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Processo nº 1029786-49.2024.8.11.0002

ID: 294883989

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1029786-49.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 10/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

KETERLY OLIVEIRA RAMOS

Acórdão

Advogados:

CARLOS AUGUSTO SERRA NETO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1029786-49.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1029786-49.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Produto Impróprio] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [LG ELECTRONICS DO BRASIL LTDA - CNPJ: 01.166.372/0001-55 (APELANTE), CARLOS ALEXANDRE MOREIRA WEISS - CPF: 862.549.606-72 (ADVOGADO), GRUPO CASAS BAHIA S.A. - CNPJ: 33.041.260/0652-90 (APELANTE), LUIZ GUILHERME MENDES BARRETO - CPF: 250.298.778-43 (ADVOGADO), KETERLY OLIVEIRA RAMOS - CPF: 053.800.121-67 (APELADO), CARLOS AUGUSTO SERRA NETO - CPF: 022.061.841-09 (ADVOGADO), GRUPO CASAS BAHIA S.A. - CNPJ: 33.041.260/0652-90 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. VÍCIO OCULTO EM APARELHO ELETRÔNICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR. TEORIA DA VIDA ÚTIL DO PRODUTO. DANOS MATERIAIS MANTIDOS. DANOS MORAIS AFASTADOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de apelação cível interposta por LG ELECTRONICS DO BRASIL LTDA e VIA VAREJO S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedente Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais. A autora pleiteou a restituição do valor pago por televisor defeituoso, recolhimento do produto e indenização por danos morais. A sentença acolheu parcialmente o pedido, condenando as rés à restituição do valor de R$ 2.499,00 mediante devolução do produto e ao pagamento de R$ 3.000,00 a título de danos morais. II. Questão em discussão 2. A controvérsia consiste em: (i) saber se é cabível a responsabilização das rés pelos vícios apresentados no televisor após o término do prazo de garantia contratual; e (ii) verificar a existência de danos morais indenizáveis em decorrência dos vícios apresentados. III. Razões de decidir 3. A responsabilidade do fornecedor persiste, nos termos do art. 26, § 3º, do CDC, quando demonstrado que o vício oculto se manifestou dentro da vida útil do produto. No caso, comprovou-se defeito funcional no display do televisor com cerca de 1 ano e 3 meses de uso, sem que tenha havido má utilização do bem. 4. A ausência de providências adequadas pela fornecedora caracteriza falha na prestação do serviço, não sendo afastada a responsabilidade objetiva pelo simples decurso do prazo contratual de garantia. 5. Quanto aos danos materiais, correta a condenação na restituição do valor pago, mediante devolução do produto, a fim de evitar enriquecimento sem causa. 6. No tocante aos danos morais, inexiste nos autos demonstração de ofensa à dignidade ou direitos da personalidade da autora, tratando-se de meros dissabores decorrentes de relação contratual, insuficientes para configurar dano moral indenizável. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso parcialmente provido, apenas para afastar a condenação por danos morais, mantendo-se a sentença nos demais termos. Tese de julgamento: “1. O fornecedor responde pelos vícios ocultos do produto manifestados dentro de sua vida útil, ainda que findo o prazo contratual de garantia. 2. A falha na prestação do serviço, consubstanciada na ausência de solução para o vício oculto, impõe a obrigação de indenizar os danos materiais suportados pelo consumidor. 3. A configuração do dano moral exige violação concreta à dignidade ou a direitos da personalidade, não caracterizada por meros aborrecimentos decorrentes da relação contratual.” Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 14, §3º, I e II; 26, §3º; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n.º 1787287/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, T3, j. 14.12.2021, DJe 16.12.2021. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por LG ELECTRONICS DO BRASIL LTDA contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, Dr. André Maurício Lopes Prioli, que nos autos da Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais interposta por KETERLY OLIVEIRA RAMOS, acolheu parcialmente o pedido inicial, para condenar as partes requeridas, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$2.499,00, condicionado a devolução do produto, bem como ao pagamento de danos morais no valor de R$ 3.000,00. Nas razões recursais, a apelante alega que não é responsável pelos danos causados a apelada, pois o vício no televisor ocorreu após o termino da garantia de 1 ano e por não haver provas desse ser oriundo do processo de fabricação do produto. Ainda, salienta que a consumidora não sofreu abalo psicológico apto para justificar a imposição de indenização por danos morais, que deve ser afastado ou, ao menos, minorado, em conformidade com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. A recorrida apresentou suas contrarrazões (id. 286070400), pugnando pelo desprovimento do apelo. É o relatório. Inclua-se na pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade recursal, conheço da apelação interposta. Extrai-se dos autos que KETERLY OLIVEIRA RAMOS ajuizou Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais em face de LG ELECTRONICS DO BRASIL LTDA e VIA VAREJO S.A., pretendendo a restituição da quantia equivalente ao valor pago no produto defeituoso, o recolhimento do aparelho e o pagamento de indenização por danos morais. Após a instrução processual, foi proferida sentença que acolheu parcialmente o pedido inicial, nos seguintes termos: “(...) Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS proposta por KETERLY OLIVEIRA RAMOS em desfavor de LG ELECTRONICS DO BRASIL LTDA e VIA VAREJO S.A., todas qualificadas nos autos. A parte autora alegou, em síntese, que em 16/05/2023 adquiriu na loja da segunda demandada um aparelho televisor 50” fabricado pela primeira ré, no valor de R$ 2.499,00. Relatou que em 08/2024 a televisão parou de funcionar e entrou em contato com a fabricante, sendo que esta alegou que diante do prazo nada poderia ser feito e indicou a assistência técnica autorizada. Que em contato com a empresa indicada pela reclamada, foi constatado que o aparelho não apresentou mau uso e/ou avaria, tratando-se de defeito funcional/falha elétrica no display do televisor, e, que o conserto ficaria em R$ 2.300,00. Afirmou que no dia 03/01/2022 a máquina apresentou defeito, acarretando inúmeros prejuízos. Após a visita técnica, foi constatada a necessidade de troca de peça, o que impediu o trabalho por semanas. Assim, requereu que as reclamadas restituam o valor pago no produto, que recolham o aparelho danificado e sejam condenadas ao pagamento de indenização por danos morais. (...)É incontroverso que no dia 16/05/2023 a requerente adquiriu a televisão objeto da lide, no valor de R$ 2.499,00 (Id. 166760932) e que o produto apresentou vício em 08/2024 (Id. 166760934). A controvérsia reside na responsabilidade de qual parte seria a responsabilidade pelo defeito. Compulsando o processo, denoto que o polo ativo comprovou que solicitou o reparo do produto por meio do protocolo nº RNN240815028743, inclusive sendo orientada a procurar a assistência técnica autorizada. Da mesma forma, restou demonstrado nos autos que o problema não foi solucionado, sendo necessário o reparo na quantia aproximada de R$ 2.300,00, ou seja, no valor do produto adquirido, fatos estes não impugnados pelas empresas demandadas. Destarte, caso contrário fosse, as requeridas teriam apresentados elementos plausíveis para o fim de desconstituir a alegação verossímil apresentada pela parte autora, já que podem comprovar que o produto estava em perfeita condição e qualidade para a sua comercialização ou que prestaram a devida assistência e/ou reparo, mas não o fizeram, inclusive, pediram o julgamento antecipado da lide. Desta feita, para que pudessem desonerar da obrigação de indenizar, deveriam provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou, a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (§3º, inc. I e II, do art. 14 do CDC), o que não se verificou no presente caso. Desta forma, configurado está o vício do produto. (...)Assim, uma vez comprovado pela requerente os fatos alegados, cumpria as reclamadas provocarem o contraditório demonstrando fato extintivo, impeditivo ou modificativo do direito do autor, nos termos do artigo 373, II do CPC, o que não fizeram. Sendo certo, que as requeridas devem reparar os danos advindos do produto avariado. Diante desse contexto, evidente a falha na prestação de serviço da parte ré e, por conseguinte, na responsabilidade da mesma em ressarcir e indenizar os danos causados à autora. - Dano material. A requerente pediu a condenação das demandadas em restituição da quantia de R$ R$ 2.499,00, pago no produto. O dano material é a lesão que atinge o patrimônio da vítima, o qual é suscetível de apreciação pecuniária e que, por isso, pode ser reparado diretamente ou por meio de equivalente indenização pecuniária. Nesta linha, entendo que a parte autora faz jus aos danos materiais pretendidos no que tange ao reembolso dos valores dispendidos com a compra da televisão, no montante de R$ 2.499,00. No entanto, deverá devolver o produto à demandada. - Dano moral. Em relação ao dano moral, não há dúvida de que o polo passivo causou prejuízo de ordem moral ao ativo, diante da negativa em reparar o produto avariado. (...)Desse modo, mostra-se razoável fixar o valor no patamar de R$ 3.000,00 (três reais), a título de compensação por danos morais, visto que a demandante não demonstrou nenhuma peculiaridade do caso concreto capaz de elevar o quantum indenizatório, devendo tal compensação ser fixada nos padrões ordinários em atenção à vedação ao enriquecimento ilícito e ao princípio da proporcionalidade.(...)”. (ID. 286070392) Irresignado, o apelante interpôs o presente recurso, pleiteando a reforma do decisum, sob o argumento de que não é responsável pelos danos causados a apelada, pois o vício no televisor ocorreu após o termino da garantia de 1 ano e por não haver provas desse ser oriundo do processo de fabricação do produto. Ainda, pugna pelo afastamento dos danos morais ou, subsidiariamente, a sua minoração. Em suas contrarrazões, o recorrido postulou o desprovimento do apelo. Pois bem. Após detida análise, constata-se que o recurso comporta parcial acolhimento. A lide encontra amparo no Código de Defesa do Consumidor, porquanto autora e réus se inserem, respectivamente, no conceito de consumidora e de fornecedores de serviço, consagrados nos artigos 2º e 3º, caput, do CDC. Dessa maneira, deve-se ter em mente que estamos diante de uma relação entre desiguais, a impor o império do diploma consumerista, de modo a restabelecer o equilíbrio e simetria nos polos da demanda. Na hipótese vertente, restou evidenciado que o aparelho de TV adquirido pela autora apresentou defeito funcional/falha elétrica no display (tela), com cerca de 1 ano e 3 meses de uso do produto, tendo o reparo um custo de R$ 2.300,00 (ID. 286069935). A empresa autorizada responsável pelo atendimento não atestou nenhuma hipótese de mau uso do aparelho pela consumidora recorrida, sendo, portanto, desnecessária a realização de prova pericial. Ainda que seja considerado que os aparelhos eletrônicos invariavelmente tenham um desgaste natural, a autora apontou vício não perceptível a ele, tecnicamente hipossuficiente, o qual se apresentou com cerca de 1 ano e 3 meses de uso. A empresa requerida não apresentou qualquer fato modificativo, extintivo ou impeditivo da pretensão autoral. Ademais, a consumidora entrou em contato, relatou os problemas verificados e solicitou providências. Entretanto, a ré se limitou a informar que o prazo de garantia havia expirado e que a consumidora deveria arcar com todos os custos do reparo, indicando apenas sua assistência técnica autorizada para realizar os reparos, fato que caracteriza o defeito na prestação de serviço. O fim do prazo de garantia contratual do produto, por si só, não afasta a responsabilidade objetiva da recorrente, a qual deve se responsabilizar pelos vícios ocultos apresentados pelo aparelho. Comprovado o nexo de causalidade, a conduta ilícita e o defeito na prestação do serviço, cabe a recorrente o dever reparação dos eventuais danos materiais suportados pela autora. Em relação aos danos materiais, restou comprovado que a autora adquiriu o aparelho de TV, que apresentou vício oculto, pelo valor de R$ 2.499,00, conforme nota fiscal de ID. 286069934. Logo, por se tratar de responsabilidade objetiva, correto o valor da indenização por danos materiais, mediante a entrega do aparelho televisor, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa da recorrida. No que tange a responsabilidade do fornecedor após a garantia contratual, é notório a responsabilidade pelo produto dentro do período de vida útil estimado para ele. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça: “RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. VÍCIO DO PRODUTO . RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR. TEORIA DA VIDA ÚTIL DO PRODUTO. ACÓRDÃO RECORRIDO. FUNDAMENTAÇÃO . PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NEGATIVA. AFASTAMENTO. JULGAMENTO EXTRA PETITA . NÃO OCORRÊNCIA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2 . A questão controvertida resume-se à verificação da responsabilidade do fornecedor por vícios apresentados em eletrodomésticos durante a denominada "vida útil do produto". 3. Não o se reconhece a negativa de prestação jurisdicional alegada quando o Tribunal de origem se pronuncia a respeito de todos os pontos levantados pela recorrente, ainda que de forma sucinta, afastando os argumentos deduzidos que, em tese, seriam capazes de infirmar a conclusão adotada. 4 . Não há julgamento extra petita quando o acórdão recorrido, acolhendo argumento da parte pleiteando a inaplicabilidade da Teoria da Vida Útil do Produto à hipótese, afasta a responsabilidade pelos vícios surgidos após o período de garantia contratual. 5. O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 26, § 3º, ao tratar dos vícios ocultos, adotou o critério da vida útil do bem, e não o da garantia, podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício mesmo depois de expirada a garantia contratual . Precedentes. 6. No caso, os vícios observados nos produtos adquiridos pela recorrente apareceram durante o período de vida útil do produto, e não foi produzida nenhuma prova de que o mau funcionamento dos eletrodomésticos decorreu de uso inadequado pelo consumidor, a evidenciar responsabilidade da fornecedora. 7 . Recurso especial conhecido e parcialmente provido.” (STJ - REsp: 1787287 SP 2018/0247332-2, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 14/12/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/12/2021) (g. n.) Examinando os autos e argumentos esboçados, assiste razão à autora, mormente não é razoável que um produto durável de elevado valor (televisor) e fabricado por empresa de renome internacional funcione pouco mais de um ano, razão pela qual, adotando-se a teoria da vida útil, desconsidero o prazo de garantia contratual (1 ano) e, consequentemente, reconheço a responsabilidade das requeridas pela reparação dos danos materiais reclamados. E mais, não foi apresentada qualquer prova indicando a utilização inadequada do produto por parte da consumidora ou descumprimento do manual, e tampouco de prova pericial apta a atestar com fidedignidade o estado de conservação do televisor. Desta forma, evidente a responsabilidade dos fornecedores, não merecendo reforma a sentença nesse ponto. Em relação aos danos morais, sem embargo da proteção que o CDC exerce sobre a relação obrigacional existente entre as partes, tenho que razão assiste a Apelante, pois não restou comprovado qualquer ofensa à dignidade ou a um dos direitos da personalidade da autora. De acordo com o que leciona Maria Helena Diniz (Curso de Direito Civil brasileiro: responsabilidade civil. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 112), o direito à indenização por dano moral exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade ou a dignidade da pessoa humana, abrangendo interesses que, embora desprovidos de conteúdo patrimonial, são dotados de extrema relevância na ordem jurídica pátria. A configuração, portanto, pressupõe grave agressão a direito da personalidade, capaz de provocar abalo, sofrimento, humilhação, desequilíbrio psicológico por um período desarrazoado. Nos autos, a situação vivenciada decorre de meros transtornos ou dissabores na relação comercial, não existindo elementos concretos do constrangimento vivido por ela que sejam capazes de atingir a intimidade, honra, privacidade ou reputação, sobretudo porque não há provas de qualquer outro fato que possa ter acarretado repercussões de maior gravidade. Por fim, considerando que o recurso de apelação da LG ELECTRONICS DO BRASIL LTDA foi parcialmente provido, impõe-se a readequação dos honorários sucumbenciais fixados na sentença de origem, de modo a refletir a sucumbência recíproca. Assim, faz-se necessária a redistribuição do ônus sucumbencial, sendo devida por ambas as partes, na proporção de 70% para o Apelante, e 30% para a Apelada, observada a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo Códex em relação à autora, por litigar sob o pálio da justiça gratuita. Em face do exposto, conheço e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por LG ELECTRONICS DO BRASIL LTDA, tão somente para afastar a condenação por danos morais e, via de consequência, redistribuir o ônus de sucumbência na forma acima assinalada, devendo ser mantida a sentença em seus demais termos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025

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Edson Augusto Arruda Pereira x Mottu Locacao De Veiculos Ltda.

ID: 334686673

Tribunal: TJMT Órgão: 1º JUIZADO ESPECIAL DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1034054-49.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

EDSON AUGUSTO ARRUDA PEREIRA

Polo Passivo:

MOTTU LOCACAO DE VEICULOS LTDA.

Sentença

Advogados:

MARCELO ZAINA DE OLIVEIRA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO MARCELO ZAINA DE OLIVEIRA

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ALBERTO VIETO MACHADO SCALOPPE

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GUSTAVO ZAINA DE OLIVEIRA

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THIAGO MAHFUZ VEZZI

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IGOR MACIEL ANTUNES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1º JUIZADO ESPECIAL DE VÁRZEA GRANDE Processo: 1034054-49.2024.8.11.0002 Parte reclamante: Edson Augusto Arruda Pereira. Parte reclamada: Mottu Locação de Veícu… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1º JUIZADO ESPECIAL DE VÁRZEA GRANDE Processo: 1034054-49.2024.8.11.0002 Parte reclamante: Edson Augusto Arruda Pereira. Parte reclamada: Mottu Locação de Veículos Ltda. S E N T E N Ç A Relatório minucioso dispensado (art. 38 da Lei nº 9.099/95). Resumo relevante EDSON AUGUSTO ARRUDA PEREIRA ajuizou uma ação de indenização por danos materiais e morais decorrentes de acidente de trânsito em desfavor da MOTTU LOCAÇÃO DE VEÍCULOS LTDA. Em síntese, alegou que no dia 26/07/2024, enquanto transitava pela Avenida B, no bairro Asa Bela, teve seu veículo Fiat Palio, cor vermelha, placa QBC0I23, abarroado por uma motocicleta Mottun Sport, cor preta, placa FVY7D04 (ID 170177506). Narrou que a motocicleta invadiu a preferência e colidiu com o para-choque de seu carro. Afirmou que ninguém se feriu e o condutor da moto se identificou como Guilherme Dias, pois não possuía documentos pessoais. Registrou o boletim de ocorrência (ID 170177505) e buscou a solução administrativa, mas sem êxito (ID 170177502). Pelos fatos narrados, pleiteou a indenização pelos danos materiais e morais. Realizada audiência de conciliação, o acordo restou infrutífero. A contestação foi apresentada no ID 183640129, na qual arguiu a incompetência do Juizado Especial, a ilegitimidade passiva e o litisconsórcio passivo. Sustentou a inexistência de ato ilícito, o descabimento dos danos materiais e a ausência do dever de indenizar. Ao final, postulou pela improcedência dos pedidos iniciais. Em seguida foi apresentada a impugnação a contestação. Incompetência em razão da matéria. Nos termos do artigo 3º da Lei nº 9.099/95, o Juizado Especial Cível é competência para processar e julgar causas cíveis de menor complexidade. Em relação ao conceito de menor complexidade, o Enunciado 54 do Fórum Nacional de Juizados Especiais estabelece que este leva em consideração o objeto da prova e não o direito material discutido: ENUNCIADO 54 - A menor complexidade da causa para a fixação da competência é aferida pelo objeto da prova e não em face do direito material. Assim sendo, os Juizados Especiais Cíveis não são competentes para processar e julgar causas em que for necessária a produção de prova pericial, visto que se trata de prova complexa. No caso em análise, verifico que as provas existentes no processo são suficientes para elucidar a controvérsia. Consequentemente, este juízo é competente para processar e julgar a presente demanda. Ilegitimidade passiva. A indicação na petição inicial das partes, trazendo como causa de pedir fundamentos que evidenciam a existência de uma suposta relação jurídica de direito material, é suficiente para sustentar a legitimidade, como preconizado pela Teoria da Asserção, amplamente aceita no c. Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AQUISIÇÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS POR INTERMÉDIO DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. TEORIA DA ASSERÇÃO. PRECEDENTES. PRESCRIÇÃO. PRAZO. TERMO INICIAL. CIÊNCIA DA LESÃO. TEORIA DA ACTIO NATA. MOMENTO DA OCORRÊNCIA DA CIÊNCIA INEQUÍVOCA. SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Não há ilegitimidade passiva nas hipóteses em que a pertinência subjetiva do réu em relação à pretensão deduzida em juízo torna-se evidente à luz da teoria da asserção, segundo a qual as condições da ação devem ser aferidas tomando como pressuposto, provisoriamente, apenas em juízo de admissibilidade da demanda, as próprias afirmações ou alegações contidas na petição inicial, dispensando-se qualquer atividade probatória. [...] 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, 3ª Turma, AgRg no AREsp nº 740.588/SP, Rel. Min.: Marco Aurélio Bellizze, DJU 27/10/2015). Diante do exposto, em exame apenas das alegações contidas na inicial, nota-se que as partes da relação jurídica de direito material, coincidem com as partes desta demanda, tornando-as partes legítimas para figurar no polo ativo e passivo. Por fim, relevante consignar que a discussão quanto à responsabilidade civil da parte reclamada, depende da análise da tese de defesa e do conjunto fático probatório, pontos que serão examinados de forma apropriada, no mérito da demanda. Portanto, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva. Intervenção de terceiro. Diante das especificidades dos Juizados Especiais, mormente quanto à simplicidade, economia processual e celeridade (art. 2º da Lei nº 9.099/95), não se admite a intervenção de terceiro, inclusive, assistência, nos ritos do juizado, conforme expressamente previsto no artigo 10 da referida lei. Portanto, é inadmissível o chamamento ao processo no caso concreto, já que este é uma das modalidades de intervenção de terceiros previstas no Código de Processo Civil. Nesse sentido: CHAMAMENTO AO PROCESSO ARTIGO 10º DA LEI 9.099/95 QUE NÃO ADMITE QUALQUER TIPO DE INTERVENÇÃO DE TERCEIRO. CHAMAMENTO AO PROCESSO. SUBSTÂNCIA INTERVENÇÃO DE TERCEIRO QUE É VEDADA PELA MENCIONADA NORMA. SIMPLICIDADE E CELERIDADE INTRÍNSECAS AO PROCEDIMENTO DOS JUIZADOS QUE DESAUTORIZAM A INTERVENÇÃO DE TERCEIROS NA DEMANDA. (TJSP, Tur. Rec., RI nº 1003188-19.2017.8.26.0024, Rel.: Iris Daiani Paganini dos Santos, DJU 13/06/2018). (Destacamos). Importante mencionar, que não se trata de litisconsórcio necessário e a parte reclamada pode manejar a ação regressiva em desfavor do locatário e condutor do veículo, vejamos: OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - Demora no fornecimento de peças de reposição pelo fabricante - Seguradora autorizou o reparo em 2/02/2024, mas a motocicleta apenas foi entregue pela oficina em 31/7/2024, pela falta de peças de reposição - Chamamento ao processo da seguradora - Não cabimento da intervenção de terceiros nos Juizados Especiais - Impossibilidade, contudo (art. 10 da Lei 9.099/1995), não torna “inadmissível” o procedimento especial, sendo certo que a ação regressiva, se o caso, poderá ser movida pela ora ré [...] (TJSP, 7ª Tur. Rec., R.I. nº 10209463620248260001, Rel.: Antônio Carlos Santoro Filho, DJU 09/09/2024). (Destacamos). Intervenção de terceiro - Artigo 10º da Lei 9.099/95 que não admite qualquer tipo de intervenção de terceiro - Solicitação de inclusão de empresa de turismo e de pessoa física que, em verdade, introduz novo fundamento na causa e, por isso, afronta a simplicidade e a celeridade intrínsecas ao procedimento dos juizados - Hipótese de intervenção de terceiros que em nada se assemelha ao litisconsórcio passivo necessário unitário afirmado pela ré - Possibilidade da ré ajuizar ação regressiva autônoma contra quem de direito para ressarcimento de valores pendentes e também da importância a ser desembolsada nesta demanda [...] Responsabilidade do proprietário do veículo locado pela reparação dos danos - Súmula 492 do STF que dispõe responsabilidade civil solidária da locadora pelos danos causados por veículo na posse de locatário [...] (TJSP, 2ª Tur. Cív.; RI nº 1020992-29.2017.8.26.0564; Rel.: Mauricio Tini Garcia, DJU 07/02/2018). (Destacamos). Desta forma, a preliminar deve ser rejeitada. Julgamento antecipado da lide. Inicialmente, destaco o cabimento do julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, visto que os fatos controvertidos só podem ser comprovados por meio documental. Com fulcro nos artigos 370 e 371 do Código de Processo Civil, em que disciplinam o Princípio da Livre Apreciação Motivada das Provas e da ausência de manifestação das partes, julgo desnecessária a produção de outras provas em audiência de instrução. Registro, que, no sistema dos Juizados Especiais, o juiz não está obrigado a rebater uma a uma as teses apresentadas pelas partes, bastando que consigne na sentença os elementos formadores da sua convicção. Colisão em via preferencial. O Código de Trânsito Brasileiro determina que os condutores reduzam a velocidade sempre que se aproximarem de um cruzamento, vejamos: Artigo 44 - Ao aproximar-se de qualquer tipo de cruzamento, o condutor do veículo deve demonstrar prudência especial, transitando em velocidade moderada, de forma que possa deter seu veículo com segurança para dar passagem a pedestre e a veículos que tenham o direito de preferência. Ainda, de acordo com o artigo 29, inciso III, em caso de cruzamento em via não sinalizada, terá preferência de passagem: a) no caso de apenas um fluxo ser proveniente de rodovia, aquele que estiver circulando por ela; b) no caso de rotatória, aquele que estiver circulando por ela; c) nos demais casos, o que vier pela direita do condutor. A dinâmica do acidente não é controvertida, porquanto a parte reclamante apresentou o boletim de ocorrência e fotografias do veículo que demonstra os danos causados no para-choque lateral do veículo, presumindo-se a culpa do condutor da motocicleta, por violar o disposto nos artigos 28 e 29 do Código de Trânsito Brasileiro. Cumpre destacar que a parte reclamada sustentou apenas a ausência de responsabilidade, em razão do condutor da motocicleta não ter autorização para pilotar. Nesse cenário, os elementos probatórios conduzem à conclusão pela culpa do condutor da motocicleta, ao deixar de adotar as cautelas necessárias e previsíveis para evitar ou minorar as consequências da colisão. Nesse sentido, segue a jurisprudência: Apelação Cível - Acidente de trânsito - Ação regressiva de ressarcimento de danos decorrentes de acidente de veículos - Sentença de procedência - Irresignação dos requeridos - Ausência de comprovação da culpa do corréu condutor do veículo - Motorista que trafega em via secundária, ao realizar ingresso na via preferencial colide com veículo segurado - Não observância das regras objetivas de cuidado previstas no Código de Trânsito Brasileiro ( CTB) - Conjunto probatório que confirma a culpa exclusiva pela colisão do condutor do veículo que ingressou em via preferencial - Responsabilidade do condutor e do proprietário do veículo causador do acidente - Sentença mantida - Improvido o recurso. (TJSP, 25ª Câm. Dir. Priv., APC nº 1027816-78.2022.8.26.0224, Rel.: João Antunes, DJU 08/05/2024). Assim, não há como afastar a responsabilidade objetiva da parte reclamada pelos danos causados ao veículo. Responsabilidade solidária da locadora. De acordo com o texto legal, haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. A atividade desenvolvida pela parte reclamada, de colocar veículos em circulação nas vias públicas, se enquadra na parte final do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, uma vez que, por si só, implica em risco para os direitos dos demais motoristas e para os pedestres. A respeito do tema, há entendimento sumulado do STF no sentido de que “a empresa locadora de veículos responde, civil e solidariamente com o locatário, pelos danos por este causado a terceiro, no uso do carro locado” (Súmula nº 492). Tratando-se de responsabilidade objetiva, é desnecessária a aferição de culpa da parte reclamada na causação do acidente, bastando que reste configurada a culpa do locatário, o que, no presente caso, restou devidamente comprovada. A corroborar: Recurso Inominado - Acidente de trânsito. Culpa incontroversa do condutor do veículo locado pelo evento. Responsabilidade solidária do proprietário com o condutor do veículo. Súmula nº 492 do STF. Legitimidade ativa - Autor a quem é dado buscar, da empresa locadora, o acionamento da proteção contra danos causados a terceiros, mesmo porque, uma vez não prestada, será o próprio requerente obrigado a arcar com o ressarcimento correspondente. Culpa do condutor veículo locado. Elemento fundamental à caracterização da responsabilidade civil extracontratual por acidente de trânsito. Locador/proprietário que responde solidariamente pelos danos causados a terceiro Súmula 492 do STF. Dever de indenizar. Ressarcimento dos danos causados a terceiro. Dano moral configurado e arbitrado de maneira razoável, que não comporta redução, em virtude da negativação indevida do nome do autor, referentemente ao valor dos danos causados ao veículo locado que, no entanto, já havia sido pago antes do seu vencimento. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJSP, 3ª Tur. Rec., RI nº 0007098-02.2022.8.26.0152, Rel.: Olavo Paula Leite Rocha, DJU 03/06/2024). Desta forma, permanece inalterada a responsabilidade da parte reclamada, pelos danos causados a parte reclamante. Dano material O dano material constitui prejuízo ou perda que atinge o patrimônio corpóreo de alguém. Diferentemente do dano moral, para o dano material não compreende dano hipotético ou eventual, logo, necessita, em regra, de prova efetiva. Nos termos do artigo 402 do Código Civil, os danos materiais podem ser subclassificados em danos emergentes (o que efetivamente se perdeu) ou lucros cessantes (o que razoavelmente se deixou de lucrar). A parte reclamante demonstrou o prejuízo com os orçamentos que instruem a inicial (ID 170177503), emitidos por firmas aparentemente idôneas e hábeis a precisar a extensão do dano. Nesse sentido, a indenização material deve ocorrer pelo menor dos três orçamentos apresentados de R$3.644,10 (três mil seiscentos e quarenta e quatro reais e dez centavos), o que tenho como parâmetro justo e adequado para a reparação. Dano moral Por fim, no que tange aos danos morais, não vislumbro nada que tenha atingido a esfera dos direitos da personalidade da parte reclamante. Afinal, quem trafega na cidade corre o risco constante de abalroar com outros veículos, ser atingido por colisões de terceiros ou, mesmo estacionado, ter o carro arranhado por motociclistas, ciclistas ou outros veículos. Porém, nada disso atinge a honra subjetiva, sobretudo porque esse tipo de acontecimento, embora desagradável, equivalente as frustrações corriqueiras. Neste sentido: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS POR ACIDENTE DE TRÂNSITO C/C PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS COM TUTELA ANTECIPADA - ACIDENTE DE TRÂNSITO - COLISÃO TRASEIRA - PRESUNÇÃO DE CULPA DO CONDUTOR QUE COLIDE COM O VEÍCULO À FRENTE - INDENIZAÇÃO -DANOS MATERIAIS - INCIDÊNCIA - DANOS MORAIS - NÃO CONFIGURADOS. [...] Para que seja deferida a indenização por danos morais necessária demonstração de que a situação experimentada tenha exposto a vítima à dor, vexame, sofrimento ou constrangimento perante terceiros. Os meros e passageiros aborrecimentos cotidianos, que não causam maiores consequências à vítima, não configuram prejuízo moral passível de indenização. A reparação dos danos materiais demanda prova do prejuízo e nexo com o evento danoso. (TJMG, 10ª Câm. Cív., APC nº 00076203020198130432, Rel.: Des. Cavalcante Motta, DJU 11/09/2024). Portanto, em se tratando de mero aborrecimento não é devida a indenização por danos morais. Dispositivo. Posto isso, proponho rejeitar as preliminares arguidas e julgar parcialmente procedente os pedidos contidos na inicial, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: 1. Condenar a parte reclamada ao pagamento de indenização por danos materiais a parte reclamante no valor de R$3.644,10 (três mil seiscentos e quarenta e quatro reais e dez centavos), corrigido monetariamente pelo IPCA (CC, art. 389, parágrafo único), a partir do evento danoso (Súm. 43 do STJ), bem como, acrescido de juros moratórios pela taxa Selic, contado a partir da citação, deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do artigo 389 do Código Civil, conforme determina o artigo 406, § 1°, do referido Diploma Civil, e precedentes do c. STJ, e; 2. Indeferir o pleito indenizatório a título de danos morais. Sem custas e honorários advocatícios, nos termos dos artigos 54 e 55, ambos da Lei nº 9.099/95. Submeto o presente projeto de decisão à homologação do Magistrado Togado, para que surta os efeitos legais previstos no artigo 40 da Lei nº 9.099/95. Francys Loide Lacerda da Silva Juíza Leiga Vistos, etc. Homologo, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos, o Projeto de Sentença elaborado pela Juíza Leiga deste Juizado Especial. Em havendo Cumprimento Voluntário da Condenação/Transação/Remanescente e a concordância da parte credora com o valor pago/depositado, tem-se a quitação da importância devida, não havendo outras obrigações a serem cumpridas. Expeça-se, se necessário, o competente Alvará Judicial na forma requerida. Caso a solicitação de transferência de valor seja para a conta do advogado da parte credora, fica já autorizado, desde que tenha sido juntado aos autos o instrumento procuratório com poderes para o causídico “receber, dar quitação”. Tudo cumprido, arquive-se com as cautelas de estilo, dando-se baixa na distribuição. Advirto que a apresentação de Embargos de Declaração manifestamente protelatórios acarretará a aplicação da multa prevista no artigo 1.026, §2°, do Código de Processo Civil. Intimem-se as partes da sentença. Data do registro no sistema. P. R. I. Juiz OTÁVIO PEIXOTO

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Wilson Sodre Farias Filho x Stellantis Financiamentos Sociedade De Credito Financiamento E Investimento S.A.

ID: 308498817

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1012132-49.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

WILSON SODRE FARIAS FILHO

Polo Passivo:

STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

Sentença

Advogados:

THIAGO MAHFUZ VEZZI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RAFAEL ANDRIGO TSCHOKE

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

SERGIO SCHULZE

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

PJe: 1012132-49.2024.8.11.0002 Vistos, etc. WILSON SODRE FARIAS FILHO, devidamente qualificado nos autos, ajuizou a presente AÇÃO DE COBRANÇA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS em face de STELLANTIS… PJe: 1012132-49.2024.8.11.0002 Vistos, etc. WILSON SODRE FARIAS FILHO, devidamente qualificado nos autos, ajuizou a presente AÇÃO DE COBRANÇA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS em face de STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (sucessora do Banco PSA Finance Brasil S.A.), também qualificada, alegando, em síntese, que firmou contrato de financiamento com a requerida para aquisição do veículo CITROEN/AIRCROSS OP, Marrom, 2012/2012, placa OBC-1819, renavam 488319412. Narra o autor que o referido veículo foi objeto de ação de busca e apreensão nº 0048717-15.2015.8.11.0041, que tramitou perante a 1ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá-MT, na qual foi deferida liminar de busca e apreensão, sendo o veículo apreendido em 17/05/2017. Aduz que, determinado o prosseguimento do feito pelo requerido, este deixou de dar efetivo andamento à demanda, resultando na revogação da liminar e posterior extinção da ação sem resolução do mérito em sentença proferida em 11/02/2020. Sustenta o autor que, em decorrência da revogação da liminar, foi penhorada nas contas do requerido a importância de R$ 32.512,00, referente ao valor da Tabela FIPE do veículo objeto da demanda. Alega que, transitada em julgado a decisão de extinção, os autos aguardavam manifestação do requerido para levantamento da quantia bloqueada, correspondente à devolução do veículo, consequência lógica da revogação da liminar. Contudo, os pedidos de levantamento dos valores foram indeferidos, sendo determinado o ajuizamento de demanda autônoma para apuração do valor da indenização. Informa o autor que, durante o trâmite da ação de busca e apreensão, o requerido procedeu à venda do veículo, impossibilitando sua restituição física. Assim, com fundamento nos artigos 302 e 309 do Código de Processo Civil e na jurisprudência consolidada dos tribunais superiores, pleiteia a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 35.960,00, correspondente ao valor do veículo conforme Tabela FIPE na época da apreensão, devidamente atualizado e acrescido de juros moratórios desde a data da apreensão. Adicionalmente, com base no artigo 3º, §6º, do Decreto-Lei 911/69, requer a condenação do requerido ao pagamento de multa equivalente a 50% do valor originalmente financiado, no montante de R$ 15.521,48, correspondente à penalidade prevista para casos de venda antecipada do bem quando a ação é julgada improcedente ou extinta sem resolução do mérito. A petição inicial veio instruída com os documentos essenciais, incluindo contrato de financiamento, documentos do veículo, consulta à Tabela FIPE, cópias dos autos da ação de busca e apreensão, sentença de extinção e acórdãos dos recursos interpostos. Foi deferida a gratuidade da justiça ao autor e determinada a citação do requerido. Regularmente citado, o requerido apresentou contestação, suscitando preliminar de carência de ação por falta de interesse processual, sob o argumento de que o autor não possui saldo credor a receber, inexistindo motivação plausível para a reparação perseguida. No mérito, sustenta que o valor pleiteado é manifestamente excessivo e desproporcional ao apurado após a venda do veículo em leilão. Alega que o veículo foi vendido por R$ 23.600,00 em 16/11/2017, valor que foi integralmente utilizado para amortização do saldo devedor e pagamento de despesas contratuais, não restando saldo credor em favor do autor. Nega a aplicabilidade da multa prevista no Decreto-Lei 911/69, sustentando que esta somente se aplica em casos de improcedência da ação, não de extinção sem resolução do mérito. Juntou documentos comprobatórios de suas alegações. Em complementação à defesa, o requerido apresentou em 19/09/2024 documentação detalhada comprovando todos os gastos incorridos com a cobrança, incluindo nota fiscal do leilão, histórico completo de pagamentos do contrato, comprovantes de custas processuais, despesas com diligências do oficial de justiça e demais gastos relacionados à ação de busca e apreensão. O autor apresentou impugnação à contestação, refutando os argumentos do requerido e reiterando seus pedidos iniciais. Sustenta que a venda do veículo foi realizada por risco do requerido e que, com a extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito, deve ser restabelecido o status quo ante. Contesta os cálculos apresentados pelo requerido, alegando que não devem ser abatidas as despesas processuais do valor a ser restituído, e reitera a aplicabilidade da multa do Decreto-Lei 911/69, com base na jurisprudência que equipara a extinção sem resolução do mérito à improcedência para fins de aplicação da penalidade. Instadas a se manifestarem sobre a produção de provas, as partes requereram o julgamento antecipado da lide. É o relatório. Decido. Cuida-se de ação de cobrança cumulada indenização por danos materiais. DO JULGAMENTO ANTECIPADO Inicialmente, cumpre analisar a possibilidade de julgamento antecipado da lide. O artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil estabelece que "o juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas". No presente caso, as questões controvertidas são predominantemente de direito, envolvendo a interpretação dos efeitos da extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito, a aplicação da jurisprudência consolidada sobre o parâmetro indenizatório em casos de impossibilidade de restituição do bem apreendido, e a incidência da multa prevista no Decreto-Lei 911/69. A prova documental juntada aos autos, especialmente os documentos apresentados pelo requerido em 19/09/2024, é suficiente para a adequada resolução de todas as questões fáticas controvertidas. A nota fiscal do leilão comprova o valor exato da venda (R$ 23.600,00), o histórico de pagamentos detalha a situação contratual, e os comprovantes de gastos esclarecem a destinação dos valores obtidos. Assim, não havendo necessidade de produção de outras provas, procedo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. DA PRELIMINAR · Da Alegada Carência de Ação por Falta de Interesse Processual O requerido suscita preliminar de carência de ação por falta de interesse processual, alegando que o autor não possui saldo credor a receber, inexistindo motivação plausível para a reparação perseguida. O interesse de agir, também denominado interesse processual, manifesta-se pela necessidade de obtenção da tutela jurisdicional pleiteada e pela adequação do procedimento escolhido. No caso em análise, verifica-se que o autor busca a reparação de alegados danos decorrentes da extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito, após a apreensão e venda do veículo objeto do contrato de financiamento. A existência ou não de saldo credor em favor do autor constitui questão de mérito, relacionada à procedência ou improcedência dos pedidos formulados, não se confundindo com a análise das condições da ação. O autor demonstra interesse jurídico na obtenção da tutela jurisdicional, fundamentando seus pedidos em dispositivos legais e jurisprudência dos tribunais superiores. A via processual escolhida (ação de cobrança c/c indenização por danos materiais) mostra-se adequada para a pretensão deduzida, especialmente considerando que o próprio juízo da ação de busca e apreensão determinou o ajuizamento de demanda autônoma para apuração da indenização. Assim, rejeito a preliminar de carência de ação por falta de interesse processual. DO MÉRITO Superadas as questões preliminares, passo à análise do mérito da demanda. O litígio envolve a pretensão do autor de obter indenização por danos materiais decorrentes da extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito, após a apreensão e venda do veículo objeto do contrato de financiamento, bem como o pagamento de multa prevista no Decreto-Lei 911/69. Da análise dos autos, extraem-se os seguintes fatos incontroversos: · As partes celebraram contrato de financiamento nº 200117158 em 22/09/2014, tendo por objeto o veículo CITROEN/AIRCROSS OP, Marrom, 2012/2012, placa OBC-1819, no valor de R31.042,96,a ser pago em 60 parcelas mensais de R$ 811,76; · O autor pagou regularmente as parcelas de números 1 a 7, vencidas entre outubro/2014 e abril/2015, entrando em mora a partir da parcela nº 8, vencida em 24/05/2015; · Em razão da inadimplência, o requerido ajuizou ação de busca e apreensão nº 0048717-15.2015.8.11.0041 perante a 1ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá-MT, obtendo liminar que foi cumprida em 17/05/2017 com a apreensão do veículo; · A ação de busca e apreensão foi extinta sem resolução do mérito em sentença proferida em 11/02/2020, por inércia do requerido em dar andamento ao feito, decisão que transitou em julgado após o julgamento dos recursos interpostos pelo autor; · Durante o trâmite da ação de busca e apreensão, o requerido procedeu à venda do veículo em leilão público realizado em 16/11/2017, pelo valor de R$ 23.600,00, conforme nota fiscal juntada aos autos; · O valor da Tabela FIPE do veículo na época da apreensão (maio/2017) era de R$ 35.960,00, conforme documento juntado pelo autor; · O valor financiado originalmente foi de R$ 31.042,96. Já as questões controvertidas cingem-se aos seguintes pontos: · Se há direito do autor à indenização por danos materiais decorrentes da extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito. · Qual o parâmetro adequado para eventual indenização: o valor da Tabela FIPE na época da apreensão (R$ 35.960,00) ou o valor efetivamente obtido na venda (R$23.600,00). · Se é legítimo o abatimento das despesas com cobrança do valor obtido na venda do veículo. · Se é aplicável a multa prevista no artigo 3º, §6º, do Decreto-Lei 911/69 em caso de extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito. Pois bem. A questão central da demanda é analisar os efeitos da extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito sobre a obrigação de restituição do bem apreendido ou de seu valor equivalente. Embora o art. 309, III, do CPC preveja que tanto o julgamento de improcedência quanto a extinção sem mérito determinem a cessação da eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, tal distinção não implica que a extinção sem mérito se equipare ao julgamento de improcedência em termos definitivos. Já o art. 302, III, do mesmo diploma estabelece a responsabilidade pela reparação dos prejuízos decorrentes da medida de urgência quando esta perder eficácia. Assim, a extinção da ação de busca e apreensão sem resolução do mérito interrompe apenas a eficácia da liminar que autorizou a apreensão do veículo, sem proferir juízo definitivo sobre o direito material, mas importando, por força desses dispositivos, o dever do requerido de restituir o bem ao autor ou, caso não seja possível, indenizá-lo pelo equivalente em dinheiro. Diante do posto a este juízo, restou incontroverso nos autos que o requerido procedeu à venda do veículo em leilão público realizado em 16/11/2017, impossibilitando sua restituição física ao autor. Esta circunstância determina a conversão da obrigação de restituir o bem em obrigação de indenizar por perdas e danos, nos termos do artigo 947 do Código Civil. A venda do bem durante o trâmite da ação de busca e apreensão, embora autorizada pelo Decreto-Lei 911/69, constitui ato praticado por conta e risco do credor fiduciário. Conforme consolidado na jurisprudência dos tribunais superiores, o credor que opta pela venda antecipada do bem assume o risco de ter que indenizar o devedor caso a ação seja posteriormente julgada improcedente ou extinta sem resolução do mérito. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA E APREENSÃO. PERDAS E DANOS. ALIENAÇÃO DO VEÍCULO APREENDIDO . IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. IMPOSSIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VEÍCULO AO APELANTE. DEVER DE INDENIZAR. ART . 3º, § 7º DO DECRETO-LEI 911/69. VALOR FIXADO COM BASE NA TABELA FIPE, CONSIDERANDO O VALOR À DATA DA APREENSÃO DO VEÍCULO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO”. (TJ-SP - Apelação Cível: 10021988420228260369 Monte Aprazível, Relator.: Eduardo Gesse, Data de Julgamento: 28/06/2024, 28ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/06/2024) Quanto ao parâmetro adequado para a indenização, a jurisprudência dos tribunais superiores consolidou-se no sentido de que, em casos de impossibilidade de restituição do veículo apreendido em ação de busca e apreensão posteriormente extinta ou julgada improcedente, a indenização deve corresponder ao valor constante da Tabela FIPE na época da apreensão, não ao valor efetivamente obtido na venda extrajudicial. Este entendimento fundamenta-se no fato de que a Tabela FIPE reflete o valor de mercado do bem, constituindo parâmetro objetivo e imparcial para a fixação da indenização. O valor obtido na venda extrajudicial, por sua vez, pode estar aquém do valor de mercado em razão das condições específicas do leilão, não constituindo parâmetro adequado para a reparação dos danos. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso, no Agravo de Instrumento nº 1019542-09.2020.8.11.0000, decidiu que "a jurisprudência é pacífica que o valor encontrado na Tabela FIPE proporcionaria ao devedor o restabelecimento ao seu status quo. A referida tabela serve como balizador de valores de veículos automotores terrestres, considerando, inclusive, os diversos fatores de depreciação existentes". Assim, o parâmetro adequado para a indenização é o valor constante da Tabela FIPE na época da apreensão, que corresponde a R$ 35.960,00, conforme documento juntado pelo autor e não impugnado especificamente pelo requerido. Quanto ao abatimento das despesas, o requerido sustenta que o valor obtido na venda do veículo (R$ 23.600,00)foi integralmente utilizado para amortização das parcelas em atraso, não restando saldo credor em favor do autor. Embora o artigo 2º, §3º, do Decreto-Lei 911/69 autorize a aplicação do preço da venda no pagamento do crédito e das despesas decorrentes, esta disposição aplica-se aos casos em que a ação de busca e apreensão é julgada procedente, confirmando-se a legitimidade da retomada do bem. No caso em análise, a ação de busca e apreensão foi extinta sem resolução do mérito, cessando a eficácia da liminar que autorizou a apreensão. Nesta hipótese, conforme decidido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso, é “incabível a compensação de valores nos autos, pois a decorrência lógica é o retorno das partes ao status quo ante, de modo que eventual compensação significaria o reconhecimento, de modo indireto, da procedência da ação de busca e apreensão”. (N.U 1018017-50.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Vice-Presidência, Julgado em 13/09/2024, Publicado no DJE 13/09/2024) Assim, não é legítimo o abatimento das despesas com cobrança do valor a ser restituído ao autor, devendo a indenização corresponder ao valor integral constante da Tabela FIPE. No que tange à multa do Decreto-Lei 911/69, prevista no artigo 3º, §6º, que estabelece: "Na sentença que decretar a improcedência da ação de busca e apreensão, o juiz condenará o credor fiduciário ao pagamento de multa, em favor do devedor fiduciante, equivalente a cinquenta por cento do valor originalmente financiado, devidamente atualizado, caso o bem já tenha sido alienado", o autor sustenta a aplicabilidade da penalidade, argumentando que a extinção sem resolução do mérito equipara-se à improcedência para fins de aplicação da multa. O requerido, por sua vez, defende que a multa somente se aplica em casos de improcedência da ação, não de extinção sem resolução do mérito. A questão envolve interpretação do alcance da norma punitiva, devendo ser analisada à luz dos princípios hermenêuticos aplicáveis às sanções legais. As normas que impõem sanção devem ser interpretadas de forma restritiva, conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso, no Recurso de Apelação Cível nº 1010015-53.2022.8.11.0003, de relatoria do Desembargador Sebastião Barbosa Farias, decidiu expressamente sobre a questão: " A multa do art. 3º, § 6º, do Decreto Lei 911/69 é aplicável somente aos casos em que a ação de busca e apreensão for julgada improcedente, não sendo cabível diante da extinção do processo sem resolução de mérito.". O mesmo tribunal, em outro julgado, reforçou o entendimento: "Conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a multa do art. 3º, § 6º, do Decreto-Lei n. 911/1969 só pode ser imposta ao autor da busca e apreensão quando o processo for extinto com julgamento do mérito, e a sentença decretar a improcedência do pedido.". (N.U 1010906-62.2019.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/12/2020, Publicado no DJE 02/12/2020). A distinção entre julgamento de improcedência e extinção sem resolução do mérito é fundamental para a correta aplicação da norma. A improcedência pressupõe análise do mérito da demanda, com reconhecimento da inexistência do direito alegado pelo autor. A extinção sem resolução do mérito, por sua vez, decorre de questões processuais que impedem o exame do mérito, não havendo pronunciamento sobre a existência ou inexistência do direito material. No caso em análise, a ação de busca e apreensão foi extinta sem resolução do mérito por inércia do requerido em dar andamento ao feito, não havendo qualquer pronunciamento sobre a legitimidade ou ilegitimidade da pretensão de retomada do bem. Diante do exposto, e seguindo o entendimento consolidado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, não é aplicável a multa prevista no artigo 3º, §6º, do Decreto-Lei 911/69 no presente caso, uma vez que a ação de busca e apreensão foi extinta sem resolução do mérito, não havendo julgamento de improcedência. A norma deve ser interpretada restritivamente, aplicando-se exclusivamente aos casos de improcedência da ação de busca e apreensão, quando há efetivo julgamento do mérito com reconhecimento da inexistência do direito do credor fiduciário. Quanto aos encargos moratórios e correção monetária, a jurisprudência consolidou-se no sentido de que devem incidir a partir da data da apreensão do veículo, momento em que se configurou o dano ao autor. Assim, a indenização por danos materiais deve ser acrescida de correção monetária pelo INPC desde a data da apreensão (17/05/2017) e juros de mora de 1% ao mês a partir da mesma data. A relação jurídica estabelecida entre as partes caracteriza-se como típica relação de consumo, aplicando-se as disposições do Código de Defesa do Consumidor. O autor figura como destinatário final dos serviços de financiamento prestados pelo requerido, enquadrando-se no conceito de consumidor previsto no artigo 2º da Lei 8.078/90. O Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras" (Súmula 297 do STJ). A aplicação do Código de Defesa do Consumidor reforça a proteção do autor e a responsabilidade do requerido pelos danos decorrentes da apreensão e venda indevida do veículo. Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO ANTECIPADAMENTE A LIDE e, no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por WILSON SODRE FARIAS FILHO em face de STELLANTIS FINANCIAMENTOS SOCIEDADE DE CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., para: a) CONDENAR o requerido ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 35.960,00 (trinta e cinco mil, novecentos e sessenta reais), correspondente ao valor do veículo conforme Tabela FIPE na época da apreensão; b) DETERMINAR que o valor seja acrescido de correção monetária pelo INPC desde 17/05/2017 (data da apreensão), e juros de mora de 1% ao mês desde 17/05/2017 (data da apreensão); c) JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de aplicação da multa prevista no artigo 3º, §6º, do Decreto-Lei 911/69, uma vez que esta somente se aplica em casos de julgamento de improcedência da ação de busca e apreensão, não de extinção sem resolução do mérito, conforme jurisprudência consolidada do Tribunal de Justiça de Mato Grosso; CONDENO o requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil, considerando a procedência parcial dos pedidos. Custas pelo requerido, na proporção de 70% (considerando a procedência parcial). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de praxe. Flávio Miraglia Fernandes Juiz de Direito

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Processo nº 1018437-49.2024.8.11.0002

ID: 330195675

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1018437-49.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

INACIO ARRUDA DA GLORIA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOAO MARCOS GOMES ROSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1018437-49.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Extorsão, Roubo Majorado, Estupro, Associação Criminosa… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1018437-49.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Extorsão, Roubo Majorado, Estupro, Associação Criminosa] Relator: Des(a). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO Turma Julgadora: [DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA] Parte(s): [INACIO ARRUDA DA GLORIA - CPF: 078.096.801-88 (APELANTE), JOAO MARCOS GOMES ROSA - CPF: 057.205.791-17 (ADVOGADO), JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR - CPF: 062.459.321-57 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), THALYA OLIVEIRA MACEDO - CPF: 615.115.933-00 (VÍTIMA), IOVANE FIGUEIREDO VIANA - CPF: 035.035.871-01 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO E EXTORSÃO. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. NEGATIVA DE AUTORIA. CONSUMAÇÃO DA EXTORSÃO. MAJORANTE DE ARMA DE FOGO. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. DESPROVIMENTO. I. Caso em exame: Apelações criminais contra sentença condenatória que reconheceu a prática dos crimes de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do Código Penal) e extorsão majorada (art. 158, §1º, do Código Penal), em contexto de violência e grave ameaça com arma de fogo, mediante concurso de agentes, com penas fixadas em regime inicial fechado para ambos os réus. II. Questão em discussão: A questão em discussão consiste em saber se: (i) as provas permitem a absolvição dos réus pelos delitos imputados, ante alegada ausência de autoria e fragilidade probatória; (ii) no caso de extorsão, se a conduta deve ser desclassificada para a forma tentada; (iii) é cabível o afastamento da majorante pelo uso de arma de fogo, pela não apreensão do objeto; (iv) se é possível a redução da pena-base, pela alegada valoração indevida da culpabilidade. III. Razões de decidir: 1. Materialidade e autoria delitivas comprovadas por depoimentos consistentes da vítima, testemunhas, confissões parciais dos réus e recuperação do bem subtraído. 2. Configuração da extorsão consumada, ainda que não logrado êxito na transferência de valores, pois a execução dos atos foi integralmente realizada e o insucesso decorreu de circunstância alheia à vontade dos agentes. 3. Aplicação da majorante pelo emprego de arma de fogo admitida com base no depoimento da vítima, firme e submetido ao contraditório, independentemente da apreensão do objeto. 4. Exasperação da pena-base mantida, diante do excesso de violência empregada, extrapolando as elementares do tipo penal. IV. Dispositivo e tese: Apelações criminais conhecidas e desprovidas. Tese de julgamento: “1. A condenação por roubo majorado e extorsão majorada é cabível quando presentes provas firmes de autoria, materialidade, divisão de tarefas e violência grave, independentemente da apreensão da arma de fogo. 2. A extorsão consuma-se com a prática de atos idôneos à obtenção da vantagem econômica, sendo irrelevante o insucesso decorrente de fato alheio à vontade dos agentes". Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 29, 157, §2º, II e §2º-A, I, e 158, §1º; CPP, art. 386, VII. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 0014501-67.2019.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JUVENAL PEREIRA DA SILVA, Vice-Presidência, Julgado em 18/05/2020, Publicado no DJE 18/05/2020; STJ, AgRg no HC n. 846.749/SC, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do Tjsp), Sexta Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 27/6/2024; TJMT, N.U 1002766-74.2024.8.11.0005, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, HELIO NISHIYAMA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 25/04/2025, Publicado no DJE 25/04/2025; TJMT, N.U 1029610-41.2022.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Vice-Presidência, Julgado em 21/03/2025, Publicado no DJE 21/03/2025, STJ, AgRg no HC 968221/SP, Rel. Min. Otávio de Almeida Toledo, Des. Convocado do TJSP, 6ª Turma, DJe 08/05/2025; TJMT, N.U 1020053-54.2023.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, WESLEY SANCHEZ LACERDA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 18/06/2025, Publicado no DJE 18/06/2025; TJMT, N.U 0014501-67.2019.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JUVENAL PEREIRA DA SILVA, Vice-Presidência, Julgado em 18/05/2020, Publicado no DJE 18/05/2020; TJMT, N.U 1000135-37.2022.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 05/12/2023, Publicado no DJE 09/12/2023. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Tratam-se de Recursos de Apelação Criminal interpostos por JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR e INACIO ARRUDA DA GLÓRIA contra a sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Várzea Grande (MT), que os condenou, pela prática dos crimes de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do Código Penal) e extorsão (art. 158, §1º, do Código Penal), às penas totais de 12 (doze) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 31 dias-multa para Joedson, e 18 (dezoito) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e dias-multa para Inacio (id. 285513523). Em suas razões recursais, a defesa de JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR postula, exclusivamente em relação à condenação pelo crime de extorsão, a sua absolvição por ausência de provas concretas de sua participação, ou, subsidiariamente, o reconhecimento da forma tentada, sustentando que permaneceu no interior do veículo e não participou da exigência de senha bancária, invocando os princípios da imputação penal individualizada e do estado de inocência (Id. 285513548). Já a defesa de INÁCIO ARRUDA DA GLÓRIA requer a absolvição dos crimes de roubo e extorsão pela insuficiência de provas (art. 386, VII, do CPP), ou, alternativamente, a desclassificação da extorsão para a modalidade tentada, além do afastamento da majorante do uso de arma de fogo e fixação da pena-base no mínimo legal. Fundamenta seus pedidos na ausência de reconhecimento da vítima, na negativa de autoria em interrogatório e na fragilidade do conjunto probatório (Id. 285513546). Em contrarrazões, o Ministério Público se manifestou pelo desprovimento dos recursos (Id. 285513551 e 285513552). O parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, de lavra da d. Procuradora Ana Cristina Bardusco Silva, manifesta pelo desprovimento dos recursos (Id. 295492852). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Os recursos em apreço são tempestivos, foram interpostos por quem tinha interesse e legitimidade para fazê-los, bem como os meios de impugnação empregados afigura-se necessários e adequados para se atingirem as finalidades colimadas, motivos pelos quais estando presentes os seus requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, CONHEÇO dos apelos manejados pelos réus. Infere-se dos autos que o Ministério Público ofereceu denúncia contra JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR e INACIO ARRUDA DA GLÓRIA, imputando-lhes a prática do crime de roubo majorado e extorsão, nos seguintes termos: Fatos 01 e 02 Consta nos autos, que no dia 04 de março de 2024, por volta das 05h00min, na rua Mem de Sá, Centro, Várzea Grande, os indiciados JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR (vulgo JUNINHO), INÁCIO ARRUDA DA GLÓRIA e IOVANE FIGUEIREDO VIANA, agindo em unidade de desígnios, subtraíram, mediante violência física e ameaça exercida com arma de fogo, coisa alheia móvel da vítima THALYA OLIVEIRA MACÊDO ZANATO DE MATOS. Consta ainda nos autos, que no dia 04 de março de 2024, por volta das 05h00min, na rua Mem de Sá, Centro, Várzea Grande, os indiciados JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR (vulgo JUNINHO), INÁCIO ARRUDA DA GLÓRIA e IOVANE FIGUEIREDO VIANA, agindo em unidade de desígnios, constrangeram a vítima THALYA OLIVEIRA MACÊDO ZANATO DE MATOS, mediante violência física e ameaça exercida com arma de fogo, com o intuito de obterem indevida vantagem econômica. Apurou-se que em data, local e horário acima citados, o indiciado JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR (vulgo JUNINHO), conduzia um automóvel Vectra Hatch, de cor prata e placa HTJ-3A80, acompanhado dos comparsas INÁCIO ARRUDA DA GLÓRIA e IOVANE FIGUEIREDO VIANA, que estavam no veículo como passageiros. Aos avistarem a vítima THALYA OLIVEIRA MACÊDO ZANATO DE MATOS, decidiram abordá-la para cometerem crimes patrimoniais e anunciaram o assalto. Narram os autos que JOEDSON JUNIOR jogou o carro contra a motocicleta conduzida pela vítima THALYA, fechando-a. Ato contínuo, INÁCIO desceu do veículo, munido com uma arma de fogo, apontando-a para a ofendida. Além da ameaça com arma de fogo, INÁCIO ainda desferiu incontáveis socos e chutes na vítima e tomou um telefone celular Samsung A23 dela (avaliado em R$ 1.650,00 – ID 156752541). Segundo os autos, INÁCIO ainda ordenou que ela desbloqueasse o celular e abrisse o aplicativo do banco e fizesse um PIX para eles, todavia, o celular era novo e THALYA ainda não tinha instalado o aplicativo do banco. Neste contexto, o indiciado IOVANE desceu do veículo e revistou a vítima, para ver se ela tinha mais objetivos a serem subtraídos. Segundo os autos, após os delitos, os indiciados evadiram do local, como passageiros no veículo conduzido por JOEDSON JUNIOR. Restou demonstrado que o telefone celular subtraído ficou em posse de INÁCIO e posteriormente foi recuperado pela polícia e restituído à ofendida (fls. 15/16 do ID 156751540). Vale mencionar que os investigadores conseguiram coletar imagens de câmeras que captaram o veículo em questão, momentos após a prática do crime (ID 156751519 e fls. 07/08 do ID 156751500). (...). Diante do exposto, (...). JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR, vulgo JUNINHO, brasileiro, filho de JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA e MARGIANA BRANDÃO DE ARRUDA , CPF 062.459.321-57, residente na Rua 17 Casa 21 - Qd 22 Bairro São Benedito - Várzea Grande/MT, pela prática dos crimes previstos no art. 157 , §2º, II (concurso de agentes) e §2º-A, I (arma de fogo), c/c art. 29 (Fato 01) e art. 158, §1º (concurso de agentes e arma de fogo) , c/c art. 29 (Fato 02), todos do Código Penal, na forma do art. 69 (concurso material) , do mesmo diploma legal e, INACIO ARRUDA DA GLÓRIA, brasileiro, filho de JOVINO GUIA DA GLÓRIA e ADILEI MARQUES DE ARRUDA, CPF 078.096.801-88, residente na Rua Alta Floresta, 35, Quadra 39, Bairro Capão do Pequi, Várzea Grande/MT (PRÓXIMO A MERCEARIA DA TIA), pela prática dos crimes previstos no art. 157 , §2º, II (concurso de agentes) e §2º-A, I (arma de fogo), c/c art. 29 (Fato 01) e art. 158, §1º (concurso de agentes e arma de fogo) , c/c art. 29 (Fato 02), todos do Código Penal, na forma do art. 69 (concurso material) , do mesmo diploma legal; requeiro que depois de recebida e autuada, sejam os denunciados citados para apresentarem a resposta à acusação, bem como intimados os denunciados, a vítima e as testemunhas abaixo arroladas para comparecerem à audiência de instrução e julgamento, culminando na condenação dos denunciados às penas cominadas aos crimes supra (Id. 285513367). Após apresentados os fatos e detida análise dos autos, o magistrado de origem entendeu pela condenação dos apelantes pelos delitos de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do Código Penal) e extorsão (art. 158, §1º, do Código Penal), às penas totais de 12 (doze) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 31 dias-multa para Joedson, e 18 (dezoito) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e dias-multa para Inacio (id. 285513523). Diante do exposto, passo à análise. I - DA ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE ROUBO - INÁCIO. O crime de roubo majorado pelo qual o acusado Inácio Arruda da Glória foi condenado está previsto no art. 157, § 2º, inciso II e § 2º-A, inciso I, do Código Penal, que assim dispõe: Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. § 2º - A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade: II - se há o concurso de duas ou mais pessoas; § 2º-A - A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços): I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo; No que pertine ao pleito absolutório, registre-se que a autoria e materialidade delitivas estão suficientemente comprovadas por meio do Relatório de investigação n. 2024.13.24011 (Id. 285512925), termos de declaração (Id. 285512926 a 285512929, 285512932, 285512934), termo de reconhecimento de pessoa n. 2024.16.134341 (Id. 285512930), termo de qualificação, vida pregressa e interrogatório (Id. 285512931, 285512936, 285512937), termo de depoimento (Id. 285512935), câmera de segurança (Id. 285512943 e 285512944), T.C.O 41/2024 (Id. 2885512947) e depoimento colhidos na audiência de instrução e julgamento. Durante a fase inquisitorial, os acusados Joedson Pereira de Arruda Junior e Iovane Figueiredo Viana confessaram o crime e confirmaram a participação do corréu Inácio. A testemunha Wilson de Anunciação Arruda relatou ter visto os acusados juntos, enquanto Amanda Ramos de Moraes afirmou ter visto o objeto do roubo na posse de Inácio. Vejamos: Thalya Oliveira Macedo – Id. 285512929. (...). PROCEDEU-SE AO RECONHECIMENTO PESSOAL, AFIRMANDO QUE, RECONHECE JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA, VULGO JUNINHO COMO SENDO UM DOS AUTORES DO ROUBO, SENDO QUE, AO VISUALIZAR JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA, A DECLARANTE AFIRMOU: "ESSE ERA O QUE TAVA NO VOLANTE DO VECTRA. ELE QUE TAVA DIRIGINDO O CARRO. EU VI BEM ELE PORQUE ELE ENCOSTOU BEM O CARRO NA MINHA MOTO. ELES GRITAVAM PÁRA A MOTO! PÁRA A MOTO! ELE JOGOU O CARRO PRA CIMA DE MIM E ME FORÇOU A PARAR A MOTO (...). Joedson Pereira de Arruda Junior- Id. 285512977. DO ROUBO EU PARTICIPEI. MAS, DO ESTUPRO NÃO. (...). EU TAVA INDO EMBORA EU ENCONTREI O INÁCIO (INÁCIO ARRUDA DA GLÓRIA) E O IOVANE (IOVANE FIGUEIREDO VIANA) NA RUA, E ELES ME CHAMARAM PRA IR LÁ NO ZERO BEBER, DAÍ EU ACEITEI. QUANDO A GENTE TAVA INDO, O INÁCIO FALOU: VAMOS FAZER UM DINHEIRO RÁPIDO. VAMOS FAZER O CORRE DE UM CELULAR NA RUA. DAÍ EU ACEITEI. DAÍ A GENTE VIU ESSA MULHER NESSA MOTO E O INÁCIO FALOU: BORA PEGAR ESSA MULHER AÍ, FECHA ELA AÍ, FECHA ELA AÍ. DAÍ EU FECHEI A MOTO DELA COM O CARRO, E, O INÁCIO E O IOVANE JÁ DESCERAM ENQUADRANDO ELA. EU NÃO DESCI DO CARRO NÃO. FIQUEI SÓ NO APOIO MESMO. SÓ NO PILOTO. O INÁCIO QUE BATEU NELA. ELE DAVA SOCO NA CABEÇA DELA. FOI O INÁCIO QUE PEGOU O CELULAR DELA E QUEM EU VI PASSANDO A MÃO NO CORPO DELA FOI O IOVANE. (...). Iovane Figueiredo Viana – Id. 285512937. NÓS TINHA COMBINADO DE IR LÁ PRO ZERO BEBER NO BAR. O JUNINHO TAVA DIRIGINDO O CARRO, O INÁCIO TAVA NA FRENTE, NO BANCO DO PASSAGEIRO, E EU TAVA ATRÁS. DAÍ O INÁCIO TEVE A IDEIA DE ROUBAR UM CELULAR NA RUA. E, BEM NA HORA, ESSA MULHER TAVA PASSANDO COM A MOTO E O JUNINHO FECHOU ELA COM O CARRO. DAÍ EU E O INÁCIO JÁ DESCEMOS, O JUNINHO FICOU NO APOIO DENTRO DO CARRO. MAS, EU NÃO ESTUPREI ELA. NEM BATI NELA. QUEM BATEU NELA E PEGOU O CELULAR FOI O INÁCIO (...) O CELULAR FICOU COM O INÁCIO! (...). Wilson de Anunciação Arruda - Id. 285512934. (...). EU CONHEÇO O IOVANE DE VISTA LÁ DO BAIRRO. O IOVANE TAMBÉM ANDA COM O JUNINHO. OS TRÊS ANDAM JUNTOS. O JUNINHO, O INÁCIO E O IOVANE, ELES SEMPRE ESTÃO JUNTOS. NESSE DIA, DEPOIS QUE O JUNINHO DEIXOU EU E O GABRIEL LÁ NA DISTRIBUIDORA, EU VI O JUNINHO PASSANDO COM O INÁCIO E O IOVANE DENTRO DO CARRO! (...). Amanda Ramos de Moraes – Id. 285512935. (...). ESSE CELULAR TÁ COM O INÁCIO. EU VI ESSE CELULAR COM ELE. ELE FALOU PRA MIM QUE TINHA ROUBADO ESSE CELULAR DE UMA MULHER QUE TAVA DE MOTO NA RUA (...). ELE NÃO FALOU NOME. SÓ FALOU PRA MIM QUE TINHA FEITO ESSE ROUBO COM UNS GURIZADA. MAS, NÃO FALOU OS NOMES DOS GURI QUE TAVA COM ELE! (...). Em juízo, o acusado INÁCIO ARRUDA DA GLÓRIA negou qualquer participação no crime, afirmou não saber o motivo de sua prisão, declarou não conhecer Alessandra e relatou que teve um relacionamento anterior com Amanda Ramos de Moraes, com quem teve uma desavença. Negou envolvimento com o celular da vítima e disse não entender por que Amanda teria lhe acusado. Também afirmou não ter desavença com Edson e Iovane, alegou estar trabalhando no momento do crime, negou ter sido visto com outros investigados e disse que os relatos de Amanda, Edson e Ilson são falsos, reafirmando sua inocência (Id. 285513491). Todavia, sob o crivo do contraditório, JOEDSON PEREIRA DE ARRUDA JUNIOR confessou que participou do crime como motorista, conduzindo o veículo utilizado na abordagem à vítima e permanecendo o tempo todo no interior do automóvel, sem descer em nenhum momento. Relatou que, naquela madrugada, foi convidado por Inácio para beber no centro, junto com Iovane, e que após consumirem todas as bebidas e ficarem sem dinheiro, Inácio propôs cometer um roubo para conseguir mais recursos. Joedson afirmou que foi Inácio quem sugeriu abordar a vítima, que estava em uma motocicleta, e que ele, seguindo orientação de Inácio, fechou a moto com o carro para facilitar a ação. Em seguida, Inácio e Iovane desceram do veículo e foram até a vítima, sendo Inácio o responsável pela agressão e pela subtração do celular. Joedson também declarou que viu quando Inácio ordenou à vítima que destravasse o telefone e tentasse acessar o aplicativo bancário, embora tal aplicativo não estivesse instalado. O acusado destacou que não participou da abordagem física e limitou-se a dar suporte logístico ao crime, reforçando que o objetivo era obter dinheiro para continuar bebendo. Por fim, afirmou que o celular ficou com Inácio e não houve divisão do produto do crime entre eles (Id. 285513491). A testemunha WILSON DE ANUNCIAÇÃO ARRUDA, em juízo, relatou que, na madrugada dos fatos, saiu de carro com seu primo Juninho (Joedson Pereira de Arruda) e Gabriel, e que antes de ir para casa parou com Gabriel em uma distribuidora, onde ambos tomaram mais uma cerveja. Wilson afirmou que, nesse momento, viu Juninho passando de carro junto com Inácio e Iovane. Ele declarou que não soube para onde eles foram após saírem do local e ressaltou que não presenciou o crime, confirmando apenas que conhecia Inácio de vista e que ele costumava andar com Juninho (Id. 285513491). O depoimento da vítima THALYA OLIVEIRA MACEDO, prestado em juízo, confirma de forma minuciosa os fatos apurados na fase inquisitorial. A vítima narrou que foi surpreendida por um veículo que fechou sua motocicleta, obrigando-a a parar. Identificou claramente Joedson como o condutor do carro, ressaltando que ele permaneceu todo o tempo ao volante, dando suporte e aguardando os comparsas retornarem para a fuga. Thalya afirmou que, ao parar, dois homens desceram do carro: o primeiro acusado, identificado como Inácio pelas investigações, foi quem desferiu diversas agressões físicas, incluindo tapas, socos e chutes, exigindo de forma insistente que ela fornecesse a senha do telefone celular e acessasse aplicativo bancário, que não estava instalado no aparelho. Descreveu que, sob constantes agressões, manteve a cabeça baixa, sentindo-se coagida e ameaçada, inclusive pelo uso de uma arma de fogo empunhada por Inácio, que era constantemente apontada em sua direção durante as ameaças e agressões. Thalya relatou que, após as agressões, o grupo subtraiu seu telefone celular e tentou levar também a chave da motocicleta, não obtendo êxito (Id. 285513491). Diante do exposto, apesar da alegação do apelante Inácio Arruda da Glória negando a prática do delito, tal versão revela-se isolada do conjunto probatório, encontrando-se em contradição com todos os demais depoimentos colhidos tanto na fase inquisitiva quanto na fase judicial. Dessa forma, a análise dos depoimentos da vítima, das testemunhas e das confissões prestadas por Joedson, em juízo, e por Iovane, na fase inquisitorial, demonstra que o acusado Inácio é autor do crime de roubo qualificado. Em julgamento de situação semelhante, o Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação por furto qualificado fundamentado especificamente nos depoimentos da vítima e dos policiais militares, confissão do acusado, além de filmagens do local (AgRg no HC n. 846.749/SC, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do Tjsp), Sexta Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 27/6/2024), tal como decidido no caso dos autos. Nesse contexto, o TJMT tem decidido que: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO DA DEFESA. ROUBO MAJORADO. ABSOLVIÇÃO. EXCLUSÃO DA CAUSA DE AUMENTO PELO EMPREGO DE ARMA. INDENIZAÇÃO. CUSTAS PROCESSUAIS. PEDIDO DE ISENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CONSECTÁRIO LEGAL DA CONDENAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. (...). III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A condenação pode ser mantida quando há prova judicializada segura da materialidade e da autoria, corroborada por depoimentos da vítima e das testemunhas, pela delação em juízo do corréu e pelas imagens de câmeras de segurança. 6. A causa de aumento pelo emprego de arma branca é objetiva e comunicável a todos os agentes, nos termos do art. 29 do Código Penal, sendo desnecessária a posse direta da arma por todos os envolvidos. 7. O valor fixado a título de reparação mínima por danos morais é cabível quando expressamente requerido pelo Ministério Público e fundado em lesões corporais sofridas pela vítima durante a prática do delito. 8. A obrigação de pagar custas processuais é consectário legal da condenação criminal, motivo pelo qual compete ao Juízo da Execução Penal analisar e decidir o pleito de suspensão do pagamento, com base na situação econômica do condenado no momento do cumprimento da pena. IV. DISPOSITIVO 9. Recurso desprovido. Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 29 e 157, § 2º, II e VII; CPP, arts. 387, IV e 804. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 857.826/SP; AgRg no AREsp 206.581/MG. (N.U 1002766-74.2024.8.11.0005, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, HELIO NISHIYAMA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 25/04/2025, Publicado no DJE 25/04/2025) (grifos meus). Portanto, inviável cogitar a absolvição do apelado Inácio Arruda da Glória quanto ao delito de roubo majorado. II. DA ABSOLVIÇÃO E DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE EXTORSÃO - INÁCIO E JOEDSON. Os apelantes, em suas razões recursais, pugnam pela absolvição quanto ao crime de extorsão, sustentando a inexistência de provas suficientes a embasar a condenação, bem como a fragilidade dos elementos probatórios colacionados aos autos. Alternativamente, requerem, caso não seja acolhido o pedido absolutório, a desclassificação da conduta de crime consumado para tentado. O crime de extorsão encontra previsão no artigo 158, § 1º, do Código Penal, que dispõe: Art. 158 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa: Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa. § 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade. Conforme debatido anteriormente, restam evidenciadas nos autos provas da materialidade e da autoria do delito de extorsão, notadamente diante do conjunto probatório colacionado. Destaca-se, de modo especial, o depoimento da vítima Thalya Oliveira Macedo (Id. 285513491), que narrou com riqueza de detalhes ter sido constrangida mediante grave ameaça – inclusive com o emprego de arma de fogo – e violência física, sendo reiteradamente coagida a fornecer a senha de seu aparelho celular e a acessar aplicativo bancário, todavia, como havia adquirido o aparelho recentemente, não possuía aplicativos de banco instalados, o que gerou ainda mais agressividade dos autores. Tal narrativa é robustamente corroborada pelo interrogatório do acusado Joedson Pereira de Arruda Junior (Id. 285513491), o qual, ao confirmar a dinâmica delitiva, relatou que o corréu Inácio, após abordar a vítima, exigiu de maneira insistente que esta destravasse o aparelho celular e tentasse acessar o aplicativo bancário, com o claro objetivo de obter indevida vantagem econômica. O depoimento de Joedson, colhido sob o crivo do contraditório, confere especial credibilidade à versão apresentada pela vítima, notadamente ao descrever o papel de cada envolvido, a ordem dos fatos e a finalidade de obter dinheiro por meio da coação empregada. No caso dos autos, no que pertine à tese da defesa de Joedson, ainda que tenha sido demonstrado que apenas o réu Inácio foi o responsável direto pelas agressões e pela coação empregada contra a vítima na tentativa de acessar seus aplicativos bancários, verifica-se que Joedson igualmente participou de modo relevante na empreitada criminosa, ao permanecer como motorista do veículo utilizado na abordagem e fuga. Ressalte-se que todos os agentes possuem o domínio comum do fato típico, mediante divisão de tarefas, não sendo necessário que todos pratiquem, de forma direta, a conduta prevista no tipo penal. Basta que a atuação de cada um, mesmo que atípica se isoladamente considerada, seja essencial para a concretização do resultado ilícito. Nessa perspectiva, os fatos praticados por Inácio encontram-se em domínio comum com os demais acusados, de modo que todos respondem pela prática do mesmo delito. O acervo probatório revela-se coeso e integrado por elementos documentais e testemunhais que atestam, de forma segura, a presença de todos os requisitos objetivos e subjetivos do tipo penal descrito no artigo 158, § 1º, do Código Penal. Restou demonstrada a efetiva participação dos apelantes na prática delitiva, sendo certo que o crime de extorsão se consumou, ainda que não tenham logrado êxito em subtrair valores das contas bancárias da vítima. Tal resultado só não se concretizou em razão da inexistência dos aplicativos bancários no aparelho celular, considerando que a vítima, constrangida, anuiu à vontade dos acusados, informando que o aparelho celular não possuía senha, circunstância que não afasta a configuração da consumação do delito, pois a execução dos atos necessários foi integralmente realizada, sendo o insucesso alheio à vontade dos agentes. O entendimento consolidado no âmbito do TJMT é no sentido de que: Ementa: direito penal e processual penal. Apelações criminais. Roubo majorado [concurso de pessoas, restrição à liberdade da vítima e emprego de arma de fogo]. Extorsão majorada [concurso de pessoas e emprego de arma de fogo]. Posse irregular de munição de uso permitido. Receptação. Suficiência probatória. Condenações mantidas por roubo, extorsão e posse irregular de munição. Readequação das penas. Absolvição por receptação. Provimento parcial e provimento. (...). III. Razões de decidir 1. O art. 226 do CPP tem por escopo conferir maior credibilidade à identificação da pessoa ou coisa, de modo que o juiz poderá atribuir “a consideração que julgar adequada em face de eventual falha ocorrida e no confronto com as demais provas produzidas”. 2. Se o envolvimento dos agentes no roubo majorado e extorsão majorada estão demonstrados pelos depoimentos das vítimas, somados às confissões e apreensões de parte dos bens subtraídos e documentos de transferências bancárias do valor extorquido, bem como as declarações dos agentes públicos, a responsabilidade penal deve ser mantida. 3. A conduta de constranger as vítimas a acessar os aplicativos de contas bancárias, com a intenção de obter vantagem econômica indevida, após a consumação do roubo, em contexto de emprego de arma fogo, concurso de agentes e restrição da liberdade da vítima, configura o crime de extorsão. 4. Na coautoria [como na hipótese], “todos os agentes possuem o domínio comum do fato típico, mediante uma divisão de tarefas. Não é necessário que todos [...] pratiquem o verbo descrito no tipo; basta que a sua conduta, atípica, se isoladamente observada, seja essencial para a realização do fato típico. Dessa forma, em se tratando de coautoria, todos os agentes respondem pela prática do mesmo delito praticado”, a elidir a tese de desclassificação da conduta de extorsão para favorecimento real. 5. O delito de favorecimento real consiste “em prestar a criminoso, fora dos casos de coautoria (art. 29, CP) ou de receptação (art. 180, CP), auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime. Portanto, se os agentes, já cientes e previamente ajustados com os executores, contribuem para a empreitada ilícita antes, durante e após a sua consumação, devem responder como efetivos autores, afastando-se a incidência subsidiária da norma residual do art. 349 do Código Penal”. 6. A circunstância de ser namorada de corréu à época e parte dos bens terem sido apreendidos na sua residência, não enseja, por si só, a autoria de receptação, sobretudo ao se considerar não ter indicativo de participação/conhecimento do roubo e extorsão em que evolvido a pessoa com quem se relacionava, além da apreensão ter ocorrido em menos de 24 horas da prática delitiva. 7. O c. STJ firmou orientação no sentido de que a confissão, ainda que parcial ou qualificada, deve ser reconhecida para fins de atenuar a pena, especialmente porque não se pode invalidar ou desprezar o ato de admissão dos fatos que repercute sobre o apenamento, cuja redução é um direito subjetivo do réu. 8. A regra do concurso formal de crimes há de ser aplicada se as condutas dos agentes são praticadas em um mesmo contexto fático, visando atingir patrimônios individuais distintos. “Ainda que as vítimas façam parte da mesma família, não há falar-se em crime único quando no mesmo contexto fático são subtraídos bens pertencentes a patrimônios distintos, incidindo, neste caso, a regra do concurso formal, prevista no art. 70 do Código Penal.” 9. A “quantidade dos dias-multa deve ser aplicada conforme o critério trifásico da dosimetria penal, guardando proporção com a pena privativa de liberdade imposta e a condição econômico-financeira” do réu.” 10. “A pena imposta foi superior a 8 anos de reclusão, não cabendo outro regime a não ser o fechado, nos termos do art. 33, § 2º, a, do Código Penal.”(...). (N.U 1029610-41.2022.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Vice-Presidência, Julgado em 21/03/2025, Publicado no DJE 21/03/2025). Assim, diante das provas constantes dos autos – em especial, os depoimentos da vítima e do acusado Joedson –, evidencia-se de forma inequívoca a materialidade e a autoria do crime de extorsão, não havendo espaço para dúvida razoável quanto à responsabilização penal dos envolvidos. III. DA MAJORANTE DA ARMA DE FOGO - INÁCIO. O apelante Inácio sustenta que a majorante referente ao emprego de arma de fogo não deve ser aplicada, uma vez que não houve apreensão do referido objeto, inexistindo, assim, prova material quanto à sua utilização. Argumenta que a mera afirmação da vítima acerca do uso de arma não é suficiente para caracterizar a causa de aumento, podendo tratar-se, inclusive, de simulacro. Neste ponto, o recurso também não merece acolhimento. A orientação predominante dos tribunais superiores é no sentido de que o depoimento da vítima, quando feito de maneira clara, consistente e submetido ao contraditório em juízo, é prova hábil e bastante para a aplicação da causa de aumento pelo uso de arma, mesmo sem a apreensão do objeto. Vejamos: (...). A palavra da vítima é aceita como suficiente para comprovar a utilização da arma de fogo, desde que não haja elementos nos autos que demonstrem o contrário (...). (AgRg no HC 968221/SP, Rel. Min. Otávio de Almeida Toledo, Des. Convocado do TJSP, 6ª Turma, DJe 08/05/2025). O TJMT, em ocasião análoga, julgou que: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO E CORRUPÇÃO DE MENORES. EMPREGO DE ARMA DE FOGO E ARMA BRANCA. RESTRIÇÃO DE LIBERDADE DA VÍTIMA. CIÊNCIA DA MENORIDADE. INDENIZAÇÃO MÍNIMA. FIXAÇÃO SEM PEDIDO EXPRESSO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...). III. Razões de decidir 3. A palavra da vítima, prestada sob o crivo do contraditório e em juízo, foi firme ao relatar o uso de arma branca e arma de fogo no crime, sendo suficiente, conforme jurisprudência dos tribunais superiores, para a manutenção da causa de aumento, mesmo diante da não apreensão das armas. 4. Quanto à corrupção de menores, a alegação de erro sobre a idade do comparsa não encontra respaldo nos autos. O vínculo prévio e o planejamento conjunto da ação delitiva revelam conhecimento da condição etária do adolescente, inexistindo prova idônea a infirmar tal presunção. 5. A condenação ao pagamento de indenização mínima não pode subsistir diante da ausência de pedido expresso e de fixação de valor na denúncia, tampouco instrução específica que sustente a liquidez do montante arbitrado. (...). (N.U 1020053-54.2023.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, WESLEY SANCHEZ LACERDA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 18/06/2025, Publicado no DJE 18/06/2025) (grifos meus). No presente caso, a vítima descreveu de forma segura e detalhada, tanto na fase policial quanto em juízo, ter sido ameaçada com arma de fogo durante o crime. Assim, considerando a consistência do depoimento judicial e o entendimento consolidado na jurisprudência, é cabível a manutenção da majorante pelo emprego de arma de fogo, não havendo elementos que justifiquem seu afastamento. IV. DA PENA BASE – CULPABILIDADE - INÁCIO. O apelante Inácio alega que a sentença agravou a pena-base dos crimes de roubo e extorsão com fundamento na violência praticada, o que entende ser indevido, pois tal circunstância já integra os próprios tipos penais. Assim, requer que seja afastada a valoração negativa da culpabilidade na fixação das penas. No caso concreto, não assiste razão à defesa. Conforme se extrai dos autos, a violência empregada pelos acusados excedeu o que se exige para a configuração dos crimes de roubo e extorsão. Mesmo após a vítima entregar o aparelho celular, o apelante prosseguiu com as agressões físicas, sendo que, segundo relato da vítima, as agressões se intensificaram após ela afirmar que não possuía aplicativo bancário, incluindo ameaças com arma de fogo, chutes e socos reiterados. Assim, a exasperação da pena-base encontra-se devidamente fundamentada em circunstâncias concretas e específicas do caso, que revelam maior reprovabilidade da conduta, extrapolando as elementares dos tipos penais. Nesse sentido, a jurisprudência é pacífica ao admitir a valoração negativa da culpabilidade quando demonstrado o excesso de violência ou de ameaças, conforme destaca este Tribunal: APELAÇÃO CRIMINAL – ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE PESSOAS (ART. 157, § 2º, II, DO CP) – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DA DEFESA – 1. PLEITO À REDUÇÃO DA PENA-BASE PARA O MÍNIMO LEGAL – IMPOSSIBILIDADE – EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA – 2. COMPENSAÇÃO INTEGRAL DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA COM A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA – POSSIBILIDADE – PRECEDENTES – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1) Escorreita a valoração negativa da culpabilidade que referiu à forma de atuação do agente durante a prática do crime de roubo, tendo considerado a violência física e psicológica extrapolada, por ter agredido as vítimas com vários chutes e golpes de facão, sendo uma delas com deficiência física, situação que demonstra excesso na culpabilidade. 2) É possível a compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão espontânea, visto que ambas são de natureza subjetiva. Recurso parcialmente provido.(N.U 0014501-67.2019.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JUVENAL PEREIRA DA SILVA, Vice-Presidência, Julgado em 18/05/2020, Publicado no DJE 18/05/2020). Portanto, mantêm-se as circunstâncias judiciais negativadas, ante a demonstração de que a conduta dos acusados ultrapassou, em muito, os limites do tipo penal, revelando maior censurabilidade. DO PREQUESTIONAMENTO – JOEDSON. Por derradeiro, no que tange ao prequestionamento deduzido pela defesa do apelante Joedson, para fins de eventual interposição de recursos às instâncias superiores, deixa-se anotado que todos os argumentos deduzidos nas suas razões recursais foram apreciados neste voto. Neste sentido tem-se que se os preceitos normativos foram observados e integrados à fundamentação, afigura-se desnecessário, para fins de prequestionamento, que o julgador esmiúce cada um dos argumentos e dispositivos legais tidos por violados, bastando que esclareça os motivos que o levaram à determinada conclusão (TJMT, N.U 1000135-37.2022.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 05/12/2023, Publicado no DJE 09/12/2023). Com essas considerações, em consonância com o parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO aos recursos interpostos, mantendo incólume a sentença contestada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Lara Jordana Pires Da Costa x Equatorial Goias Distribuidora De Energia S.A.

ID: 260779741

Tribunal: TJGO Órgão: 10ª Câmara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5698024-41.2023.8.09.0051

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

LARA JORDANA PIRES DA COSTA

Polo Passivo:

EQUATORIAL GOIAS DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A.

Ementa

Advogados:

ILANDER SILVA CUSTODIO

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LUCILEIDE GALVAO LEONARDO PINHEIRO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

DYOGO CROSARA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

DINAMERICO PIKHARDT NETO

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Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESOLUÇÃO 414/2010 DA ANEEL. INOVAÇÃO RECURSAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA … Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESOLUÇÃO 414/2010 DA ANEEL. INOVAÇÃO RECURSAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. TELAS E FATURAS SISTÊMICAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DOS DÉBITOS. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA DÍVIDA E EXCLUSÃO DA ANOTAÇÃO MANTIDAS. INSCRIÇÃO DESABONADORA PREEXISTENTE. DANO MORAL INDEVIDO. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. DELIMITAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. SENTENÇA CORRIGIDA DE OFÍCIO. RECURSO CONHECIDO PARCIALMENTE E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.I. CASO EM EXAME1. Trata-se de apelação cível interposta por concessionária de energia elétrica contra sentença que, ao julgar parcialmente procedentes os pedidos iniciais, declarou a inexistência do débito cobrado da consumidora, determinou a exclusão de seu nome dos cadastros de proteção ao crédito e condenou a ré ao pagamento de indenização por dano moral.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. As questões em discussão consistem em saber:(i) se é possível conhecer do recurso na parte em que discute o tempo pelo qual as concessionárias devem guardar documentos relativos aos serviços prestados (Resolução nº 414/2010 da ANEEL);(ii) se os débitos atribuídos à consumidora são legítimos e se a anotação relativa a eles, incluída em cadastro de proteção ao crédito, deve ser excluída;(iii) se há dano moral em razão da anotação irregular e se há aplicabilidade da Súmula nº 385 do STJ ao feito;(iv) se os ônus sucumbenciais estão distribuídos corretamente;(v) se é possível corrigir os honorários de sucumbência de ofício quando, na sentença, há referência à condenação das partes ao seu pagamento sem indicação de seu valor (erro material).III. RAZÕES DE DECIDIR3. É vedado conhecer do recurso na parte em que traz alegações inéditas, a exemplo da limitação do tempo de guarda dos documentos pelas concessionárias de serviços públicos (Resolução nº 414/2010 da ANEEL), sob pena de violação ao duplo de grau de jurisdição, ao contraditório e à ampla defesa.4. A simples juntada de telas e faturas extraídas de sistema interno, desacompanhadas de outras provas que as corroborem, é insuficiente para demonstrar a existência dos débitos de energia elétrica atribuídos à consumidora.5. Reconhecida a irregularidade da cobrança, impõe-se determinar a exclusão do registro da dívida em órgãos de proteção ao crédito.6. Descabe pleitear dano moral por anotação irregular se há inscrição preexistente, cuja ilegitimidade deixou de ser demonstrada (Súmula nº 385, STJ).7. Configurada a sucumbência recíproca, as despesas proporcionais devem ser rateadas de maneira proporcional entre as partes (art. 86, CPC).8. Se a sentença, ao estabelecer a condenação das partes em honorários advocatícios, omite-se sobre sua quantificação, é possível à Instância Revisora corrigir o erro material e delimitar a verba honorária de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública. IV. DISPOSITIVO9. Apelação cível conhecida em parte e, nessa extensão, parcialmente provida._____________________________________________________________Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 84, 85, 86, 98, § 3º, 373, I, 1.014; CDC, art. 6º, VIII.Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 385, STJ, AgInt no AgInt no AREsp 1.036.285/PE, Relatora Ministra Assusete Magalhães, 2ª Turma, j. em 19/10/2017; TJGO, Súmula 18, TJGO, Apelação Cível 5503894-51.2023.8.09.0051, Rel. Des. José Carlos Duarte, 11ª Câmara Cível, j. em 17/06/2024; TJGO, Apelação Cível 5723403-18.2022.8.09.0051, Rel. Des. Anderson Máximo De Holanda, 10ª Câmara Cível, j. em 04/03/2024; TJGO, Apelação Cível 5326610-08.2023.8.09.0164, Rel. Des. Fernando De Castro Mesquita, 9ª Câmara Cível, j. em 26/06/2024; TJGO, Apelação Cível 5686370-90.2023.8.09.0137, Rel. Des. Antônio Cézar Pereira Meneses, 11ª Câmara Cível, j. em 01/07/2024. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de GoiásAv. Assis Chateaubriand, 195 - St. Oeste, Goiânia - GO, 74130-01210ª Câmara CívelGabinete do Desembargador Altamiro Garcia FilhoAPELAÇÃO CÍVEL Nº 5698024-41.2023.8.09.0051COMARCA : GoiâniaAPELANTE : Equatorial Goiás Distribuidora de Energia S.A.APELADO : Lara Jordana Pires da CostaRELATOR : Desembargador Altamiro Garcia Filho Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESOLUÇÃO 414/2010 DA ANEEL. INOVAÇÃO RECURSAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. TELAS E FATURAS SISTÊMICAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DOS DÉBITOS. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA DÍVIDA E EXCLUSÃO DA ANOTAÇÃO MANTIDAS. INSCRIÇÃO DESABONADORA PREEXISTENTE. DANO MORAL INDEVIDO. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. DELIMITAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. SENTENÇA CORRIGIDA DE OFÍCIO. RECURSO CONHECIDO PARCIALMENTE E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.I. CASO EM EXAME1. Trata-se de apelação cível interposta por concessionária de energia elétrica contra sentença que, ao julgar parcialmente procedentes os pedidos iniciais, declarou a inexistência do débito cobrado da consumidora, determinou a exclusão de seu nome dos cadastros de proteção ao crédito e condenou a ré ao pagamento de indenização por dano moral.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. As questões em discussão consistem em saber:(i) se é possível conhecer do recurso na parte em que discute o tempo pelo qual as concessionárias devem guardar documentos relativos aos serviços prestados (Resolução nº 414/2010 da ANEEL);(ii) se os débitos atribuídos à consumidora são legítimos e se a anotação relativa a eles, incluída em cadastro de proteção ao crédito, deve ser excluída;(iii) se há dano moral em razão da anotação irregular e se há aplicabilidade da Súmula nº 385 do STJ ao feito;(iv) se os ônus sucumbenciais estão distribuídos corretamente;(v) se é possível corrigir os honorários de sucumbência de ofício quando, na sentença, há referência à condenação das partes ao seu pagamento sem indicação de seu valor (erro material).III. RAZÕES DE DECIDIR3. É vedado conhecer do recurso na parte em que traz alegações inéditas, a exemplo da limitação do tempo de guarda dos documentos pelas concessionárias de serviços públicos (Resolução nº 414/2010 da ANEEL), sob pena de violação ao duplo de grau de jurisdição, ao contraditório e à ampla defesa.4. A simples juntada de telas e faturas extraídas de sistema interno, desacompanhadas de outras provas que as corroborem, é insuficiente para demonstrar a existência dos débitos de energia elétrica atribuídos à consumidora.5. Reconhecida a irregularidade da cobrança, impõe-se determinar a exclusão do registro da dívida em órgãos de proteção ao crédito.6. Descabe pleitear dano moral por anotação irregular se há inscrição preexistente, cuja ilegitimidade deixou de ser demonstrada (Súmula nº 385, STJ).7. Configurada a sucumbência recíproca, as despesas proporcionais devem ser rateadas de maneira proporcional entre as partes (art. 86, CPC).8. Se a sentença, ao estabelecer a condenação das partes em honorários advocatícios, omite-se sobre sua quantificação, é possível à Instância Revisora corrigir o erro material e delimitar a verba honorária de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública. IV. DISPOSITIVO9. Apelação cível conhecida em parte e, nessa extensão, parcialmente provida._____________________________________________________________Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 84, 85, 86, 98, § 3º, 373, I, 1.014; CDC, art. 6º, VIII.Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 385, STJ, AgInt no AgInt no AREsp 1.036.285/PE, Relatora Ministra Assusete Magalhães, 2ª Turma, j. em 19/10/2017; TJGO, Súmula 18, TJGO, Apelação Cível 5503894-51.2023.8.09.0051, Rel. Des. José Carlos Duarte, 11ª Câmara Cível, j. em 17/06/2024; TJGO, Apelação Cível 5723403-18.2022.8.09.0051, Rel. Des. Anderson Máximo De Holanda, 10ª Câmara Cível, j. em 04/03/2024; TJGO, Apelação Cível 5326610-08.2023.8.09.0164, Rel. Des. Fernando De Castro Mesquita, 9ª Câmara Cível, j. em 26/06/2024; TJGO, Apelação Cível 5686370-90.2023.8.09.0137, Rel. Des. Antônio Cézar Pereira Meneses, 11ª Câmara Cível, j. em 01/07/2024. VOTO – Juízo de admissibilidadeDe início, registre-se que o recurso não poderá ser conhecido na parte em que traz alegação inédita, que configura inovação recursal indevida.Trata-se do argumento de que não foi possível à Apelante localizar a documentação apresentada no momento de cadastro da Unidade Consumidora da Apelada porque a obrigatoriedade de manter esses registros seria de apenas 5 (cinco) anos, nos termos da Resolução nº 414 da ANEEL.Como se sabe, as partes devem apresentar suas alegações de fato no momento de suas respectivas manifestações processuais (inicial e contestação) perante o juízo de 1º grau.A apresentação extemporânea de alegações fáticas na apelação só é possível quando for demonstrado pela parte que o deixou de fazê-lo por motivo de força maior (art. 1.014, CPC), o que não se verifica.Portanto, descabe conhecer do recurso em relação à tese inovadora, sob pena de ofensa ao duplo grau de jurisdição e aos princípios do contraditório e da ampla defesa, como bem ensina a jurisprudência:“II. A apresentação, nas razões do apelo, de argumento novo a respeito dos fatos deduzidos na peça inicial, configura inovação recursal, o que é vedado pelo ordenamento jurídico vigente, em razão de ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. (…) (TJGO, Apelação Cível 5686370-90.2023.8.09.0137, Rel. Des(a). ANTÔNIO CÉZAR PEREIRA MENESES, 11ª Câmara Cível, julgado em 01/07/2024, DJe de 01/07/2024).”Dito isso, presentes os pressupostos recursais extrínsecos (tempestividade, preparo e regularidade formal – em parte) e os intrínsecos (cabimento, legitimidade, interesse recursal e inexistência de fato impeditivo ou extintivo), conheço parcialmente do recurso, com a ressalva acima.– Controvérsia recursalConforme relatado, trata-se de apelação cível interposta por Equatorial Goiás Distribuidora de Energia S.A. contra sentença (mov. 64) prolatada pelo pelo Juiz de Direito da 20ª Vara Cível da Comarca de Goiânia, Dr. Fernando Ribeiro de Oliveira, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos proposta por Lara Jordana Pires da Costa em face da apelante.A sentença objeto deste recurso julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para a) declarar inexistente o débito questionado (R$ 871,35); b) determinar que a requerida exclua o registro da requerente em cadastros de proteção ao crédito por esse débito; c) condenar a ré ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização por dano moral.A controvérsia recursal consiste em verificar:I. se os débitos atribuídos pela Apelante à Apelada são legítimos e, por consequência, se a inscrição da Apelada em cadastro de proteção ao crédito foi regular;II. se houve abalo à personalidade que justifique a condenação ao pagamento de indenização por dano moral;III. se o valor da indenização deve ser revisto.Para melhor compreensão, a exposição será feita em tópicos.a) Da dinâmica de provaA relação jurídica que envolve as partes é, sem dúvida, de consumo, o que conduz à aplicação das regras consumeristas (CDC) e possibilita a facilitação dos meios de prova ao consumidor, se constatada sua hipossuficiência ou a verossimilhança de suas alegações (art. 6º, VIII do CDC).No curso do processo, o juízo de 1º grau reconheceu a verossimilhança as alegações da Apelada e deferiu em seu favor a inversão do ônus de prova (mov. 58).Assim, diante do questionamento feito pela Apelada aos débitos que lhe foram atribuídos pela Apelante, passou a ser desta o ônus de provar que as cobranças são legítimas, ou seja, decorrem de serviços efetivamente contratados e prestados.Convém registrar ainda que a simples hipossuficiência do consumidor não lhe dispensa de produzir provas, ainda que mínimas, de suas alegações, conforme pacífico entendimento na jurisprudência.b) Dos débitos cobradosA Apelante defende que os débitos atribuídos à Apelada, pelos quais esta foi negativada, são legítimos e decorrem de serviços que teriam sido prestados a elas.Argumenta ainda que o “Termo de Confissão de Dívida”, que teria sido firmado pela Apelada, bem assim os demais documentos trazidos na contestação, comprovariam a contratação e a existência da dívida.A sentença, ao revés, compreendeu que não houve comprovação satisfatória da relação contratual porque as telas sistêmicas apresentadas pela concessionária são insuficientes para provar o vínculo e porque a autenticidade do termo de confissão de dívida foi impugnada pela Apelada.Após detida análise dos autos, tem-se que o juízo de 1º grau decidiu com acerto.Na contestação, a Apelante limitou-se a juntar telas sistêmicas que, a seu ver, demonstrariam o cadastro da Apelada e os supostos débitos vinculados às unidades consumidoras em seu nome (mov. 25, arq. 2).Para além disso, anexou fatura com vencimento em 05.09.2019, relativa à UC nº 12354016, e o “Termo Particular de Aceitação e Negociação de Débitos”, datado de 18.06.2019, cuja autenticidade é objeto de controvérsia (mov. 25, arq. 2).Sabe-se que a simples apresentação de capturas de tela e faturas de seu sistema informático interno, documentos unilaterais, são insuficientes para demonstrar a relação contratual se desacompanhados de outras provas que os corroborem, a exemplo de cópia da documentação pessoal da contratante ou mesmo notificação da inadimplência.Nesse sentido, a jurisprudência tem decidido:“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RELAÇÃO JURÍDICA NÃO COMPROVADA. TELAS SISTÊMICAS. DÉBITO INEXISTENTE. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1. É ônus da concessionária de energia a comprovação da regularidade da contratação de serviços pelos consumidores e, por conseguinte, da origem das cobranças por ela realizadas. 2. A apresentação de tela sistêmica desacompanhada de qualquer outro elemento probatório, caracteriza-se como prova unilateral, não sendo válida para demonstrar vínculo obrigacional. 3. Ausente a comprovação da relação jurídica entre as partes, é medida impositiva a declaração da inexistência do débito juridicamente controvertido. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, Apelação Cível 5503894-51.2023.8.09.0051, Rel. Des(a). José Carlos Duarte, 11ª Câmara Cível, julgado em 17/06/2024, DJe de 17/06/2024).” (g.)Portanto, as telas informáticas anexadas, por si, são inservíveis a comprovar que os débitos atribuídos à Apelada são legítimos.Nesse particular, também chama a atenção que a Apelante não apresentou um documento pessoal sequer da Apelada, nem cópia do termo de abertura de cadastro das unidades consumidoras em seu nome.A própria concessionária explica em seu recurso que a obtenção de documentos pessoais antecedem a contratação. Veja-se o trecho das razões (mov. 67):“Insta consignar que a ligação de Unidades Consumidoras de energia elétrica na zona de concessão da Equatorial Goiás Distribuição de Energia S.a., ocorre mediante a devida apresentação de documentação pessoal original, tal como RG, CPF ou CNH, além do comprovante de propriedade e/ou posse do imóvel para o qual está sendo solicitado o fornecimento de energia, conforme informações constantes no próprio site da concessionária.”Se a Apelante traz em juízo telas sistêmicas com anotações de suposta contratação de serviços pela Apelada em 2014 e 2018, não é crível que não disponha dos documentos apresentados ao tempo do cadastro ou mesmo do histórico de consumo das unidades.Para além disso, vê-se que a tela sistêmica trazida na contestação indica que, supostamente, teria havido inadimplemento de faturas da Unidade Consumidora nº 15263447 por três meses consecutivos (05.11.2019, 05.12.2019, 05.01.2020). Observe-se: No entanto, embora seja de usual conhecimento que débitos consecutivos ocasionam a interrupção dos serviços, a Apelante não demonstrou que houve o corte de energia elétrica, tampouco posterior religação ou reaviso de dívidas à Apelada, circunstâncias que infirmam as teses defensivas.Quanto ao “Termo Particular de Aceitação e Negociação de Débitos” (mov. 25, arq. 2), tem-se que também não demonstra a regularidade dos débitos cobrados, tal como compreendeu o juízo singular.Segundo a Apelante, existiriam os seguintes débitos em aberto, indicados na tela sistêmica reproduzida acima (valores originais, sem acréscimos):1. R$ 181,27, Vencimento em 05.09.2019 (Referência Unidade Consumidora: 12354016);2. R$ 243,43, Vencimento em 05.09.2019 (Referência Unidade Consumidora: 14781610);3. R$ 131,96, Vencimento em 05.01.2020 (Referência Unidade Consumidora: 15263447;4. R$ 167,44, Vencimento em 05.12.2019 (Referência Unidade Consumidora: 15263447);5. R$ 147,25, Vencimento em 05.11.2019 (Referência Unidade Consumidora: 15263447);Porém, o termo de renegociação ao qual a Apelante se reporta traz referência apenas à UC nº 12354016 e aos meses de 04/2019 e 05/2019. Confira-se a respectiva imagem (mov. 25, arq. 2): Embora a Apelada tenha impugnado o documento e questionado a assinatura nele contida, fato é que, independentemente do debate sobre sua autenticidade, o documento em questão é inservível para provar os débitos cobrados nestes autos e pelos quais houve negativação.Como dito, o termo se restringe à UC nº 12354016 e os supostos débitos nele indicados não guardam correspondência com nenhuma das negativações realizadas em nome da Apelada, nem mesmo com as telas sistêmicas juntadas na contestação.Nesse panorama, se o termo de renegociação é inapto à demonstração pretendida pela Apelante, sobram-lhe apenas telas e faturas sistêmicas, as quais, como dito, não comprovam a legitimidade dos débitos cobrados, como bem assentado na Súmula nº 18 deste Tribunal de Justiça:SÚMULA 18/TJGO - Telas sistêmicas, por si só, não são capazes de demonstrar relação obrigacional entre as partes, exceto se não impugnadas especificamente e se corroboradas com outros meios de provas.Assim, o juízo de 1º grau decidiu com acerto ao declarar a inexistência dos débitos apontados e determinar a exclusão das anotações a eles pertinentes de órgãos de proteção ao crédito.c) Do dano moral: descaracterizaçãoQuanto ao pedido de reparação por dano moral, o magistrado singular julgou-o parcialmente procedente e condenou a Apelante ao pagamento de indenização no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais).O dirigente processual considerou que a inserção de registro em cadastro restritivo por dívida inexistente e sem prévia notificação acarretaria, por si, dano moral presumido (in re ipsa) e geraria o dever de indenizar.A Apelante defende que a sentença se equivocou nesse ponto porque teria desconsiderado inscrição preexistente em nome da Apelada.Após detido exame do caso e dos documentos que o acompanham, tem-se que, nesse ponto, razão assiste à Apelante.A inscrição indevida do consumidor em cadastro restritivo enseja, em princípio, reparação por dano moral, porquanto a anotação tem aptidão para lhe abalar a imagem e prejudicar a obtenção de crédito.Entretanto, há muito a jurisprudência fixou o entendimento de que, mesmo diante de anotação irregular, se houver registro desabonador prévio e legítimo em seu nome, o consumidor não pode se sentir ofendido, nem reclamar abalo à moral.Nessa hipótese (anotação preexistente), sua imagem de bom pagador já estará comprometida, o que impede a reparação extrapatrimonial pretendida. Essa compreensão está sedimentada na Súmula nº 385 do STJ, que assim diz:Súmula 385, STJ: “Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”.Ao serem intimadas para especificarem provas (mov. 28), a Apelante requisitou a obtenção do histórico de negativações em nome da Apelada nos últimos cinco anos (mov. 31), o que foi deferido pelo juízo de 1º grau (mov. 33).Após a resposta da SPC Brasil (mov. 47), a Apelante suscitou a incidência da Súmula nº 385 do Superior Tribunal de Justiça ao caso concreto (mov. 50), todavia, embora tenha sido oportunizado à Apelada manifestar-se sobre o documento da SPC Brasil (mov. 48), silenciou-se.A Apelada também não refutou as considerações feitas pela Equatorial na mov. 50 – de que haveria anotação preexistente –, nem mesmo em sua manifestação posterior (mov. 61), quando se limitou a requerer o julgamento antecipado da lide.Dessa maneira, os apontamentos constantes do histórico da SPC Brasil (mov. 47), documento oficial, são incontroversos e devem ser observados no julgamento. Reproduz-se abaixo a cópia do documento: Como se percebe, as anotações discutidas nestes autos, atribuídas à Apelante (Equatorial Energia), foram incluídas no cadastro restritivo em 21.07.2020.Todavia, observa-se que, ao tempo da inclusão, havia inscrição preexistente em nome da Apelada, inserida pela empresa “Flash Fotos” em 30.03.2020, por débito no valor de R$ 1.100,00 e vencido em 15.02.2020.Essa circunstância impede o reconhecimento do dano moral pretendido, pois, na data de inserção dos registros desabonadores atribuídos à Apelante (21.07.2020), a imagem da consumidora estava comprometida pelo registro anterior (“Flash Fotos”).Convém registrar que a Apelada não demonstrou que a anotação prévia era ilegítima (por exemplo, inscrição por dívida já paga), tampouco que obteve em juízo o cancelamento dela, ônus que lhe incumbia por se tratar de fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, CPC).Por outro lado, não obstante conste do histórico que a inscrição relativa a “Flash Fotos” foi cancelada posteriormente, em 03.09.2020, essa circunstância não significa que a inscrição prévia era ilegítima, pois o cancelamento também pode decorrer de pagamento.De todo modo, em relação à inscrição da “Flash Fotos”, há informação na contestação de que aquela empresa ajuizou processual judicial em 15.09.2022 (PJD nº 5564470-44) para cobrar da Apelada dívida no valor de R$ 1.100,00 (mil e cem reais) e vencida em 15.02.2020, justamente os dados relativos à anotação preexistente.Ao que se lê da sentença proferida naqueles autos (mov. 20 – PJD 5564470-44), a Apelada foi condenada ao pagamento da dívida, o que evidencia, pois, a legitimidade da inscrição prévia realizada pela “Flash Fotos”.Diante desses contornos, compreende-se que a reparação extrapatrimonial pretendida é indevida, uma vez que a Apelada falhou em provar que o registro preexistente (“Flash Fotos”) ao tempo da anotação tida por irregular (“Equatorial Energia”) era ilegítima.Incide ao caso a Súmula nº 385 do STJ, o que, entretanto, deixou de ser ponderado na sentença. Assim, impõe-se a reforma do julgado para julgar-se improcedente o pedido de indenização por dano moral.Essa compreensão é reforçada pela jurisprudência desta Corte de Justiça:“4. Preexistente legítima anotação, a inscrição do devedor em cadastro restritivo de crédito, ainda que indevida, não enseja indenização por dano moral, ressalvado o direito ao cancelamento, exegese da súmula 385/STJ. 5. Quem já é registrado como mau pagador não pode se sentir moralmente ofendido por mais uma inscrição do nome como inadimplente em cadastros de proteção ao crédito (REsp 1.386.424/MG (Tema 922), sob o rito dos recursos especiais repetitivos do STJ. (…) (TJGO, Apelação Cível 5723403-18.2022.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ANDERSON MÁXIMO DE HOLANDA, 10ª Câmara Cível, julgado em 04/03/2024, DJe de 04/03/2024)”. (g.)d) Dos ônus sucumbenciaisA sentença distribuiu os ônus sucumbenciais – custas e honorários advocatícios – de maneira proporcional entre as partes, nos seguintes termos:“Em razão da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento proporcional das custas processuais e dos honorários advocatícios, sendo 80% (oitenta por cento) de responsabilidade da parte demandada e 20% (vinte por cento) da parte autora, observando-se a gratuidade da justiça deferida à parte autora, cuja exigibilidade permanece suspensa, nos termos do artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil, extinguindo o processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.”Sobre as despesas processuais – que não englobam os honorários advocatícios – o Código de Processo Civil determina seu rateio em caso de sucumbência recíproca. Confira-se o que dizem os arts. 84 e 86, CPC:Art. 84. As despesas abrangem as custas dos atos do processo, a indenização de viagem, a remuneração do assistente técnico e a diária de testemunha.Art. 86. Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas.A compreensão firme em doutrina e jurisprudência é de que a definição do grau de sucumbência deve levar em conta o número de pedidos formulados e julgados procedentes (TJGO, Apelação Cível 0057986-47.2015.8.09.0134, Rel. Des(a). Vicente Lopes Da Rocha Júnior, 2ª Câmara Cível, julgado em 09/10/2023, DJe de 09/10/2023).No quadro analisado, em que formulados dois pedidos de mérito (I. declaração de inexistência da dívida; II. Indenização por dano moral) e um deles é julgado improcedente, deve ser corrigido o rateio das custas processuais, estabelecendo-o proporção de 50% (cinquenta por cento) a cada parte.Quanto aos honorários, nota-se que a sentença pretendeu fixá-los, pois fez referência à condenação em custas e honorários, porém, deixou de estabelecer seu valor.A fixação dos honorários de sucumbência decorre de expresso comando legal (art. 85, § 2º, CPC), portanto, por ter a sentença sido omissa sobre sua quantificação, deve haver deliberação sobre essa matéria de ofício, que é de ordem pública.A esse respeito, citem-se os seguintes julgados:“(…) V. Na forma da jurisprudência desta Corte, "'a fixação dos honorários advocatícios é matéria que deve ser conhecida de ofício, porquanto é consectário lógico da sucumbência’' ( AgRg no REsp 1.189.999/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/8/2012, DJe de 24/8/2012)" (STJ, AgRg no AgRg no REsp 1471484/MG, Rel . Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe de 09/11/2015). Nesse contexto, considerando o efeito devolutivo da Apelação, que possibilita o conhecimento, pelo Tribunal de origem, de matérias examináveis de ofício – como é o caso dos honorários advocatícios –, não há que se falar em preclusão ou em ilegalidade do acórdão que, em razão da omissão da sentença, arbitrou honorários advocatícios, em desfavor da parte sucumbente na demanda. Precedentes do STJ. VI. Agravo interno parcialmente conhecido, e, nessa parte, improvido. (STJ, AgInt no AgInt no AREsp: 1036285 PE 2016/0334730-1, Relator.: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Julgamento: 19/10/2017, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/10/2017).”“4. Considerando a omissão na sentença, imperiosa a condenação, de ofício, das partes ao pagamento, pro rata, dos honorários advocatícios sucumbenciais, arbitrados equitativamente em R$ 2.000,00 (dois mil reais), vedada a compensação (arts. 85, §§8º, 11 e 14, e 86, caput, CPC/15), com a ressalva da suspensão da exigibilidade em relação à parte autora/apelada, por ser beneficiária da gratuidade (art. 98, §3º, CPC/15). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA PONTUALMENTE REFORMADA, DE OFÍCIO. (TJGO, Apelação Cível 5326610-08.2023.8.09.0164, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR FERNANDO DE CASTRO MESQUITA, 9ª Câmara Cível, julgado em 26/06/2024, DJe de 26/06/2024)”. (g.)A verba sucumbencial é autônoma de cada advogado e é insuscetível de compensação, mesmo nos casos de sucumbência recíproca (art. 85, § 14, CPC). A esse respeito, confira-se:“[…] 1. Sendo os litigantes em parte vencedor e vencido, mister reconhecer a sucumbência recíproca, com rateio das despesas processuais na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada litigante. 2. Quanto aos honorários advocatícios, cabe a cada parte arcar com o pagamento no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, vedada a compensação (art. 85, § 14, CPC). (…) Embargos de declaração conhecidos e parcialmente providos. (TJGO, Apelação Cível 5525166-15.2022.8.09.0091, minha relatoria, 10ª Câmara Cível, julgado em 13/11/2023, DJe de 13/11/2023) (g.)Com relação à Apelada, vencedora no pedido de declaração de inexistência de dívida, é inviável a fixação de seus honorários sobre condenação ou sobre proveito econômico, uma vez que, nessa última hipótese, resultaria em verba ínfima.Assim, os honorários da Apelada devem ser estabelecidos em 10% sobre o valor atualizado da causa, de acordo com os critérios sucessivos do art. 85, § 2º do CPC.Quanto à Apelante, seus honorários devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico alcançado, a saber, o quanto dos pedidos iniciais conseguiu abaixar (decaimento), o que corresponde ao pedido de dano moral julgado improcedente.Por certo, a exigibilidade da condenação em custas e honorários sucumbenciais permanece suspensa pois o Apelante é beneficiário da gratuidade da justiça (art. 98, § 3º, CPC).– DispositivoPelas razões expostas, CONHEÇO PARCIALMENTE da apelação cível e, na extensão conhecida, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO para em reforma à sentença:a) julgar improcedente o pedido de reparação por dano moral;b) ratear as despesas processuais entre as partes na proporção de 50% (cinquenta por cento) a cada uma, ante a sucumbência recíproca (art. 86, CPC).De ofício, corrijo a sentença e fixo os honorários sucumbenciais devidos à Apelante (requerida) em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido por ela e os honorários devidos à Apelada (requerente) em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, vedada a compensação.Descabe a majoração de honorários nesta sede em razão do desfecho do recurso (Tema 1.059, STJ).A exigibilidade da condenação permanece suspensa por ter o Apelante obtido os benefícios da gratuidade da justiça (art. 98, § 3º, CPC).Adverte-se de antemão que o manejo de recursos protelatórios poderá incidir na penalidade do art. 1.026, 2º, CPC e, para evitar a oposição de novos embargos declaratórios voltados exclusivamente ao prequestionamento, tenho por expressamente prequestionada toda a matéria debatida nos autos.É como voto.Goiânia, datado e assinado digitalmente. Altamiro Garcia FilhoDesembargador RelatorAGF8ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Quarta Turma Julgadora de sua Décima Câmara Cível, à unanimidade de votos, em conhecer parcialmente do recurso e, nessa extensão, dar-lhe parcial provimento e corrigir de ofício a sentença, tudo nos termos do voto do (a) Relator (a).Presidente da sessão, relator (a) e votantes nominados no extrato de ata de julgamento.A Procuradoria-Geral de Justiça esteve representada pelo membro também indicado no extrato da ata. Altamiro Garcia FilhoDesembargador Relator AGF8

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