Processo nº 0002084-73.2025.8.13.0223
ID: 277706086
Tribunal: TJMG
Órgão: 3ª Vara Criminal da Comarca de Divinópolis
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0002084-73.2025.8.13.0223
Data de Disponibilização:
23/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RENATO PEREIRA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de / 3ª Vara Criminal da Comarca de Divinópolis PROCESSO Nº: 0002084-73.2025.8.13.0223 CLASSE: [CRIMINAL] AÇÃO PENAL -…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de / 3ª Vara Criminal da Comarca de Divinópolis PROCESSO Nº: 0002084-73.2025.8.13.0223 CLASSE: [CRIMINAL] AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) ASSUNTO: [Adulteração de Sinal Identificador de Veículo Automotor] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: JOAO VITOR FERREIRA BEIRIGO CPF: 133.662.506-66 SENTENÇA Vistos e examinados. I. RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS ofereceu denúncia em face de JOÃO VITOR FERREIRA BEIRIGO, brasileiro, natural de Divinópolis/MG, nascido no dia 28 de abril de 2001, portador do RG nº 19.669.073/SSP-MG e inscrito no CPF n° 133.662.506-66, filho de Grasiele Ferreira Garcia e João Jacinto Beirigo Júnior, residente na Fazenda João Beirigo, região Cacoco de Baixo, Zona Rural de Divinópolis/MG, atualmente recolhido no Presídio Floramar, pela suposta prática dos crimes previstos nos artigos 180 e 311, §2°, III, ambos do Código Penal. A denúncia de ID 10391024661 narra os fatos nos seguintes termos: Detrai-se dos presentes autos de inquérito policial que, em data desconhecida, mas decerto após o dia 22/01/2025, em local incerto e não sabido desta cidade e Comarca de Divinópolis (MG), o denunciado JOÃO VITOR FERREIRA BEIRIGO adquiriu, em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime. Consta dos autos, ainda, que, na mesma oportunidade narrada no Fato 1, o denunciado JOÃO VITOR FERREIRA BEIRIGO adquiriu e possuía veículo automotor com sinais identificadores veiculares que sabia, ou deveria saber, estarem adulterados. De acordo com as investigações, no dia 22/01/2025, no Bairro Bom Pastor, nesta urbe, indivíduo(s) não identificado(s) subtraiu(iram) o veículo FIAT STRADA, placa SYX-2G89, de propriedade da vítima M.A.P.L., que se encontrava estacionado na via pública. Em data e local que não se pôde determinar, mas após 22/01/2025, o denunciado adquiriu de pessoa não identificada o veículo FIAT STRADA supramencionado, mesmo ciente de que era de origem criminosa (furto), e de que os seus sinais identificadores estavam adulterados. É certo que, no dia dos fatos, a Polícia Militar flagrou o referido automotor na posse do denunciado, vez que ele estava estacionado nas dependências do “Condomínio Recando dos Pássaros”, nesta cidade, residência de sua genitora, tendo sido constatado o carro tinha as placas SIC-2F17, correspondente a outro veículo (clonagem). Durante diligências, os policiais localizaram o denunciado, que transitava na via pública na condução de um segundo veiculo, marca BMW, placa EZR-1B55. Durante a abordagem, foram arrecadados em sua posse, além da quantia de R$1.400,00 (mil e quatrocentos reais), em espécie, um telefone celular e uma chave veicular que, ao depois, se constatou pertencer ao FIAT STRADA clonado, tudo conforme auto de apreensão de fls. 22. Levado a perícia de constatação, fls. 56/56, foi verificado que o veículo Fiat Strada, placa SYX-2G89 - que apresentava sinais de arrombamento na maçaneta dianteira e de acionamento anormal da ignição, possuía placa de identificação incompatível com as numerações de seu chassi e motor. As irregularidades e ilegalidades referentes ao veículo Fiat Strada eram de pleno conhecimento do denunciado, haja vista as circunstâncias nebulosas da sua aquisição, calhando destacar que é ele envolvido na prática de crimes nesta cidade, entre eles de furto, receptação e organização criminosa (fls. 02). De importância probatória, a inicial foi instruída pelos seguintes documentos: APFD (ID 10391024662, pág. 02/10); boletim de ocorrência (ID 10391024662, págs. 11/15); auto de apreensão (ID 10391024662, pág. 22); laudo pericial em veículo relacionado a roubo/furto (IDs 10391024663, págs. 30/31 e 10391074964, pág. 01/03); boletim de ocorrência do furto do veículo (ID 10391074964, pág. 10/13). Juntada cópia da decisão constante dos autos 5001306-18.2025.8.13.0223, onde a prisão em flagrante do acusado foi convertida em prisão preventiva (ID 10391074965, pág. 03/07). A denúncia foi recebida aos 18/02/2025, por meio da decisão de ID 10394865191. Devidamente citado (ID 10398089990), o acusado apresentou resposta à acusação por meio de advogado particular, reservando-se a discutir o mérito em sede de alegações finais (ID 10408400421). Foi realizada a audiência de instrução aos 07/05/2025, procedendo-se à oitiva de três testemunhas arroladas comumente pela acusação e pela defesa, sendo dispensadas as faltantes. Na sequência, foi assegurado ao réu o direito de entrevistar-se reservadamente com seu Procurador, nos termos do art. 185, § 5º do Código de Processo Penal, bem como foi cientificado do seu direito ao silêncio, sendo qualificado e interrogado em seguida. Encerrada a fase instrutória, facultou-se às partes a formulação de requerimentos complementares em sede de diligências, ocasião em que o representante ministerial requereu a atualização da CAC, enquanto a defesa nada demandou. O Ministério Público ofereceu alegações finais orais durante o ato, pugnando, em síntese, pela condenação do réu pelas práticas dos crimes arrimados na exordial acusatória, eis que provadas a materialidade e autoria delitiva (ata de audiência de ID 10445176175 e mídia audiovisual disponível na plataforma pje-mídias). A defesa apresentou memoriais, requerendo a absolvição do acusado quanto aos crimes previstos no art. 311 e 180, ambos do Código Penal, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, formulou requerimentos relacionados à eventual aplicação de pena, em caso de condenação (ID 10450412096). No ID 10450509768 foi colacionada a CAC atualizada do acusado. Vieram os autos conclusos para julgamento. II. FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação penal pública ajuizada pelo Ministério Público na qual se imputa ao réu JOÃO VITOR FERREIRA BEIRIGO a prática dos crimes de receptação e adulteração de sinal identificador de veículo automotor (art. 180, caput, e art. 311, §2°, III, ambos do CP). Ao exame dos autos, verifico estarem presentes os pressupostos de existência e de validade da relação processual, bem como as condições da ação penal. Não foram arguidas questões preliminares, nem vislumbro qualquer nulidade apta a ser reconhecida de ofício. Passo, pois, à apreciação do mérito. Foi imputada ao acusado JOÃO VITOR FERREIRA BEIRIGO a prática dos crimes previstos no artigo 180, caput, e artigo 311, § 2º, inciso III, ambos do Código Penal, sob a acusação de que adquiriu e mantinha em sua posse, em proveito próprio, bem que sabia ser produto de crime, consistente em um veículo automotor caminhonete Fiat Strada, ciente, ou ao menos devendo estar ciente, de que o referido automóvel apresentava sinais identificadores adulterados. A materialidade delitiva dos delitos restaram demonstradas pelo APFD (ID 10391024662, pág. 02/10); boletim de ocorrência (ID 10391024662, págs. 11/15); auto de apreensão (ID 10391024662, pág. 22); laudo pericial em veículo relacionado a roubo/furto (IDs 10391024663, págs. 30/31 e 10391074964, pág. 01/03); boletim de ocorrência do furto do veículo (ID 10391074964, pág. 10/13). De acordo com o laudo pericial trazido nos IDs 10391024663, págs. 30/31 e 10391074964, pág. 01/03 “I) O veículo portava as placas SIC-2F17 no momento dos exames periciais. Após consulta ao Qrcode, este apresentou-se inválido, não remetendo a nenhum dado comumente vinculado aos códigos presentes nas placas originais; II) A maçaneta dianteira esquerda encontrava-se danificada, mais especificamente no local próximo ao orifício para inserção da chave, com sinais de abrasão e forçamento por um objeto rígido, configurando um arrombamento no veículo; III) O veículo encontrava-se extremamente sujo e as placas não, o que sugere terem sidos colocadas recentemente; Conclusão: Através dos exames realizados, a perícia constatou que o veículo analisado guardava integridade de seus itens de identificação, numeração do chassi, motor e vidros, conforme foi apresentado nas imagens digitalizadas do presente documento. A placa que estava afixada ao veículo não era original, e não era compatível com as numerações do chassi e do motor do veículo.” No que se refere à autoria, esta se revela induvidosa em relação a ambos os delitos, conforme se extrai do conjunto probatório, como se demonstrará a seguir. O condutor do flagrante, PM Éverton de Castro Campos, disse na fase flagrancial que durante patrulhamento recebeu informações de que João Vitor Ferreira, foragido com mandado de prisão em aberto e suspeito de integrar organização criminosa de furto de veículos, teria deixado um veículo furtado no condomínio Recanto dos Pássaros. Após diligências, confirmou-se que o veículo era furtado e se tratava de uma caminhonete Fiat Strada, com placa SIC-2F17, quando a verdadeira era SYX-2G89, com queixa registrada em 22/01/2025, segundo pesquisas realizadas pela própria guarnição. Durante a vigilância, constatou-se que João Vitor trafegava em um veículo BMW na Avenida Paraná, nesta urbe, deslocando-se a guarnição imediatamente ao citado local. Na abordagem, foram encontrados a quantia de R$ 1.400,00, um celular e uma chave Fiat, cuja procedência desta última, ele não soube explicar. A chave permitiu ligar o Fiat Strada estacionado no condomínio onde mora a genitora do réu. João Vitor alegou ter recebido R$ 1.000,00 para guardar o veículo. Em buscas autorizadas no apartamento da genitora do suspeito, nada ilícito foi encontrado. Durante a instrução, o militar confirmou integralmente os relatos acima. Acrescentou que conhece o réu por meio de atuação no serviço de inteligência da Polícia Militar, sendo ele apontado como o principal envolvido em crimes de furto de veículos. Afirmou que o veículo BMW estava legalizado. Relatou que o Fiat Strada já se encontrava estacionado com a placa adulterada. Questionado se no condomínio onde a caminhonete estava estacionada, haviam bens pessoais do acusado, respondeu que não foi o militar responsável pelas buscas na residência, contudo foi informado pela avó do acusado que ele frequenta o local, não possuindo residência fixa, alternando-se entre a casa da avó e a dos genitores, inclusive mencionando que a caminhonete estava estacionada em uma vaga destinada a visitantes. Declarou que o furto da caminhonete ocorreu um dia antes da guarnição tomar conhecimento de sua localização no condomínio. Por fim, disse que o réu foi colaborativo no momento da prisão e confirmou que o emplacamento do veículo havia sido feito, realmente, em outra Comarca. Seu colega de farda, PM Lucas Faria de Sousa, ouvido somente em Juízo, narrou que não conhecia o acusado, mas confirmou o histórico de ocorrências relacionado ao caso. Esclareceu que sua atuação se limitou às buscas realizadas na residência da genitora do réu. Declarou desconhecer a origem do veículo BMW e relatou que, durante as diligências, apesar de a casa pertencer à mãe do acusado, visualizou objetos pessoais do réu em um dos quartos, especificamente vestimentas. A testemunha Marco Antônio Pereira Lopes, ao ser indagada na fase policial, disse ser proprietária da caminhonete Fiat Strada, placas SYX-2G89, a qual foi objeto de furto no dia 22/01/2025. Declarou não ter suspeitos do crime a indicar e que seu veículo possui valor comercial aproximado de R$ 103.000,00 (cento e três mil reais). Em juízo, a testemunha confirmou a narrativa anteriormente exposta, declarando que, ao buscar o veículo, a placa que nele constava era a clonada, identificada como SIC-2F17. O réu João Vitor, na fase policial, afirmou ter guardado a caminhonete Fiat Strada mediante promessa de recebimento da quantia de R$ 1.000,00 (um mil reais), reconhecendo que tinha ciência da origem espúria do bem, mas negando qualquer participação na subtração ou clonagem do veículo. Perante o Juízo, o réu manteve a negativa de autoria, tendo relatado que, na quinta-feira, por volta das 7h15, recebeu uma ligação de seu amigo Vinícius, que lhe pediu ajuda para guardar um veículo. Afirmou que cedeu a garagem de sua mãe para tal fim, mas que, de fato, não chegou a guardar o veículo. Negou que tenha sido preso na posse das chaves do carro Fiat Strada, qualificando tal informação como falsa. Lidas suas declarações anteriores, confirmou-as. Disse não saber o motivo pelo qual os policiais teriam afirmado que a chave do veículo estava em sua posse. Apontou Vinícius como a pessoa que lhe solicitou o favor de guardar o carro e afirmou que, no momento em que foi abordado pelos policiais, não tinha conhecimento da situação. Acrescentou que sabia que Vinícius era envolvido com crimes, razão pela qual, a princípio, não quis guardar o veículo. Eis, em suma, o acervo probatório dos autos. Afirmou o Órgão Ministerial, na inicial que o réu adquiriu e tinha a posse sobre veículo de procedência ilícita, ciente de tal circunstância, o o ocultou, mantendo a posse sobre ele na residência de sua genitora, constatando-se que a placa identificadora do automóvel estava adulterada. Assim, a conduta típica do réu se amolda tanto ao delito previsto no art. 180, caput, quanto no delito tipificado no art. 311, § 2º, inciso III, ambos do Código Penal, conforme se demonstrará a seguir. Estabelecida essa premissa, constata-se, a partir do exame do conjunto probatório, que, no caso em apreço, a autoria delitiva relativa à receptação dolosa é incontestável. As circunstâncias externas que envolveram o fato, aliadas à própria conduta do réu, evidenciam que este tinha plena ciência de que o veículo automotor por ele ocultado era produto de crime. Conforme apurado ainda, o acusado ocultou a caminhonete Fiat Strada, veículo cujo emplacamento estava adulterado ou remarcado, circunstância que ele sabia ou, ao menos, deveria saber. Neste ponto, restou demonstrado o elemento subjetivo dos tipos penais, consubstanciado no dolo indireto, na modalidade eventual, uma vez que o réu, no mínimo, deixou de adotar as cautelas exigíveis ao aceitar "ajudar um amigo" em troca de expressiva vantagem pecuniária — a quantia de R$ 1.000,00 — para guardar o veículo de origem criminosa e com sinais identificadores adulterados na garagem da residência de sua genitora. Em outras palavras, e diferente do caso de culpa consciente, em que se cogita o resultado, mas acredita-se ser capaz de afastá-lo, o acusado vislumbrou que estava recebendo veículo objeto de crime e, ainda assim, o manteve sob guarda e posse, sem adotar quaisquer diligências para sua identificação. Com efeito, fato é que a estória de não ter sequer visto o automotor, especialmente da forma narrada, não se sustenta em prova ou lógica alguma. Verificou-se que o referido automóvel havia sido objeto de furto perpetrado contra a vítima Marco Antônio Pereira Lopes, em 22 de janeiro de 2025. Já no dia 23 de janeiro de 2025, a Seção de Inteligência da Polícia Militar constatou que o acusado mantinha o veículo oculto na garagem do imóvel de sua genitora, localizado no Condomínio Recanto dos Pássaros. Durante a abordagem, foi localizada na posse do acusado a chave da caminhonete, informação que foi confirmada pelo Tenente Éverton, o qual acionou a ignição do automóvel com referida chave, ao chegar no local de guarda do veículo. No interrogatório judicial, o próprio acusado afirmou que, inicialmente, não queria guardar o veículo para um indivíduo de nome Vinícius, por saber que este possui envolvimento com a criminalidade. Ora, a alegação do acusado de que as chaves não foram encontradas em sua posse, bem como de que não teria sequer visualizado o automotor, sob o argumento de que quem o teria guardado na garagem de sua genitora foi o próprio amigo, contraria frontalmente o conjunto probatório constante dos autos. Não se trata, pois, de subverter a lógica processual penal e impor ao acusado o ônus da prova – o que configuraria indevida responsabilização objetiva -, mas de aplicar o disposto expressamente no art. 156 do Código de Processo Penal, segundo o qual “a prova da alegação incumbirá a quem a fizer”, sendo acertado o entendimento da Corte Cidadã, do qual comungo. Aliás, nesse sentido mantém-se a jurisprudência do STJ: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. ABSOLVIÇÃO. ORIGEM LÍCITA DOS BENS. ÔNUS PROBATÓRIO DA DEFESA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. DESOBEDIÊNCIA. ATUAÇÃO DE POLICIAIS NO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE OSTENSIVA PARA PREVENÇÃO E REPRESSÃO DE CRIMES. FUGA APÓS ORDEM DE PARADA. TIPICIDADE DA CONDUTA. DESOBEDIÊNCIA. MATÉRIA PACÍFICA NESTA CORTE SUPERIOR. RESP N. 1.859.933/SC (TEMA 1.060). REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte Superior é firmada no sentido de que, "no crime de receptação, se o bem houver sido apreendido em poder do paciente, caberia à defesa apresentar prova acerca da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova" (AgRg no HC n. 331.384/SC, relator Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 22/8/2017, DJe 30/8/2017). […]” (AgRg no HC n. 680.878/SC, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 17/5/2022, DJe de 20/5/2022). Nesse passo, não é crível a alegação de que o réu sequer tenha visualizado o veículo, especialmente porque ele próprio declarou ter cedido a garagem de sua genitora para o seu armazenamento — circunstância esta que, por óbvio, não teria ocorrido sem a sua intermediação, haja vista que sua genitora não teria cedido o espaço espontaneamente a terceiro desconhecido. E se assim não fosse, caberia ao réu indicar quem teria aberto a garagem para entrada do réu na casa de sua genitora, prova que não produziu. De mais a mais, os policiais militares foram uníssonos ao afirmar que a chave do automóvel foi apreendida em poder do acusado, quando abordado na Av. Paraná, nesta urbe. Outro ponto que chama a atenção é fato de o acusado, mesmo ciente do envolvimento de seu amigo com a criminalidade e de que o veículo era produto de crime, aceitou guardá-lo mediante promessa de recompensa no valor de R$ 1.000,00 (mil reais). Assim, não merece acolhimento o pleito absolutório, uma vez que restou evidenciado que o acusado possui experiência na seara criminosa, conforme se extrai de sua Certidão de Antecedentes Criminais (CAC), a qual revela envolvimento pretérito em práticas delitivas de mesma natureza. Tais antecedentes evidenciam que o réu detinha plena consciência da necessidade de cautela ao armazenar veículos de procedência duvidosa, razão pela qual não lhe aproveita a alegação de desconhecimento da origem espúria do automóvel. Destarte, a conduta do réu revela-se ainda mais reprovável, não podendo ser equiparada à daquela pessoa simples e desavisada, que guarda um bem acreditando, de boa-fé, que este não possui origem ilícita. Inviável, portanto, acolher as teses autodefensivas tendentes a absolvição quanto ao crime de receptação. Em derradeiro, quanto ao delito de adulteração de sinal identificador veicular, é digno de nota que a Lei 14.562/2023 vigente a partir de 26/04/2023, promoveu alteração legislativa no tipo em comento, para incluir no caput do art. 311, do Código Penal o §2º, III, o qual narra a conduta equiparada à adulteração, punindo com as mesmas penas do caput: I – o funcionário público que contribui para o licenciamento ou registro do veículo remarcado ou adulterado, fornecendo indevidamente material ou informação oficial; II – aquele que adquire, recebe, transporta, oculta, mantém em depósito, fabrica, fornece, a título oneroso ou gratuito, possui ou guarda maquinismo, aparelho, instrumento ou objeto especialmente destinado à falsificação e/ou adulteração de que trata o caput deste artigo; ou III – aquele que adquire, recebe, transporta, conduz, oculta, mantém em depósito, desmonta, monta, remonta, vende, expõe à venda, ou de qualquer forma utiliza, em proveito próprio ou alheio, veículo automotor, elétrico, híbrido, de reboque, semirreboque ou suas combinações ou partes, com número de chassi ou monobloco, placa de identificação ou qualquer sinal identificador veicular que devesse saber estar adulterado ou remarcado. (grifei). Nesse contexto, conforme disposição do art. 311, §2º, III, CP, a aquisição, recebimento, ocultação ou manutenção em depósito de veículo automotor com sinal identificador adulterado é suficiente para a incursão do agente nas penas do caput do art. 311 do CP, não havendo que se falar na necessidade de demonstração de que foi ele o autor da falsificação/ adulteração. É exatamente o que se extrai do cotejo probatório produzido nestes autos. Não subsiste dúvida de que a conduta perpetrada pelo réu se amolda perfeitamente ao tipo penal descrito no inciso III do § 2º do artigo 311 do Código Penal, uma vez que restou demonstrado que ele tinha ciência não apenas da origem ilícita do bem, mas também de que o emplacamento do veículo encontrava-se adulterado. Tal conclusão é evidente, haja vista que o próprio perito, em laudo pericial acostado aos autos, apontou nítida discrepância entre as placas da caminhonete Fiat Strada e o restante do veículo, pois, enquanto o automóvel apresentava-se extremamente sujo, as placas aparentavam ser novas, o que sugere ter havido substituição recente. As observações do perito não se restringem a esse único aspecto, avançando ainda no sentido de concluir que o veículo apresentava sinais de arrombamento na maçaneta do lado do motorista. Assim, deveria o acusado ter recusado a solicitação recebida, sobretudo diante das circunstâncias concretas da proposta: o pedido partiu de indivíduo com vínculos notórios com a criminalidade, o veículo apresentava características suspeitas, e havia a promessa de pagamento de quantia elevada — R$ 1.000,00 — em troca de uma simples diária de garagem. Tais elementos, considerados em conjunto, impunham ao réu o dever de rejeitar a oferta, sendo absolutamente previsível e exigível essa conduta de quem, como ele, conhecia os riscos e os elementos indiciários da ilicitude. Registre-se que, na hipótese, não há de se falar em incidência do princípio da consunção entre os delitos sob exame. Quanto ao referido princípio, confira-se o escólio de Cezar Roberto Bitencourt: "(...) Pelo princípio da consunção, ou absorção, a norma definidora de um crime constitui meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime. Em termos bem esquemáticos, há consunção quando o fato previsto em determinada norma é compreendido em outra, mais abrangente, aplicando-se somente esta. Na relação consuntiva, os fatos não se apresentam em relação de gênero e espécie, mas de minus e plus, de continente e conteúdo, de todo e parte, de inteiro e fração. Por isso, o crime consumado absorve o crime tentado, o crime de perigo é absorvido pelo crime de dano. A norma consuntiva constitui fase mais avançada na realização da ofensa a um bem jurídico, aplicando-se o princípio major absorbet minorem. Assim, as lesões corporais que determinam a morte são absorvidas pela tipificação do homicídio, ou o furto com arrombamento em casa habitada absorve os crimes de dano e de violação de domicílio etc. A norma consuntiva exclui a aplicação da norma consunta, por abranger o delito definido por esta. Há consunção quando o crime-meio é realizado como uma fase ou etapa do crime-fim, onde vai esgotar seu potencial ofensivo, sendo, por isso, a punição somente da conduta criminosa final do agente." (Cezar Roberto Bitencourt, Tratado de Direito Penal, 17ª ed., Ed. Saraiva, pág. 99). Na hipótese em que se debruça, apesar de ambos os crimes ostentarem causalidade entre si, nota-se que eles foram praticados em circunstância de espaço e tempo distintas: a receptação se deu com a guarda e ocultação do veículo pelo réu e a adulteração dos sinais identificadores do veículo, ocorreu em momento anterior, segundo fala do réu, entretanto, não provada por qualquer meio. Deste modo, não é possível afirmar que a receptação constituiu meio para a consumação do crime de adulteração de sinal identificador de veículo. Para além disso, os dois tipos penais em análise tutelam bens jurídicos diversos. Enquanto o crime de receptação tutela o patrimônio, o delito previsto no art. 311, §2°, III, do Código Penal tutela a fé pública, mais especificamente, a autenticidade dos sinais identificadores do veículo, preservando o exercício do poder de polícia do Estado na circulação e controle dos automóveis. A este respeito, confira-se o seguinte aresto: APELAÇÃO CRIMINAL - RECEPTAÇÃO - ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR - PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS COMPROVADAS - CONSUNÇÃO ENTRE OS DELITOS DE RECEPTAÇÃO E DE ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR - INOCORRÊNCIA - DOSIMETRIA DA PENA - ADEQUADA - APLICAÇÃO DA DETRAÇÃO PENAL - IMPOSSIBILIDADE - COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO - CUSTAS PROCESSUAIS - ISENÇÃO - INVIABILIDADE. Demonstrada a autoria e a materialidade delitiva, a manutenção da condenação do agente é medida que se impõe. Comete o delito de receptação aquele que adquire, recebe, transporta, conduz ou oculta, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influi para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte. Inexistente a consunção entre os delitos de receptação e de adulteração de sinal de veículo, visto que o primeiro não é meio razoável para a consumação do segundo e que ambos os crimes maculam bens jurídicos diversos. Não há que se falar em alteração da pena quando observadas as balizas previstas no art. 59 do CP. A despeito do disposto no art. 387, §2º, do Código de Processo Penal, a análise da detração deve ficar a cargo do juízo da execução penal. Incabível a análise do pedido de isenção das custas processuais, por se tratar de matéria afeta ao Juízo da Execução. (TJMG - Apelação Criminal 1.0000.22.281361-0/001, Relator(a): Des.(a) Anacleto Rodrigues , 8ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 29/02/2024, publicação da súmula em 01/03/2024) (grifei). Por todo o exposto, entendo como devidamente comprovada a autoria e materialidade dos delitos de receptação e de adulteração de sinal identificador, como provenientes de desígnios autônomos, com relação ao acusado. E, inexistindo dúvidas quanto à materialidade e à autoria delitivas, bem como ausentes quaisquer excludentes de ilicitude ou de culpabilidade aptas a favorecer o réu, as condenações impõem-se como medida de rigor. II.1 Das condições pessoais do acusado Reconhecida a procedência parcial da imputação e atenta às etapas de aplicação da pena previstas no art. 69 do Código Penal, verifico que o acusado é reincidente específico, pois possui condenação definitiva nos autos nº 0031245-02.2023.8.13.0223, por fatos ocorridos no dia 11/10/2023, tipificados no art. 311, §2°, III, do CP, sendo-lhe aplicada pena de três anos de reclusão, que fora substituída por restritiva de direitos, consistente em prestação pecuniária e de serviços à comunidade, cujo trânsito em julgado se deu em 29/04/2024, ainda encontrando-se o réu em cumprimento de pena, conforme autos executórios n° 4400520-57.2024.8.13.0223. Tal registro será utilizado para fins de reincidência. O registro tombado sob o número 0031922-32.2023.8.13.0223 não será considerado, haja vista se encontrar em fase de recurso. De mais a mais, não constato a presença de outras agravantes ou mesmo atenuantes a incidirem na hipótese. Por fim, inexistem causas de aumento ou diminuição de pena a serem apreciadas. III. DISPOSITIVO Por todo o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para CONDENAR o réu JOÃO VITOR FERREIRA BEIRIGO, qualificado nos autos, pelas práticas dos crimes previstos nos arts. 180, caput, e 311, §2°, III, ambos do Código Penal, em concurso de crimes. Passo à dosimetria da pena, em observância ao princípio constitucional de sua individualização (Constituição da República, art. 5º, XLVI) e consoante o disposto nos artigos 59 e 68, do Código Penal. III.1 DO DELITO DESCRITO NO ART. 180, CAPUT, DO CP Na primeira fase, examino as circunstâncias judiciais: a) Culpabilidade: entendida como o juízo de censurabilidade incidente sobre a conduta do agente, tenho a culpabilidade demonstrada pelo acusado como ínsita a delitos da mesma natureza. b) Antecedentes: À luz da certidão de antecedentes criminais do acusado, não se constatam registros aptos a ensejar o reconhecimento de maus antecedentes, posto que a condenação será sopesasa em segunda fase de aplicação da pena. c) Personalidade: não há nos autos elementos suficientes para aferi-la, quer pela inexistência de laudo psicossocial, quer pela ausência de elementos suficientes no interrogatório do acusado, pelo que, considero tal circunstância favorável. d) Motivos: os precedentes causais de caráter psicológico da ação ou mola propulsora do crime não podem, no caso, exacerbar a reprimenda a ser imposta, pois que são próprios dos crimes desta espécie. e) Conduta social: consta dos autos elemento concreto que desabona a conduta social do réu, na medida em que ele praticou o novo delito em tela (janeiro 2025) durante o cumprimento de pena por condenações em autos diversos, conforme autos executórios n° 4400520-57.2024.8.13.0223, o qual consta execução ativa no regime aberto. Este entendimento está em consonância com a jurisprudência do STJ, da qual cito os seguintes julgados: AgRg no HC 556.444/DF, Sexta Turma, J. 18/8/2020, DJe 24/8/2020; AgRg no AREsp n. 2.209.318/MG, Quinta Turma, J. 11/4/2023, DJe 14/4/2023; AgRg no HC n. 752.992/SP, Sexta Turma, J. 17/4/2023, DJe 19/4/2023. f) Circunstâncias: inexiste nos autos prova da ocorrência de elementos acidentais ao delito que influenciam negativamente na gravidade da conduta do réu. g) Consequências: consistentes nos efeitos produzidos pela ação criminosa, o maior ou menor vulto do dano ou perigo de dano e o sentimento de insegurança trazido pela ação, não refletem em reprovabilidade mais elevada, sendo próprias dos delitos da mesma natureza. h) Comportamento da vítima: não influiu na prática do delito. O crime previsto no art. 180, caput, do Código Penal, prevê a pena de reclusão, de 01 (um) a 04 (quatro) anos, e multa. Assim, ponderadas as circunstâncias judiciais e sendo uma delas desfavorável ao acusado (conduta social), fixo as penas-base privativa de liberdade e de multa acima do mínimo legal, a saber: 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Passo à segunda fase de fixação das penas e constato inexistir atenuantes a serem consideradas, ao passo que milita em favor do acusado a agravante da reincidência (art. 61, I, do Código Penal), na medida em que ele se encontra em execução de pena por fato cuja condenação transitou em julgado anteriormente aos fatos em trato, conforme minudenciosamente analisados no tópico (II.1). Desta feita, havendo uma condenação apta a gerar a reincidência (autos n° 0031245-02.2023.8.13.0223), utilizo a fração de aumento usual, qual seja 1/6 (um sexto) alcançando a pena privativa de liberdade e de multa, provisoriamente, no patamar de: 1 (um) ano, 7 (sete) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa. Por fim, na terceira fase do trifásico, à míngua de causas majorantes ou minorantes, torno definitivas as penas em: 1 (um) ano, 7 (sete) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa. Ante a falta de dados sobre a efetiva condição financeira do réu, fixo o valor do dia-multa no mínimo legal, a saber, 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à data do fato e atualizado quando do seu efetivo pagamento. Apesar do quantum da reprimenda aplicada, entendo adequado, para a obtenção dos fins de prevenção e reprovação exigidos pelo legislador, que o acusado inicie o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto, tendo em vista ser reincidente específico, nos termos do entendimento a contrário sensu do disposto no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal. No caso, descontando-se o tempo de prisão provisória do réu (de 23/01/2025 até a presente data – cerca de 04 meses), em obediência à regra do art. 42, do Código Penal c/c art. 387, § 2º, do CPP, bem como aquelas atinente à progressão de regime (art. 112 da LEP), remanesce o regime semiaberto. Eventuais benefícios derivados do cumprimento provisório da pena devem ser aplicados pelo Juízo da Execução Penal. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, em razão da reincidência do réu (CP, art. 44, II). Pelo mesmo motivo, inviável o sursis (CP, art. 77, I). III.2 DO DELITO DESCRITO NO ART. 311, §2°, III, DO CP Na primeira fase, examino as circunstâncias judiciais: a) Culpabilidade: entendida como o juízo de censurabilidade incidente sobre a conduta do agente, tenho a culpabilidade demonstrada pelo acusado como ínsita a delitos da mesma natureza. b) Antecedentes: À luz da certidão de antecedentes criminais do acusado, não se constatam registros aptos a ensejar o reconhecimento de maus antecedentes. c) Personalidade: não há nos autos elementos suficientes para aferi-la, quer pela inexistência de laudo psicossocial, quer pela ausência de elementos suficientes no interrogatório do acusado, pelo que, considero tal circunstância favorável. d) Motivos: os precedentes causais de caráter psicológico da ação ou mola propulsora do crime não podem, no caso, exacerbar a reprimenda a ser imposta, pois que são próprios dos crimes desta espécie. e) Conduta social: consta dos autos elemento concreto que desabona a conduta social do réu, na medida em que ele praticou o novo delito em tela (janeiro/2025) durante o cumprimento de pena por condenações em autos diversos, conforme autos executórios n° 4400520-57.2024.8.13.0223, o qual consta execução ativa no regime aberto. Este entendimento está em consonância com a jurisprudência do STJ, da qual cito os seguintes julgados: AgRg no HC 556.444/DF, Sexta Turma, J. 18/8/2020, DJe 24/8/2020; AgRg no AREsp n. 2.209.318/MG, Quinta Turma, J. 11/4/2023, DJe 14/4/2023; AgRg no HC n. 752.992/SP, Sexta Turma, J. 17/4/2023, DJe 19/4/2023. f) Circunstâncias: inexiste nos autos prova da ocorrência de elementos acidentais ao delito que influenciam negativamente na gravidade da conduta do réu. g) Consequências: consistentes nos efeitos produzidos pela ação criminosa, o maior ou menor vulto do dano ou perigo de dano e o sentimento de insegurança trazido pela ação, não refletem em reprovabilidade mais elevada, sendo próprias dos delitos da mesma natureza. h) Comportamento da vítima: não influiu na prática do delito. O crime previsto no art. 311, §2°, III, do Código Penal, prevê a pena de reclusão, de 03 (três) a 06 (seis) anos, e multa. Assim, ponderadas as circunstâncias judiciais e sendo uma delas desfavorável ao acusado (conduta social), fixo as penas-base privativa de liberdade e de multa acima do mínimo legal, a saber: 3 (três) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Passo à segunda fase de fixação das penas e constato inexistir atenuantes a serem consideradas, ao passo que milita em favor do acusado a agravante da reincidência (art. 61, I, do Código Penal), na medida em que encontra em execução de pena por fato cuja condenação transitou em julgado anteriormente aos fatos em trato, conforme minudenciosamente analisados no tópico (II.1). Desta feita, havendo uma condenação apta a gerar o referido instituto (autos n° 0031245-02.2023.8.13.0223), utilizo a fração de aumento usual, qual seja 1/6 (um sexto) alcançando a pena privativa de liberdade e de multa, provisoriamente, no patamar de: 3 (três) anos, 11 (onze) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa. Por fim, na terceira fase do trifásico, à míngua de causas majorantes ou minorantes, torno definitivas as penas em: 3 (três) anos, 11 (onze) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 12 (doze) dias-multa. Ante a falta de dados sobre a efetiva condição financeira do réu, fixo o valor do dia-multa no mínimo legal, a saber, 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à data do fato e atualizado quando do seu efetivo pagamento. Apesar do quantum da reprimenda aplicada, entendo adequado, para a obtenção dos fins de prevenção e reprovação exigidos pelo legislador, que o acusado inicie o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semiaberto, tendo em vista ser reincidente específico, nos termos do entendimento a contrário sensu do disposto no artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal. No caso, descontando-se o tempo de prisão provisória do réu (de 23/01/2025 até a presente data – cerca de 04 meses), em obediência à regra do art. 42, do Código Penal c/c art. 387, § 2º, do CPP, bem como aquelas atinente à progressão de regime (art. 112 da LEP), remanesce o regime semiaberto. Eventuais benefícios derivados do cumprimento provisório da pena devem ser aplicados pelo Juízo da Execução Penal. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, em razão da reincidência do réu (CP, art. 44, II). Pelo mesmo motivo, inviável o sursis (CP, art. 77, I). III.3 DO CONCURSO DE CRIMES No que se refere aos crimes imputados ao acusado, previstos no art. 180, caput, e no art. 311, § 2º, inciso III, ambos do Código Penal, entendo configurado o concurso formal imperfeito ou impróprio, nos termos da parte final do art. 70 do mesmo diploma legal. Tal entendimento se mostra o mais adequado ao caso concreto, considerando que a conduta dolosa do réu foi única — no mesmo contexto fático, ocultou veículo que sabia ser produto de crime e, ainda, estava na posse de veículo com sinais identificadores (placas) adulterados —, resultando, contudo, em infrações penais decorrentes de desígnios autônomos. Com efeito, restou demonstrado que a ação do agente decorreu de vontades independentes, pois ele assumiu a posse de bem de origem criminosa, ao tempo em que, também aceitou a condição de adulteração do emplacamento. Diante dessa dinâmica, não se configura concurso material de crimes, mas sim o concurso formal impróprio, hipótese em que dois ou mais delitos são praticados por uma única ação ou omissão, sendo, todavia, evidente a vontade do agente de realizar todas as infrações penais, em razão de desígnios autônomos. Assim, já se posicionou a Corte Mineira: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO, ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ABSOLVIÇÃO PELO DELITO DISPOSTO NO ARTIGO 311, §2°, INCISO III, DO CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. CARACTERIZAÇÃO DO TIPO PENAL. PALAVRA DOS POLICIAIS MILITARES. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. LAUDO PERICIAL. PRESCINDIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. RECONHECIMENTO DO CONCURSO FORMAL IMPRÓPRIO ENTRE OS DELITOS DE RECEPTAÇÃO E ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. CABIMENTO. ÚNICA CONDUTA DOLOSA, MAS CRIMES QUE RESULTAM EM DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. FIXAÇÃO DA PENA-BASE AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL EM FACE DE CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE. INVIABILIDADE. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA Nº 231 DO STJ. ENTENDIMENTO PACIFICADO NA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE FIXADA EM PATAMAR ADEQUADO E SUFICIENTE, ESTANDO EM CONSONÂNCIA COM OS DISPOSITIVOS LEGAIS PREVISTOS EM LEI. RECURSO PROVIDO EM PARTE, CONTUDO, DECISÃO SEM EFEITO PRÁTICO, EIS QUE INALTERADA A SANÇÃO APLICADA. Se as provas produzidas formam um conjunto probatório harmônico e desfavorável ao apelante, autorizando um juízo de certeza para o decreto condenatório, não há como acolher o pedido de absolvição. Demonstrado pelo conjunto probatório que o veículo que estava na posse do agente estava com sinal identificador adulterado, resta configurada a conduta típica do artigo 311, §2°, inciso III, do CP. A perícia técnica não é imprescindível para atestar a adulteração de sinal de identificação de veículo automotor, sendo possível outros meios de provas. O concurso formal impróprio incide quando forem praticados dois ou mais crimes, mediante uma só ação ou omissão, mas era da vontade do autor a prática de todos os delitos (desígnios autônomos). A lei limita a quantidade de pena aplicável, razão pela qual não pode ficar aquém do mínimo e nem além do máximo diante da incidência de atenuantes e agravantes. A aplicação de circunstância atenuante não pode reduzir a pena para aquém do mínimo legal, em obediência à Súmula nº 231 do STJ. Logo, inexistindo causa de diminuição, a pena não pode ser reduzida para patamar inferior ao mínimo legal, não havendo nisso qualquer injustiça ou violação ao princípio da individualização da pena, mas apenas estrito cumprimento da lei. (TJMG - Apelação Criminal 1.0000.24.432096-6/001, Relator(a): Des.(a) Doorgal Borges de Andrada , 4ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 22/01/2025, publicação da súmula em 24/01/2025). Grifo nosso. EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - RECEPTAÇÃO, ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR E POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO - ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA - DESCABIMENTO - MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS POR PROVAS PRODUZIDAS EM CONTRADITÓRIO JUDICIAL - REDUÇÃO DA PENA - IMPOSSIBILIDADE - PROCEDIMENTO TRIFÁSICO REALIZADO DE FORMA ESCORREITA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA - RECONHECIMENTO DO DISPOSTO NO ARTIGO 70 DO CÓDIGO PENAL - CONCURSO FORMAL IMPRÓPRIO CARACTERIZADO - APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 387, §2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CABIMENTO - POSSIBILIDADE DE ABRANDAMENTO DO REGIME - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA - SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DAS CUSTAS PROCESSUAIS - POSSIBILIDADE - ESTIPULAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PELA ATUAÇÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. - A existência de provas seguras acerca da prática do crime previsto no artigo 311 do Código Penal, consubstanciadas, principalmente, por elementos de convicção produzidos sob o crivo do contraditório, demanda a manutenção da sentença condenatória proferida em primeiro grau. - Considerando que o procedimento trifásico de fixação da reprimenda foi realizado de forma escorreita em primeira instância, não há que se falar na modificação da sentença condenatória. - Tendo em vista a prática de dois delitos mediante uma única ação, havendo a comprovação de desígnios autônomos, mostra-se de rigor o reconhecimento do concurso formal impróprio. - O procedimento disposto no § 2º do art. 387 do CPP deverá ser realizado pelo juiz quando a operação implicar inequivocamente em abrandamento do regime. - O réu assistido por Defensor Dativo ou que comprove a sua hipossuficiência, faz jus à suspensão da exigibilidade das custas processuais, nos termos do §3º do artigo 98 da Lei nº 13.105/2015, em consonância, ainda, com o entendimento firmado pelo Órgão Especial deste E. Tribunal, no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade nº 1.0647.08.088304-2/002. - Necessária a fixação de honorários advocatícios pela atuação em segunda instância a defensor dativo nomeado pelo juízo de origem. (TJMG - Apelação Criminal 1.0000.24.165744-4/001, Relator(a): Des.(a) Glauco Fernandes , 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 19/09/2024, publicação da súmula em 20/09/2024). (grifei). Dessa forma, aplico a regra prevista na parte final do art. 70 do Código Penal, procedendo ao cúmulo das penas anteriormente fixadas, alcançando-se, assim, a reprimenda definitiva no patamar de: 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 14 (quatorze) dias de reclusão e 24 (vinte e quatro) dias-multa. Ante a falta de dados sobre a efetiva condição financeira do réu, fixo o valor do dia-multa no mínimo legal, a saber, 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à data do fato e atualizado quando do seu efetivo pagamento. Apesar do quantum da reprimenda aplicada (inferior a oito anos), entendo adequado, para a obtenção dos fins de prevenção e reprovação exigidos pelo legislador, que o acusado inicie o cumprimento da pena privativa de liberdade em regime fechado, tendo em vista ser reincidente específico, nos termos do entendimento a contrário sensu do disposto no artigo 33, § 2º, alínea “b”, do Código Penal. No caso, descontando-se o tempo de prisão provisória do réu (de 23/01/2025 até a presente data – cerca de 04 meses), em obediência à regra do art. 42, do Código Penal c/c art. 387, § 2º, do CPP, bem como aquelas atinente à progressão de regime (art. 112 da LEP), remanesce o regime fechado, face reincidência. Eventuais benefícios derivados do cumprimento provisório da pena devem ser aplicados pelo Juízo da Execução Penal. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, em razão da reincidência do réu (CP, art. 44, II). Pelo mesmo motivo, inviável o sursis (CP, art. 77, I). IV. Disposições gerais IV.1 Reparação dos danos: Deixo de proceder à fixação da indenização prevista no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, tendo em vista a recuperação do veículo automotor pela vítima, bem como a ausência de elementos concretos nos autos que permitam aferir, com segurança, o quantum devido a título de reparação pelos danos causados. IV.2 Condenação em custas: Condeno o acusado ao pagamento das custas processuais (artigo 804 do Código de Processo Penal). IV.3 Requisitos da prisão cautelar: Mantenho a prisão preventiva do sentenciado João Vitor Ferreira Beirigo, considerando que permanecem incólumes os requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal, conforme anteriormente analisado. A segregação cautelar foi, à época, devidamente fundamentada com base nos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal, especialmente para a garantia da ordem pública e a prevenção de reiteração delitiva, sendo esta justificada pela acentuada periculosidade social do agente, circunstância que permanece atual, haja vista que o réu encontra-se em cumprimento de pena e responde a outras quatro ações penais (processos nº 0023794-86.2024.8.13.0223, 0002574-32.2024.8.13.0223, 0016194-14.2024.8.13.0223 e 0023638-98.2024.8.13.0223), todas relativas a fatos da mesma natureza dos ora tratados. Tais circunstâncias permanecem hígidas e revelam risco concreto à ordem pública, pela reiteração delitiva, justificando, assim, a continuidade da medida extrema. Diante desse panorama, deixo de reconhecer ao réu o direito de aguardar o trânsito em julgado da presente condenação em liberdade. Expeça-se, de imediato, mandado de prisão em desfavor do sentenciado, por força da presente sentença condenatória recorrível, observando-se o disposto no Ofício Circular nº 58/CGJ/2010. Fixo o prazo de validade do mandado em 08 (oito) anos, conforme o quantum da pena aplicada, devendo constar expressamente o motivo da ordem prisional: manutenção da prisão preventiva em sentença condenatória recorrível, nos termos do artigo 2º, inciso III, da Portaria nº 2.087/CGJ/2012. IV.4 Quanto aos bens apreendidos: Quanto ao numerário apreendido em poder do sentenciado, no valor de R$ 1.400,00 (mil e quatrocentos reais), inexistindo nos autos elementos que indiquem sua origem ilícita, impõe-se a restituição. Todavia, determino a utilização do referido valor para a quitação das custas processuais e da multa aplicada, e, havendo eventual saldo remanescente, este deverá ser restituído ao réu. Na hipótese de o montante ser insuficiente, deverá o sentenciado ser intimado a complementar o pagamento. Quanto ao aparelho telefônico da marca Apple, modelo iPhone 16 Pro Max, considerando que a perícia de extração de dados ainda não foi concluída, determino que as partes se manifestem, no prazo de cinco dias, acerca do interesse na conclusão da referida diligência. Em caso de manifestação positiva, oficie-se ao Instituto de Criminalística para que informe sobre o andamento da perícia, com posterior vista às partes da resposta recebida. Não havendo manifestação no prazo assinalado, fica, desde já, deferida a restituição do aparelho ao acusado, devendo ser oficiado o Instituto de Criminalística para que proceda à imediata devolução do bem. Após a devolução, intimem-se as partes, possibilitando que o acusado reivindique o aparelho no prazo de 30 (trinta) dias, mediante expedição, pela Secretaria, do respectivo alvará de liberação, sob pena de decretação de perdimento do bem. Por fim, considerando a informação prestada pela vítima no sentido de que já procedeu à regularização do veículo Fiat Strada, nada há a prover quanto a esse ponto. Quanto à chave do referido veículo, intime-se o proprietário para retirada em Secretaria, no prazo de 10 dias contados da intimação, sob pena de perdimento e destruição, o que desde já determino. Após o trânsito em julgado: Nos presentes autos de conhecimento: a) proceda ao lançamento das informações no sistema INFODIP referente ao Tribunal Regional Eleitoral, para os fins do artigo 15, inciso III, da Constituição da República; b) procedam-se às comunicações e anotações de praxe, inclusive ao Instituto de Identificação do Estado; c) expeça-se guia de execução definitiva, instruindo-a com os documentos constantes da LEP e da Resolução nº 113/20/04/2010, do CNJ, remetendo-as à Vara de execução competente por malote digital, nos termos do disposto na Resolução 933/2020 do TJMG e no Provimento 401/2022, do TJMG. Intime-se pessoalmente o sentenciado por todo o conteúdo da presente Sentença, bem como o cientifique do prazo para interposição de recurso. Deverá o Sr. Oficial de Justiça indagá-lo se o mesmo deseja recorrer desta Sentença certificando este ato. Intimem-se pessoalmente o Ministério Público, posto que goza desta prerrogativa. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Divinópolis/MG, data da assinatura eletrônica. MARCILENE DA CONCEICAO MIRANDA Juiz(íza) de Direito 3ª Vara Criminal da Comarca de Divinópolis
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