Flavia Pereira Costa e outros x Vale S.A.
ID: 324834994
Tribunal: TRT3
Órgão: 1ª Vara do Trabalho de Ouro Preto
Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO
Nº Processo: 0010671-60.2023.5.03.0069
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Passivo:
Advogados:
CLISSIA PENA ALVES DE CARVALHO
OAB/MG XXXXXX
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BRAULIO DE ALMEIDA PEREIRA PAIVA
OAB/MG XXXXXX
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JOHNNY RAPHAEL GONCALVES CARVALHO
OAB/MG XXXXXX
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MARJORIE ALVES TAVARES DE SOUZA
OAB/MG XXXXXX
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MARJARA ALVES TAVARES DE SOUZA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 1ª VARA DO TRABALHO DE OURO PRETO ATOrd 0010671-60.2023.5.03.0069 AUTOR: JOSEILTON SANTOS RÉU: VALE S.A. INTIMAÇ…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 1ª VARA DO TRABALHO DE OURO PRETO ATOrd 0010671-60.2023.5.03.0069 AUTOR: JOSEILTON SANTOS RÉU: VALE S.A. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 46b524a proferida nos autos. SENTENÇA RELATÓRIO JOSEILTON SANTOS, qualificado na inicial, ajuíza, em 30/06/2023, ação trabalhista, pelo rito ordinário, em face de VALE S.A., qualificada na inicial. Pelas razões de fato e de direito que apresenta, requer a condenação da reclamada ao cumprimento das obrigações indicadas no rol de pedidos e atribui à causa o valor de R$ 350.625,42 (fls. 2/77). A reclamada defende-se por meio de contestação, suscitando prejudicial de mérito de prescrição quinquenal, e impugnando articuladamente todos os pedidos formulados pelo autor na peça vestibular. Pede a improcedência da ação (fls. 430/494). O reclamante manifestou-se quanto à defesa e aos documentos que a acompanharam (fls. 1025/1102). As partes juntaram documentos, foram realizadas perícias, foram ouvidas as partes e foi ouvida uma testemunha, encerrando-se a instrução. As razões finais foram remissivas. As tentativas de conciliação foram oportunamente externadas, revelando-se inexitosas. Os autos vieram conclusos para sentença. FUNDAMENTAÇÃO 1. Direito Intertemporal In casu o contrato de trabalho teve início anterior e vigência posterior à Lei nº 13.467/17, que introduziu significativas alterações na legislação trabalhista e em especial na CLT. Mostra-se necessário assim o estabelecimento de premissas prévias acerca do direito intertemporal para fins de análise das pretensões deduzidas na presente demanda. Quanto às alterações de direito material, aplicam-se aos contratos vigentes em 11/11/2017. Vale destacar que nesse sentido recentemente o TST fixou a tese de que “A Lei nº 13.467/2017 possui aplicação imediata aos contratos de trabalho em curso, passando a regular os direitos decorrentes de lei cujos fatos geradores tenham se efetivado a partir de sua vigência". (TST-IncJulgRREmbRep - 528-80.2018.5.14.0004). Trata-se de precedente vinculante e que deve ser necessariamente observado (art. 927, V, do CPC/15). Quanto às alterações de direito processual, e tendo em vista que a presente reclamação trabalhista foi ajuizada após a Lei nº 13.467/17, são plenamente aplicáveis in casu por força do art. 14 do CPC/15, segundo o qual “a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada”. 2. Prescrição A Constituição da República, em seu artigo 7º, inciso XXIX, estabelece que os créditos trabalhistas prescrevem em cinco anos, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho. Já o artigo 3º da Lei nº 14.010/20 suspendeu o curso dos prazos prescricionais pelo período de 141 dias e, no entendimento deste Magistrado, tal disposição se mostra plenamente aplicável à seara laboral. In casu a parte reclamante foi admitida 09/06/2011, o desligamento ocorreu em 01/12/2021 e a reclamação trabalhista foi ajuizada em 30/06/2023. A priori tal conduz ao reconhecimento da prescrição das parcelas anteriores a 30/06/2018 que, com acréscimo dos 141 dias decorrentes do artigo 3º da Lei nº 14.010/20, culmina na fixação do marco prescricional como sendo 09/02/2018. Por oportuno e visando prevenir a indevida oposição de embargos de declaração, ressalto que no entendimento deste Magistrado a aplicação da Lei nº 14.010/20 pode se dar ex officio a partir do momento em que suscitada a prescrição pela parte reclamada - uma vez que cabe às partes apresentarem os fatos e ao juiz aplicar o direito. Diante do exposto, concluo que estão cobertas pela prescrição as pretensões anteriores a 09/02/2018 e, relativamente a elas, extingo o processo com resolução do mérito, na forma do artigo 487, inciso II, do CPC. 3. Doença Ocupacional - Reintegração - Indenizações por Danos Materiais e Morais O reclamante sustenta que suas atividades de manutenção mecânica em setores de barragem, usina e mina em geral demandavam “alto desgaste físico e elevada pressão psicológica” e “esforços elevados sem adoção de meios e práticas que pudessem reduzir os danos a sua saúde, à medida que precisava cumprir longas jornadas de trabalho exposto a variados riscos”. Prossegue referindo que “ao movimentar carros de grelha sentiu lesão em seu joelho direito, em meados de 2015”, afastou-se das atividades, iniciou tratamento médico até realizar artroscopia em outubro de 2015 para corrigir tal enfermidade, e permaneceu afastado “por longo período passando por lenta recuperação, com sessões de fisioterapia e tratamentos convencionais que possibilitaram seu retorno ao labor habitual, malgrado ainda sentisse fortes dores na área lesionada”. Menciona que “precisou reassumir as mesmas funções que executava outrora” e com a “necessidade de preservar o joelho direito (recém operado) precisou direcionar a maior quantidade de esforços para a outra perna, vindo a sofrer então a mesma lesão no joelho esquerdo, em meados de 2017”. Diz que submeteu-se a operação em outubro de 2017 e após recuperar-se retornou às atividades com orientação de que deveria “evitar exercícios intensos e de agachamento sobre os joelhos, além de manter fisioterapia e colágeno”. Diz que “recebeu ordens para atuar em manutenção de máquinas e equipamentos” e voltou a ficar exposto a condições ergonomicamente inadequadas, vindo a “ser vítima de nova lesão no joelho esquerdo, com comprometimento do menisco e necessidade de nova artroscopia” - a qual foi realizada em agosto de 2018. Resumidamente, assevera que teve 3 (três) lesões nos joelhos e que jamais conseguiu recuperar sua capacidade para o trabalho. Mais adiante refere que “ainda veio a sofrer adoecimento na coluna lombar (lombalgia aguda em L4-L5 e L5-S1)” e que não se submeteu a cirurgia por determinação do ortopedista em razão dos riscos envolvidos. Refere assim que “seguiu em tratamentos médicos com consultas frequentes ao ortopedista, realização de infindáveis sessões de fisioterapia e, por fim, consumo de medicamentos e tratamentos alternativos para tentar reduzir as severas crises de dor”. Diz que embora não estivesse apto para o trabalho foi despedido sem justa causa, asseverando que “desde o desligamento da ré (...) segue em severos tratamentos destinados a combater seu quadro de lesões ortopédicas que ainda teve agravamento com transtornos depressivos que surgiram com a perda do emprego e a cessação de seu plano de saúde, tão logo concluído o período de aviso prévio indenizado”. Com base nesse relato, postula a reintegração no emprego, asseguradas todas as vantagens do período de afastamento - inclusive restabelecimento do plano de saúde, pagamento de auxílio/cartão alimentação; indenizações por danos materiais (pensão mensal vitalícia e lucros cessantes) e moral (itens “H”, “I”, “T”, “U”, “V”, “W” e “X”). Pede, ademais, a condenação da reclamada à emissão da CAT (item “S” do rol de pedidos). A reclamada impugna as alegações de fato do reclamante, basicamente negando que entre as patologias que lhe acometeram ao longo do período contratual e suas atividades em prol da Vale S.A. haja qualquer nexo causal ou concausal e referindo os exames denotam moléstias que possuem origens genéticas, degenerativas e causas como obesidade, instabilidade articular e traumas. Com base nesse relato e asseverando por cautela que cumpre integralmente todas as normas regulamentares de saúde e segurança do trabalho, pede a improcedência do pedido. Analiso. 3.1. Doença Ocupacional e Responsabilidade Civil do Empregador O acidente do trabalho e a doença ocupacional são aquelas que decorrem do trabalho prestado pelo empregado ao empregador e que causem perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade do trabalho (art. 19 c/c art. 20, incisos I e II, da Lei nº 8.213/91), bem como aquelas em que, ainda que o trabalho não tenha sido a única causa, contribuiu diretamente para a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade laborativa (art. 21, inciso I, da Lei nº 8.213/91). A responsabilidade civil do empregador em casos de acidente do trabalho ou doença ocupacional a ele equiparada está prevista na Constituição da República, cujo artigo 7º, inciso XXVIII, garante aos trabalhadores “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa”. In casu a parte reclamante sustenta que há quatro moléstias que lhe acometeram ao longo do período contratual e no período subsequente e que caracterizam-se como doenças ocupacionais, quais sejam: (i) problemas nos joelhos direito e esquerdo; (ii) problemas na coluna vertebral; e (iii) transtornos depressivos que teria surgido em razão da perda do emprego e da cessação do plano de saúde que era mantido por força do contrato de trabalho com a reclamada. Com base nas alegações de fato de inicial e defesa, análise dos exames médicos e demais documentos juntados aos autos, análise da perícia ergonômica que foi realizada na sede da reclamada, entrevista com o reclamante e exame clínico realizado por ocasião da inspeção, a Sra. Perita Médica concluiu o seguinte a respeito do quadro clínico do reclamante: a) quanto aos problemas nos joelhos esquerdo e direito, o reclamante apresenta quadro de dor crônica intermitente e foi diagnosticado com “condropatia patelar bilateral”; tais moléstias possuem causas constitucionais e degenerativas, não havendo nexo de causalidade ou concausalidade com o aparecimento e/ou agravamento e as atividades desempenhadas em prol da demandada; atualmente não há incapacidade para o trabalho em razão de tais moléstias; b) quanto ao problema na coluna vertebral, o reclamante apresenta quadro de dor crônica intermitente na coluna vertebral lombossacra, tendo havido diagnósticos específicos indicando abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1; tais problemas são multifatoriais, mas em atenção aos elementos disponíveis nos autos a Expert assentou que há nexo de concausalidade entre eles e as atividades desempenhadas pelo reclamante; não há incapacidade laborativa, sendo que inclusive o reclamante encontra-se atualmente com contrato de trabalho ativo; e c) quanto aos transtornos depressivos que supostamente teriam ocorrido após a ruptura do contrato de trabalho, não há qualquer menção a respeito no laudo pericial médico (fls. 2169/2229). A parte reclamante impugnou o laudo pericial médico e formulou quesitos complementares (fls. 2232/2234). A parte reclamada impugnou o laudo pericial médico, apresentou parecer de assistente técnico e formulou quesitos complementares (fls. 2235/2263 e 2296/2298). A Sra. Perita Médica respondeu os quesitos complementares formulados pelas partes, ratificando in totum suas conclusões anteriores (fls. 2279/2291). Estabelecidas essas premissas, passo a examinar se no caso destes autos estão dados os pressupostos necessários ao reconhecimento da doença ocupacional e da responsabilidade civil do empregador. 3.1.1. Dano In casu avalio que os elementos de convicção reunidos nos autos permitem concluir parcialmente quanto aos danos alegados na peça vestibular, uma vez que o laudo pericial médico é peremptório nos diagnósticos quanto aos problemas nos joelhos esquerdo e direito do reclamante (condropatia patelar bilateral) e na coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1). Gizo que nada há nos autos capaz de afastar tais diagnósticos, os quais a rigor sequer foram impugnados. Em contrapartida não estão evidenciados os transtornos depressivos sugeridos pelo reclamante na peça vestibular. É importante ressaltar que o reclamante até juntou aos autos com a peça vestibular alguns documentos indicando problemas de sono e estresse pessoal (fl. 163, por exemplo), mas a rigor não houve qualquer diagnóstico a respeito de tais sintomas e a Expert Médica tampouco fez qualquer referência a eles no laudo pericial médico. E saliento que nesse ponto não houve qualquer irresignação do reclamante quanto ao estudo técnico. Concluo assim que a parte reclamante comprovou os problemas nos joelhos esquerdo e direito (condropatia patelar bilateral) e na coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1), mas não os transtornos depressivos referidos na peça vestibular. 3.1.2. Nexo Causal ou Concausal Registro ab initio que tendo sido comprovados exclusivamente os problemas nos joelhos esquerdo e direito (condropatia patelar bilateral) e coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1), mas não os transtornos depressivos referidos na peça vestibular, prossegue-se na análise dos pressupostos da responsabilidade civil exclusivamente quanto àquelas em razão da prejudicialidade. Gizo que a Sra. Perita Médica não estabeleceu nexo causal ou concausal entre as patologias nos joelhos do reclamante (condropatia patelar bilateral) e as atividades desempenhadas pelo obreiro em prol da reclamada. Muito embora a parte autora tenha impugnado o laudo pericial médico nesse particular (fls. 2232/2234), cabia-lhe o ônus da prova técnica capaz de afastar as conclusões da Expert Médica (art. 818, I, da CLT) - encargo processual do qual não se desincumbiu. Em contrapartida, a Sra. Perita Médica estabeleceu nexo concausal entre os problemas na coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1) e as atividades exercidas pelo reclamante em prol da reclamada. Muito embora a parte reclamada tenha impugnado o laudo pericial médico nesse particular (fls. 2235/2263 e 2296/2298), avalio que não há in casu elementos de prova suficientes capazes de afastar tal enquadramento. É preciso destacar que in casu houve análise ergonômica do ambiente de trabalho e das atividades do reclamante, e que a Sra. Perita Engenheira concluiu que as atividades desempenhadas pelo reclamante como Mecânico eram de risco ergonômico elevado - o qual foi atenuado apenas quando o reclamante foi transferido para exercer a função de Ferramenteiro (fl. 1375). É certo que houve impugnação à conclusão da Sra. Perita Engenheira nesse ponto (fls. 1395/1402), mas não vieram aos autos quaisquer elementos técnicos capazes de infirmá-la e ônus da prova nesse particular cabia à reclamada (art. 818, II, da CLT). Mero consectário lógico da conclusão de que as atividades desempenhadas do reclamante enquanto Mecânico envolviam risco ergonômico elevado, não há espaço para que se acolha o laudo da assistente técnica da reclamada (fls. 2238/2263). Concluo assim que a parte reclamante logrou comprovar o nexo concausal entre os problemas de coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1) e as atividades desempenhadas em prol da reclamada, mas não no que diz respeito aos problemas nos joelhos esquerdo e direito (condropatia patelar bilateral). 3.1.3. Culpa Repiso ab initio que não houve comprovação dos transtornos depressivos referidos na peça vestibular, bem como que não ficou estabelecido nexo causal ou concausal entre os problemas nos joelhos esquerdo e direito (condropatia patelar bilateral) e as atividades do reclamante em prol da reclamada - o que afasta sua caracterização como doença ocupacional. Sob tal compasso, prossegue-se na análise dos pressupostos da responsabilidade civil exclusivamente quanto aos problemas de coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1). E quanto à culpa da reclamada no surgimento e/ou agravamento dos problemas de coluna vertebral apresentados pelo reclamante, tenho que está devidamente caracterizada. Gizo que a perícia ergonômica considerou que havia riscos ergonômicos associados especialmente à função de mecânico exercida pelo reclamante ao longo da maior parte do período contratual e no período em que surgiram as primeiras manifestações dessa moléstia (fl. 1375). Os atestados de saúde ocupacional do obreiro mostram de forma clara que tais riscos ergonômicos foram marginalizados pela empregadora, pois não constam mencionados no preenchimento Riscos Ocupacionais da Atividade (fls. 609/634). Tal circunstância é bastante para concluir que houve negligência da empregadora com a saúde ocupacional do reclamante, caracterizando-se assim o elemento culpa para fins de responsabilidade civil. Diante do exposto, concluo que estão preenchidos os pressupostos necessários tanto para caracterização dos problemas na coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1) como doença ocupacional na forma da Lei nº 8.213/91, quanto para a caracterização da responsabilidade civil do empregador na forma do art. 7º, inciso XXVIII, da Constituição da República. Passo assim ao exame das demais pretensões deduzidas na peça vestibular e que possuem lastro na alegada doença ocupacional e/ou na responsabilidade civil do empregador. 3.2. Reintegração no Emprego - Demais Pedidos Correlatos Registro que o artigo 7º, inciso I, da CRFB/88, consagra a “relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”. Há consenso em doutrina e jurisprudência quanto à existência de direito potestativo do empregador quanto à resilição do contrato de trabalho do empregado em razão de não ter sido editada à altura tal lei complementar. Porém, é certo que não se trata de direito absoluto e que deve ser interpretado em consonância com as demais previsões contidas no ordenamento jurídico pátrio. É incontroverso que o reclamante foi despedido sem justa causa em 01/12/2021, cingindo-se a controvérsia posta nestes autos a perquirir se à altura havia algum fato juridicamente relevante e obstativo ao desligamento ou se houve despedida discriminatória. De fato, in casu a parte reclamante lastreia o pedido de nulidade da despedida e reintegração no emprego nos argumentos de que à época do desligamento se encontrava incapacitado para o trabalho; de que em razão da doença ocupacional estaria ao abrigo do art. 118 da Lei nº 8.213/91; e de que houve despedida discriminatória em razão de estar acometido de problemas de saúde. Tomando-se tais alegações de fato em perspectiva abstrata, tenho que realmente não há espaço para que o trabalhador seja despedido sem justa causa pelo empregador quanto acometido de problemas de saúde que lhe incapacitem para o desempenho de suas atividades. Especialmente porque em tais casos o empregado possui direito ao gozo de auxílio por incapacidade temporária (art. 60 da Lei nº 8.213/91) e o contrato de trabalho deve ser considerado suspenso (art. 476 da CLT), devendo o empregador encaminhá-lo à autarquia previdenciária para gozo do benefício previdenciário correspondente e não subitamente despedi-lo sem justa causa. Prosseguindo e ainda tomando em abstrato as alegações de fato da peça vestibular, o art. 118 da Lei nº 8.213/91 prevê que o segurado que tenha sofrido acidente de trabalho possui estabilidade provisória no emprego pelo prazo mínimo de 12 (doze) meses a contar da alta previdenciária. E nesse particular recentemente o TST editou o Tema 125 dos IRRs indicando que “para fins de garantia provisória de emprego prevista no artigo 118 da Lei nº 8.213/1991, não é necessário o afastamento por período superior a 15 (quinze) dias ou a percepção de auxílio-doença acidentário, desde que reconhecido, após a cessação do contrato de trabalho, o nexo causal ou concausal entre a doença ocupacional e as atividades desempenhadas no curso da relação de emprego”. Por fim e repisando que à altura se analisam os pressupostos de direito à luz das alegações de fato tecidas na peça vestibular, a Lei nº 9.029/95 prevê no artigo 1º que é “proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII do artigo 7º da Constituição Federal”. E o art. 4º faculta ao empregado em casos de resilição do contrato de trabalho por ato discriminatório do empregador optar ou pela reintegração ao emprego com ressarcimento integral do período de afastamento, ou pela percepção em dobro da remuneração do período de afastamento. In casu não há qualquer elemento de prova que permita concluir que o reclamante estava incapacitado à época do desligamento, o que afasta a aplicação dos arts. 60 da Lei nº 8.213/91 c/c art. 476 da CLT. Verifico que o último relatório médico que junta o autor com a peça vestibular é de fevereiro de 2021, quase 9 (nove) meses antes da ruptura do contrato de trabalho (fl. 166); que o ASO Demissional do reclamante considerou-o apto para a função que vinha exercendo (fls. 1769/1773); que ao prestar informações à Expert Médica por ocasião da inspeção referiu que não teve quaisquer limitações para atividades laborativas após a saída da reclamada (fl. 2174); que após a saída da reclamada não teve mais qualquer afastamento previdenciário (fl. 2174); e que após a saída da reclamada inclusive obteve novo emprego aproximadamente 7 (sete) meses (fl. 2174). Tampouco há espaço para que se reconheça qualquer descumprimento do art. 118 da Lei nº 8.213/91 em razão da doença ocupacional reconhecida na forma do item 3.1 destes fundamentos. Muito embora a priori poder-se-ia cogitar da aplicação do Tema 125 dos IRRs do TST ao caso dos autos, avalio que são vários os elementos de prova que permitem a realização do distinguishing para concluir quanto à ausência de inobservância do art. 118 da Lei nº 8.213/91 por parte da reclamada. Primeiro, é preciso considerar que a perícia médica foi realizada em 29 de outubro de 2024 e quase 3 (três) anos após o desligamento do reclamante dos quadros da reclamada (fl. 2170). E que a Expert foi categórica no sentido de que os problemas na coluna vertebral não incapacitam o reclamante para o trabalho, tanto que após o desligamento e a fruição do benefício do seguro-desemprego o reclamante conseguiu se recolocar com relativa rapidez no mercado de trabalho. Verifico que constam documentalmente comprovados vínculos de emprego com a M S Manutenção Ltda, de 14/07/2022 a 28/07/2023; com a Rivelli Alimentos S/A, de 18/12/2023 a 16/03/2024; e por fim com a CBSI - Companhia Brasileira de Serviços de Infraestrutura, entre 07/05/2024 e 04/08/2024, e por fim com a Vordex Serviços Ltda, a partir de 14/08/2024 (fls. 1594/1596). E repiso que ao prestar informações à Sra. Perita Médica o reclamante referiu que inexistiram quaisquer limitações após seu desligamento dos quadros da reclamada. Segundo, conforme informações dadas pelo autor em inspeção, suas dores na coluna vertebral iniciaram quando ele tinha entre 43 a 45 anos de idade - ou seja, entre os anos de 2015 e 2017 se considerado que ele é nascido em 1972 (fl. 2190). E que o último quadro álgico oriundo desses problemas na coluna vertebral teria ocorrido no ano de 2020 (fl. 2190) - cabendo presumir terem ocorrido por volta de novembro de 2020, que é a data do último exame de imagem realizado na coluna vertebral pelo reclamante (fl. 164). Tenho assim que à luz das circunstância acima delineadas, seria possível cogitar da incidência do art. 118 da Lei nº 8.213/91 exclusivamente a partir da última ocorrência de episódio álgico na coluna vertebral do reclamante, em novembro de 2020. E como o desligamento do obreiro ocorreu em dezembro de 2021, avalio que esse prazo já havia se esvaído e que não há espaço para que se cogite de inobservância da regra inserta no art. 118 da Lei nº 8.213/91. Por fim e no que diz respeito à alegação de despedida discriminatória, é importante assinalar que in casu as moléstias da coluna vertebral não atraem o entendimento contido na Súmula nº 443 do TST. Cabia ao reclamante assim o ônus da prova quanto à despedida sem justa causa ter estado relacionada aos problemas de saúde enfrentados - encargo processual do qual não se desincumbiu, pois inexistem nos autos elementos de convicção capazes de chancelar tal alegação de fato. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “H” do rol de pedidos da peça vestibular. Presente que os pedidos deduzidos nos itens “I”, “V” e “W” do rol de pedidos da peça vestibular tinham como pressuposto o acolhimento do pedido de reintegração ao emprego, julgo-os igualmente improcedentes. 3.3. Indenização por Danos Materiais - Pensão Mensal Vitalícia A pensão mensal vitalícia é devida quando o trabalhador não mais puder exercer sua atividade habitual ou tiver diminuída a capacidade de trabalho, após o fim de convalescença (art. 950, caput, parte final). Colocando-se em perspectiva concreta, a pensão mensal vitalícia pressupõe perda ou redução da capacidade de forma permanente, não incidindo quando essa perda ou redução é temporária. In casu a Sra. Perita Médica concluiu que os problemas na coluna vertebral do reclamante não o incapacitam para o trabalho - e essa conclusão é ratificada pela circunstância de que não se visualizam nos autos afastamentos laborais por conta dos problemas na coluna vertebral, bem como a circunstância de que após o desligamento dos quadros da reclamada a parte autora obteve novo emprego. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “T” do rol de pedidos da peça vestibular. 3.4. Indenização por Danos Materiais - Lucros Cessantes Registro ab initio que no entendimento deste Magistrado os lucros cessantes associam-se à ideia de ressarcimento daquilo que o trabalhador deixou de ganhar quando a incapacidade ainda é temporária e ele encontra-se afastado do labor, conforme art. 949 do CC/02 e segundo o qual “o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido” (meu grifo). In casu e como já assinalado acima, não há qualquer elemento nestes autos que permita a conclusão de que o reclamante tenha permanecido afastado ainda que temporariamente das atividades em virtude dos problemas na coluna vertebral. Gizo que a ilação de incidência da perda de uma chance não sobrevive à prova documental, pois o Extrato CNIS do obreiro indica que após o desligamento dos quadros da reclamada ele prontamente conseguiu se recolocar no mercado de trabalho. Verifico que constam vínculos de emprego com a M S Manutenção Ltda, de 14/07/2022 a 28/07/2023; com a Rivelli Alimentos S/A, de 18/12/2023 a 16/03/2024; e por fim com a CBSI - Companhia Brasileira de Serviços de Infraestrutura, entre 07/05/2024 e 04/08/2024, e por fim com a Vordex Serviços Ltda, a partir de 14/08/2024 (fls. 1594/1596). E que ao prestar informações à Sra. Perita Médica o reclamante referiu que inexistiram quaisquer limitações após seu desligamento dos quadros da reclamada. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “U” do rol de pedidos da inicial. 3.5. Indenização por Dano Moral A Constituição da República assegura no artigo 5º, inciso V, o “direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, e no inciso X, prevê que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. A Lei nº 13.467/17 introduziu à CLT dispositivos específicos a respeito do dano extrapatrimonial sob a perspectiva do contrato de trabalho, estabelecendo o artigo 223-C que “a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são os bens juridicamente tutelas inerentes à pessoa física”. Mostra-se pacífico em doutrina e jurisprudência o cabimento de indenização por dano moral em casos de acidente do trabalho ou doença ocupacional. Nesse sentido, invoco a lição de Sebastião Geraldo de Oliveira: “O cabimento da indenização por danos morais decorrentes do acidente do trabalho é, atualmente, questão pacificada na doutrina e na jurisprudência. Em primeiro lugar porque o dispositivo constitucional acima transcrito não restringiu a indenização apenas aos aspectos patrimoniais, não devendo o intérprete impor limitações onde a norma não restringiu. Em segundo, porque o Código Civil consagra a cláusula genérica da indenização decorrente do ato ilícito no art. 186, no qual está indicado expressamente o dano moral. Em terceiro, porque o mesmo Código Civil quando trata da indenização por danos pessoais indica as parcelas da reparação material, mas deixa a ressalva ‘sem excluir outras reparações’ (art. 948) ou ‘além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido’ (art. 949). Nessas ressalvas, não há dúvidas, deve ser incluída a indenização pelos danos morais do acidentado ou de seus dependentes. Por último, a regulamentação do de natureza extrapatrimonial – uma denominação mais elaborada do dano moral – pela reforma trabalhista de 2017 (arts. 223-A a 223-G da CLT) afasta de vez qualquer questionamento” (Op. Cit., p. 300). In casu reconheceu-se o preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil. De fato e repisando o quanto já exposto nos tópicos anteriores, o reclamante padece de moléstia na coluna vertebral (abaulamento e protrusões discais nas regiões L1-L2, L4-L5 e L5-S1); há nexo concausal entre a moléstia e as atividades desempenhadas em prol da reclamada; e foi verificada a culpa da empregadora quanto ao surgimento/agravamento da doença ocupacional, na modalidade negligência. Vale dizer que a Constituição da República elenca como direito fundamental dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art. 7º, XXII, CRFB/88), e isso foi marginalizado in casu. Ademais, não há dúvida possível acerca da relevância da tutela de bens jurídicos como saúde e integridade física. Colocando-se em perspectiva concreta, há gravidade mais do que suficiente para caracterização do dano moral in re ipsa. Quanto à fixação da indenização, o artigo 223-G da CLT indica em seus incisos uma série de aspectos a serem levados em consideração, a saber, natureza dos bens jurídicos tutelados, intensidade do sofrimento, possibilidade de superação física ou psicológica, reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão, extensão e duração dos efeitos da ofensa, condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral, grau de dolo ou culpa, ocorrência de retratação espontânea, esforço efetivo para minimizar a ofensa, perdão, tácito ou expresso, situação social e econômica das partes envolvidas, e grau de publicidade da ofensa. In casu a natureza do bem jurídico tutelado é relevantíssima porque diz respeito à integridade física e à saúde do trabalhador. E repiso que a preservação da integridade física e da saúde do trabalhador deriva de mandamento constitucional, mais precisamente aquele previsto no art. 7º, XXII, da CRFB/88, que impõe a redução dos riscos inerentes ao trabalho - o que como já salientado acima foi negligenciado pela empregadora. Em contrapartida, é necessário ponderar que a moléstia na coluna vertebral do reclamante é multifatorial e foi estabelecido exclusivamente nexo concausal com as atividades. Colocando-se em perspectiva concreta, o surgimento/agravamento dessas lesões não decorre tão-somente das condições de trabalho que lhe foram ofertadas e são igualmente causas e/ou concausas fatores extralaborais - como o próprio envelhecimento humano. Tampouco é possível desconsiderar que ao menos daquilo que se depreende destes autos não se visualiza tenha o reclamante efetivamente se afastado das atividades em razão desse adoecimento; que ele não lhe incapacita para o trabalho, sendo que o autor inclusive se recolocou no mercado de trabalho; e que ao menos por ocasião da perícia há aproximadamente 4 (quatro) anos não havia qualquer manifestação álgica em consequência da moléstia. Diante do exposto, e sopesando os parâmetros acima indicados e já considerado o nexo concausal estabelecido, julgo procedente em parte o pedido para deferir ao reclamante indenização por dano moral no quantum de R$ 15.000,00 à época da prolação da sentença. 3.6. Emissão da CAT Tendo em vista a caracterização da doença ocupacional, cumpre ao empregador a expedição da Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT), conforme preceitua o art. 22 da Lei nº 8.213/91. Registro que se trata de obrigação legal e que a faculdade prevista no art. 22, §2º, no sentido de que ela pode ser emitida pelo acidentado, seus dependentes, entidade sindical ou médico do trabalho não exclui o dever que lhe cabe. Diante do exposto, condeno a reclamada em obrigação de fazer, traduzida na expedição da CAT decorrente da doença ocupacional ora reconhecida, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado e sua intimação para tanto, sob pena de multa de R$ 1.000,00 por dia em caso de descumprimento, até o limite de R$ 10.000,00. 4. Diferenças Salariais por Acúmulo de Função O reclamante sustenta que exerceu as funções de Mecânico e Ferramenteiro ao longo do período contratual, mas que a partir do momento em que foi transferido para a Mina de Fábrica passaram a lhe ser exigidas a execução de tarefas inerentes às funções de Lubrificador e Soldador. Com base nesse relato, postula o pagamento de diferenças salariais por acúmulo de função e suas integrações (item “N” do rol de pedidos). A reclamada impugna as alegações de fato do reclamante, asseverando que os serviços de lubrificação e solda estão compreendidos no conteúdo ocupacional das funções de Mecânico e Ferramenteiro e que não há falar assim em desempenho de atividades estranhas às funções para a qual ele foi contratado. Analiso. Registro ab initio que o salário remunera o tempo à disposição do empregador e todas as atividades que sejam compatíveis com a condição pessoal do empregado, exceto se houver cláusula contratual expressa (art. 456, parágrafo único, da CLT). Não há qualquer norma que obrigue o empregador remunerar o empregado por tarefas desempenhadas, decorrendo do jus variandi que lhe é inerente determinar a realização de atividades correlacionadas à função contratada. É importante destacar que o art. 460 da CLT não possui amplitude a ponto de permitir que o Poder Judiciário imiscuir-se no salário pactuado entre empregador e empregado, bem como que as disposições contidas na Lei nº 6.615/78 são específicas da profissão de radialista e dada tal especificidade não há espaço para que sejam ampliadas via analogia para todo e qualquer trabalhador. Se o legislador ordinário tivesse tal intenção, teria inserido a previsão na CLT e não em lei especial. Em contrapartida, é consabido que nos contratos de trabalho apenas é lícita alteração das condições por mútuo consentimento e desde que não resultem prejuízos diretos ou indiretos ao empregado (art. 468 da CLT). É possível cogitar-se de alteração ilícita se após a admissão o empregador passar a exigir do empregado tarefas que não eram realizadas inicialmente, se mostrem incompatíveis com sua condição pessoal ou sejam mais complexas que aquelas decorrentes da função pactuada. As diferenças salariais por acúmulo de função originam-se justamente da tensão entre os preceitos normativos mencionados. Se comprovado que após a admissão o empregador passou a exigir do empregado atividades não relacionadas à função originalmente contratada e que sejam substancialmente incompatíveis com sua condição pessoal ou lhe exijam maior responsabilidade, viável o reconhecimento da ilicitude da alteração contratual por abuso do jus variandi e a correção do desequilíbrio e restauração do sinalagma do contrato. Nesse sentido, a jurisprudência deste Eg. TRT da 3ª Região: ACÚMULO DE FUNÇÃO. DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL NÃO CONFIGURADO. Ausente o desequilíbrio qualitativo ou quantitativo entre as funções inicialmente combinadas entre o empregado e o empregador e aquelas exigidas no decorrer do contrato, o não reconhecimento do acúmulo de funções é medida que se impõe. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010550-35.2021.5.03.0026 (ROT); Disponibilização: 25/07/2024; Órgão Julgador: Decima Primeira Turma; Relator(a)/Redator(a) Marco Antonio Paulinelli Carvalho). DIFERENÇA SALARIAL. ACÚMULO DE FUNÇÃO. O acúmulo ou desvio funcional ocorre quando o trabalhador é contratado para exercer determinada função (feixe de tarefas), mas por imposição do empregador desempenha, com habitualidade, função distinta daquela para a qual contratado ou na qual classificado, com o exercício de tarefas de maior complexidade e sem a percepção de remuneração compatível com o mister agregado. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010140-15.2024.5.03.0044 (ROT); Disponibilização: 24/07/2024; Órgão Julgador: Oitava Turma; Relator(a)/Redator(a) Sérgio Oliveira de Alencar). In casu a reclamada juntou aos autos a Descrição de Cargo da função de Mecânico e que foi formalmente ocupada pelo obreiro na maior parte do período não coberto pela prescrição e previamente à readaptação por motivos de ordem médica. Tal documento mostra com clareza que tarefas de solda e lubrificação integram o conteúdo ocupacional de tais funções (fl. 602) - o que no entendimento deste Magistrado já é mais do que suficiente para concluir pela improcedência do pedido no que diz respeito ao interregno em que o obreiro foi classificado como Mecânico, sendo que a prova oral não altera tal conclusão. Já no que diz respeito ao período em que o reclamante atuou como Ferramenteiro, avalio que igualmente não estão dados os pressupostos necessários ao reconhecimento do acúmulo de função. Não é possível perder de vista que o reclamante foi readaptado de função em razão dos problemas de saúde que apresentava e não teve qualquer diminuição salarial, de modo que se seguiu executando algumas tarefas inerentes ao cargo de Mecânico não visualizo nesse particular qualquer ato ilícito. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “N” do rol de pedidos da inicial. 5. Diferenças Salariais por Equiparação O reclamante sustenta que exercia as mesmas atividades que seus colegas de trabalho Amadeu Gervásio dos Santos, César Augusto Carlos Pinto, Fernando Roberto Damasceno, Maicon Estevam e Regian Oliveira Paula, mas que recebia salário inferior ao deles. Com base nesse relato e invocando o art. 461 da CLT, pede o pagamento de diferenças salariais por equiparação e suas integrações (item “L” do rol de pedidos). A reclamada impugna as alegações de fato do reclamante, asseverando que não estão dados os pressupostos previstos no art. 461 da CLT quanto aos modelos invocados na peça vestibular. Pede assim a improcedência dos pedidos. Analiso. As diferenças salariais por equiparação concretizam os princípios constitucionais da igualdade e da não-discriminação (arts. 5º, caput e inciso I, e 7º, incisos XXX e XXXII, da CRFB/88) e são devidas a partir da análise do caso concreto à luz dos requisitos estabelecidos na legislação infraconstitucional e na jurisprudência consolidada (art. 461 da CLT e Súmula nº 6 do TST). É importante ressaltar que embora tal princípio informe e oriente o instituto, não é possível o deferimento de diferenças salariais por equiparação apenas com base no princípio da igualdade, sob pena de abstração excessiva, consequente esvaziamento da previsão normativa específica, ofensa ao princípio da segurança jurídica e ofensa ao princípio da legalidade (art. 5º, II, da CRFB/88). Cumpre assim transcrever tanto o dispositivo legal celetista quanto o enunciado jurisprudencial para melhor compreensão a respeito dos contornos objetivos desse instituto - ressaltando-se que a redação da Súmula nº 6 do TST antecede a Lei nº 13.467/17 e, por essa razão, seus enunciados devem ser examinados à luz das alterações legislativas promovidas que em alguns pontos os superaram: “Art. 461. Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade. § 1º Trabalho de igual valor, para os fins deste Capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço para o mesmo empregador não seja superior a quatro anos e a diferença de tempo na função não seja superior a dois anos. § 2º Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal organizado em quadro de carreira ou adotar, por meio de norma interna da empresa ou de negociação coletiva, plano de cargos e salários, dispensada qualquer forma de homologação ou registro em órgão público. § 3º No caso do § 2o deste artigo, as promoções poderão ser feitas por merecimento e por antiguidade, ou por apenas um destes critérios, dentro de cada categoria profissional. § 4º O trabalhador readaptado em nova função por motivo de deficiência física ou mental atestada pelo órgão competente da Previdência Social não servirá de paradigma para fins de equiparação salarial. § 5º A equiparação salarial só será possível entre empregados contemporâneos no cargo ou na função, ficando vedada a indicação de paradigmas remotos, ainda que o paradigma contemporâneo tenha obtido a vantagem em ação judicial própria. (...)” “SÚMULA Nº 6. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. ART. 461 DA CLT. I - Para os fins previstos no § 2º do art. 461 da CLT, só é válido o quadro de pessoal organizado em carreira quando homologado pelo Ministério do Trabalho, excluindo-se, apenas, dessa exigência o quadro de carreira das entidades de direito público da administração direta, autárquica e fundacional aprovado por ato administrativo da autoridade competente. II - Para efeito de equiparação de salários em caso de trabalho igual, conta-se o tempo de serviço na função e não no emprego. III - A equiparação salarial só é possível se o empregado e o paradigma exercerem a mesma função, desempenhando as mesmas tarefas, não importando se os cargos têm, ou não, a mesma denominação. IV - É desnecessário que, ao tempo da reclamação sobre equiparação salarial, reclamante e paradigma estejam a serviço do estabelecimento, desde que o pedido se relacione com situação pretérita. V - A cessão de empregados não exclui a equiparação salarial, embora exercida a função em órgão governamental estranho à cedente, se esta responde pelos salários do paradigma e do reclamante. VI - Presentes os pressupostos do art. 461 da CLT, é irrelevante a circunstância de que o desnível salarial tenha origem em decisão judicial que beneficiou o paradigma, exceto: a) se decorrente de vantagem pessoal ou de tese jurídica superada pela jurisprudência de Corte Superior; b) na hipótese de equiparação salarial em cadeia, suscitada em defesa, se o empregador produzir prova do alegado fato modificativo, impeditivo ou extintivo do direito à equiparação salarial em relação ao paradigma remoto, considerada irrelevante, para esse efeito, a existência de diferença de tempo de serviço na função superior a dois anos entre o reclamante e os empregados paradigmas componentes da cadeia equiparatória, à exceção do paradigma imediato. VII - Desde que atendidos os requisitos do art. 461 da CLT, é possível a equiparação salarial de trabalho intelectual, que pode ser avaliado por sua perfeição técnica, cuja aferição terá critérios objetivos. VIII - É do empregador o ônus da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação salarial.. IX - Na ação de equiparação salarial, a prescrição é parcial e só alcança as diferenças salariais vencidas no período de 5 (cinco) anos que precedeu o ajuizamento. X - O conceito de "mesma localidade" de que trata o art. 461 da CLT refere-se, em princípio, ao mesmo município, ou a municípios distintos que, comprovadamente, pertençam à mesma região metropolitana. Verifica-se assim que o direito às diferenças salariais por equiparação pressupõe a presença cumulativa de quatro requisitos, quais sejam, identidade de função, identidade de empregador, identidade de local de exercício das funções e simultaneidade no desempenho das atividades - cabendo ao reclamante o ônus da prova relativamente a eles (art. 818, I, da CLT). E que pode ser afastado pela presença de cinco fatores impeditivos, modificativos ou extintivos, quais sejam, diferença de perfeição técnica, diferença de produtividade, diferença de tempo de serviço, existência de quadro de carreira e readaptação funcional do paradigma - cabendo à parte reclamada o ônus da prova relativamente a eles (art. 818, II, da CLT). In casu a ficha de registro funcional do reclamante indica que ele foi admitido nos quadros da reclamada como Mecânico, em 09/06/2011; foi promovido a Mecânico II, em 05/06/2014; e por fim transferido para a função de Ferramenteiro em razão dos problemas de saúde apresentados e a necessidade de adaptação das atividades, em 01/12/2020 (fl. 494). A ficha de registro funcional do paradigma Fernando Roberto Damasceno indica que ele foi foi admitido nos quadros da reclamada como Mecânico I, em 05/02/2010; foi promovido a Mecânico II, em 01/05/2012; e foi promovido a Técnico Mecânico I, em 14/11/2014 - sendo que após o desligamento do reclamante foi promovido a Técnico Mecânico II, em 10/02/2022 (fl. 647). A ficha de registro funcional do modelo Maicohn Stevan Cruz Fernandez indica que ele foi admitido nos quadros da reclamada como Mecânico I, em 13/04/2010; foi promovido a Mecânico II, em 01/04/2013; e por fim foi promovido a Técnico Mecânico I, em 01/06/2021 (fl. 672). A ficha de registro de empregado do paradigma Regian Oliveira Paula indica que ele foi admitido nos quadros da reclamada como Mecânico I, em 06/06/2012; foi promovido a Mecânico II, em 14/11/2014; foi promovido a Técnico Mecânico I, em 22/07/2021 - e posteriormente e quando o autor já havia sido desligado foi promovido a Técnico Mecânico II, em 12/07/2022 (fl. 698). A ficha de registro funcional do modelo Amadeu Gervásio dos Santos indica que ele foi admitido nos quadros da reclamada como Mecânico I, em 04/10/2010; foi promovido a Mecânico II, em 01/05/2012; e foi promovido a Mecânico Especializado, em 23/10/2019 (fl. 723). Por fim, a ficha de registro funcional do paradigma César Augusto Carlos Pinto indica que ele foi admitido nos quadros da reclamada como Mecânico I, em 01/04/2010; foi promovido a Mecânico II, em 15/10/2014; passou a Eletromecânico I, em 04/01/2021 - e posteriormente e quando o reclamante já havia sido desligado, foi promovido a Eletromecânico II, em 01/09/2022 (fl. 748). Prosseguindo, a Descrição de Cargo que arrola as atividades dos Mecânicos I, II e Especializado confirma que tais funções compreendem um feixe idêntico de atividades, distinguindo-se exclusivamente no que diz respeito à formação do trabalhador. Para Mecânico I é desejável experiência de até 2 (dois) anos; para Mecânico II é desejável experiência superior a 2 (dois) anos; e para Mecânico Especializado é desejável experiência superior a 4 (quatro) anos (fls. 602/603). Já a Descrição de Cargo juntada pela reclamada e que indica as atividades dos Técnicos Mecânicos comprova que o feixe de tarefas dessa função é diferente da função de Mecânico (fls. 777/778). Os Mecânicos dedicam-se precipuamente à execução de serviços de manutenção, ao passo que os Técnicos Mecânicos possuem atribuições de planejamento, programação e controle das atividades de manutenção, incluindo elaboração e revisão de procedimentos operacionais. Os Técnicos Mecânicos participam também da elaboração de orçamentos, controle de serviços terceirizados e têm responsabilidade pela análise de performance dos equipamentos com implementação de ferramentas da qualidade (PDCA, Análise de Falhas). E a formação exigida é diferenciada, pois os Técnicos Mecânicos devem ter ensino médio técnico em mecânica, eletromecânica ou mecatrônica, enquanto o Mecânico precisa apenas ensino médio completo com curso profissionalizante de mecânica. E a Descrição de Cargo dos Eletromecânicos igualmente denota distinção quanto ao conteúdo ocupacional da função se comparado àquele dos Mecânicos - aqueles atuam em atividades que envolvem elementos elétricos e eletrônicos para além da mecânica, ao passo que estes atuam especificamente em componentes mecânicos, hidráulicos e pneumáticos (fls. 779/780). De resto, a formação exigida para Eletromecânico inclui curso de mecânica/eletricista, demonstrando a necessidade de conhecimentos multidisciplinares que não são requeridos para o Mecânico. Tenho assim que não há falar em equiparação salarial quanto aos períodos em que os modelos exerceram as funções de Técnico Mecânico ou Eletromecânico, pois a Descrição de Cargo é prova suficiente de que não há falar em identidade de função e comprova que para ascender a tais cargos é necessária maior qualificação técnica. É importante destacar que tais Descrições de Cargo não foram objeto de impugnação específica em réplica, sendo que as declarações da testemunha Márcio Luís Pereira e que foi ouvida a convite do reclamante aludiu à função de mecânico e no entendimento deste Magistrado não permite superar a prova documental. Em contrapartida, mostra-se viável a equiparação salarial quanto aos períodos em que os paradigmas exerceram as funções de Mecânico, Mecânico I, Mecânico II ou Mecânico Especializado, pois a identidade funcional está comprovada a partir das declarações da testemunha Márcio Luis Pereira, inclusive quanto à inexistência de diferenças de produtividade ou perfeição técnica entre o labor do reclamante e dos modelos indicados na peça vestibular (00:30:55 a 00:32:00). E de resto a reclamada não produziu qualquer contraprova ou prova de outros fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor (art. 818, II, da CLT). É preciso destacar nesse particular que a ficha de registro funcional do reclamante foi juntada de forma incompleta e ao contrário da ficha de registro funcional dos modelos não indica claramente os locais nos quais ele se ativou ao longo do período contratual, o que não permite concluir quanto à diferença de localidade. E que a diferença de supervisor não é fato impeditivo do direito à equiparação salarial porque não consta na legislação de regência como pressuposto da equiparação salarial. Colocando-se em perspectiva concreta, relativamente aos períodos em que autor e modelo exerceram as funções de Mecânico, Mecânico I, Mecânico II e Mecânico Especializado o reclamante desincumbiu-se do ônus da prova e a reclamada não comprovou qualquer fato extintivo, impeditivo ou modificativo do direito. É preciso destacar que deverá ser considerado que o reclamante exerceu a função de Mecânico exclusivamente até 06/02/2019. Muito embora conste na ficha de registro funcional que a alteração teria ocorrido apenas no final de 2020, é certo que a partir das declarações dadas pelas partes à Expert Engenheira deve ser considerado que a alteração das atividades do reclamante ocorreu em fevereiro de 2019 (fl. 1342). Gizo que corrobora tal conclusão a circunstância do reclamante ter referido que trabalhou com os paradigmas até 2019 (00:09:45 a 00:10:11). Por fim e não menos importante, as fichas de registro funcional do reclamante e dos paradigmas permitem concluir pelo desnível salarial entre eles no período em que exerceram de forma simultânea as funções de Mecânico, Mecânico I, Mecânico II ou Mecânico Especializado - considerando a admissão do reclamante até 06/02/2019, data-limite estabelecida na forma do parágrafo anterior. É importante destacar que as diferenças salariais devem ser apuradas relativamente a todo período contratual, em que pese suas repercussões pecuniárias devam estar adstritas período não coberto pela prescrição (item 2 da fundamentação). Ademais, as diferenças salariais são devidas mesmo a partir de 06/02/2019 em virtude do princípio da irredutibilidade salarial. Colocando-se em perspectiva concreta e com vistas a evitar a desnecessária oposição de embargos de declaração, significa dizer que o desnível salarial entre o reclamante e os modelos deve ser apurado até 06/02/2019; mas que eventuais diferenças salariais são devidas a partir dessa data caso se apure que após essa data o salário pago ao reclamante era inferior àquele devido até 06/02/2019, até que essas diferenças tenham deixado de subsistir a partir dos salários pagos ao reclamante. Diante do exposto, julgo procedente em parte o pedido para deferir ao reclamante o pagamento de diferenças salariais por equiparação com os paradigmas Fernando Roberto Damasceno, Maicohn Stevan Cruz Fernandez, Regian Oliveira Paula, Amadeu Gervásio dos Santos e César Augusto Carlos Pinto relativamente ao período em que eles exerceram de forma simultânea as funções de Mecânico, Mecânico I, Mecânico II ou Mecânico Especializado, com reflexos em horas extras pagas, adicional noturno pago, férias com acréscimo de 1/3, 13º salários, FGTS acrescido de 40% e PLR - sendo que as incidências de FGTS acrescidas de 40% deverão ser depositadas em conta vinculada e oportunamente liberadas ao reclamante por meio de alvará judicial. Não há reflexos em aviso-prévio indenizado, pois não há consta tal requerimento no item “L” do rol de pedidos da inicial. E são indevidos os reflexos em “incorporação do adicional noturno no DSR”, por ausência de amparo legal e porque as diferenças salariais por equiparação já remuneram os repousos semanais remunerados. Sinalizo que nesse particular devem ser observados os limites objetivos da lide. As diferenças salariais por equiparação deverão observar estritamente os salários-base do autor e do modelo, não havendo falar em inclusão de outras parcelas que constituem vantagens pessoais do obreiro e/ou modelo ou pagamento de adicionais relativos às especificidades de suas atividades. As repercussões em horas extras postuladas e adicionais de insalubridade e/ou periculosidade serão examinadas na sequência e deferidas na forma de reflexos e/ou composição da base de cálculo, tendo em vista que é preciso primeiramente verificar a procedência dos respectivos pedidos. 6. Adicionais de Insalubridade e Periculosidade O reclamante sustenta que suas atividades eram insalubres e perigosas, mas que jamais recebeu o pagamento do adicional correspondente. Pede assim o pagamento dos adicionais de insalubridade e periculosidade, de forma cumulada, observados os critérios e os parâmetros que indica, bem como a retificação do PPP (itens J e K do rol de pedidos). A reclamada nega que as atividades do reclamante fossem insalubres ou perigosas, requerendo a improcedência dos pedidos. Por cautela, requer seja observada a impossibilidade de cumulação de adicionais de insalubridade e periculosidade caso se conclua pela procedência de tais requerimentos. Analiso. A Constituição da República garante aos trabalhadores urbanos e rurais o direito ao adicional de remuneração para atividades penosas, insalubres ou perigosas, nos termos da lei (art. 7º, XXIII). A CLT define atividades insalubres como aquelas que expõem os empregados a agentes nocivos à saúde, em níveis superiores aos limites de tolerância fixados em função da natureza, intensidade do agente e tempo de exposição (art. 189 da CLT). Compete ao Ministério do Trabalho e Emprego regulamentar as atividades insalubres, estabelecendo critérios de caracterização, limites de tolerância, meios de proteção e tempo máximo de exposição (art. 190 da CLT). Conforme entendimento consolidado pelo TST, apenas as atividades previstas nos atos normativos desse órgão poderão ser legalmente consideradas insalubres para fins de pagamento de adicional (Súmula nº 448, I). Já as atividades perigosas são aquelas que, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a inflamáveis, explosivos ou energia elétrica, roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial, colisões, atropelamentos ou outras espécies de acidentes ou violências nas atividades profissionais dos agentes das autoridades de trânsito, bem como as atividades do trabalhador em motocicleta (art. 193, caput, incisos I a III e §2º, da CLT). É importante destacar que o enquadramento das atividades como insalubres e/ou perigosas deve ser realizado por perícia técnica, conduzida por Médico ou Engenheiro do Trabalho, devidamente registrados no Ministério do Trabalho, evidenciando o caráter eminentemente técnico da matéria e a relevância da prova pericial (art. 195 da CLT) - ainda que o Magistrado não esteja adstrito às conclusões contidas no laudo pericial (art. 479 do CPC/15). A Sr.ª Perita Engenheira, no laudo pericial anexado aos autos, elaborado com base nas informações prestadas pelas partes e inspeção in loco, inicialmente concluiu que as atividades do reclamante não eram insalubres ou perigosas, na forma das NRs 15 e 16 da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), tendo referido o seguinte: a) quanto à exposição ao ruído, embora em alguns períodos ele tenha sido superior aos limites de tolerância previstos no Anexo nº1 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do MTE, nesses interregnos esteve documentalmente comprovado o fornecimento de EPIs aptos a elidir a insalubridade daí decorrente (fls. 1342/1344); b) quanto à exposição a agentes químicos, considerou que o manuseio de óleos minerais ocorria de forma eventual porque o reclamante teria referido que no período em que atuou como Mecânico “às vezes, precisava completar óleo das bombas hidráulicas e também tinha que limpar as ferramentas sujas de graxa e óleo”, bem como porque foi comprovado documentalmente o fornecimento de luvas nitrílicas aptas a elidir a exposição ao agente químico (fls. 1345/1348); e c) quanto à periculosidade, considerou que no período em que o autor foi Ferramenteiro ele ficou responsável pelo depósito de gás, nos quais são armazenados cilindros de nitrogênio, oxigênio e acetileno, sendo em média 15 cilindros. Ela referiu que o acetileno é gás inflamável, mas que conforme a FISQP era armazenado de forma diluída; e que são consideradas periculosas as atividades de armazenamento de gás liquefeito. Contudo, não procedeu ao respectivo enquadramento (fls. 1350/1352). A parte reclamante apresentou quesitos complementares e instou a Expert a se manifestar quanto a supostas incongruências no laudo pericial e eventualmente retificar suas conclusões anteriores (fls. 1391/1394). Prestando esclarecimentos aos questionamentos levantados pelo reclamante, a Expert retificou parcialmente suas conclusões anteriores nos seguintes particulares: a) quanto à periculosidade, “reviu suas condições e constatou que o reclamante fazia regularmente a substituição de cilindros contendo gases altamente inflamáveis” e “manuseando cilindros cheios e vazios não desgaseificados ou decantados, atuando também nas áreas de risco”. E a partir daí concluiu que as atividades do reclamante se enquadram como periculosas no período em que atuou como Ferramenteiro, de 1º/12/2020 até o desligamento, na forma do Anexo nº 2 da NR-16 da Portaria nº 3.214/78 do MTE (fls. 2268/2270). Tanto a parte reclamante quanto a parte reclamada apresentaram quesitos complementares às respostas anteriormente dadas pela Expert aos quesitos complementares originalmente formulados pelo reclamante (fls. 2294/2295 e 2308/2309). E nesse aspecto mais uma vez a Sra. Perito Engenheira retificou parcialmente suas conclusões anteriores nos seguintes aspectos: a) quanto ao agente físico ruído, considerou que no período de 09/08/2019 a 30/11/2020 consta no PPP do reclamante sua mensuração como sendo de 87,40 dB(A) e que os recibos de EPIs sugerem que dessa exposição o reclamante esteve protegido exclusivamente até 11/07/2020. Concluiu assim que as atividades do reclamante caracterizam-se como insalubres em grau médio por exposição ao ruído de 12/07/2020 a 30/11/2020, na forma do Anexo nº1 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do MTE (fl. 2327). A parte reclamante não apresentou mais quesitos complementares e tampouco apresentou quaisquer impugnações ao laudo pericial técnico e suas retificações. A parte reclamada impugnou a conclusão retificada da Expert quanto à caracterização da periculosidade, argumentando que o acetileno é armazenado na forma dissolvida e que “o Anexo 2 da NR-16 trata apenas de inflamável gasoso liquefeito, e que o que o acetileno é armazenado no cilindro no estado gasoso não liquefeito” - razão por que não haveria falar em caracterização da periculosidade. Giza, ademais, que deve ser observado o disposto no item 16.6 da NR-16 e segundo o qual o transporte de inflamável gasoso liquefeito de até 135kg não gera periculosidade - o que deve ser observado quanto ao armazenamento dos 81kg do depósito de inflamáveis, pois é atividade de menor risco. Por fim, refere que a permanência na área de risco era por tempo extremamente reduzido e que deve ser aplicado o raciocínio contido no item I da Súmula nº 364 do TST (fls. 2299/2309 e 2333/2337). Quanto à caracterização da insalubridade em grau médio por exposição ao ruído, de 12/07/2020 a 30/11/2020, na forma do Anexo nº 1 da NR-15 da Portaria nº 3.214/78 do MTE, tenho que não pode prevalecer. E isso porque nesse particular a premissa considerada pela Expert como parâmetro para estabelecer o enquadramento está equivocada, já que no período em que o reclamante exerceu a função de Ferramenteiro o ruído mensurado no ambiente de trabalho foi de 65,80 dB(A) (fl. 1343). É importante referir que embora a alteração de função do reclamante para Ferramenteiro tenha sido formalizada apenas a partir de 1º/12/2020, a partir das declarações convergentes prestadas pelas partes em inspeção a conclusão que se impõe é que já a partir de fevereiro de 2019 o reclamante começou a desempenhá-las. Logo, tenho que o ruído no interregno em que a Expert menciona que não houve fornecimento de EPIs esteve abaixo do limite de tolerância do Anexo nº1 da NR-15 e que, assim, não há falar em insalubridade. Quanto à caracterização da periculosidade na forma do Anexo nº2 da NR-16 da Portaria nº 3.214/78 do MTE e no período em que o reclamante exerceu a função de Ferramenteiro, cabia à reclamada o ônus da prova técnica capaz de elidir eventual inconsistência no parecer da Expert Engenheira (art. 818, II, da CLT). E desse encargo processual ela não se desincumbiu, pois nenhum elemento técnico foi acostado aos autos. Forçoso concluir assim que as atividades do reclamante eram periculosas no período em que ele exerceu a função de Ferramenteiro. E que em linha com o exposto no que diz respeito à insalubridade e na forma do laudo pericial, o período a ser considerado para tal finalidade é aquele que coincide com o retorno das atividades do autor a partir de 06/02/2019 - quando na prática ele já passou a desempenhar tarefas de ferramenteiro, em que pese a alteração funcional tenha sido formalizada apenas posteriormente. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido de pagamento de adicional de insalubridade e seus consectários deduzido no item “J.1” do rol de pedidos da inicial, e procedente em parte o pedido para deferir ao reclamante o pagamento do adicional de periculosidade a partir de 06/02/2019, com reflexos em horas extras pagas, adicional noturno pago, aviso-prévio indenizado, férias com acréscimo de 1/3, 13º salários e FGTS acrescido de 40% - devendo as incidências de FGTS serem depositadas na conta vinculada e posteriormente liberadas. Não há reflexos em adicional de turno e participação nos lucros e resultados, cuja base de cálculo é o salário contratual. E tampouco há reflexos em “incorporação do adicional noturno no DSR”, por ausência de amparo legal. A base de cálculo do adicional de periculosidade é o salário contratual do obreiro, devendo ser consideradas as diferenças salariais por equiparação deferidas no item 5 destes fundamentos. Condeno ainda a reclamada a proceder à retificação do PPP do reclamante nos moldes do laudo pericial, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado e sua intimação para tanto, sob pena de multa diária de R$ 500,00, até o limite de R$ 5.000,00, sem prejuízo de majoração na fase processual adequada em caso de resistência ao cumprimento da medida. 7. Adicional de Transferência O reclamante sustenta que começou atuando na Mina de Timbopeba e que se localiza na área rural de Mariana/MG, mas que em 2014 foi deslocado para a Mina de Fábrica e que se localiza na área rural de Ouro Preto/MG. Prossegue referindo que em 2020 e após o “acidente de Brumadinho” as atividades na Mina de Fábrica foram reduzidas e assim foi transferido para a Mina Vargem Grande, que fica na zona rural de Nova Lima/MG. Diz que “precisou mudar de domicílio por ordem imperiosa da empresa que de forma transitória o transferiu para da Unidade Mina de Fábrica, em Ouro Preto, para a Unidade Mina de Vargem Grande, em Nova Lima” - onde permaneceu de junho de 2020 até o desligamento em janeiro de 2022. Pede assim o pagamento do adicional de transferência e suas integrações (item “M” do rol de pedidos). A reclamada impugna o pedido do reclamante, asseverando que o adicional de transferência é devido em transferências de caráter provisório e que sob a própria perspectiva da causa de pedir da peça vestibular a transferência do reclamante de Ouro Preto/MG para Nova Lima/MG se deu em caráter definitivo - tanto que aí permaneceu até o término do período contratual. Pede a improcedência do pedido. Analiso. O adicional de transferência é devido quando há transferência provisória do empregado para localidade distinta daquela que resulta do contrato de trabalho e que lhe acarrete mudança de domicílio (art. 469, caput e §3º, da CLT). Vê-se assim que são 2 (dois) os requisitos necessários e cumulativos para o pagamento da parcela, quais sejam, a transferência do empregado e a mudança de domicílio. E in casu não há dúvida possível de que não há falar no pagamento dessa parcela ao reclamante, uma vez que conforme consta no item 16 das razões de pedir da peça vestibular “o autor desta lide sempre residiu na Rua Frei Eustáquio, no Bairro Lourdes, na cidade de Conselheiro Lafaiete/MG” (fl. 35). Dizendo-se de outro modo, o reclamante jamais teve qualquer alteração de domicílio ao longo do período contratual e isso é suficiente para concluir pela improcedência do pedido. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “M” do rol de pedidos da inicial. 8. Duração do Trabalho 8.1. Cartões-Ponto - Horários de Trabalho Registro ab initio que à luz dos cartões-ponto juntados aos autos pela reclamada extrai-se que ao longo do período não coberto pela prescrição o reclamante cumpriu as seguintes rotinas de trabalho: i) até 01/12/2021: prestou serviços no horário administrativo (turnos de 8 [oito] horas, com horários contratuais oscilando das 7h30min às 16h30min, 7h30min às 16h46min e 7h30min às 16h50min, com intervalo intrajornada de 1 (uma) hora pré-assinalado nos controles de horário, de segundas a sextas-feiras e com folgas em sábados e repouso semanal em domingos. São os horários que constam com o código 00052 em seus cartões-ponto, bem como das assinalações de horário registradas em tais documentos (fls. 581/601). 8.2. Horas in Itinere O reclamante sustenta que ao longo do período não coberto pela prescrição sempre residiu em Conselheiro Lafaiete/MG, aduzindo que no interregno prestou serviços na Mina de Fábrica (Ouro Preto/MG) e na Mina Vargem Grande (Nova Lima/MG). Menciona que não há transporte público regular entre o local de residência e as frentes de trabalho, razão por que deslocava-se nesses trajetos em transporte fornecido pela reclamada. Sustenta que no início da jornada o deslocamento durava 70 (setenta) minutos (60 [sessenta] minutos no trajeto externo + 10 [dez] minutos no trajeto interno), e que ao final em sentido inverso outros 70 (setenta) minutos (10 [dez] minutos no trajeto interno + 60 [sessenta] minutos no trajeto externo). Postula assim o pagamento de 140 (cento e quarenta minutos) extras a título de horas in itinere, com as integrações que indica (item “O” do rol de pedidos). A reclamada impugna o pedido do reclamante, asseverando que com o advento da Lei nº 13.467/17 e a alteração realizada no art. 58, §2º, da CLT, não há falar em pagamento de horas in itinere. De resto, menciona que as normas coletivas de trabalho disciplinam de forma exauriente a questão e que não há espaço para inobservá-las, por força do Tema 1046 de Repercussão Geral do STF. Pede assim a improcedência dos pedidos. Analiso. A Lei nº 13.467/17 alterou o art. 58, §2º, da CLT, para estabelecer que o “tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não serão computado na jornada de trabalho, por não se tratar de tempo à disposição do empregador”. Presente que in casu e no que diz respeito às horas in itinere o marco prescricional foi fixado em momento posterior à vigência da Lei nº 13.467/17 (item 2), bem como as regras de direito intertemporal fixadas na presente decisão (item 1), está claro que não há falar em pagamento de horas in itinere porque tal direito já não mais subsistia no ordenamento jurídico pátrio no período sob exame. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “O” do rol de pedidos da inicial. 8.3. Tempo de Espera - Horas de Baldeio Sustenta o reclamante que ao chegar na sede da reclamada com o transporte que cumpria o trajeto externo “aguardava por cerca de 10 minutos pela chegada das demais conduções e realização da operação de troca de ônibus até se iniciar o percurso interno com destino a central de ponto”. E que ao final da jornada “marcava o fim de seu módulo normal de trabalho, tomava o ônibus na central de ponto, mas, precisava aguardar por mais cerca de 30 minutos no baldeio até que chegassem todos os ônibus originários de pontos bastante distantes da mina e que traziam trabalhadores que laboravam em locais próximos, mas que deveriam seguir para suas residências com destinos diversos”. Prossegue referindo que esses interregnos “seguia efetuando contato com os demais trabalhadores da equipe que também cuidavam da operação e manutenção de equipamentos na área de produção e beneficiamento em usina”, solicitando informações “sobre metas e resultados do setor operacional e respondia às cobranças encaminhadas por seus superiores”, preenchendo “formulários e precisava repassar aos colegas que iam substitui-lo o andamento das demandas de seu setor”. Com base nesse relato e ressaltando que esses minutos de espera não ficavam registrados nos controles de horário e que se traduzem em tempo à disposição do empregador em razão do exercício das atividades retromencionadas, pede o pagamento de 40 (quarenta) minutos extras por dia de trabalho, observadas as integrações e os critérios que indica (item “P” do rol de pedidos). A reclamada impugna o pedido do reclamante, asseverando que o “tempo despendido à espera de transporte não pode ser considerado como à disposição do empregador, já que nesse período o reclamante não aguardava ordens, tampouco se ativava em benefício da reclamada, restando veementemente impugnadas quaisquer alegações em sentido contrário”. Pede a improcedência do pedido. Analiso. Registro ab initio que o art. 4º da CLT prevê que deve ser integrado à jornada de trabalho o tempo no qual o “empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada”. Tenho que a questão posta nestes autos e que diz respeito ao tempo que os trabalhadores permanecem aguardando o baldeio entre os transportes que cumprem os trajetos externo e interno e vice-versa deve ser examinada sob tal perspectiva legal. In casu e a partir dos depoimentos colhidos por ocasião da audiência de instrução e a partir de audiências de instrução realizadas em inúmeros processos nos quais a Vale S.A. figura no polo passivo da relação processual, extraio que seus empregados chegam à unidade empresarial alguns minutos antes do horário contratual com o transporte que lhes conduz a partir de suas respectivas cidades. E que a partir de então ficam aguardando o baldeio para o transporte que lhes conduzirá até os respectivos postos de serviços. Já ao final da jornada de trabalho ocorre tal rotina em sentido inverso. Eles cessam suas atividades alguns minutos antes do término do horário contratual e dirigem-se aos vestiários para higienização e troca de uniforme, deslocando-se em trajeto interno até a portaria e/ou ponto no qual é feita a troca de ônibus e momento no qual é considerada a jornada de trabalho. A partir daí aguardam os ônibus chegarem dos respectivos postos de serviços e realizam a troca do ônibus, se necessário. Não há qualquer evidência in casu de que nesses períodos em que a parte reclamante esperava a troca de transporte no início e no final da jornada estivesse à disposição do empregador para a realização de quaisquer atividades, o que é suficiente para a improcedência do pedido. Pelo contrário, ao prestar depoimento o reclamante foi mais do que claro que neste período ficava somente aguardando o transporte e isso no entendimento deste Magistrado traduz confissão real (00:03:54 a 00:04:01). Tenho que as declarações dadas pela testemunha Márcio Luís Pereira de que precisavam permanecer trajando o uniforme de trajeto, de que não poderiam seguir para casa caminhando e de que não poderiam praticar atividades particulares, de esporte ou lazer durante a espera não alteram essa conclusão (00:23:26 a 00:25:33). Primeiro porque o uniforme de trajeto era vestido antes do trabalhador se deslocar para a reclamada e recolocado antes do registro do ponto. E segundo porque a impossibilidade de ir caminhando para casa ou praticar atividades de lazer ou esporte não permite o acolhimento do pedido do reclamante porque esbarra nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. É cediço que a reclamada fica localizada em local de difícil acesso e que nenhum trabalhador em sã consciência ousaria cumprir o itinerário à pé. E de resto é evidente que naquela localidade nem se quisessem haveria quaisquer atividades de esporte e/ou lazer a serem praticadas. De resto é importante assinalar que a declaração da testemunha Márcio Luis Pereira no sentido de que não havia proibição de utilização do celular dentro do ônibus já é suficiente para concluir que nesse momento de espera os trabalhadores já não se encontravam sob o rígido controle do empregador (00:25:33) - o que igualmente conspira contra a tese de que havia restrição de liberdades nesse período de espera. Tampouco é apto ao acolhimento do pedido a circunstância da necessidade de observância das regras de conduta impostas pela reclamada no momento do aguardo do transporte. Ora, é evidente que se o empregador fornece o transporte para seus empregados se responsabiliza por eventuais acidentes e/ou incidentes que possam ocorrer nesse itinerário e que por isso a exigência de que regras de conduta mínimas sejam observadas não é desproporcional e tampouco conduz à conclusão de que os empregados estavam à disposição do empregador nesse período. Por fim, cumpre assinalar que a testemunha Márcio Luís Pereira referiu que ocorria de ser chamado de volta ao trabalho enquanto aguardava no ônibus (00:24:14). Tal declaração deve ser vista com parcimônia porque não foi referida pelo reclamante quando indagado pormenorizadamente a respeito da rotina de espera, mas ainda que isso ocorresse somente haveria qualquer infração às regras de duração do trabalho se ao retornar não houvesse registro do ponto indicando tal circunstância - prova essa ausente nestes autos. De resto e não menos importante, avalio que igualmente sob a perspectiva do art. 58, §2º, da CLT, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 13.467/17, carece de amparo legal a pretensão da consideração do tempo de espera como à disposição do empregador para fins de integração à jornada de trabalho e eventual pagamento de horas extras. E isso porque o art. 58, §2º, da CLT, é mais do que claro que o tempo de deslocamento até a efetiva ocupação do posto de trabalho não deve ser considerado dessa forma. Gizo que o tempo de espera para troca do transporte deve ser considerado como tempo do itinerário, pois em nada difere dos trabalhadores em geral que se valem do transporte público para os deslocamentos casa/trabalho e vice-versa e que eventualmente precisam tomar 2 (duas) ou mais conduções nesses itinerários. Eles igualmente se submetem a tal contingência porque não há estrita coincidência entre os itinerários do transporte público urbano. É preciso considerar ainda que a reclamada transporta seus trabalhadores até o local de trabalho a partir de inúmeras localidades da região pelo critério do local de residência, precisando reorganizá-los quando chegam na empresa pelo critério do local de prestação de serviços. E que no final da jornada aplica-se essa mesma lógica no sentido inverso - cabendo repisar que ela nada possui de irregular, mostrando-se racional e não desbordando do princípio da proporcionalidade, especialmente quando não evidenciada a realização de quaisquer tarefas nesse interregno. Cito, nesse sentido, a jurisprudência do C. TST: "(...) 2. TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Na hipótese, o Tribunal Regional, soberano na análise de fatos e provas, manteve a sentença, na qual, para o período anterior à vigência da Lei 13.467/2017, foi reputado inválido o instrumento normativo por aplicação da Súmula 429 do TST, e, para o período posterior à vigência da Lei 13.467/2017, foi aplicado o disposto no art. 58, § 2º, da CLT, com redação dada pela referida legislação. Com efeito, a Lei 13.467/2017, com vigência em 11/11/2017, alterou a redação do art. 58, § 2º, da CLT, que previa como à disposição o tempo despendido pelo empregado em transporte fornecido pelo empregador para local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o qual passou a estipular que o tempo " despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador ". Assim, o tempo despendido com o deslocamento da portaria até o vestiário e vice-versa, após a vigência da Lei 13.467/2017, não é considerado tempo à disposição do empregador. Outrossim, extrai-se do acórdão regional que o tempo gasto com a troca de uniforme obrigatória era, em média, de 5 (cinco) minutos, razão pela qual o acórdão regional está em conformidade com a Súmula 429/TST. Recurso de revista não conhecido" (meu grifo, Ag-RRAg-713-29.2021.5.06.0201, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 31/03/2023). Visando prevenir a indevida oposição de embargos de declaração, avalio que in casu não há falar em aplicação da Tese Jurídica Prevalecente nº 13 deste Eg. TRT3 porque no entendimento deste Magistrado encontra-se superada pela alteração legislativa promovida pela Lei nº 13.467/17 e que estabeleceu que o tempo gasto no deslocamento do trabalhador da residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e vice-versa não se considera como tempo à disposição do empregador - observada a linha intelectiva acima exposta. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “P” do rol de pedidos da inicial. 8.4. Minutos Residuais O reclamante sustenta que gastava em média 30 (trinta) minutos por dia em atividades como “atos de preparação, troca de uniforme, transporte de ferramentas, leitura de informes da empresa e participação em DDS”, os quais não eram contraprestados pela reclamada. Postula o pagamento de tais minutos residuais “conforme restar apurado nos cartões de ponto ou, caso a empregadora não o faça, no importe mínimo de 30 (trinta) minutos por dia”, como extraordinários, pois em extrapolação ao art. 58, §1º, da CLT, observadas as integrações e os critérios que indica (item “Q” do rol de pedidos). A reclamada impugna as alegações de fato do reclamante, asseverando que ele registrava o início da jornada de trabalho logo ao chegar no posto de serviço e a saída imediatamente antes da saída do ônibus e quando já havia encerrado suas atividades. Pede a improcedência do pedido. Registro ab initio que conforme delimitado na respectiva causa de pedir in casu cogita-se de eventuais minutos registrados nos cartões-ponto em extrapolação à duração normal de trabalho do obreiro. Trata-se a rigor da análise dos registros de início e término da jornada de trabalho, sob a perspectiva do art. 58, §1º, da CLT, que foi expressamente invocado na peça vestibular. E nesse particular é preciso assinalar que o acordo coletivo de trabalho 2019/2020 e que vigeu de 01/04/2019 a 31/03/2020 transacionou a respeito da regra do art. 58, §1º, da CLT, estabelecendo tolerância de 10 (dez) minutos no início da jornada e 10 (dez) minutos ao final da jornada (cláusula 11.8 [fl. 786]). Tal previsão deve ser prestigiada por força do Tema 1046 de Repercussão Geral do STF, mas é importante referir que não visualizo similar regra nas demais normas coletivas juntadas aos autos, aplicando-se o art. 58, §1º, da CLT. Colocando-se em perspectiva concreta, até 31/03/2019 e a partir de 1º/04/2020 cogita-se da incidência da regra do art. 58, §1º, da CLT, a qual prevê a tolerância de 5 (cinco) minutos quanto ao registro de entrada e saída, desde que não extrapolados 10 (dez) minutos diários; e entre 1º/04/2019 e 31/03/2020 aplica-se a cláusula 11.8 do ACT 2019/2020, a qual prevê tolerância de 10 (dez) minutos quanto ao registro de entrada e saída, desde que não extrapolados 20 (vinte) minutos diários. Manifestando-se quanto aos documentos juntados com a defesa, o reclamante indicou diferenças relativas a julho de 2019, asseverando que nos dias 1º, 8 e 26/07 teria extrapolado a jornada contratual em 11 minutos; que no dia 05/07 teria extrapolado a jornada contratual em 12 minutos; que nos dias 2, 24 e 31/07 teria extrapolado a jornada contratual em 13 minutos; que nos dias 10, 11, 15, 19, 22, 23, 25 e 29/07 teria extrapolado a jornada em 14 minutos; que nos dias 09 e 30/07 teria extrapolado a jornada em 15 minutos; que no dia 17/07 teria extrapolado a jornada em 17 minutos; e que no dia 16/07 teria extrapolado a jornada em 19 minutos - sem ter recebido qualquer pagamento de horas extras (fls. 1075/1076). Citou ainda o mês de novembro de 2019, quando no dia 20 e 27/11 teria extrapolado a jornada em 11 minutos; no dia 26/11 teria extrapolado a jornada contratual em 14 minutos; e dias 5, 6, 8, 11 e 18/11 teria extrapolado a jornada contratual em 15 minutos - mais uma vez sem qualquer pagamento de horas extras nos contracheques da competência ou da competência subsequente (fls. 1077/1078). E por fim citou o mês de março de 2020, quando no dia 12/03 teria extrapolado a jornada contratual em 21 minutos; nos dias 09 e 16/03 teria extrapolado a jornada contratual em 20 minutos; e nos dias 6, 13 e 17/03 teria extrapolado a jornada contratual em 14 minutos. Mais uma vez sem qualquer pagamento de horas extras nos contracheques da competência ou da competência subsequente (fls. 1079/1080). Tais demonstrativos de diferenças se mostram ineficazes, pois conforme referido acima os cartões-ponto indicam que o horário de trabalho tinha termo final variável e que gravitava entre 16h30min e 16h50min, ao passo que os cartões-ponto não deixam dúvidas de que a jornada contratual média no período sob enfoque era de 8 (oito) horas e 16 (dezesseis) minutos - conclusão a que chego quanto à jornada contratual lançada nos dias em que o reclamante atuou em Home Office. Tal significa dizer que nos períodos apontados pelo reclamante deveria ter sido considerado que o horário de trabalho é aquele apontado no cabeçalho que corresponde a 7h30min às 16h46min - e não aquele das 7h30min às 16h30min, que foi o parâmetro utilizado no demonstrativo de diferenças. Tomando-se assim o dia em que supostamente teria havido a maior extrapolação, vê-se que em realidade não havia qualquer direito do reclamante ao pagamento de horas extras. De fato, em 12/03/2020 ele trabalhou das 7h24min às 16h45min e isso significa que registrou o início da jornada 6 (seis) minutos antes do horário contratual e findou-a 1 (um) minuto antes do horário contratual das 16h46min. Vê-se assim que a extrapolação a rigor ficou adstrita aos 6 (seis) minutos anteriores ao horário contratual, dentro da tolerância da cláusula 11.8 do ACT 2019/2020 e que era a regra vigente à época. Diante do exposto, e porque como o reclamante não se desincumbiu do ônus da prova quanto ao apontamento dos minutos residuais registrados e alegadamente inadimplidos, julgo improcedente o pedido deduzido no item “Q” do rol de pedidos da inicial. 8.5. Intervalos Intrajornada O reclamante sustenta que embora pré-assinalados nos cartões-ponto os intervalos intrajornada não lhe foram, referindo que precisava “se alimentar rapidamente para reassumir seu posto de trabalho, por ordem imperiosa da empresa” - sendo-lhe concedidas pausas de 15 a 20 minutos quando em cumprimento de jornadas de 8 (oito) horas e nenhum intervalo quando em cumprimento de jornadas de 6 (seis) horas. Pede assim o pagamento das horas extras decorrentes da supressão dos intervalos intrajornada, observados os parâmetros e as integrações que indica (item “R” do rol de pedidos). A reclamada sustenta que os intervalos intrajornada eram corretamente gozados, conforme pré-assinalação. Pede a improcedência do pedido. Analiso. Os intervalos intrajornada devem ser de, no mínimo, 15 (quinze) minutos para jornadas de mais de 4 (quatro) e até 6 (seis) horas, e de 1 (uma) hora, no mínimo, para jornadas superiores a 6 (seis) horas (art. 71, caput e §1º, da CLT). Em caso de descumprimento, o trabalhador terá direito à indenização pelo período suprimido, acrescida de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71, §4º, da CLT). Repiso que in casu os intervalos intrajornada estão pré-assinalados nos controles de horário e que sob tal compasso é do reclamante o ônus da prova quanto a não tê-los usufruído (art. 74, §2º, c/c art. 818, I, da CLT). E desse encargo processual no sentir deste Magistrado ele se desincumbiu parcialmente, ainda que não haja espaço para que se acolham as informações contidas na peça vestibular a respeito do gozo de apenas 15 a 20 minutos de intervalo intrajornada. E isso porque a testemunha Márcio Luis Pereira e que foi ouvida a convite do reclamante referiu que levava 15 minutos para ir ao restaurante, 15 minutos se alimentando e 5 minutos para voltar à frente de serviço - totalizando assim um intervalo médio de 30 minutos (00:26:28 a 00:26:44). Tenho que não há qualquer razão específica para que se considere que o retorno à frente de serviço levasse apenas 5 (cinco) minutos se o deslocamento até o refeitório levava 15 (quinze) minutos, de modo que esse último parâmetro é que deve ser considerado em ambos os sentidos. Concluo assim com esteio nas declarações da testemunha Márcio Luís Pereira que o intervalo intrajornada do reclamante era de 45 (quarenta e cinco) minutos - contabilizando-se o deslocamento até o refeitório de 15 (quinze) minutos, o tempo gasto em alimentação de 15 (quinze) minutos, e o tempo de retorno à frente de serviço de 15 (quinze) minutos. Tenho que nessa média arbitrada já se encontram eventuais chamados ao serviço no período de intervalo, uma vez que in casu está apurando-se uma média porque é inviável analisar a questão dia a dia. Diante do exposto, julgo procedente o pedido para condenar a parte reclamada a pagar à parte reclamante indenização de 15 (quinze) minutos por dia de trabalho, observados os seguintes critérios: a) cartões-pontos juntados aos autos quanto aos dias de trabalho, excluídos os períodos em que o reclamante esteve afastado em gozo de benefício previdenciário e considerados os períodos nos quais constam “Trabalho Interno - Plano Crise”, “Ausência Atribuída à Empresa”, e “Marcação Não Registrada”; b) base de cálculo na forma da Súmula nº 264 do TST, considerada a evolução salarial do obreiro, as diferenças salariais por equiparação deferidas no item 5 destes fundamentos e o adicional de periculosidade deferido no item 6 destes fundamentos; c) divisor 220, inexistindo amparo legal ou convencional para que se considere o divisor 180 porque nos turnos administrativos de 8 (oito) horas o reclamante submetia-se aos limites legais de duração do trabalho de 8 (oito) horas diárias e 44 (quarenta e quatro) horas semanais; e d) adicional legal de 50%, uma vez que os adicionais diferenciados previstos em normas coletivas de trabalho dizem respeito às horas extras propriamente ditas e não à indenização pela supressão dos intervalos intrajornada - o qual deve observar o parâmetro legal previsto no art. 71, §4º, da CLT. Visando prevenir a indevida oposição de embargos de declaração, é importante assinalar que a conclusão quanto à irregular supressão dos intervalos intrajornada conduz à conclusão de que o reclamante teve suprimidos 15 (quinze) minutos do intervalo intrajornada e por isso lhe está sendo deferida a respectiva indenização; e de que trabalhou 15 (quinze) minutos no período que deveria ser destinado ao gozo do intervalo intrajornada. Todavia, in casu o que o reclamante postula são as horas extras decorrentes da supressão dos intervalos intrajornada na forma do art. 71, §4º, da CLT, e não as horas extras propriamente ditas pelo labor no período de intervalo. Tanto que o pedido é de “pagamento integral dos intervalos intrajornada suprimidos”, invocando claramente o entendimento da Súmula nº 437, IV, do TST. Tampouco há espaço para que se considere esse período nos minutos residuais acima analisados, pois a respeito deles o autor indicou claro balizador legal de que deveriam ser verificados “conforme restar apurado nos cartões de ponto”. Colocando-se em perspectiva concreta, não se trata de omissão da sentença o não deferimento de horas extras pelo labor no período de intervalo intrajornada e sim da interpretação dada por esse Magistrado à peça vestibular no sentido de que inexiste qualquer pedido nesse sentido. Não há reflexos, em razão da natureza indenizatória da parcela (art. 74, §4º, da CLT). 9. Multa do Art. 467 da CLT Postula o reclamante a multa do art. 467 da CLT. A parte reclamada impugna o pedido. Não há falar em aplicação da multa prevista no art. 467 da CLT, uma vez que sequer há pedido de pagamento de parcelas resilitórias in casu. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido deduzido no item “Z” do rol de pedidos da inicial. 10. Justiça Gratuita A partir da vigência da Lei nº 13.467/2017, o benefício da justiça gratuita pode ser concedido, inclusive de ofício, àqueles que percebam salário igual ou inferior a 40% do teto do Regime Geral da Previdência Social, ou à parte que comprovar insuficiência de recursos para pagamento dos custos do processo, conforme artigo 790, §§ 3º e 4º, da CLT, respectivamente. A parte reclamante anexou aos autos declaração de hipossuficiência (fl. 80), a qual, na esteira do disposto nos artigos 1º da Lei nº 7.115/83 e 99, §3º, do CPC, gera presunção relativa de veracidade de que não possui condições de suportar as despesas processuais e viabilizar o enquadramento no artigo 790, §4º, da CLT. Nesse sentido, a jurisprudência deste Eg. TRT da 3ª Região: “JUSTIÇA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE. Havendo declaração da parte autoral de insuficiência de recursos para recorrer ao Judiciário e à míngua de prova em contrário, defere-se a gratuidade judiciária (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010383-98.2023.5.03.0009” (ROT); Disponibilização: 03/10/2024; Órgão Julgador: Segunda Turma; Relator(a)/Redator(a) Des.Sabrina de Faria F.Leao). “JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA NATURAL. A prova da insuficiência de recursos se dá por todos os meios admitidos em direito, como, por exemplo, a apresentação da CTPS para demonstrar a condição de desempregado, e, como a Lei 13.467/17 não revogou o art. 1º da Lei 7.115/83, a declaração da parte, sob as penas da lei, goza de presunção de veracidade. O art. 99, § 3°, do CPC também admite a prova da insuficiência de recursos por meio de declaração da parte, presumindo-se verdadeira a afirmação de insuficiência da pessoa natural, possibilitando que a declaração seja firmada por seu procurador com poderes específicos (art. 105 do CPC). Tais normas são compatíveis com o processo do trabalho, inclusive o art. 99, § 2º, do CPC, segundo o qual o Juízo somente poderá indeferir o pedido de justiça gratuita se houver elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade” (TRT da 3.ª Região; PJe: 0011328-05.2021.5.03.0026 (ROT); Disponibilização: 03/10/2024; Órgão Julgador: Segunda Turma; Relator(a)/Redator(a) Lucas Vanucci Lins). Logo, cabia à(s) parte(s) demandada(s) o ônus da prova quanto à artificialidade desse documento mediante apresentação de elementos concretos capazes de comprovar que a parte demandante possui condições financeiras de arcar com os custos do processo. E desse encargo processual não se desincumbiu(ram), pois de per si o quantum salarial é insuficiente para tanto. Diante do exposto, defiro à parte reclamante o benefício da justiça gratuita. 11. Honorários Advocatícios Os honorários advocatícios na Justiça do Trabalho estão previstos no artigo 791-A da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/17. Eles devidos no percentual de 5% a 15% sobre o valor da liquidação da sentença ou do proveito econômico obtido – ou não sendo possível mensurar esse último, sobre o valor atualizado da causa –, conforme caput do artigo 791-A da CLT. Visando estabelecer parâmetros para fins de fixação do quantum percentual de honorários advocatícios, prevê o §2º do artigo 791-A da CLT que ao defini-los deverá o Magistrado levar em consideração o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. Fixa a legislação de regência que havendo procedência parcial deverá o Magistrado fixar honorários advocatícios recíprocos, vedando-se a compensação entre os honorários dos profissionais respectivos, conforme §3º do artigo 791-A da CLT. De resto, prevê a legislação que os honorários são devidos igualmente na reconvenção, consoante se extrai do §5º do artigo 791-A da CLT. Diante do exposto, e com esteio nos parâmetros legais acima indicados, defiro o seguinte: a) honorários advocatícios de 10% aos(às) procuradores(as) da parte reclamante, devidos pela parte reclamada, os quais incidirão sobre o crédito do obreiro que resultar da liquidação de sentença; b) honorários advocatícios de 10% aos(às) procuradores(as) da parte reclamada, devidos pela parte reclamante, os quais incidirão sobre os valores atribuídos pela parte reclamante aos pedidos nos quais ela sucumbiu. Cogita-se de sucumbência da parte reclamante em determinado pedido quando ele for julgado improcedente. Se ele é julgado procedente em parte, como nos casos em que o valor fica aquém daquele postulado, considerado que o bem da vida que deu causa à pretensão jurídica justifica a propositura da ação e que não há falar em sucumbência no particular, regendo-se a questão pela aplicação do princípio da causalidade. Quanto à exigibilidade dos honorários de sucumbência devidos pela parte autora à patrona das partes reclamadas, não desconheço que o STF declarou a inconstitucionalidade do artigo 791-A, §4º, por ocasião do julgamento da ADI nº 5.766. Contudo, a meu sentir tal decisão alcança exclusivamente a situação de exigibilidade dos honorários de sucumbência de beneficiários da justiça gratuita e não a obrigação e a responsabilidade pelo pagamento. Dizendo-se de outro modo, a obrigação e a responsabilidade pelo pagamento de honorários de sucumbência pela parte reclamante permanecem no ordenamento jurídico pátrio porque o caput do artigo 791-A da CLT não foi declarado inconstitucional. Já a exigibilidade dos honorários de sucumbência pelo beneficiário da justiça gratuita é que foi extirpada da legislação processual trabalhista, em razão da inconstitucionalidade do artigo 791-A, §4º, da CLT reconhecida pelo STF na ADI nº 5.766. Sob tal compasso, é flagrante que se erigiu lacuna na legislação trabalhista quanto à exigibilidade dos honorários de sucumbência dos beneficiários da justiça gratuita e que a aplicação subsidiária das disposições contidas no CPC a esse respeito é medida que se impõe – com as adequações pertinentes, especialmente quanto ao prazo prescricional de 2 (anos) anos para fins de cobrança e extinção da obrigação. Com esteio na aplicação subsidiária do artigo 98, §3º, do CPC, com as adequações correlatas, fixo que os honorários de sucumbência devidos pela parte reclamante ficarão sob condição suspensiva pelo prazo de 2 (dois) anos, extinguindo-se a obrigação a partir de então e sendo vedado desconto dos créditos referentes a este ou quaisquer outros processos trabalhistas que a parte autora possa vir a ajuizar. 12. Honorários Periciais 12.1. Horas In Itinere A responsabilidade pelo pagamento de honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, exceto se beneficiária da justiça gratuita (art. 790-B, caput, c/c ADI nº 5.766). In casu a parte reclamante foi sucumbente na pretensão objeto da perícia de horas in itinere e lhe foi concedida a justiça gratuita, cabendo à União a responsabilidade pelos honorários periciais. Diante do exposto, presentes a complexidade da matéria, o grau de zelo do profissional designado, o lugar e o tempo para prestação do serviço e as peculiaridades regionais, bem como o limite imposto pelo art. 790-B, §1º, da CLT, arbitro os honorários periciais no quantum de R$ 1.000,00 e fixo que a responsabilidade pelo pagamento é da União. Os honorários periciais serão satisfeitos na forma da da Resolução nº 247/2019 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). 12.2. Doença Ocupacional e Adicionais de Insalubridade/Periculosidade A responsabilidade pelo pagamento de honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, exceto se beneficiária da justiça gratuita (art. 790-B, caput, c/c ADI nº 5.766). In casu houve médica e de adicionais de insalubridade e periculosidade, e a(s) parte(s) reclamada(s) foi(ram) sucumbente(s) na pretensão objeto da perícia, devendo arcar com a responsabilidade do custeio dos honorários periciais. Diante do exposto, e presentes a complexidade da matéria, o grau de zelo do profissional designado, o lugar e o tempo para prestação do serviço e as peculiaridades regionais, arbitro os honorários periciais no quantum de R$ 2.000,00 a cada um dos profissionais que atuaram nos objetos das perícias em epígrafe, e condeno a(s) reclamada(s) a pagá-los. 13. Contribuições Previdenciárias - Descontos Fiscais Os depósitos previdenciários serão realizados pelo reclamado e deverão ser comprovados nos autos, incidindo sobre as verbas que integram o salário de contribuição deferidas nesta sentença, conforme rol do art. 28 da Lei nº 8.212/91. Eles deverão ser apurados mês a mês, na forma do entendimento subjacente à Súmula nº 368 do C. TST, autorizando-se a dedução da corta parte de responsabilidade do empregado. O imposto de renda deverá ser deduzido quando o crédito, de algum modo, ficar disponível ao reclamante, incidindo sobre as parcelas de cunho salariais, excluídos os juros de mora (OJ nº 400 da SDI-1 do TST), utilizando-se o critério mensal para o cálculo, tudo conforme disposto nos artigos 12-A da Lei nº 7.713/98 e regulamentação da Instrução Normativa nº 1.127/2011 da Receita Federal, bem como da jurisprudência do C. TST. 14. Juros e Correção Monetária Os índices de correção monetária e juros de mora deverão seguir os parâmetros definidos pelo STF no julgamento das ADCs nº 58 e 59, já integrados pelos embargos de declaração julgados pelo Plenário Virtual daquela Corte na sessão que se encerrou em 22/10/2021, bem como as alterações introduzidas ao Código Civil pela Lei nº 14.905/24, com vigência a partir de 30/08/2024: a) na fase pré-processual e quando cabível, incidirá o IPCA-E como índice de correção monetária e juros moratórios TRD (art. 39, caput, da Lei nº 8.177/91); b) a partir do ajuizamento da ação e até 29/08/2024, incidirá a Taxa SELIC, nela já compreendidos tanto a correção monetária quanto os juros de mora; c) a partir de 30/08/2024, incidirá o IPCA-E como índice de correção monetária (art. 389, parágrafo único, do CC/02), bem como juros de mora correspondentes à diferença entre a SELIC e o IPCA-E (art. 406, parágrafo único, do CC/02). Fica ressalvada a possibilidade de não incidência de juros de mora (taxa 0), conforme art. 406, §3º, do CC/02, bem como vedada a incidência de juros negativos (E-ED-RR-713-03.2010.5.04.0029, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 25/10/2024). 15. Compensação Tendo em vista que a primeira reclamada não é credora do reclamante, indefiro a compensação requerida em defesa. As deduções estão autorizadas nos tópicos próprios, quando cabíveis. 16. Limites da Condenação Muito embora o entendimento deste Magistrado de que cabe a limitação dos valores da condenação ao quantum indicado na peça vestibular pela parte autora, recentemente o C. TST fixou em julgamento realizado na Seção de Dissídios Individuais 1 (SDI-1) de que a interpretação a ser dada pelo art. 840, §1º, da CLT, não pode conduzir à conclusão de que eventual quantum debeatur a ser apurado em liquidação de sentença fique adstrito aos limites indicados para cada um dos pedidos - não havendo ressalva quanto ao rito processual: "EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT.APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. (...) 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos" (Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 07/12/2023). Diante do exposto, curvo-me ao entendimento exarado pela SDI-1 do C. TST e indefiro o requerimento das partes reclamadas de que eventual quantum debeatur fique adstrito aos valores indicados na peça vestibular. DISPOSITIVO ANTE O EXPOSTO, (i) prejudicialmente ao mérito, pronuncio a prescrição das parcelas anteriores a 09/02/2018 e, relativamente a elas, extingo o processo com resolução do mérito, na forma do artigo 487, II, do CPC/15; e (ii) no mérito, julgo a presente ação trabalhista PROCEDENTE EM PARTE para fins de condenar a(s) parte(s) reclamada(s) VALE S.A. a pagar(em) à parte reclamante JOSEILTON SANTOS, em valores que serão apurados em liquidação de sentença, observados os critérios supra, no prazo legal, as seguintes parcelas: a) indenização por dano moral no quantum de R$ 15.000,00 à época da prolação da sentença (item 3.5 da fundamentação); b) diferenças salariais por equiparação com os paradigmas Fernando Roberto Damasceno, Maicohn Stevan Cruz Fernandez, Regian Oliveira Paula, Amadeu Gervásio dos Santos e César Augusto Carlos Pinto relativamente ao período em que eles exerceram de forma simultânea as funções de Mecânico, Mecânico I, Mecânico II ou Mecânico Especializado, com reflexos em horas extras pagas, adicional noturno pago, férias com acréscimo de 1/3, 13º salários, FGTS acrescido de 40% e PLR - sendo que as incidências de FGTS acrescidas de 40% deverão ser depositadas em conta vinculada e oportunamente liberadas ao reclamante por meio de alvará judicial, observados os parâmetros e os critérios fixados no item 5 da fundamentação; c) adicional de periculosidade a partir de 06/02/2019, com reflexos em horas extras pagas, adicional noturno pago, aviso-prévio indenizado, férias com acréscimo de 1/3, 13º salários e FGTS acrescido de 40% - devendo as incidências de FGTS serem depositadas na conta vinculada e posteriormente liberadas -, observados os parâmetros e os critérios fixados no item 6 da fundamentação; e d) indenização de 15 (quinze) minutos por dia de trabalho, observados os parâmetros e os critérios fixados no item 8.5 da fundamentação. Condeno a reclamada em obrigação de fazer, traduzida na expedição da CAT decorrente da doença ocupacional ora reconhecida, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado e sua intimação para tanto, sob pena de multa de R$ 500,00 por dia em caso de descumprimento, até o limite de R$ 5.000,00 (item 3.6 da fundamentação). Condeno ainda a reclamada a proceder à retificação do PPP do reclamante nos moldes do laudo pericial, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado e sua intimação para tanto, sob pena de multa diária de R$ 500,00, até o limite de R$ 5.000,00, sem prejuízo de majoração na fase processual adequada em caso de resistência ao cumprimento da medida (item 6 da fundamentação). São improcedentes os demais pedidos e requerimentos. O quantum será apurado em liquidação de sentença, observadas as contribuições previdenciárias e fiscais (item 13), os juros e correção monetária (item 14), sem adstrição aos limites do pedido (item 16), integrando o dispositivo os respectivos fundamentos para todos os fins de direito. A parte reclamada pagará custas processuais de R$ 2.000,00, calculadas sobre o valor provisoriamente arbitrado à condenação, de R$ 100.000,00, honorários de sucumbência ao(s) procurador(es) da parte reclamante, à razão de 10% sobre o valor que vier a ser arbitrado em liquidação (item 11); e honorários periciais da Sra. Perita Médica e da Sra. Perita Engenheira, no quantum de R$ 2.000,00 para cada uma das profissionais (item 12.2). Defiro à parte reclamante o benefício da justiça gratuita (item 10). A parte reclamante pagará ao(s) procurador(es) da(s) parte(s) reclamada(s) honorários advocatícios de 10% sobre o valor dos pedidos nos quais sucumbiu, suspensa a exigibilidade (item 11). Os honorários do Sr. Perito que realizou a perícia de horas in itinere foram fixados em R$ 1.000,00 e serão suportados pela União (item 12.1). Ficam as partes cientes da presente sentença por intermédio de seus procuradores, através da publicação no DEJT. Intime-se a União, oportunamente. Intime-se os(as) Srs(as). Peritos(as), oportunamente. Cumpra-se no prazo legal. Nada mais. OURO PRETO/MG, 13 de julho de 2025. FERNANDO BLOS SUNARA Juiz do Trabalho Substituto
Intimado(s) / Citado(s)
- JOSEILTON SANTOS
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