Processo nº 5001882-84.2020.4.04.7008
ID: 294597071
Tribunal: TRF4
Órgão: Gabinete de Admissibilidade do Paraná
Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL
Nº Processo: 5001882-84.2020.4.04.7008
Data de Disponibilização:
10/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GENI KOSKUR
OAB/PR XXXXXX
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RECURSO CÍVEL Nº 5001882-84.2020.4.04.7008/PR
RECORRENTE
: ELCIO JOSE DE FARIAS (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: GENI KOSKUR (OAB PR015589)
DESPACHO/DECISÃO
Pedido de Uniformização Nacional - parte autora
Trat…
RECURSO CÍVEL Nº 5001882-84.2020.4.04.7008/PR
RECORRENTE
: ELCIO JOSE DE FARIAS (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: GENI KOSKUR (OAB PR015589)
DESPACHO/DECISÃO
Pedido de Uniformização Nacional - parte autora
Trata-se de pedido de uniformização nacional interposto pela parte autora contra acórdão prolatado por Turma Recursal desta Seção Judiciária, no qual requer:
(i)
o reconhecimento da especialidade das atividades desempenhadas nos períodos de 16/09/2004 a 21/09/2004 e 17/05/2019 a 29/10/2019, sob exposição ao agente nocivo fósforo;
(ii)
o sobrestamento do feito (Tema 1.090/STJ);
(iii)
o reconhecimento da especialidade da atividade por exposição ao ruído (Tema 1.083/STJ).
O recorrente suscitou como precedentes paradigmas julgados da Turma Recursal dos Juizados Especiais de Pernambuco e da TNU, e os Temas 170 da TNU e 1.083 e 1.090 do STJ.
O voto/ acórdão recorrido encontra-se assim fundamentado (
evento 120, VOTO1
):
"O INSS requer a reforma da sentença quanto ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de
29/04/1995 a 31/12/1999, de 01/03/2000 a 12/11/2002 e de 13/11/2002 a 15/09/2004 . Alega que não foi comprovada a exposição habitual e permanente a ruído em nível superior ao limite de tolerância.
O autor pede o reconhecimento do exercício de atividade especial de 16/09/2004 a 21/09/2004 e de 17/05/2019 a 29/10/2019, como estivador, em face da exposição a agentes químicos.
Mantenho a sentença por seus próprios fundamentos, nos termos em que autoriza o art. 46 da Lei 9.099/1995, aplicável subsidiariamente aos Juizados Especiais Federais, conforme o art. 1º da Lei 10.259/2001:
O PPP emitido pelo Sindicato dos Estivadores de Paranaguá e Pontal do Paraná, referente à atividade desenvolvida
até 31/12/2003
, aponta exposição ao risco de queda de nível ou de materiais (
evento 1, PPP7
).
Já o laudo técnico produzido em 1996 para o mesmo sindicato aponta ruído
entre 86 e 96 decibéis
, o que foi verificado em quatro diferentes navios (frigorífico, de carga geral, de contêineres e roll-on roll-off) aportados em Paranaguá (
evento 1, LAUDO16
). Na parte conclusiva desse documento consta que as atividades desempenhadas pelos estivadores são insalubres devido a ruído, poeira, gases e vapores.
De outro lado, o formulário DSS-8030 emitido pelo OGMO, referente à atividade de estivador desenvolvida de
01/04/1996 a 31/12/2003
, aponta exposição aos seguintes agentes:
poeiras vegetais e minerais (não especificadas), umidade em casos de chuvas, frio de -10º C e ruído variando de 77 a 101 dB(A)
, de forma contínua e permanente nas fainas correlatas aos agentes nocivos (
evento 26, PPP2
).
Os dados constantes nesse formulário são corroborados pelo
laudo técnico produzido em 2001 de acordo com a NR-15
, por engenheiro do trabalho, a pedido do OGMO-PR (
evento 1, LAUDO17
). O estudo faz referência às intensidades de ruído aferidas em cada um dos navios que costumeiramente aportam em Paranaguá, concluindo que estão compreendidas entre
77 e 101 decibéis
, bem como que essa exposição se dá de
forma habitual e permanente
. Note-se que a divergência na intensidade de ruído se deve ao tipo de navio e ao local da embarcação em que se realiza o trabalho (entrada, porão, guindaste, rechego, vigia). Além disso, esse laudo aponta a sujeição do trabalhador portuário a
poeiras vegetais e minerais (não especificadas), umidade em caso de chuvas e frio de 10ºC negativos
. Veja-se a parte conclusiva desse capítulo relativo aos estivadores (fl. 16 do laudo):
Embora o trabalho dos portuários avulsos já estivesse sob a gestão do OGMO, em 2003 foi produzido laudo técnico por iniciativa do Sindicato dos Estivadores dos Portos do Paraná, o qual conclui que a atividade é insalubre, nos termos da NR-15, em razão do
ruído superior a 85 decibéis, com exposição habitual e permanente
, além de poeiras minerais e vegetais, e frio
(
evento 1, LAUDO18
).
Isso posto,
analisando esses documentos contemporâneos ao período de 29/04/1995 a 18/11/2003
, têm-se que o laudo de 1996 aponta ruído entre
86 e 96 decibéis
, o formulário e o laudo do OGMO (2001) indicam exposição entre
77 e 101 decibéis
e o laudo de 2003, do sindicato, afirma
intensidade superior a 85 decibéis
. Assim, de forma muito clara,
o intervalo de 29/04/1995 a 05/03/1997, em que o limite de tolerância para ruído era de 80 decibéis, deve ser averbado como de atividade ensejadora de aposentadoria especial
.
No que tange ao período de
06/03/1997 a 18/11/2003
, em que o limite era de 90 decibéis, fosse adotada a média aritmética simples das intensidades indicadas no laudo do OGMO (77 e 101 decibéis), chegar-se-ia ao
nível de 89 decibéis, valor muito próximo ao aludido limite de tolerância
.
Na hipótese de opção pelo maior nível de ruído aferido, por alguns chamados de "critério de pico", ocorreria o enquadramento
, tendo em conta a intensidade de 101 decibéis indicada no formulário emitido pelo OGMO com base no laudo técnico de 2001. De qualquer forma,
é certo que
o
segurado não pode ser prejudicado pela falta de média ponderada
. Registre-se que os laudos técnicos mais recentes certamente não demonstrariam a realidade do ambiente de trabalho vivenciado pelos trabalhadores portuários de Paranaguá naquela época, até porque se presume que a concentração de ruído proveniente dos equipamentos utilizados nos portos e nas embarcações era superior àquela existente atualmente. Ademais, destaca-se que no período inexistia previsão legal ou entendimento jurisprudencial sedimentado a albergar tal situação, de alternância entre níveis de ruído inferiores e superiores ao limite, sendo certo que
o entendimento firmado pelo STJ ao julgar o tema 1.083
, acerca da necessidade de verificação da intensidade de ruído na forma de NEN (nível de exposição normalizado, NHO-01 da Fundacentro) em situações como a existente no caso em exame,
incide apenas
a partir de 18/11/2003
.
Por tais razões, entendo que
os períodos compreendidos no intervalo de 06/03/1997 a 18/11/2003 também devem ser averbados como ensejadores de aposentadoria especial em razão da exposição ao agente ruído
.
Além do agente ruído, os documentos técnicos apresentados indicam exposição do estivador a poeiras vegetais e minerais, umidade em caso de chuvas e frio de 10ºC negativos. As poeiras, não especificadas, não ensejam enquadramento. A umidade se fazia presente apenas em caso de chuva, e os laudos do OGMO apontam a utilização de EPI (
evento 1, LAUDO17
, p. 14). Quanto ao frio, a exposição ocorria de modo eventual, apenas na hipótese de trabalho com carga frigorificada, e mediante uso de EPI (p. 14):
Registre-se que as decisões recentes do TRF4 acerca dos trabalhadores portuários avulsos estivador e arrumador, no porto de Paranaguá, são no sentido de enquadrar o período de atividade até 31/12/2003. A exemplo:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. ESTIVADOR. RUÍDO. FRIO. RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE DE TEMPO DE AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO: POSSIBILIDADE. TEMA 998/STJ. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. TUTELA ESPECÍFICA.
[...] 3. Constatada a exposição do estivador a outros agentes nocivos, como poeiras minerais e vegetais, umidade, especialmente frio, por conta do trabalho em navios frigoríficos, ficando sujeito o trabalhador a temperaturas negativas, sendo cabível o reconhecimento da especialidade do período, mesmo que o agente nocivo frio não esteja mais previsto nos Decretos nºs 2.172/1997 e 3.048/1999, posto que identificado o prejuízo para a saúde do trabalhador, incidindo a Súmula nº 198 do extinto TFR. Precedentes. 4. Limitado o reconhecimento do labor dos Estivadores do Porto de Paranaguá e Antonina até 31/12/2003. Precedentes. [...]
(TRF4, AC 5001453-54.2019.4.04.7008, DÉCIMA TURMA, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 20/05/2022)
Na sequência,
sobre os intervalos de atividade a partir de
19/11/2003
, inicialmente destaca-se que o STJ, ao julgar o
tema 1.083
, decidiu da seguinte forma (sem grifo no original):
O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN)
. Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço.
Quanto à prova documental, há nos autos os PPP relativos aos períodos de 03/03/2005 a 30/09/2018 (
evento 1, PPP8
), 22/09/2004 a 30/04/2006 (
evento 1, PPP8
), 01/05/2006 a 31/10/2007 (
evento 1, PPP9
) e 22/09/2004 a 28/02/2021 (
evento 34, PPP2
), nos quais constam as intensidades de ruído a que o autor esteve exposto em cada jornada, compreendidas entre
82 e 87 decibéis
,
a depender do navio e do respectivo posto de trabalho dentro da embarcação
. Nesse documento não há medição na forma de NEN.
Os laudos do OGMO emitidos entre 2004 e 2011 apontam intensidades de ruído de
77 a 101 decibéis
, embora repliquem os dados coletados para elaboração do estudo de 2001. Também não houve indicação do nível de exposição normalizado.
Da mesma forma quanto ao laudo elaborado para o Sindicato dos Estivadores de Paranaguá entre 2013/2014, porque
desde 01/04/1996 a alocação da mão de obra dos trabalhadores portuários avulsos é intermediada pelo Órgão Gestor de Mão de Obra
(OGMO), tanto que a partir dessa data os formulários DSS-8030 e PPP são emitidos por esse órgão, que possui os laudos técnicos acima mencionados, a partir de 2001. Ademais, no laudo do sindicato, embora tenham sido apontados 14 locais diferentes de amostragem (
evento 21, LAUDO5
, p. 2), quanto ao ruído há resultados de apenas 7 deles, não especificados (p. 5-6), o que retira a credibilidade de suas conclusões.
De outro lado,
há a prova pericial produzida nos autos nº 5001506-79.2012.4.04.7008, por determinação do e. TRF da 4ª Região
, cujo laudo esclarece que as atividades do estivador são realizadas
nos conveses e porões dos navios ancorados no cais Porto de Paranaguá (Porto Público, nos berços 201 ao 214), no cais do TCP Terminal de Contêineres de Paranaguá (berços 215 ao 217), e no cais do Terminal da Fospar
(
evento 49, LAUDO1
, p. 5 do laudo, item 6). Assim sendo, foram analisadas as condições do trabalho exercido a bordo dos
navios cargueiros Dianthus
(fertilizantes - p. 7)
e Shail Al Khor
(grãos - p. 2), ambos ancorados em berços públicos do porto de Paranaguá, do
navio MSC Alghero
, destinado ao transporte de contêineres, nas instalações do Terminal de Contêineres de Paranaguá e do
navio cargueiro Ocean Opal
, que transporta fertilizantes, ancorado nas instalações da Fospar S/A. Quanto ao agente ruído,
constatou-se exposição com intensidade LEQ entre 81 e 87,8 decibéis
e, a partir desses dados, obteve-se
NEN de 79,8 a 83,6 decibéis
,
de acordo com a metodologia da NHO-01 da Fundacentro
(
evento 79, DOC2
):
Quanto ao navio MSC Alghero (
evento 49, LAUDO2
), que não consta na tabela acima, verificou-se nível equivalente (Leq) de 84,4 decibéis (estivador, jornada de 6 horas diárias).
Logo, tal como ocorreu com a análise relativa aos demais navios (tabela acima), o NEN, que transforma aquele valor para jornada de 8 horas, seria ainda inferior
.
A partir dessas aferições, o engenheiro Mozart Azevedo da Silveira, perito nomeado pelo juízo, apresentou a seguinte conclusão (
evento 49, LAUDO1
, p. 15), mantida mesmo após a verificação do NEN de ruído (
evento 79, DOC2
, parte final - sem grifo no original):
b) Considerando o tempo de exposição ao agente físico ruído, os níveis equivalentes e as doses obtidas,
as atividades do Autor causavam exposição que excediam os Limites de Tolerância definidos pela NR 15 Atividades e Operações Insalubres Anexo 1 Ruído, e estavam enquadradas como insalubres, no período 01/06/1991 até 05/03/1997
.
Em resposta à crítica quanto à utilização de decibelímetro na perícia judicial realizada, o
expert
afirmou (
evento 79, DOC1
, p. 3-4 - sem grifo no original):
A avaliação pericial referente à exposição ao agente físico ruído pode ser realizada com o instrumento decibelímetro, não havendo impedimento ou obrigatoriedade do uso deste ou outro aparelho. Dado que na jornada do Autor ocorria uma variedade de locais e tempos diversos em cada atividade (porão de navios, convés de navios, operador de equipamentos, p.ex.), o uso do instrumento decibelímetro é adequado,
registrando uma
amostra
da exposição ao agente físico ruído em cada um destes pontos de trabalho
.
[...]
Nos Laudos de Insalubridade, podemos utilizar o decibelímetro e mensurar o ruído para a avaliação deste Laudo. A NR 15 permite a possibilidade de fazer avaliações pontuais e utilizar fórmula no anexo 1 da NR 15 para determinar uma média de exposição do trabalhador em análise.
[...]
A avaliação realizada com o instrumento decibelímetro verifica a exposição em cada situação laboral, por um tempo representativo (5-7 minutos, p.ex), e segue para outra situação laboral e repete o procedimento, por tempo igualmente representativo. Realizada com o instrumento dosímetro, o qual fica fixado ao corpo do Autor, a avaliação ocorre de modo contínuo. A utilização do instrumento dosímetro tem mais sentido e adequação quando se quer avaliar uma jornada completa (8 horas, p.ex), para efeito de análise laboral para documentos como LTCAT Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho e o PPRA Programa de Prevenção de Riscos Ambientais.
De fato, tal como assentou o perito,
a NHO-01 da Fundacentro não prevê obrigatoriedade de utilização do dosímetro, mencionando expressamente a possibilidade de aferição por decibelímetro
.
Assim,
como a prova pericial judicial indica que o nível de exposição normalizado (NEN) de ruído a que o estivador é exposto não ultrapassa o limite de 85 decibéis nos três diferentes locais de atividade desse trabalhador
(berços públicos, TCP e Fospar),
não há como averbar como especiais, em razão da exposição ao agente físico ruído, os períodos posteriores a 18/11/2003
.
Analisando-se a jurisprudência do e. TRF da 4ª Região posterior ao trânsito em julgado da decisão do STJ quanto ao tema 1.083, tem-se que a 10ª Turma do TRF4
não reconhece a atividade especial do estivador de Paranaguá a partir de 01/01/2004
, tendo em conta que
a exposição não ocorre de modo habitual e permanente acima do limite de tolerância
, tal como evidenciado no PPP emitido pelo OGMO (sem grifos nos originais):
Portanto,
a partir da avaliação produzida no citado PPP, iniciada em 03/01/2004, não é mais cabível o reconhecimento da especialidade da atividade de estivador, bem como das funções decorrentes na área portuária, como portoló, contra-mestre de porão, estivador em equipe, operador de ponte, operador de guincho, contra-mestre geral e todas as demais atividades ligadas aos serviços de estiva
.
(TRF4, AC 5003440-33.2016.4.04.7008, DÉCIMA TURMA, Relatora para Acórdão MÁRCIA VOGEL VIDAL DE OLIVEIRA, juntado aos autos em
18/05/2023
- trecho do inteiro teor)
Para apuração das condições de trabalho a partir de 01/01/2004, utilizo-me do Perfil Profissiográfico Previdenciário elaborado pelo Órgão de Gestão de Mão-de-Obra do Trabalhador Portuário e Avulso do Porto Organizado de Paranaguá - OGMO/PR constante dos autos 50002580520174047008 (ev. 7, doc. 1/6). Referido trabalho pericial compôs o acervo probatório de diversos processos previdenciários com trâmite na Circunscrição Judiciária de Paranaguá debatendo idêntico tema, reconhecimento da especialidade do labor de estivadores e afins no Porto de Paranaguá (
5000040-74.2017.4.04.7008;
5002717-14.2016.4.04.7008;
5000470-60.2016.4.04.7008;
5000394-36.2016.4.04.7008;
5003813-64.2016.4.04.7008
; 5000090-03.2017.4.04.7008
; 5002788-16.2016.4.04.7008, entre outros).
Registre-se que o PPP em questão foi baseado em inspeções no Porto de Paranaguá no período de 01/01/2004 até 31/03/2011.
Foram mais de 07 anos ininterruptos de avaliações quase que diárias de dezenas de centenas de navios atracados no Porto, averiguando as condições de trabalho das funções de Portoló, Contra-mestre de porão, estivador em equipe, operador de ponte, operador de guincho e contra-mestre geral, todas ligadas aos serviços de estiva
.
Embora o requerente tenha exercido as funções de arrumador, a similitude de atividades desenvolvidas pelo estivador possibilitam a utilização da referida prova. Ademais, os PPPs anexados no evento 7 - PROCADM1/6 registram os fatores de risco a que submetidos o autor na função de arrumador e são coincidentes com os fatores de risco do PPP paradigma, quais sejam: ruídos, queda de material, queda de nível, prensagem, poeiras incomodas e postura inadequada.
Trata-se de exame aprofundado e estatisticamente inconteste, pois não se resumiu a avaliar as condições de trabalho de pequeno número de embarcações, ao contrário. O Exame de mais de sete anos, nos quais diariamente se procedeu à apuração da pressão sonora sofrida em cada tipo de navio, nas mais diversas atividades desenvolvidas pelos serviços de estiva, resulta em apuração fidedigna das reais condições de trabalho tão sujeito a variações, a depender da natureza da embarcação, da mercadoria transportada e, ainda e mais importante, da atividade desenvolvida pelo estivador.
Além da constatação dos ruídos suportados pelos trabalhadores, o PPP trouxe o exame da exposição às poeiras incomodas, queda de nível e postura inadequada
.
(TRF4, AC 5000006-02.2017.4.04.7008, DÉCIMA TURMA, Relatora FLÁVIA DA SILVA XAVIER, juntado aos autos em 08/11/2022 - trecho do inteiro teor)
Veja-se ainda o seguinte trecho do inteiro teor de decisão que rejeita embargos de declaração opostos pela parte autora, em caso semelhante a este:
Na hipótese dos autos
, a publicação do Tema 1083 não altera o entendimento da Turma em casos símeis, pois o período em que há reconhecimento de diferentes níveis sonoros, com medição de 77 a 101 decibéis, refere-se ao período até 31/12/2003, cuja especialidade está sendo reconhecida por vários fundamentos, inclusive ruído, com base no formulário DSS8030.
A partir de 01/01/2004, há formulário PPP detalhado que informa exposição
eventual
a ruído.
Nesse contexto,
a publicação do Tema 1083/STJ confirma a compreensão já manifestada pela Turma no julgamento de casos similares, pois os documentos técnicos juntados aos autos comprovam exposição eventual ao ruído, enquanto a Tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 1083 exige a comprovação da
"habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo
"
.
No mesmo sentido, menciono os seguintes precedentes: 5003860-04.2017.4.04.7008/PR, 5000187-66.2018.4.04.7008/PR, e 5000985-61.2017.4.04.7008/PR, julgados à unanimidade pela Turma Regional Suplementar do Paraná, sob a relatoria do Exmo. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, na sessão de 15/03/2022.
(TRF4, AC 5003726-74.2017.4.04.7008, DÉCIMA TURMA, Relator OSCAR VALENTE CARDOSO, juntado aos autos em 07/02/2023)
Registra-se que no PPP encaminhado pelo OGMO, relativo ao trabalho do autor a partir de janeiro/2004, há ocorrência de exposição a ruído nas intensidades de
82 a 87 decibéis, porém, as
intensidades que superam o limite de tolerância, quais sejam, 86 e 87 decibéis, ocorrem de forma minoritária
.
Não se desconhece a existência de acórdãos recentes da 11ª Turma do TRF4 que determinam o enquadramento da atividade de estivador exercida após 18/11/2003,
entretanto aparentemente a prova constante nas ações julgadas não incluía o laudo técnico da perícia produzida nestes autos,
no qual a intensidade do agente físico ruído foi aferida na forma de NEN, tal qual previsto na tese firmada pelo STJ quanto ao tema 1.083, e não houve constatação da presença de outros agentes acima do respectivo limite de tolerância, tampouco de agentes químicos cancerígenos. A exemplo (sem grifo no original):
Quanto ao método de aferição do agente nocivo ruído, esta Corte Regional tem posicionamento segundo o qual
a utilização de metodologia diversa da prevista na NHO-01 da FUNDACENTRO não inviabiliza o reconhecimento da especialidade, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto
(AC 5015224-47.2015.4.04.7200, Turma Regional Suplementar de SC, Relator Paulo Afonso Brum Vaz,
em 19/09/2019
; AC 5001695-25.2019.4.04.7101, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira,
em 06/08/2020
; AC 5003527-77.2017.4.04.7129, Quinta Turma, Relatora Gisele Lemke,
em 08/07/2020
).
[...]
3.
A exposição a múltiplos fatores de risco como ruído, poeiras e frio enseja o reconhecimento da atividade de estivador como tempo especial
, mesmo após 29/04/1995.
(TRF4, AC 5004171-92.2017.4.04.7008, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora ELIANA PAGGIARIN MARINHO, juntado aos autos em 19/04/2023 - trechos do interior e da ementa)
Quanto aos demais agentes mencionados pela parte autora, o perito judicial afirmou que a exposição a frio, poeiras, calor, radiações ionizantes e não-ionizantes, pressões anormais, umidade, agentes químicos, agentes biológicos e vibrações
não excedia os limites de tolerância estabelecidos pela NR-15 (
evento 49, LAUDO1
).
No que tange ao frio, acrescenta-se que no LTCAT produzido para o OGMO
em 2001
(
evento 1, LAUDO17
), e aqueles emitidos nos anos de
2004 a 2011
, apontam que os trabalhadores
somente
ficam expostos a esse agente físico quando trabalham em cargas frigorificadas, transportadas em navios com temperatura de -10ºC,
mediante utilização de EPI
. Entretanto,
há algum tempo o porto de Paranaguá não recebe navios frigorificados
, ou seja, desde então deixou de existir a exposição a frio. Nesse ponto, note-se que
os PPP emitidos pelo OGMO para a atividade desenvolvida
a partir de janeiro/2004
, acima mencionados, nos quais foram relacionados os agentes presentes em cada dia de trabalho,
não há menção ao frio
.
Sobre a umidade, nos laudos do OGMO de 2001 a 2011 mencionou-se o contato direto com locais alagados ou encharcados
nos dias de chuva
, porém, mediante utilização de EPI adequado.
O fornecimento de EPI foi afirmado no laudo pericial produzido nos autos nº 5001506-79.2012.4.04.7008 (
evento 49, LAUDO1
, p. 5, itens "a" e "b"):
a) A empresa OGMO apresentou Comprovantes de Fornecimento ao Autor dos EPI Equipamentos de Proteção Individual: Capacete, calça, camiseta, capa de chuva, sapato de segurança, botas de borracha, óculos, protetor auricular, luvas (malha, sinaleira, vaqueta, nitrílica e raspa), meias térmicas, jaqueta para frigorífico, blusa e protetor solar. Itens fornecidos com os respectivos CA Certificados de Aprovação. Estes fornecimentos estão datados de 22/07/1997 a 17/05/2011.
b)
O Autor declarou ter recebido os EPI Equipamentos de Proteção Individual de modo habitual, no período a serviço da OGMO
(junho/1996 até 17/05/2011).
Os agentes poeiras, gases e vapores (não especificados e quantificados) também não estão previstos como ensejadores de aposentadoria especial. Note-se que no aludido laudo de 2021 há referência à exposição a "particulado respirável", com concentração inferior ao limite de tolerância, sendo a conclusão de que inexiste insalubridade nesse ponto.
A esse respeito, deixo consignado que o estudo anexado com a inicial (
evento 1, OUT24
), relativo a doenças respiratórias causadas pela poeira na armazenagem de grãos vegetais, a partir da análise de silos e moegas situados no Rio Grande do Sul, apontou que
a avaliação quantitativa nas moegas utilizando-se a coleta gravimétrica revelou valores relativamente baixos de concentrações de poeira inalável, provavelmente devido a ventilação natural existente nessas áreas
. Ainda que assim não fosse, o parecer técnico não mudaria o fato de que não há previsão desse agente como ensejador de aposentadoria especial.
Além disso, ressalto, com base nos laudos técnicos analisados nesta sentença, que também não se pode dizer que eventual exposição dos estivadores no porto de Paranaguá a esses agentes ocorra de forma habitual e permanente.
Relevante consignar que nenhum dos laudos técnicos apresentados aponta exposição a sílica livre cristalina, cristalizada ou em quartzo. No laudo pericial judicial constou que
as mercadorias movimentadas pelo Autor, como fertilizantes e grãos alimentares, não geram nuvens de poeiras minerais ou sílica livre
(
evento 49, LAUDO1
, p. 18, item "18.14", "b").
Especificamente quanto ao
fósforo
, mencionado pelo autor, deve-se esclarecer inicialmente que constou apenas em "relatório de inspeção" feito em 2005 por encomenda do sindicato, e não pelo OGMO (
evento 1, LAUDO19
). De qualquer forma, o próprio documento, emitido há cerca de 18 anos, indica que
esse produto químico compõe apenas determinado tipo de fertilizante utilizado na agricultura
(p. 14 do documento)
,
todavia a atividade de estivador é exercida no embarque e desembarque de inúmeras cargas diversas, sendo que o contanto com esse fertilizante específico, se existente, certamente ocorre de forma eventual. Some-se a isso o fato de que esse agente somente enseja aposentadoria especial quando a exposição ocorre de modo habitual e permanente, não ocasional nem intermitente,
no exercício das seguintes atividades previstas pelo item 1.0.12 do Decreto 3.048/1999
(item 1.0.12):
a) extração e preparação de fósforo branco e seus compostos; b) fabricação e aplicação de produtos fosforados e organofosforados (sínteses orgânicas, fertilizantes e praguicidas); c) fabricação de munições e armamentos explosivos.
Sobre o calor, o perito judicial afirmou que não há fonte artificial de calor no ambiente de trabalho do autor, como fornos e estufas, logo a exposição não é habitual. Acrescentou que
a fonte natural solar não tem presença permanente
, altera-se a cada época do ano (
evento 79, DOC1
, p. 7-8). Outrossim, note-se que em regra
o estivador portuário tem jornada de seis horas diárias, sendo que dois dos quatro turnos de trabalho possíveis ocorrem no
período noturno
. Ainda quanto a esse agente físico, frisa-se que não foi mencionado no PPP relativo à atividade de estivador a partir de 01/01/2004.
Relativamente à vibração, também não se pode afirmar a habitualidade, pois essas atividades constituem pequena parte das diversas funções exercidas pelo estivador.
No LTCAT do OGMO do ano de 2021 há informação da ocorrência de vibração de corpo inteiro apenas na função de operador de equipamentos específicos, quais sejam, pá-carregadeira (p. 59 e 63) e guincho (p. 50), o que não é habitual.
Ainda de acordo com o laudo pericial judicial, o estivador não é exposto à periculosidade decorrente do abastecimento do navio pois, ainda que isso ocorra durante seu turno de trabalho, haja vista a distância entre a entrada do tanque do navio e os possíveis postos de trabalho (
evento 49, LAUDO1
, p. 19). Também não se afirmou a existência de risco no que tange à movimentação de contêineres com cargas inflamáveis (p. 20-21).
O autor apresentou outros artigos, pareceres, laudos e estudos, que não afastam as conclusões dos laudos e fomulários já apontados nesta decisão, notadamente o laudo pericial judicial produzido nos autos nº 5001506-79.2012.4.04.7008, conforme analisa-se a seguir:
laudo particular elaborado, em setembro de 2015, por engenheiro de segurança do trabalho.
Apesar de conter informação de nível de exposição normalizado (NEN), utilizou fórmula cuja origem não corresponde a média ponderada e ainda considerou uma jornada de trabalho dupla, de 12 horas, fato que não é comum a todos os estivadores e, ao que se sabe, não ocorre no Porto de Paranaguá há bastante tempo (
evento 1, LAUDO21
);
artigo intitulado "Análise de Condições de Saúde e Segurança do Trabalhador Portuário no Porto de Paranaguá", apresentado no IV Congresso Internacional de Desempenho Portuário
(
evento 15, OUT2
).
Esse estudo não apresenta dados específicos, como se eventual exposição dos estivadores no porto de Paranaguá aos agentes identificados se dava de modo habitual e permanente, ou mesmo a concentração de agentes químicos mencionados. Concluiu-se, ainda, que
para que um estudo mais aprofundado seja factível, seria necessário o levantamento de dados relativos aos portuários e o meio laboral em que estão inseridos, contando-se, inclusive com a participação direta dos mesmos na pesquisa
(p.19);
estudos elaborados pela OMS e pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo
(
evento 15, OUT3
e
evento 15, OUT4
).
Nada há nos autos a confirmar que o autor tenha sido exposto aos agentes químicos relacionados em concentração acima do limite de tolerância e de modo habitual e permanente;
parecer técnico particular sobre as condições ambientais de trabalho na função de Estivador do Porto de Paranaguá elaborado, em março de 2021, a pedido de escritório de advocacia
(
evento 33, PARECER2
).
Esse parecer não é capaz de infirmar os dados técnicos apontados no laudo pericial judicial produzido
nos autos nº 5001506-79.2012.4.04.7008, já referido nesta decisão.
O parecer particular, aliás, embora tenha avaliado alguns laudos, formulário e decisões, nada disse a respeito do laudo pericial dos autos nº 5001506-79.2012.4.04.7008. Veja-se:
Também serão avaliados neste trabalho os documentos fornecidos pela contratante: Laudo Técnico Pericial, realizado em 2001 pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra Portuário e Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR;Laudo Técnico Pericial, realizado em 2008 pelo Órgão de Gestão de Mão de Obra Portuário e Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR; Sentença proferida nos autos n° 5003725-89.2017.4.04.7008 e respectivo Acórdão; Perfil Profissiográfico Previdenciário de trabalhadores que exercem a função de Estivador no Porto de Paranaguá.
Veja-se que, ao avaliar o agente ruído, o parecer particular não afirma que a exposição é acima do limite de tolerância previsto na legislação, limitando-se a dizer que (p. 17 do documento):
(...) a exposição não se restringe apenas ao ruído de uma máquina ou de um equipamento e sim de várias máquinas e equipamentos atuando na embarcação, da circulação de caminhões, além do ruído gerado pela casa de máquinas da embarcação que está sendo carregada ou descarregada. Portanto, a exposição ao ruído ocorre de forma permanente, ou seja, frequente, comum, usual, todos os dias, ininterrupta, contínua.
No mesmo sentido, ao fazer referência a agentes de risco, como calor, radiações não ionizantes o parecer apenas menciona que são realizadas atividades que "podem expor o trabalhador" aos agentes de risco. Menciona exposição a agentes químicos e biológicos sem comprovar essa situação e nada menciona a respeito do uso de EPIs pelos estivadores.
detalhes fornecidos por um estivador sobre sua atividade, durante a audiência realizada nos autos nº
5000980-39.2017.4.04.7008
.
Como se sabe, a comprovação da atividade ensejadora de aposentadoria especial demanda prova técnica. Assim, é certo que os detalhes fornecidos por um estivador sobre sua atividade, durante a audiência realizada nos autos nº 5000980-39.2017.4.04.7008 (evento 60), não afastam as conclusões contidas nos PPP e laudos que instruem estes autos.
fotografias do auto de constatação do Ibama produzido na
ação
civil
pública
nº 5000412-67.2010.4.04.7008
(evento 45).
Como se sabe, a comprovação da atividade ensejadora de aposentadoria especial demanda prova técnica, embora as fotos possam demonstrara existência de poeiras decorrentes das operações de carga e descarga de produtos nos navios atracados nos portos de Paranaguá e Antonina, não permitem aferir sua composição. Os agentes "poeiras", "gases" e "vapores", mencionados de forma genérica, sem especificação e quantificação, bem como o "farelo de soja" referido no aludido auto de constatação, não estão previstos como ensejadores de aposentadoria especial.
Os laudos apresentados pelo INSS no evento 85, dos portos de Itajaí e Rio Grande,
referem-se a atividades desenvolvidas em portos distintos daquele em que o autor trabalhou como estivador, portanto não afastam as conclusões dos laudos específicos já analisados nesta sentença.
Em resumo,
não há qualquer prova de que esse trabalhador tenha sido exposto aos agentes ensejadores de aposentadoria especial de modo habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, com intensidade superior àquela prevista na legislação já acima indicada,
nos períodos de atividade posteriores a 18/11/2003
.
Os períodos intercalados em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade podem ser computados como ensejadores de aposentadoria especial, nos termos da tese firmada pelo STJ ao julgar o Tema 998. Confira-se (grifei):
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL ADMITIDO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 1.036 DO CÓDIGO FUX. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, PARA FINS DE APOSENTADORIA, PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE NATUREZA NÃO ACIDENTÁRIA. PARECER MINISTERIAL PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Até a edição do Decreto 3.048/1999 inexistia na legislação qualquer restrição ao cômputo do tempo de benefício por incapacidade não acidentário para fins de conversão de tempo especial. Assim, comprovada a exposição do Segurado a condições especiais que prejudicassem a sua saúde e a integridade física, na forma exigida pela legislação, reconhecer-se-ia a especialidade pelo período de afastamento em que o Segurado permanecesse em gozo de auxílio-doença, seja este acidentário ou previdenciário.
2. A partir da alteração então promovida pelo Decreto 4.882/2003, nas hipóteses em que o Segurado fosse afastado de suas atividades habituais especiais por motivos de auxílio-doença não acidentário, o período de afastamento seria computado como tempo de atividade comum.
3. A justificativa para tal distinção era o fato de que, nos períodos de afastamento em razão de benefício não acidentário, não estaria o Segurado exposto a qualquer agente nocivo, o que impossibilitaria a contagem de tal período como tempo de serviço especial.
4. Contudo, a legislação continuou a permitir o cômputo, como atividade especial, de períodos em que o Segurado estivesse em gozo de salário-maternidade e férias, por exemplo, afastamentos esses que também suspendem o seu contrato de trabalho, tal como ocorre com o auxílio-doença não acidentário, e retiram o Trabalhador da exposição aos agentes nocivos. Isso denota irracionalidade na limitação imposta pelo decreto regulamentar, afrontando as premissas da interpretação das regras de Direito Previdenciário, que prima pela expansão da proteção preventiva ao Segurado e pela máxima eficácia de suas salvaguardas jurídicas e judiciais.
5. Não se pode esperar do poder judicial qualquer interpretação jurídica que venha a restringir ou prejudicar o plexo de garantias das pessoas, com destaque para aquelas que reivindicam legítima proteção do Direito Previdenciário. Pelo contrário, o esperável da atividade judicante é que restaure visão humanística do Direito, que foi destruída pelo positivismo jurídico.
6. Deve-se levar em conta que a Lei de Benefícios não traz qualquer distinção quanto aos benefícios auxílio-doença acidentário ou previdenciário. Por outro lado, a Lei 9.032/1995 ampliou a aproximação da natureza jurídica dos dois institutos e o § 6o. do artigo 57 da Lei 8.213/1991 determinou expressamente que o direito ao benefício previdenciário da aposentadoria especial será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o art. 22, II da Lei 8.212/1991, cujas alíquotas são acrescidas conforme a atividade exercida pelo Segurado a serviço da empresa, alíquotas, estas, que são recolhidas independentemente de estar ou não o Trabalhador em gozo de benefício.
7. Note-se que o custeio do tempo de contribuição especial se dá por intermédio de fonte que não é diretamente relacionada à natureza dada ao benefício por incapacidade concedido ao Segurado, mas sim quanto ao grau preponderante de risco existente no local de trabalho deste, o que importa concluir que, estando ou não afastado por benefício movido por acidente do trabalho, o Segurado exposto a condições nocivas à sua saúde promove a ocorrência do fato gerador da contribuição previdenciária destinada ao custeio do benefício de aposentadoria especial.
8. Tais ponderações, permitem concluir que o Decreto 4.882/2003 extrapolou o limite do poder regulamentar administrativo, restringindo ilegalmente a proteção exclusiva dada pela Previdência Social ao trabalhador sujeito a condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física.
9. Impõe-se reconhecer que o Segurado faz jus à percepção de benefício por incapacidade temporária, independente de sua natureza, sem que seu recebimento implique em qualquer prejuízo na contagem de seu tempo de atividade especial, o que permite a fixação da seguinte tese:
O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em
gozo
de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como
tempo
de serviço
especial
.
10. Recurso especial do INSS a que se nega provimento.
(REsp 1759098/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/06/2019, DJe 01/08/2019)
No caso em tela, a presente sentença reconheceu como especial as atividades de estivador exercidas até 18/11/2003 e o INSS averbou como ensejador de aposentadoria especial o período de 22/09/2004 a 16/05/2019 (
evento 1, PROCADM15
, p. 436). Logo, o intervalo de 13/11/2002 a 15/09/2004 (NB 126.685.163-9) também deverá ser enquadrado como especial.
------------
(...)
A sentença embargada tratou especificamente dos seguintes termos grifados pelo autor: poeiras, gases, vapores, frio e fósforo. Desnecessária maior análise do laudo do sindicato de estivadores de 1996, inclusive no que tange ao acidente ocorrido com trabalhador naquele ano, envolvendo empilhadeira movida a GLP (gás liquefeito de petróleo), pois a atividade desenvolvida no período de confecção desse documento, e até 18/11/2003, já foi enquadrada como especial pela exposição a ruído. Quanto ao caulim, de fato não houve fundamentação específica no
decisum
.
No que tange ao
caulim
(
https://www.gov.br/anm/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/serie-estatisticas-e-economia-mineral/outras-publicacoes-1/6-2-caulim#:~:text=Em menor escala o caulim,auxiliares de filtração, cosméticos, produtos
), produto químico mencionado pelo autor, note-se que não está arrolado como agente nocivo no anexo do decreto nº 3.048/99 e também não foi incluído na Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (LINACH). Além disso, eventual exposição ao caulim é ocasional, porque relativa a apenas um dos diversos tipos de carga movimentados no porto de Paranaguá.
Por fim, existe o erro material indicado pelo INSS, pois o intervalo de 01/01/2000 a 28/02/2002 sequer foi computado como tempo de contribuição (
evento 1, PROCADM15
, p. 434). Como se sabe, admitir um determinado intervalo de tempo como passível de consideração no cômputo do tempo de contribuição total é condição
sine qua non
para se efetivar seu enquadramento como ensejador de aposentadoria especial. Assim, ausente o interesse processual quanto ao período indicado acima.o de EPI não afasta o direito ao enquadramento de atividade especial, no caso do ruído, conforme a tese fixada pelo STF no julgamento do ARE 664.335:
na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
Relativamente ao recurso do autor, acrescente-se que os laudos da OGMO, relativos aos anos de 2020 e 2021 não são suficientes para afastar o conjunto probatório adotado pelo juízo monocrático, em especial a prova pericial produzida nos autos nº 5001506-79.2012.4.04.7008."
Não obstante os argumentos exarados pela parte recorrente, o recurso não logra juízo positivo de admissibilidade.
(i
e
iii)
Da análise das razões recursais, observa-se tratar de reexame de matéria fática, o que é vedado em pedido de uniformização.
O Colegiado Recursal manteve a sentença prolatada pelo juízo
a quo
por seus próprios fundamentos, que assim concluiu:
"[...]
como a prova pericial judicial indica que o nível de exposição normalizado (NEN) de ruído a que o estivador é exposto não ultrapassa o limite de 85 decibéis nos três diferentes locais de atividade desse trabalhador (berços públicos, TCP e Fospar)
, não há como averbar como especiais, em razão da exposição ao agente físico ruído, os períodos posteriores a 18/11/2003
."
"
Analisando-se a jurisprudência do e. TRF da 4ª Região posterior ao trânsito em julgado da decisão do STJ quanto ao tema 1.083, tem-se que a 10ª Turma do TRF4
não reconhece a atividade especial do estivador de Paranaguá a partir de 01/01/2004, tendo em conta que a exposição não ocorre de modo habitual e permanente acima do limite de tolerância, tal como evidenciado no PPP emitido pelo OGMO
"
"Não se desconhece a existência de acórdãos recentes da 11ª Turma do TRF4 que determinam o enquadramento da atividade de estivador exercida após 18/11/2003,
entretanto aparentemente a prova constante nas ações julgadas não incluía o laudo técnico da perícia produzida nestes autos, no qual a intensidade do agente físico ruído foi aferida na forma de NEN, tal qual previsto na tese firmada pelo STJ quanto ao tema 1.083
,
e não houve constatação da presença de outros agentes acima do respectivo limite de tolerância
,
tampouco de agentes químicos cancerígenos
.
"
"
Especificamente quanto ao fósforo, mencionado pelo autor, deve-se esclarecer inicialmente que constou apenas em "relatório de inspeção" feito em 2005 por encomenda do sindicato, e não pelo OGMO (
evento 1, LAUDO19
). De qualquer forma, o próprio documento, emitido há cerca de 18 anos,
indica que esse produto químico compõe apenas determinado tipo de fertilizante utilizado na agricultura (p. 14 do documento), todavia a atividade de estivador é exercida no embarque e desembarque de inúmeras cargas diversas, sendo que o contanto com esse fertilizante específico, se existente, certamente ocorre de forma eventual
. Some-se a isso o fato de que esse agente somente enseja aposentadoria especial quando a exposição ocorre de modo habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, no exercício das seguintes atividades previstas pelo item 1.0.12 do Decreto 3.048/1999 (item 1.0.12): a) extração e preparação de fósforo branco e seus compostos; b) fabricação e aplicação de produtos fosforados e organofosforados (sínteses orgânicas, fertilizantes e praguicidas); c) fabricação de munições e armamentos explosivos.
"
Portanto, vislumbra-se que a pretensão do recorrente reside em rediscussão da prova produzida nos autos, de forma a embasar suas alegações.
Com efeito, a alteração da conclusão do acórdão recorrido
implicaria em reexame do conjunto fático-probatório, fato que encontra óbice nas
Súmulas nº 42/TNU
,
nº 7/STJ e nº 279/STF
(
"Não se conhece de incidente de uniformização que implique reexame de matéria de fato."; "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial."; "Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário."
- respectivamente), aplicáveis às Turmas de Uniformização.
Desse modo, aplica-se ao ponto o estabelecido no artigo 14, inciso V, alínea "d", da
Resolução nº 586/2019 - CJF
: "
V –
não admitir
o pedido de uniformização de interpretação de lei federal, quando desatendidos os seus requisitos, notadamente se: d) a análise do pedido de uniformização demandar
reexame de matéria de fato
;"
(ii)
Em relação ao
Tema 1.090 do STJ
,
observa-se a configuração da
inovação recursal
, vez que a questão relativa à respectiva irresignação
não
foi objeto de deliberação pela Turma Recursal
, nem mesmo por intermédio de embargos de declaração.
Dessa forma, o recurso não deve ser provido por falta do requisito essencial à admissibilidade do pedido de uniformização, consistente no
prequestionamento
da matéria.
Neste sentido, dispõe a
Questão de Ordem nº 10
da TNU:
"Não cabe o incidente de uniformização quando a parte que o deduz apresenta tese jurídica inovadora, não ventilada nas fases anteriores do processo
e sobre a qual não se pronunciou expressamente a Turma Recursal no acórdão recorrido
."
Ainda, considerando que o Colegiado não debateu especificamente sobre a insurgência recursal apresentada, não ficando expresso na decisão da Turma Recursal os fundamentos que contrariam o posicionamento do STJ, não entendo possível o manejo do pedido de uniformização. Nesse sentido, o enunciado da
Questão de Ordem nº 35
da TNU
:
"
o conhecimento do pedido de uniformização
pressupõe a efetiva apreciação do direito material controvertido por parte da Turma de que emanou o acórdão impugnado
."
O prequestionamento não exige que haja menção expressa dos dispositivos infraconstitucionais tidos como violados, entretanto,
é imprescindível que no aresto recorrido as questões tenham sido discutidas e decididas fundamentadamente
, sob pena de não preenchimento do requisito, indispensável para o conhecimento do recurso.
Assim, recai sobre o ponto o contido no artigo 14, inciso I, da
Resolução nº 586/2019 do CJF
: "
I -
não conhecer
de pedido de uniformização de interpretação de lei federal intempestivo, incabível,
prejudicado
, interposto por parte ilegítima ou carecedor de interesse recursal;
"
Ante ao exposto,
não admito/conheço
o/do pedido de uniformização nacional.
Intimem-se.
Após, certifique-se o trânsito em julgado do acórdão e encaminhem-se os autos ao Juizado de origem.
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