Processo nº 5022419-97.2024.4.03.6100
ID: 325931498
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO
Classe: APELAçãO / REMESSA NECESSáRIA
Nº Processo: 5022419-97.2024.4.03.6100
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
OSCAR GUILLERMO FARAH OSORIO
OAB/SP XXXXXX
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ALAN HUMBERTO JORGE
OAB/SP XXXXXX
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TIAGO ALEXANDRE ZANELLA
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5022419-97.2024.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: DELEGADO DA DE…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 3ª Turma APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5022419-97.2024.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: CARTPANDA TECNOLOGIA DE SOFTWARE LTDA Advogados do(a) APELADO: ALAN HUMBERTO JORGE - SP329181-A, OSCAR GUILLERMO FARAH OSORIO - SP306101-A, TIAGO ALEXANDRE ZANELLA - SP304365-A OUTROS PARTICIPANTES: JUIZO RECORRENTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 22ª VARA FEDERAL CÍVEL FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP D E C I S Ã O Trata-se de remessa necessária e apelação da UNIÃO em mandado de segurança impetrado por CARTPANDA TECNOLOGIA DE SOFTWARE LTDA contra ato do DELEGADO(A) DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO – DERAT/SP, objetivando: “[...]60. Desta feita, em se reconhecendo a inconstitucionalidade da inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS, deverá ser assegurado o direito à restituição dos valores recolhidos desde jan/2021, bem como aqueles que venham a ser recolhidos ao longo da demanda, seja pelo cumprimento de sentença, pela compensação administrativa, ou pela via de repetição de indébito. [...] d) ao final, com o regular processamento do feito, a concessão da segurança, para, confirmando a medida liminar, assegurar à Impetrante o direito de não ser compelida a incluir o ISS na base de cálculo da contribuição do PIS e da COFINS, com o afastamento das alterações promovidas pelo art. 2º, da Lei n. 12.973/14, no artigo 12, § 5º, do Decreto-Lei n. 1.598/77 (contribuições passadas e vincendas); e) em face do acolhimento do pedido de item “d”, a declaração da interrupção da prescrição e de que foram realizados a maior os recolhimentos de PIS/CONFINS nos 5 anos anteriores à impetração deste writ pela Impetrante, incluindo valores vincendos eventualmente recolhidos, e para reconhecer o direito da Impetrante a reaver valores indevidamente recolhidos (vencidos e vincendos), inclusive pela via da compensação de quaisquer tributos federais, devidamente atualizados pelos juros equivalentes à taxa SELIC, sem que seja imposto qualquer ato de construção pela d. Autoridade Coatora em razão do exercício de tal direito; [...]”. A r. sentença (ID 323830722) concedeu a segurança nos seguintes termos: “[...] Diante do exposto e de tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido e CONCEDO A SEGURANÇA, confirmando a medida liminar anteriormente deferida, para determinar à autoridade impetrada que se abstenha de exigir da impetrante a inclusão, na apuração da base de cálculo das contribuições vincendas do PIS e COFINS, do valor integral do ISS destacado em suas notas fiscais de vendas de serviços, bem como, para reconhecer o direito da impetrante em proceder à restituição/compensação tributária do quanto recolheu a maior, em conformidade com esta sentença, a partir do período quinquenal que antecedeu a propositura desta ação até o trânsito em julgado, cujo valor poderá ser atualizado monetariamente pela variação da Taxa Selic, sem quaisquer outros acréscimos, procedimento que somente poderá ser adotado após o transito em julgado desta sentença, nos termos do artigo 170-A do CTN. A certeza e a exatidão do valor a ser compensado será de exclusiva responsabilidade da impetrante, ressalvando-se o direito da administração fiscal de proceder à conferência desse valor, podendo exigir o que eventualmente for compensado em desacordo com esta sentença, sendo que, eventual opção pela restituição do indébito deve observar o regime de precatórios, sendo descabida a restituição em espécie na via administrativa. Por conseguinte, julgo extinto o processo, com resolução do mérito, na forma do inciso I do artigo 487 do Código de Processo Civil. Custas na forma da lei. Sem condenação em honorários advocatícios por incabíveis à espécie. Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oficie-se.” Em suas razões recursais (ID 323830724) a União postula a reforma do julgado sob o fundamento, em síntese, de que a tese firmada no julgamento dos embargos de declaração opostos pela União no RE 574.706/PR, submetido à sistemática da repercussão geral (Tema 69), qual seja, "O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins", não se enquadra à moldura legal do ISSQN. Devidamente processado o feito, com contrarrazões (ID 323830726), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal. O Ministério Público Federal, não vislumbrando interesse público que justificasse sua intervenção, manifestou-se pelo regular processamento do feito (ID 324697611). É o relatório. Decido. Discute-se a inclusão, na base de cálculo da contribuição para o Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS, de valores a título de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS. Da pendência de julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 118/STF Curvo-me ao entendimento uníssono das Turmas integrantes da 2ª Seção no sentido de que não se verifica impedimento para julgamento recursal em razão da pendência de julgamento pelo e. STF do Tema de Repercussão Geral n.º 118 (“Inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS” - RE nº. 592.616), haja vista que, em que pese imperativo legal expresso no artigo 1.035, § 5º, do CPC, não houve determinação da Corte Suprema para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a questão. (confira-se: STF, Pleno, RE/RG-QO 966177, relator Ministro Luiz Fux, j. 07.06.2017: “2. A suspensão de processamento prevista no §5º do art. 1.035 do CPC não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no caput do mesmo dispositivo, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la.”). Do mérito A Constituição estabelece que a seguridade social será financiada por toda a sociedade mediante recursos, dentre outros, provenientes das contribuições do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei (artigo 195, I). Até a vigência da Emenda Constitucional n.º 20/1998 essa contribuição incidia sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro; posteriormente, passou a incidir sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício (artigo 195, I, a, CF), sobre a receita ou o faturamento (alínea b) e sobre o lucro (alínea c). A contribuição para o Programa de Integração Social – PIS foi instituída pela Lei Complementar n.° 7/70, visando promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas. A Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS foi instituída pela Lei Complementar n.° 70/91, com destinação exclusiva às despesas com atividades-fins das áreas de saúde, previdência e assistência social. Ambas as contribuições possuíam como base de cálculo o faturamento, que sempre foi entendido como a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza (confira-se: ADC n.° 1-1/DF; artigo 3º da Lei n.º 9.715/98). Posteriormente, a Lei n.° 9.718/98, em que foi convertida a Medida Provisória n.° 1.724/98, dispôs que a base de cálculo do PIS e da COFINS é o faturamento (artigo 2°), correspondente à receita bruta da pessoa jurídica (artigo 3°, caput), entendida como a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas (artigo 3°, § 1°). Em razão desta definição de faturamento, prevista por lei ordinária precedente à EC n.º 20/98, foi declarada a inconstitucionalidade do dispositivo pelo Plenário do e. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 390.840-5/MG, em 09.11.05. Enfim, o referido § 1º foi revogado pela Lei n.º 11.941/09. Com a promulgação da EC n.° 20/98, foram editadas as Leis n.°s 10.637/02 (artigo 1°, §§ 1° e 2°) e 10.833/03 (artigo 1°, §§ 1° e 2°) que alteraram a base de cálculo do PIS e da COFINS, respectivamente, ao considerar o valor do faturamento entendido como o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, compreendendo a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica. Quanto às pessoas jurídicas sujeitas ao regime cumulativo, reguladas pela Lei nº 9.718/98, foi editada a Lei nº 12.973/2014 que alterou seu artigo 3º, para determinar, como faturamento, a receita bruta de que trata o artigo 12 do Decreto-Lei nº 1.598/77, que, por sua vez, passou a estabelecer: “Art. 12. A receita bruta compreende: I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria; II - o preço da prestação de serviços em geral; III - o resultado auferido nas operações de conta alheia; e IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III.{...} § 4o Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo prestador dos serviços na condição de mero depositário. § 5o Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações previstas no caput, observado o disposto no § 4o.” A despeito de eventuais discrepâncias com conceitos empresariais e contábeis, é fato que até a EC n.° 20/98, para fins tributários, fixou-se uma sinomínia entre “faturamento” e a “receita bruta” oriunda das atividades empresariais. Com a inclusão no texto constitucional da hipótese de incidência “receita” ou “faturamento”, revela-se importante a distinção dos conceitos. Enquanto receita é gênero, que abrange todos os valores recebidos pela pessoa jurídica, que incorporam sua esfera patrimonial, independentemente de sua natureza (operacional ou não operacional); faturamento é espécie, que comporta tão somente as receitas operacionais, isto é, provenientes das atividades empresariais da pessoa jurídica. Se, de fato, sempre houve uma imprecisão técnica na redação legislativa sobre o que é “faturamento”, agora repetida quanto ao que é “receita”, tal jamais foi empecilho para ser considerada a exigibilidade das exações cujos fatos geradores ou bases de cálculo fossem fundadas nesses elementos, desde que respeitados os princípios constitucionais e tributários, mormente o da legalidade. À medida que a EC n.° 20/98 permite a incidência de contribuições sociais para financiamento da seguridade social sobre “receita” ou faturamento”, basta à legislação infraconstitucional definir o fato gerador do tributo e respectiva base de cálculo como “receita” ou “faturamento”, tomados em sua conceituação obtida do direito privado. As empresas tributadas pelo regime da Lei n.° 9.718/98 têm como fato gerador e base de cálculo do PIS e COFINS seu faturamento, entendido na qualidade de espécie de receita, cuja ordem é operacional. Já as empresas tributadas pelo regime das Leis n.°s 10.637/02 e 10.833/03 têm como fato gerador e base de cálculo a totalidade de suas receitas e não apenas aquelas consideradas “faturamento”; independentemente de constar no texto destas normas que o fato gerador “é o faturamento mensal” e a base de cálculo “é o valor do faturamento”, a definição apresentada para faturamento (o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, compreendida a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela empresa) é incontestavelmente a do gênero “receita”, que é absolutamente compatível com a EC n.° 20/98. Por se considerar que os valores do ICMS e do ISS estão ínsitos, respectivamente, no preço da mercadoria ou dos serviços, por força de disposição legal – já que é vedado o aparte de tal tributo do preço, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle – e da sistemática da tributação por dentro preconizada pelas LC n.ºs 87/96 e 116/03, construiu-se larga jurisprudência no sentido de que é legítima a inclusão do valor do ICMS e do ISS na base de cálculo das contribuições ao PIS e COFINS, inclusive com base nas, hoje cancelas, Súmulas n.ºs 68 (“A parcela relativa ao ICM inclui-se na base de calculo do PIS”, de 15.12.1992) e 94 (“A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de calculo do FINSOCIAL”, de 22.02.1994) do c. Superior Tribunal de Justiça. A discussão que há muito se travou nos órgãos do Poder Judiciário, e de forma unânime sustentada pelos contribuintes, reside no fato de que, ainda que incluso no preço da mercadoria ou serviço, o valor desses tributos (ICMS e ISS) não constitui, efetivamente, qualquer tipo de receita em favor do contribuinte, quanto menos faturamento, na exata medida em que deverá ser vertido aos cofres públicos. Na qualidade de responsável tributária, a empresa não possui disponibilidade jurídica ou econômica sobre os valores percebidos a título de ICMS ou ISS. Assim, não há “receita” do contribuinte, mas mero ônus fiscal. O e. Supremo Tribunal Federal, respectivamente em 25.04.2008 e 10.10.2008, reconheceu repercussão geral aos temas n.º 69 (“Inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.”) e 118 (“Inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS.”), este último ainda pendente de julgamento (RE n.º 592.616/RS). Já em 08.10.2014, o Plenário do e. Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário n.º 240.785/MG, que afastava a incidência da COFINS sobre os valores de ICMS, sem necessidade de se aguardar o julgamento conjunto da ADC n.º 18 e do RE n.º 574.706. Posteriormente, a Ação Declaratória de Constitucionalidade n.º 18/DF (referente ao inciso I, do § 2º, do artigo 3º da Lei n.º 9.718/98) foi julgada prejudicada em razão do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 574.706/PR, com reconhecimento de repercussão geral (tema n.º 69), no qual o e. STF firmou tese no sentido de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins” (j. 15.03.2017), observada a modulação (j. 13.05.2021) de seus efeitos a partir de 15.03.2017, ressalvadas as ações judiciais e procedimentos administrativos protocolados até referida data. Segue a ementa dos Acórdãos: “RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURAÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços: análise contábil ou escritural do ICMS. 2. A análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não cumulatividade a cada operação. 3. O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu da base de cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que não há como se excluir a transferência parcial decorrente do regime de não cumulatividade em determinado momento da dinâmica das operações. 4. Recurso provido para excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.” (STF, Pleno, RE 574706, relatora Ministra Cármen Lúcia, j. 15.03.2017) “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E CONFINS. DEFINIÇÃO CONSTITUCIONAL DE FATURAMENTO/RECEITA. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE DO JULGADO. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. ALTERAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA COM EFEITOS VINCULANTES E ERGA OMNES. IMPACTOS FINANCEIROS E ADMINISRTATIVOS DA DECISÃO. MODULAÇÃO DEFERIDA DOS EFEITOS DO JULGADO, CUJA PRODUÇÃO HAVERÁ DE SE DAR DESDE 15.3.2017 – DATA DE JULGAMENTO DE MÉRITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 574.706 E FIXADA A TESE COM REPERCUSSÃO GERAL DE QUE “O ICMS NAO COMPÕE A BASE DE CÁLCULO PARA FINS DE INCIDÊNCIA DO PIS E DA COFINS” - , RESSALVADAS AS AÇÕES JUDICIAIS E PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS PROTOCOLADAS ATÉ A DATA DA SESSÃO EM QUE PROFERIDO O JULGAMENTO DE MÉRITO. EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS.” (STF, Pleno, RE/ED 574706, relatora Ministra Cármen Lúcia, j. 13.05.2021) Destaca-se do voto da i. Ministra Cármen Lúcia, condutor do leading case, que: “[...] Poder-se-ia aceitar que a análise jurídica e a contábil do ICMS, ambas pautadas na característica da não cumulatividade deste tributo, revelariam que, assim como não é possível incluir o ICMS na base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, também não seria possível excluí-lo totalmente, pois enquanto parte do ICMS é entregue diretamente ao Estado, parte dele se mantém no patrimônio do contribuinte até a realização da nova operação. Entretanto, a análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há que levar em consideração o conteúdo normativo do art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, ou seja, examina-se a não cumulatividade a cada operação: [...] conquanto nem todo o montante do ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na “fatura” é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento para fins de apuração da base de cálculo das contribuições. Portanto, ainda que não no mesmo momento, o valor do ICMS tem como destinatário fiscal a Fazenda Pública, para a qual será transferido. [...]” Ainda, no julgamento dos aclaratórios se reafirmou: “[...] 15. No julgado embargado, prevaleceu o entendimento segundo o qual, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, o regime da não cumulatividade impõe se excluir todo ele da definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. Quer dizer, todo o valor destacado a título de ICMS deve ser excluído da base de cálculo da contribuição PIS/COFINS. [...] 16. O valor integral do ICMS destacado na nota fiscal da operação não integra o patrimônio do contribuinte – e não apenas o que foi efetivamente recolhido em cada operação isolada -, pois o mero ingresso contábil não corresponde ao faturamento, devendo por isso ser excluído da base de cálculo da contribuição PIS/COFINS.[...] 22. Antes do julgamento do presente caso, com reconhecimento da repercussão geral, o Superior Tribunal de Justiça tinha firmado entendimento contrário ao que veio a ser concluído por este Supremo Tribunal. [...] 27. Pelo exposto, acolho, em parte, os presentes embargos de declaração, para modular os efeitos do julgado cuja produção haverá de se dar desde 15.3.2017 – data em que julgado este recurso extraordinário n. 574.706 e fixada a tese com repercussão geral “O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS” -, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que proferido o julgamento de mérito. (g.n.)” Especificamente no que tange ao marco temporal relativo à modulação de efeitos, a Corte Suprema reafirmou sua jurisprudência, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 1.279 (RE n.º 1.452.421), fixando a tese de que “em vista da modulação de efeitos no RE 574.706/PR, não se viabiliza o pedido de repetição do indébito ou de compensação do tributo declarado inconstitucional, se o fato gerador do tributo ocorreu antes do marco temporal fixado pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as ações judiciais e os procedimentos administrativos protocolados até 15.3.2017”. Segue a ementa do acórdão: “Recurso extraordinário. Representativo da controvérsia. Direito tributário. Contribuições para o PIS e a COFINS. Base de Cálculo. ICMS. Exclusão. RE 574.706/PR. Tema 69 da repercussão geral. Modulação de efeitos. Fato gerador do Tributo. Marco Temporal: a partir de 15 de março de 2017. Precedentes. Questão constitucional. Relevância. Potencial multiplicador da controvérsia. Repercussão geral com reafirmação de jurisprudência. Decisão recorrida em dissonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário a que se dá provimento. 1. O marco temporal da modulação dos efeitos da decisão proferida nos embargos de declaração no RE 574.706/PR, Tema 69, Rel. Min. Cármen Lúcia, na qual se afastou o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, a partir de 15.3.2017, atinge o fato gerador do tributo, e não a data do lançamento, recolhimento ou pagamento. 2. Recurso extraordinário provido. 3. Fixada a seguinte tese: Em vista da modulação de efeitos no RE 574.706/PR, não se viabiliza o pedido de repetição do indébito ou de compensação do tributo declarado inconstitucional, se o fato gerador do tributo ocorreu antes do marco temporal fixado pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as ações judiciais e os procedimentos administrativos protocolados até 15.3.2017.” (STF, Pleno, RE 1452421, relatora Ministra Rosa Weber, j. 22.09.2023) Reconhecido pelo Plenário do e. STF que não há receita, mas ônus fiscal relativo aos valores destacados nas notas fiscais a título de ICMS, tem-se que tais valores não compõem a base de cálculo das contribuições ao PIS e COFINS incidentes sobre fatos geradores ocorridos a partir de 15.03.2017, ou de acordo com a modulação de efeitos prevista. Não obstante a Corte Suprema não tenha firmado tese quanto ao Tema de Repercussão Geral n.º 118, tenho que, por analogia, aplica-se ao ISS o mesmo entendimento que se desenvolveu sobre o ICMS, que, igualmente, representaria um ônus fiscal. Assim, também os valores a título de ISS, devidamente destacados nas notas fiscais, não compõem sua base de cálculo contribuições ao PIS e COFINS. Contudo, não se aplica aos valores de ISS o mesmo efeito temporal que, em sede de modulação de efeitos, a Corte Suprema definiu para aqueles relativos ao ICMS, posto que a questão extrapola a competência das Cortes de Apelação. A modulação de efeitos, disciplinada nos artigos 27 da Lei n.º 9.868/99 e 927, §3, do CPC, é instituto previsto em favor das Cortes superiores visando à garantia do interesse social e da segurança jurídica, nas hipóteses em que estas Cortes promovem, no âmbito de suas respectivas competências, a declaração a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo e a alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes: “DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ISS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO MANIFESTADO PELO STF NO TEMA 69 DA REPERCUSSÃO GERAL. DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO À COMPENSAÇÃO. PARÂMETROS DA COMPENSAÇÃO. ICMS: MODULAÇÃO DA EFICÁCIA DA TESE VINCULANTE. AFASTADA QUANTO AO ISS. RESTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Após longa controvérsia sobre a matéria, o Supremo Tribunal Federal, no RE 574.706 - Tema 69, submetido à sistemática prevista no art. 543-B do CPC/73, art. 1036 do CPC/15, firmou Tese no sentido de que: “O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”. 2. De acordo com o entendimento firmado pela Suprema Corte por ocasião do julgamento dos embargos de declaração opostos no RE 574.706, a declaração de inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS terá eficácia prospectiva, ou seja, somente serão indevidos os recolhimentos efetuados a partir da data do julgamento do mérito do RE 574.706 (15.03.2017), salvo nos casos em que o protocolo da medida judicial ou administrativa houver sido anterior à data desse julgamento. 3. Por identidade de razões, o entendimento firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal, no RE 574706 - Tema 069. deve ser estendido ao ISS. 4. Incabível a modulação dos efeitos do direito à compensação dos valores recolhidos a título de ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS nos termos estabelecidos pelo julgamento dos embargos de declaração opostos no RE 574.706. A modulação no Tema 69/STF teve como base a data do julgamento do RE 574.706, que versa exclusivamente sobre o ICMS. A aplicação desse limite temporal exige a identidade material entre o presente caso e a tese de repercussão geral. 5. Ainda que as questões relativas ao ISS versem sobre a mesma tese aplicada ao ICMS, pende a apreciação do RE 592.616. A data do reconhecimento da repercussão geral no RE 592.616 remonta à 09/10/2008, não havendo ainda decisão definitiva. Logo, necessário aguardar o pronunciamento do STF acerca de eventual modulação dos efeitos e de qual marco temporal será adotado naquele recurso extraordinário. 6. O e. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que "O mandado de segurança pode ser usado pelo contribuinte para garantir o direito de fazer a compensação tributária com indébitos recolhidos anteriormente à data da impetração, mas ainda não atingidos pela prescrição. 7. O e. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião da análise do REsp 1.114.404/MG, submetido ao regime da Lei nº 11.672/08 (Lei dos Recursos Repetitivos), firmou o entendimento de que, uma vez reconhecido, judicialmente, indébito a favor do contribuinte, pode ele optar pela forma de recebimento: via pagamento mediante precatório ou compensação. 8. Possibilidade de cumprimento do julgado do mandado de segurança, pela repetição via precatório, conforme precedentes desta Egrégia Terceira Turma. 9. Cabível o mandado de segurança impetrado com vistas a declarar o direito à restituição por precatório/compensação tributária, em virtude do reconhecimento da ilegalidade ou inconstitucionalidade da anterior exigência da exação. 10. A restituição do indébito deve observar o regime de precatórios (art. 100 da Constituição Federal). Descabida a restituição em espécie na via administrativa, conforme entendimento firmado no âmbito desta Terceira Turma. 11. O contribuinte poderá realizar a compensação administrativa após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. 12. A análise e exigência da documentação necessária para apuração do valor do ISS e a sua correta exclusão, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/96. 13. Apelação da União e remessa necessária parcialmente providas. 14. Apelação da impetrante provida.” (TRF3, 3ª Turma, ApelRemNec 5023455-82.2021.4.03.6100, relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, j. 08.05.2023) “AGRAVOS INTERNOS. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DO ISS DA BASE DE CÁLCULO DE PIS/COFINS. TEMA 69 DE REPERCUSSÃO GERAL. MODULAÇÃO DE EFEITOS. INAPLICABILIDADE. I.Inicialmente, não há que se falar em suspensão do presente feito em razão do reconhecimento da repercussão geral nos autos do RE nº 592.616 (Tema 118), visto que não houve determinação expressa nesse sentido, conforme exige o art. 1.035, § 5º, do CPC/2015. II. O Plenário do E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 69 de repercussão geral (RE nº 574.706-PR, j. 02.10.2017), firmou entendimento no sentido de que"O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins". Assim, amparado firmemente no regime da não cumulatividade, constitucionalmente imposto ao ICMS (art. 155, §2º, I, CF/88), definiu aquele Sodalício pela exclusão dos valores do ICMS da base de cálculo das contribuições ao PIS/COFINS.O tema de fundo, portanto, tornou-se indiscutível. III. No entendimento desta C. 6ª Turma, as razões de decidir da Corte Superior são aplicáveis ao questionamento do ISS, dada a semelhança entre as matérias. IV. Não se afigura possível, todavia, a modulação de efeitos no presente caso, uma vez que a questão relacionada à exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da COFINS foi afetada à sistemática da repercussão geral pelo C. Supremo Tribunal Federal (RE 592.616 – Tema nº 118) e está pendente de apreciação. V. Sendo assim, em que pese tenham sido utilizados os fundamentos do RE 574.706 como razão de decidir, a modulação somente pode ser realizada pelo órgão competente, neste caso, o próprio Supremo Tribunal Federal. Por outras palavras, trata-se de medida excepcional que necessita da maioria de dois terços dos membros do C. STF para ser implementada, o que demanda, portanto, interpretação restritiva. VI. Agravo interno da União Federal desprovido. Agravo interno da impetrante provido.“ (TRF3, 6ª Turma, ApelRemNec 5002555-46.2021.4.03.6143, relator Desembargador Federal Mairan Maia, j. 29.04.2023) Destaca-se que não há se falar em “declaração de inexigibilidade” do crédito tributário, haja vista que a situação trata de inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue a parte ao recolhimento tributário. Observado o prazo quinquenal de prescrição disposto no artigo 168, I, do CTN, contado da data do ajuizamento desta ação, reconheço o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente, consoante pleiteado em sede do apelo. Quanto ao ponto, o reconhecimento do direito à compensação não é de cunho de meramente declaratório, mas, sim, condenatório, uma vez que obriga a União a suportar a compensação daquilo cuja conclusão, em regra, implicaria execução nos próprios autos. Na forma dos artigos 39, § 4º, da Lei n.º 9.250/95 e 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, bem como das teses fixadas nos Temas n.º 810/TSF e 905/STJ, os créditos serão atualizados pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic (composta de taxa de juros moratórios e correção monetária), calculada a partir do recolhimento indevido (Súmula STJ n.º 162) até o mês anterior ao da repetição, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices. Após o trânsito em julgado (artigo 170-A do CTN), poderá ser requerida a compensação do indébito administrativamente junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil, observando-se o disposto nos artigo 74 da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A da Lei n.º 11.457/2007, vigentes na data da propositura da ação, ressalvando-se o direito de proceder à compensação em conformidade com normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios, nos termos da tese firmada pelo c. STJ no julgamento do Tema Repetitivo n.º 265 (REsp n.º 1.137.738/SP). Ressalta-se que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil disciplinar os procedimentos necessários para o requerimento administrativo da compensação (artigo 74, § 14, da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A, § 2º, da Lei n.º 11.457/2007). No que tange à restituição, em espécie, do indébito, tem-se que, na via administrativa, encontra-se expressamente assegurada e regulamentada nos artigos 165 do CTN, 66, § 2º, da Lei n.º 8.383/91 e 73 da Lei 9.430/96: CTN: “Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; [...]” (g.n..) Lei n.º 8.383/91: “Art. 66. Nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos, contribuições federais, inclusive previdenciárias, e receitas patrimoniais, mesmo quando resultante de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de importância correspondente a período subseqüente. [...] § 2º É facultado ao contribuinte optar pelo pedido de restituição. [...]” (g.n.) Lei n.º 9.430/96: “Art. 73. A restituição e o ressarcimento de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil ou a restituição de pagamentos efetuados mediante DARF e GPS cuja receita não seja administrada pela Secretaria da Receita Federal do Brasil será efetuada depois de verificada a ausência de débitos em nome do sujeito passivo credor perante a Fazenda Nacional.” Contudo, na hipótese da restituição decorrente de decisão judicial, estabeleceu-se dissenso jurisprudencial quanto à possibilidade de sua realização na via administrativa, ainda que não houvesse óbice da Administração Tributária. A questão resulta do quanto disposto no artigo 100 da Constituição, que estabelece que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. O e. Supremo Tribunal Federal, em 08.08.2015, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 831, delimitado como “obrigatoriedade de pagamento, mediante o regime de precatórios, dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva”, reafirmou sua jurisprudência e firmou tese no sentido de que “o pagamento dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva deve observar o regime de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal”. Posteriormente, em 13.09.2019, a Corte Suprema julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 250/DF para estabelecer a necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor): “ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. CONCESSÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA. VALORES DEVIDOS. EXCLUSÃO DO REGIME DE PRECATÓRIO. LESÃO AOS PRECEITOS FUNDAMENTAIS DA ISONOMIA, DA IMPESSOALIDADE E OFENSA AO DEVIDO PROCESSO CONSTITUCIONAL. ATRIBUIÇÃO DE EFEITO VINCULANTE À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL SOBRE A MATÉRIA. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL JULGADA PROCEDENTE. 1. Apesar de ter sido dirimida a controvérsia judicial no julgamento do Recurso Extraordinário n. 889.173 (Relator o Ministro Luiz Fux, Plenário virtual, DJe 14.8.2015), a decisão proferida em recurso extraordinário com repercussão geral não estanca, de forma ampla e imediata, situação de lesividade a preceito fundamental resultante de decisões judiciais: utilidade da presente arguição de descumprimento de preceito fundamental. 2. Necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor). Precedentes. 3. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada procedente.” (STF, Pleno, ADPF 250, relatora Ministra Cármen Lúcia, j. 13.09.2019) Ainda, em 10.02.2010, no julgamento pelo c. Superior Tribunal de Justiça do Tema Repetitivo n.º 228 (REsp n.ºs 1.114.404/MG e 937.890/SP), delimitado como “questiona-se se é facultado ao contribuinte que detém crédito contra a Fazenda Pública por tributo indevidamente pago optar pela restituição via precatório ou compensação, conforme previsão legal do ente tributante”, e assim analisado, fixou-se a tese no sentido de que “o contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”, posteriormente convertida na Súmula STJ n.º 461. É importante frisar que, após o decidido pelo e. STF, a Secretaria da Receita Federal do Brasil passou a obstar a restituição, na via administrativa, de valores decorrentes de condenação judicial, conforme se verifica no Parecer PGFN/CAT n.º 2.093/2011, na Solução de Consulta COSIT n.º 239/2019, e posteriores redações das Instruções Normativas que regulam a restituição tributária na via administrativa, em relação àquela que constava do artigo 70 da revogada Instrução Normativa RFB n.º 900/2008. Não obstante, a Corte Superior vinha adotando entendimento no sentido de que o contribuinte pode optar pela restituição na via administrativa, mormente em sede de mandado de segurança, conforme precedentes de suas 1ª e 2ª Turmas: “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CRÉDITOS PRESUMIDOS DE ICMS. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ/CSLL. MANDADO DE SEGURANÇA OBJETIVANDO A DECLARAÇÃO DO DIREITO À RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO NA VIA ADMINISTRATIVA. CABIMENTO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO STJ. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. [...] 4. Também em relação à possibilidade de se assegurar, na via administrativa, o direito à restituição do indébito tributário reconhecido por decisão judicial em mandado de segurança, o acórdão embargado seguiu a jurisprudência firmada por ambas as turmas integrantes da Primeira Seção de que "o mandado de segurança é via adequada para declarar o direito à compensação ou restituição de tributos, sendo que, em ambos os casos, concedida a ordem, os pedidos devem ser requeridos na esfera administrativa, restando, assim, inviável a via do precatório, sob pena de conferir indevidos efeitos retroativos ao mandamus" (AgInt no REsp 1.895.331/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/05/2021, DJe 11/06/2021). [...]” (STJ, 1ª Turma, EDcl/REsp 1951855, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, j. 13.03.2023) “TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO INCIDENTE SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO RURAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO OU RESTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO. 1. Conforme consignado na decisão agravada, o acórdão recorrido encontra-se em sintonia com a jurisprudência do STJ, que se firmou no sentido de que a opção pela compensação ou restituição do indébito, na forma da Súmula 461 do STJ c/c os arts. 66, § 2º, da Lei 8.383/1991 e 74, caput, da Lei 9.4390/1996, se refere à restituição administrativa do indébito, e não à restituição por precatório ou RPV. Isso porque a pretensão manifestada na via mandamental de condenação da Fazenda Nacional à restituição de tributo indevidamente pago no passado, possibilitando o posterior recebimento desse valor pela mediante precatório, implica utilização do Mandado de Segurança como substitutivo da ação de cobrança, o que não se admite, conforme entendimento cristalizado na Súmula 269 do STF. 2. Agravo Interno não provido.” (STJ, 2ª Turma, AgInt/AREsp 1945394, relator Ministro Herman Benjamin, j. 21.02.2022) Sedimentando a questão, o Tribunal Pleno do e. Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à matéria (Tema n.º 1.262 – RE 1.420.691) e, reafirmando sua jurisprudência, firmou tese no sentido de que “não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal”: Segue a ementa do acórdão: “Recurso extraordinário. Representativo da controvérsia. Direito constitucional e tributário. Restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial. Inadmissibilidade. Observância do regime constitucional de precatórios (CF, art. 100). Questão constitucional. Potencial multiplicador da controvérsia. Repercussão geral reconhecida com reafirmação de jurisprudência. Decisão recorrida em dissonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário provido. 1. Firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de pronunciamentos jurisdicionais devem ser realizados por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, consoante previsto no art. 100 da Constituição da República 2. Recurso extraordinário provido. 3. Fixada a seguinte tese: Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal.” (STF, Pleno, relatora Ministra Rosa Weber, j. 21.08.2023) Em consonância com o entendimento da Corte Suprema, a quem compete assegurar o devido atendimento dos preceitos da Carta, entendo que é incabível a restituição, em espécie, na via administrativa. Assim, uma vez reconhecida judicialmente a existência de valores de tributos recolhidos indevidamente ou a maior, cabe ao contribuinte optar pela sua compensação, na via administrativa, ou por sua restituição em espécie, por meio de precatório. Quanto ao ponto, cabe destacar a situação peculiar do contribuinte que, por opção própria, elege a via judicial mandamental para satisfação de seus direitos. Previsto na Constituição (artigo 5º, LXIX) como garantia fundamental para proteção de direito líquido e certo, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público, o mandado de segurança não se confunde – nem pode ser confundido – com ação de cobrança, sob pena de se aviltar seu caráter garantidor de direitos fundamentais especialmente protegidos pela Carta. Nesse sentido, a Corte Suprema já editara os enunciados de Súmula n.ºs 269 (“O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança”) e 271 (“Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”). Destaca-se que a Lei n.º 12.016/2009, que disciplina o mandado de segurança, estabeleceu em seu artigo 14, § 4º, que “o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial”. Nessa compreensão de executoriedade, na própria via mandamental, de valores devidos a partir da impetração, reafirmada pelo e. STF para o quanto devido pela Fazenda Pública independentemente da natureza jurídica do crédito, entendo possível a restituição em espécie do indébito tributário, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança, apenas dos valores devidos a partir da impetração, até a efetiva implementação da ordem concessiva. Quanto aos valores pretéritos à impetração reconhecidos na ordem concessiva, caberá ao contribuinte, nas vias próprias, pugnar pela restituição em espécie, por meio de precatório. Ante o exposto, nego provimento à apelação da União e dou parcial provimento à remessa necessária para fixar os parâmetros supra definidos quanto à compensação e restituição em espécie do indébito, mantida, no mais, a r. sentença de 1º grau de jurisdição. Intimem-se e, oportunamente, remetam-se os autos ao juízo de origem. São Paulo, data constante da certificação de assinatura eletrônica.
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