Processo nº 5000074-21.2021.4.03.6108
ID: 294757337
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5000074-21.2021.4.03.6108
Data de Disponibilização:
10/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RYCARDO FERREIRA VELHO MEDEIROS
OAB/SP XXXXXX
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CARLOS ROSSETO JUNIOR
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 1ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000074-21.2021.4.03.6108 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APEL…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 1ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000074-21.2021.4.03.6108 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APELADO: CONSTRUTORA FORTEFIX LTDA, FORTE URBE EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES LTDA., LA SAVINA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS - SPE - LTDA., LORRAINE CAROLINE DE ASSIS Advogado do(a) APELADO: CARLOS ROSSETO JUNIOR - SP118908-A Advogado do(a) APELADO: RYCARDO FERREIRA VELHO MEDEIROS - SP354777-A OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 1ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000074-21.2021.4.03.6108 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APELADO: CONSTRUTORA FORTEFIX LTDA, FORTE URBE EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES LTDA., LA SAVINA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS - SPE - LTDA., LORRAINE CAROLINE DE ASSIS Advogado do(a) APELADO: CARLOS ROSSETO JUNIOR - SP118908-A Advogado do(a) APELADO: RYCARDO FERREIRA VELHO MEDEIROS - SP354777-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Trata-se de ação ajuizada por Lorraine Caroline de Assis em face da Caixa Econômica Federal – CEF, Construtora Fortefix Ltda., Forte Urbe Empreendimentos e Participações Ltda. e La Savina Empreendimentos Imobiliarios - SPE - Ltda., na qual, em razão de alegado inadimplemento, pleiteia: “b) O deferimento da inversão do ônus da prova pelos motivos comentados acima, nos termos do artigo 6º, VIII, da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor); c) A concessão da liminar, baseada no artigo 300 do Código de Processo Civil, para cessar, imediatamente, a cobrança de todos os valores referentes à obra abandonada; d) A procedência do pedido, a fim de rescindir o contrato de pleno direito e condenar as rés, solidariamente, a pagarem, a título de reparação por dano material valor desembolsado para o cumprimento das obrigações contratuais, totalizando R$ 27.629,25 (vinte e sete mil e seiscentos e vinte e nove reais e vinte e cinco centavos); e) A procedência do pedido, condenando as rés, solidariamente, subsidiariamente: e.1) 1% (um por cento) sobre o valor total da venda do imóvel – R$ 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil reais) por mês de descumprimento da obrigação, como lucros cessantes, a contar da previsão de entrega do imóvel (março/2019) até o trânsito em julgado desta demanda, com a devida atualização monetária, nos moldes das regras estatuídas no Manual de Cálculos da Justiça Federal, devendo ser calculado em momento oportuno, isto é, com a sentença do caso; ou e.2) multa de 20% (vinte por cento) sobre os valores pagos até o trânsito, conforme cláusula 12.1 do contrato, a fim de que se inverta a cláusula penal, obedecendo a regra constante no Tema nº 971 do Superior Tribunal de Justiça. f) A procedência do pedido, condenando as rés, solidariamente, a pagarem, a título de reparação por dano moral, a quantia de R$ 23.000,00 (vinte e três mil reais). Em tempo, requer que todos os valores descritos acima sejam atualizados e corrigidos de acordo com o artigo 405 do Código Civil e Súmulas 43 e 364 do Superior Tribunal de Justiça.” O pedido foi julgado procedente, consoante dispositivo que segue: “Posto isso, com amparo no artigo 487, inciso I, do CPC, julgo procedentes os pedidos para: (i) Declarar rescindido o contrato o “Contrato de compra e venda de terreno e mútuo para construção de unidade habitacional, alienação fiduciária em garantia, fiança e outras obrigações – Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV – Recursos do FGTS – com utilização do FGTS do(s) comprador(es)”, n.º 855553841594, firmado em 24 de março de 2017; (ii) Condenar, solidariamente, as requeridas à devolução integral do valor pago – abrangido o valor do FGTS (a ser estornado na conta vinculada), tudo a ser apurado em liquidação de sentença; (iii) Condenar as rés, solidariamente, a reparar os danos morais arbitrados em R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos e remunerados exclusivamente pela variação da taxa SELIC, a partir da data desta sentença, nos termos do artigo 406, do CC de 2002 e (iv) Condenar as rés CONSTRUTORA FORTEFIX LTDA, FORTE URBE EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. e LA SAVINA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS - SPE - LTDA. ao pagamento da multa contratual no percentual de 20% (vinte por cento) do valor pago, nos termos da cláusula 12.1 do contrato Id 44129538 - Pág. 60. As quantias deverão ser corrigidas monetariamente pelo IPCA, desde a data de cada pagamento até a citação, quando serão corrigidas e remuneradas pela variação da taxa SELIC, nos termos do artigo 406, do CC de 2002. Condeno as requeridas sucumbentes, solidariamente, ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor da condenação. Custas pelas requeridas. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, observadas as formalidades legais. Eficácia imediata da sentença Demonstrada a inadimplência absoluta do contrato, concedo a tutela de urgência, e acresço o seguinte: (i) suspendo, a partir desta data, a exigibilidade das parcelas vincendas e quaisquer pagamentos relativos ao contrato firmado, inclusive os juros de obra, independentemente de depósito judicial; e (ii) determino que as requeridas se abstenham de protestar ou negativar o nome da autora junto aos órgãos de proteção ao crédito até final solução da presente demanda ou decisão em contrário.” Apelou a CEF, aduzindo, em preliminar, que não é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, por ter “exclusivamente como agente financeiro decorrente da concessão de empréstimo ao comprador – pois não vendeu nem se comprometeu a construir o imóvel em determinado prazo, constatando-se de plano, que a responsabilidade pelo cumprimento do cronograma de construção é apenas da construtora/incorporadora”. No mérito, insurge-se quanto à condenação em danos materiais e morais. Pugna pela reforma da sentença e a total procedência do pedido. Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta Corte. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 1ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000074-21.2021.4.03.6108 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APELADO: CONSTRUTORA FORTEFIX LTDA, FORTE URBE EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES LTDA., LA SAVINA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS - SPE - LTDA., LORRAINE CAROLINE DE ASSIS Advogado do(a) APELADO: CARLOS ROSSETO JUNIOR - SP118908-A Advogado do(a) APELADO: RYCARDO FERREIRA VELHO MEDEIROS - SP354777-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Da legitimidade passiva ad causam da Caixa Econômica Federal – CEF. Com referência à responsabilidade da CEF para responder pelo descumprimento contratual relativo ao atraso na construção e entrega de imóvel vinculado a empreendimento financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, há que se distinguir duas situações, consoante jurisprudência sedimentada: 1ª) A CEF é parte legítima e pode responder, solidariamente, pelo descumprimento contratual, nas hipóteses em que tenha atuado na escolha da construtora, elaboração do projeto, execução ou fiscalização das obras do empreendimento ou opere como gestor de recursos e agente executor de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda; 2ª) não se reconhece a legitimidade passiva ad causam da CEF, caso esta instituição funcione como agente financeiro em sentido estrito, responsável, apenas, pelo financiamento da aquisição do imóvel já edificado e em nome de terceiro. Nesse sentido, destaco o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS. AFRONTA AO ART. 535 DO CPC/73. VÍCIO NÃO INDICADO. SÚMULA Nº 284/STF. TESES REFERENTES À MULTA CONTRATUAL E JUROS, COMISSÃO DE CORRETAGEM, RESSARCIMENTO DOS ALUGUEIS E DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS Nº 211/STJ E Nº 282/STF. PROGRAMA HABITACIONAL MINHA CASA MINHA VIDA. CEF. NATUREZA DAS ATIVIDADES. AGENTE FINANCEIRO. SEM LEGITIMIDADE PASSIVA. SÚMULA Nº 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. A alegação de afronta ao art. 535 do CPC/73 sem indicar em que consistiria o vício, consubstancia deficiência bastante a inviabilizar a abertura da instância especial, atraindo a incidência da Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal. 2. A ausência de prequestionamento, mesmo implícito, impede a análise da matéria na via especial. Súmulas nº 211/STJ e nº 282/STF. 3. A Caixa Econômica Federal somente possui legitimidade passiva para responder por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis objeto do Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida se, à luz da legislação, do contrato e da atividade por ela desenvolvida, atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, sendo parte ilegítima se atuar somente como agente financeiro. Súmula nº 83/STJ. 4. Agravo interno não provido.” (STJ, Quarta Turma, AgInt no REsp 1.646.130/PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 30/08/2018, DJe de 04/09/2018) Ressalto, adicionalmente, que, no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para que se configure a responsabilidade da CEF por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis, e, por consequência, a sua legitimidade para compor lides a esse respeito, é necessário que a instituição financeira tenha atuado seja na construção do imóvel, seja na elaboração do projeto, sua execução ou fiscalização das obras do empreendimento, ou, ainda, que o contrato esteja relacionado ao Programa de Arrendamento Residencial (PAR), com recursos advindos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). In casu, a autora firmou com a CEF, em 24/03/2017, contrato para “compra e venda de terreno e mútuo para construção de unidade habitacional, alienação fiduciária em garantia, fiança e outras obrigações”, em empreendimento integrante do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, recursos do FGTS com utilização de recursos da conta vinculada do FGTS do comprador, tendo por objeto o apartamento nº 702-B do Residencial La Savina, em Lençois Paulista/SP (ID 275930915, p. 73/94). Em 27/03/2017, celebrou com a LA Savina Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda., “instrumento particular de compromisso de reserva de fração ideal a que corresponderá unidade autônoma futura para venda e compra, confissão de dívida, promessa de contratação, financiamento e outras avenças”, referente ao mesmo imóvel (ID 275930915, p. 60/71). Das cláusulas do contrato entabulado com a CEF, é nítida a atuação desta instituição tanto na fiscalização das obras do empreendimento, como na gestão dos recursos. Coube à CEF, dentre outras atribuições: condicionar a liberação dos recursos ao andamento das obras, no percentual atestado no Relatório de Acompanhamento do Empreendimento - RAE, conforme o cronograma físico-financeiro aprovado por essa instituição (cláusula 2ª); o acompanhamento da execução das obras, a ser efetuado por sua equipe de engenharia, para fins de liberação de parcelas, e a entrega da última parcela para construção do empreendimento condicionada à verificação da conclusão total da obra e de que nela foram investidas todas as parcelas anteriormente entregues (item 4.14). Além disso, a CEF figura como garante da escorreita consecução da obra de engenharia, na medida em que obriga a contratação de seguro pela construtora para o término da obra, com cobertura para “a substituição da construtora, a retomada, a finalização das obras e a legalização do empreendimento, cuja vigência deve ser mantida até 60 dias após o final da obra” (item 24.8). Dessa forma, a CEF é parte legítima para figurar no polo passivo da presente demanda. Nesse sentido, os seguintes julgados desta Primeira Turma: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. MÚTUO HABITACIONAL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. AGENTE FINANCEIRO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. APELO PROVIDO. 1. No caso em questão, foram firmados dois contratos: o primeiro com a Construtora e Incorporadora, consistente no 'Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Unidade autônoma condominial'; e o segundo, firmado com a CEF, consistente no 'Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo Para Construção de Unidade Habitacional Com Fiança, Alienação Fiduciária em Garantia e outras Obrigações - Apoio À Produção De Habitações e Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV - Recurso FGTS'. 2. A CEF não se limitou a atuar como mero agente financeiro, na medida em que também operou como agente executor de política federal de promoção de moradia popular e fiscalizador do andamento da obra, razão pela qual deve integrar o polo passivo da demanda. 3. Consta no instrumento contratual firmado com a CEF, que a construção do empreendimento 'Condomínio Residencial Quinta das Figueiras', do qual faz parte a unidade imobiliária adquirida pelo Apelante, recebeu subsídios do Governo Federal por intermédio do Programa "Minha Casa, Minha Vida", funcionando a Caixa Econômica Federal, na qualidade de gestora do FGTS, como agente operador do programa e, portanto, co-responsável pela conclusão das obras de construção da casa própria que financia, posto que fiscalizadas permanentemente pela Instituição Financeira, havendo inclusive acerto contratual que vincula a liberação do capital ao andamento do cronograma físico-financeiro. 4. Assim, se a CEF foi a financiadora da construção de todo o empreendimento imobiliário, com recursos do FGTS, deve também se responsabilizar pelo cumprimento do prazo de entrega da obra. 5. Aplica-se na hipótese, o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que possui legitimidade passiva a Caixa Econômica Federal para responder, nos casos em que não atua apenas como agente financeiro, "por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis objeto do Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida se, à luz da legislação, do contrato e da atividade por ela desenvolvida, atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda (...)" (AgInt no REsp 1646130/PE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 30/08/2018, DJe 04/09/2018). 6. Uma vez caracterizada a legitimidade passiva da CEF na relação jurídica dos autos, na medida em que eventual rescisão do contrato de compra e venda do imóvel poderá repercutir no contrato de financiamento do imóvel objeto da lide, deve ser reconhecida a competência da Justiça Federal para julgar e processar o feito, nos termos do artigo 109, inciso I da Constituição Federal. 7. Apelação a que se dá provimento, a fim de anular a sentença guerreada, e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para o devido processamento.” (ApCiv 0006991-44.2016.4.03.6100, Rel. Des. Federal Wilson Zauhy, j. em 07/02/2020, e - DJF3 Jud. 1 de 12/02/2020, grifos nossos) “AGRAVO DE INSTRUMENTO. ATRASO EM ENTREGA DE OBRA. INDENIZAÇÃO MENSAL. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. AGENTE EXECUTOR DE POLÍTICAS FEDERAIS DE HABITAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. No processo originário, os requerentes alegam que na data de 28/04/2015 firmaram contrato de compra e venda de terreno com ENGECORP, mútuo de construção de apartamento, vaga de garagem e cessão de fração ideal da terra e constituição de garantia mediante alienação fiduciária de imóvel (contrato nº 8.5555.3284143), com previsão de 24 meses para entrega da obra, cujo termo findou-se em 29/04/2017, admitida uma prorrogação de até 180 dias úteis por ocorrência de caso fortuito, força maior ou fatos estranhos à vendedora, entretanto inocorreu a respectiva tradição. Compulsando o feito, se afere que o contrato carreado foi elaborado pela própria CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF, pelo qual se verifica revestir-se do poder de fiscalização da obra, além de agente executor de políticas federais para promoção de moradia de baixa renda, o que impõe inclusive responsabilidade por eventuais vícios de construção. Neste sentido, precedentes do STJ e da 1ª Turma desta Corte Regional. Frise-se que as partes celebraram com a instituição bancária aquisição de terreno e construção imobiliária, com o mútuo acordado e alienação fiduciária em garantia no âmbito do Programa de Apoio à Produção de Habitações e Programa Carta de Crédito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, no Sistema Financeiro de Habitação - SFH. A indenização por danos materiais arbitrada não se consubstancia em lucros cessantes, mas sim danos emergentes, já que, uma vez frustrada a possibilidade do pleno exercício dos poderes de que dispõe o proprietário do bem, este precisou mobilizar sua renda e patrimônio para viver em outro imóvel, sendo certo que ninguém desfruta de habitação sem custos, quer seja às suas próprias custas ou de terceiros, como na hipótese de residência com outros familiares. In casu, fixada com moderação pelo Juízo de origem. Agravo de instrumento a que se nega provimento." (AI 5008873-49.2018.4.03.0000, Rel. Juíza Federal Convocada Denise Avelar, julgado em 22/04/2020, e - DJF3 Jud. 1 de 27/04/2020, grifos nossos) No mérito, versa o caso sobre o pedido de rescisão dos contratos celebrados entre as partes, com a restituição dos valores pagos pela autora e indenização por danos morais, tendo como fundamento o atraso na entrega da obra. Do Código de Defesa do Consumidor. A relação jurídica contratual em discussão sujeita-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), consoante entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal (ADI nº 2591, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 7/6/06, DJ 29/9/06, Rel. para acórdão Min. Eros Grau) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297). Disciplina o artigo 6º, incisos VI e VII, do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;” O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor preceitua, inclusive, que o fornecedor de serviços responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor decorrentes de defeitos na prestação do serviço (teoria do risco do empreendimento). Sendo objetiva a responsabilidade, não se perquire a existência ou não de culpa na prestação do serviço, mas apenas do nexo de causalidade entre a conduta e o dano sofrido nas relações consumeristas. Sob outro prisma, nos termos do art. 7º, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, as rés devem solidariamente responder pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à responsabilidade solidária entre a construtora e o agente financeiro para responder pelo atraso na conclusão da obra e entrega do imóvel, quando este atua na qualidade de agente executor e operador de políticas federais para a promoção de moradia para consumidores de baixa renda, como ocorre na espécie: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA E DE MÚTUO. EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO DO PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA E NA ENTREGA DO IMÓVEL. CLÁUSULA PENAL MORATÓRIA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. CUMULAÇÃO COM LUCROS CESSANTES. INVIABILIDADE. REEXAME DE DANOS MORAIS. MATÉRIA DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7 DO STJ. ATRASO NA CONSTRUÇÃO E ENTREGA DO IMÓVEL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE A CONSTRUTORA E AGENTE FINANCEIRO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Embora rejeitados os embargos de declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente. 2. No presente caso, a Caixa Econômica Federal tem legitimidade passiva para responder solidariamente com a incorporadora, nas causas em que se pleiteia a indenização por atraso na entrega do imóvel quanto também tiver participado na qualidade de agente executor e operador de políticas federais para a promoção de moradia para consumidores de baixa renda. Precedentes. 3. A alegação de omissão quanto à análise dos argumentos dos diversos tipos de contratos e modalidades de financiamento do PMCMV - PNHUV, que alegadamente levaria ao reconhecimento da ilegitimidade passiva ad causam da CAIXA, e que configurariam a violação ao art. 535 do CPC de 1973 não foi abordada nas razões do apelo especial, nem tão pouco nos embargos declaratórios, acarretando, no ponto, verdadeira inovação recursal, o que obsta o conhecimento desta matéria quando suscitada apenas em sede de agravo interno. 4. Agravo interno não provido.” (Quarta Turma, AIREsp 1606103/RN 2016.01.53327-5, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, j. em 21/11/2019, DJE de 27/11/2019) No mesmo sentido, a jurisprudência de ambas as Turmas da Primeira Seção desta Corte: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO PRIVADO. APELAÇÃO. CONHECIMENTO EM PARTE. RAZÕES DISSOCIADAS. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE CEF E CONSTRUTORA. DANOS MORAIS. SUCUMBÊNCIA. 1. Preliminarmente, observa-se que a sentença condenou a CEF a pagar solidariamente indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00, sendo impertinentes e dissociadas as razões recursais, que extrapolam o limite da sucumbência, ao veicular discussão de que os mutuários são solidariamente responsáveis pela dívida junto à CEF e de que são indevidas devolução de valores pagos durante construção ou indenização de danos materiais. 2. Verificado atraso na entrega da obra vinculado ao Programa Minha Casa Minha Vida, em que a atuação da CEF não foi a de mero agente financeiro, mas de ente executor de política federal de promoção de moradia popular e fiscalizador da execução da obra, inclusive com controle técnico, financeiro e operacional sobre o curso da construção, a empresa pública federal é parte legítima para responder por danos suportados em razão do evento lesivo materializado. 3. É firme a jurisprudência da Corte Superior e desta Turma no sentido de que é solidária a responsabilidade da CEF, como agente de promoção do programa de moradia popular, quanto à inexecução e danos causados pela construtora, na entrega de obras, por atraso no cronograma ou falha nas especificações técnicas contratadas, respondendo, pois, pelos danos morais apurados. 4. Pela sucumbência recursal, a apelante deve suportar condenação adicional, nos termos do artigo 85, § 11, CPC, no equivalente a 5% do valor da causa atualizado, a ser acrescida à sucumbência fixada pela sentença pelo decaimento na instância de origem. 5.Apelação conhecida em parte e, nesta extensão, desprovida.” (Primeira Turma, ApCiv 0011690-15.2015.4.03.6100, Rel. Des. Federal Carlos Muta, j. em 25/10/2023, DJEN de 30/10/2023, grifos nossos) “CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE CEF E CONSTRUTORA. ATUAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA COMO AGENTE PROMOTOR DE POLÍTICA PÚBLICA HABITACIONAL. DANOS MORAIS E MATERIAIS DEVIDOS. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. A relação jurídica estabelecida entre as partes litigantes se caracteriza como de consumo, sendo regulamentada, portanto, pelo Código de Defesa do Consumidor. Estabelecida a aplicabilidade do CDC para a hipótese tratada nestes autos, cumpre ressaltar que, de acordo com a legislação consumerista, as empresas que formam a cadeia de fornecimento respondem de forma solidária pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviço, nos termos estipulados pelo artigo 14 do CDC. 2. Por conseguinte, insta consignar que, contrariamente ao aduzido em razões de apelação, a CEF possui responsabilidade solidária no que concerne aos problemas de atraso na entrega do imóvel em questão. Isso porque, in casu, a instituição financeira não se limitou a atuar como agente financeiro; ao contrário, operou como agente executor de política pública federal de promoção de moradia popular e fiscalizador do andamento da obra, razão pela qual, além de ser parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, também é responsável solidariamente pelos vícios de construção e/ou atraso na entrega do imóvel. 3. Observo, da análise do instrumento contratual citado, que a construção do empreendimento do qual faz parte a unidade imobiliária adquirida pela autora, recebeu subsídios do Governo Federal por intermédio do Programa Minha Casa Minha Vida, funcionando a Caixa Econômica Federal como agente operador do programa, atuando com controle técnico, financeiro e operacional sobre o andamento da construção do empreendimento. 4. Assim, demonstrado está, de modo claro e inequívoco, o papel central da CEF na consecução do empreendimento e do cronograma de obras, não havendo como afastar sua responsabilidade pelos danos advindos de vícios de construção ou de atraso no desenvolvimento da construção. 5. Desse modo, caracterizado o atraso na entrega do imóvel, respondem solidariamente todos os que tenham intervindo de alguma forma na relação de consumo, e participado, direta ou indiretamente, para ocorrência do inadimplemento contratual, independentemente de culpa, nos termos do art. 14 e 18 do Código de Defesa do Consumidor. 6. Inequívoca, portanto, a responsabilidade solidária da CEF pelas consequências advindas do atraso na entrega do imóvel adquirido pela parte autora. 7. Pugna a corré CEF pela exclusão, ou, subsidiariamente, pela redução da indenização por danos morais - arbitrada pela magistrada sentenciante em R$ 10.000,00 (dez mil reais) - sob o argumento de que, a uma, não cometeu qualquer ato ilícito que justifique a condenação e, a duas, o montante arbitrado é excessivo. Não merece guarida a argumentação expendida, ressaltando-se que a responsabilidade solidária da CEF pelo atraso na entrega do imóvel já está devidamente fundamentada. 8. Especificamente quanto ao dano moral, anoto que o artigo 5º, inciso X da Constituição Federal garante, expressamente, a todos que sofram violação do direito à imagem, à intimidade, à vida privada e à honra, a indenização por danos morais. Dano moral, de acordo com a melhor doutrina e com o entendimento sedimentado nas cortes superiores, é a lesão a direito da personalidade. Em outros termos: corresponde a toda violação ao patrimônio imaterial da pessoa no âmbito das suas relações de direito privado. 9. Não se confunde, no entanto, e nem poderia, sob pena de banalização do instituto, com acontecimentos cotidianos que, apesar de incomodarem, não têm aptidão para atingir, de forma efetiva, direitos da personalidade. Tais acontecimentos têm sido tratados, com acerto, pela jurisprudência, como "meros aborrecimentos", inafastáveis na sociedade contemporânea, devendo ser suportados por seus integrantes, ou punidos administrativamente, para que o instituto do dano moral não perca seu real sentido, sua verdadeira função: compensar o lesado pela violação a direitos de personalidade. 10. A despeito de conhecer a tese do C. STJ no sentido de que o mero descumprimento contratual de atraso na entrega de obra não gera, em regra, danos morais, entendo que, no presente caso, os elementos dos autos evidenciam que a não entrega do imóvel dentro do prazo estipulado maculou a esfera extrapatrimonial de direitos da autora. Forçoso reconhecer que, no caso dos autos, o imóvel tinha previsão de entrega, considerado o prazo de tolerância, para janeiro de 2015 e, até o presente momento, inexiste nos autos notícia de que as chaves tenham sido entregues à autora. Não há como se desvencilhar da repercussão causada à adquirente pelo atraso substancial na entrega de imóvel, pois adia planos, frustra expectativas, e impõe à compradora transtornos que ultrapassam, e muito, a esfera do mero aborrecimento. 11. Consequentemente, diante do longo lapso temporal decorrido desde a data prevista para a conclusão das obras e entrega do imóvel, entendo razoável o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) arbitrado pela magistrada em primeiro grau a título de indenização por danos morais, valor que não se mostra excessivo ante as circunstâncias do caso concreto, estando de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 12. Não assiste razão ao recorrente quanto à alegação de “... improcedentes o pedido de repetição de indébito, pois como o contrato foi cumprido regularmente pela Ré, não existe excedente a favor da parte autora. Conseqüentemente não há crédito a favor daquela. Sendo assim, descabe a repetição”. Compulsando os autos, observa-se ocorrência de atraso no cumprimento da obrigação, cabendo restituição dos valores pagos pela parte autora. 13. Apelação desprovida. Honorários majorados.” (Primeira Turma, ApCiv 5000357-84.2017.4.03.6140, Rel. Juiz Federal Conv. Renato Becho, j. em 30/03/2023, intimação via sistema em 13/04/2023, grifos nossos) “APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA COM A CONSTRUTORA. LUCROS CESSANTES. MULTA MORATÓRIA. RECURSO PROVIDO. 1. A atuação da CEF não se restringiu às atividades típicas de mero agente financeiro em sentido estrito, mas, sim, como agente executor de política pública habitacional federal, pois consta expressamente do contrato de financiamento a obrigação e o interesse da CEF em fiscalizar o andamento da obra, como se infere do item 4.4 da cláusula quarta e cláusula quinta do contrato. 2. A jurisprudência tem admitido a legitimidade passiva e a responsabilidade civil solidária da CEF com o construtor do imóvel. Precedentes. 3. Reconhecida que é solidária a responsabilidade civil entre o banco apelado e as corrés quanto ao descumprimento do prazo de entrega do imóvel, bem como a condenação solidária destes ao pagamento das indenizações fixadas. 4. No caso, entendo ser devida a indenização por lucros cessantes, que ora fixo no importe de 0,5% do valor atualizado do imóvel por mês de atraso até a efetiva entrega do imóvel. Em vista da responsabilidade solidária da CEF, da construtora e da incorporadora, é forçoso concluir que elas deverão arcar com aludida indenização. 5. Acolhido o pedido dos autores de arbitramento da multa moratória, pois havendo previsão contratual de multa tão somente em face do inadimplemento do adquirente, é cabível a inversão da cláusula penal em favor dos apelantes, sendo a multa moratória devida em seu favor pelo período do atraso da entrega do imóvel, no percentual de 2% sobre o valor do contrato, a título de atraso na entrega da obra, contado a partir do prazo original estabelecido (23.12.2018). 6. Excluídos os honorários de sucumbência em favor dos patronos da CEF, uma vez reconhecida a responsabilidade solidária da empresa pública com os demais Apelados, inclusive no tocante à condenação ao pagamento das custas processuais e da verba honorária fixada em face das corrés. 7. Apelação da parte autora provida.” (Segunda Turma, ApCiv 5003386-67.2019.4.03.6110, Rel. Des. Federal Luiz Paulo Cotrim Guimaraes, j. em 15/12/2022, DJEN de 19/12/2022, grifos nossos) Cumpre, assim, aferir, de acordo com os elementos dos autos, se houve atraso injustificável na entrega da obra e se ocorreram danos patrimonial e moral indenizáveis. Do prazo para entrega do imóvel. O prazo de entrega do imóvel foi ajustado em ambos os contratos celebrados pela autora. O instrumento contratual firmado em 27/03/2017 com a LA Savina Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda., estimou o prazo de 24 (vinte e quatro) meses para a conclusão das obras e a consequente entrega das unidades autônomas do empreendimento, contados a partir da data de assinatura do contrato de financiamento com a CEF, podendo ser prorrogado por até 180 (cento e oitenta) dias, desde que devidamente justificados, por caso fortuito ou força maior (cláusula 7ª) (ID 275930915, p. 60/71). Por sua vez, estipula o contrato de financiamento (ID 275930915, p. 73/94): “4.9. O prazo para o término da construção e legalização do imóvel é aquele constante na Letra B.8.2, podendo ser prorrogado, uma única vez, em até 6 (seis) meses, quando restar comprovado caso fortuito, força maior ou outra situação excepcional superveniente à assinatura do Contrato, que tenha efetiva interferência no ritmo de execução da obra, mediante análise técnica e autorização da CAIXA, sempre que a medida se mostrar essencial a viabilizar a conclusão do empreendimento”. O item B.8.2 prevê o prazo de 25 (vinte e cinco) meses para construção/legalização do empreendimento (ID 275930915, p. 74). De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a denominada “cláusula de tolerância” em contratos dessa espécie - que prevê a possibilidade de atraso na entrega do imóvel - não é abusiva, desde que o prazo máximo de prorrogação não ultrapasse 180 (cento e oitenta) dias. Confira-se: “RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. ATRASO DA OBRA. ENTREGA APÓS O PRAZO ESTIMADO. CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. VALIDADE. PREVISÃO LEGAL. PECULIARIDADES DA CONSTRUÇÃO CIVIL. ATENUAÇÃO DE RISCOS. BENEFÍCIO AOS CONTRATANTES. CDC. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. OBSERVÂNCIA DO DEVER DE INFORMAR. PRAZO DE PRORROGAÇÃO. RAZOABILIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia a saber se é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção, a qual permite a prorrogação do prazo inicial para a entrega da obra. 2. A compra de um imóvel "na planta" com prazo e preço certos possibilita ao adquirente planejar sua vida econômica e social, pois é sabido de antemão quando haverá a entrega das chaves, devendo ser observado, portanto, pelo incorporador e pelo construtor, com a maior fidelidade possível, o cronograma de execução da obra, sob pena de indenizarem os prejuízos causados ao adquirente ou ao compromissário pela não conclusão da edificação ou pelo retardo injustificado na conclusão da obra (arts. 43, II, da Lei nº 4.591/1964 e 927 do Código Civil). 3. No contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção, além do período previsto para o término do empreendimento, há, comumente, cláusula de prorrogação excepcional do prazo de entrega da unidade ou de conclusão da obra, que varia entre 90 (noventa) e 180 (cento e oitenta) dias: a cláusula de tolerância. 4. Aos contratos de incorporação imobiliária, embora regidos pelos princípios e normas que lhes são próprios (Lei nº 4.591/1964), também se aplica subsidiariamente a legislação consumerista sempre que a unidade imobiliária for destinada a uso próprio do adquirente ou de sua família. 5. Não pode ser reputada abusiva a cláusula de tolerância no compromisso de compra e venda de imóvel em construção desde que contratada com prazo determinado e razoável, já que possui amparo não só nos usos e costumes do setor, mas também em lei especial (art. 48, § 2º, da Lei nº 4.591/1964), constituindo previsão que atenua os fatores de imprevisibilidade que afetam negativamente a construção civil, a onerar excessivamente seus atores, tais como intempéries, chuvas, escassez de insumos, greves, falta de mão de obra, crise no setor, entre outros contratempos. 6. A cláusula de tolerância, para fins de mora contratual, não constitui desvantagem exagerada em desfavor do consumidor, o que comprometeria o princípio da equivalência das prestações estabelecidas. Tal disposição contratual concorre para a diminuição do preço final da unidade habitacional a ser suportada pelo adquirente, pois ameniza o risco da atividade advindo da dificuldade de se fixar data certa para o término de obra de grande magnitude sujeita a diversos obstáculos e situações imprevisíveis. 7. Deve ser reputada razoável a cláusula que prevê no máximo o lapso de 180 (cento e oitenta) dias de prorrogação, visto que, por analogia, é o prazo de validade do registro da incorporação e da carência para desistir do empreendimento (arts. 33 e 34, § 2º, da Lei nº 4.591/1964 e 12 da Lei nº 4.864/1965) e é o prazo máximo para que o fornecedor sane vício do produto (art. 18, § 2º, do CDC). 8. Mesmo sendo válida a cláusula de tolerância para o atraso na entrega da unidade habitacional em construção com prazo determinado de até 180 (cento e oitenta) dias, o incorporador deve observar o dever de informar e os demais princípios da legislação consumerista, cientificando claramente o adquirente, inclusive em ofertas, informes e peças publicitárias, do prazo de prorrogação, cujo descumprimento implicará responsabilidade civil. Igualmente, durante a execução do contrato, deverá notificar o consumidor acerca do uso de tal cláusula juntamente com a sua justificação, primando pelo direito à informação. 9. Recurso especial não provido.” (Terceira Turma, REsp 1.582.318/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. em 12/09/2017, DJe de 21/09/2017) No mesmo sentido: Terceira Turma, REsp 1.727.939/DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/09/2018, DJe de 17/09/2018; Quarta Turma, AgInt no REsp 1.698.519/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 20/09/2018, DJe de 26/9/2018 e Terceira Turma, REsp 1.454.139/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/06/2014, DJe de 17/6/2014. Segue a mesma orientação, a Primeira Turma desta Corte: “CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE TERRENO E CONSTRUÇÃO DE BEM IMÓVEL. FINANCIAMENTO PELA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. PRAZO DE ENTREGA DE OBRA. CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE DESDE QUE NÃO ULTRAPASSE 180 DIAS. IMÓVEL QUE FOI ENTREGUE NO PRAZO CONTRATUAL. TAXA DE OBRA. COBRANÇA DEVIDA. TAXA DE CORRETAGEM INDEVIDA. FALTA DE COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. CADASTRO DE DEVEDORES. FALTA DE PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA A SUSPENSÃO DA INSCRIÇÃO DO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL. 1. Em 11/11/2017 foi celebrado entre a autora e a corré Condomínio UP CLUB - SPE Ltda. o "Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Bem Imóvel e Outros Pactos". Referido contrato previa prazo de conclusão da obra em 24 meses a contar da data de assinatura de contrato de financiamento a ser celebrado entre a autora e a CEF. O item 2.4.1.1 autoriza uma tolerância de 180 dias do prazo constante no item 2.4.1. 2. Por sua vez o contrato de financiamento foi firmado com a CEF em 06/07/2018 prevendo prazo de conclusão de 26 meses a contar da data de sua assinatura, com prazo de tolerância de seis meses. 3. Saliente-se, nesse ponto, que a jurisprudência do C. STJ entende que a presença da denominada 'cláusula de tolerância' em contratos desse jaez - que prevê a possibilidade de atraso na entrega do imóvel - não é abusiva, desde que o prazo máximo de prorrogação não ultrapasse 180 (cento e oitenta) dias. 4. Aplicando-se as datas estabelecidas em ambos os contratos se verifica que não houve atraso na entrega do imóvel. De acordo com o contrato de compromisso de compra e venda as obras deveriam ser concluídas em julho de 2020, e, contando com o prazo de tolerância, janeiro de 2021. Se considerarmos o prazo de entrega do contrato de financiamento as obras deveriam ser concluídas em setembro de 2020, e, contando com o prazo de tolerância, março de 2021. 5. Os documentos acostados aos autos comprovam que as chaves do imóvel estavam disponíveis em janeiro de 2021 e que para que a autora tivesse acesso deveria adimplir as parcelas em atraso no valor de R$ 18.038,48. Assim, não procede a alegação de que houve atraso na entrega do empreendimento, tampouco o pedido de devolução das parcelas pagas. (...) 18. Recurso desprovido.” (ApCiv 5000165-08.2021.4.03.6110, Rel. Des. Federal Helio Nogueira, julgado em 18/04/2023, Intimação via sistema em 20/04/2023) “AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATOS. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA VERIFICADO. INCLUSÃO DE NOME EM CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO AGRAVADA REFORMADA. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Considerando o prazo de 36 meses previsto no contrato celebrado com a construtora, bem como a possibilidade de prorrogação por mais 180 dias, tem-se que o prazo final para conclusão do empreendimento em debate se encerraria em abril de 2020. 2. Ademais, reconhecem os próprios agravantes que em Assembleia Geral Ordinária realizada em 07.07.2019 com os representantes da construtora restou acordada nova prorrogação do prazo de entrega para maio de 2020, inexistindo elementos que confirmem a alegação de que tal data fora imposta pela construtora, tendo em vista a presença de representantes de 120 unidades habitacionais. 3. Tendo em vista a informação dos agravantes de que a obra ainda não está concluída no presente momento, é medida que se impõe a suspensão do contrato e da exigibilidade da cobrança das parcelas correlatas. (...) 5. Agravo parcialmente provido para suspender o contrato e a exigibilidade da cobrança das parcelas correlatas, bem como impedir a inclusão e negativação do nome dos agravantes em cadastros de inadimplentes até final julgamento do feito de origem.” (AI 5007044-62.2020.4.03.0000, Rel. Des. Federal Wilson Zauhy Filho, j. em 22/03/2021, DJEN de 05/04/2021) “CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO FIRMADO NO ÂMBITO DO SFH. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DA CEF E DA CONSTRUTORA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. ILICITUDE DA COBRANÇA DE JUROS DE OBRA OU TAXA DE CONSTRUÇÃO APÓS O PERÍODO CONTRATUALMENTE PREVISTO PARA ENTREGA DAS CHAVES COM INCLUSÃO DO PERÍDO DE TOLERÊNCIA. ENTENDIMENTO FIRMADO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE DETERMINOU A RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS A TAL TÍTULO. HONORÁRIOS ESTIPULADOS EM VALOR FIXO. IMPOSSIBILIDADE. PREVISÃO LEGAL DE ARBITRAMENTO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (...)3. O. C. Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do Recurso Especial 1.729.593/SP, apreciou o Tema Repetitivo 996 e firmou a tese de que, nos contratos de aquisição de imóvel, mediante contrato de financiamento, firmados no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida - e também nos celebrados na seara do Sistema Financeiro da Habitação, ante a similitude dos regimes jurídicos que disciplinam tais avenças -, é ilícita cobrança de juros de obra após o prazo previsto para a entrega das chaves, com inclusão do período de tolerância. 4. No caso dos autos, observo que a r. sentença ora recorrida está de acordo com o entendimento firmado no âmbito do C. STJ, pois determinou a restituição dos valores pagos a título de taxa de construção tão somente pelo período que extrapolou o prazo contratualmente previsto para a entrega do imóvel, com o acréscimo do prazo de tolerância de 180 dias. 5. Desse modo, estando o entendimento esposado pela sentença de acordo com a jurisprudência pacificada no STJ, impõe-se sua manutenção, no ponto. (...) 7. Apelação parcialmente provida.” (ApCiv 0003912-19.2014.4.03.6103, Rel. Des. Federal Hélio Nogueira, j. em 14/10/2020, e - DJF3 Jud. 1 de 19/10/2020, grifos nossos) Cumpre ressaltar que a validade da “cláusula de tolerância” foi incorporada ao nosso sistema jurídico – para os contratos futuros – pela Lei nº 13.786/2018, que acrescentou o art. 43-A na Lei nº 4.591/64: “Art. 43-A. A entrega do imóvel em até 180 (cento e oitenta) dias corridos da data estipulada contratualmente como data prevista para conclusão do empreendimento, desde que expressamente pactuado, de forma clara e destacada, não dará causa à resolução do contrato por parte do adquirente nem ensejará o pagamento de qualquer penalidade pelo incorporador. § 1º Se a entrega do imóvel ultrapassar o prazo estabelecido no caput deste artigo, desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, poderá ser promovida por este a resolução do contrato, sem prejuízo da devolução da integralidade de todos os valores pagos e da multa estabelecida, em até 60 (sessenta) dias corridos contados da resolução, corrigidos nos termos do §8º do art. 67-A desta Lei. § 2º Na hipótese de a entrega do imóvel estender-se por prazo superior àquele previsto no caput deste artigo, e não se tratar de resolução do contrato, será devida ao adquirente adimplente, por ocasião da entrega da unidade, indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso, pro rata die, corrigido monetariamente conforme índice estipulado em contrato. § 3º A multa prevista no § 2º deste artigo, referente a mora no cumprimento da obrigação, em hipótese alguma poderá ser cumulada com a multa estabelecida no §1º deste artigo, que trata da inexecução total da obrigação." Segundo o contrato firmado com a construtora, a entrega do imóvel para a autora deveria ocorrer em até 24 (vinte e quatro) meses contados da assinatura do contrato de financiamento com a CEF, em 24/03/2017, com prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias. Se considerarmos o prazo de construção estipulado no contrato de financiamento (item B.8.2), a entrega do imóvel deveria ocorrer em até 25 (vinte e cinco) meses, podendo, igualmente, ser prorrogado por até 180 (cento e oitenta) dias. Na hipótese de ambiguidade ou contradição nas cláusulas contratuais, deve prevalecer o sentido mais favorável ao aderente, entendimento que decorre tanto do art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, como do art. 423 do Código Civil, que assim dispõe: "Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente." No caso dos autos, adotando-se o prazo mais benéfico ao consumidor, qual seja, 24 (vinte e quatro) meses contados da assinatura do contrato de financiamento com a CEF em 24/03/2017, além do prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias, temos como prazo final para entrega do imóvel, o dia 20/09/2019. Do direito à resolução do contrato e à restituição das parcelas pagas. No caso, configura-se a mora contratual das requeridas a partir de 21/09/2019, dia imediatamente subsequente ao último dia do prazo para a entrega da obra, incluso o prazo de tolerância. Tal não se deve à culpa do adquirente do imóvel, mas exclusivamente à mora da construtora, tecnicamente responsável pelo empreendimento, e à fiscalização deficitária da instituição financeira, aptas a amparar o dever de indenizar, ex vi do art. 389 do Código Civil: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. O parágrafo único do art. 395 do Código Civil dispõe que, caso a prestação, devido à mora, torne-se inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos. Ainda, o art. 475 do Código Civil, expressamente, faculta ao credor, diante do inadimplemento do devedor, escolher entre exigir o cumprimento da prestação ou rescindir o contrato, cabendo, em qualquer das hipóteses, a respectiva indenização: "Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos." “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento” (Súmula 543 do Superior Tribunal de Justiça). Nesse sentido, o entendimento desta Primeira Turma: “APELAÇÃO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CEF. CONSTRUTORA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS. APELAÇÕES NÃO PROVIDAS. 1. Na origem, os autores ajuizaram a presente demanda em face da CEF e da construtora objetivando a rescisão do contrato de financiamento habitacional e do contrato de promessa de compra e venda, bem como a condenação das requeridas na devolução dos valores já pagos, corrigidos monetariamente. Alegou que, em razão do atraso na entrega do imóvel, manifestaram desinteresse na manutenção do contrato, sustentando, ainda, que a demora excessiva das obras constitui ilícito previsto na legislação consumerista e também na Lei nº 4.591/64. 2. No que se refere à responsabilidade da CEF em relação a eventuais vícios de construção de imóveis financiados segundo as regras do Sistema Financeiro de Habitação, há que se distinguir entre duas situações: 1ª) nas hipóteses em opera como gestora de recursos e executora de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda (como é o caso do Programa Minha Casa Minha Vida), atuando na elaboração do projeto ou na fiscalização das obras, a CEF é parte legítima e pode responder por danos (materiais e/ou morais); 2ª) nos casos em que atua apenas como agente financeiro, financiando a aquisição de imóvel que já se encontra edificado e em nome de terceiro, essa instituição financeira não pode ser responsabilizada por vícios de construção e é parte ilegítima para compor lides a esse respeito. Precedentes. 3. Conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça e também deste Tribunal Regional, ainda que no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para se configurar a responsabilidade/legitimidade da CEF, há necessidade de que além de financiar o imóvel, a instituição financeira tenha atuado na elaboração e/ou fiscalização da obra, ou ainda que o contrato esteja relacionado à Faixa 1 do mencionado Programa, quando a CEF atua como verdadeira gestora de políticas públicas, subsidiando a aquisição de moradias para a população de baixa renda, por meio de recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Precedentes do STJ e desta Corte. 4. No caso dos autos, a parte apelada celebrou, com a MRV Engenharia e Participações S/A, contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel, em 05/01/2020, tendo por objeto a unidade imobiliária nº 1707, Bloco 1, do Residencial San Vicenzo, situado na Rua Domingos Ataíde, s/nº, Bairro Vila Andrade, na cidade de São Paulo/SP, com registro de incorporação imobiliária na matrícula nº 423.161, do 11º Registro de Imóveis de São Paulo/SP. Constou, do referido contrato, que a data limite para entrega das chaves seria 29/05/2021 (Id 262714268, p. 1-5). 5. Em seguida, os apelados celebraram com a CEF contrato de compra e venda de terreno e mútuo para construção de unidade habitacional, alienação fiduciária em garantia, fiança e outras obrigações – Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) – Recursos do FGTS com utilização dos recursos da conta vinculada do FGTS do devedor, em 19/02/2020, no valor de R$ 167.326,59, a serem pagos em 360 prestações, atualizadas de acordo com a Tabela Price (Id 262714270, p. 2-28). 6. Na espécie, consta na cláusula 2.1 do contrato de financiamento com a CEF: “os valores remanescentes serão destinados à construção e creditados em parcelas mensais na proporção do andamento das obras em conta vinculada ao empreendimento, no percentual atestado no Relatório de Acompanhamento do Empreendimento – RAE e mediante o cumprimento das demais exigências estabelecidas neste contrato”, comprovando que a CEF financiou e atuou na fiscalização da obra, sendo parte legítima para atuar no processo. Assim, possui responsabilidade solidária no caso de atraso na entrega do imóvel em questão. 7. No que se refere ao prazo para conclusão da obra, constou, na cláusula 5,1, a previsão para a entrega das chaves em 30.11.2020, sendo a data limite para entrega das chaves 29.05.2021 (Id 262714268, p. 1-5). No item B.7 do contrato de financiamento com a CEF o prazo para a entrega das obras é 29.11.2021. 8. Entretanto, conforme bem consignou a sentença apelada, “ainda que houvesse a consideração do prazo estipulado no contrato de financiamento para a finalização das obras, vale destacar que apesar de a MRV aduzir em sua contestação que “as obras não foram entregues ANTES da data prevista no contrato de financiamento, ou seja, 29/11/2021, face a pandemia, que obrigou a paralisação das obras, mediante determinação do Executivo do Estado de São Paulo, através do Decreto n° 64.879, de 20 de março de 2020.”, o decreto apontado como embasador da paralisação das obras não tratou do tema.”, acrescentando também que “diante da inexecução contratual operada (ausência de entrega das obras nas condições aprazadas), não se pode obrigar os autores a manterem as avenças firmadas com as corrés, sobretudo em razão de inexistir o objeto da execução contratual, qual seja, a unidade habitacional construída, nos termos da Lei nº 9.514/97”. 9. Diante do atraso na entrega das obras, não se pode referendar a “vedação ao direito dos adquirentes de desfazer o negócio jurídico entabulado com a construtora”, sendo de rigor o retorno ao status quo anterior à realização do contrato, com a devolução de todos os valores recebidos pelas rés em razão do contrato, inclusive dos recursos do FGTS dos autores. Precedentes. 10. Apelações não providas. Honorários sucumbenciais majorados.” (ApCiv 5027905-68.2021.4.03.6100, Rel. Des. Federal Nelton dos Santos, j. em 03/08/2023, DJEN de 08/08/2023, grifos nossos) "APELAÇÃO. CIVIL. COMPRA E VENDA. MÚTUO. EMPREITADA. FINANCIAMENTO PARA CONSTRUÇÃO. ATRASO NA OBRA. INADIMPLEMENTO. RESOLUÇÃO POR CULPA DA CONSTRUTORA. APELAÇÃO IMPROVIDA. I - Pretende a parte Autora a resolução dos contratos firmados com as corrés com a consequente restauração do status quo ante sob o fundamento de que obra não seria concluída no prazo avençado. O pleito exposto na inicial sugere a incidência do art. 395, parágrafo único do CC, segundo o qual se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la e exigir a satisfação das perdas e danos, bem como o teor do art. 475 do CC, que prevê que a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. II - Nestas condições, considerando que as obras não foram concluídas nem há notícia de justificativa para o atraso nos termos contratados, é patente o inadimplemento das corrés, não subsistindo controvérsia quanto à configuração do atraso. A construtora não logrou concluir a obra no prazo avençado, razão pela qual deve ser mantida a decisão que reconheceu a resolução do contrato sem qualquer retenção, considerando a sua culpa. A consagrar o entendimento anteriormente esposado, cumpre citar o teor da Súmula 543 do STJ. III - Como bem salientando na sentença impugnada, a atuação da CEF como promotora de políticas públicas está evidenciada nos autos por documentos remetidos à Prefeitura Municipal e por publicidade veiculada em seu nome. A intermediação das demais corrés não descaracteriza o fato de que a CEF foi a responsável pelo financiamento e destinatária final dos valores recolhidos a este título. Neste diapasão, na ausência de denunciação da lide, eventual divergência entre as corrés deverá ser objeto de ação própria. IV - No tocante aos danos morais, considerando a natureza do bem discutido nos autos e sua centralidade na vida dos adquirentes, é certo que o atraso na conclusão da obra gera impactos não apenas em seu patrimônio, mas também gera danos morais que não representam mero dissabor cotidiano. Considerando a frustração de seus planos pessoais e, em especial, a demora da CEF em oferecer resposta satisfatória para a conduta da construtora, o dano moral é presumido e foi fixado em montante que não representa valor irrisório ou exorbitante, R$ 10.000,00 (dez mil reais). V - Apelação improvida. Honorários majorados. (ApCiv 5000203-82.2020.4.03.6133, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, j. em 27/10/2022, Intimação via sistema em 03/11/2022) Sendo assim, a autora faz jus à rescisão do contrato de compra e venda do imóvel objeto desta lide, que se estende ao financiamento contraído perante a CEF. Consequência da rescisão conjunta dos contratos é o retorno das partes ao status quo ante, ou seja, à posição jurídica em que se encontravam antes da celebração dos pactos. Merece assim acolhimento o pleito de ressarcimento de todas as despesas comprovadamente realizadas pela proponente, “abrangido o valor do FGTS (a ser estornado na conta vinculada)”, consoante discriminado na sentença. Quanto aos valores a serem repetidos à autora, não há, todavia, que se falar em solidariedade, cabendo a cada qual das rés, devolver aquilo que lhe foi alcançado. Da indenização por danos morais Segundo ensinamento de Yussef Said Cahali in Dano Moral, 2ª edição, Editora Revista dos Tribunais, p. 21, considera-se dano moral: "Tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito, à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral." Em complemento, assevera Cleyton Reis em sua obra Avaliação do Dano Moral, 4ª edição, Editora Forense, p. 15: "É inquestionável que os padecimentos de natureza moral, como, por exemplo, a dor, a angústia, a aflição física ou espiritual, a humilhação, e de forma ampla, os padecimentos resultantes em situações análogas, constituem evento de natureza danosa, ou seja, danos extrapatrimoniais. Todavia, esse estado de espírito não autoriza a compensação dos danos morais, se não ficar demonstrado que os fatos foram conseqüência da privação de um bem jurídico, em que a vítima tinha um interesse juridicamente tutelado." A indenização por danos morais visa compensar os prejuízos ao interesse extrapatrimonial sofridos pelo ofendido, que não são, por sua natureza, ressarcíveis, e não se confundem com os danos patrimoniais, estes sim, suscetíveis de recomposição ou, se impossível, de indenização pecuniária. No que se refere à indenização por danos morais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem entendido que “O simples inadimplemento contratual em razão do atraso na entrega do imóvel não é capaz, por si só, de gerar dano moral indenizável. Entretanto, sendo considerável o atraso, alcançando longo período de tempo, pode ensejar o reconhecimento de dano extrapatrimonial” (Segunda Seção, AgInt nos EAREsp n. 676.952/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 03/10/2023, DJe de 5/10/2023; Terceira Turma, AgInt no AREsp 2.158.472/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/12/2022, DJe de 14/12/2022, e Terceira Turma, AgInt no AREsp 2.059.944/MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 28/11/2022, DJe de 13/12/2022). No caso sob análise, verificados os documentos acostados aos autos, sobressaem presentes as premissas expostas pela autora e, consequentemente, o dano moral pretendido, a saber: "Como já descrito, ao subscrever os documentos objetos desta demanda, a requerente imaginou que o respectivo imóvel seria entregue obrigatoriamente no dia previsto em contrato. Entretanto, o abandono total da obra impossibilitou a conclusão do empreendimento, não sendo observadas medidas eficazes por parte dos verdadeiros responsáveis, isto é, das rés, situação que se perfaz, no mínimo, há 14 (quatorze) meses, com a ciência da autora aos fatos, mais da metade do tempo previsto inicialmente para a finalização do referido empreendimento. Com isso, resta nítido que o atraso na continuação da obra e, consequentemente, na entrega do imóvel, o qual ainda permanece no plano imaterial, ultrapassou, e muito, um mero dissabor ou um simples aborrecimento." (ID 270204868, p. 10/11) Com efeito, a mora contratual das requeridas deu-se a partir de 21/09/2019. A ação foi ajuizada em 14/01/2021 e, até o momento, não há notícia, nos autos, de que a unidade habitacional tenha sido entregue. O tempo decorrido nesse interregno foi relevante, sendo apto a determinar abalos morais acima de meros aborrecimentos, mormente porque relacionado ao direito social básico de moradia. Este caso, portanto, possui particularidades que tornam devida a indenização por danos morais. É indispensável, contudo, que exista uma mínima correlação entre o valor pedido a título de danos morais e os fatos trazidos a Juízo. Nesse sentido, esta Primeira Turma tem adotado o entendimento segundo o qual, na hipótese de cumulação de pedidos de proveito material e moral, o valor da indenização a título de danos morais deve ser fixado sem excesso, adequando-se aos parâmetros consolidados pela jurisprudência, que, em casos análogos à espécie, o vem estimando em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade: "APELAÇÃO. PMCMV. FINANCIAMENTO HABITACIONAL. CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUÍTA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL NA QUALIDADE DE GESTORA DE POLÍTICAS PÚBLICA. RESILIÇÃO DO CONTRATO POR CULPA DAS CONTRATADAS. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO MUTUÁRIO. DANO MORAL CONFIGURADO. APELO NÃO PROVIDO. 1. A documentação consignada aos autos se mostra suficiente à comprovação da hipossuficiência necessária à concessão dos benefícios pretendidos. 2. O § 2º do art. 99, do CPC/15 é claro ao consignar que o magistrado poderá indeferir o pedido “se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade. 3. Ao enfrentar o tema, o C. STJ tem entendido que a presunção de pobreza é relativa, sendo possível o indeferimento do pedido de assistência judiciária caso verifique a existência de elementos que invalidem a hipossuficiência declarada. 4. Vale ressaltar, ainda, que o Apelado é efetivamente beneficiário do Programa Minha Casa Minha Vida, destinada à população de baixa renda, uma vez atendidas as exigências previstas tanto na Lei 11.977/2009, como no Decreto-Lei n.º 7.499/2011 que regulamentam o programa habitacional. 5. No que diz respeito à legitimidade da Embargante, a jurisprudência do próprio C. STJ firmou orientação assim sintetizada: a) Nas hipóteses em que a CAIXA atua na condição de agente financeiro em sentido estrito, isto é, não financia a construção do imóvel e nem participa dessa fase do empreendimento, não ostenta legitimidade para responder pelos vícios de construção na obra financiada, tendo em vista que a sua responsabilidade contratual diz respeito apenas ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, à liberação do empréstimo, nas épocas acordadas, e à cobrança dos encargos estipulados no contrato; b) em se tratando de créditos imobiliários cedidos à CAIXA, essa empresa pública também não pode ser responsabilizada por eventuais vícios de construção nos imóveis, seja porque não financiou sua construção, seja porque não financiou originariamente a aquisição das unidades habitacionais. Precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte. 6. No caso em análise, contudo, denota-se que a CEF, na qualidade de agente financeiro, também financiou a construção do imóvel, atuando com controle técnico, financeiro e operacional sobre o andamento da construção do empreendimento, como se depreende das cláusulas do contrato. 7. Constata-se, ainda, que a construção do empreendimento, recebeu subsídios do Governo Federal por intermédio do Programa "Minha Casa, Minha Vida", funcionando a Caixa Econômica Federal, na qualidade de gestora do FGTS, como agente operador do programa e, portanto, co-responsável pela conclusão das obras de construção da casa própria que financia, posto que fiscalizadas permanentemente pela Instituição Financeira, havendo inclusive acerto contratual que vincula a liberação do capital ao andamento do cronograma físico-financeiro. 8. Aplica-se ao caso, portanto, o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que a Caixa Econômica Federal possui legitimidade passiva para responder nos casos em que não atua apenas como agente financeiro, "por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis objeto do Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida se, à luz da legislação, do contrato e da atividade por ela desenvolvida, atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda (...)" (AgInt no REsp 1646130/PE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 30/08/2018, DJe 04/09/2018). 9. O descumprimento injustificado do prazo estabelecido em compromisso de promessa de compra e venda para a entrega da unidade imobiliária negociada, caracteriza inadimplemento contratual culposo, fazendo emergir, para o comprador, o direito de pleitear a rescisão judicial do contrato. 10. A consequência da rescisão contratual em virtude do atraso excessivo e injustificado em que incidira na conclusão do empreendimento é o retorno ao statu quo ante, isto é, as partes devem retornar à posição jurídica em que se encontravam antes da celebração do contrato. Vale dizer: a restituição das parcelas pagas, na sua integralidade. 11. Precedentes. 12. A restituição das parcelas pagas pelos promitentes adquirentes e o pedido de indenização a título de danos morais, em decorrência da mora das requeridas e pelo interregno que foram privados do uso do imóvel, consistem em pretensões de natureza distintas, cuja legitimidade já foi pacificada pela jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. 13. O caso dos autos, em que o autor adquiriu imóvel na planta para sua própria moradia, efetuou o pagamento das parcelas do financiamento e não pode fazer uso do mesmo, em razão do atraso na entrega de obra objeto de financiamento habitacional, revela situação que ultrapassa os limites de um mero aborrecimento, ensejando o dano moral passível de recomposição. 14. Demonstrada a ocorrência do dano, e presentes os requisitos ensejadores à configuração da responsabilidade da apelada, a fixação de indenização é medida que se impõe. 15. Considerando as circunstâncias específicas do caso concreto, em especial a elevada extensão do dano moral, uma vez que a aquisição de imóvel para moradia é fato de alta relevância no contexto socioeconômico do autor, bem como o considerável grau de culpa da CEF, que, além de atrasar a entrega completa e satisfatória do imóvel, pouco fez para solucionar o ocorrido, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), se revela razoável e suficiente à reparação do dano moral no caso dos autos, sem importar no enriquecimento indevido da parte. 16. Desprovido o recurso interposto pela CEF, e havendo a condenação da parte vencida em primeira instância, restam presentes os requisitos necessários a ensejar a majoração dos honorários advocatícios de sucumbência, para o percentual de 17% (dezessete por cento), sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/15. 17. Recurso de apelação a que se nega provimento." (ApCiv 5007510-25.2021.4.03.6110, Rel. Des. Federal Wilson Zauhy Filho, j. em 17/02/2023, DJEN de 23/02/2023, grifos nossos) "CIVIL. APELAÇÃO. FINANCIAMENTO PARA CONSTRUÇÃO DE IMÓVEL. COMPRA E VENDA. MÚTUO. EMPREITADA. ATRASO NA OBRA. INADIMPLEMENTO. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. RESTAURAÇÃO DO STATUS QUO ANTE. DANOS MATERIAIS PRESUMIDOS. DANOS MORAIS. APELAÇÃO A QUE SE NEGA PROVIIMENTO. 1. Com o ajuizamento da ação, pretende a parte Autora a rescisão dos contratos firmados com as corrés com a consequente restauração do status quo ante, além da condenação à indenização por danos materiais e danos morais, sob o fundamento de atraso na conclusão e entrega da obra para além do estabelecido em contrato. 2. O pleito exposto na inicial sugere a incidência do art. 395, parágrafo único do CC, segundo o qual se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la e exigir a satisfação das perdas e danos, bem como o teor do art. 475 do CC, que prevê que a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. 3. Vislumbra-se, ainda, a incidência do teor do art. 389 do CC ao prever que, não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado. E também o art. 624 do CC, ao determinar que, suspensa a execução da empreitada sem justa causa, responde o empreiteiro por perdas e danos. 4. No âmbito da legislação consumerista, o art. 3° do CDC trata como fornecedor a pessoa física ou jurídica que desenvolve atividade de construção. A CEF, enquanto pessoa jurídica pública nacional que presta serviços de natureza bancária, financeira e de crédito mediante remuneração no mercado de consumo, enquadra-se no conceito de fornecedora do art. 3º, caput e § 2º do CDC. A jurisprudência dos egrégios Supremo Tribunal Federal (ADI 2591) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297) é pacífica na conclusão de que o Código de Defesa do Consumidor aplica-se aos contratos de mútuo bancário. 5. Na hipótese de uma relação de consumo triangular em que o adquirente e mutuário compra o imóvel do vendedor ou construtor, mas sua obrigação principal tem como credora uma instituição financeira, ao se constatar a configuração de conduta lesiva da construtora que justifique a resolução do contrato, não há dúvidas de que os atos em questão podem repercutir no patrimônio da instituição financeira independentemente de culpa. 6. Com efeito, nestas condições, a instituição financeira não poderá exigir o cumprimento da obrigação do contrato de mútuo nos termos estritamente avençados, o que não impede que a instituição financeira possa exercer o correspondente regresso ou pleito de reparação civil junto ao construtor ou vendedor. A ausência de culpa, todavia, não serve de óbice à pretensão do consumidor. 7.No caso dos autos, em 17/05/2016 a parte Autora firmou com ALCANCE CONSTRUTORA LTDA "Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda de Imóvel Urbano com Confissão de Dívida" com a previsão de entrega do imóvel em até 36 meses após a assinatura do contrato. 8. Em 14/12/2016, as partes firmaram "Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo Para Construção de Unidade Habitacional, Alienação Fiduciária em Garantia, Fiança e Outras Obrigações - Programa Minha Casa Minha Vida - PMCMV - Recursos do FGTS - Com Utilização do FGTS do(s) Comprador(es), com prazo de construção, consoante o item B.8.2, de 25 (vinte e cinco) meses, prorrogável uma única vem, em até 6 (seis) meses, uma vez restado comprovado caso fortuito, força maior ou outra situação excepcional superveniente à assinatura do contrato, conforme a Quinta Cláusula contratual. 9. O contrato contém, ainda, a previsão de substituição da construtora, entre outras hipóteses, quando ocorrer infração pela construtora de qualquer disposição do contrato e quando não concluída a obra dentro do prazo contratual (Cláusula Vigésima Nona). 10. Qualquer que seja o prazo considerado, as obras não foram concluídas tempestivamente, já que não haviam sido concluídas até a data do ajuizamento da presente ação, em julho de 2020. Não houve a comprovação de caso fortuito ou força maior a justificar qualquer prorrogação. 11. É patente o inadimplemento das fornecedoras. A construtora não logrou concluir a obra no prazo avençado. Quanto à CEF, resta inequívoca a sua obrigação contratual de fiscalizar a obra para fins de liberar os recursos necessários a construção. Considerando a natureza do empreendimento, a relação de consumo triangular configurada, bem como a evidente disparidade entre a capacidade técnica e econômica entre a CEF e parte Autora para exigir da construtora o cumprimento da obrigação, a responsabilidade da CEF resta configurada. 12. Não suficiente, era sua obrigação atestar eventual necessidade de prorrogar o prazo por força maior ou caso fortuito, além de mobilizar o seguro contratado em tempo hábil para não gerar danos ao adquirentes. Não há que se falar, portanto, que a responsabilidade solidária não se presume na hipótese em comento. 13. Ressalte-se, ainda, que o contrato é vinculado ao Programa Minha Casa, Minha Vida, sendo possível discutir se a atuação da CEF não poderia, inclusive, ser caracterizada como promotora de políticas públicas na área da habitação, o que só faria aumentar sua responsabilidade. 14. No âmbito do dos contratos de compra e venda de imóvel, o STJ editou a Súmula 543 que prevê o dever de imediata e integral restituição das parcelas pagas pelo comprador em caso de resolução do contrato por culpa exclusiva do vendedor ou construtor. 15. O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar recurso especial pelo rito do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas enfatizou, entre outras teses, que na hipótese de atraso na conclusão da obra em financiamentos para construção de imóvel no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida, o dano material é presumido. 16. No que se refere aos danos morais, considerando a natureza do bem discutido nos autos e sua centralidade na vida dos adquirentes, é certo que o atraso na conclusão da obra gera impactos não apenas em seu patrimônio, mas também gera danos morais que não representam mero dissabor cotidiano. Considerando a frustração de seus planos pessoais e, em especial, a demora da CEF em oferecer resposta satisfatória para a conduta da construtora, o dano moral é presumido e foi fixado em montante que não representa valor irrisório ou exorbitante, R$ 10.000,00 (dez mil reais). 17. Apelação a que se nega provimento." (ApCiv 5001510-52.2020.4.03.6107, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, j. em 04/02/2022, DJEN de 09/02/2022, grifos nossos) Dessa forma, para compensar a parte autora dos prejuízos emocionais sofridos, entendo adequado manter a indenização por danos morais no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Deve ser mantida a condenação das rés a, solidariamente, indenizar a proponente pelo dano moral (artigos 7º, parágrafo único, e 14 do CDC). Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação, para excluir a solidariedade da condenação à devolução integral do valor pago, cabendo, a cada qual das rés, devolver aquilo que lhe foi alcançado. É o meu voto. Herbert de Bruyn Desembargador Federal Relator E M E N T A SFH. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE UNIDADE AUTÔNOMA E DE MÚTUO HABITACIONAL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA – PMCMV. ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA E ENTREGA DO IMÓVEL. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF. ATUAÇÃO NA FISCALIZAÇÃO DAS OBRAS E NA GESTÃO DOS RECURSOS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. MORA CONTRATUAL. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MORAIS. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. APELO DA CEF PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Com referência à responsabilidade da Caixa Econômica Federal - CEF para responder pelo descumprimento contratual relativo ao atraso na construção e entrega de imóvel vinculado a empreendimento financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, há que se distinguir duas situações, consoante jurisprudência sedimentada: 1ª) A CEF é parte legítima e pode responder, solidariamente, pelo descumprimento contratual, nas hipóteses em que tenha atuado na escolha da construtora, elaboração do projeto, execução ou fiscalização das obras do empreendimento ou opere como gestor de recursos e agente executor de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda; 2ª) não se reconhece a legitimidade passiva ad causam da CEF, caso esta instituição funcione como agente financeiro em sentido estrito, responsável, apenas, pelo financiamento da aquisição do imóvel já edificado e em nome de terceiro. 2. No âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para que se configure a responsabilidade da CEF por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis, e, por consequência, a sua legitimidade para compor lides a esse respeito, é necessário que a instituição financeira tenha atuado seja na construção do imóvel, seja na elaboração do projeto, sua execução ou fiscalização das obras do empreendimento, ou, ainda, que o contrato esteja relacionado ao Programa de Arrendamento Residencial (PAR), com recursos advindos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). 3. Das cláusulas do contrato de financiamento habitacional, é nítida a atuação da CEF tanto na fiscalização das obras do empreendimento, como na gestão dos recursos. 4. A relação jurídica contratual em discussão sujeita-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), consoante entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal (ADI nº 2591, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 7/6/06, DJ 29/9/06, Rel. para acórdão Min. Eros Grau) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297). 5. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à responsabilidade solidária entre a construtora e o agente financeiro para responder pelo atraso na conclusão da obra e entrega do imóvel, quando este atua na qualidade de agente executor e operador de políticas federais para a promoção de moradia para consumidores de baixa renda, como ocorre na espécie. 6. A mora contratual, configurada a partir de 21/09/2019, não se deve à culpa do adquirente do imóvel, mas exclusivamente à construtora, tecnicamente responsável pelo empreendimento, e à fiscalização deficitária da instituição financeira, aptas a amparar o dever de indenizar, ex vi do art. 389 do Código Civil. 7. O parágrafo único do art. 395 do Código Civil dispõe que, caso a prestação, devido à mora, torne-se inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e exigir perdas e danos. Ainda, o art. 475 do Código Civil, expressamente, faculta ao credor, diante do inadimplemento do devedor, escolher entre exigir o cumprimento da prestação ou rescindir o contrato, cabendo, em qualquer das hipóteses, a respectiva indenização. 8. A autora faz jus à rescisão do contrato de compra e venda do imóvel objeto desta lide, que se estende ao financiamento contraído perante a CEF, bem como ao ressarcimento de todas as despesas comprovadamente realizadas, cabendo a cada qual das rés devolver aquilo que lhe foi alcançado. 9. A indenização por danos morais visa compensar os prejuízos ao interesse extrapatrimonial sofridos pelo ofendido, que não são, por sua natureza, ressarcíveis, e não se confundem com os danos patrimoniais, estes sim, suscetíveis de recomposição ou, se impossível, de indenização pecuniária. 10. Verificados os documentos acostados aos autos, sobressaem presentes as premissas expostas pelo autora e, consequentemente, os danos morais alegados, sendo indispensável, contudo, que exista uma mínima correlação entre o valor pedido a esse título e os fatos trazidos a Juízo, adequando-se aos parâmetros consolidados pela jurisprudência que, em casos análogos à espécie, o vem estimando em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 11. Matéria preliminar rejeitada. Apelação parcialmente provida. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, rejeitou a matéria preliminar e, no mérito, deu parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. HERBERT DE BRUYN Desembargador Federal
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