Processo nº 0001351-62.2018.8.11.0012
ID: 278323566
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0001351-62.2018.8.11.0012
Data de Disponibilização:
26/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RAYSSA TOLEDO BALSTER DE CASTILHO
OAB/MT XXXXXX
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MAURICIO MAGALHAES FARIA NETO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 0001351-62.2018.8.11.0012 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, DANO AO …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 0001351-62.2018.8.11.0012 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, DANO AO ERÁRIO, VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS] RELATOR: EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JUNIOR TURMA JULGADORA: [EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JUNIOR, EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS, EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, EXMO. SR. DES. MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, EXMA. SRA. DESA. VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] PARTE(S): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), JOAO BATISTA VAZ DA SILVA - CPF: 282.509.151-00 (APELADO), JOAO VITOR SCEDRZYK BRAGA - CPF: 018.740.431-32 (ADVOGADO), NADIA RIBEIRO DE FREITAS - CPF: 352.742.458-03 (ADVOGADO), MAURICIO MAGALHAES FARIA NETO - CPF: 031.410.811-40 (ADVOGADO), MAURICIO MAGALHAES FARIA JUNIOR - CPF: 474.882.121-34 (ADVOGADO), RAYSSA TOLEDO BALSTER DE CASTILHO - CPF: 033.110.031-28 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA PROVERAM O RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO O EXCELENTÍSSIMO SR. DES. RELATOR DEOSDETE CRUZ JÚNIOR,1º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, 2ª VOGAL EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, 3ª VOGAL EXMA. SRA. DESA. VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO (convocada) E 4º VOGAL EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS (convocado). E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO MUNICIPAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO FISCAL EM ANO ELEITORAL. INFRAÇÃO AO ART. 73, § 10, DA LEI N. 9.504/97. ART. 10, VII, DA LEI N. 8.429/92. CONFIGURADO. DOLO ESPECÍFICO. DANO AO ERÁRIO. COMPROVADO. REFORMA DA SENTENÇA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Nova Xavantina, que julgou improcedente ação civil pública por improbidade administrativa em desfavor do ex-prefeito municipal João Batista Vaz da Silva, sob o fundamento de inexistência de dolo e dano ao erário. O objeto da controvérsia consiste na edição e sanção de lei municipal pelo recorrido, concedendo benefícios fiscais em ano eleitoral, em violação ao disposto no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97, sem respaldo nas exceções legais, e na alegação de que tal conduta causou prejuízo ao erário municipal. II. Questão em discussão A questão em discussão consiste em verificar se a concessão de benefícios fiscais no período vedado configura ato de improbidade administrativa nos termos do art. 10, VII, da Lei n. 8.429/92, bem como se restaram demonstrados o dolo específico e o dano efetivo ao erário. III. Razões de decidir A concessão de benefício fiscal em período vedado pela legislação eleitoral para configurar a prática do ato de improbidade administrativa prevista no inc. VII do art. 10 exige a comprovação do dolo específico do agente e do efetivo dano ao erário, após as alterações promovidas pela Lei n. 14.230/2021 à Lei n. 8.429/92. O recorrido, além de sancionar a lei municipal que instituiu os benefícios fiscais, foi o autor do projeto de lei, demonstrando sua participação ativa no ato, o que configura o dolo específico necessário à tipificação da improbidade administrativa. A renúncia de valores referentes a multas e juros de IPTU e ISS totalizou R$ 48.527,15, caracterizando prejuízo efetivo ao erário, elemento indispensável para caracterizar os atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, após a vigência da Lei n. 14.230/2021. Jurisprudência consolidada do STJ e de tribunais estaduais reconhecem que a concessão de benefícios fiscais em ano eleitoral configura a prática de ato ímprobo quando ausente fundamento excepcional e demonstrado o desvio de finalidade em proveito político do agente. IV. Dispositivo e tese Recurso de apelação provido para reformar a sentença e condenar o recorrido às sanções previstas no art. 12, II, da Lei n. 8.429/92, nos seguintes termos: a) Ressarcimento integral do dano ao erário, no montante de R$ 48.527,15, corrigido monetariamente e acrescido de juros legais desde a data da prática do ato ilícito; b) Multa civil equivalente ao valor do dano causado ao erário, R$ 48.527,15, também corrigida e acrescida de juros. Tese de julgamento: "A concessão de benefício fiscal em ano eleitoral, sem amparo nas exceções legais e com desvio de finalidade, configura ato de improbidade administrativa, desde que demonstrados o dolo específico do agente e o prejuízo efetivo ao erário." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, caput e § 4º; Lei n. 8.429/92, arts. 10, VII, e 12, II; Lei n. 9.504/97, art. 73, § 10. Jurisprudência relevante citada: STF, Tema 1199 de Repercussão Geral; STJ, AgInt no AREsp 2068838/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 27/05/2024; TJ-MT, APL 0000101-59.2017.8.11.0034, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 04/06/2018. R E L A T O R IO EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR (RELATOR): Egrégia Câmara, Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Nova Xavantina, que julgou improcedente a ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida em desfavor de João Batista Vaz da Silva, então prefeito municipal, sob o fundamento de inexistência de dolo e dano ao erário. Nas razões recursais, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso sustenta que o recorrido, na qualidade de Prefeito do Município de Nova Xavantina, em ano eleitoral (2016), editou a Lei Municipal n. 1.917/2016, através da qual permitiu a concessão de descontos no pagamento de impostos municipais (IPTU e ISS), configurando renúncia de receita e concessão indevida de benefício fiscal, em afronta ao disposto no § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97 (Lei das Eleições). Argumenta, ainda, que a prática configura ato de improbidade administrativa, e teria sido utilizada para obter vantagem política indevida e desequilibrar o pleito eleitoral. Diante desse contexto, requer a reforma da sentença para condenar o recorrido, aplicando-lhe as sanções previstas no artigo 12, inciso II, da Lei n. 8.429/92, consistentes em: a) ressarcimento ao erário no montante de R$ 48.527,15 (devidamente corrigido); b) perda do cargo público; c) suspensão dos direitos políticos pelo período legal; d) multa civil; e e) proibição de contratar com o Poder Público . Nas contrarrazões, o apelado pugna pelo desprovimento do recurso, sob o argumento de inexistência de qualquer indício de dolo e dano ao erário. Em parecer ministerial, o douto Procurador de Justiça Edmilson da Costa Pereira manifestou-se pelo provimento do recurso. É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR (RELATOR): Egrégia Câmara, Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Nova Xavantina, que julgou improcedente a ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida em desfavor de João Batista Vaz da Silva, então prefeito municipal, sob o fundamento de inexistência de dolo e dano ao erário. A improbidade administrativa consiste na violação do princípio constitucional da probidade administrativa, que pode ser definido como o dever do agente público agir sempre com honestidade, lealdade, decência e honradez na sua relação com a administração pública. Nesse sentido, ensina José Afonso da Silva que “A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial pela Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37, §4º). A probidade administrativa consiste no dever de o ‘funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer”.1 Para a configuração da improbidade administrativa, portanto, é necessário que o agente público aja com má-fé, propósitos maldosos ou desonestidade na condução dos negócios públicos, não bastando a prática de mera ilegalidade, se esta não vem acompanhada daqueles predicados negativos. Corroborando esta conclusão, após a superveniência da Lei nº 14.230, de 25/10/2021, a Lei nº 8.429/92, que dispõe sobre a ação de improbidade administrativa, passou a exigir a comprovação de dolo específico para o enquadramento do agente público em todas as condutas ímprobas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 da LIA, dentre outras alterações relevantes. Neste viés, após diversas controvérsias sobre a aplicação das novas disposições inseridas à Lei 8.429/92, o STF julgou o Tema de Repercussão Geral 1199, fixando as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo – DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". Empós as alterações promovidas na LIA, Marçal Justen Filho discorre sobre a exigência de dolo específico: “(…) 13.2 A exigência do dolo Um dos núcleos da reforma promovida pela Lei 14.230/2021 consistiu em afirmar que a improbidade somente se configura nos casos de conduta dolosa. O elemento subjetivo do tipo da improbidade é o dolo. Isso significa a consciência do sujeito quanto à antijuridicidade de sua conduta e a vontade de praticar a ação ou a omissão necessária à consumação da infração. 13.3 A intencionalidade da prática do ato reprovável Apenas existe improbidade nos casos em que o agente estatal tiver consciência da natureza indevida da sua conduta e atuar de modo consciente para produzir esse resultado. Ou seja, a improbidade é uma conduta necessariamente dolosa. Assim se impõe porque a configuração da desonestidade depende da consciência e da vontade de violar um dever moral. (…) 14 Ainda a identificação do dolo A Lei 14.230/2021 preocupou-se em definir o próprio conceito de dolo, de modo a evitar a prevalência do entendimento de que bastaria a voluntariedade do agente. 14.1 A consciência e a vontade de produzir o resultado danoso O dolo se configura não apenas como a vontade livre de praticar um ato subsumível à tipificação material prevista em lei. É indispensável a consciência quanto à ilicitude e a vontade de produzir o resultado reprovado pela ordem jurídica. Um exemplo permite compreender a questão. Configura-se improbidade quando o agente deixar indevidamente de promover licitação, de modo a gerar um prejuízo para a Administração (art. 10, inc. VIII, da Lei 8.429). Essa hipótese de improbidade exige a presença de um elemento subjetivo reprovável relativo a essa situação de causalidade material. Deve existir a consciência não apenas de que a licitação era necessária. Mais ainda, é indispensável a vontade de praticar uma conduta indevida apta a causar o resultado antijurídico. Se o sujeito tinha consciência e vontade de praticar a conduta (contratação sem a necessária licitação), mas sem se orientar a produzir o resultado específico (prejuízo para o erário ou benefício a um particular), então a improbidade não está configurada. Isso não significa que a ausência de licitação, numa hipótese em que seria necessária, configure conduta lícita, se o vício de conduta do agente público não estiver acompanhado de dolo. Esse ato poderá ser ilegal e, eventualmente, invalidável, a depender das circunstâncias. Caberá a responsabilização do agente infrator. O que se afirma é que não existirá nem improbidade nem crime na hipótese de conduta não eivada de dolo. (…) Dito de outro modo, o elemento subjetivo reprovável (dolo ou culpa) não é presumido. É indispensável a avaliação da conduta adotada pelo sujeito para reconhecer a existência da culpa ou do dolo. (…)”.2 De igual modo, Rafael de Oliveira Costa e Renato Kim Barbosa descrevem sobre a exigência de dolo a partir da vigência da Lei 14.230/2021:3 “(…) A caracterização do ato de improbidade administrativa depende, a partir do advento da Lei n. 14.230/21, da presença do elemento subjetivo dolo na conduta perpetrada pelo sujeito ativo. Dolo é a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei. Não basta, portanto, a voluntariedade do agente. É necessário que o agente público deseje praticar a conduta e alcançar determinado resultado (…) Com efeito, o dolo é componente subjetivo da conduta, composto por dois elementos: o volitivo, ou seja, a vontade de praticar a conduta prevista na norma, e o intelectivo, traduzido na consciência da conduta e do resultado. Não se admite, diferentemente do que ocorre na Lei Anticorrupção, a responsabilidade objetiva no âmbito da Lei n. 8.429/1992. Nem se admite, ainda, a prática do ato a título de culpa, como permitido no artigo 186 do Código Civil. Por derradeiro, o mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. Do mesmo modo, reforça-se a necessidade de haver dolo e não apenas uma mera voluntariedade. (…)”. Acerca de como conferir se há dolo ou não do agente público, ensina Marçal: “(…) 15.2 Os meios de prova: indícios e presunções Isso não significa a vedação à prova indireta. A avaliação do elemento subjetivo, em situações concretas de improbidade, far-se-á usualmente mediante elementos probatórios indiretos. Não se exige que o agente manifeste formal e diretamente uma intenção reprovável. Assim, é perfeitamente cabível inferir o elemento subjetivo do agente a partir das diversas manifestações de sua atuação – tenham sido elas anteriores, concomitantes ou posteriores à consumação do evento material danoso. A presença do dolo, por exemplo, poderá ser evidenciada mediante a constatação de condutas que demonstrem a consciência e a vontade de produzir o resultado final antijurídico. Isso compreende uma ampla série de questões. Assim, é pertinente estabelecer uma comparação entre as condutas anteriores e posteriores do sujeito. É relevante examinar os padrões de soluções adotados pela instituição em hipóteses similares. Também interessa verificar se existiu aprovação pelos órgãos de controle à conduta adotada. Não é cabível reputar presente o elemento doloso quando o sujeito tiver adotado exatamente a mesma conduta que sempre fora praticada e que merecera aprovação de órgãos de controle. Isso não impede o reconhecimento da irregularidade da conduta, mas exclui a presença de elemento subjetivo reprovável. (...)”4 - grifo e destaque nosso Dessa forma, em relação ao dolo específico, entendo que deve ser aferido com base na narrativa dos fatos e nas provas produzidas nos autos, avaliando-se os comportamentos adotados pelos réus para confirmar se tinham consciência, a vontade de praticar a ilicitude e alcançar o resultado específico - enriquecimento ilícito, dano ao erário ou infringência aos princípios da Administração Pública. Outro elemento introduzido pela Lei n. 14.230/2021 é a necessidade de dano efetivo para configuração do art. 10, o que significa dizer que o dano in re ipsa (dano presumido), solução bastante difundida na jurisprudência, deixou de existir e passa a ser necessário que o autor de alguma forma quantifique o dano causado ao erário, por exemplo, nos casos em que há frustração da licitude do processo licitatório (inc. VIII do art. 10). Sobre essa nova exigência, Marçal preceitua5: “(…) 12.5 A configuração do dano Somente é possível cogitar de dano por uma contratação quando a Administração desembolsar prestação superior ao que seria cabível. Ainda que tenha ocorrido indevida dispensa de licitação, não haverá a improbidade do inc. VIII do art. 10 da LIA quando a Administração desembolsar valor igual ou inferior ao que seria obtido em caso de licitação. Portanto, a lesão indispensável à existência de improbidade não se confunde com o montante do valor desembolsado pela Administração num contrato comutativo. A lesão se configura quando houver desembolso de valor excessivo, indevido, desnecessário. Considerando o exemplo acima, o dano apto a configurar a improbidade do inc. VIII do art. 10 da LIA consiste no valor sobejante pago pela Administração em relação àquele que teria desembolsado se a licitação tivesse ocorrido. (…) 13 Ainda o descabimento da tese da ficção de prejuízo Cabe reiterar o entendimento do descabimento da tese da ficção do prejuízo, consistente em reputar que toda e qualquer contratação sem licitação resulta em condições de contratação mais onerosas do que as que seriam obtidas em caso de licitação. Essa tese conduziria à inconstitucionalidade da contratação direta, eis que implicaria o reconhecimento de que a ausência de licitação produziria contratação desvantajosa. Essa afirmativa não encontra respaldo nem na própria experiência, eis que é perfeitamente cabível que a contratação sem licitação propicie um resultado satisfatório e vantajoso para a Administração. Dito de outro modo, a ocorrência do dano ao erário é uma questão fática, que depende do exame dos fatos. (…) 14 Ainda o argumento da dificuldade da prova Apenas por cautela, cabe rejeitar qualquer contraposição no sentido da “dificuldade” da prova da lesão ao erário. Esse tipo de argumento infringe as garantias constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal. Ademais, o argumento é improcedente em seu conteúdo. É perfeitamente cabível produzir prova do valor que seria possível obter numa licitação. Basta considerar, por exemplo, as seguintes informações: os preços de mercado; os valores obtidos em contratações semelhantes pela própria Administração, precedidas ou não de licitação, e os valores cobrados pelo próprio particular contratado em contratos similares. (…)”. Ao analisar as razões da apelação, verifico que o cerne da controvérsia gira em torno da configuração do ato de improbidade administrativa, notadamente se há elementos que demonstram o dolo na conduta do apelado e a existência de dano ao erário. Diante dos regramentos acima mencionados, a despeito das alegações do recorrido, tenho que restou configurada a prática de ato de improbidade administrativa prevista no inc. VII do art. 10 da Lei n. 8.429/92, merecendo, portanto, ser reformada a sentença. A Lei n. 8.429/92, em seu artigo 10, inciso VII, qualifica como ímprobo o ato de "conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie". No caso em apreço, a instrução probatória revela que a Lei Municipal nº 1.917/2016, aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo apelado, previu descontos e parcelamentos de débitos da dívida ativa municipal, em plena vigência do calendário eleitoral. O Ministério Público enfatiza que o apelado, além de prefeito, é advogado com atuação na esfera eleitoral, o que evidencia seu pleno conhecimento das vedações impostas pelo artigo 73, §10, da Lei nº 9.504/97, dispositivo que proíbe a concessão de benefícios fiscais em ano eleitoral, salvo em situações excepcionais, como calamidade pública ou programas sociais previamente instituídos. Dessa forma, resta comprovado que sua conduta foi deliberada, no sentido de se autopromover politicamente em ano eleitoral, configurando-se, assim, o dolo específico no caso concreto. A alegação de que o apelado apenas sancionou a norma, sem protagonismo no processo legislativo, não se sustenta diante das provas colacionadas. É incontroverso que o próprio apelado foi o autor do projeto de lei que resultou na concessão dos benefícios fiscais, o que demonstra sua participação ativa e consciente no ato, caracterizando o uso da máquina pública em benefício próprio. No que tange à tese de ausência de dano ao erário, também não se verifica, uma vez que houve renúncia dos valores referentes a multas e juros do IPTU e ISS, totalizando o valor de R$ 48.527,15 (quarenta e oito mil, quinhentos e vinte e sete reais e quinze centavo).6 É cediço que a concessão de benefícios fiscais em ano eleitoral, sem respaldo nas exceções legais, caracteriza não só ilicitude eleitoral, mas também ato de improbidade administrativa, sobretudo quando há comprovação de desvio de finalidade para obtenção de vantagem política pessoal - o que está demonstrado no caso em tela, haja vista que o apelado concorreu à reeleição como candidato único. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE – EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS SUFICIENTES À FORMAÇÃO DA CONVICÇÃO DO JULGADOR – INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA – PREFEITO MUNICIPAL – CANDIDATO À REELEIÇÃO – EDIÇÃO E SANÇÃO DE ATO NORMATIVO SOBRE PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL E CONCESSÃO DE PRAZO DE INCENTIVOS À ARRECADAÇÃO DE TRIBUTOS MUNICIPAIS EM PERÍODO PROIBIDO – ANO DE ELEIÇÃO – CONDUTA VEDADA – VIOLAÇÃO AO ARTIGO 73, § 10, DA LEI N. 9.504/1997 – SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS – NÃO CONFIGURAÇÃO – ATO ÍMPROBO - VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – CONFIGURADO – PENALIDADES – PERDA DE FUNÇÃO PÚBLICA E MULTA CIVIL – RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – OBSERVÂNCIA – RECURSO DESPROVIDO. [...] A teor do disposto no artigo 73, § 10, da Lei n. 9.504/1997, é vedada à Administração Pública, em ano de eleição, a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. No caso concreto, as penalidades de perda da função pública e de pagamento de multa civil, no valor correspondente a 10 (dez) vezes o da remuneração do agente, por atenderem ao comando do parágrafo único do artigo 12, da Lei n. 8.429/1992, devem ser mantidas. (TJ-MT - APL: 00001015920178110034 MT, Relator.: MÁRCIO VIDAL, Data de Julgamento: 04/06/2018, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Data de Publicação: 21/06/2018) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DOAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA POR PREFEITO EM PERÍODO ELEITORAL. ATO ÍMPROBO CONFIGURADO. PENALIDADE IMPOSTA. [...] IV - Doação de área pública em período eleitoral, sem a finalidade de socorrer situação emergencial, configura improbidade administrativa. V - Sentença de procedência mantida. Prefeito condenado ao pagamento de multa civil, equivalente a vinte (20) vezes sua última remuneração; suspensão dos direitos políticos por oito (08) anos. Aplicação da Lei nº 9.504/97, artigo 73, § 10; Lei nº 8.429/92, artigos 10, I, II, III, 11, caput, 12, II e III. Inaplicáveis os honorários recursais, ante a ausência de condenação em verba de sucumbência no juízo de origem (artigo 85, § 11, do Codex de Ritos). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-GO 0161192-91.2011.8 .09.0110, Relator.: FAUSTO MOREIRA DINIZ, 6ª Câmara Cível, Data de Publicação: 22/01/2019) CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NULIDADE DA SENTENÇA. INOCORRÊNCIA. PUBLICIDADE VEICULADA EM INFORMATIVO MUNICIPAL. FOTOS E MANIFESTAÇÕES PESSOAIS DO PREFEITO. AUTOPROMOÇÃO. EXALTAÇÃO DA FIGURA E QUALIDADES DO ALCAIDE E ASSOCIAÇÃO PESSOAL COM ATOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM GERAL. INEXISTÊNCIA DE CARÁTER EDUCATIVO, INFORMATIVO OU DE ORIENTAÇÃO SOCIAL. DISTRIBUIÇÃO DE CESTAS BÁSICAS E TELHAS EM ANO ELEITORAL E SEM CRITÉRIO. EXECUÇÃO DE PROGRAMA JÁ INICIADO. INOCORRÊNCIA. ART. 73, § 10, LEI 9.504/97. DOLO E MÁ-FÉ CONFIGURADOS. SENTENÇA MANTIDA. - Demonstrado pelo conjunto probatório que a publicidade institucional extrapolou o desiderato informativo, educativo e de orientação previstos na Constituição Federal, incorreu o réu em violação aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, com afronta direta ao art. 37, § 1º da CR/88 - Fotos do recorrido dirigindo trator e participando de obra pública para construção, entre outras, e de textos elogiosos e autopromocionais são notícias que nada acrescentam de substancial na vida municipal e serviram única e exclusivamente para vincular, em explícita propaganda (eleitoral), a imagem do Prefeito a ações positivas da Administração Pública - Distribuídas cestas básicas e telhas coloniais em ano eleitoral, com pedido de voto, sem observância dos critérios previstos na Lei, e sem que tais atos sejam continuidade de programa iniciado no exercício anterior evidencia intuito eleitoreiro e oportunista.(TJ-MG - AC: 00042400320118130392 Malacacheta, Relator.: Des.(a) Alberto Vilas Boas, Data de Julgamento: 23/04/2019, Câmaras Cíveis / 1ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 30/04/2019) Demonstrando a necessidade de repressão de condutas semelhantes, em igual sentido, “mutatis mutandis”: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA, COM NÍTIDA PROMOÇÃO PESSOAL. CONDENAÇÃO COM BASE NO ART. 10, XI, DA LEI 8.429/1992. CONSTATAÇÃO DE PREJUÍZO EFETIVO AO ERÁRIO. AFRONTA AO ART. 1022 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE. REVISÃO. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. ANÁLISE DA DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL PREJUDICADA. 1. Trata-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra Rafael Muzzi de Miranda, em face da realização de propaganda eleitoral extemporânea e com nítida promoção pessoal, em afronta ao artigo 37, § 1º, da Constituição da República Federativa Brasileira e à Lei 9.504/1997.2. O Parquet, na referida Ação, imputou ao réu a prática de atos definidos nos arts. 10 e 11 da Lei 8429/1992, sob o argumento de ter ele, em ano eleitoral e no exercício do cargo de Prefeito do Município de Cachoeiras de Macacu, procedido à distribuição de cartilhas do Conselho Municipal dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes, de Revista Informativa da Prefeitura Municipal de Cachoeiras de Macacu e DVD, com inserção de seu nome, imagem, e divulgação de conquistas municipais no período de 2009 a 2012, quando de sua gestão, as quais não continham caráter informativo, mas objetivavam, tão somente, sua promoção pessoal. [...] 3. O juízo sentenciante acolheu o pedido e condenou o ora recorrente (fl . 972, e-STJ): "Na hipótese em apreço, verifico que a conduta do réu RAFAEL foi de elevada reprovabilidade, pois apesar de atuar como Prefeito e gestor dos recursos públicos determinou e autorizou a elaboração das publicações elogiosas a sua pessoa e à Administração, bem como sua divulgação, violando os Princípios da Moralidade e da Impessoalidade, causando prejuízo financeiro ao Município. Diante de todos esses fatores, deverá o requerido RAFAEL receber censura deste juízo, ficando condenado nas seguintes sanções do artigo 12, incisos II e III, da Lei 8.429/1992 (...)", além do"ressarcimento integral do dano ao erário apurado em R$ 21.600, acrescidos de correção monetária pela UFIR desde a data do empenho (22/09/2011) e acrescidos de juros legais, a contar do trânsito em julgado".4. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, analisando detidamente o conjunto fático-probatório dos autos, manteve a condenação . In verbis (fls. 1120-1121, e-STJ): "[...] Ressalte-se, por fim, que, pelos mesmos fatos aqui analisados, o apelante foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro ao pagamento de multa de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais), por prática de propaganda eleitoral extemporânea e desvirtuamento de publicidade institucional (índice 191, fls. 195/199, e índices 378/411, fls. 397/411) ( ...) Por fim, nada há que se modificar quanto às sanções impostas a apelante, eis que em conformidade com o estabelecido no artigo 12, incisos II e III, da Lei nº 8.492/1992". [...] 10. Agravo Interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2068838 RJ 2022/0035143-8, Relator.: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 27/05/2024, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/06/2024) DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISTRIBUIÇÃO DE REVISTA COM CONTEÚDO ELEITOREIRO. DESVIO DE FINALIDADE. PENA APLICADA. REEXAME. SÚMULA 7/STJ. 1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública contra o ex-prefeito de Encantado/RS, Adroaldo Conzatti, que teria distribuído publicação com propaganda sua, nas últimas semanas da campanha eleitoral, a fim de proporcionar reeleição partidária. 2. O Tribunal de Justiça condenou o recorrente às seguintes penas: a) ressarcimento integral do dano; b) suspensão dos direitos políticos por cinco anos; c) pagamento de multa civil no valor da remuneração percebida pelo agente; d) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, pelo prazo de três anos. 3. Não há como o STJ minorar a pena aplicada sem rever o contexto fático probatório dos autos, o que é vedado, consoante dispõe a Súmula 7/STJ. 4. Agravo Regimental não provido. (STJ - AgRg no REsp: 1274069 RS 2011/0168803-1, Relator.: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 27/08/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/09/2013) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ILEGITIMIDADE DO MUNICÍPIO. VIOLAÇÃO À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NÃO VERIFICADA. DOAÇÃO E CESSÃO DE DIREITO REAL IRREGULARES DE IMÓVEL PÚBLICO. CARACTERIZADO ATO IMPROBO. DOLO ESPECÍFICO. CONFIGURADO. REVOGAÇÃO DO INCISO I DO ARTIGO 11. ABOLITIO ILLICITI. APLICAÇÃO RETROATIVA AO CASO. SETENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. [...] 4. A doação ou cessão de direito real de imóvel de ente público deve observar rigorosamente as normas de regência, devendo estar presentes interesse público, autorização legislativa, prévia avaliação e procedimento licitatório (art. 17 da lei 8.666/93). 5. Configura-se ato de improbidade a doação/cessão irregular de terreno público em ano eleitoral, com nítido propósito de arregimentação de sufrágio, subsumindo-se a conduta dolosa ao art. 10, inciso III da Lei de Improbidade. 6. Havendo abolitio illiciti das condutas anteriormente previstas, não pode o agente sofrer condenação pela prática de ato que deixou de configurar conduta ímproba, tendo em vista que art. 11, inciso I da lei 8 .249/92 foi revogado pela lei 14.230/2021, havendo, motivo pelo qual se deve afastar a multa civil imposta (art. 12, II, LIA). APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. (TJ-GO 50710038620178090072, Relator.: ALEXANDRE DE MORAIS KAFURI - (DESEMBARGADOR), 8ª Câmara Cível, Data de Publicação: 25/07/2024) DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO SEM LICITAÇÃO DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19. SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 14.230/2021. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE DOLO E EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. ELEMENTOS DO TIPO LEGAL DEMONSTRADOS. EX-PREFEITO JÁ CONDENADO NA JUSTIÇA ELEITORAL PELO USO DE RECURSOS PÚBLICOS. RECURSO DO EX-PREFEITO IMPROVIDO. RECURSO DA EMPRESA PROVIDO. [...] Ex-prefeito já condenado por infração ao art. 73, inciso IV, da Lei nº 9.504/97 (distribuição de bens ou serviços custeados pelo poder público com a finalidade de propaganda eleitoral). Lei nº 9.504/97 que prevê expressamente que a conduta eleitoral ilícita constitui ato de improbidade. [...] lV. Dispositivo e tese recurso da empresa provido e recurso do ex-prefeito improvido. Tese de julgamento: para a caracterização de ato de improbidade administrativa, é imprescindível a demonstração de dolo específico do agente e de prejuízo patrimonial efetivo ao erário. A retroatividade da Lei nº 14.230/2021 se aplica a atos de improbidade administrativa praticados antes de sua vigência, desde que mais benéfica ao acusado. A manutenção da previsão da conduta ilícita, ainda que em outro dispositivo legal, permite o reconhecimento do ato ímprobo, como consequência da aplicação dos princípios da mihi factum et dabo tibi jus e jura novit curia. A contratação de serviços por dispensa de licitação, desde que nos limites legais e sem conluio ou má-fé, não configura ato de improbidade administrativa por parte do particular contratado. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 487, I; Lei nº 8.429/1992, arts. 10, VIII; 11, incisos I e XII, 12, II e III, e 17-c, §1º; Lei nº 14.230/2021; Lei nº 9.504/97, art. 73, inciso IV e § 7º; CF/1988, art. 5º, XXXVI. Jurisprudência relevante citada: STF, tema nº 1.199, re nº 843.989/PR; STF are 1012197 AGR ? Rel. Min. Ricardo lewandowski, j. 23.08.2018, p. 28.08.2018. STJ, agint no aresp nº 2.068.838/RJ, Rel. Min. Herman benjamin, segunda turma, j. 27.05.2024, dje 04.06.2024; aresp nº 1.777.909/MS, Rel. Min. Herman benjamin, segunda turma, j. 16.11.2021, dje 16.12.2021. (TJSP; AC 1001023-38.2021.8.26.0095; Brotas; Segunda Câmara de Direito Público; Relª Desª Maria Fernanda de Toledo Rodovalho; Julg. 17/09/2024) Portanto, restam plenamente preenchidos os requisitos legais para a configuração do ato de improbidade administrativa (art. 10, inc. VII, da Lei n. 8.429/92), sobretudo a presença do dolo específico do agente e do dano ao erário, elementos indispensáveis à aplicação das sanções previstas no artigo 12, inciso II, da Lei n. 8.429/92. Quanto à dosimetria da pena no campo da improbidade administrativa, deve-se observar os princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade, conforme estabelecido no artigo 37, §4º, da Constituição Federal. Nesse contexto, a proporcionalidade exige que as penas sejam adequadas e necessárias para atingir os objetivos de punição e prevenção, sem impor sanções excessivamente gravosas que extrapolem o impacto concreto dos atos de improbidade. Já a razoabilidade impõe a avaliação da gravidade dos atos praticados, considerando o contexto, a extensão do dano ao erário e o impacto social decorrente da conduta. Na mesma linha, a Lei nº 14.230/2021, que reformou a Lei de Improbidade Administrativa, reforçou a necessidade de observância da proporcionalidade na aplicação das sanções. Ante o exposto, voto no sentido de CONHECER da Apelação e DAR-LHE PROVIMENTO, reformando a sentença recorrida para condenar o apelado João Batista Vaz da Silva às seguintes sanções previstas no artigo 12, inciso II, da Lei nº 8.429/92, observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade: a) Ressarcimento integral do dano ao erário, no montante de R$ 48.527,15, corrigido monetariamente e acrescido de juros legais desde a data da prática do ato ilícito; b) Multa civil equivalente ao valor do dano causado ao erário, ou seja, R$ 48.527,15, também corrigida e acrescida de juros. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (1º VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO (2ª VOGAL): Acompanho o voto do Relator. SESSÃO DE 06 DE MAIO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO): V O T O (VISTA) EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (1º VOGAL): Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Nova Xavantina/MT, nos autos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta em face de João Batista Vaz da Silva. Extrai-se dos autos que o Ministério Público moveu ação sob a alegação de que o requerido, na qualidade de Prefeito Municipal de Nova Xavantina e em ano eleitoral (2016), editou a Lei Municipal nº 1.917/2016, que dispôs sobre concessão de benefícios fiscais relativos ao IPTU e ISS mediante "mutirão de conciliação". A conduta do requerido foi tipificada no disposto no art. 10, inciso VII, da Lei de Improbidade Administrativa. O Juízo da Comarca de Nova Xavantina julgou improcedentes os pedidos iniciais por não vislumbrar a ocorrência de ato de improbidade administrativa, considerando não ter restado comprovada i) a presença do elemento subjetivo dolo e ii) a ocorrência de efetivo dano ao erário. Irresignado, o Ministério Público interpôs recurso de apelação (id 154886206) alegando que o conjunto probatório evidencia o dolo na conduta do requerido, tendo agido com intenção de favorecer-se eleitoralmente por meio da concessão de benefícios fiscais em ano de eleições municipais. Em suas contrarrazões (id 217553237), o requerido pugnou pelo desprovimento do recurso, sustentando a regularidade da conduta, bem como a ausência de comprovação de dolo e dano ao erário. O Douto Relator, e. Des. Deosdete Cruz Junior proferiu voto no sentido de conceder provimento ao recurso, para condenar o apelado João Batista Vaz da Silva às sanções de ressarcimento integral do dano ao erário, no montante de R$ 48.527,15 e multa civil equivalente ao valor do dano causado ao erário, ou seja, R$ 48.527,15, também corrigida e acrescida de juros. Para melhor análise da matéria solicitei vista dos autos. Pois bem. Atribui-se ao Prefeito Municipal, a prática de ato de improbidade administrativa, capitulado no artigo 10, inciso VII, da lei de regência. Vejamos o disposto na Lei de Improbidade: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;” Nos termos da lei, consideram-se atos de improbidade administrativa, as condutas dolosas tipificadas nos artigos 9º a 11, caracterizando o elemento subjetivo, a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado como ímprobo. Ainda em consonância à legislação de regência, constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário, que enseje efetiva e comprovada perda patrimonial, e notadamente, conceder beneficio fiscal sem observância das formalidades legais. O Artigo 73, §10, da Lei nº 9.504/97 preconiza que, no ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública. Quanto à eventual obtenção de vantagem política, verifica-se que tal alegação não se sustenta. Pelo que se extrai dos autos, o Requerido/Recorrido fora candidato único no pleito eleitoral. Ademais, o Autor não logrou êxito em demonstrar o efetivo prejuízo causado ao erário. A concessão de descontos nos juros e multa incidentes sobre impostos pagos em atraso pelos contribuintes, não necessariamente permitem concluir em prejuízo ao erário. Com efeito, não há qualquer indício de prova de que o alcaide tenha se beneficiado direta ou indiretamente com a concessão do benefício fiscal. O caput do art. 10 da Lei de Improbidade, estabelece que, “constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário (...), que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial”. Se não restou comprovada a efetiva quantia de lesão ao erário, não há ato de improbidade administrativa que possa ser enquadrado no mencionado dispositivo (art. 10). Registre-se que, não houve efetiva e comprovada perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento e a dilapidação de bens. A corroborar tal entendimento, colaciona-se a doutrina: “Deve ser novamente ressaltado, pela sua relevância, que o art. 10 da Lei de Improbidade trata daquelas situações em que o agente público cause dano ao patrimônio público (financeiro ou moral), sendo imprescindível à existência de um prejuízo. Apesar dos termos do inciso I, do art. 21, da Lei de Improbidade Administrativa, o certo é que as hipóteses do art. 10 exigem sim a existência de um prejuízo, financeiro ou moral, ao Poder Público. Na esteira do que já se entendia no âmbito da ação popular (art. 4º, da Lei 4.717/65), tem prevalecido o entendimento de que a lesão ao erário, como requisito elementar do ato de improbidade previsto no art. 10 da Lei 8.429/92, não pode ser meramente presumida. Assim, a pena de ressarcimento só é aplicável ao agente se o prejuízo ao erário for real, isto é, tiver conteúdo econômico ou patrimonial, não sendo possível a aplicação da pena se a lesão for considerada do ponto de vista moral ou social(...). (...) cumpre ressaltar que (...) adoção de procedimento diverso, mas que não resultar em prejuízo à Administração e nem houver comprovação da intenção de fraudar a lei pelo agente público, pode-se afastar a incidência das penalidades do art. 10 em comento, por se caracterizar mera irregularidade ou ilegalidade, mas não ato de improbidade. É a necessária distinção de que nem toda ilegalidade gera improbidade administrativa.” (Comentários à Lei de improbidade administrativa [livro eletrônico]: Lei 8.249 de 02 de junho de 1992 / Fernando da Fonseca Gajardoni ... [et al.]. -- 4. ed. -- São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020). “Os atos de improbidade, que causam prejuízos ao erário, consagrados no art. 10 da Lei 8.429/1992, relacionam-se à ação ou omissão, dolosa ou culposa, que acarreta perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres da Administração Pública e demais entidades mencionadas no art. 1.º da Lei de Improbidade Administrativa. (...) O pressuposto central para tipificação do ato de improbidade, no caso, é a ocorrência de lesão ao erário, (...). (...) Entendemos que a incidência do art. 10 da LIA depende necessariamente da efetiva comprovação da lesão ao patrimônio público econômico (erário), sendo certo que, nas hipóteses exemplificativamente arroladas nos incisos da referida norma, a lesividade é presumida. A ausência de prejuízo econômico aos cofres públicos afasta a configuração da improbidade por dano ao erário, mas não impede a tipificação da improbidade por enriquecimento ilícito (art. 9.º), concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário (art. 10-A) ou por violação aos princípios da Administração (art. 11), desde que preenchidos os respectivos pressupostos legais. (...) Isto não significa dizer que todo e qualquer deslize no dia a dia da Administração venha a configurar improbidade administrativa. Existem graus de violação à ordem jurídica que são sancionados com intensidades distintas. A mera irregularidade administrativa comporta sanção administrativa, mas não sanção de improbidade. A interpretação da legislação de improbidade deve ser feita à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, tanto na tipificação das condutas quanto na aplicação das sanções. O erro administrativo não pode ser confundido com a improbidade administrativa. (...)” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Improbidade administrativa: direito material e processual [livro eletrônico] – 8. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. Destarte, no caso, o ato não pode ser enquadrado na Lei de Improbidade, pois não evidenciado o efetivo prejuízo ao erário, consignando-se que, ainda que constatada irregularidade ou ilegalidade, por si só, não há falar em improbidade. Outrossim, não restou evidenciada a vontade livre e consciente do agente de agir em desconformidade com a legislação eleitoral. Em consonância à orientação do Pretório Excelso no Tema 1.199, é necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se a presença do elemento subjetivo dolo; o que não fora verificado na espécie. A propósito: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – ALEGAÇÃO DE ATOS VOLTADOS A CONCEDER BENEFÍCIO FISCAL ILEGAL – AUSÊNCIA DE ELEMENTO PROBANTE DA CONDUTA - NÃO DEMONSTRAÇÃO DO DOLO – ADVENTO DAS ALTERAÇÕES NA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PELA LEI N° 14.230/2021 – RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA – FENÔMENO ANÁLOGO À ABOLITIO CRIMINIS – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1 - Não havendo elemento probante suficiente a demonstrar que cada um dos requeridos servidores públicos, no desempenho de suas funções específicas, agiram em conluio, de forma intencional – ou mesmo com dolo genérico, para o fim de conceder ilegalmente o benefício e provocar dano ao erário, não há que se falar em condenação por atos ímprobos. (...) 2 - Com as mudanças promovidas pela lei nº 14.230/2021, passou-se a exigir o elementos subjetivo - dolo, para configuração de atos de improbidade. Sendo assim, uma vez não tipificada a conduta e não evidenciado o dolo, não há que se falar em condenação.” (N.U 0025387-38.2005.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 24/10/2023, Publicado no DJE 25/10/2023) Ante o exposto, peço vênia ao e. Relator para divergir de seu voto e negar provimento ao recurso interposto; com a manutenção da sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. É como voto. EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (PRESIDENTE): Em razão da divergência, o julgamento, prosseguirá com aplicação da técnica de ampliação do colegiado, prevista no art. 942 do CPC, nos termos do art. 23-A do RITJ/MT, em sessão futura. SESSÃO DE 20 DE MAIO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO): SUSTENTAÇÃO ORAL USOU DA PALAVRA A ADVOGADA DRA. RAYSSA TOLEDO BALSTER DE CASTILHO, OAB/MT 30320-B V O T O EXMA. SRA. DESA. VANDYMARA GALVÃO RAMOS PAIVA ZANOLO (3ª VOGAL – CONVOCADA): Excelentíssimos Senhores Desembargadores, Peço vênia ao Relator, para acompanhar o voto divergente, proferido pelo Des. Mário Roberto Kono de Oliveira, no sentido de negar provimento ao recurso interposto, com a manutenção da sentença que julgou improcedente a ação civil pública por ato de improbidade administrativa. I. RELATÓRIO Trata-se de recurso de apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO contra a sentença que, nos autos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta contra JOÃO BATISTA VAZ DA SILVA, julgou improcedentes os pedidos, em razão da ausência da prática de ato ímprobo previsto no artigo 10, VII, da Lei n. 8.429/92 (conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais). O Douto Des. Relator, Deosdete Cruz Júnior, proferiu voto no sentido de dar provimento ao recurso, em razão de que restaram preenchidos os requisitos legais para a configuração do ato de improbidade administrativa (artigo 10, VII, da Lei n. 8.429/92), sobretudo a presença do dolo específico e do dano ao erário, visto que o agente, de forma ativa e consciente, concedeu irregularmente benefícios fiscais, caracterizando o uso da máquina pública em benefício próprio. Por sua vez, foi proferido voto divergente pelo Des. Mário Roberto Kono de Oliveira (1º Vogal), no sentido de negar provimento ao recurso interposto, com a manutenção da sentença que julgou improcedente a ação civil pública por ato de improbidade administrativa, sob o fundamento de que não há qualquer indício de prova de que o alcaide tenha se beneficiado direta ou indiretamente com a concessão do benefício fiscal, bem como não houve a efetiva e comprovada a perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento e a dilapidação de bens. A Exma. Sra. Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago (2ª Vogal), proferiu voto no sentido de acompanhar o Des. Relator Deosdete Cruz Júnior. II. FUNDAMENTAÇÃO Consta dos autos que o Ministério Público do Estado de Mato Grosso ajuizou ação civil pública por ato de improbidade administrativa em face de João Batista Vaz da Silva, que na qualidade de Prefeito do Município de Nova Xavantina e em ano eleitoral (2016), propôs projeto de lei e sancionou a Lei do Município de Nova Xavantina n. 1.917/2016, que dispôs sobre concessão de benefícios fiscais relativos ao IPTU e ISS mediante “mutirão de conciliação”, atribuindo-lhe a conduta ímproba tipificada no artigo 10, VII, da Lei n. 8.429/92 (conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais). O Juízo a quo julgou improcedentes os pedidos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa, sob o fundamento de que não restou comprovado o dolo do agente político e a efetiva perda patrimonial do ente público municipal (Sentença, Id. 217553233). De fato, analisando detidamente os autos e conforme consta do voto divergente, a concessão de benefício fiscal, especificamente, pela Lei do Município de Nova Xavantina n. 1.917/2016 que concedeu desconto sobre juros e multas de tributos pagos em atraso, não foi acompanhada da demonstração cabal do prejuízo econômico ao erário e do dolo por parte do agente político. A mera concessão de descontos não implica, por si só, em diminuição patrimonial, sobretudo quando não se demonstra a existência de qualquer desvio, fraudes, ou desobediência aos preceitos legais que regulam tais benefícios. Ademais, o artigo 73, §10, da Lei n. 9.504/97, que regula as eleições, veda expressamente a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios no ano eleitoral, buscando evitar o uso da máquina pública para fins eleitorais. Contudo, essa vedação não se estende à concessão regular de benefícios fiscais que estejam amparados em lei, observadas as formalidades e critérios legais, especialmente quando não houver indícios de que tais atos tenham sido utilizados para angariar vantagem política. No presente caso, a alegação de obtenção de vantagem política não se sustenta, pois conforme se extrai dos autos, o apelado era candidato único no pleito eleitoral, o que afasta qualquer suposição de benefício eleitoral decorrente da medida. A ausência de competição eleitoral elimina o cenário de captação indevida de votos por meio da concessão do benefício fiscal. A interpretação da norma deve respeitar o princípio da legalidade e da segurança jurídica, evitando que simples concessões fiscais, realizadas dentro dos limites legais e sem prejuízo comprovado, sejam tratadas como ilícitos administrativos. No ponto, nos termos do artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa, exige-se comprovação efetiva de prejuízo ao erário, além de conduta dolosa, conforme § 2º do art. 1º da mesma norma. No caso dos autos, não se logrou êxito em demonstrar a existência de lesão patrimonial concreta ao Município de Nova Xavantina, tampouco não restou evidenciado o propósito eleitoral vedado pela legislação. A jurisprudência consolidada, em consonância com a doutrina majoritária, estabelece que a responsabilização por ato de improbidade administrativa tipificado no artigo 10 exige a demonstração inequívoca de dano efetivo ao erário, o que não pode ser presumido, tampouco inferido exclusivamente com base em irregularidades formais ou meras ilegalidades administrativas. Nesse sentido: [...] Razão de decidir: O acervo probatório não demonstra, de forma inequívoca, a prática de ato doloso pelos réus, tampouco a ocorrência de dano aoerário. A ausência de comprovação do elemento subjetivo do dolo e a inexistência de prejuízo efetivo ao patrimônio público impedem a imposição de sanção porimprobidadeadministrativa. Tese: Para a configuração deimprobidadeadministrativa é imprescindível a demonstração do dolo e do efetivo dano aoerário, não sendo suficientes meras irregularidades formais em processos licitatórios para a imposição de penalidades. [...]. (TJ/MT, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, apelação n. 1001923-23.2021.8.11.0003, relator Desembargador José Luiz Leite Lindote, julgamento em 16/4/2025). Portanto, ausente comprovação da materialidade do dano, bem como da intenção deliberada de violar o ordenamento jurídico por parte do apelado, a improcedência da ação civil pública por ato de improbidade administrativa se impõe. Assim sendo, com a devida vênia ao Ilustre Relator, acolho a divergência instaurada pelo 1º Vogal para negar provimento ao recurso, com a manutenção da sentença que julgou improcedente a ação civil pública por ato de improbidade administrativa. III. DISPOSITIVO Ante o exposto, acompanho a divergência inaugurada pelo eminente Des. Mário Roberto Kono de Oliveira (1º Vogal) para negar provimento ao recurso, com a manutenção da sentença que julgou improcedente a ação civil pública por ato de improbidade administrativa. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. DES. JONES GATTAS DIAS (4º VOGAL – CONVOCADO): Eminentes pares, Extrai-se dos autos que o apelado foi autor do projeto de Lei que imputou a concessão dos benefícios fiscais. O artigo 73, §10, da Lei n. 9.504/97, que regula as eleições diz textualmente: Conduta expressamente proibida No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública. De forma que entendo que está claramente caracterizada a ilicitude, a questão está no dolo. A lei nova que trouxe alteração na Lei de Improbidade Administrativa veio corrigir as imperfeições com as quais convivíamos, a exemplo do que muito se fala na doutrina de administração do medo. Podíamos visualizar nas administrações municipais, o prefeito que é o ordenador de despesas tem um cuidado muito grande. Existia o receio de tomar decisões e depois responder por improbidade administrativa, por conta de culpa que existia na legislação anterior e do dolo genérico que predominava. Penso que com a nova legislação pune-se o agente que age deliberadamente, ou seja, que age com má-fé e visualizo no presente caso. Não se está aqui diante de conduta culposa ou de um dolo genérico, marcado pela inabilidade ou distanciamento do ato concreto que pudesse justificar eventual desinformação ou incompreensão de consequências da conduta. Importante, repetir que o apelado foi o autor do projeto de lei do qual se trata a alegação de improbidade. Entendo que o recorrido agiu deliberadamente, com má fé e o dano ao erário está demonstrado através da renúncia as multas e juros do IPTU e ISS Acompanho o voto do Relator por compreender que estamos diante de um quadro típico, a meu ver, de conduta com dolo específico. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 20/05/2025
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