Processo nº 1002211-91.2023.8.11.0005
ID: 306711193
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1002211-91.2023.8.11.0005
Data de Disponibilização:
25/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JAKSON CLAYTON DE ALMEIDA
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002211-91.2023.8.11.0005 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Seguro, Indenização por Dano Moral, Indenização …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002211-91.2023.8.11.0005 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Seguro, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [HENRIQUE BITENCORT - CPF: 411.855.281-72 (APELANTE), JAKSON CLAYTON DE ALMEIDA - CPF: 125.018.118-60 (ADVOGADO), RAFAEL AZIANI GUARINO - CPF: 424.611.748-06 (ADVOGADO), COMPANHIA DE SEGUROS PREVIDENCIA DO SUL - CNPJ: 92.751.213/0001-73 (APELADO), EDUARDO CHALFIN - CPF: 689.268.477-72 (ADVOGADO), BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (APELADO), NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - CPF: 668.018.009-06 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. SEGURO NÃO CONTRATADO. DESCONTOS INDEVIDOS EM CONTA CORRENTE. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL. MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos materiais e morais em razão de descontos mensais indevidos em seus extratos bancários em favor da empresa Previsul, sem jamais ter celebrado qualquer vínculo contratual com a referida instituição, pleiteando a restituição em dobro dos valores subtraídos e indenização por danos morais. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se os descontos indevidos realizados na conta corrente do autor, sem comprovação de contratação válida de seguro, ensejam a restituição em dobro dos valores, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor; e (ii) saber se o quantum indenizatório fixado a título de danos morais em primeira instância, no valor de R$ 3.000,00, mostra-se adequado às circunstâncias específicas do caso concreto, considerando a condição de pessoa idosa e hipervulnerável do autor. III. Razões de decidir 3. Na relação de consumo estabelecida entre as partes, competia aos réus demonstrar a regularidade da contratação do seguro mediante documento assinado pelo autor, ônus do qual não se desincumbiram, limitando-se a apresentar certificado individual de seguro preenchido unilateralmente via sistema, sem assinatura do contratante. 4. Demonstrados os descontos na conta corrente do apelante e não comprovada a legalidade da contratação, impõe-se a restituição em dobro do quantum descontado, caracterizada a má-fé dos réus ao efetuarem desconto com fundamento em contrato inexistente, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 5. O dano moral restou configurado pela responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços, independentemente de culpa, bastando a constatação do dano sofrido pelo consumidor e o nexo causal entre o dano e a conduta do prestador de serviços, conforme artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. 6. O quantum indenizatório fixado em primeira instância revela-se insuficiente para atender à finalidade reparatória e pedagógica da indenização, considerando que o apelante ostenta a condição de pessoa idosa e hipervulnerável, circunstância que agrava os efeitos da conduta lesiva perpetrada pelos apelados sobre parcela de natureza alimentar de sua aposentadoria equivalente a um salário mínimo. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de apelação conhecido e parcialmente provido. Tese de julgamento: "1. Configurada a má-fé na cobrança indevida de valores decorrentes de contrato de seguro não comprovadamente contratado, impõe-se a restituição em dobro, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 2. O quantum indenizatório por danos morais deve ser majorado quando o lesado ostenta a condição de pessoa idosa e hipervulnerável, considerando a natureza alimentar dos valores indevidamente descontados e a necessidade de atendimento às finalidades compensatória e pedagógica da reparação." Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 2º, 3º, 6º, VIII, 14, 42, parágrafo único; CPC, arts. 85, § 2º e § 11, 373, II. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, Apelação Cível 1000831-39.2023.8.11.0003, Rel. Des. Sebastião de Moraes Filho, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 12/06/2024; TJ-MT, Apelação Cível 0002063-80.2017.8.11.0014, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 19/12/2018; STJ, EAREsp 600.663/RS, Rel. Min. Maria Tereza de Assis Moura, Corte Especial, j. 21/10/2020. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Trata-se de apelação apresentada por HENRIQUE BITENCORT contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Diamantino, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito cumulada com Indenização por Dano Material e Moral ajuizada em desfavor de BANCO BRADESCO S.A. e COMPANHIA DE SEGUROS PREVIDÊNCIA DO SUL, que julgou parcialmente procedente o pedido. Alega o recorrente que sofreu descontos indevidos em seus proventos previdenciários, pretendendo a condenação dos recorridos ao pagamento de indenização material e moral. O apelante sustenta que "o recorrente ingressou com a presente demanda pretendendo a condenação dos recorridos ao pagamento de indenização material e moral após sofrer descontos indevidos em seus proventos." Para reforçar sua alegação, argumenta que o quantum indenizatório fixado pelo juízo singular foi irrisório se comparado aos danos causados e ao poderio econômico dos apelados. Sustenta ainda que "o valor fixado pelo Nobre Magistrado 'a quo' foi irrisório se comparado aos danos causados à apelante e ao poderio econômico dos apelados", pleiteando majoração da indenização por danos morais. Adicionalmente, requer a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente e a elevação dos honorários advocatícios para o patamar máximo legal. Por fim, requer que seja reformada a sentença para: majorar o quantum indenizatório moral, determinar a devolução em dobro dos valores descontados e alterar os honorários de sucumbência para o patamar máximo. Contrarrazões da parte COMPANHIA DE SEGUROS PREVIDÊNCIA DO SUL – PREVISUL, id. 288847882 Contrarrazões da parte BANCO BRADESCO S.A, id. 288847883. Isenção do preparo, id. 290837375. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Conforme o explicitado, cuida-se de apelação apresentada por HENRIQUE BITENCORT contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Diamantino, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito cumulada com Indenização por Dano Material e Moral ajuizada em desfavor de BANCO BRADESCO S.A. e COMPANHIA DE SEGUROS PREVIDÊNCIA DO SUL, que julgou parcialmente procedente o pedido. Cinge-se dos autos que a parte autora, ora apelante, ajuizou a presente demanda em razão da constatação de descontos mensais lançados em seus extratos bancários em favor da empresa Previsul, sem que jamais tenha celebrado qualquer vínculo contratual com a referida instituição. Ao final, requereu o reconhecimento da inexistência do débito imputado, bem como a condenação solidária dos requeridos à restituição em dobro dos valores indevidamente subtraídos. O Juízo a quo proferiu sentença de parcial procedência, nos seguintes termos: “ [...] É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, porquanto a matéria controvertida é unicamente de direito e os fatos já se encontram devidamente comprovados nos autos, mostrando-se desnecessária a produção de outras provas. Inicialmente, passo à análise das questões processuais pendentes. Da Ilegitimidade Passiva do Banco Bradesco S.A. A preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Banco Bradesco S.A. não merece prosperar. Isso porque, conforme relatado na inicial, o autor é correntista do Banco Bradesco S.A. e constatou descontos indevidos em sua conta bancária. Ainda que o seguro seja oferecido por outra empresa, o banco é o responsável pela realização dos descontos em conta e pela administração dos pagamentos. Portanto, o Banco Bradesco S.A. tem legitimidade para figurar no polo passivo da ação, uma vez que possui relação contratual direta com o autor. Ademais, a contestação argumenta que o banco não suportará os efeitos e obrigações decorrentes da sentença a ser proferida. No entanto, essa afirmação desconsidera o fato de que o autor é correntista do banco e que os descontos indevidos foram realizados em sua conta bancária. Como responsável pela gestão e administração dos valores depositados, o banco possui o dever de zelar pela segurança e integridade dos recursos de seus correntistas. Portanto, é legítimo que o Banco Bradesco S.A. seja parte no processo e possa ser responsabilizado pelos danos sofridos pelo autor. Da Falta de Interesse de Agir A preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo Banco Bradesco S.A. também não merece prosperar. Isso porque a exigência de prévia tentativa de solução extrajudicial do conflito ofende o princípio da inafastabilidade da jurisdição, direito fundamental estabelecido no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal. Aliás, conforme regra prevista no artigo 3º, § 3º, do Código de Processo Civil, métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados e não impostos por juízes. Além disso, não há norma jurídica nesse sentido, sendo, por isso, vedado ao magistrado impor barreira ao direito de ação. Dessa forma, depreende-se que a comprovação da prévia tentativa de solução extrajudicial para o ingresso em juízo não possui amparo legal, pois além de o CPC não prescrever a sua obrigatoriedade como condição para a aferição de interesse processual, a Constituição Federal também assegura a todos o livre acesso ao Judiciário, segundo princípio fundamental da inafastabilidade da jurisdição. Da Conexão A alegação de conexão entre a presente ação e outras demandas ajuizadas pelo autor também não merece prosperar. Isso porque, nos termos do artigo 55 do Código de Processo Civil, reputam-se conexas as ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir, o que autoriza a reunião dos processos de ofício ou a requerimento, a fim de serem julgadas simultaneamente para evitar decisões conflitantes, exceto quando uma delas já houver sido sentenciada. No caso em tela, embora as ações possuam partes em comum, os contratos de seguro questionados são distintos, com valores e períodos de cobrança diversos, não havendo, portanto, risco de decisões conflitantes. Da Prescrição A prejudicial de mérito relativa à prescrição arguida pela Companhia de Seguros Previdência do Sul não merece prosperar. Isso porque, conforme relatado na inicial, o autor jamais contratou o seguro em questão, de modo que a presente ação não se trata de ação para o pagamento de cobertura securitária. Assim, o Código Civil de 2002, define que uma ação indenizatória pelos danos moral e material seja de três anos. Além do mais, a contagem do prazo prescricional se inicia a partir da data em que o autor teve conhecimento sobre o desconto, qual seja a data em que tirou o extrato. Conforme infere-se do documento anexado à exordial, o autor obteve conhecimento de tal ocorrência apenas em 31/07/2023. Portanto, seja por uma via ou por outra, não há incidência de prescrição no caso em comento, sendo que a prejudicial de mérito deve ser afastada. Do chamamento ao processo Rejeita-se a preliminar de chamamento ao processo, uma vez que a lide em questão versa sobre relação de consumo, hipótese na qual o chamamento ao processo não encontra amparo legal. Com efeito, nos termos do artigo 88 do Código de Defesa do Consumidor, a denunciação da lide é vedada nas ações que envolvem consumidor e fornecedor, salvo as exceções expressamente previstas em lei. Tal vedação visa preservar os princípios da celeridade e da efetividade da tutela jurisdicional, pilares do microssistema protetivo do consumidor. Neste ponto, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que: “[...] O chamamento ao processo, nas causas que envolvam relação de consumo, é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor, excetuando-se a hipótese prevista no art. 101, II, do CDC. 2. O art. 88 do CDC é interpretado considerando-se as garantias ao consumidor da celeridade e da efetividade da prestação jurisdicional, de forma que a vedação à denunciação da lide se estende à hipótese de chamamento ao processo. 3. A responsabilidade solidária dos fornecedores que participam da relação de consumo (art. 3º e 18 do CDC) é garantia dirigida ao consumidor de modo que não conduz obrigatoriamente ao litisconsórcio passivo, cabendo ao consumidor escolher contra quem deseja demandar . 4. Recurso conhecido e não provido.” (TJ-DF 07032564020208070000 DF 0703256-40.2020 .8.07.0000, Relator.: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de Julgamento: 27/05/2020, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 19/06/2020. Pág .: Sem Página Cadastrada.) Do Mérito No mérito, a pretensão autoral merece parcial acolhimento. A relação jurídica existente entre as partes é de consumo, porquanto o autor se enquadra no conceito de consumidor, previsto no art. 2º do Código de Defesa do Consumidor, e os réus no de fornecedores de serviços, nos termos do art. 3º do mesmo diploma legal. Assim, aplicam-se ao caso as normas do Código de Defesa do Consumidor, inclusive a que prevê a inversão do ônus da prova, em face da hipossuficiência do consumidor e da verossimilhança de suas alegações, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Nesse contexto, caberia aos réus comprovar a regularidade da contratação do seguro, ônus do qual não se desincumbiram. Isso porque não apresentaram qualquer documento assinado pelo autor que comprovasse a sua anuência com a contratação do seguro, ônus que lhes incumbia, nos termos do art. 373, II, do CPC. Assim, restando demonstrada a falha na prestação do serviço, consubstanciada na cobrança de serviço não contratado, é devida a restituição dos valores descontados indevidamente, na forma simples, e não em dobro, como pretende o autor. Isso porque não restou demonstrada a má-fé dos réus na cobrança, requisito necessário para a aplicação do art. 42, parágrafo único, do CDC. No que se refere ao dano moral, entendo que este restou configurado. Isso porque a cobrança indevida de serviço não contratado gera transtornos e aborrecimentos que extrapolam o mero dissabor, notadamente quando, como no caso em tela, o autor é pessoa idosa e de baixa renda, de modo que a cobrança indevida afeta significativamente sua subsistência. Nesse sentido, a jurisprudência: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - CONTRIBUIÇÃO – AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO – FRAUDE - DESCONTOS INDEVIDOS - RESTITUIÇÃO DOS VALORES – INEXISTÊNCIA DE MÁ-FÉ – REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM – CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 - Considerado que o negócio tenha sido mantido por terceiro, em fraude, a formalização do contrato, por contato telefônico, sem exigir a apresentação de documentos pessoais e comprovante de residência do contratante, sem formalizar um contrato escrito e assinado, chama para si o risco do empreendimento, respondendo pelas fraudes de terceiros – que não podem, notoriamente, prejudicar o consumidor. 2 - Não demonstrada a existência de má-fé por parte do credor, inviável a condenação pela repetição do indébito em dobro. Reforma-se a sentença neste importe . 3 - O arbitramento da indenização em valor de R$ 5.000,00 mostra-se justo e razoável para o caso concreto, pois proporcional ao dano moral sofrido, de forma que bem atende ao duplo objetivo a que a reparação se destina. 4. Sentença Reformada Parcialmente . Recurso Provido em Parte.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1000831-39.2023.8 .11.0003, Relator.: SEBASTIAO DE MORAES FILHO, Data de Julgamento: 12/06/2024, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/06/2024) Para a fixação do quantum indenizatório, deve o julgador atentar para as peculiaridades do caso concreto, levando em consideração a extensão do dano, a capacidade econômica das partes e o caráter pedagógico da medida, a fim de que a indenização não se torne fonte de enriquecimento ilícito, nem seja tão irrisória que não cumpra sua função punitiva e pedagógica. Nesse contexto, considerando as peculiaridades do caso concreto, entendo que o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) é suficiente para compensar o dano moral sofrido pelo autor, sem configurar enriquecimento ilícito. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para: a) Declarar a inexistência do débito do autor em relação à Companhia de Seguros Previdência do Sul; b) Condenar os réus, solidariamente, a restituírem ao autor os valores descontados indevidamente de seu benefício previdenciário, na forma simples, a serem apurados em liquidação de sentença, acrescidos de correção monetária pelo INPC, desde cada desconto, e juros de mora de 1% ao mês, desde a citação; c) Condenar os réus, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescidos de correção monetária pelo INPC, desde a data desta sentença, e juros de mora de 1% ao mês, desde a citação. [...]” Pois bem. Inicialmente, invocando o princípio jurídico tantum devolutum quantum appellatum, considerando que a parte apelante quedou-se silente quanto aos demais pontos da sentença, concluo que, em relação a tais aspectos, operou-se a coisa julgada, razão pela qual restrinjo a análise ao mérito recursal propriamente dito, qual seja, restituição em dobro dos valores descontados e a majoração do dano moral. A questão posta à apreciação judicial cinge-se em verificar se os fatos delineados na peça inaugural são capazes de gerar o dever de restituir, em dobro, o quantum descontado de maneira indevida da conta corrente do Autor, bem como se, na hipótese, restou configurado ato ilícito passível de reparação. Pois bem. No caso em exame se aplica a lei consumerista, sendo assim, era ônus da Seguradora Ré trazer aos autos documento assinado pelo Autor, demonstrando a contratação dos seus serviços, contudo, não o fez, limitando-se a juntar um “Certificado Individual de Seguro”, sem assinatura do contratante, preenchido unilateralmente via sistema (Id. 288847389). Por outro lado, o Apelante logrou êxito em demonstrar os descontos em sua conta corrente, conforme Id. 288847366. Assim, não comprovada à legalidade da contratação, é de concluir que os descontos realizados são ilegais. Daí consequente, tem-se que o quantum descontado deve ser restituído em dobro à parte Apelante, em razão da má-fé da parte Recorrida (art. 42 do CDC), eis que efetuou desconto com fundamento em contrato inexistente. Sobre o tema, colaciono o seguinte julgado: APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ANULABILIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – ILEGITIMIDADE PASSIVA – AFASTADA – CONTRATO DE EMPRÉSTIMO FIRMADO COM INDÍGENA IDOSO E ANALFABETO – DESCONTOS INDEVIDOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR – RESTITUIÇÃO EM DOBRO DEVIDA – DANO MORAL CONFIGURADO – FIXAÇÃO – POSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO. Não prospera a alegada ilegitimidade passiva para figurar no polo passivo da demanda, se contatado o desconto indevido realizado pela instituição financeira requerida. Não comprovada pela instituição financeira a regularidade na contratação do empréstimo com a parte, que é pessoa indígena, idosa e analfabeta, torna-se inexistente o débito efetivado no benefício da aposentadoria, condição que enseja a restituição em dobro (art. 42, CDC) e configura ato ilícito passível de reparação. Comporta fixação de indenização a título de dano moral, máxime porque o desconto indevido se deu sobre verba de natureza alimentar. (N.U 0002063-80.2017.8.11.0014, Apelação Cível, Guiomar Teodoro Borges, Quarta Câmara de Direito Privado, julgado em 19/12/2018, publicado No DJE 22/01/2019). Quanto aos danos morais, subsiste o dever de indenizar, porquanto, aqui, a responsabilidade é objetiva e independe de culpa (art. 14, do CDC), bastando à constatação do dano sofrido pelo consumidor e o nexo causal existente entre dano e a conduta do fornecedor de serviços. Não se olvida os transtornos sofridos pelo Apelante pessoa idosa, ao ver as deduções indevidas em sua conta corrente, mês a mês, de dívida que não contratou; certo é que a situação por ele vivenciada ultrapassou o mero aborrecimento, merecendo reparação. Nesse sentido, esta Colenda Corte de Justiça tem decidido: RECURSOS DE APELAÇÃO CIVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS – SEGURO NÃO CONTRATADO – DESCONTO INDEVIDO – DEVOLUÇÃO EM DOBRO – DANO MORAL CONFIGURADO – RECURSOS DESPROVIDOS. Nos termos do art. 14, do CDC, por ser objetiva a responsabilidade do prestador de serviço, como na espécie em julgamento, responde pelos danos causados ao consumidor, independentemente de culpa. Inexistindo prova da contratação válida, os descontos efetuados nos proventos de aposentadoria são irregulares, capaz de gerar danos de ordem moral, tendo em vista a privação de parte dos rendimentos. A fixação dos danos morais deve ser segundo os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, não podendo ser em valor irrisório, tampouco fonte de enriquecimento sem causa, exercendo função reparadora do prejuízo e de prevenção da reincidência da conduta lesiva. “1. "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EAREsp 600.663/RS, Rel. Min. MARIA TEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. para Acórdão Min. HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/03/2021).” (N.U 1000926-97.2019.8.11.0039, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NÃO INFORMADO, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/02/2024, Publicado no DJE 08/02/2024). APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C ANULAÇÃO DE DÉBITO C/C REPARAÇÃO DE DANOS, C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA - CONTRATAÇÃO DE SEGURO NÃO COMPROVADA - DESCONTO INDEVIDO EM CONTA CORRENTE – DANO MORAL CONFIGURADO – RECURSO PROVIDO. É ônus do réu comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, o que nas ações declaratórias de inexistência de débito refere-se à prova da dívida (art. 373, II, do CPC). Não demonstrada a contratação, os descontos efetivados imotivadamente configuram ato ilícito gerador de dano moral. A indenização tem de ser fixada em quantia que cumpra a função compensatória, punitiva e preventiva da medida. (N.U 1012458-23.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/03/2024, Publicado no DJE 15/03/2024). APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – SEGURO – CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA – COBRANÇA INDEVIDA - LESÃO EXTRAPATRIMONIAL CONFIGURADA – RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO - VERBA HONORÁRIA - ARBITRAMENTO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA – ART. 85, § 8º, DO CPC – POSSIBILIDADE – VALOR ÍNFIMO – MAJORAÇÃO NECESSÁRIA – RECURSO PROVIDO. As instituições financeiras respondem objetivamente por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias (Súmula 479 do STJ). O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. Constatada a má-fé, as parcelas imotivadamente descontadas devem ser restituídas em dobro (art. 42 do CDC). Se o valor fixado na sentença para os honorários advocatícios mostrar-se irrisório, deve ser majorado de modo a remunerar de forma digna o desempenho do profissional. (N.U 1007467-72.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/10/2022, Publicado no DJE 24/10/2022). No que tange ao quantum indenizatório, após detida análise dos autos, constato que assiste razão ao apelante quanto à pretensão de majoração da verba fixada a título de danos morais. Com efeito, o montante arbitrado em primeiro grau, correspondente a R$ 3.000,00 (três mil reais), revela-se insuficiente para atender, de forma proporcional e razoável, à finalidade reparatória e pedagógica da indenização, sobretudo quando consideradas as circunstâncias específicas do caso concreto. Cumpre ressaltar que o apelante ostenta a condição de pessoa idosa e, portanto, hipervulnerável, circunstância que agrava sobremaneira os efeitos da conduta lesiva perpetrada pelos apelados, os quais, não obstante sua evidente capacidade econômica, promoveram descontos indevidos sobre parcela de natureza alimentar de sua aposentadoria, cujo valor restringe-se ao equivalente a um salário-mínimo. Tal situação revela acentuado descompasso entre as partes e vulnera, de forma evidente, princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana e a proteção especial conferida ao idoso. A jurisprudência consolidada desta Corte de Justiça, em hipóteses análogas, tem reiteradamente fixado a reparação por danos morais em patamares superiores àquele arbitrado pela instância de origem. Vejamos: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – CONTRATAÇÃO DE SEGURO NÃO COMPROVADA – DESCONTO INDEVIDO EM CONTA CORRENTE – DEVOLUÇÃO EM DOBRO – ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM ARBITRADO EM CONFORMIDADE COM OS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – RECURSO PROVIDO. Não comprovada pela parte ré a regularidade na contratação do seguro com a parte autora, é de concluir que os descontos realizados em conta corrente são ilegais, circunstância que enseja a restituição em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, caracterizada a má-fé da instituição financeira. O dano moral daí decorrente é presumido, dispensa prova . Para a fixação do quantum indenizatório, a título de danos morais, deve ser observados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, bem como as circunstâncias do caso concreto, sem perder de vista que a finalidade da reparação do dano é compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1012737-43.2022.8 .11.0041, Relator.: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 26/03/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/04/2024) Nessa senda, reputo adequada e juridicamente justificável a majoração do quantum indenizatório para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), valor que, à luz das especificidades do caso concreto, revela-se consentâneo com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, atendendo de forma simultânea à finalidade compensatória do dano suportado e à função pedagógica e inibitória que deve nortear a resposta judicial à prática de atos ilícitos. Por derradeiro, quanto aos honorários advocatícios sucumbenciais, mantenho o percentual fixado na sentença em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, por entender que atende adequadamente aos critérios estabelecidos no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Em razão do trabalho adicional realizado em grau recursal, majoro os honorários advocatícios em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, perfazendo o total de 15% (quinze por cento). Ante o exposto, CONHEÇO e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao Recurso de Apelação interposto Henrique Bitencort, para reformar a sentença determinando à restituição, em dobro, do valor descontado indevidamente da conta corrente do Autor; majorar o valor da indenização por danos morais para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), mantidos os parâmetros de correção monetária e juros fixados na sentença; Em razão do desfecho do julgamento e considerando o labor adicional desenvolvido em sede recursal, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil, observados os limites legais e a base de cálculo anteriormente fixada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear