, dos crimes previstos nos arts. 33 e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006.
Tais crimes ensejam punição com pena de reclusão, não se tendo presente neste caso, portanto, o impeditivo previsto no inciso III do art. 2º da Lei nº 9.296/96, que diz respeito, a meu sentir, à proporcionalidade em sentido estrito da medida pleiteada.
Já em análise do impeditivo previsto no inciso II do art. 2º da Lei nº 9.296/96, tenho que guarda ele concernência com a necessidade da medida pleiteada, ou seja, quanto a não haver forma diversa, que menos afete a intimidade das pessoas investigadas, de se obter prova sobre se são elas, ou não, autoras ou partícipes das práticas criminosas investigadas. A esse propósito, parece evidente que a ação investigativa poderia optar por outros rumos de obtenção de elementos de prova, diversos da interceptação de comunicações: poder-se-ia, por exemplo, optar por primeiro empreender busca nas residências e locais de trabalho das pessoas investigadas, e, nesse caso, eventualmente, poder-se-ia lograr apreender elementos de convicção, quem sabe até mesmo obtendo desde logo a prova da materialidade de crime; poder-se-ia, também, primeiramente, chamar as pessoas investigadas para depor perante a Autoridade Policial, e, nesse caso, poder-se-ia, quem sabe, delas obter até mesmo uma confissão acerca de sua participação nos fatos, ou delação contra os outros partícipes; poder-se-ia, também, colocar agentes policiais seguindo os investigados sem que estes disto soubessem, para que, no momento certo, viessem estes a ser apanhados em flagrante com elementos de prova. São várias, portanto, as outras formas pelas quais se poderia obter elementos de prova contra os investigados. O que sucede, porém, é que as demais formas de obtenção de provas não se afiguram, neste caso em específico, suficientemente seguras quanto a um padrão mínimo de eficácia da ação investigativa. Com efeito, a realização imediata de busca e apreensão, por exemplo, sem um trabalho mais aprofundado e precedente de inteligência, até poderia culminar com a apreensão de algum elemento de convicção relevante, mas também seria possível que, ocasionalmente, tal medida viesse a ser realizada justamente em momento no qual nada houvesse a ser apreendido e, nesse caso, a precipitação em empreender desde logo uma tal medida preveniria os investigados contra outras ações investigativas futuras, colocando pá de cal sobre o êxito do restante das investigações; a coleta imediata de depoimentos dos envolvidos até poderia resultar na obtenção de confissões ou delações, mas, evidentemente, poderia resultar apenas em coleta de negativas veementes de culpa, revelando-se providência que, então, muito além de ser inexitosa, culminaria por também prevenir os investigados acerca da realização das investigações; a colocação de agentes seguindo os envolvidos para propiciar prisões em flagrante em momentos nos quais estivessem na posse de prova material do crime até lograria obtenção de alguns elementos de convicção, mas eles tenderiam a ser localizados apenas em parte dos investigados, surgindo daí dificuldades para que esse êxito inicial compartimentado da investigação possa depois ser estendido para alcançar todos os demais envolvidos na prática delituosa, isso sem nem contar as dificuldades para que haja êxito em seguir-se alguém sem que se tenha informações paralelas dos locais para onde esteja indo e das atividades que está por empreender. Sob esse enfoque, penso que o impeditivo atinente ao art. 2° da Lei n° 9.296/96 diz respeito a situações onde, de fato, outros meios de prova possam substituir a interceptação de comunicações com um mesmo nível de probabilidade de êxito na descoberta da verdade real, e com um mesmo nível de segurança quanto ao risco de que um infortúnio localizado havido na investigação não previna os investigados acerca de toda a ação policial, contribuindo para mobilizá-los a que atuem para dificultar ainda mais a descoberta da verdade real. O escopo da norma é evitar a banalização das escutas telefônicas, e não a exaltação da ingenuidade investigativa. A interceptação das comunicações é, de fato, portanto, medida extremamente necessária, porque única a propiciar a evidenciação em questão com aquele nível de segurança para o êxito das investigações na busca da verdade real que antes foi mencionado (dá-se por cumprido, nos termos expostos, o disposto no inciso V do art. 10 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça).
Vale registrar, por sinal, que, embora a investigação esteja ainda numa fase inicial, não é a interceptação de comunicações telefônicas a primeira medida investigativa adotada, tendo havido outros procedimentos de investigação que a antecederam (passa-se a atender, a seguir, ao disposto no inciso IV do art. 10 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça): foi colhida imagem da primeira embarcação investigada, de nome
Golfo Pesca V
, quando se encontrava em Natal/RN, atracada em região supostamente dominada por facção criminosa (Processo 50107122120204047208, evento 01, INF3 e INF2, págs. 09/10). Também foi feita a checagem de deslocamentos da referida embarcação por meio dos pontos obtidos pelo sistema alusivo ao Programa Nacional de Rastreamento de Embarcações Pesqueiras por Satélite (Sistema PREPS), o qual demonstrou que efetivamente operou nos portos pesqueiros de Itajaí/SC e de Angra dos Reis/RJ entre 2018 e 2019, e que realizou deslocamento até a região nordeste do pais, onde, em tese, não estaria autorizada para realização de atividade pesqueira (Processo 50107122120204047208, evento 01, INF2, págs. 06/09). Houve identificação de pessoa que teria integrado a tripulação da embarcação (Processo 50107122120204047208, evento 01, INF2, págs. 10/12). Houve coleta de elemento informativo de que Fabio Adriani Oliveira de Souza teria constado como integrante da tripulação da embarcação em data recente (Processo 50107122120204047208, evento 12, OFIC1, pág. 07), disso se depreendendo existência de ligação efetiva entre o barco e Fabio, que, ao menos numa impressão inicial, confirmou a possibilidade de deter este último o controle de uso da embarcação, como inicialmente cogitado na investigação. Quanto à segunda embarcação investigada, foi efetuada diligência de campo que colheu as suspeitas iniciais sobre a embarcação
Oceano Brasil
, propiciando que dela se realizasse imagem (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, pág. 02), com coleta de dados acerca da mesma (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, págs. 02/03), inclusive do registro oficial de sua localização (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, pág. 03), verificação de sua movimentação pelo Sistema PREPS (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, págs. 04/08), constatação de estadia suspeita na costa do Rio Grande do Norte (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, pág. 08), identificação de sua tripulação (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, pág. 09/13), de seu proprietário (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, pág. 03), com apuração de ações de mobilidade por este empreendidas (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, pág. 13/18) e de possíveis comparsas de atuação mais destacada nos atos suspeitos, com elos comuns de mobilidade (Processo 50107122120204047208, evento 140, INF2, págs. 19/23).
Por fim, o impeditivo previsto no inciso I do art. 2º da Lei n° 9.296/96 tem a ver com a adequação da medida pleiteada em relação aos fatos investigados, ou seja, se estão ou não presentes indícios razoáveis de que as pessoas que serão afetadas pela medida requerida efetivamente são autoras ou partícipes das infrações penais supostamente praticadas. Nesse sentido e observando aquela acepção prevista no art. 239 do Código de Processo Penal (e se passa agora ao atendimento do disposto no inciso III do art. 10 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça), penso que a interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas tende a propiciar conhecimento sobre comunicações empreendidas pelas pessoas suspeitas, evidenciando outras pessoas que com elas se comunicam, propiciando angariar informações sobre locais, datas, horários, o que facilitará o preparo e desenvolvidemento de outras ações investigativas, tudo isso servindo para confirmação de suspeitas sobre os alvos já eleitos e, eventualmente, identificação de outros agentes que possam estar tomando parte das ações criminosas sob investigação.
A partir da documentação apresentada pela Autoridade Policial, verifico a superveniência, no último período da investigação, de novos elementos a roborar as suspeitas de que as pessoas investigadas estejam envolvidas na prática de crimes. Com efeito, a representação da Autoridade Policial antes transcrita dá conta de que Fábio, aparente líder das ações associadas ao barco Golfo Pesca V, estaria adotando medidas destinadas a operacionalizar potencial empreitada criminosa, tanto arregimentado tripulantes quanto buscando munir a embarcação dos petrechos necessários à prática delituosa, havendo registro de comunicação telefônica na qual ele solicitou, a loja de utensílios náuticos de Itajaí/SC, que entregasse determinado material em Natal/RN, local onde se sabe estar atracada a embarcação
Golfo Pesca V
. Também há notícia de que estaria ele em busca de corrente que supostamente seria utilizada para acoplagem de câmera que permitiria visualização do fundo do mar, o que não seria usual na atividade pesqueira. E foram registradas conversas acerca do aumento da capacidade dos tanques de combustível da embarcação, a partir da redução de sua capacidade de carga, medida que parece condizente com a utilização em viagens mais prolongadas, com prioridade para o transporte de algo mais valioso que o produto da pesca convencional.
No tocante aos investigados cujo envolvimento se dá a partir da embarcação Oceano Brasil, de se registrar a informação, comprovada por registro fotográfico, de que o barco se encontra atualmente atracado no município de Navegantes/SC, o que reforça a existência de laços de seu proprietário com a região. Ademais, conquanto haja notícia de que alguns de seus tripulantes estejam procurando outras embarcações para trabalhar no curto prazo, penso que a aparente realização de ação destinada a remessa de entorpecente ao exterior no período de apuração passado, tal como narrado na respectiva decisão (Processo 50107122120204047208, evento 177, DESPADEC1), lança luz sobre o potencial envolvimento de pessoas a ela associadas com o tráfico transnacional de drogas, tornando razoável que se prossiga, ao menos por ora, na interceptação de comunicações telefônicas de tais investigados, seja diante de possíveis comunicações reportando os acontecimentos verificados com a embarcação recentemente, seja em razão do possível planejamento de novas ações para o futuro.
Há, portanto, enfim, adequação na prorrogação da interceptação telefônica dos números nela já abrangidos, para aprofundamento das investigações que buscam elucidar a verdade diante das fundadas suspeitas formadas.
Observo, ainda, que há pleito de inclusão de vários novos números no rol de terminais alcançados pela interceptação de comunicações telefônicas.
Quanto ao número 48-98839-0722, observo que a Autoridade Policial indicou que se trata do terminal de telefonia celular agora associado à escuta ambiental anteriormente já deferida (Processo 50107122120204047208, evento 36, DESPADEC1, tópico 06), mas ainda não implementada junto ao veículo Land Rover/SDV8 VOGUE de placas OKB-7J77, pelo que penso ser lógico que, havendo mera adequação do número de telefone a ser utilizado para implementação da medida investigativa em enfoque, haja deferimento do pleito de inclusão.
Os números 11-95475-9241, 11-96398-7408, 48-98492-6916 e 47-99723-4047 dizem respeito a terminais recentemente habilitados e com códigos DDD distintos do endereço de seu proprietário formal, o que gera a suspeita de que tenham sido habilitados em nome de pessoas distintas dos reais usuários, para emprego por integrantes da organização criminosa, havendo registro de troca recente de mensagens, mediante utilização do aplicativo
Whatsapp
, entre os usuários de tais terminais e o número 77-9928-5763, este que é tido como correspondente a linha utilizada pelo investigado Fábio de maneira restrita ás comunicações envolvendo a atividade criminosa supostamente desenvolvida. Consigno, por oportuno, que, a despeito de o relato fático vertido na representação da Autoridade Policial, em aparente equívoco, citar por duas vezes o número 48-98492-6916 e não mencionar o número 11-95475-9241 (Processo 50107122120204047208, evento 192, REPRESENTACAO_BUSCA1, pág. 07), certo é que este terminal mencionado por último está expressamente incluído na parte dispositiva do pedido final formulado (Processo 50107122120204047208, evento 192, REPRESENTACAO_BUSCA1, págs. 11 e 14) como sendo um daqueles cujas comunicações se pretende ver interceptadas, havendo sido referido no Relatório de Análise de Polícia Judiciária que instrui o pedido feito pela autoridade policial, no mesmo contexto que os demais (Processo 50107122120204047208, evento 192, INF2, págs. 31/37). Por tudo isso, entendo haver pleno cabimento na inclusão de tais terminais ao rol dos alcançados pelas medidas de interceptação deferidas na presente decisão.
Quanto ao número 41-99279-2041, verifico que, a despeito de associado a código DDD do estado do Paraná, foi habilitado, recentemente, em nome de pessoa que residiria em Mossoró/RN, havendo registro de que o investigado Fábio a ele dirigiu sucessivas chamadas telefônicas não atendidas, o que sugere que possa estar sendo utilizado por algum comparsa.
Já o número 13-99664-9101 foi identificado como sendo o único com o qual o já referido terminal de número 41-99279-2041 se comunicou no mais recente período das investigações, o que gera suspeitas sobre seu potencial uso por outro integrante da organização criminosa.
O número 47-99957-7534 é associado a homem ainda não identificado, conhecido pela alcunha de
"Gordão"
, que se comunicou por mensagens SMS com o investigado Fábio no mais recente período de apuração, inclusive com afirmação de que tal método seria mais seguro que o emprego do aplicativo
Whatsapp
. Os contatos recorrentes e a preocupação com a segurança igualmente sugerem que dito número possa ser empregado por pessoa associada às atividades criminosas empreendidas por Fábio, estando, assim, justificado que seja incluído entre aqueles alcançados pela interceptação de comunicações deferida.
O terminal 48-99979-8283 é associado a pessoa conhecida como Izidoro, este que parece ser tripulante da embarcação que se suspeita seja empregada na traficância e que manteve contato telefônico com Fábio em época recente, agendando, com este, reunião pessoal para falarem de uma
"pescaria boa"
, havendo, no uso dessa expressão, possível eufemismo para o acerto de participação em ação criminosa, daí a conveniência de inclusão entre os terminais com comunicações interceptadas.
Por fim, o terminal 48-98463-6003 é associado a pessoa conhecida como Jefferson, outro potencial tripulante da embarcação que, recentemente, manteve contato com Fábio, ocasião em que este último pediu, àquele, para que olhasse, rapidamente, mensagem enviada pelo aplicativo
Whatsapp
, a qual seria logo apagada pelo comparsa, gerando esse comportamento suspeita de que o assunto tratado envolveria a traficância ou alguma outra atividade criminosa, daí se justificando a inserção do referido número ao rol dos alcançados pelas medidas investigativas deferidas nos presentes autos.
Consigno, nos termos do art. 5º da Lei nº 9.296/96, que a validade da autorização para implementar a interceptação de comunicações telefônicas tem prazo inicial de quinze dias, o qual, porém, poderá ter a necessidade de sua prorrogação avaliada oportunamente se vier esta a ser requerida em tempo futuro (há cumprimento, aqui, do disposto no inciso VII do art. 10 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça). Sem negar respeito a entendimento diverso, enfatizo, aqui, minha compreensão de que a expressão
"uma vez"
, constante do art. 5º da Lei nº 9.296/96, faz as vezes de conjunção subordinativa adverbial condicional, introduzindo a enunciação de condição necessária para a renovação do prazo da interceptação, e não quantificando o número de renovações possíveis. A mesma conclusão já se chegou por diversas vezes no âmbito do Supremo Tribunal Federal:
(...).
É lícita a prorrogação do prazo legal de autorização para interceptação telefônica, ainda que de modo sucessivo, quando o fato seja complexo e, como tal, exija investigação diferenciada e contínua.
(...).
(STF, Plenário, INQ 2424, rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 26.11.2008).
(...).
Considerando o entendimento jurisprudencial e doutrinário acerca da possibilidade de se prorrogar o prazo de autorização para a interceptação telefônica por períodos sucessivos, quando a intensidade e a complexidade das condutas delitivas investigadas assim o demandarem, não há que se falar, na espécie, em nulidade da referida escuta, uma vez que foi autorizada pelo Juízo de piso, com a observância das exigências de fundamentação previstas na lei de regência (Lei nº 9.296/96, art. 5º).
(...).
(STF, 1ª Turma, HC 102601, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 04.10.2011).
(...).
É cediço na Corte que as interceptações telefônicas podem ser prorrogadas por mais de uma vez, desde que comprovada sua necessidade mediante decisão motivada do Juízo competente, como ocorrido no caso sub judice. Precedentes: RHC 85575/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ªTurma, DJ de 16/3/2007; RHC 88371/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ªTurma, DJ de 2/2/2007; HC 83515, rel. Min. Nelson Jobim, Pleno, DJ de 4/3/2005; Inq 2424, rel. Min. Cezar Peluso, Pleno, DJ de 26/3/2010.
(...).
(STF, 1ª Turma, HC 104934, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 20.09.2011).
RECURSO EM HABEAS CORPUS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PRAZO DE VALIDADE. PRORROGAÇÃO. POSSIBILIDADE. Persistindo os pressupostos que conduziram à decretação da interceptação telefônica, não há obstáculos para sucessivas prorrogações, desde que devidamente fundamentadas, nem ficam maculadas como ilícitas as provas derivadas da interceptação.
(...).
(STF, 2ª Turma, RHC 85575, rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 28.03.2006).
(...).
É possível a prorrogação do prazo de autorização para a interceptação telefônica, mesmo que sucessivas, especialmente quando o fato é complexo a exigir investigação diferenciada e contínua.
(...).
(STF, Plenário, HC 83515, rel. Min. Nelson Jobim, julgamento em 16.09.2004).
Essa interpretação, friso, ao apegar-se à própria gramática, é meramente literal e, por isso mesmo, estrita, e não ampliativa (faço aqui essa afirmação em razão do disposto no art. 14 da Resolução nº 59/2008, na redação conferida pelo art. 1º da Resolução nº 217/2016, ambas do Conselho Nacional de Justiça).
[...]
03.
Informações acerca da conta do aplicativo
Whatsapp
.
Também foi requerido acesso, junto à empresa Facebook, administradora do aplicativo
Whatsapp
, de informações alusivas às contas do aludido aplicativo cadastradas para os terminais telefônicos em relação aos quais deferida a prorrogação da interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas, bem como das comunicações em si estabelecidas a partir de tais contas.
A necessidade, a adequação e a proporcionalidade em sentido estrito que justificam, nos termos antes explicitados na presente decisão, o acesso a informações contidas em comunicações telefônicas e telemáticas que estejam ainda em desenvolvimento e envolvam os alvos da investigação, justificam, também, o acesso a informações semelhantes que integrem tanto o conteúdo em si de comunicações que estejam em desenvolvimento pelo aplicativo
Whatsapp
e mesmo outros assemelhados, quanto, também, o acesso a elementos a tais comunicações extrínsecos, que possibilitem identificar quando as comunicações ocorreram, dados e imagens acerca de interlocutor que delas participou, pessoas com quem comunicações tenham sido ou possam ainda vir a ser travadas, dados de funcionamento do aplicativo e endereços eletrônicos à conta associados.
Não que se faça devido o espelhamento de contas de whatsapp, pelo qual tenha a Autoridade Policial acesso a utilizá-las com possibilidade de até mesmo produzir e enviar mensagens. Isso não deve ocorrer.
O que é devido é o registro das mensagens recebidas e enviadas a partir da conta, ao longo do período de interceptação das comunicações - que, desde logo, é estabelecido em quinze dias, passíveis de prorrogação por nova decisão judicial -, e o posterior envio de relatório reproduzindo-as, com indicação de horários, remetentes, destinatários, ausência ou presença de sinal de que foi recebida ou lida, entre outras informações disponiveis.
Para respaldar o deferimento do acesso ao conteúdo das comunicações e a informações alusivas às contas do aplicativo
Whatsapp
- inclusive quanto ao caráter vinculante do que for decidido na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5527, lastreada na discussão sobre a validade constitucional do art. 10, § 2º, e do art. 12, incisos III e IV, ambos da Lei nº 12.965/14, e na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 403, ajuizada visando a obstar a determinação de suspensão dos serviços do WhatsApp -, incorporo à fundamentação da presente decisão os argumentos sustentados nos precedentes com ementas a seguir colacionadas:
APELAÇÃO. DECISÃO QUE IMPÔS MULTA SANCIONATÓRIA POR DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. INTERCEPTAÇÃO DO FLUXO DE COMUNICAÇÕES VIA APLICATIVO WHATSAPP DETERMINADA NO BOJO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL (OPERAÇÃO "SIMON"). AUSÊNCIA DE PREJUDICIALIDADE. INTERVENÇÃO DA WHATSAPP INC. COMO ASSISTENTE SIMPLES. DESCABIMENTO. LEGITIMIDADE DA FACEBOOK DO BRASIL PARA CUMPRIMENTO DA DECISÃO. CRIPTOGRAFIA. DADOS DE COLETA, GUARDA, ARMAZENAMENTO E TRATAMENTO DE DADOS PESSOAIS OU DE COMUNICAÇÃO DEVERÃO SER MANTIDOS EM FORMATO INTEROPERÁVEL E ESTRUTURADO PARA FACILITAR O ACESSO DECORRENTE DE DECISÃO JUDICIAL OU DETERMINAÇÃO LEGAL. NATUREZA COERCITIVA DA MULTA. BLOQUEIO DE VALORES VIA BACENJUD. POSSIBILIDADE. REDUÇÃO DO VALOR. APELO PROVIDO EM PARTE.
1. Foi determinada à empresa Facebook do Brasil a interceptação do fluxo das comunicações do aplicativo WhatsApp de investigados no âmbito da Operação "Simon", com vista à apuração de supostos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, de lavagem de dinheiro e de constituição de organização criminosa, com a fixação de multa no valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) por dia, no caso de eventual descumprimento. Em razão da inércia da companhia, foi determinada a aplicação da multa relativa ao período de 42 (quarenta e dois) dias, no valor total de R$ 21.000.000,00 (vinte e um milhões de reais), o qual foi bloqueado das contas bancárias, via Bacenjud, pelo Juízo de origem.
2. Sem descurar do caráter vinculante do quanto for decidido na ADI-5527, lastreada na discussão da constitucionalidade do art. 10, § 2º, e art. 12, III e IV, ambos da Lei nº 12.965/14, e na ADPF-403, ajuizada visando a obstar a determinação de suspensão dos serviços do WhatsApp, ambas encontram-se ainda em andamento. Portanto, nada obsta que o curso deste processo tenha prosseguimento.
3. (...).
4. Não se admite a intervenção da WhatsApp Inc. como assistente simples. Não existe relação jurídica entre o WhatsApp Inc. e o Facebook Serviços OnLine do Brasil Ltda. A condição de integrante do mesmo grupo econômico não traduz relação jurídica capaz de ensejar a admissão como assistente. No caso presente, não é possível afirmar com segurança, com base no pertencimento ao mesmo grupo econômico, que o WhatsApp esteja sofrendo os efeitos da decisão recorrida, sequer reflexamente. O valor da multa/astreinte está indisponibilizado na conta do Facebook Serviços OnLine do Brasil Ltda, com capacidade de ser destinatário da lei brasileira. Vencida a Relatora, que entendia que a WhatsApp Inc. tem interesse jurídico na demanda, uma vez que, à luz da legislação brasileira, deve desenvolver soluções técnicas para disponibilizar o fluxo de informações, em cumprimento a ordem judicial, uma vez que, em casos como os dos autos, a medida se mostra como meio imprescindível para obtenção de elementos informativos, em razão da natureza das condutas investigadas.
5. A ponderação do conflito entre valores constitucionais que a complexidade deste caso oferece não parece ser passível de resolução no seio do Poder Judiciário, ao menos no âmbito desta Corte, exigindo intervenção legislativa. Trata-se de ponderação a ser promovida por meio de lei, dados os contornos e multiplicidade de interesses em conflito e a profusão de informações e debates necessários à tomada de decisão.
6. Instituições devem lidar com constrangimentos e limitações reais e a estruturação dos poderes do Estado se dá em função da escassez informacional. Cabe à legislação concretizar o direito constitucional à livre iniciativa, e não o juiz remover leis editadas para excepcionar determinada classe de empreendedores, sem contar com toda a informação que possa afluir dos diversos setores sociais. Em especial quando os interesses constitucionais em conflito sejam tão prementes quanto ao da segurança pública, em confronto com o da livre iniciativa. O Judiciário não é o órgão melhor equipado a solver tal conflito. Por atribuição deve, prioritariamente, resolver disputas concretas mediante o uso de informações sobre eventos passados, no interesse de litigantes. As informações são produzidas segundo garantias processuais e regras procedimentais e a adjudicação é baseada em provas e evidências antagônicas, submissíveis ao contraditório. Tribunais (Juízos, Juizados, Turmas Recursais ou Tribunais, assim como seus órgãos fracionados) são especificamente aparelhados para a coleta de provas que permitam a tomada de decisões em condições de informação incompleta. Não pode este Tribunal Regional, com os dados que dispõe, afastar o cumprimento de exigência legal em nome do princípio do livre mercado, processando informações técnicas e também de preferências coletivas de âmbito nacional, tarefa à qual o legislador - ou talvez o próprio STF, com atuação em todo o Brasil e mediante o uso da modalidade de audiência pública - está nitidamente mais capacitado. Cabe à empresa interessada interceder perante as instâncias responsáveis pelo balanceamento proposto em sentido geral e prospectivo.
7. Ainda que assim não fosse, a prestação de informações ao juiz é tecnicamente possível, mesmo em caso de encriptação ponta-a-ponta. Poderia o Whatsapp desenvolver meios de capturar o código fornecido para habilitação do Whatsapp WEB, utilizando-o para fins de espelhamento, mediante determinação judicial, satisfazendo, assim, a obrigação legal, conforme laudo pericial elaborado no bojo dos autos nº 5003809-05.2017.4.04.7004. Não parece estar afastada, pelo laudo, a possibilidade de entrega do código QR à investigação - para os casos que dispensem a não-notificação ao usuário, ou naquelas em que a notificação não irá ocorrer automaticamente - o que não teria relação direta com as propaladas inviabilidades técnicas decorrentes da encriptação ponta-a-ponta. Nos casos em que houver necessidade de interceptação de fluxo contínuo de comunicação de usuários de desktop, o sistema desenvolvido pela empresa não parece ser infenso à construção de programas ou alternativas que permitam o cumprimento do dever legal. Deverá, por certo, manter controle estrito sobre tais alternativas, justamente como preveem as disposições do Marco Civil da Internet.
8. A assertiva de que inexistiria regulação que impusesse a necessidade de quebra da criptografia pelas plataformas de comunicação online não parece proceder, sendo que é possível identificar, opostamente, a existência de obrigação legal de informar mediante ordem judicial. A possibilidade de encriptação não exclui o dever de preservar e entregar os dados às autoridades judiciárias, ou exclui o Whatsapp de possibilitar a interceptação do fluxo de comunicação - ou algo que lhe faça as vezes. Os provedores de conexões e de aplicações devem manter os dados de acesso e de comunicação em formato interoperável e estruturado para o atendimento das determinações judiciais. No caso dos autos, estão presentes os requisitos da Lei nº 9.296/96 para a interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática, tendo em conta que apontados indícios da prática de condutas graves, que envolviam crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, lavagem de capitais e organização criminosa. Eventuais entraves operacionais e sistêmicos enfrentados pela companhia não são fundamento para afastar cumprimento de ordem judicial, cabendo à empresa providenciar aprimoramento de seu sistema para sempre atender às demandas correlatas ao serviço que se dispõe a prestar. A colaboração da apelante para a identificação da autoria e comprovação da materialidade mostrava-se indispensável, não sendo admissível a negativa apresentada, tampouco a desídia demonstrada em relação à legislação pátria e à ordem emanada pela Justiça criminal. Evidenciado o descumprimento da decisão judicial, que determinou a interceptação das comunicações realizadas via WhatsApp, em período determinado, de investigados no âmbito da Operação "Simon".
9. Não obstante a interceptação das comunicações do aplicativo WhatsApp devesse ser implementada pela empresa WhatsApp Inc., localizada no exterior e sem representação jurídica no Brasil, a ordem judicial foi dirigida à Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., por ser empresa sediada em território nacional que integra o mesmo grupo econômico, com fundamento no art. 11 do Marco Civil da Internet. Na solicitação de informações a grupos empresariais, como é o caso da relação Facebook e WhatsApp, o Poder Judiciário, diante da urgência e gravidade dos fatos criminosos que almejava evitar e esclarecer, pode exigir que a informação seja prestada por pessoa jurídica situada no Brasil, a qual detém conhecimentos suficientes para encaminhar a decisão judicial para o pronto atendimento pelo setor competente ou por outra empresa pertencente ao conglomerado, localizada em território estrangeiro.
10. O Marco Civil da Internet no Brasil estabelece que os dados de coleta, guarda, armazenamento e tratamento de dados pessoais ou de comunicação deverão ser mantidos em formato interoperável e estruturado para facilitar o acesso decorrente de decisão judicial ou determinação legal, respeitadas as diretrizes do artigo 13 do Decreto nº 8.771/2016. Os provedores de conexões e de aplicações devem manter os dados de acesso e de comunicação em formato interoperável e estruturado para o atendimento das determinações judiciais.
11. (...).
(TRF4, Processo 50135696920174047200, rel. Des. Fed. Cláudia Cristina Cristofani, julgamento em 13.08.2019).
PROCESSO PENAL. INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. FACEBOOK E WHATSAPP. QUEBRA DE SIGILO. EMPRESA CONTROLADORA ESTRANGEIRA. DADOS ARMAZENADOS NO EXTERIOR. MULTA. COERCITIVIDADE. EFETIVIDADE DAS DECISÕES JUDICIAIS. CONTEMPT OF COURT. MARCO CIVIL DA INTERNET. LEGIMITIDADE DE TERCEIROS. PARÂMETROS DA SANÇÃO PROCESSUAL. MARCO TEMPORAL. META DADOS. OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO. (...).
1. Determinada a quebra de sigilo telemático em investigação de crime cuja apuração e punição sujeitam-se à legislação brasileira, impõe-se ao impetrante o dever de prestar as informações requeridas, mesmo que os servidores de dados da empresa se encontrem em outro país, uma vez que se trata de empresa constituída conforme as leis locais e, por este motivo, sujeita tanto à legislação brasileira quanto às determinações da autoridade judicial brasileira.
2. O armazenamento de dados no exterior não obsta o cumprimento da medida que determinou o fornecimento de dados telemáticos, uma vez que basta à empresa controladora estrangeira repassar os dados à empresa controlada no Brasil, não ficando caracterizada, por esta transferência, a quebra de sigilo.
3. Nos termos do Marco Civil da Internet, é lícita a transmissão de mensagens criptografadas, assim como a utilização da tecnologia ponta a ponta e o protocolo Signal, não estando as empresas de telecomunicações obrigadas a modificar seus produtos para criação de meios de interceptação, como a introdução de backdoor, men-in-the-middle (MITM), espelhamento são providências que importam em modificação do produto (aplicativo) e que implicam em fragilização de sua segurança do serviço.
4. Isso, porém, não as desobriga do dever de prestar ao Poder Judiciário as informações que lhe forem requisitas e sejam tecnicamente possíveis fornecer, como metadados e mensagens criptografadas, o que não ocorreu, mesmo após dezoito meses e sucessivas ordens judiciais.
5. É imperioso que as empresas de telecomunicações, mesmo sem modificar seus produtos, auxiliem as autoridades judiciais na solução de crimes, inclusive com a apresentação de apresentando alternativas viáveis e ferramentas tecnológicas aptas à prevenção.
6. A decisão relativa ao local de armazenamento dos dados é questão de âmbito organizacional interno da empresa, não sendo de modo algum oponível ao comando judicial que determina a quebra de sigilo.
7. O legislador pátrio não descurou da necessidade de, além das próprias partes, também direcionar medidas coercitivas em face de terceiros não integrantes da relação processual penal ou mesmo de tipificar condutas como, por exemplo, o crime de desobediência (art. 330 do CP).
8. (...).
(TRF4, Processo 50141658220194047200, rel. Des. Fed. João Pedro Gebran Neto, julgamento em 02.10.2019).
Defiro, portanto, a expedição de ofício-mandado, direcionado à empresa Facebook, nos exatos termos apresentados pela Autoridade Policial:
(a) que no prazo de 05 dias, sob pena de análise de aplicação de multa judicial, a empresa WHATSAPP, por sua controladora FACEBOOK, forneça os dados da conta vinculada a todas as linhas/IMEI investigadas, fornecendo as seguintes informações: I) Dados cadastrais da conta (informações do aparelho e sistema operacional, versão do App, data e horário do registro, status de conexão, última conexão com data e hora, nome, endereço de e-mail se disponível e informações de cliente Web; II) Foto de perfil; III) Registro de acesso (IPs) dos últimos 6 meses; IV) Histórico de mudança de números; V) Grupos (data de criação, descrição, identificador do Grupo (“Group ID”), foto, quantidade de membros e nome do Grupo). Após o fornecimento da listagem de grupos, fica autorizado o fornecimento de dados dos membros dos grupos (identificação e de nomes, telefones e contas de e-mail dos integrantes dos grupos do qual faça parte o terminal monitorado) que vierem a ser indicados formalmente pela Autoridade Policial, por meio de Ofício.
(b) Por fim, pela “interceptação” telemática das contas WhatsApp associadas aos números de telefone móveis abaixo identificados, respeitados os limites técnicos, com o correspondente envio de extratos de comunicação, consistente nas informações de remetente, destinatário (inclusive com o IP do INTERLOCUTOR – “
sender IP”),
data e hora da comunicação; tipo da comunicação e o registro de acesso da conta alvo se disponível, a cada 24 horas, contados da data de implementação da medida até os 15 (quinze) dias seguintes a esta data.
(...).
(Processo 50107122120204047208, evento 192, REPRESENTACAO_BUSCA1).
As contas do aplicativo
Whatsapp
em relação às quais é deferido acesso ao conteúdo de comunicações estabelecidas e demais informações antes referidas são aquelas associadas aos terminais telefônicos especificados na tabela seguinte:
Linha/IMEI
Usuário
Operadora
Situação
+55-47-99758-4625
SANTIAGO
TIM
Inclusão
+55-48-99113-0815
BIANKA/FABIO
VIVO
Prorrogação
+55-48-98817-0000
FABIO
VIVO
Prorrogação
+55-77-99928-5763
FABIO
VIVO
Prorrogação
+55-77-99965-8923
NANDO
VIVO
Prorrogação
+55-48-99931-6078
DUDU
CLARO
Prorrogação
+55-28-98113-7923
CACAU
TIM
Inclusão
+55-47-99957-7534
GORDÃO
TIM
Inclusão
+55-47-99723-4047
Camila WhatsApp77
TIM
Inclusão
+55-11-95475-9241
Fabia WhatsApp77
TIM
Inclusão
+55-11-96398-7408
José Reinaldo WhatsApp77
VIVO
Inclusão
+55-41-99279-2041
THALLISON SMS 77
VIVO
Inclusão
+55-13-99664-9101
GREGORY LIG 2041
VIVO
Inclusão
+55-48-98492-6916
Eodesio WhatsApp 77
Oi
Inclusão
[...]
A análise dessa decisão revela que os fundamentos do deferimento da medida probatória impugnada e seu direcionamento ao terminal n. (13) 99664-9101 são sólidos e estritamente aderentes à legislação vigente.
O ato decisório foi consistentemente fundamentado na Lei n. 9.296/96 e na Lei n. 12.850/13. Observou-se os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade, bem como a existência de elementos razoáveis que sustentavam a suspeita de provável concorrência do usuário da linha interceptada para o cometimento das infrações penais investigadas.
No caso em questão, a investigação, denominada "MAR ABERTO", não teve início a partir de denúncias anônimas ou de forma especulativa. Pelo contrário, ela surgiu de uma comunicação formal e objetiva da Coordenação-Geral de Polícia de Repressão a Drogas e Facções Criminosas (CGPRE-FC) da Polícia Federal. Essa comunicação apontou fundadas suspeitas de envolvimento da embarcação "Golfo Pesca V" com o tráfico internacional de entorpecentes. Diligências preliminares, como a coleta de imagens da embarcação em área dominada por facção criminosa e a checagem de seus deslocamentos por meio do Sistema PREPS
— que demonstrou operações em portos e deslocamentos anômalos —
precederam qualquer requerimento de interceptação telefônica. Dessa forma, a operação foi desencadeada por investigação própria, e não por ilações genéricas ou conexões indiretas desprovidas de respaldo fático concreto.
No que tange especificamente ao usuário do terminal (13) 99664-9101, sua qualificação como "interlocutor indireto" e "pessoa de interesse para a investigação" decorreu da pesquisa de dados cadastrais e históricos de outro terminal, que era de um "interlocutor direto" de alvos já investigados. A identificação de linhas com códigos DDD distintos do endereço de seus proprietários formais, ou vinculadas a IMEIs utilizados por investigados em comunicações relacionadas à atividade criminosa, como o número usado pelo investigado FÁBIO, gerou a suspeita de uso por integrantes da organização criminosa, justificando a inclusão desses terminais. Linhas como (11) 95475-9241, (11) 96398-7408, (48) 98492-6916 e (47) 99723-4047 foram incluídas no rol de medidas de interceptação por terem DDDs distintos do proprietário formal e por registrarem troca de mensagens via WhatsApp com o número (77) 9928-5763, este último sendo associado ao investigado FÁBIO em comunicações criminosas. Assim, a inclusão do (13) 99664-9101 no rol de números alcançados pela medida foi embasada em elementos concretos que o ligavam indiretamente à rede criminosa, afastando a alegação de
"fishing expedition"
.
A decisão que deferiu o meio de prova também foi categórica ao afirmar que a interceptação das comunicações era medida
"extremamente necessária, porque única a propiciar a evidenciação em questão com aquele nível de segurança para o êxito das investigações na busca da verdade real"
. Argumentou-se que outras formas de obtenção de provas, como busca e apreensão imediata, depoimentos ou vigilância física, não se mostravam suficientemente seguras ou eficazes para uma investigação complexa sem o risco de alertar os envolvidos e comprometer o êxito das diligências. De fato, a experiência demonstra que autores de fatos criminosos, ao agirem de forma cautelosa, optam por aplicativos de mensagens ou contatos presenciais. Isso sublinha a imprescindibilidade da interceptação de comunicações e de dados telefônicos e telemáticos para desvendar o
modus operandi
e a estrutura da organização.
Adicionalmente, a decisão assinalou a adequação da medida, asseverando a aptidão dela para propiciar o conhecimento sobre as comunicações entre pessoas suspeitas, a identificação de outros agentes e a obtenção de informações sobre locais, datas e horários.
Por fim, densificou-se a proporcionalidade concreta da autorização de acesso, realçando que o sigilo foi afastado de forma restrita, apenas no âmbito das investigações, em favor de pessoas que mantinham contato direto com o processo. Isso diminui a afetação da intimidade das pessoas atingidas. Sublinhou-se, ainda, que a vulneração à intimidade seria mínima diante do relevante interesse na persecução penal dos crimes investigados, que eram graves e afetavam toda a coletividade.
Com efeito, além do efetivo cumprimento do dever de fundamentação (art. 93, IX, da CF), o ato decisório observou estritamente os requisitos legais para o deferimento do meio de prova impugnado.
Diante disso, não prospera a alegação de nulidade por fundamentação insuficiente ou por ter havido
fishing expedition
. A decisão que deferiu medidas sobre o terminal (13) 99664-9101 pautou-se em indícios veementes sobre a existência de crime em curso e em vestígios sugestivos da possível concorrência do usuário da linha interceptada para o desenvolvimento dos fatos investigados. Além disso, demonstrou a imprescindibilidade da medida para o avanço da investigação, a adequação do meio de prova aos fatos investigados, e a proporcionalidade frente aos bens jurídicos tutelados, tudo em conformidade com o devido processo legal e as garantias constitucionais e legais aplicáveis.
6. Renovações do prazo da interceptação das comunicações do terminal (13) 99664-9101
A Defesa não possui interesse processual que justifique a análise da impugnação à validade da prova decorrente
das renovações
da interceptação das comunicações do terminal (13) 99664-9101.
Nenhum elemento de prova inerente às prorrogações da medida foi utilizado para fundamentar a imputação contida na denúncia ou mesmo para demonstrar a licitude do caminho percorrido até a obtenção da prova emprestada.
Conforme evidenciado no histórico de causalidade da prova emprestada (tópico 3 desta decisão), a pertinência das comunicações monitoradas permaneceu restrita. Sua contribuição se limitou à identificação do usuário da linha (CAIO) e à constatação do envio e recebimento de mensagens tendo como interlocutores usuários de terminais cadastrados no Paraguai, Bolívia, Chile e Argentina.
Com relação ao prenome do usuário, a informação foi descoberta em um diálogo telefônico mantido por ele no dia 07/04/2021. Essa informação foi utilizada unicamente para atestar que os dados cadastrais do acusado, referentes à conta de e-mail vinculada ao terminal telefônico, correspondiam aos dados primários de identificação fornecidos durante o diálogo. Com isso, a hipótese investigativa de que o usuário de fato da linha monitorada era realmente o titular da conta de e-mail ironnmann888@gmail.com ganhou maior concretude, fortalecendo o repertório de pertinência que, posteriormente, lastreou a autorização judicial de acesso aos dados em nuvem.
Esse vestígio, contudo, surgiu em
abril/2021
, durante o primeiro período de interceptação das comunicações do terminal.
A respeito dos registros de mensagens de aplicativo instantâneo de mensagens trocadas com terminais do exterior, a informação não levou à localização das contas Google e Icloud. Na linha dos fundamentos expostos no tópico 3 desta decisão, essa constatação apenas reforçou a suspeita anteriormente fundada sobre o possível envolvimento do usuário da aplicação com os fatos investigados, e as informações referem-se também a abril de 2021.
O restante do monitoramento das comunicações não forneceu qualquer contribuição causal à descoberta dos dados mantidos em nuvem, os quais foram acessados com autorização judicial após a descoberta cadastral de uma conta vinculada ao terminal telefônico.
Assim, não há utilidade processual que justifique conhecer a pretensão impugnativa da Defesa, pois as decisões que renovaram a interceptação das comunicações veiculadas por meio do terminal não interferiram em qualquer aspecto da cadeia processual que levou ao deferimento judicial do acesso aos dados de nuvem.
7. Acesso a dados armazenados em nuvem
O acesso aos dados informáticos relacionados à conta Google ironnmann888@gmail.com foi deferido pela decisão do
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 267, DESPADEC1
:
[...]
05.
Dados armazenados junto a aplicativos das empresas Google e Microsoft
.
Houve requerimento de afastamento do sigilo das caixas de mensagens e dados armazenados na nuvem que estejam vinculados aos terminais telefônicos em relação aos quais deferida a prorrogação ou mesmo o início da interceptação de comunicações telefônicas, bem como acesso a contas de e-mail associadas a pessoas investigadas, vinculadas às empresas Google e Microsoft.
A necessidade, a adequação e a proporcionalidade em sentido estrito
que justificam, nos termos antes explicitados na presente decisão, o acesso a informações contidas em comunicações telefônicas e telemáticas que estejam ainda em desenvolvimento e envolvam os alvos da investigação,
justificam, também, o acesso a informações semelhantes que, havendo constado de comunicações anteriores já finalizadas, ou sendo, enfim, úteis ao esclarecimentos do fatos, possam ser acessadas a partir de dispositivos de armazenamento de dados em nuvem ou em caixas de e-mail, nos quais venham a estar armazenadas.
Registro que há pleito de inclusão ao rol de contas alcançadas pelas medidas investigativas já anteriormente deferidas de diversos endereços eletrônicos.
Quanto aos endereços de
e-mail
bmwx10077@gmail.co
m,
izidorio.manoel.1212@gmail.com
,
ricardojoias10@gmail.com
,
324561jk@gmail.com
e
ironnmann888@gmail.com
, observo que a Autoridade Policial logrou êxito em identificá-los a partir da vinculação de tais contas com os códigos IMEI associados a várias linhas telefônicas utilizadas por investigados e já alcançadas pela interceptação de comunicações telefônicas levada a efeito nos presentes autos (Processo 50107122120204047208, evento 259, INF2, págs. 33/35). Logo, em havendo indicativo objetivo de que sejam utilizados por possíveis membros da organização criminosa, justificado o pleito de acesso ao conteúdo de tais contas.
Já o
e-mail
isaias.santiago@hotmail.com
, cuja nomenclatura já sugere estar associado ao investigado Isaias Santiago, foi identificado pela Autoridade Policial por ter sido também destinatário de mensagem de
e-mail
encaminhada a outro endereço eletrônico vinculado à mesma pessoa e já alcançado pelas medidas investigativas aqui deferidas (Processo 50107122120204047208, evento 259, INF2, págs. 26/27). Tenho, pois, por também justificado o pleito de acesso a seu conteúdo.
Defiro, portanto, a expedição de ofícios-mandado, direcionados às empresas Google e Microsoft, nos exatos termos apresentados pela Autoridade Policial:
2.3. DADOS ARMAZENADOS EM NUVEM e EMAILs – INTERCEPTAÇÃO TELEMÁTICA
Nos termos das representações anteriores, e fundamentando o pedido expressamente no comando da Lei 9.296/96 e da Lei 12.965/14, represento pelas seguintes medidas investigativas,
solicitando que sejam expedidos ofícios distintos para cada empresa
:
(a) Interceptação do fluxo de dados telemáticos em tempo real (Lei 9.296/96) e dados armazenados (Lei 12.965/14):
GOOGLE BRASIL: Google LLC 1600 Amphitheatre Parkway, Mountain View, CA 94043 (Google Brasil Internet Ltda.: Av. Brigadeiro Faria Lima, 3477 – Itaim Bibi – São Paulo/SP
- que no prazo de 05 dias, sob pena de análise de aplicação de multa judicial, promova o afastamento do sigilo das caixas de mensagens e dados armazenados nas contas vinculadas aos terminais da tabela abaixo relacionada, por meio da criação de uma conta espelho para
acesso histórico
(conteúdo armazenado desde a criação das respectivas contas)
e também acesso em tempo real
(15 dias da data de implementação da medida), com relação aos dados de cadastro, endereços físicos registrados pelos usuários e vinculados a suas contas de e-mails, IPs, datas, e horários dos acessos, itens enviados, recebidos, lixo e armazenados nos seus sistemas, além do acesso de arquivos, imagens, notas, contatos, drive (Google Drive, OneDrive), mensagens de aplicativos, serviços e histórico de localização (maps), marcas e modelos dos aparelhos vinculados aos IMEIs, números das linhas telefônicas vinculadas aos IMEIs (essa apenas nos últimos 90 dias), e quaisquer outros dados nos seus sistemas de
cloud computing
, ressaltando tratar-se de crime potencialmente previsto nos art. 33 e 35 da Lei 11.343/06, punido com reclusão, bem como que a medida encontra amparo na Lei 9.296/96 e na Lei 12.965/14. Não sendo viável a criação de contas-espelho, que a empresa providencie o envio diretamente à Polícia Federal, a cada período de 24 horas, dos pacotes de dados coletados do ambiente de
cloud computing
dos alvos interceptados, com a indicação e fornecimento dos meios técnicos necessários para os respectivos acessos. Para evitar respostas protelatórias da empresa, explicita-se os produtos GOOGLE cujo conteúdo se faz necessário às investigações: Conteúdo do Google Drive e Google One, se houver, desde a data de criação da conta; Histórico de localização, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Gmail, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Google Fotos, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Google Play, lista de aplicativos atualmente instalados; Conteúdo do Google Agenda, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Google Keep, desde a data de criação da conta; Lista dos contatos, desde a data de criação da conta; Histórico, Log de IPs de acesso ao Gmail, Google Drive; Dispositivos vinculados ou conectados a conta.
(...).
MICROSOFT BRASIL: Av. das Nações Unidas, 12.901, Torre Norte, 27º andar, Itaim-Bibi – São Paulo/SP
- que no prazo de 05 dias, sob pena de análise de aplicação de multa judicial, promova a criação de conta espelho, com respectivo login e senha,
para acesso histórico
(conteúdo armazenado desde a criação das respectivas contas)
e também em tempo real
(15 dias da data de implementação da medida) da conta abaixo.
(...).
(Processo 50107122120204047208, evento 259, REPRESENTACAO_BUSCA1).
As caixas de mensagens e de dados armazenados na nuvem cujo acesso é deferido são aquelas associadas aos terminais telefônicos especificados nas tabelas seguintes:
GOOGLE
Conta Usuário
Provedor
Pedido
isaias.santiago2020@gmail.com
GOOGLE
Prorrogação
sergio.r.silva.bc@gmail.com
GOOGLE
Prorrogação
pajero0011@gmail.com
GOOGLE
Prorrogação
bmwx10077@gmail.com
GOOGLE
Dados desde a data de criação
izidorio.manoel.1212@gmail.com
GOOGLE
Dados desde a data de criação
ricardojoias10@gmail.com
GOOGLE
Dados desde a data de criação
324561jk@gmail.com
GOOGLE
Dados desde a data de criação
ironnmann888@gmail.com
GOOGLE
Dados desde a data de criação
MICROSOFT
Conta Usuário
Provedor
Pedido
nitrixfc@hotmail.com
MICROSOFT
Prorrogação
bianka_per@hotmail.com
MICROSOFT
Prorrogação
isaias.santiago@hotmail.com
MICROSOFT
Inclusão
[...]
Diferentemente dos requisitos legais estabelecidos pela Lei n. 9.296/1996 para a interceptação de comunicações, que se fundamentam no artigo 5º, XII, da Constituição Federal, o acesso a dados informáticos armazenados exige um rigor jurídico menor. Este é orientado pela tutela da privacidade, conforme disciplinado pelos artigos 7º, III, e 10, §§ 1º e 2º, da Lei n. 12.965/2014 (Marco Civil da Internet).
Por se estruturarem em linguagem mais flexível do que a prevista para a interceptação, essas disposições demandam uma avaliação judicial que não se prende a parâmetros legais específicos para seu deferimento. Em certa medida, o menor potencial invasivo do acesso a dados armazenados na esfera individual justificou a criação de uma norma mais aberta, conferindo ao Poder Judiciário um exercício de ponderação adaptável às circunstâncias de cada caso concreto.
Essa percepção foi considerada na decisão que deferiu o meio de prova. A deliberação sobre o acesso aos dados armazenados ocorreu após a análise da pertinência da prorrogação da interceptação das comunicações. O rigor da fundamentação referente à proporcionalidade dessa primeira medida, de natureza mais drástica, permitiu, em momento subsequente, a reafirmação dos fundamentos jurídicos já empregados, os quais se mostraram igualmente aptos a subsidiar o ônus argumentativo inerente ao acesso aos dados pretéritos.
Quanto aos aspectos fáticos, a decisão impugnada abordou expressamente a conta
ironnmann888@gmail.com
. Relatou as descobertas da equipe de investigação e valorou tais evidências como indicativos objetivos de que a conta era utilizada por possíveis membros da organização criminosa investigada, o que, à época, justificava o deferimento da medida. Ao assim decidir, essa deliberação manteve a coerência com os fundamentos da primeira decisão que deferiu a interceptação das comunicações do terminal, não se afastando do quadro fático investigativo que se mantinha vigente nos autos.
Desde o início da identificação do terminal telefônico, as evidências colhidas sugeriam a possível participação do usuário da linha nos fatos investigados, sendo essa hipótese reforçada no curso da primeira etapa da interceptação das comunicações (conforme abordado no tópico 3).
Esse cenário permaneceu presente até o deferimento do acesso aos dados armazenados, não havendo, à época, qualquer evento que pudesse afastar ou atenuar a suspeita fundada que recaía sobre a participação do alvo nos atos de traficância sob investigação.
Ainda que, ao final, o acusado não tenha sido indiciado e processado por aqueles fatos específicos, no momento em que o acesso aos dados foi deferido, o quadro investigatório existente sugeria consistentemente seu possível envolvimento nos fatos. Havia, portanto, uma hipótese fundada que legitimava a medida probatória, destinando-se à obtenção de evidências capazes de confirmar ou refutar a suspeita existente.
Consequentemente, não há vício na decisão que autorizou o acesso aos dados armazenados em nuvem, indexados à conta ironnmann888@gmail.com.
Em igual medida, o posterior acesso aos dados mantidos junto ao
Icloud
derivou de um quadro fático processual apto ao deferimento judicial da medida.
O acesso aos dados da conta ironnmann888@icloud.com foi autorizado pela decisão do
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 376, DESPADEC1
:
[...]
04.
Dados armazenados junto a aplicativos das empresas Google, Apple e Microsoft
.
Houve requerimento de afastamento do sigilo das caixas de mensagens e dados armazenados na nuvem que estejam vinculados aos terminais telefônicos em relação aos quais deferida a prorrogação ou mesmo o início da interceptação de comunicações telefônicas, bem como acesso a contas de e-mail associadas a pessoas investigadas, vinculadas às empresas Google e Apple.
A necessidade, a adequação e a proporcionalidade em sentido estrito que justificam, nos termos antes explicitados na presente decisão, o acesso a informações contidas em comunicações telefônicas e telemáticas que estejam ainda em desenvolvimento e envolvam os alvos da investigação, justificam, também, o acesso a informações semelhantes que, havendo constado de comunicações anteriores já finalizadas, ou sendo, enfim, úteis ao esclarecimentos do fatos, possam ser acessadas a partir de dispositivos de armazenamento de dados em nuvem ou em caixas de e-mail, nos quais venham a estar armazenadas.
Defiro, portanto, a expedição de ofícios-mandado, direcionados às empresas Google e Apple, nos exatos termos apresentados pela Autoridade Policial:
Nos termos das representações anteriores, e fundamentando o pedido expressamente no comando da Lei 9.296/96 e da Lei 12.965/14, represento pelas seguintes medidas investigativas,
solicitando que sejam expedidos ofícios distintos para cada empresa
:
(...).
Interceptação do fluxo de dados telemáticos em tempo real (Lei 9.296/96) e dados armazenados (Lei 12.965/14):
GOOGLE BRASIL: Google LLC 1600 Amphitheatre Parkway, Mountain View, CA 94043 (Google Brasil Internet Ltda.: Av. Brigadeiro Faria Lima, 3477 – Itaim Bibi – São Paulo/SP
- que no prazo de 05 dias, sob pena de análise de aplicação de multa judicial, promova o afastamento do sigilo das caixas de mensagens e dados armazenados nas contas vinculadas aos terminais da tabela abaixo relacionada, por meio da criação de uma conta espelho para
acesso histórico
(conteúdo armazenado desde a criação das respectivas contas)
e também acesso em tempo real
(15 dias da data de implementação da medida), com relação aos dados de cadastro, endereços físicos registrados pelos usuários e vinculados a suas contas de e-mails, IPs, datas, e horários dos acessos, itens enviados, recebidos, lixo e armazenados nos seus sistemas, além do acesso de arquivos, imagens, notas, contatos, drive (Google Drive, OneDrive), mensagens de aplicativos, serviços e histórico de localização (maps), marcas e modelos dos aparelhos vinculados aos IMEIs, números das linhas telefônicas vinculadas aos IMEIs (essa apenas nos últimos 90 dias), e quaisquer outros dados nos seus sistemas de
cloud computing
, ressaltando tratar-se de crime potencialmente previsto nos art. 33 e 35 da Lei 11.343/06, punido com reclusão, bem como que a medida encontra amparo na Lei 9.296/96 e na Lei 12.965/14.
Não sendo viável a criação de contas-espelho, que a empresa providencie o envio diretamente à Polícia Federal, a cada período de 24 horas, dos pacotes de dados coletados do ambiente de
cloud computing
dos alvos interceptados, com a indicação e fornecimento dos meios técnicos necessários para os respectivos acessos. Para evitar respostas protelatórias da empresa, explicita-se os produtos GOOGLE cujo conteúdo se faz necessário às investigações: Conteúdo do Google Drive e Google One, se houver, desde a data de criação da conta; Histórico de localização, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Gmail, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Google Fotos, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Google Play, lista de aplicativos atualmente instalados; Conteúdo do Google Agenda, desde a data de criação da conta; Conteúdo do Google Keep, desde a data de criação da conta; Lista dos contatos, desde a data de criação da conta; Histórico, Log de IPs de acesso ao Gmail, Google Drive; Dispositivos vinculados ou conectados a conta.
(...).
APPLE: Rua Leopoldo Couto Magalhães Junior, 700, 7º andar – Itaim Bibi – São Paulo/SP
- que no prazo de 05 dias, sob pena de análise de aplicação de multa judicial, promova o afastamento do sigilo das caixas de mensagens e dados armazenados nas contas vinculadas aos terminais da tabela abaixo relacionada, por meio da criação de uma conta espelho
para acesso histórico
(conteúdo armazenado desde a criação das respectivas contas)
e também em tempo real
(15 dias da data de implementação da medida), com relação aos dados de cadastro, endereços físicos registrados pelos usuários e vinculados a suas contas de e-mails, IPs, datas, e horários dos acessos, itens enviados, recebidos, lixo e armazenados nos seus sistemas, além do acesso de arquivos, imagens, notas, contatos, drive (iCloud), mensagens de aplicativos, serviços e histórico de localização (maps), marcas e modelos dos aparelhos vinculados aos IMEIs, números das linhas telefônicas vinculadas aos IMEIs (essa apenas nos últimos 90 dias), e quaisquer outros dados nos seus sistemas de
cloud computing
, ressaltando tratar-se de crime potencialmente previsto nos art. 33 e 35 da Lei 11.343/06), punido com reclusão, tratando-se de medida que encontra amparo na Lei 9.296/96 e na Lei 12.965/14.
Não sendo viável a criação de contas-espelho, que a empresa providencie o envio diretamente à Polícia Federal, a cada período de 24 horas, dos pacotes de dados coletados do ambiente de
cloud computing
dos alvos interceptados, com a indicação e fornecimento dos meios técnicos necessários para os respectivos acessos.
(...).
(Processo 50107122120204047208, evento 371, REPRESENTACAO_BUSCA1).
As caixas de mensagens e de dados armazenados na nuvem cujo acesso é deferido são aquelas associadas aos terminais telefônicos especificados nas tabelas seguintes:
GOOGLE
Conta Usuário
Provedor
Pedido
isaias.santiago2020@gmail.com
GOOGLE
Dados após 05/05/2021
pajero0011@gmail.com
GOOGLE
Dados após 05/05/2021
APPLE
Conta Usuário
Provedor
Pedido
brenda301013@icloud.com
APPLE
Dados após 20/05/2021
ironnmann888@gmail.com
APPLE
Dados desde sua criação
[...]
Conforme detalhado no Tópico 3 desta decisão, a solicitação de acesso aos dados em nuvem da Apple foi embasada em duas descobertas cruciais, oriundas da análise de dados já armazenados no Google (RAPJ 12/2021,
processo 5010712-21.2020.4.04.7208/SC, evento 371, INF2
, pp. 28-30). Primeiro, e-mails na caixa de entrada do usuário indicaram o consumo de serviços de transporte (Uber) e entrega de alimentos em um hotel localizado em Santa Cruz de La Sierra, Bolívia, em janeiro de 2021, sugerindo sua estadia no local. Segundo, foi encontrado um vínculo entre essa conta de e-mail e uma conta iCloud da Apple.
Esse cenário probatório, particularmente a primeira evidência, reforçou a suspeita do possível envolvimento do alvo com o tráfico de cocaína. A Bolívia, conforme reiterado por relatórios do UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime), é um dos principais países produtores de cocaína na América do Sul, ao lado de Colômbia e Peru, e um ponto estratégico nas rotas de tráfico para a internalização em outros países da região e para mercados internacionais. Essa nova evidência somou-se a vestígios anteriores da investigação, como a utilização de terminal telefônico em nome de terceiro, contato com indivíduos ligados a Fábio e deslocamento para a região onde a embarcação GP5 estava atracada. Assim, o quadro de suspeita sobre o envolvimento do usuário da conta nos atos de traficância investigados foi significativamente incrementado.
Diante desse contexto, e como os dados fornecidos pelo Google revelaram a vinculação do e-mail ironnmann888@gmail.com a uma conta mantida junto à Apple, o interesse processual no acesso a essa conta tornou-se evidente. Seu deferimento despontou como um desdobramento lógico dos próprios fundamentos que já haviam autorizado tanto a interceptação das comunicações do terminal telefônico quanto o acesso primário aos dados em nuvem do Google.
A Defesa questionou o vínculo entre o Gmail e a conta Apple. Contudo, as informações contidas no RAPJ 12/2021, no tópico III.12.1 do relatório sobre a análise da nuvem Google de ironnmann888@gmail.com, são pertinentes e confirmam essa vinculação, demonstrando que o elo entre as contas foi constatado a partir da análise preliminar dos dados.
De qualquer forma, mesmo que não houvesse evidência explícita desse vínculo entre as contas, o interesse na pesquisa e acesso existiria ainda assim. Ele se fundava na necessidade, adequação e proporcionalidade de vasculhar os rastros digitais do alvo, usuário do terminal telefônico monitorado. Isso, por si só, legitimaria, para além da interceptação das comunicações, o direcionamento das buscas junto a contas Google, Apple e Microsoft, independentemente de eventual relacionamento informático entre elas.
Sobre este ponto, é importante considerar que o uso de dispositivos e serviços dessas "big techs" é comum, e por vezes preferencial, em diversas esferas, inclusive no âmbito de organizações criminosas, devido aos seus robustos recursos de segurança, criptografia, compartilhamento e gerenciamento de dados à distância. Dessa forma, diante da pertinência investigativa de buscar dados informáticos mantidos em nuvem pelo usuário do terminal monitorado, a pesquisa de informações junto a esses provedores seria legítima independentemente da prévia demonstração de vínculo cruzado entre eles.
Não obstante, conforme pontuado anteriormente, na situação concreta, o direcionamento da busca por dados junto à Apple decorreu da prévia constatação de vínculo entre as contas. Isso evidencia, pelo histórico investigativo e processual, a sequência de eventos que culminou na identificação dos dados utilizados nesta persecução.
Em resumo, a decisão que acolheu a representação de acesso aos dados mantidos junto à Apple (tal como ocorreu anteriormente em relação à conta Google) partiu de um lastro indiciário robusto, constituído pelo acúmulo de evidências que relacionava o usuário da linha n. (13) 99664-9101 à conta iCloud cujo acesso foi deferido. Adicionalmente, os fundamentos de ponderação expostos na decisão impugnada mostraram-se pertinentes e proporcionais à realidade ontológica investigada, justificando legitimamente o deferimento da medida probatória. Dessa forma, não há vício (nulidade, ilegalidade ou ilicitude) que macule a validade do acesso à prova digital impugnada.
III – Deliberações processuais
1.
Não acolho
a arguição incidental suscitada pela Defesa de ilicitude e inadmissibilidade da prova digital
emprestada que embasou o oferecimento da denúncia (
216.1
)
.
Intimem-se.
2.
Considerando a disponibilização à Defesa do acesso à fonte da prova emprestada que desejava conhecer, a inexistência de requerimento de complementação de acesso àqueles dados e a extinção do HC 5008473612025404000/TRF4, por perda do objeto,
levanto a suspensão processual anteriormente determinada
,
a fim de que a ação penal retome a tramitação.
3.
Desde logo, como as decisões dos eventos
162.1
,
174.1
e
185.1
foram tornadas sem efeito pela decisão do evento
194.1
e a questão inerente ao conhecimento sobre as fontes da prova emprestada foi solucionada,
retome-se o cumprimento da decisão do evento
110.1
, a partir do tópico 5:
[...]
5.
Defiro, noutro norte, a reabertura de prazo para defesa prévia dos Denunciados, considerando a manifestação favorável do MPF juntada do
evento 108, PET1
e os documentos juntados nos eventos 80 e 81.
5.1.
Apresentadas novas defesas prévias, ou complementadas aquelas já juntadas, voltem os autos conclusos.
6.
Não aproveitado o prazo deferido no item anterior,
determino o prosseguimento do feito
na forma determinada na decisão constante do
evento 32, RECDEN1
.
6.1.
Cumpram-se então as determinações dos itens 4 e 5 da decisão constante do
evento 32, RECDEN1
, observada a celeridade necessária por se tratar de feito com réu preso.
7.
Intimem-se.
[...]
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