Processo nº 0015915-93.2019.8.08.0012
ID: 308509385
Tribunal: TJES
Órgão: 027 - Gabinete Desª. DEBORA MARIA AMBOS CORREA DA SILVA
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0015915-93.2019.8.08.0012
Data de Disponibilização:
26/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO
OAB/ES XXXXXX
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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO PROCESSO Nº 0015915-93.2019.8.08.0012 APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: EDP ESPIRITO SANTO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A. APELADO: ELISANGELA FREIRE DE ALMEIDA RE…
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO PROCESSO Nº 0015915-93.2019.8.08.0012 APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: EDP ESPIRITO SANTO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A. APELADO: ELISANGELA FREIRE DE ALMEIDA RELATOR(A): DÉBORA MARIA AMBOS CORRÊA DA SILVA ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ EMENTA Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. ENERGIA ELÉTRICA. FRAUDE NO MEDIDOR. TERMO DE OCORRÊNCIA E INSPEÇÃO – TOI. PROVA UNILATERAL. AUSÊNCIA DE PERÍCIA E CONTRADITÓRIO. COBRANÇA INDEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta por EDP Espírito Santo Distribuição de Energia S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Cariacica, que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito c/c indenização por danos morais ajuizada por Elisângela Freire de Almeida, julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a inexistência de débito oriundo do TOI nº 3464196 e condenar a concessionária ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se o Termo de Ocorrência de Irregularidade (TOI), lavrado unilateralmente pela concessionária de energia elétrica, é suficiente para comprovar fraude no medidor da unidade consumidora; e (ii) determinar se houve violação ao contraditório e à ampla defesa na apuração da suposta irregularidade, conforme exigido pela Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010 (revogada) e pela vigente Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A concessionária de energia elétrica, ao apurar irregularidades em medidores de consumo, deve observar rigorosamente os direitos do consumidor ao contraditório e à ampla defesa, sob pena de nulidade da cobrança fundada exclusivamente em elementos unilaterais. 4. O TOI, ainda que acompanhado de fotografias e histórico de consumo, configura documento unilateral e não possui força probatória absoluta para justificar a cobrança por suposta fraude sem a realização de perícia técnica imparcial e sem garantir ao consumidor o direito de acompanhamento e impugnação do procedimento. 5. A Resolução ANEEL nº 414/2010, em seu art. 129, §§ 6º e 7º, e os arts. 590 e 591 da Resolução ANEEL nº 1.000/2021 exigem que o consumidor seja previamente notificado da avaliação técnica e tenha assegurado o direito de participar da perícia, o que não ocorreu no presente caso. 6. A ausência de comprovação de que a autora tenha sido responsável pela adulteração do medidor, aliada à inobservância das normas procedimentais impostas pela ANEEL, torna ilegítima a cobrança e afasta a presunção de veracidade do TOI. 7. A jurisprudência do STJ (REsp nº 1.412.433/RS) e do TJES é firme ao considerar ilegal a apuração unilateral de supostas fraudes em medidores de energia elétrica, exigindo prova técnica contraditória como condição de validade da cobrança. 8. A fixação da indenização por danos morais em R$ 5.000,00 é razoável e proporcional, diante da cobrança indevida e da violação dos direitos do consumidor em relação a serviço essencial. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. O Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI), elaborado unilateralmente pela concessionária de energia elétrica, não é suficiente para comprovar fraude no medidor de consumo, sendo indispensável a realização de perícia técnica contraditória. 2. A ausência de ciência e de participação do consumidor na apuração da suposta irregularidade configura violação ao contraditório e à ampla defesa, acarretando a nulidade do TOI e a inexigibilidade do débito dele decorrente. 3. A cobrança indevida fundada em prova unilateral e a interrupção de serviço essencial configuram dano moral in re ipsa, ensejando indenização compensatória. Dispositivos relevantes citados: Resolução ANEEL nº 414/2010, art. 129, §§ 6º e 7º; Resolução ANEEL nº 1.000/2021, arts. 590 e 591; CPC, art. 487, I; CDC, arts. 6º e 42. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.412.433/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 25.04.2018, DJe 28.09.2018; TJES, Apelação Cível nº 5000467-39.2022.8.08.0028, Rel. Des. José Paulo Calmon Nogueira da Gama, j. 09.10.2024; TJES, Apelação Cível nº 0002036-73.2017.8.08.0049, Rel. Des. Arthur José Neiva de Almeida, j. 01.04.2024; TJES, Apelação Cível nº 0014955-43.2019.8.08.0011, Rel. Des. Sérgio Ricardo de Souza, j. 26.02.2024. ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ ACÓRDÃO VISTOS, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Desembargadores que compõem a colenda Terceira Câmara Cível do egrégio Tribunal de Justiça do Espírito Santo, na conformidade da ata e das notas taquigráficas da sessão, que integram este julgado, por maioria de votos, CONHECER do presente recurso de apelação e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto divergente. Composição de julgamento: 013 - Gabinete Des. FERNANDO ESTEVAM BRAVIN RUY - FERNANDO ESTEVAM BRAVIN RUY - Relator / 023 - Gabinete Desª. MARIANNE JUDICE DE MATTOS - ALDARY NUNES JUNIOR - Vogal / 025 - Gabinete Des. SÉRGIO RICARDO DE SOUZA - SERGIO RICARDO DE SOUZA - Vogal / 027 - Gabinete Desª. DEBORA MARIA AMBOS CORREA DA SILVA - DEBORA MARIA AMBOS CORREA DA SILVA - Vogal / 005 - Gabinete Des. CARLOS SIMÕES FONSECA - CARLOS SIMOES FONSECA - Vogal ______________________________________________________________________________________________________________________________________________ RELATÓRIO Cuida-se de recurso de apelação interposto por EDP ESPÍRITO SANTO DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA S.A. contra a r. sentença (evento 12286930) proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Cariacica, Comarca da Capital, que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito, movida por ELISÂNGELA FREIRE DE ALMEIDA, julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Em suas razões recursais, apresentadas no evento 12286931, a apelante sustenta, em suma, que: (I) “o procedimento realizado pela EDP se deu à luz da Resolução Normativa 1.000/2021 da ANEEL, de maneira que a sua validade é indubitável, porquanto trata-se de ato completamente vinculado a lei, conforme comprova o arcabouço documental juntado com a contestação, não havendo que se falar em unilateralidade no agir da EDP”; (II) “em momento algum a EDP imputou ao Apelado a execução da irregularidade, no entanto, tal irregularidade provocou queda visível no consumo da instalação e cabe à EDP, conforme descrito no art. 591 da Resolução 1.000/2021 da ANEEL, apurar as diferenças entre os valores consumidos e não apurados devido à irregularidade e, assim, proceder com a recuperação de receita”; (III) “todo o procedimento adotado pela EDP é completamente isento e, longe de ser abusivo, contempla a participação do usuário em todas as suas etapas, sem guardar qualquer traço de arbitrariedade”; (IV) “resta comprovada a total ausência de qualquer irregularidade na suspensão do fornecimento de usuário que deixe de efetuar o pagamento de fatura de energia elétrica, mesmo que derivada de recuperação de consumo por irregularidade no medidor”; (V) “não foi demonstrado qualquer fato capaz de gerar danos morais no presente caso”. Desse modo, requer que o recurso seja conhecido e provido reformar a sentença, no sentido de reconhecer a improcedência da pretensão autoral. Subsidiariamente, pleiteia a redução do montante fixado a título de danos morais. Contrarrazões ofertadas pela apelada no evento 12286985, pelo desprovimento do recurso. É o relatório. Cumpra-se o disposto no art. 934 do Código de Processo Civil1. ________________________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTO VENCEDOR DESEMBARGADORA DÉBORA MARIA AMBOS CORRÊA DA SILVA Eminentes Pares, Com a devida vênia ao ilustre Relator, divirjo do voto condutor por entender que a r. sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Cariacica merece ser mantida integralmente, por estar em perfeita consonância com os princípios que regem as relações de consumo e com a normativa da ANEEL aplicável à espécie. Conforme brevemente relatado pelo ínclito Desembargador FERNANDO ESTEVAM BRAVIN RUY, cuida-se de recurso de apelação interposto por EDP ESPÍRITO SANTO DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA S.A. contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Cariacica, Comarca da Capital, que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito, movida por ELISÂNGELA FREIRE DE ALMEIDA, julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC: (...) Ante as razões acima expendidas, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO AUTORAL, DECLARANDO A INEXISTÊNCIA DO DÉBITO proveniente da apuração de irregularidade no faturamento energia elétrica na unidade consumidora de nº 3464196, com base no TOI nº 3464196, confirmando a decisão dada em audiência de fl. 45, bem como para CONDENAR a parte requerida ao pagamento da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescida de juros de mora e correção monetária a contar desta data, resolvendo o mérito nos termos do art. 269, inciso I, do CPC. (...) Em seu voto, o nobre Desembargador Relator conheceu do recurso e, no mérito, deu-lhe provimento para reformar a sentença, no sentido de julgar integralmente improcedentes os pleitos autorais e resolver o mérito da lide na forma do artigo 487, inciso I, do CPC. Pois bem. A controvérsia gira em torno da validade do Termo de Ocorrência de Irregularidade – TOI nº. 3464196, lavrado unilateralmente pela concessionária de energia, bem como na legitimidade da cobrança de valores expressivos decorrentes da suposta constatação de fraude na unidade consumidora da autora, ora apelada, especialmente diante da ausência de notificação prévia, de contraditório, de direito à perícia e da exclusão do consumidor na apuração da suposta irregularidade. Em que pese a concessionária tenha alegado a existência de fraude no medidor, não há nos autos prova técnica imparcial e contraditória que sustente a cobrança impugnada. É notório que o consumidor possui o direito de participar da apuração da suposta irregularidade, conforme previsto, à época, no art. 129 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010, e, atualmente, nos arts. 590 e 591 da Resolução nº 1.000/2021. No caso concreto, não houve requerimento ou realização de perícia metrológica, tampouco foi dada ciência à autora sobre a apuração, violando-se frontalmente os princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa. De fato, a concessionária apresentou fotografias e histórico de consumo demonstrando a irregularidade e a posterior normalização do consumo, o que pode indicar a ocorrência de fraude. Contudo, tais elementos, por si sós, não são suficientes para imputar ao consumidor a prática de irregularidade, especialmente quando os procedimentos legais e regulamentares não foram rigorosamente observados. Ainda que existam indícios de fraude, a retirada unilateral dos medidores e a lavratura dos TOIs, desacompanhadas da presença ou da ciência do consumidor, não são suficientes para comprovar a irregularidade, tampouco autorizam a cobrança de valores expressivos a título de recuperação de consumo. Ademais, não há comprovação de que a alteração nos medidores tenha sido causada por ato doloso ou culposo da parte autora, não se podendo, portanto, presumir sua responsabilidade sem a devida apuração técnica contraditória. Para além disso, destaque-se que a Resolução Normativa n. 414/2010, da ANEEL, (atualmente revogada pela Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021) delimitava em seu artigo 129 o procedimento a ser adotado em caso de detecção de irregularidades na instalação do padrão para consumo de energia elétrica, permitindo ainda a realização de todas as providências para caracterização do consumo, entre elas a realização de perícia técnica. Confira-se: Art. 129. Na ocorrência de indício de procedimento irregular, a distribuidora deve adotar as providências necessárias para sua fiel caracterização e apuração do consumo não faturado ou faturado a menor. (…) § 6º. A avaliação técnica dos equipamentos de medição pode ser realizada pela Rede de Laboratórios Acreditados ou pelo laboratório da distribuidora, desde que com pessoal tecnicamente habilitado e equipamentos calibrados conforme padrões do órgão metrológico, devendo o processo ter certificação na norma ABNT NBR ISO 9001, preservado o direito de o consumidor requerer a perícia técnica de que trata o inciso II do § 1º. § 7º. Na hipótese do § 6º, a distribuidora deve comunicar ao consumidor, por escrito, mediante comprovação, com pelo menos 10 (dez) dias de antecedência, o local, data e hora da realização da avaliação técnica, para que ele possa, caso deseje, acompanhá-la pessoalmente ou por meio de representante nomeado. Atualmente, tal regramento está previsto nos arts. 590 e 591 da Resolução 1.000 de 2021 da ANEEL: Art. 590. Na ocorrência de indício de procedimento irregular, a distribuidora deve adotar as providências necessárias para sua fiel caracterização, compondo um conjunto de evidências por meio dos seguintes procedimentos: I - emitir o Termo de Ocorrência e Inspeção – TOI, em formulário próprio, elaborado conforme instruções da ANEEL; II - solicitar a verificação ou a perícia metrológica, a seu critério ou quando requerida pelo consumidor; III - elaborar relatório de avaliação técnica quando constatada a violação do medidor ou demais equipamentos de medição, contendo as informações técnicas e a descrição das condições físicas de suas partes, peças e dispositivos, exceto quando for solicitada a perícia metrológica do inciso II; IV - avaliar o histórico de consumo e das grandezas elétricas; e V - implementar, quando julgar necessário: a) medição fiscalizadora, com registros em memória de massa de pelo menos 15 dias consecutivos; e b) recursos visuais, tais como fotografias e vídeos. Art. 591. Ao emitir o TOI, a distribuidora deve: I - entregar cópia legível ao consumidor ou àquele que acompanhar a inspeção, mediante recibo com assinatura do consumidor ou do acompanhante; e II - informar: a) a possibilidade de solicitação de verificação ou de perícia metrológica junto ao INMETRO ou ao órgão metrológico delegado; e b) os prazos, os custos de frete e de verificação ou da perícia metrológica, e que o consumidor será responsabilizado pelos custos se comprovada a irregularidade, vedada a cobrança de outros custos. § 1º É permitida a emissão eletrônica do TOI e a coleta eletrônica da assinatura do consumidor ou daquele que acompanhar a inspeção, devendo a distribuidora garantir a impressão no local ou o envio ao consumidor com comprovação do recebimento. § 2o Se o consumidor se recusar a receber a cópia do TOI, a distribuidora deve armazenar evidências que comprovem a recusa, inclusive, se for o caso, com prova testemunhal. § 3º Em caso de recusa do recebimento do TOI ou se não for o consumidor que acompanhar a inspeção, a distribuidora deve enviar ao consumidor em até 15 dias da emissão, por qualquer modalidade que permita a comprovação do recebimento, a cópia do TOI e demais informações dos incisos do caput. § 4º O consumidor tem 15 dias, contados a partir do recebimento do TOI, para solicitar à distribuidora a verificação ou a perícia metrológica no medidor e demais equipamentos junto ao INMETRO ou órgão metrológico delegado. § 5º As marcas de selagem que são controladas pelo INMETRO ou pelo órgão metrológico delegado não podem ser rompidas pela distribuidora enquanto dentro do prazo do § 4º ou antes da realização da verificação ou da perícia metrológica. § 6º A cópia do TOI e do conjunto de evidências utilizados para caracterização da irregularidade devem ser disponibilizadas adicionalmente no espaço reservado de atendimento pela internet. In casu, não há demonstração de que a perícia técnica tenha ocorrido, pois o procedimento adotado foi de forma unilateral, conduta que vai de encontro à normatização alhures e que viola o direito de defesa e do contraditório, pertencentes ao consumidor. Na espécie, “incumbe à concessionária do serviço público observar rigorosamente os direitos ao contraditório e à ampla defesa do consumidor na apuração do débito, já que o entendimento do STJ repele a averiguação unilateral da dívida” (REsp n. 1.412.433/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 25/4/2018, DJe de 28/9/2018.). Dessa forma, as formalidades previstas nas resoluções supracitadas, de observância obrigatória, não foram cumpridas no presente caso, o que compromete a regularidade do procedimento e invalida a cobrança efetuada. Nesse sentido, destaco a conclusão tomada em análise similar por este egrégio Tribunal. Confira-se: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. IRREGULARIDADE EM MEDIDOR DE ENERGIA ELÉTRICA. TERMO DE OCORRÊNCIA E INSPEÇÃO – TOI. DOCUMENTO UNILATERAL. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. PERÍCIA TÉCNICA INDISPENSÁVEL. MANUTENÇÃO DA ANULAÇÃO DO TOI. RECURSO DESPROVIDO. 1) Apelação interposta contra sentença que anulou Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI) lavrado unilateralmente por concessionária de energia elétrica, que alegava irregularidade no medidor de consumo. A sentença reconheceu a nulidade do TOI pela ausência de observância do contraditório e da ampla defesa, visto que a perícia técnica não foi realizada em conformidade com o art. 129 da Resolução Normativa nº 414/2010 da ANEEL, e que a concessionária não comprovou a regularidade da cobrança de débito. 2) Há duas questões em discussão: (i) definir se o TOI, elaborado unilateralmente pela concessionária, é suficiente para comprovar fraude no medidor de energia elétrica; e (ii) estabelecer se houve violação ao contraditório e à ampla defesa, conforme exigido pela Resolução Normativa nº 414/2010 da ANEEL. 3) O Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI) é considerado um documento unilateral, elaborado exclusivamente pela concessionária, e, portanto, não possui força probatória suficiente e inquestionável para comprovar fraude no medidor de energia elétrica, sendo necessária a realização de perícia técnica. 4) O art. 129 da Resolução Normativa nº 414/2010 da ANEEL impõe a realização de procedimentos específicos, como a perícia técnica e a avaliação do histórico de consumo, para a caracterização da irregularidade no medidor, além da garantia do contraditório e da ampla defesa ao consumidor. 5) No caso concreto, a concessionária não observou o direito ao contraditório e à ampla defesa, pois a avaliação técnica foi realizada sem a presença do consumidor, impossibilitando a realização de perícia em conformidade com os requisitos estabelecidos na norma regulatória. 6) A jurisprudência do STJ e deste Tribunal é pacífica no sentido de que a suspensão do fornecimento de energia elétrica, quando baseada unicamente no TOI, sem a devida comprovação por perícia técnica, é considerada ilegal, especialmente quando ocorre violação às garantias processuais do consumidor. 7) Recurso desprovido. 8) Tese de julgamento: (i) O Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI), elaborado unilateralmente pela concessionária de energia elétrica, não é suficiente para comprovar fraude no medidor de consumo, sendo indispensável a realização de perícia técnica; (ii) A violação das garantias do contraditório e da ampla defesa, conforme previsto no art. 129 da Resolução Normativa nº 414/2010 da ANEEL, acarreta a nulidade do TOI e a inexigibilidade do débito apurado. (TJES, Apelação Cível nº 5000467-39.2022.8.08.0028, Magistrado: JOSE PAULO CALMON NOGUEIRA DA GAMA, Órgão julgador: 1ª Câmara Cível, Data: 09/10/2024) EMENTA APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO. SUPOSTA FRAUDE EM MEDIDOR DE ENERGIA ELÉTRICA. TOI. INSPEÇÃO TÉCNICA NO MEDIDOR DE FORMA UNILATERAL PELA CONCESSIONÁRIA. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO NÃO OBSERVADOS. COBRANÇA INDEVIDA. RECURSO PROVIDO. 1 – A circunstância da lavratura do TOI sem a presença do consumidor, já é ato suficiente para mácula da suposta prova da fraude no medidor alegada pela Concessionária. 2 – Considerando que o TOI produzido unilateralmente não é apto a comprovar a irregularidade do medidor de energia elétrica, bem como que a perícia técnica foi realizada sem a inspeção no medidor e com base nos laudos anexados pela concessionária, a cobrança do suposto débito não se mostra legítima, razão pela qual o pedido de declaração de inexistência do débito descrito no Termo de Ocorrência de Irregularidade (TOI) - R$ 15.453,70 (quinze mil e quatrocentos e cinquenta e três reais e setenta centavos) - deve ser provido. 3 – Recurso provido. (TJES, Apelação Cível nº 0002036-73.2017.8.08.0049, Magistrado: ARTHUR JOSE NEIVA DE ALMEIDA, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Data: 01/04/2024) RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA – JUIZ É O DESTINATÁRIO FINAL DA PROVA – ART. 370 DO CPC – INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA POR AUSÊNCIA DE PROVA PERICIAL IMPERTINENTE AO CASO – INSPEÇÃO TÉCNICA REALIZADA UNILATERALMENTE PELA CONCESSIONÁRIA – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FRAUDE PELO CONSUMIDOR – RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO TÉCNICA REALIZADO EM DATA DIVERSA DA INFORMADA AO CONSUMIDOR – RECURSO DESPROVIDO. 1. Inicialmente, não há cerceamento de defesa por ausência de prova pericial, a qual constituiria, inclusive, prova impertinente ao deslinde do feito, tendo o magistrado, na condição de destinatário final da prova, concluído conforme dispõe o art. 370 do CPC. 2. No caso em exame, embora o TOI tenha sido devidamente assinado pelo consumidor, como determinado no art. 129, §§ 1º, I, 2º, da Resolução 414/2010 da ANEEL, observa-se que a inspeção técnica realizada unilateralmente pela concessionária, a partir da lavratura do Termo de Ocorrência e Inspeção, não fora suficiente para caracterizar irregularidade ou prática ilícita na conduta do consumidor, como autor da fraude, tornando ilegal o débito, oriundo do Termo de Ocorrência e Inspeção descrito nos autos. 3. Ademais, ao analisar o comunicado de substituição do medidor, verifica-se que o dispositivo foi retirado e encaminhado para o laboratório da concessionária de energia elétrica, a fim de que fosse realizada análise técnica, marcada para o dia 14.05.2019, contudo, o relatório de avaliação técnica do medidor colacionado às fls. 106, produzido pela EDP, apontando que a dita avaliação técnica foi realizada na data de 17.05.2019, isto é, em data diversa daquela que foi comunicada à parte autora que, inclusive, não acompanhou a avaliação técnica realizada unilateralmente pela apelante. 4. A suposta falha no medidor veio a ser constatada unilateralmente pela concessionária apelante, sem conferir oportunidade para que o titular responsável pela unidade consumidora pudesse contestar o resultado ou mesmo acompanhar a produção de eventual relatório de avaliação técnica. 5. Assim, por ter sido unilateralmente elaborado o laudo técnico que confere respaldo à cobrança de valores devidos a título de refaturamento, não se mostra suficientemente comprovada pela Apelante a alegada irregularidade no medidor de energia elétrica, o que tornam inexigíveis os valores por ela cobrados em sua integralidade. 6. Recurso desprovido. (TJES, Apelação Cível nº 0014955-43.2019.8.08.0011, Magistrado: SERGIO RICARDO DE SOUZA, Órgão julgador: 3ª Câmara Cível, Data: 26/02/2024) APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO ENERGIA ELÉTRICA ADULTERAÇÃO DO MEDIDOR DE CONSUMO DE ENERGIA PERÍCIA TÉCNICA APURAÇÃO UNILATERAL TOI INSUFICIENTE PARA COMPROVAÇÃO DE FRAUDE SENTENÇA MANTIDA RECURSO DESPROVIDO. […] 2. Para que a conduta da concessionária requerida estivesse revestida de legalidade, deveria ter adotado todas as providências necessárias para que o usuário acompanhasse a verificação da suposta fraude no medidor de energia elétrica, o que, in casu, não restou demonstrado. (TJES, Classe: Apelação Cível, 032190014426, Relator : TELEMACO ANTUNES DE ABREU FILHO, Órgão julgador: TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 19/04/2022, Data da Publicação no Diário: 06/05/2022). O Juízo de origem, com acerto, reconheceu a nulidade do débito baseado em prova unilateral e fixou indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00, valor que se mostra razoável e proporcional à gravidade da ofensa, diante da indevida interrupção do fornecimento de serviço essencial e da cobrança ilegítima. Anoto, ainda, que a referida importância fixada a título de indenização não destoa daqueles fixados por este Sodalício em casos análogos. A propósito: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. ENERGIA ELÉTRICA. SUPOSTA FRAUDE NA UNIDADE MEDIDORA. APURAÇÃO UNILATERAL. TERMO DE OCORRÊNCIA E INSPEÇÃO (TOI). IRREGULARIDADE CONSTATADA. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA. DANO MORAL VERIFICADO. APELO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO E DA PARTE RÉ IMPROVIDO. I- Embora avessa a qualquer espécie de locupletamento ilícito, o ordenamento pátrio exige que o procedimento empregado pela concessionária na apuração de irregularidades observe o contraditório e a ampla defesa, o qual, aqui, não foi respeitado, haja vista a atuação unilateral da demandada. II- A Resolução ANEEL nº 414/2010, no escopo de afastar a unilateralidade na apuração de eventual irregularidade, estabelece como uma das etapas do procedimento a solicitação de perícia técnica, exigência inarredável em tais casos para a composição de um sólido conjunto de evidências da fraude na medição, conforme art. 129, incs. II e III. III- A inspeção técnica realizada unilateralmente pela concessionária não é suficiente para caracterizar a fraude alegada pela parte Requerida, isto porque se torna necessária a realização de perícia no equipamento de medição de energia elétrica com o respeito dos pressupostos da ampla defesa e do contraditório. IV- Verificada a irregularidade do Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI) nº 3377272/2018 e, consequentemente, a impossibilidade de aplicação de penalidades contra o Apelado com base especificamente naquele procedimento, bem como a suspensão do fornecimento de energia prevista no art. 6º, §3º, inciso II, da Lei Federal nº 8.987/95 e art. 172, inciso I da Resolução da ANEEL nº 414/2010, deve ser mantida a sentença de origem quanto a inexistência do débito apontado no TOI. V- Restando caracterizada a irregularidade no procedimento adotado pela EDP, deve-se considerar que o dano moral no presente caso operou-se in re ipsa, em função da própria ilicitude do ato praticado. Diante de tais argumentos, considera-se cabível a indenização por danos morais pleiteada, sendo o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) razoável e proporcional a hipótese, impingindo seu caráter pedagógico, além de compensar o apelado pelo dano suportado. VI - Reconhecida a irregularidade no TOI, a energia do cliente deve ser religada caso não existam outros débitos pendentes. VII - Recurso de apelação da parte requerida improvido e apelo do autor parcialmente provido. (TJES – Apelação nº 0006475-46.2019.8.08.0021, Relatora: Desa. DEBORA MARIA AMBOS CORREA DA SILVA, Órgão Julgador: 3ª Câmara Cível, Data de Julgamento: 19/09/2023). (não possui grifo no original) Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. RECUPERAÇÃO DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. PROVA UNILATERAL. AUSÊNCIA DE CIÊNCIA E PARTICIPAÇÃO DO CONSUMIDOR. NULIDADE DO DÉBITO APURADO. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. MANUTENÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por EDP ESPÍRITO SANTO DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA S.A. contra sentença que julgou procedentes os pedidos de SILVANO CARCABINI RODRIGUES, para declarar a inexistência de débito no valor de R$6.896,17 e condenar a apelante ao pagamento de R$5.000,00 a título de danos morais, decorrentes de suposta fraude no medidor de energia e interrupção do serviço. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão central consiste em determinar a regularidade do procedimento de apuração de fraude no medidor de energia e a validade da cobrança unilateral do débito, além de analisar a legitimidade da suspensão do fornecimento de energia e a caracterização dos danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR Aplicação do Código de Defesa do Consumidor: A relação entre a concessionária de energia e o consumidor é regida pelo CDC, conforme jurisprudência consolidada pelo STJ, devendo ser observados os direitos de contraditório e ampla defesa na apuração de supostas fraudes no medidor de energia elétrica. Procedimento de Apuração Unilateral: Verifica-se dos autos que a apuração da suposta fraude foi realizada unilateralmente pela apelante, sem participação efetiva do consumidor, em afronta às disposições da Resolução nº 414/2010 da ANEEL, que exige a comunicação ao consumidor sobre a avaliação técnica do medidor com antecedência mínima de 10 (dez) dias, o que não foi comprovado nos autos. Assim, o débito apurado de forma unilateral é inexigível. Suspensão do Fornecimento de Energia: A jurisprudência do STJ veda a suspensão do fornecimento de energia elétrica quando o débito decorre de recuperação de consumo apurado unilateralmente pela concessionária. A interrupção do serviço somente seria válida se o débito fosse apurado com o devido contraditório e ampla defesa, o que não ocorreu no presente caso. Danos Morais: A interrupção indevida do fornecimento de energia elétrica, configurando falha na prestação de serviço público essencial, enseja a reparação por danos morais, configurados in re ipsa, ou seja, presumidos pela simples ocorrência da lesão ao direito do consumidor, não sendo necessária a demonstração de prejuízo concreto. O valor fixado em R$5.000,00 atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Mantida a sentença que declarou a inexistência do débito e condenou a apelante ao pagamento de danos morais no valor de R$5.000,00. Tese de julgamento: A cobrança de débito decorrente de recuperação de consumo de energia elétrica, apurado unilateralmente pela concessionária sem observância ao contraditório e à ampla defesa, é nula e inexigível. A suspensão do fornecimento de energia em razão de débito apurado unilateralmente é ilegal e enseja a reparação por danos morais in re ipsa. O valor de R$5.000,00 fixado a título de danos morais mostra-se adequado aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Dispositivos relevantes citados: Resolução ANEEL nº 414/2010, art. 129, §§ 6º e 7º; CDC, arts. 6º e 42; CC, art. 186; STJ, REsp nº 1412433/RS. (TJES, Apelação Cível nº 5000722-31.2022.8.08.0049, Magistrado: FABIO BRASIL NERY, Órgão Julgador: 2ª Câmara Cível, Data de Julgamento: 28/11/2024) Nesse contexto, não há como se acolher a pretensão recursal da concessionária, devendo ser preservada a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos, conforme preconiza o art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Diante de todo o exposto, e com a devida vênia ao ilustre Relator, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pela EDP – Espírito Santo Distribuição de Energia S/A, mantendo-se integralmente a r. sentença proferida, por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do artigo 487, I, do CPC. É como voto. VOTO DO RELATOR Des. Fernando Bravin Ruy Conforme relatado, cuida-se de recurso de apelação interposto por EDP ESPÍRITO SANTO DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA S.A. contra a r. sentença (evento 12286930) proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível de Cariacica, Comarca da Capital, que, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito, movida por ELISÂNGELA FREIRE DE ALMEIDA, julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Em suas razões recursais, apresentadas no evento 12286931, a apelante sustenta, em suma, que: (I) “o procedimento realizado pela EDP se deu à luz da Resolução Normativa 1.000/2021 da ANEEL, de maneira que a sua validade é indubitável, porquanto trata-se de ato completamente vinculado a lei, conforme comprova o arcabouço documental juntado com a contestação, não havendo que se falar em unilateralidade no agir da EDP”; (II) “em momento algum a EDP imputou ao Apelado a execução da irregularidade, no entanto, tal irregularidade provocou queda visível no consumo da instalação e cabe à EDP, conforme descrito no art. 591 da Resolução 1.000/2021 da ANEEL, apurar as diferenças entre os valores consumidos e não apurados devido à irregularidade e, assim, proceder com a recuperação de receita”; (III) “todo o procedimento adotado pela EDP é completamente isento e, longe de ser abusivo, contempla a participação do usuário em todas as suas etapas, sem guardar qualquer traço de arbitrariedade”; (IV) “resta comprovada a total ausência de qualquer irregularidade na suspensão do fornecimento de usuário que deixe de efetuar o pagamento de fatura de energia elétrica, mesmo que derivada de recuperação de consumo por irregularidade no medidor”; (V) “não foi demonstrado qualquer fato capaz de gerar danos morais no presente caso”. Desse modo, requer que o recurso seja conhecido e provido reformar a sentença, no sentido de reconhecer a improcedência da pretensão autoral. Subsidiariamente, pleiteia a redução do montante fixado a título de danos morais. É assente na jurisprudência do Tribunal da Cidadania e desta egrégia Corte que as normas consumeristas regem as relações existentes entre as concessionárias de energia elétrica e os usuários finais deste serviço público essencial, vide os seguintes julgados: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. ENQUADRAMENTO DE EMPRESA COMO CONSUMIDORA FINAL DO SERVIÇO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REVISÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a relação entre concessionária de serviço público e o usuário final para o fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como energia elétrica, é consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. […] 6. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1061219/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe 25/08/2017). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADE NO CONSUMO APRESENTADO PELO MEDIDOR. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE MÁ-FÉ DO CONSUMIDOR. ILEGALIDADE NAS COBRANÇAS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. A relação jurídica existente entre as partes é tida como relação de consumo, portanto, imperioso o reconhecimento da aplicação das normas estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor (CDC). 2. Constatado defeito no medidor de energia elétrica e, sendo desconhecida a causa, a cobrança do custo administrativo é indevida já que não evidenciada a má-fé do consumidor. 3. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJES, Classe: Apelação, 064170032961, Relator: ARTHUR JOSÉ NEIVA DE ALMEIDA, Órgão julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 07/10/2019, Data da Publicação no Diário: 17/10/2019). Ao compulsar os autos, percebe-se que o termo de ocorrência e inspeção (TOI) de nº 3464196 (fl. 71), lavrado no dia 23/05/2019, detectou fraude no medidor de titularidade da apelada, pois a unidade consumidora não estava sendo devidamente registrada, uma vez que estava ligada diretamente à rede elétrica da concessionária requerida, sem medição. Segundo os técnicos da concessionária apelante, foi constatada que a instalação encontrava-se “interligada diretamente a rede de distribuição a revelia desta concessionária e sem medição de consumo, fazendo com que a energia consumida não seja registrada no faturamento”. Conforme defendi em diversas ocasiões1, as informações contidas no TOI gozam de presunção de legalidade, sendo que não é razoável e proporcional que os fiscais da EDP devam permanecer no local da vistoria aguardando a chegada do usuário do serviço, porque a assinatura do responsável pelo medidor de energia não é um requisito de validade do TOI. Veja-se que foi constatado que a instalação deixou de registrar corretamente o consumo de energia, e efetuado o cálculo de consumo irregular, conforme normatização regente (considerando a média dos três maiores valores disponíveis de consumo mensal de energia elétrica ocorridos em até 12 ciclos completos de medição regular imediatamente anteriores ao início da irregularidade, proporcionalizados em 30 dias), apurando-se, no período também permitido pela normatização regente, de 26/05/2018 a 23/05/2019, o montante de R$ 5.787,35 (cinco mil, setecentos e oitenta e sete reais e trinta e cinco centavos), cujo documento assegura o contraditório ao consumidor (fls. 68/69-v). Observa-se que constam dos autos, ainda, os registros fotográficos feitos pelos técnicos da apelante (fls. 75/78), que denotam o estado em que se encontrava a instalação da consumidora, interligada diretamente na rede de distribuição. Ademais, o histórico juntado aos autos (fl. 74-v) evidencia claramente o degrau de consumo. Nesse contexto, inexiste mácula no procedimento adotado pela concessionária, de forma que regular e válida a forma de constatação da fraude na instalação. Não obstante o douto julgador de origem ter entendido que a parte requerida, ora apelante, não comprovou a existência suposta irregularidade, a qual deveria ter sido aferida por perícia técnica, entendo que a fraude está devidamente demonstrada pela descrição do TOI, e, sobretudo, pelas fotografias e pelo degrau de consumo claramente identificado após a regularização da unidade, cuja medição de consumo ficou comprometida pelos danos causados por intervenção de terceiros. Como sabido, o consumidor é responsável pelos danos causados aos equipamentos de medição ou ao sistema elétrico da distribuidora, decorrentes de qualquer procedimento irregular ou deficiência técnica de sua unidade (Art. 167, inciso III, da Resolução nº 414/2010 da ANEEL, vigente à época). Desse modo, inexistia óbice para que a apelante procedesse aos métodos legais de cobrança, inclusive com notificação de interrupção do fornecimento de energia elétrica, porquanto foram preenchidos os pressupostos da tese repetitiva do REsp 1.412.433/RS2. A orientação ora adotada encontra respaldo na jurisprudência desta egrégia Corte de Justiça, conforme arestos abaixo colacionados: EMENTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. DEFEITO NO MEDIDOR. COMPROVAÇÃO. VALORES COBRADOS. DEVIDOS. RECURSO PROVIDO. 1. Considerando que o procedimento administrativo seguiu os parâmetros previstos na então vigente Resolução Normativa n.º 414/2010, da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, inclusive no tocante ao estabelecimento do contraditório, não sendo identificada qualquer pecha capaz de infirmar a conclusão acerca da irregularidade do medidor, deve ser afastada a alegação de falha na prestação do serviço. 2. Recurso provido. (Data: 13/Nov/2023, Órgão julgador: 2ª Câmara Cível, Número: 0006279-09.2019.8.08.0011, Desembargador SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR, Classe: APELAÇÃO CÍVEL) CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C PERDAS E DANOS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. RELAÇÃO DE CONSUMO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DEFEITO NO MEDIDOR. COMPROVAÇÃO. VALORES COBRADOS. DEVIDOS. DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. RECURSO PROVIDO. 1. A relação entre concessionária de serviço público e o usuário final, para o fornecimento de serviços públicos essenciais, como água e energia, é consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Precedente do c. STJ. 2. Considerando que o procedimento administrativo seguiu os parâmetros previstos na então vigente Resolução Normativa n.º 414/2010, da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, inclusive no tocante ao estabelecimento do contraditório, não sendo identificada qualquer pecha capaz de infirmar a conclusão acerca da irregularidade do medidor, deve ser afastada a alegação de falha na prestação do serviço. 3. Não estando configurado o ato ilícito da concessionária de serviço público, inviável o pagamento da indenização por danos morais. Em contrapartida, torna-se possível a cobrança dos valores a título de refaturamento. 4. Recurso provido. (Data: 13/Mar/2023, Órgão julgador: 2ª Câmara Cível, Número: 5001931-56.2021.8.08.0021, Desembargador Substituto RODRIGO FERREIRA MIRANDA, Classe: APELAÇÃO CÍVEL). Pelo exposto, CONHEÇO do recurso de apelação e, no mérito, DOU-LHE PROVIMENTO para reformar a sentença, no sentido de JULGAR INTEGRALMENTE IMPROCEDENTES os pleitos autorais e resolver o mérito da lide na forma do artigo 487, inciso I, do CPC. Ato seguinte, inverto o ônus sucumbencial e condeno a apelada/requerente ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (art. 85, §2º, do CPC), dada a baixa complexidade da demanda. Por fim, suspendo a exigibilidade da cobrança das verbas sucumbenciais (art. 98, §3º, do CPC), já que a autora milita amparada pela gratuidade de justiça. É como voto. 1TJES, Classe: Apelação, 011180038512, Relator: FERNANDO ESTEVAM BRAVIN RUY, Órgão julgador: SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 27/08/2019, Data da Publicação no Diário: 10/10/2019. 2 REsp 1412433/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/04/2018, DJe 28/09/2018. _________________________________________________________________________________________________________________________________ VOTOS VOGAIS 023 - Gabinete Desª. MARIANNE JUDICE DE MATTOS - ALDARY NUNES JUNIOR (Vogal) Proferir voto escrito divergente 025 - Gabinete Des. SÉRGIO RICARDO DE SOUZA - SERGIO RICARDO DE SOUZA (Vogal) Proferir voto para acompanhar divergência 027 - Gabinete Desª. DEBORA MARIA AMBOS CORREA DA SILVA - DEBORA MARIA AMBOS CORREA DA SILVA (Vogal) Proferir voto escrito divergente 005 - Gabinete Des. CARLOS SIMÕES FONSECA - CARLOS SIMOES FONSECA (Vogal) Proferir voto escrito para acompanhar divergência
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