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Pedro De Sa Coutinho x Capemisa Seguradora De Vida E Previdencia S/A

ID: 299454450

Tribunal: TJMT Órgão: 6ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1006992-19.2021.8.11.0041

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

PEDRO DE SA COUTINHO

Polo Passivo:

CAPEMISA SEGURADORA DE VIDA E PREVIDENCIA S/A

Sentença

Advogados:

JACÓ CARLOS SILVA COELHO

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BRUNO COSTA ALVARES SILVA

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FERNANDA VAUCHER DE OLIVEIRA KLEIM

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 6ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Gabinete: e-mail - cba.gab6varacivel@tjmt.jus.br - telefone/whatsapp - (65) 3648-6334 Secretaria: e-mail - cba.6civel@tjmt.jus.br - tele… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 6ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Gabinete: e-mail - cba.gab6varacivel@tjmt.jus.br - telefone/whatsapp - (65) 3648-6334 Secretaria: e-mail - cba.6civel@tjmt.jus.br - telefone - (65) 3648-6327 Processo nº 1006992-19.2021.8.11.0041 Vistos, em correição. Pedro de Sá Coutinho ajuizou ação de rescisão contratual cumulada com pedido de danos materiais e morais, com requerimento de tutela de urgência, em face de Capemisa Seguradora de Vida e Previdência S/A, aduzindo, em síntese, que, após mais de quatro décadas de contribuições mensais regulares a plano de previdência privada contratado originalmente em 1976, foi surpreendido com a informação de que sua contratação teria sido convertida, por meio de novações contratuais unilaterais e não transparentes, em seguro de vida ou pensão por morte. Sustentou que tais alterações implicaram renúncia a direitos inicialmente pactuados, como o recebimento de pensão em vida ou resgate em parcela única, sem restituição das quantias pagas em regime de capitalização. Requereu liminarmente a suspensão das cobranças mensais sem perda da condição de segurado, a resolução do contrato com apuração e restituição dos valores investidos corrigidos, indenização por danos materiais e morais no valor de R$ 50.000,00, produção de prova pericial, inversão do ônus da prova e concessão da justiça gratuita. O pedido de tutela de urgência foi indeferido na decisão de ID 50654853, sendo deferido o benefício da justiça gratuita. Foi designada audiência de conciliação nos termos do art. 334 do CPC, a qual restou infrutífera. A requerida Capemisa Seguradora de Vida e Previdência S/A apresentou contestação arguindo preliminarmente a ocorrência de decadência do direito à revisão do contrato e prescrição quanto ao pedido de restituição de valores. No mérito, defendeu que o autor aderiu voluntariamente às alterações contratuais ao longo dos anos, tendo assinado documentos como "atualização de benefícios e contribuições", "saldamento de plano de pecúlio ou pensão" e "aditivo contratual". Afirmou que os valores pagos se referem a plano de pecúlio com cobertura exclusivamente por morte e que o autor foi devidamente informado das condições contratuais. Requereu a improcedência dos pedidos. Em réplica, o autor impugnou os argumentos da contestação, reafirmando que jamais foi informado de forma clara e precisa acerca das alterações contratuais promovidas unilateralmente pela requerida. Sustentou que os documentos assinados referem-se a adesões genéricas e não explicitaram a renúncia a direitos originalmente pactuados. Rechaçou as preliminares de decadência e prescrição, argumentando que a ciência da lesão ocorreu somente quando solicitou informações ao INSS e à própria seguradora. As partes foram intimadas para manifestação sobre provas que pretendiam produzir, tendo o autor indicado quesitos para perícia atuarial e a requerida reiterado a necessidade de prova técnica. Os autos vieram conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. Do julgamento antecipado da lide O feito comporta julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, uma vez que a matéria é unicamente de direito e os elementos probatórios carreados aos autos são suficientes para o julgamento da causa. A prova documental acostada aos autos é robusta e demonstra de forma inequívoca os fatos alegados na inicial. Os documentos apresentados pela própria requerida comprovam as sucessivas alterações contratuais realizadas ao longo dos anos que evidencia a conversão do plano original de previdência em plano de pecúlio exclusivamente por morte. Quanto ao requerimento de produção de prova pericial atuarial, entendo que se mostra prescindível à solução da controvérsia nesta fase, visto que os documentos já encartados aos autos são suficientes para firmar o convencimento do juízo. Eventual apuração de valores será realizada em liquidação de sentença, quando, se necessário, poderá ser designada perícia contábil. Da decadência e prescrição Quanto à alegada decadência e prescrição, observo que a controvérsia envolve relação de consumo sujeita às disposições do Código de Defesa do Consumidor. O prazo decadencial previsto no art. 26 do CDC aplica-se aos vícios aparentes ou de fácil constatação. No caso em análise, as alterações contratuais e suas consequências não se caracterizam como vícios aparentes, mas sim como questões que demandam análise técnica especializada para sua identificação. Com efeito, aplica-se ao caso o prazo decenal que se inicia com a ciência inequívoca do segurado/beneficiário da negativa da seguradora em efetuar o pagamento, nos termos do artigo 205, do Código Civil. Assim, conforme alegado pelo autor e não refutado adequadamente pela requerida, a ciência inequívoca dos prejuízos decorrentes das alterações contratuais ocorreu no momento em que teve acesso aos seus contracheques de janeiro de 2020, emitidos em fevereiro daquele ano, os quais indicavam descontos vinculados à CAPEMISA, incompatíveis com as garantias do plano original de previdência contratado. A partir desse momento, ficou evidente ao autor que havia sido migrado de contrato de forma lesiva, sem informação clara e adequada, de modo que somente então teve condições de identificar o prejuízo suportado e o vínculo contratual vigente. Portanto, a presente demanda, ajuizada em 2021, está dentro do prazo decenal previsto no artigo 205 do Código Civil, não havendo falar em decadência ou prescrição. Assim, rejeito a preliminar arguida. Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Trata-se o caso em tela de relação de consumo, sendo assim, aplicável a inversão do ônus da prova, conforme os artigos 2º, 3º § 1º, § 2º e 6º, VIII, ambos do Código de Defesa do Consumidor, dispõe que: Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final ". Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista". Art. 6º São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência; A propósito, os tribunais já manifestaram entendimento quanto a aplicação da lei consumerista ao caso, senão observe: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATAL C/C DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS E DANOS MORAIS. PREVIDÊNCIA PRIVADA. CONTRATO DE PECÚLIO . VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA REFORMADA . 1. (...) (TJ-GO - Apelação Cível: 02545469420178090132 POSSE, Relator.: Des(a) . DESEMBARGADOR GUILHERME GUTEMBERG ISAC PINTO, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ) Nesse sentido, aplica-se ao caso, o Código de Defesa do Consumidor. Do mérito A controvérsia central dos autos refere-se à validade das alterações contratuais promovidas pela requerida ao longo da execução do contrato de previdência privada firmado em 1976, bem como aos direitos do autor decorrentes de tais modificações. Em razão da submissão às disposições do Código de Defesa do Consumidor, se aplica ao caso o princípio da transparência, insculpido no art. 4º, caput, do CDC, que impõe ao fornecedor o dever de prestar informações claras, precisas e ostensivas sobre os produtos e serviços oferecidos, especialmente quando se tratar de contratos de longa duração como o dos autos. O art. 6º, III, do CDC assegura ao consumidor o direito à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem. No caso concreto, a análise dos documentos carreados aos autos revela que as sucessivas alterações contratuais promovidas pela requerida ao longo dos mais de quatro décadas de vigência do contrato não observaram o princípio da transparência exigido pela legislação consumerista. Os documentos denominados "atualização de benefícios e contribuições", "saldamento de plano de pecúlio ou pensão" e "aditivo contratual", embora subscritos pelo autor, não demonstram a prestação de informação adequada sobre as consequências das alterações implementadas, especialmente no que tange à modificação da natureza do produto contratado. A conversão unilateral de plano de previdência privada com possibilidade de resgate e renda mensal em seguro de vida exclusivamente por morte representa alteração substancial das condições originalmente pactuadas, implicando renúncia a direitos fundamentais do contrato original. O art. 51, IV, do CDC considera abusivas as cláusulas que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade. A alteração promovida pela requerida caracteriza-se como abusiva por colocar o consumidor em manifesta desvantagem, suprimindo direitos essenciais do contrato original sem contrapartida adequada ou informação clara sobre as consequências de tal modificação, já tendo os tribunais manifestados em situações similares: APELAÇÃO – Previdência Privada - Ação de Restituição de Contribuições Pagas c/c Pedido de Indenização Por Danos Morais – Alega a autora que adquiriu um plano de pecúlio e pensão, aderidos em 1980, junto a requerida "Capemisa", sendo que houve migração, em 1992, para o denominado "Plano Pecúlio I", com renúncia de direitos, todavia, informa que foi induzida ao erro, por falta de informações claras e objetivas - Sentença de parcial procedência - Apelação da seguradora requerida, arguição preliminar de cerceamento de defesa e de que ocorreu a decadência e prescrição, no mérito, insiste na improcedência da demanda – Exame: Preliminar de cerceamento de defesa afastada - O Juiz é o destinatário principal e direto da prova, competindo-lhe aferir a necessidade da dilação probatória, para formação da sua convicção, conforme os artigos 370 e 371, ambos do Código de Processo Civil – Prescrição e decadência afastadas, o prazo prescricional só se inicia com a ciência do segurado/beneficiário da negativa da seguradora em efetuar o pagamento, prazo prescricional decenal, inteligência do artigo 205, do Código Civil - Bem caracterizado a relação de consumo entre as partes, por isso aplicável o Código de Defesa do Consumidor - Inteligência dos artigos 2º, 3º § 1º, § 2º e 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor e da súmula 563 do C. STJ - Seguradora que não se desincumbiu do ônus que lhe competia de provar nos autos fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito autoral – Ex vi do artigo 373, II, do Código de Processo Civil – Ausência do dever de transparência e de informações claras e objetivas ao consumidor - Decisão bem fundamentada e dentro da legislação processual – Precedentes desta C. 27ª Câmara de Direito Privado - Sentença mantida - RECURSO IMPROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 1001293-38 .2020.8.26.0470 Porangaba, Relator.: Luis Roberto Reuter Torro, Data de Julgamento: 18/12/2023, 27ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/12/2023) O princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil e aplicável às relações de consumo, impõe às partes o dever de agir com lealdade, transparência e colaboração, vedando comportamentos que frustrem as legítimas expectativas da parte contrária. Os documentos emitidos pela Capemisa Seguradora de Vida e Previdência S/A, no ano de 2016, revela alterações substanciais na relação contratual originalmente firmada por Pedro de Sá Coutinho com a antiga CAPEMI, da qual era participante desde 1976. Inicialmente, o contrato previa benefícios de caráter previdenciário, com regime de capitalização, contemplando pecúlio, pensão por morte, pensão por invalidez e possibilidade de aposentadoria proporcional ou integral. Contudo, em 1989 e 1990, foram realizados ajustes contratuais que resultaram na migração para o Plano Pecúlio I, estruturado sob regime de repartição simples, que exclui a capitalização e limita a cobertura ao risco de morte. Essa mudança, formalizada por meio de saldamento, extinguiu os benefícios previdenciários anteriores, restringindo o contrato a um pecúlio saldado, vitalício e corrigido apenas monetariamente, sem direito de resgate em vida ou restituição das contribuições. Além disso, os reajustes passaram a ocorrer de forma quinquenal por faixa etária, sem correspondente aumento no valor do benefício. A seguradora sustenta que a migração foi autorizada pela SUSEP e aceita voluntariamente pelo autor, mediante assinatura de documentos. No entanto, do ponto de vista do autor, a modificação foi imposta sem informação clara e transparente, acarretando significativa perda patrimonial e frustrando legítimas expectativas de aposentadoria após mais de 40 anos de contribuição. Trata-se, portanto, de alteração unilateral que reduziu expressivamente os direitos contratados, comprometendo a função previdenciária do vínculo original e desvirtuando a finalidade essencial do contrato. Diante desse cenário, e à luz dos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da proteção ao consumidor, mostra-se legítima a pretensão deduzida na inicial. Neste viés, considerando o acolhimento do pedido rescisão contratual, fica prejudicado o exame do pedido de suspensão das cobranças mensais com manutenção da condição de segurado, uma vez que a relação contratual será extinta. Do dano material Consta dos autos que o contrato original previa benefício de pecúlio e pensão com opção de saque em vida após 25 anos de contribuição ou, proporcionalmente, a partir de 10 anos. A alteração para seguro exclusivamente por morte suprimiu essa possibilidade, violando o dever de informação e o direito à manutenção do equilíbrio contratual e impendido que o autor reaviesse o valor investido. Ficou incontroverso que o autor contribuiu regularmente ao longo de mais de 40 anos. A cláusula contratual inicial previa direito ao pecúlio em vida, proporcional ao tempo de contribuição, hipótese que não se consumou em razão das alterações contratuais impostas unilateralmente. Diante disso, o autor faz jus ao resgate dos valores pagos ao plano, desde a data da primeira alteração contratual efetiva e abusiva (02/10/1989), considerando-se o valor total das contribuições vertidas até a data da ciência do prejuízo (fevereiro de 2020), com abatimento de eventual prêmio de risco efetivamente utilizado. Desta feita, a restituição deverá observar o montante efetivamente pago durante o vínculo contratual, devendo ser apurado em fase de liquidação, respeitados os critérios aqui fixados. A apuração do valor devido, por sua complexidade, deverá ser feita em fase de liquidação por arbitramento, mediante apresentação de demonstrativos pela requerida. Do dano moral No presente caso, está evidente que as alterações contratuais promovidas pela requerida, além de terem sido implementadas sem transparência e com violação às legítimas expectativas do autor, culminaram em evidente onerosidade excessiva em momento de especial vulnerabilidade. Com mais de 40 anos de vínculo contratual e já em idade avançada, o autor passou a sofrer reajustes periódicos em suas contribuições sem que houvesse qualquer contraprestação proporcional nos benefícios, agravando ainda mais sua condição financeira e comprometendo a finalidade de segurança que motivou sua adesão ao contrato. A cobrança dos valores majorados, com base exclusivamente na faixa etária, sem respaldo em critérios atuariais transparentes e sem justa causa, revela prática abusiva, sobretudo quando o segurado conta com mais de 60 anos de idade e mais de uma década de vinculação contratual. Tal conduta configura violação ao princípio da boa-fé objetiva e afronta à dignidade do consumidor idoso. Nesse sentido, tem-se que: “Nos contratos de seguro de vida, a cláusula contratual que estipula a majoração do prêmio segundo a faixa etária do consumidor somente é abusiva quando o segurado completar 60 (sessenta) anos de idade e tiver mais de 10 (dez) anos de vínculo contratual, contados da vigência da Lei nº 9.656/1998, se a pactuação lhe for anterior, por aplicação analógica do art. 15, parágrafo único, da Lei de Planos de Saúde [...] Se a consumidora viu seus proventos de aposentadoria minguarem, diante dos aumentos das contribuições, especialmente quando mais necessitava de seus proventos, diante da idade avançada, deve ser ressarcida pelos danos morais causados pela cobrança indevida de valores.” (TJMT, Apelação Cível n. 1042868-06.2019.8.11.0041, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 20/03/2024, DJe 25/03/2024). O caso dos autos guarda perfeita similitude com o precedente citado, de modo que é cabível o reconhecimento do dano moral, diante da conduta ilícita da requerida e do abalo sofrido pelo autor, que viu seus rendimentos serem comprometidos por cobranças indevidas em fase avançada da vida, justamente quando mais dependia da segurança econômica que esperava do vínculo contratual mantido por décadas. Dessa forma, mostra-se legítimo o pedido de reparação por danos morais, os quais devem ser fixados de modo a atender aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando-se o tempo de vínculo, a idade do autor, a extensão do dano, o caráter punitivo e pedagógico da medida, e o porte econômico da requerida. O dano moral não se confunde com mero aborrecimento. No presente caso, a conduta da seguradora extrapolou o limite do contratualmente aceitável, pois a seguradora assumiu o risco da atividade e tinha o dever de efetuar a indenização de maneira célere, evitando o agravamento da situação do segurado. A frustração prolongada do pagamento da indenização securitária gerou sofrimento, angústia e incerteza, que ultrapassam os limites do mero dissabor cotidiano. Dessa forma, é cabível a condenação da seguradora ao pagamento de indenização por danos morais, tendo em vista a clara falha na prestação do serviço, nos termos do art. 186 e 927 do Código Civil, bem como do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. Todavia, considerando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como as circunstâncias do caso concreto, arbitro a indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor suficiente para compensar os transtornos vivenciados pelo autor sem representar enriquecimento sem causa. Do dispositivo Ante o exposto, julgo parcialmente procedente os pedidos formulados por Pedro de Sá Coutinho em face de Capemisa Seguradora de Vida e Previdência S/A, para: a) declarar a nulidade das alterações contratuais promovidas pela requerida sem observância do dever de informação e transparência; b) condenar a requerida à restituição dos valores pagos pelo autor desde 02/10/1989 até fevereiro de 2020, corrigidos monetariamente pelo INPC a partir de cada desembolso e acrescidos de juros legais desde a citação, abatido o prêmio de risco eventualmente devido, conforme apuração a ser realizada em liquidação de sentença por arbitramento; c) Condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigido monetariamente pelo IPCA desde a presente sentença e acrescido de juros de mora com base na taxa SELIC desde a citação; d) Condenar a requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil, em razão da parcial sucumbência. Por conseguinte, resolvo o mérito, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil. Transitada em julgado, dê-se baixa e arquivem-se os autos. P. I. Cumpra-se. Luís Otávio Pereira Marques Juiz de Direito

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Processo nº 1001293-33.2024.8.11.0044

ID: 315530281

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001293-33.2024.8.11.0044

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

SEVERINA MARIA DA CONCEICAO GALDINNO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOAO BATISTA ANTONIOLO

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ELIANA NUCCI ENSIDES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001293-33.2024.8.11.0044 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer /… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001293-33.2024.8.11.0044 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer / Não Fazer] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [SEVERINA MARIA DA CONCEICAO GALDINNO - CPF: 727.291.801-25 (APELANTE), JOAO BATISTA ANTONIOLO - CPF: 283.886.378-94 (ADVOGADO), ELIANA NUCCI ENSIDES - CPF: 336.013.748-54 (ADVOGADO), ASSOCIACAO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL - CNPJ: 07.508.538/0001-50 (APELADO), PEDRO OLIVEIRA DE QUEIROZ - CPF: 063.333.123-63 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO DE DESCONTO INDEVIDO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ASSOCIAÇÃO PRESTADORA DE SERVIÇOS. COBRANÇAS NÃO AUTORIZADAS EM BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que, em Ação de Restituição em Dobro de Desconto Indevido Acumulada com Indenização com Danos Morais movida por aposentada contra entidade associativa, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para declarar inexistente a relação contratual e determinar a restituição simples dos valores debitados, rejeitando os pleitos de restituição em dobro e de indenização por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em verificar se: (i) a restituição dos valores indevidamente descontados deve ser feita em dobro; e (ii) o desconto indevido sobre verba de natureza alimentar, sem respaldo contratual, enseja reparação por dano moral. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A ausência de prova da contratação em relação de consumo impõe o reconhecimento da ilegalidade do desconto, o que autoriza a restituição em dobro, ante a falha na prestação do serviço e a ausência de engano justificável. 4. O desconto de valores em benefício previdenciário sem respaldo contratual viola o direito de autodeterminação financeira e configura dano moral presumido, especialmente diante da condição de hipervulnerabilidade da autora, pessoa idosa e de baixa renda. IV. DISPOSITIVO E TESE 5. Recurso conhecido e provido, para determinar que a restituição dos valores indevidamente descontados dos benefícios da autora seja realizada em dobro, bem como para condenar a apelada ao pagamento de indenização por danos morais, arbitrados em R$ 3.000,00 (três mil reais). Teses de julgamento: “1. Nas relações de consumo, a ausência de contrato válido que autorize débitos em benefício previdenciário enseja a repetição em dobro dos valores indevidamente descontados. 2. A realização de descontos indevidos em benefício previdenciário de pessoa idosa sem respaldo contratual enseja reparação por dano moral in re ipsa.” Dispositivos relevantes citados: CR, art. 1º, III; CDC, arts. 14 e 42; CC, arts. 389, parágrafo único, e 406; Lei n. 14.905/2024. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, Súmulas n. 43, n. 54 e n. 362; TJMT, N.U 1000991-27.2021.8.11.0038, N.U 1010352-12.2024.8.11.0055, N.U 1015326-37.2024.8.11.0041, e N.U 1000819-41.2024.8.11.0051. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por SEVERINA MARIA DA CONCEIÇÃO GALDINNO contra sentença proferida pelo Juiz de Direito Substituto Leonardo Lucio Santos, em atuação na 2ª Vara da Comarca de Paranatinga, que nos autos da Ação de Restituição em Dobro de Desconto Indevido Acumulada com Indenização com Danos Morais e Tutela de Urgência movida em desfavor de ASSOCIAÇÃO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL - AAPEN, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: (i) declarar inexistente a relação contratual entre as litigantes, determinando que a entidade ré proceda ao cancelamento de eventual filiação da autora, bem como se abstenha de efetuar novos descontos em seus benefícios previdenciários; (ii) condenar a demandada à restituição simples das quantias debitadas, ante a inexistência de comprovação de má-fé, com acréscimo de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação e correção monetária pelo INPC desde a data do evento danoso (desconto indevido); (iii) julgar improcedente o pedido de danos morais; e (iv) estabelecer que ambas as partes arquem, pro rata, com as custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observada a assistência judiciária deferida à requerente (id. 292482369). Nas razões recursais, a apelante sustenta ser devida a indenização por danos morais e a restituição em dobro do montante irregularmente debitado de seus benefícios. Quanto aos danos morais, argumenta que a apelada efetuou descontos indevidos em seus proventos, sem qualquer contratação que justificasse a cobrança ou seu consentimento, causando-lhe transtornos mensalmente. Enfatiza ser pessoa aposentada e hipossuficiente, alegando que as parcelas debitadas causaram prejuízo à sua subsistência e à de seus familiares, o que lhe gerou situação constrangedora e angustiante, com abalo moral. Defende que a má prestação de serviço da recorrida e as práticas abusivas que envolvem a relação violou seu direito, gerando angústia, estresse e humilhação. Assevera que o dano moral se configura in re ipsa e sugere indenização equivalente a R$ 15.000,00 (quinze mil reais). No tocante à restituição em dobro, aduz que as cobranças indevidas ensejam a repetição dobrada do indébito, nos termos dos arts. 42, parágrafo único, do CDC c/c 940 do CC. Com essas considerações, requer a reforma da sentença para condenar a recorrida ao pagamento de indenização por danos morais e à restituição em dobro. Embora intimada, a apelada não apresentou contrarrazões (id. 292482372). É o relatório. Inclua-se na pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade recursal, conheço da apelação interposta. Extrai-se dos autos que SEVERINA MARIA DA CONCEIÇÃO GALDINNO ajuizou Ação de Restituição em Dobro de Desconto Indevido Acumulada com Indenização com Danos Morais e Tutela de Urgência em face da ASSOCIAÇÃO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL - AAPEN, pretendendo, liminarmente, que a instituição requerida se abstivesse de realizar lançamentos de débitos nos benefícios previdenciários da autora, cancelando-os e vedando a inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes até a solução final da demanda, sob pena de multa diária a ser fixada pelo juízo. No mérito, postulou a condenação da ré ao pagamento de indenização a título de danos morais, na importância sugerida de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), além dos ônus sucumbenciais e da declaração de inexigibilidade das cobranças tidas como indevidas, com restituição em dobro, na quantia de R$ 564,80 (quinhentos e sessenta e quatro reais e oitenta centavos), acrescida de juros e correção monetária (id. 292482032). O pleito de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido (id. 292482042). Após a instrução processual, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, nos seguintes termos: Na sequência, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação, nos seguintes termos: “(...) DA RELAÇÃO DE CONSUMO E DO CDC A alegação da parte requerida no sentido de que não seria aplicável a legislação consumerista, por tratar-se de entidade associativa, não merece prosperar. A jurisprudência é pacífica ao reconhecer que a ausência de fins lucrativos não impede o reconhecimento da ré como fornecedora, quando há prestação de serviço mediante pagamento, ainda que travestido de contribuição ou mensalidade associativa. A jurisprudência do TJMT confirma esse enquadramento: (...) Por essa razão, impõe-se a inteira aplicação das normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, que positiva um núcleo de regras e princípios protetores dos direitos dos consumidores, enquanto tais. O ônus da prova acerca da existência de débito é de responsabilidade do fornecedor, a teor do disposto no art. 14, § 3º, I e II, do CDC, in verbis: (...) Por sua vez, o artigo 373 do CPC prevê a distribuição da carga de responsabilidade sobre as provas a serem produzidas no processo pelas partes, e o inciso II desse dispositivo legal determina ser do réu a incumbência de demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. A ré não apresentou qualquer contrato firmado com a parte autora. Na ausência de prova da contratação, presume-se a ilegalidade dos descontos realizados. E, sendo indevida a cobrança, por certo que os valores já descontados indevidamente devem ser restituídos à parte autora, nos termos do artigo 876 do CC. Quanto a repetição do indébito, tanto a jurisprudência do STJ, como da Terceira Câmara De Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, é firme no sentido de que a devolução em dobro, prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, pressupõe, além da existência de pagamento indevido, a demonstração da má-fé do credor, o que não ficou evidenciado no caso em tela, o que atrai a restituição simples. DOS DANOS MORAIS Já, em relação ao dano moral, é cediço que este ao prejuízo decorrente da dor imputada a uma pessoa, em razão de atos que, indevidamente, ofendem seus sentimentos de honra e dignidade, que provocam mágoa e atribulações na esfera interna pertinente à sensibilidade moral. Ou seja, o dano moral indenizável deve corresponder à violação dos direitos referentes à dignidade humana, cuja doutrina especializada e a jurisprudência dominante vêm entendendo que a consequência do dano se encontra ínsita na própria ofensa, porquanto deflui da ordem natural das coisas, tomando-se como parâmetro a vida comum das pessoas ou empresa. Entretanto, apesar do possível transtorno suportado pela consumidora com a cobrança de valores tidos por ilegais, a jurisprudência tem se firmado no sentido de que suposto ilícito contratual, isoladamente considerado, não é capaz de ensejar danos morais indenizáveis. Neste sentido é o posicionamento da Terceira Câmara de Direito Privado do Eg. TJMT, in verbis: (...) Conquanto os fatos relatados na inicial possam ter causado aborrecimentos à parte autora, não há falar em ocorrência de dano moral, configurando tão-somente incômodo inerente à vida em sociedade, notadamente se não ocorreu fato capaz de gerar constrangimento. DISPOSITIVO Diante do exposto e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, que faço para: 1. DECLARAR inexistente a relação contratual entre a parte autora e a parte requerida; devendo a requerida proceder com o cancelamento de eventual filiação da parte autora junto à ré, bem como se abster de efetuar novos descontos; 2. CONDENAR a REQUERIDA à restituição simples, ante a inexistência de comprovação de má-fé devendo a quantia ser acrescida de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária segundo INPC a partir da data do evento danoso (desconto indevido). 3. JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de danos morais. 4. CONDENAR as partes no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º do CPC, a ser pago pro rata, observada a assistência judiciária concedida a autora. (...)”. (id. 292482366). Irresignada, a apelante interpôs o presente recurso, objetivando a reforma da sentença para que a entidade associativa seja condenada ao pagamento de indenização por danos morais e à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados de seus benefícios. Pois bem. Após detida análise, vislumbra-se que o apelo comporta provimento. De proêmio, cumpre destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, devendo ser aplicadas ao caso as disposições do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentir, quanto à repetição do indébito, importa dizer que o parágrafo único do art. 42 do CDC prevê que o consumidor cobrado em quantia indevida faz jus à restituição em dobro do que pagou em excesso. A propósito, “comprovada a cobrança indevida, a restituição dobrada tem cabimento por força do parágrafo único do art. 42 do CDC, porquanto houve falha na prestação do serviço, sendo patente inocorrência de engano justificável” (TJMT, N.U 1000991-27.2021.8.11.0038, Nilza Maria Possas de Carvalho, Primeira Câmara de Direito Privado, julgado em 14/03/2023, publicado no DJE 20/03/2023). Frise-se que me alinho ao entendimento de que a expressão “salvo hipótese de engano justificável” constante no art. 42, parágrafo único, do CDC, deve ser compreendida como elemento de causalidade, e não de culpabilidade, ao passo que o ônus probatório para excludente da repetição dobrada é do fornecedor e, não o fazendo, como no vertente, impõe-se a repetição do indébito em dobro. Assim, dada a cobrança indevida de valores nos benefícios da autora, em virtude da inexistência de prova quanto à contratação, e considerando que o recorrido se beneficiou de tais importâncias sem respaldo contratual ou autorização válida, o ressarcimento em dobro é medida que se impõe. Em relação aos danos morais, igualmente, o recurso merece ser acolhido. No caso, o dever de indenizar decorre da própria conduta ilícita da empresa recorrida, que efetuou descontos indevidos nos benefícios previdenciários da autora sem qualquer respaldo contratual, situação que ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano e configura dano moral in re ipsa, prescindindo de comprovação específica do prejuízo, especialmente considerando tratar-se a apelada de pessoa idosa e aposentada. O dever de reparar da apelada decorre da falha na prestação do serviço, nos moldes do art. 14 do CDC, que estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor, independentemente da existência de culpa. Comprovado o desconto indevido sem respaldo contratual, impõe-se a obrigação de indenizar, bastando a demonstração do nexo entre a conduta e o prejuízo experimentado pela consumidora. Da mesma forma, a atuação da ré violou frontalmente o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III, da Constituição da República, na medida em que subtraiu, de forma injustificada, parcela de verba essencial à subsistência da autora. A afronta à autodeterminação financeira do aposentado, sobretudo quando desprovido de meios alternativos de renda, extrapola os limites da legalidade e da razoabilidade. Por certo, o direito à indenização por dano moral exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade ou a dignidade da pessoa humana, abrangendo interesses que, embora desprovidos de conteúdo patrimonial, são dotados de extrema relevância na ordem jurídica pátria, tal como se verifica na hipótese, uma vez que os débitos afetaram diretamente a disponibilidade financeira da consumidora, violando o direito de autodeterminação sobre seus próprios recursos. A propósito: “(...) 5. O dano moral decorrente de descontos indevidos em benefício previdenciário é presumido, não se tratando de mero aborrecimento. (...)”. (TJMT, N.U 1010352-12.2024.8.11.0055, Sebastião de Arruda Almeida, Quinta Câmara de Direito Privado, julgado em 26/06/2025, publicado no DJE 26/06/2025). “(...) Configura dano moral a realização de descontos indevidos sobre verba de natureza alimentar, independentemente de comprovação do prejuízo concreto. (...)”. (TJMT, N.U 1015326-37.2024.8.11.0041, Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, julgado em 24/06/2025, publicado no DJE 24/06/2025). “(...) 4. Os descontos indevidos sobre benefício previdenciário de natureza alimentar, sem a existência de vínculo jurídico regular entre as partes, caracterizam apropriação indevida de verba essencial à subsistência da autora, configurando ilícito civil indenizável, caracterizando dano moral in re ipsa. (...)”. (TJMT, N.U 1000819-41.2024.8.11.0051, Anglizey Solivan de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Privado, julgado em 19/06/2025, publicado no DJE 19/06/2025). Logo, a realização de descontos indevidos em benefício previdenciário, sem prévia autorização da consumidora, viola a sua esfera patrimonial e causa transtornos que extrapolam o mero dissabor, afetando sua tranquilidade e paz de espírito, sendo necessário reconhecer o dano moral advindo da conduta ilícita. Ressalte-se que a condição de hipervulnerabilidade da autora - pessoa idosa, de baixa renda e cuja subsistência provém exclusivamente de benefícios previdenciários - confere especial gravidade à conduta ilícita da ré. Em tais circunstâncias, os efeitos deletérios do desconto indevido não se limitam ao aspecto financeiro, mas atingem a segurança existencial e a dignidade da parte, valores estes constitucionalmente protegidos. No que se refere ao quantum indenizatório, releva mencionar que seu arbitramento exige uma análise criteriosa das circunstâncias do caso concreto, considerando a extensão dos danos, sua repercussão social e o comportamento das partes envolvidas, além de levar em conta o perfil social e financeiro da pessoa lesada (idosa e aposentada) e do ofensor, sendo suficiente para desestimular novas infrações, sem, contudo, gerar enriquecimento indevido. Desse modo, tendo em vista os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, bem como a natureza pedagógica da medida, fixo o importe de R$ 3.000,00 (três mil reais), valor que atende às peculiaridades do caso concreto, além do caráter disciplinar e ressarcitório da condenação. Em face do exposto, conheço e DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por SEVERINA MARIA DA CONCEIÇÃO GALDINNO, para determinar que a restituição dos valores indevidamente descontados dos benefícios previdenciários da autora seja realizada em dobro, acrescidos de correção monetária pelo INPC e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir de cada desembolso (Súmulas n. 43 e 54 do STJ). Ainda, condeno a apelada ao pagamento da quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescidos de correção monetária pelo INPC a contar do arbitramento (Súmula n. 362 do STJ) e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir do evento danoso (Súmula n. 54 do STJ). Saliente-se que os cálculos devem observar a data em que a Lei n. 14.905/2024 passou a produzir efeitos, após o que a correção monetária e os juros de mora, tanto dos danos materiais quanto dos morais, deverão observar os índices dos arts. 389, parágrafo único, e 406, ambos do CC. Por corolário lógico, determino que a apelada arque com a totalidade dos ônus de sucumbência, mantendo o percentual fixado na origem. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 1001293-33.2024.8.11.0044

ID: 315530287

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001293-33.2024.8.11.0044

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ASSOCIACAO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL

Acórdão

Advogados:

PEDRO OLIVEIRA DE QUEIROZ

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001293-33.2024.8.11.0044 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer /… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001293-33.2024.8.11.0044 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer / Não Fazer] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [SEVERINA MARIA DA CONCEICAO GALDINNO - CPF: 727.291.801-25 (APELANTE), JOAO BATISTA ANTONIOLO - CPF: 283.886.378-94 (ADVOGADO), ELIANA NUCCI ENSIDES - CPF: 336.013.748-54 (ADVOGADO), ASSOCIACAO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL - CNPJ: 07.508.538/0001-50 (APELADO), PEDRO OLIVEIRA DE QUEIROZ - CPF: 063.333.123-63 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO DE DESCONTO INDEVIDO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ASSOCIAÇÃO PRESTADORA DE SERVIÇOS. COBRANÇAS NÃO AUTORIZADAS EM BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que, em Ação de Restituição em Dobro de Desconto Indevido Acumulada com Indenização com Danos Morais movida por aposentada contra entidade associativa, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para declarar inexistente a relação contratual e determinar a restituição simples dos valores debitados, rejeitando os pleitos de restituição em dobro e de indenização por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em verificar se: (i) a restituição dos valores indevidamente descontados deve ser feita em dobro; e (ii) o desconto indevido sobre verba de natureza alimentar, sem respaldo contratual, enseja reparação por dano moral. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A ausência de prova da contratação em relação de consumo impõe o reconhecimento da ilegalidade do desconto, o que autoriza a restituição em dobro, ante a falha na prestação do serviço e a ausência de engano justificável. 4. O desconto de valores em benefício previdenciário sem respaldo contratual viola o direito de autodeterminação financeira e configura dano moral presumido, especialmente diante da condição de hipervulnerabilidade da autora, pessoa idosa e de baixa renda. IV. DISPOSITIVO E TESE 5. Recurso conhecido e provido, para determinar que a restituição dos valores indevidamente descontados dos benefícios da autora seja realizada em dobro, bem como para condenar a apelada ao pagamento de indenização por danos morais, arbitrados em R$ 3.000,00 (três mil reais). Teses de julgamento: “1. Nas relações de consumo, a ausência de contrato válido que autorize débitos em benefício previdenciário enseja a repetição em dobro dos valores indevidamente descontados. 2. A realização de descontos indevidos em benefício previdenciário de pessoa idosa sem respaldo contratual enseja reparação por dano moral in re ipsa.” Dispositivos relevantes citados: CR, art. 1º, III; CDC, arts. 14 e 42; CC, arts. 389, parágrafo único, e 406; Lei n. 14.905/2024. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, Súmulas n. 43, n. 54 e n. 362; TJMT, N.U 1000991-27.2021.8.11.0038, N.U 1010352-12.2024.8.11.0055, N.U 1015326-37.2024.8.11.0041, e N.U 1000819-41.2024.8.11.0051. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por SEVERINA MARIA DA CONCEIÇÃO GALDINNO contra sentença proferida pelo Juiz de Direito Substituto Leonardo Lucio Santos, em atuação na 2ª Vara da Comarca de Paranatinga, que nos autos da Ação de Restituição em Dobro de Desconto Indevido Acumulada com Indenização com Danos Morais e Tutela de Urgência movida em desfavor de ASSOCIAÇÃO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL - AAPEN, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: (i) declarar inexistente a relação contratual entre as litigantes, determinando que a entidade ré proceda ao cancelamento de eventual filiação da autora, bem como se abstenha de efetuar novos descontos em seus benefícios previdenciários; (ii) condenar a demandada à restituição simples das quantias debitadas, ante a inexistência de comprovação de má-fé, com acréscimo de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação e correção monetária pelo INPC desde a data do evento danoso (desconto indevido); (iii) julgar improcedente o pedido de danos morais; e (iv) estabelecer que ambas as partes arquem, pro rata, com as custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observada a assistência judiciária deferida à requerente (id. 292482369). Nas razões recursais, a apelante sustenta ser devida a indenização por danos morais e a restituição em dobro do montante irregularmente debitado de seus benefícios. Quanto aos danos morais, argumenta que a apelada efetuou descontos indevidos em seus proventos, sem qualquer contratação que justificasse a cobrança ou seu consentimento, causando-lhe transtornos mensalmente. Enfatiza ser pessoa aposentada e hipossuficiente, alegando que as parcelas debitadas causaram prejuízo à sua subsistência e à de seus familiares, o que lhe gerou situação constrangedora e angustiante, com abalo moral. Defende que a má prestação de serviço da recorrida e as práticas abusivas que envolvem a relação violou seu direito, gerando angústia, estresse e humilhação. Assevera que o dano moral se configura in re ipsa e sugere indenização equivalente a R$ 15.000,00 (quinze mil reais). No tocante à restituição em dobro, aduz que as cobranças indevidas ensejam a repetição dobrada do indébito, nos termos dos arts. 42, parágrafo único, do CDC c/c 940 do CC. Com essas considerações, requer a reforma da sentença para condenar a recorrida ao pagamento de indenização por danos morais e à restituição em dobro. Embora intimada, a apelada não apresentou contrarrazões (id. 292482372). É o relatório. Inclua-se na pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade recursal, conheço da apelação interposta. Extrai-se dos autos que SEVERINA MARIA DA CONCEIÇÃO GALDINNO ajuizou Ação de Restituição em Dobro de Desconto Indevido Acumulada com Indenização com Danos Morais e Tutela de Urgência em face da ASSOCIAÇÃO DOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS NACIONAL - AAPEN, pretendendo, liminarmente, que a instituição requerida se abstivesse de realizar lançamentos de débitos nos benefícios previdenciários da autora, cancelando-os e vedando a inscrição de seu nome em cadastro de inadimplentes até a solução final da demanda, sob pena de multa diária a ser fixada pelo juízo. No mérito, postulou a condenação da ré ao pagamento de indenização a título de danos morais, na importância sugerida de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), além dos ônus sucumbenciais e da declaração de inexigibilidade das cobranças tidas como indevidas, com restituição em dobro, na quantia de R$ 564,80 (quinhentos e sessenta e quatro reais e oitenta centavos), acrescida de juros e correção monetária (id. 292482032). O pleito de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido (id. 292482042). Após a instrução processual, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, nos seguintes termos: Na sequência, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação, nos seguintes termos: “(...) DA RELAÇÃO DE CONSUMO E DO CDC A alegação da parte requerida no sentido de que não seria aplicável a legislação consumerista, por tratar-se de entidade associativa, não merece prosperar. A jurisprudência é pacífica ao reconhecer que a ausência de fins lucrativos não impede o reconhecimento da ré como fornecedora, quando há prestação de serviço mediante pagamento, ainda que travestido de contribuição ou mensalidade associativa. A jurisprudência do TJMT confirma esse enquadramento: (...) Por essa razão, impõe-se a inteira aplicação das normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, que positiva um núcleo de regras e princípios protetores dos direitos dos consumidores, enquanto tais. O ônus da prova acerca da existência de débito é de responsabilidade do fornecedor, a teor do disposto no art. 14, § 3º, I e II, do CDC, in verbis: (...) Por sua vez, o artigo 373 do CPC prevê a distribuição da carga de responsabilidade sobre as provas a serem produzidas no processo pelas partes, e o inciso II desse dispositivo legal determina ser do réu a incumbência de demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. A ré não apresentou qualquer contrato firmado com a parte autora. Na ausência de prova da contratação, presume-se a ilegalidade dos descontos realizados. E, sendo indevida a cobrança, por certo que os valores já descontados indevidamente devem ser restituídos à parte autora, nos termos do artigo 876 do CC. Quanto a repetição do indébito, tanto a jurisprudência do STJ, como da Terceira Câmara De Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, é firme no sentido de que a devolução em dobro, prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, pressupõe, além da existência de pagamento indevido, a demonstração da má-fé do credor, o que não ficou evidenciado no caso em tela, o que atrai a restituição simples. DOS DANOS MORAIS Já, em relação ao dano moral, é cediço que este ao prejuízo decorrente da dor imputada a uma pessoa, em razão de atos que, indevidamente, ofendem seus sentimentos de honra e dignidade, que provocam mágoa e atribulações na esfera interna pertinente à sensibilidade moral. Ou seja, o dano moral indenizável deve corresponder à violação dos direitos referentes à dignidade humana, cuja doutrina especializada e a jurisprudência dominante vêm entendendo que a consequência do dano se encontra ínsita na própria ofensa, porquanto deflui da ordem natural das coisas, tomando-se como parâmetro a vida comum das pessoas ou empresa. Entretanto, apesar do possível transtorno suportado pela consumidora com a cobrança de valores tidos por ilegais, a jurisprudência tem se firmado no sentido de que suposto ilícito contratual, isoladamente considerado, não é capaz de ensejar danos morais indenizáveis. Neste sentido é o posicionamento da Terceira Câmara de Direito Privado do Eg. TJMT, in verbis: (...) Conquanto os fatos relatados na inicial possam ter causado aborrecimentos à parte autora, não há falar em ocorrência de dano moral, configurando tão-somente incômodo inerente à vida em sociedade, notadamente se não ocorreu fato capaz de gerar constrangimento. DISPOSITIVO Diante do exposto e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, que faço para: 1. DECLARAR inexistente a relação contratual entre a parte autora e a parte requerida; devendo a requerida proceder com o cancelamento de eventual filiação da parte autora junto à ré, bem como se abster de efetuar novos descontos; 2. CONDENAR a REQUERIDA à restituição simples, ante a inexistência de comprovação de má-fé devendo a quantia ser acrescida de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária segundo INPC a partir da data do evento danoso (desconto indevido). 3. JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de danos morais. 4. CONDENAR as partes no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º do CPC, a ser pago pro rata, observada a assistência judiciária concedida a autora. (...)”. (id. 292482366). Irresignada, a apelante interpôs o presente recurso, objetivando a reforma da sentença para que a entidade associativa seja condenada ao pagamento de indenização por danos morais e à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados de seus benefícios. Pois bem. Após detida análise, vislumbra-se que o apelo comporta provimento. De proêmio, cumpre destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, devendo ser aplicadas ao caso as disposições do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentir, quanto à repetição do indébito, importa dizer que o parágrafo único do art. 42 do CDC prevê que o consumidor cobrado em quantia indevida faz jus à restituição em dobro do que pagou em excesso. A propósito, “comprovada a cobrança indevida, a restituição dobrada tem cabimento por força do parágrafo único do art. 42 do CDC, porquanto houve falha na prestação do serviço, sendo patente inocorrência de engano justificável” (TJMT, N.U 1000991-27.2021.8.11.0038, Nilza Maria Possas de Carvalho, Primeira Câmara de Direito Privado, julgado em 14/03/2023, publicado no DJE 20/03/2023). Frise-se que me alinho ao entendimento de que a expressão “salvo hipótese de engano justificável” constante no art. 42, parágrafo único, do CDC, deve ser compreendida como elemento de causalidade, e não de culpabilidade, ao passo que o ônus probatório para excludente da repetição dobrada é do fornecedor e, não o fazendo, como no vertente, impõe-se a repetição do indébito em dobro. Assim, dada a cobrança indevida de valores nos benefícios da autora, em virtude da inexistência de prova quanto à contratação, e considerando que o recorrido se beneficiou de tais importâncias sem respaldo contratual ou autorização válida, o ressarcimento em dobro é medida que se impõe. Em relação aos danos morais, igualmente, o recurso merece ser acolhido. No caso, o dever de indenizar decorre da própria conduta ilícita da empresa recorrida, que efetuou descontos indevidos nos benefícios previdenciários da autora sem qualquer respaldo contratual, situação que ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano e configura dano moral in re ipsa, prescindindo de comprovação específica do prejuízo, especialmente considerando tratar-se a apelada de pessoa idosa e aposentada. O dever de reparar da apelada decorre da falha na prestação do serviço, nos moldes do art. 14 do CDC, que estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor, independentemente da existência de culpa. Comprovado o desconto indevido sem respaldo contratual, impõe-se a obrigação de indenizar, bastando a demonstração do nexo entre a conduta e o prejuízo experimentado pela consumidora. Da mesma forma, a atuação da ré violou frontalmente o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III, da Constituição da República, na medida em que subtraiu, de forma injustificada, parcela de verba essencial à subsistência da autora. A afronta à autodeterminação financeira do aposentado, sobretudo quando desprovido de meios alternativos de renda, extrapola os limites da legalidade e da razoabilidade. Por certo, o direito à indenização por dano moral exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade ou a dignidade da pessoa humana, abrangendo interesses que, embora desprovidos de conteúdo patrimonial, são dotados de extrema relevância na ordem jurídica pátria, tal como se verifica na hipótese, uma vez que os débitos afetaram diretamente a disponibilidade financeira da consumidora, violando o direito de autodeterminação sobre seus próprios recursos. A propósito: “(...) 5. O dano moral decorrente de descontos indevidos em benefício previdenciário é presumido, não se tratando de mero aborrecimento. (...)”. (TJMT, N.U 1010352-12.2024.8.11.0055, Sebastião de Arruda Almeida, Quinta Câmara de Direito Privado, julgado em 26/06/2025, publicado no DJE 26/06/2025). “(...) Configura dano moral a realização de descontos indevidos sobre verba de natureza alimentar, independentemente de comprovação do prejuízo concreto. (...)”. (TJMT, N.U 1015326-37.2024.8.11.0041, Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Quinta Câmara de Direito Privado, julgado em 24/06/2025, publicado no DJE 24/06/2025). “(...) 4. Os descontos indevidos sobre benefício previdenciário de natureza alimentar, sem a existência de vínculo jurídico regular entre as partes, caracterizam apropriação indevida de verba essencial à subsistência da autora, configurando ilícito civil indenizável, caracterizando dano moral in re ipsa. (...)”. (TJMT, N.U 1000819-41.2024.8.11.0051, Anglizey Solivan de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Privado, julgado em 19/06/2025, publicado no DJE 19/06/2025). Logo, a realização de descontos indevidos em benefício previdenciário, sem prévia autorização da consumidora, viola a sua esfera patrimonial e causa transtornos que extrapolam o mero dissabor, afetando sua tranquilidade e paz de espírito, sendo necessário reconhecer o dano moral advindo da conduta ilícita. Ressalte-se que a condição de hipervulnerabilidade da autora - pessoa idosa, de baixa renda e cuja subsistência provém exclusivamente de benefícios previdenciários - confere especial gravidade à conduta ilícita da ré. Em tais circunstâncias, os efeitos deletérios do desconto indevido não se limitam ao aspecto financeiro, mas atingem a segurança existencial e a dignidade da parte, valores estes constitucionalmente protegidos. No que se refere ao quantum indenizatório, releva mencionar que seu arbitramento exige uma análise criteriosa das circunstâncias do caso concreto, considerando a extensão dos danos, sua repercussão social e o comportamento das partes envolvidas, além de levar em conta o perfil social e financeiro da pessoa lesada (idosa e aposentada) e do ofensor, sendo suficiente para desestimular novas infrações, sem, contudo, gerar enriquecimento indevido. Desse modo, tendo em vista os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, bem como a natureza pedagógica da medida, fixo o importe de R$ 3.000,00 (três mil reais), valor que atende às peculiaridades do caso concreto, além do caráter disciplinar e ressarcitório da condenação. Em face do exposto, conheço e DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por SEVERINA MARIA DA CONCEIÇÃO GALDINNO, para determinar que a restituição dos valores indevidamente descontados dos benefícios previdenciários da autora seja realizada em dobro, acrescidos de correção monetária pelo INPC e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir de cada desembolso (Súmulas n. 43 e 54 do STJ). Ainda, condeno a apelada ao pagamento da quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescidos de correção monetária pelo INPC a contar do arbitramento (Súmula n. 362 do STJ) e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir do evento danoso (Súmula n. 54 do STJ). Saliente-se que os cálculos devem observar a data em que a Lei n. 14.905/2024 passou a produzir efeitos, após o que a correção monetária e os juros de mora, tanto dos danos materiais quanto dos morais, deverão observar os índices dos arts. 389, parágrafo único, e 406, ambos do CC. Por corolário lógico, determino que a apelada arque com a totalidade dos ônus de sucumbência, mantendo o percentual fixado na origem. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 1008107-29.2022.8.11.0045

ID: 307471787

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA CRIMINAL DE LUCAS DO RIO VERDE Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1008107-29.2022.8.11.0045

Data de Disponibilização: 25/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MACIEL PEREIRA LIMA

Intimação

Advogados:

VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA CRIMINAL DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1008107-29.2022.8.11.0045. AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: MACIEL PEREIRA LIMA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA CRIMINAL DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1008107-29.2022.8.11.0045. AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: MACIEL PEREIRA LIMA 1008107-29.2022.8.11.0045 VISTOS. O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia em desfavor de MACIEL PEREIRA DE LIMA, qualificado nos autos, como incurso nas disposições do arts. 129, §9º do Código Penal, com as implicações legais da Lei n.º 11.340/2006, pelos fatos descritos na denúncia. Consta da denúncia que o acusado, após ingerir bebida alcoólica, passou a quebrar pertences da vítima, bem como a agrediu com socos no olho e chutes nas costelas, além de quebrar o celular da ofendida, jogando-o contra a parede. O acusado teria se evadido do local, retornando por volta das 19h35min, quando a vítima acionou a guarnição da Polícia Militar, que efetuou sua prisão. A denúncia foi recebida em 02/04/2023 (ID 114167261), ocasião em que foi determinada a citação do acusado, bem como declarada extinta a punibilidade quanto aos crimes de dano (art. 163 do CP) e de ameaça (art. 147 do CP), pela decadência do direito de queixa e prescrição da pretensão punitiva, respectivamente. Devidamente citado, o acusado apresentou resposta à acusação (ID 126251236), sustentando sua inocência e alegando que as lesões constatadas no rosto da vítima seriam provenientes de uma discussão entre esta e seu próprio filho, Jheimeson Alessandro Fontanelli da Silva. Em audiência de instrução e julgamento realizada em 15/10/2024 (ID 172529269), foram ouvidas a vítima Suely Fontaneli, as testemunhas Helckier Ricardo da Silva Araújo e João Adelar Godois Santana, além do interrogatório do réu. Em alegações finais orais, o Ministério Público pugnou pela condenação do réu nos exatos termos da denúncia. A defesa, por sua vez, apresentou alegações finais por memoriais (ID 173692316), requerendo a absolvição do acusado por insuficiência de provas, com fundamento no art. 386, VII, do CPP, sustentando que a lesão encontrada no rosto da vítima teria sido causada por seu filho Jheimeson. Subsidiariamente, pleiteou a desclassificação da conduta para lesão corporal culposa (art. 129, §6º, do CP) ou, ainda, a fixação da pena no mínimo legal. Vieram-me os autos conclusos. É a síntese do necessário. Fundamento e Decido. Trata-se de ação penal pública incondicionada que imputa ao réu MACIEL PEREIRA LIMA a prática do delito de lesão corporal no âmbito de violência doméstica e familiar, tipificado no artigo 129, §9º do Código Penal, com as implicações da Lei nº 11.340/2006. I – DO CRIME DE LESÃO CORPORAL A materialidade está demonstrada através do inquérito policial n. 267/2015, auto de prisão em flagrante (ID. 101686749 - Pág. 1), boletins de ocorrência n° 2015.159201 e 2015.159154 (ID. 101686749 - Pág. 13/15), arquivo fotográfico de ID 101686749 - Pág. 27/29, exame de corpo de delito (ID. 101686749 - Pág. 35), além da declaração da vítima e depoimentos das testemunhas, tanto na fase inquisitorial, quanto em juízo. O laudo pericial atestou a existência de lesões no olho esquerdo e nas costelas da vítima, compatíveis com a dinâmica dos fatos narrados pela ofendida, confirmando objetivamente a materialidade do delito em apuração. A autoria delitiva recai sobre o acusado. No tocante à autoria, a análise das provas produzidas nos autos demonstra a responsabilidade penal do acusado pelos fatos narrados na denúncia. A vítima, Sueli Fontanelle, relatou que os fatos tiveram início com uma discussão doméstica ocorrida no dia 07 de junho de 2015, por volta das 20 horas, na residência em que convivia com o acusado, Maciel Pereira de Lima. Segundo seu relato, a briga teve início quando amigos do acusado estavam na casa e ela solicitou que não utilizassem suas taças pessoais, guardadas no armário. Posteriormente, sua filha chegou ao local acompanhada de uma amiga, e, diante da ausência de copos limpos, Sueli ofereceu uma taça para que a visitante pudesse tomar refrigerante, o que teria desagradado o acusado. Ainda segundo a vítima, após esse episódio, Maciel demonstrou irritação, quebrou a taça em questão e iniciou agressões físicas contra ela, desferindo-lhe socos no rosto e chutes na região das costelas. Disse que, em razão das agressões, desmaiou e foi encaminhada ao hospital, não se recordando de quem teria prestado socorro ou acionado a Polícia Militar. Esclareceu que não se lembrava de algumas informações com exatidão, pois, após o episódio, sofreu um acidente de moto que afetou sua memória. Informou que, embora o laudo pericial inicial tenha registrado apenas um hematoma no olho, dias após os fatos, retornou ao hospital em razão de dores persistentes na região torácica, ocasião em que foi diagnosticada uma fratura (trinca) em duas costelas. Confirmou também que, no momento das agressões, o acusado estava embriagado e afirmou que esse não foi um episódio isolado de violência, mas sim parte de um histórico anterior de agressividade por parte do réu. Ao ser indagada sobre a continuidade do relacionamento, disse que, após o episódio, optou pela separação, e que Maciel deixou a cidade, pois seus filhos teriam manifestado intenção de confrontá-lo diante do ocorrido. Relatou ainda que não sabia ao certo se teria sido ela ou outra pessoa que acionou a polícia, em razão do desmaio, mas confirmou que o acusado permaneceu preso por alguns dias e foi liberado após pagamento de fiança pelo empregador. Esclareceu que, embora tenha declarado anteriormente que trincou as costelas, não conseguia afirmar com segurança se essa lesão ocorreu exatamente nesse episódio, ou em uma outra ocasião de agressão praticada pelo réu. Afirmou, contudo, que Maciel a agrediu mais de uma vez durante o relacionamento. Por fim, relatou que, no momento exato da agressão, apenas ela e o acusado estavam na residência, pois sua filha e os amigos que estavam no local teriam se retirado do ambiente ao perceberem o início da confusão. Disse que a amiga da filha temia conflitos e, por isso, se afastou prontamente, levando sua filha consigo. A testemunha João Adelar Godóis Santana, policial militar à época dos fatos, relatou que atendeu à ocorrência registrada no dia 07 de junho de 2015, envolvendo o acusado Maciel Pereira de Lima e a vítima Sueli Fontanelle. Informou que o chamado foi repassado à guarnição pela central de emergência (190), mas, ao chegarem ao local da residência situada no bairro Jardim Primavera II, o acusado já não se encontrava presente. No local, a vítima relatou que havia tido um desentendimento com seu companheiro e que este teria quebrado objetos da casa, desferido um soco em seu olho, bem como chutes na região das costelas, além de ter danificado seu aparelho celular. A equipe policial registrou o boletim de ocorrência e orientou a vítima, que, naquele momento, optou por se dirigir ao posto de saúde com seu próprio veículo, informando que se sentia capaz de buscar atendimento médico sem necessidade de acionamento do SAMU. A testemunha acrescentou que, posteriormente, houve uma nova solicitação policial, e que, ao retornarem à residência, o acusado foi encontrado no local. Segundo o policial, Macielnão ofereceu qualquer resistência à abordagem, afirmando que não devia nada e que iria espontaneamente à delegacia para prestar esclarecimentos. De fato, ele foi conduzido até a viatura, enquanto a vítima também se dirigiu até a unidade policial por meios próprios. Questionado sobre as condições físicas da vítima, o policial afirmou recordar-se de um ferimento visível na região ocular, embora não pudesse afirmar se havia sangramento. Em relação aos chutes alegadamente recebidos pela vítima, limitou-se a relatar o conteúdo das declarações feitas por ela, reconhecendo que não presenciou os fatos, e que chegaram ao local apenas após a ocorrência da agressão. Ao ser indagado se o acusado apresentava sinais de embriaguez no momento da abordagem, a testemunha respondeu que não se recordava com clareza, mas reiterou que o conduzido manteve comportamento tranquilo e colaborativo, inclusive manifestando a intenção de esclarecer os fatos perante a autoridade policial. Finalizou ressaltando que, em razão do tempo decorrido, não se recordava com exatidão de todas as falas proferidas pelo acusado no momento da condução, mas confirmou que ele declarou que iria relatar sua versão dos fatos diretamente à delegacia. O acusado, Maciel Pereira Lima, indagado sobre os fatos ocorridos no dia 07 de junho de 2015, no bairro Jardim Primavera II, em Lucas do Rio Verde, afirmou que houve, de fato, uma discussão entre ele e a vítima, Sueli Fontanelle, mas negou que tenha havido agressões nas proporções descritas na denúncia. Disse que não a agrediu com socos no olho nem com chutes na costela, como apontado no laudo de exame de corpo de delito e nas fotografias juntadas ao processo. Afirmou que, naquele dia, a vítima estava sob efeito de álcool quando ele chegou à residência e que a discussão teria evoluído para um episódio de agressividade mútua, com empurrões recíprocos, sem que ninguém tivesse caído ao chão. Negou ter quebrado objetos intencionalmente e alegou que, por conta da situação, se retirou do local espontaneamente, retornando posteriormente, quando a vítima teria chamado a Polícia Militar. Ressaltou que não tentou fugir e que se apresentou por vontade própria, por entender que não devia nada à Justiça. Disse ainda que a vítima possuía comportamento violento, já tendo o ameaçado com faca em ocasiões anteriores. Afirmou que chegou a desarmá-la e que quebrou a faca em um banco de madeira da casa, como forma de se proteger. Acrescentou que não sabia da existência de acusações referentes a lesões graves, como desmaio e encaminhamento hospitalar, negando veementemente que esses fatos tenham ocorrido por sua conduta. Quando questionado sobre o hematoma no olho da vítima, respondeu que esse ferimento pode ter resultado de uma briga anterior entre a vítima e um amigo dela, que também residia na casa, lembrando que, em certa ocasião, Sueli teria lançado um prato de louça no rosto desse amigo, causando um corte. Disse que não se recordava de qualquer agressão que pudesse ter causado aquele hematoma, reafirmando que, se tivesse feito algo, não se negaria a reconhecer, pois sempre assumiu seus erros. Negou também que a vítima tenha desmaiado e sido levada ao hospital em razão de agressões praticadas por ele. Confirmou que, após o episódio, o relacionamento passou por separações e reconciliações, até que, em definitivo, afastaram-se. Disse que atualmente reside a cerca de 600 quilômetros de distância, buscando paz e afirmando que, durante o relacionamento, viveu momentos de constante instabilidade emocional, com ameaças e episódios de alcoolismo por parte da vítima. Encerrou reafirmando que não se recordava de ter praticado as agressões descritas na denúncia e que, da sua parte, tais atos não ocorreram Da análise das provas amealhadas aos autos, tenho que as declarações do acusado, por sua vez, foram evasivas, oscilantes e autocentradas, ora admitindo discussão e “empurrões mútuos”, ora negando qualquer agressão mais grave. Alegou que a vítima seria pessoa agressiva e que teria histórico de embriaguez, tentando deslocar a responsabilidade para episódios anteriores ou terceiros. Todavia, tais argumentos não se sustentam diante da firmeza do relato da vítima e do testemunho isento dos policiais militares. A testemunha João Adelar Godóis Santana, policial militar que atendeu a ocorrência, confirmou que, ao chegarem ao local, a vítima relatou imediatamente que fora agredida por seu companheiro com soco no olho, chute nas costelas e destruição de bens. O policial afirmou que Sueli apresentava um ferimento visível no olho, embora tenha ido ao atendimento médico por conta própria, sem necessidade de SAMU. Relatou ainda que o acusado foi conduzido à delegacia de forma voluntária, sem resistência, sem que isso, contudo, descaracterize o fato criminoso. Embora a defesa tenha argumentado que a vítima apresentou versões distintas durante a instrução processual, especialmente quanto ao modo como foi socorrida após as agressões, tal inconsistência não compromete a essência de seu relato quanto às agressões sofridas, considerando o longo lapso temporal decorrido entre os fatos e a instrução processual (aproximadamente nove anos). Ademais, no momento da prisão em flagrante, não há registro de que o acusado tenha apresentado tal versão aos policiais, o que enfraquece consideravelmente sua credibilidade. Importante ressaltar que, nos crimes praticados no âmbito doméstico e familiar contra a mulher, geralmente cometidos na clandestinidade, sem a presença de testemunhas oculares, a palavra da vítima assume especial relevância probatória, desde que coerente e em harmonia com os demais elementos de prova, como ocorre no presente caso. Nesse sentido, a jurisprudência dos tribunais é pacífica: APELAÇÃO CRIMINAL – AMEAÇA E VIAS DE FATO NO ÂMBITO DOMÉSTICO – RECURSO DEFENSIVO - PEDIDO DE 1) PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO - IMPROCEDÊNCIA - MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS – PALAVRAS FIRMES E CORENTES DA VÍTIMA NA FASE POLICIAL E, ANOS DEPOIS, EM JUIZO - ESPECIAL RELEVÂNCIA – PRECEDENTES DESTE E. TJMT - 2) AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DE DELITO A COMPROVAR A PRATICA DAS VIAS DE FATO - PRESCINDIBILIDADE – VIOLÊNCIA NARRADA QUE NÃO DEIXA, NECESSARIAMENTE, LESÕES VISÍVEIS - CONDENAÇÃO MANTIDA – 3) NEUTRALIZAÇÃO DA CULPABILIDADE – IMPERTINENCIA – CONDIÇÃO DE POLICIAL MILITAR - CONDUTA REPROVÁVEL – INOBSERVÂNCIA AO DEVER DE OFÍCIO – FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA – APELO DESPROVIDO, DE ACORDO COM O PARECER DA D. PGJ. 1 - Nos crimes praticados no contexto da Lei Maria da Penha, a jurisprudência confere ao depoimento da vítima, especial relevância, ainda mais quando o relato é firme, coerente mesmo após considerável lapso de tempo ocorrido entre os fatos e sua oitiva e, também quando evidenciada a total ausência de interesse da vítima, em pura e simplesmente prejudicar o apelante, imputando-lhe falsamente os crimes narrados. 2 - A realização de exame de corpo de delito é prescindível para a comprovação da materialidade delitiva na contravenção penal de vias de fato, tendo em vista que as agressões tipificadas e narradas na denúncia não são, necessariamente, das que ofendem a integridade física da vítima a ponto de deixar vestígios passíveis de constatação via prova técnica. 3 - A condição de policial não é elementar nem do crime de ameaça e nem da contravenção penal de vias de fato, sendo evidente a maior reprovabilidade e censura da conduta do apelante, uma vez, que o comportamento dele esperado seria exatamente o de evitar a prática de crimes, manter a ordem pública e cumprir as leis. (N.U 0001641-49.2019.8.11.0010, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 01/02/2023, Publicado no DJE 08/02/2023) No caso em análise, a própria denúncia menciona que este não teria sido o primeiro episódio de violência por parte do acusado, que "ao longo do relacionamento sempre foi pessoa agressiva", circunstância que, embora não comprovada especificamente quanto a episódios anteriores, reforça a credibilidade do relato da vítima quanto ao comportamento violento do réu. Diante do conjunto probatório produzido nos autos, tenho por suficientemente comprovadas a materialidade e a autoria do crime de lesão corporal no âmbito doméstico imputado ao acusado, impondo-se sua condenação nos termos da denúncia. II - DA TESE DEFENSIVA DE DESCLASSIFICAÇÃO A defesa pleiteou, subsidiariamente, a desclassificação da conduta para lesão corporal culposa (art. 129, §6º, CP). Contudo, tal pedido não merece acolhimento. A dinâmica dos fatos narrados na denúncia e comprovados durante a instrução processual evidencia que o acusado agiu com animus laedendi, ou seja, com a intenção deliberada de causar lesões corporais na vítima, mediante socos e chutes direcionados ao seu corpo. A conduta do réu, após ingerir bebida alcoólica, quebrar pertences da vítima e agredi-la fisicamente, revela claramente sua intenção dolosa de lesionar, inexistindo qualquer elemento que sugira culpa ou imprudência na causação das lesões. Portanto, inviável a desclassificação pleiteada. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para CONDENAR o réu MACIEL PEREIRA LIMA, qualificado nos autos, como incurso nas penas do artigo 129, §9º do Código Penal, com as implicações da Lei nº 11.340/2006. IV – DA DOSIMENTRIA DA PENA Atenta à alteração no Código Penal que exasperou a pena para o delito em comento, deixo de aplicar as penas previstas na nova lei, levando em consideração o inciso XL do artigo 5º da Constituição Federal que prevê a retroatividade da lei em benefício do réu, como é o caso dos autos. O delito previsto no artigo 129 §9º, do CP, possui como pena abstrata detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. Em atenção ao critério trifásico de Nelson Hungria, na primeira fase da individualização da pena, denoto que o acusado agiu com culpabilidade inerente ao tipo, uma vez que seu comportamento não ultrapassou a esfera de censurabilidade da conduta para este delito. Conforme já dito, os antecedentes criminais são favoráveis. A conduta social e a personalidade do agente são circunstâncias neutras. Os motivos e circunstâncias do crime não ultrapassaram a esfera de normalidade do tipo. As consequências são inerentes à espécie e não há indícios de que o comportamento da vítima tenha influenciado a prática delitiva. Logo, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 03 (três) meses de detenção, a qual considero como suficiente para reprovação e prevenção do crime em análise. Na segunda fase da dosimetria da pena, não vislumbro agravantes ou atenuantes. No mais, deixa-se de valorar a agravante do art. 61, II, “f”, do Código Penal (“prevalecendo-se de relações domésticas”), pois em caso anterior este Juízo reconheceu a referida agravante, todavia o Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso reformou a dosimetria em sede recursal, afastando-a entendendo que a dupla incidência caracteriza bis in idem (Processo n. 1001293-12.2022.8.11.0009). O tema 1197 do STJ, para o TJMT, somente se aplica para o art. 129, §9° do CP. Por fim, na terceira fase da dosimetria, constato a inexistência de causas de aumento ou diminuição de pena, motivo pelo qual torno definitiva a pena privativa de liberdade do acusado quanto ao crime de lesão corporal praticada em âmbito de relação íntima de afeto em 03 (três) meses de detenção. Em atenção ao que dispõe o artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, tendo-se em conta a primariedade do réu e a quantidade da pena, fixo o REGIME ABERTO para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade. Ausentes os requisitos legais para a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, conforme o disposto no artigo 44 do Código Penal, revelando-se tal medida como insuficiente à prevenção e repressão do delito no caso concreto. Preenchidos os requisitos do artigo 77 do Código Penal, concedo ao acusado o benefício da suspensão condicional da pena, pelo prazo de 02 (dois) anos, mediante o cumprimento das condições do artigo 78, §2º, do mesmo diploma legal, que deverão ser observadas sob pena de revogação. Em atenção ao disposto no § 1º do artigo 387 do Código de Processo Penal, CONCEDO ao acusado o direito de recorrer em liberdade, eis que ausentes os pressupostos legais para decretação de sua prisão preventiva. VII - DETERMINAÇÕES FINAIS CONDENO o réu ao pagamento das custas e despesas processuais (art. 804, CPP). Dê-se ciência pessoal ao MPE e a Defesa, conforme disposição do art. 370, § 4°, CPP. Transitada esta sentença em julgado, expeça-se guia de recolhimento e remeta-se o processo de execução à Vara das Execuções Criminais (art. 105 da Lei n.º 7.210/1984), oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral (art. 376, §1º do CNGC), preencha-se e remeta-se o boletim individual estatístico ao Departamento de Informática Policial (art. 809, incisos VI e VII do Código de Processo Penal), tudo nos termos do CNGC-MT, notadamente o art. 371. Intime-se a vítima, conforme determina o artigo 21 da lei 11.340/2006. Dispensada a intimação pessoal do réu, nos termos do PROVIMENTO-TJMT/CGJ N.º 4/2025-GAB-CGJ DE 4 de fevereiro de 2025, tendo em vista tratar-se de réu solto, vide artigo 369, §2º, I e II. Ciência ao Ministério Público e à Defesa. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. De Colíder para Lucas do Rio Verde, data da assinatura eletrônica. Paula Tathiana Pinheiro Juíza de Direito em Substituição (Portaria 866/2025 PRES/TJMT)

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Processo nº 1011921-82.2025.8.11.0000

ID: 310370665

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: AGRAVO DE EXECUçãO PENAL Nº Processo: 1011921-82.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

GEOVANE JUNIOR CONCEICAO

Acórdão

Advogados:

JOAO MARLON GIMENEZ BARBOSA

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1011921-82.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Assunto: [Pena Privativa de Liberdade] Relator: Des(a). R… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1011921-82.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Assunto: [Pena Privativa de Liberdade] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (AGRAVANTE), GEOVANE JUNIOR CONCEICAO - CPF: 043.130.291-09 (AGRAVADO), JOAO MARLON GIMENEZ BARBOSA - CPF: 025.671.792-32 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO TRIENAL PARA INSTAURAÇÃO DE P.A.D. PARA APURAÇÃO DE FALTA GRAVE NO TRANSCURSO DA EXECUÇÃO PENAL – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – PRETENDIDA REFORMA – ALEGAÇÃO DE NÃO PRESCRIÇÃO – INVIABILIDADE – OCORRÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA QUE FOSSE RECONHECIDA A FALTA GRAVE – PRAZO REGULADO PELO ART. 109, VI, DO CP – AUSÊNCIA DE P.A.D. E AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO – PRECEDENTES STJ [HC 452.988] – VERBETE SUMULAR 533 E 526 STJ – DECISÃO REFORMADA – RECURSO DESPROVIDO. É entendimento consolidado nos tribunais superiores que o prazo de prescrição de falta grave é de 3 anos, sendo imprescindível a instauração de processo administrativo disciplinar (PAD) para o seu reconhecimento. Transcorrido, no caso, mais de 3 anos sem a instauração do procedimento necessário para a ocorrência do contraditório, correto está o reconhecimento da prescrição. Súmula 533, STJ. Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar, no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado. Súmula 526, STJ: O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de agravo em execução penal interposto pelo Ministério Público contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá que, nos autos da Execução Penal nº 0007937-93.2016.8.11.0042, declarou prescrita a falta grave decorrente do novo fato delituoso que originou a Guia nº 0038396-44.2017.8.11.0042 e fixou como data-base para a concessão da progressão regimental o dia 25/07/2015, data da última prisão do agravado. Em suas razões recursais, o Ministério Público sustenta, em síntese, que: 1) A falta grave que se debate consistiu na prática de novo crime doloso, do qual resultou a condenação do agravado, não cabendo ao magistrado da execução ignorá-la; 2) O prazo prescricional para casos como este não seria o de 3 anos, aplicável às faltas disciplinares, mas sim o prazo regulado pelo Código Penal de acordo com o montante da pena fixado na sentença condenatória, que no caso seria de 12 anos; 3) Mesmo sem instauração de PAD ou realização de audiência de justificação em tempo hábil, o delito foi completamente apurado em sede de ação penal, com respeito ao contraditório e à ampla defesa; 4) Apurada e verificada em sede de ação penal a falta grave, há que se aplicar a adequada reprimenda, nos termos do art. 118, I, da LEP e a alteração da data-base conforme disciplina o art. 112, §6º da LEP. (I. 2806627864) Em contrarrazões, o agravado afirma que não foi submetido à instauração de PAD ou audiência de justificação em tempo hábil, tendo transcorrido mais de 3 anos entre o fato e a decisão que reconheceu a falta grave, razão pela qual defende a manutenção da decisão agravada. (Id. 2806627871) Em juízo de retratação, o magistrado manteve a decisão pelos seus próprios fundamentos. (id. 280627873). A douta Procuradoria-Geral de Justiça através da Procuradora de Justiça Dra. Ana Cristina Bardusco Silva manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso, assim sintetizando: “Sumário: Agravo em Execução Penal – Inconformismo ministerial – Agrava da decisão que declarou prescrita a falta grave decorrente de novo fato delituoso, fixando a data-base o dia da última prisão, anterior a prática do novo crime doloso – Viabilidade - reeducando que, estando preso e cumprindo pena em regime fechado, praticou novo crime, sendo novamente condenado – desnecessidade de instauração de PAD para imposição de sanção pela falta grave – contraditório e ampla defesa, assegurados na ação de conhecimento, cuja sentença transitou em julgado – alteração da data-base que decorre dos efeitos secundários da falta grave – precedentes judiciais – data do último crime, ou última falta grave, que deve ser considerada como data-base para futuros benefícios na execução penal - Pelo CONHECIMENTO e PROVIMENTO do agravo.” É o relatório. V O T O R E L A T O R Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. Consta dos autos que o agravado GEOVANE JUNIOR CONCEIÇÃO cumpre pena unificada de 33 anos, 5 meses e 23 dias de reclusão, em regime fechado, pela prática dos crimes de roubo, latrocínio e tráfico de entorpecentes. Em 28/08/2016, enquanto cumpria pena no regime fechado, o agravado cometeu novo delito (tráfico de drogas) no interior da unidade prisional, o que originou a Guia nº 0038396-44.2017.8.11.0042, sendo condenado à pena de 7 anos de reclusão. Após a juntada da nova guia, foi realizada audiência de justificação em 13/10/2022, quando o Juízo reconheceu a prática de falta grave e determinou que a data-base para progressão fosse fixada em 28/08/2016, data do novo delito. Posteriormente, em 11/06/2024, a defesa impugnou o cálculo, sustentando que teria ocorrido a prescrição da falta grave, uma vez que entre a data do fato (28/08/2016) e a decisão que reconheceu a falta grave (13/10/2022) haveria transcorrido período superior a 3 anos. O magistrado acolheu a pretensão da defesa, declarando a prescrição da falta grave e fixando como data-base o dia da última prisão do recuperando (25/07/2015). A decisão combatida foi assim proferida: “Trata-se de Processo Executivo de Pena em que figura como recuperando GEOVANE JÚNIOR CONCEIÇÃO, condenado à pena total de 33 anos, 05 meses e 23 dias de reclusão, ante a unificação das seguintes Guias: Guia nº 0018492-09.2015.8.11.0042, pena de 06 anos, 05 meses e 23 dias de reclusão, pela prática do crime de roubo; Guia nº 0028547-53.2014.8.11.0042, pena de 20 anos de reclusão, pela prática do crime de latrocínio; e Guia nº 0038396-44.2017.8.11.0042, pena de 07 anos de reclusão, pela prática do crime de tráfico de drogas. No dia 25/07/2015, o recuperando deu entrada no sistema penitenciário, em decorrência de prisão preventiva oriunda da Ação Penal nº 18492-09.2015.8.11.0042, permanecendo segregado até a fase de execução penal. Iniciado o cumprimento da pena perante este juízo, a aludida GEP foi unificada à Guia nº 0028547-53.2014.8.11.0042, tendo o penitente permanecido segregado. Ocorre que, embora recluso, no dia 28/08/2016, o recuperando se envolveu em nova prática criminosa, cujo fato deu origem à terceira condenação lançada nos autos – Guia nº 0038396- 44.2017.8.11.0042. Com o aporte da referida GEP ao PEP, o recuperando foi submetido à audiência de justificação, no dia 26/07/2022, oportunidade em que foram colhidas as declarações do penitente, além das manifestações defensiva e ministerial. Em análise dos fatos, na data de 13/10/2022, foi reconhecida a prática de falta grave e, por consequência, aplicados os efeitos secundários à regressão de regime – alteração da data-base e decretação de perde de dias remidos. No dia 11/06/2024, a defesa pugnou pela prescrição da pretensão do reconhecimento da falta grave decorrente da nova prática delituosa, ante o decurso de lapso temporal superior a 03 anos entre o fato criminoso e a decisão que procedeu a homologação da aludida sanção. Instado a manifestar, o representante ministerial opinou de forma contrária ao intento defensivo, sob o argumento que o prazo prescricional indicado pela defesa merece aplicabilidade, tão somente, em relação às ocorrências instruídas via PAD, o que não é o caso dos fatos em testilha, cujo teor apontam a existência de condenação criminal. É o relatório. Decido. A questão trazida à baila versa sobre o reconhecimento, ou não, da prescrição da falta grave decorrente da prática de novo crime no curso da execução penal e, de consequência, a possibilidade de reconhecimento da aludida falta com a aplicação dos efeitos secundários à regressão de regime. Acerca da prática de falta grave no curso da execução, é sabido que tal fato poderá ser fruto de infração disciplinar intramuros ou, ainda, de fato definido como crime. Nesse sentido, em se tratando de infração disciplinar, a Excelsa Corte, no julgamento do RE n. 972598-RS, em 04/05/2020, ao apreciar o tema 941 da repercussão geral, fixou a tese de que “a oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena”. Logo, na inexistência de PAD intramuros, de forma subsidiária, o fato poderá ser objeto de audiência de justificação e análise diretamente pelo Juízo da execução penal. Por outro lado, ao versar sobre fato definido como crime doloso, a mera condenação transitada em julgado, por si só, enseja a regressão de regime e a consequente aplicação dos efeitos secundários à regressão de regime. O tema foi objeto da Súmula 526 do STJ, que assim expressa: “O reconhecimento de falta grave decorrente do cometimento de fato definido como crime doloso no cumprimento da pena prescinde do trânsito em julgado de sentença penal condenatória no processo penal instaurado para apuração do fato.” Ainda que o reconhecimento de falta grave prescinda de trânsito em julgado, é “ consolidado na Súmula 533 do STJ e no julgamento do REsp 1.378.557/RS, admitido como representativo de controvérsia, de que, para o reconhecimento de falta disciplinar na execução penal, é indispensável a abertura de procedimento administrativo, assegurando-se o direito à ampla defesa, sendo insuficiente a mera ocorrência de audiência de justificação” (STJ, 6ª T., AgRg no REsp 1815080/MA, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, julgado em 08/10/2019). Soma-se a isso, a Excelsa Corte, no julgamento do RE n. 972598-RS, em 04/05/2020, ao apreciar o tema 941 da repercussão geral, fixou a tese de que “a oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena”. Na mesma toada, ainda que a Súmula 534 do STJ oriente no sentido de que “a prática de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento da pena, o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração.”, não resta dúvida acerca da imprescindibilidade da oitiva do recuperando, acompanhado de defesa técnica, em sede do Juízo das execuções penais, como forma de garantia do contraditório e ampla defesa. Ademais, acerca do lapso prescricional a ser aplicado, é sabido que para apuração de falta disciplinar grave praticada no curso da execução penal, tal prazo é regulado no art. 109, inciso VI, do Código Penal, qual seja, 3 anos, se verificada após a edição da Lei n. 12.234/2010. Nessa linha, assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça, verbis: “EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. FALTA GRAVE. PRESCRIÇÃO. PRAZO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 109, VI, DO CP. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. WRIT NÃO CONHECIDO. (...) 2. As Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte firmaram o entendimento de que, em razão da ausência de legislação específica, a prescrição da pretensão de se apurar falta disciplinar, cometida no curso da execução penal, deve ser regulada, por analogia, pelo prazo do art. 109 do Código Penal, com a incidência do menor lapso previsto, atualmente de três anos, conforme dispõe o inciso VI do aludido artigo. (...) 5. Habeas corpus não conhecido.” (STJ, 5ª T., HC 452.988/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, julgado em 07/ 08/2018). In casu, as informações extraídas dos autos revelam que o recuperando se encontrava em cumprimento de pena quando, no dia 28/08/2016, quando no interior da unidade prisional, se envolveu na prática de novo crime, cujo fato deu origem à Guia nº 0038396-44.2017.8.11.0042. A audiência de justificação, para instrução da respectiva falta ocorre, tão somente, em 27/ 07/2022, sendo a falta grave homologada no dia 13/10/2022. Ora, em que pese exercido o exigido contraditório e ampla defesa, mediante a realização de audiência de justificação, o ato ocorreu a posteriori daquele previsto no art. 109, inciso VI, do Código Penal. Cumpre salientar, ainda, que a existência de condenação, por si só, não supre a necessidade de homologação da aludida falta perante o juízo das execuções penais. Logo, razão assiste à defesa, posto que a falta grave em tela se encontra fulminada pelo fenômeno da prescrição. Com essas considerações, ACOLHO a pretensão defensiva para RECONHECER a prescrição da falta grave decorrente do fato que originou a Guia nº 0038396-44.2017.8.11.0042, nos termos do art. 109, inciso VI, do Código Penal.” (Id. 280627865). Em que pese a fundamentação lançada na decisão, é entendimento consolidado nos Tribunais Superiores que o prazo de prescrição da falta grave, seja de PAD ou via judicial, será de 03 (três) anos, in verbis: “(...) É de 03 (três) anos o prazo prescricional para a aplicação de sanção disciplinar decorrente do cometimento de falta grave, após a edição da Lei n. 12.234/2010, utilizando-se, para tanto, o art. 109, VI, do Código Penal, diante da falta de norma específica quanto à prescrição em sede de execução. (...)” (STJ - RHC: 58726 MT 2015/0089508-5, Relator: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Julgamento: 20/04/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/04/2021) Nota-se que a decisão agravada reconheceu a prescrição da falta grave sob o fundamento de que, para apuração de falta disciplinar grave praticada no curso da execução penal, o prazo prescricional seria de 3 anos, nos termos do art. 109, inciso VI, do Código Penal. Considerando que entre o fato (28/08/2016) e o reconhecimento da falta grave (13/10/2022) transcorreu prazo superior a 3 anos, o magistrado declarou prescrita a falta grave. Com efeito, a orientação firme do Col. Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que cometido novo crime no curso da execução penal, para o reconhecimento da infração disciplinar é prescindível o trânsito em julgado no processo penal instaurado para apuração do fato [Súmula 526 STJ]. Por outro lado, o entendimento da Corte Superior, “consolidado na Súmula 533 do STJ e no julgamento do REsp 1.378.557/RS, admitido como representativo de controvérsia, de que, para o reconhecimento de falta disciplinar na execução penal, é indispensável a abertura de procedimento administrativo, assegurando-se o direito à ampla defesa, sendo insuficiente a mera ocorrência de audiência de justificação” (AgRg no REsp 1815080/MA, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 08/10/2019). Ainda, cito julgamento do RE n. 972598-RS, em 4/5/2020, apreciando o tema 941 da repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que: “(...) a oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena”. Contudo, no caso dos autos além de não se instaurar processo administrativo disciplinar, não se designou audiência de justificação perante o Juízo das Execuções Penais, evidenciando que o reconhecimento de falta grave somente se deu após decurso de prazo superior a cinco anos, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Importante consignar que fato de o agravado ter tido a oportunidade de se defender no processo de conhecimento referente ao novo crime não supre a necessidade do devido processo legal para o reconhecimento da falta grave, no âmbito da execução penal. Nessa linha intelectiva, sem o devido processo legal para o reconhecimento da falta disciplinar, a superveniência de nova condenação criminal, com a unificação de guia de pena, não autorizará a modificação da data-base ou a perda de dias remidos, mas apenas a soma das penas, mantendo-se como data-base o termo inicial original. Ressalto, o novo crime no curso da execução penal ocorreu em 28/08/2016, com o transcurso de mais de 3 (três) anos entre a suposta falta grave e a data em que foi realizada a audiência de justificação, sem a instauração do contraditório válido, seja por processo administrativo disciplinar ou audiência de justificação, a evidenciar a prescrição da pretensão punitiva administrativa, aplicando-se analogicamente a regra do art. 109, inciso VI, do Código Penal. Esta é a compreensão do Superior Tribunal de Justiça: “EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. FALTAGRAVE. PRESCRIÇÃO. PRAZO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 109, VI, DO CP. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. WRIT NÃO CONHECIDO. (...) 2. As Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte firmaram o entendimento de que, em razão da ausência de legislação específica, a prescrição da pretensão de se apurar falta disciplinar, cometida no curso da execução penal, deve ser regulada, por analogia, pelo prazo do art. 109 do Código Penal, com a incidência do menor lapso previsto, atualmente de três anos, conforme dispõe o inciso VI do aludido artigo. (...) 5. Habeas corpus não conhecido.” (HC 452.988/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 07/08/2018) Não diverge desse entendimento, a jurisprudência do TJMT: “AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – RECONHECIMENTO DA OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO PARA HOMOLOGAÇÃO DE FALTA GRAVE – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – PRETENDIDA REFORMA – ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO CONFORME PENA APLICADA – IMPROCEDÊNCIA – OCORRÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA QUE FOSSE RECONHECIDA A FALTA GRAVE - PRAZO REGULADO PELO ART. 109, VI, DO CP – AUSÊNCIA DE P.A.D. E AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO – PRECEDENTES STJ – RECURSO DESPROVIDO – CONSONÂNCIA DO PARECER DA PGJ. É entendimento consolidado nos tribunais superiores que o prazo de prescrição de falta grave é de 3 anos, sendo imprescindível a instauração de processo administrativo disciplinar (PAD) para o seu reconhecimento. Transcorrendo, in casu, mais de 3 anos sem a instauração do procedimento necessário para a ocorrência do contraditório, correto está o reconhecimento da prescrição.” (N.U 1001293-39.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 04/05/2022, Publicado no DJE 11/05/2022) “AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – DECISÃO QUE DECLAROU A PRESCRIÇÃO EXECUTÓRIA PARA HOMOLOGAÇÃO DA FALTA GRAVE – IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL – PRETENDIDA A REFORMA DA DECISÃO – ALEGAÇÃO DE TRÂNSITO EM JULGADO CONDENATÓRIO – IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE PROCEDIMENTO DISCIPLINAR OU AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO - OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA FALTA GRAVE – PRAZO PRESCRICIONAL TRANSCORRIDO – RECURSO NÃO PROVIDO. Sem o devido processo legal para o reconhecimento da falta disciplinar, a superveniência de nova condenação criminal, com a unificação de guia de pena, não autorizará a modificação da data-base ou a perda de dias remidos, mas apenas a soma das penas, mantendo-se como data-base o termo inicial original.” (N.U 1019616-29.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PAULO DA CUNHA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 15/02/2022, Publicado no DJE 18/02/2022) Logo, diante da prescrição da falta grave, não há razão para a modificação da data-base, devendo ser mantida como tal àquela anterior ao aludido novo crime. Ante o exposto, mantenho a decisão proveniente do Juízo de Execuções que reconheceu a prescrição da falta em questão, ante o decurso de mais de três anos desde a sua ocorrência. Posto isso, DESPROVEJO o recurso de agravo em execução, mantendo a decisão combatida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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Processo nº 5761624-74.2022.8.09.0179

ID: 329891435

Tribunal: TJGO Órgão: 7ª Câmara Cível Classe: PETIçãO CíVEL Nº Processo: 5761624-74.2022.8.09.0179

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

ALEXANDER CORREA RODRIGUES

Polo Passivo:

Relatório e Voto

Advogados:

HOMAILE MASCARIN DO VALE

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete do Desembargador Sebastião Luiz Fleury REMESSA NECESSÁRIA Nº 5761624-74.2022.8.09.0179 7ª CÂMARA CÍVEL COMARCA DE… PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete do Desembargador Sebastião Luiz Fleury REMESSA NECESSÁRIA Nº 5761624-74.2022.8.09.0179 7ª CÂMARA CÍVEL COMARCA DE SERRANÓPOLIS AUTOR: ALEXANDER CORREA RODRIGUES RÉUS: MUNICÍPIO DE CHAPADÃO DO CÉU e ESTADO DE GOIÁS TRIPLA APELAÇÃO CÍVEL 1º APELANTE : ESTADO DE GOIÁS 1º APELADO : ALEXANDER CORREA RODRIGUES 2º APELANTE : MUNICÍPIO DE CHAPADÃO DO CÉU 2º APELADO : ALEXANDER CORREA RODRIGUES 3º APELANTE : ALEXANDER CORREA RODRIGUES 3ºs APELADOS : MUNICÍPIO DE CHAPADÃO DO CÉU e ESTADO DE GOIÁS RELATOR : Desembargador SEBASTIÃO LUIZ FLEURY EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DE SAÚDE. REMESSA NECESSÁRIA E TRIPLA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS ONCOLÓGICOS. RELATÓRIO MÉDICO INDICANDO A INEFICÁCIA DOS MEDICAMENTOS PLEITEADOS. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE NEGATIVA ADMINISTRATIVA PRÉVIA. ATO ILÍCITO NÃO DEMONSTRADO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e tripla apelação cível contra sentença que julgou procedente ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, condenando os réus ao fornecimento dos medicamentos Dabrafenibe e Trametinibe para tratamento de melanoma metastático e ao pagamento de danos morais no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Determinar se: (i) a alteração do quadro clínico que tornou desnecessário o uso dos medicamentos pleiteados configura perda superveniente do interesse processual; (ii) a ausência de comprovação de negativa administrativa prévia impede a condenação por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A perda superveniente do interesse processual constitui causa extintiva do processo sem resolução do mérito quando fatos posteriores à propositura da demanda tornam impossível ou desnecessária a prestação jurisdicional originalmente requerida. 4. A alteração do quadro clínico do autor, que tornou inútil a medicação, evidencia inequívoca perda do interesse processual superveniente em relação ao pedido de obrigação de fazer (fornecimento dos medicamentos DABRAFENIBE e TRAMETINIBE), uma vez que a tutela jurisdicional pleiteada perdeu sua utilidade prática e concreta. 5. A ausência de comprovação da negativa administrativa prévia afasta a configuração de ato ilícito apto a ensejar reparação por danos morais. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Remessa necessária provida. Primeira apelação parcialmente conhecida e, nessa parte, provida. Segunda e terceira apelações prejudicadas. Tese de julgamento: 1. A perda superveniente do interesse processual decorrente de alteração do quadro clínico, que torna desnecessário o medicamento pleiteado na inicial, enseja a extinção do processo sem resolução de mérito. 2. A ausência de comprovação da negativa administrativa prévia afasta a configuração de ato ilícito apto a ensejar reparação por danos morais em ações de fornecimento de medicamentos. _____________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 109, I; CPC, arts. 485, VI, 487, I, 493, caput, 85, §§ 2º, 3º, I, 4º, I, 8º e 8º-A, 292 e 496, I; Lei 9.494/97, art. 1º-F; Lei 11.960/2009; Lei 10.742/2003; EC 113/2021, art. 3º; Lei 12.016/2009, art. 6º, § 5º; Regimento Interno TJGO, art. 157; Súmulas 54 e 362/STJ. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 1.366.243/SC (Tema 1234); STF, RE 855178 (Tema 793); STF, RE 566.471/RN (Tema 06); STF, Reclamações 49.890 e 50.414; TJGO, AC e RN 5338611-78.2021.8.09.0072, 7ª Câmara Cível; TJGO, RN 0455509-64.2007.8.09.0134, 5ª Câmara Cível; TJGO, MS 5295516-83.2022.8.09.0000, 1ª Câmara Cível; TJGO, MS 5218180-03.2022.8.09.0000, 6ª Câmara Cível. VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da remessa necessária e dos apelos. Conforme relatado, trata-se de Remessa Necessária e de Tripla Apelação Cível (movimentações ns. 79, 90 e 92), interpostas, respectivamente, por ESTADO DE GOIÁS (movimentação n. 79), MUNICÍPIO DE CHAPADÃO DO CÉU (movimentação n. 90) e ALEXANDER CORREA RODRIGUES PREVIDÊNCIA (movimentação n. 92), contra a sentença (movimentação n. 66) proferida pela juíza de direito da Comarca de Serranópolis-GO, Dra. Bruna de Oliveira Farias, nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais, promovida pelo terceiro apelante em desfavor dos demais. Na inicial, o autor alega que foi diagnosticado com melanoma metastático e que está em tratamento contínuo desde 2015, sofrendo recidiva óssea em novembro de 2022. Seu médico prescreveu os medicamentos Dabrafenibe (Tafinlar) e Trametinibe (Mekinist), os quais possuem alto custo e não são fornecidos pelo SUS, que oferta apenas a quimioterapia com dacarbazina, de eficácia muito inferior. Alegando risco iminente à vida, ausência de alternativas terapêuticas eficazes no SUS, aprovação dos medicamentos pela ANVISA e hipossuficiência financeira, o autor ajuizou ação contra o Estado de Goiás e o Município de Chapadão do Céu, requerendo o fornecimento imediato dos medicamentos e indenização por danos morais de 10 salários mínimos. A sentença (movimentação n. 66) julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para confirmar a tutela de urgência, bem como: (i) RECONHECER o direito da parte autora de receber os medicamentos “DABRAFENIBE EM DOSE DE 150Mg 12/12h E TRAMETINIBE 1MG DIA”, a ser fornecido pelas requeridas, mediante tratamento perante unidades cadastradas na Rede de Atenção Oncológica, cuja lista encontra-se disponível no endereço eletrônico do Instituto Nacional de Câncer – INCA (https://www.inca.gov.br/onde-tratar-pelo-sus); e (ii) CONDENAR os réus, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 7.000,00 (sete mil reais), cujo valor deverá ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E, desde o arbitramento (Súmula 362 do STJ), e os juros de mora, segundo o índice da remuneração da caderneta de poupança, na forma do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ). A partir de 09/12/2021, todavia, por força do disposto no artigo 3º da Emenda Constitucional n. 113/2021, deverá incidir somente a taxa SELIC, uma única vez, em acumulação mensal, até o efetivo pagamento. É de incumbência do paciente, ora parte autora, a cada 03 (três) meses, na oportunidade do recebimento do fármaco, apresentar relatório médico atualizado, fornecido em unidade da Rede de Atenção Oncológica, atestando a persistência de necessidade do medicamento, sob pena de suspensão do fornecimento. Ademais, determino a intimação da parte autora que acoste aos autos documento pessoal com foto, no prazo de 15 (quinze) dias. Pela sucumbência, condeno a parte requerida ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, o que faço com esteio no artigo 85, §§2º, 3º, inciso I, e 4º, inciso I, do Código de Processo Civil. Quanto às custas processuais, por se tratarem de entes públicos, estes são isentos. Sentença sujeita ao instituto da remessa necessária, nos termos do disposto no art. 496, inciso I, do Código de Processo Civil, pelo que determino, após o decurso do prazo de recurso voluntário, sejam os autos remetidos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás. Após a oposição de embargos de declaração, a sentença foi integrada pela decisão de movimentação n. 82, nos seguintes termos: Diante do exposto, CONHEÇO os embargos de declaração e DOU-LHES PROVIMENTO para o fim de sanar a obscuridade existente na sentença exarada em mov. 66, adequando-se o seguinte parágrafo no dispositivo: “Pela sucumbência, condeno a parte requerida ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais arbitro em R$ 2.000,00 (dois mil reais), o que faço com esteio no artigo 85, §8º, do Código de Processo Civil.” No mais, permanece a r. sentença demov. 66, como está lançada. Irresignado, o primeiro apelante, ESTADO DE GOIÁS, interpõe a apelação cível de movimentação n. 79, alegando, inicialmente, que o mecanismo de disponibilização de tratamento oncológico aos usuários do SUS apresenta sistemática específica, sendo que os medicamentos contra o câncer não são disponibilizados diretamente ao paciente pelo Ministério da Saúde ou pelas Secretarias Municipais e Estaduais, mas sim pelos hospitais habilitados em Oncologia pelo SUS, responsáveis pelo fornecimento por meio da inclusão nos procedimentos quimioterápicos registrados no subsistema APAC-SIA. Sustenta que, nos termos da decisão do Ministro Gilmar Mendes no Recurso Extraordinário n. 1.366.243/SC (Tema 1234), deferiu-se tutela provisória estabelecendo que, em relação aos medicamentos oncológicos no SUS, a composição do polo passivo deve observar as normas de repartição de competências do sistema público de saúde, ainda que isso implique deslocamento de competência. Aduz que a sentença violou a orientação firmada pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário 855178 (Tema 793), que estabeleceu a responsabilidade solidária dos entes federativos, mas determinou que compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. Avançando, argumenta que não há conduta ilícita por parte do Estado de Goiás, uma vez que o tratamento oncológico é de responsabilidade da União, não havendo elementos configuradores do dano moral. Quanto aos honorários advocatícios, sustenta que deve ser afastada a condenação ou, subsidiariamente, fixados por equidade, considerando o valor inestimável do proveito econômico em demandas de saúde, conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça. Por essas razões, requer seja reformada a sentença recorrida, a fim de que seja determinada a inclusão da União no polo passivo da demanda, com remessa dos autos à Justiça Federal, seja afastada a condenação por danos morais e a condenação em honorários advocatícios ou, subsidiariamente, sua fixação por equidade, bem como expressa manifestação sobre a responsabilidade da União no fornecimento de tratamento oncológico e sobre a aplicabilidade dos Temas 1234 e 793 do STF ao caso. Sem preparo, ante a isenção legal. O MUNICÍPIO DE CHAPADÃO DO CÉU interpôs a segunda apelação (movimentação n. 90), alegando, inicialmente, a supremacia do interesse público em face do interesse privado e a aplicação da teoria da reserva do possível. Sustenta que a receita municipal não supre toda a demanda de direitos sociais individuais, sendo necessário sobrepor o interesse coletivo para atender a estrutura mínima das necessidades essenciais de sobrevivência da coletividade. Argumenta que ao comprometer valores expressivos de forma imediata, canalizados em um único beneficiário para medicamentos de alto custo, o Município deixa de cobrir atendimento básico a centenas de cidadãos da municipalidade. Aduz que os medicamentos objeto da presente demanda, somado a outros processos similares, comprometem de forma absurda a receita municipal, deixando de fornecer diversos outros tratamentos, equipamentos e medicamentos já incluídos no orçamento e necessários para outros cidadãos. Assevera que é da União a responsabilidade pelo financiamento de tratamento oncológico, com base na decisão do Supremo Tribunal Federal no tema 793, que estabeleceu a solidariedade entre os entes federativos, mas determinou que a autoridade judicial deve direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências. Invoca o entendimento da 1ª Turma do STF nas Reclamações n. 49.890 e 50.414, que deixou clara a necessidade de litisconsórcio passivo da União em ações que pretendem medicamentos não padronizados e oncológicos. Argumenta que, tratando-se de medicamento oncológico de alto custo, a responsabilidade pelo financiamento é da União, razão pela qual o município deveria ser excluído do polo passivo. Por essas razões, requer seja reformada a sentença recorrida, determinando-se a inclusão da União no polo passivo da lide, com remessa dos autos à Justiça Federal, ou subsidiariamente, sejam julgados improcedentes os pedidos autorais. Sem preparo, ante a isenção legal. O terceiro apelante, ALEXANDER CORREA RODRIGUES, interpõe a apelação cível de movimentação n. 92, alegando que a sentença merece parcial reforma exclusivamente no tocante aos honorários advocatícios sucumbenciais. Sustenta que, tendo sido a sentença integralmente procedente, os honorários deveriam ser arbitrados com base no artigo 85, §3º, do Código de Processo Civil, que estabelece percentuais específicos para causas em que a Fazenda Pública é parte. Argumenta que o proveito econômico do autor corresponde a 670 salários-mínimos, considerando o valor da causa de R$ 909.336,24 (novecentos e nove mil trezentos e trinta e seis reais e vinte e quatro centavos), o que ensejaria a aplicação de honorários entre o mínimo de 8% e máximo de 10% sobre o valor do proveito econômico, conforme o inciso II do referido dispositivo. Invoca ainda a natureza alimentar dos honorários advocatícios, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal. Alternativamente, requer a aplicação do artigo 85, §8º-A, do Código de Processo Civil, que determina a observância dos valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, alegando que a tabela da OAB/GO indica, para matéria de advocacia em direito da saúde, o valor mínimo de R$ 9.000,00 (nove mil reais). Por essas razões, requer seja reformada a sentença recorrida, a fim de que os honorários sucumbenciais sejam arbitrados conforme os parâmetros do artigo 85, §3º, do CPC, variando entre R$ 72.720,00 (setenta e dois mil setecentos e vinte reais) e R$ 90.900,00 (noventa mil e novecentos reais), ou, subsidiariamente, com base no artigo 85, §8º-A, no valor mínimo de R$ 9.000,00 (nove mil reais), conforme tabela da OAB/GO. Sem preparo, eis que beneficiário da assistência judiciária. Foram apresentadas contrarrazões apenas por ALEXANDER CORREA RODRIGUES e pelo ESTADO DE GOIÁS, nas movimentações números 91 e 95, respectivamente, pleiteando os desprovimentos dos primeiros e terceiros recursos. Passo à análise concomitante das apelações cíveis e a remessa necessária. Em proêmio, acerca da competência para apreciar pedido do medicamento, o STF no julgamento do Tema nº 1234, fixou a tese no sentido de que: I – Competência 1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS, mas com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG – situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC. (…) Cumpre salientar que o STF modulou os efeitos da decisão, unicamente quanto ao deslocamento de competência (item 1 do acordo firmado na Comissão Especial), determinando que somente se apliquem aos feitos que forem ajuizados após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco. No caso em análise, aplica-se a modulação dos efeitos acima mencionada, pois a presente demanda foi ajuizada em 15/12/2022, ou seja, aproximadamente dois anos antes do julgamento do Tema 1234. Por conseguinte, revela-se competente a Justiça Estadual para o processamento e julgamento da presente ação. Feita esta consideração, destaco que a questão central da controvérsia sofreu significativa alteração superveniente, que impacta diretamente no julgamento do mérito recursal, especificamente no tocante ao pedido de obrigação de fazer. Conforme manifestação do autor, constante da movimentação n. 145, datada de 25 de fevereiro de 2025, houve expressa comunicação de que os medicamentos Dabrafenibe e Trametinibe, objetos da inicial e da sentença ora recorrida, não mais se mostram eficazes para o tratamento de sua enfermidade. Segundo novo laudo médico emitido pela Dra. Veridiana Pires de Camargo, CRM-SP 113.175, tornou-se necessária a substituição dos fármacos anteriormente prescritos pelo medicamento RELATLIMABE (Opdualag), na dosagem de 160g, para melhor atender às necessidades terapêuticas do requerente. Tal circunstância configura hipótese de perda superveniente do interesse processual da obrigação de fazer. A perda superveniente do objeto processual constitui causa extintiva do processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil, configurando-se quando os fatos posteriores à propositura da demanda tornam impossível ou desnecessária a prestação jurisdicional originalmente requerida. No presente caso, a alteração do quadro clínico do autor, que tornou inútil a medicação objeto da inicial, evidencia inequívoca perda do interesse processual superveniente, uma vez que a tutela jurisdicional pleiteada perdeu sua utilidade prática e concreta para a solução do conflito que motivou o ajuizamento da ação. Conforme leciona Nelson Nery Junior, “a perda superveniente do objeto torna sem efeito qualquer pronunciamento jurisdicional sobre o mérito da controvérsia, inclusive em sede recursal” (Código de Processo Civil Comentado). Assim, reconhecida a carência de ação por perda do objeto, impõe-se, com relação à obrigação de fazer (fornecimento da medicação DABRAFENIBE e TRAMETINIBE), a extinção do processo sem resolução do mérito, restando prejudicado o julgamento do primeiro e segundo recursos de apelação nessa parte. A propósito do assunto, imperiosa a redação do art. 493, caput, do Código de Processo Civil, segundo o qual: Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão. Transcrevo, ainda, o art. 485, VI, do mesmo diploma: Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (…) VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual; E o artigo 157 do Regimento Interno desta Corte: Art. 157. Julgar-se-á prejudicada a pretensão quando houver cessado sua causa determinante ou já estiver sido plenamente alcançada em outra via, judicial ou não. Assim, a superveniência de fato que retira a utilidade da tutela jurisdicional específica reclamada impede o prosseguimento do feito quanto ao objeto originalmente pleiteado. A respeito do assunto, assim se manifesta este Sodalício: (…) II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Determinar se a alteração do quadro clínico da parte autora, que tornou desnecessário o uso do medicamento pleiteado, configura perda superveniente do objeto processual, ensejando a extinção do processo sem resolução de mérito e prejudicando o juízo de retratação. III. RAZÕES DE DECIDIR 1. A perda superveniente do objeto processual constitui causa extintiva do processo sem resolução do mérito quando fatos posteriores à propositura da demanda tornam impossível ou desnecessária a prestação jurisdicional originalmente requerida. 2. A alteração do quadro clínico que tornou inútil a medicação evidencia inequívoca perda do interesse processual superveniente, uma vez que a tutela jurisdicional pleiteada perdeu sua utilidade prática e concreta. (…) IV. TESE(S) 1. A perda superveniente do interesse processual decorrente de alteração do quadro clínico que torna desnecessário o medicamento pleiteado enseja a extinção do processo sem resolução de mérito. (…) V. DISPOSITIVO Remessa necessária conhecida e provida. Apelação cível prejudicada. Processo extinto sem resolução de mérito. Juízo de retratação prejudicado. (TJGO, AC e RN n. 5338611-78.2021.8.09.0072, 7ª Câmara Cível, de minha relatoria, 06/06/25). (…) A perda superveniente do interesse processual, decorrente da cessação da necessidade de uso do medicamento pleiteado, justifica a extinção do processo sem resolução de mérito. (TJGO, Remessa Necessária Cível 0455509-64.2007.8.09.0134, Rel. Des. ALGOMIRO CARVALHO NETO, 5ª Câmara Cível, julgado em 26/05/2025). (…) Há perda parcial do objeto do mandado de segurança quando a autoridade impetrada efetiva administrativamente as progressões pleiteadas, permanecendo o interesse dos impetrantes, contudo, em relação à declaração do direito de que os efeitos pessoais/funcionais das progressões retroajam até as datas que os substituídos cumpriram o requisito legal, bem como que os efeitos financeiros sejam considerados a partir de 20/05/2022, data de impetração do mandamus. (…) SEGURANÇA CONCEDIDA EM PARTE. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimentos Especiais -> Procedimentos Regidos por Outros Códigos, Leis Esparsas e Regimentos -> Mandado de Segurança Coletivo 5295516-83.2022.8.09.0000, Rel. Des. José Ricardo Marcos Machado, 1ª Câmara Cível, julgado em 05/12/2022, DJe de 05/12/2022) (…) Impetrada a segurança e sobrevindo fato posterior que, consequentemente, acarrete falta de interesse processual, como a disponibilização e transferência da substituída em vaga hospitalar para realização de cirurgia antes da concessão da liminar, a extinção do processo sem resolução de mérito é medida que se impõe, por perda superveniente do objeto. Aplicação do artigo 6º, § 5º, da Lei nº 12.016/2009 combinado com os artigos 493, caput e 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, e com o artigo 157, do Regimento Interno deste Tribunal. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimentos Especiais -> Procedimentos Regidos por Outros Códigos, Leis Esparsas e Regimentos -> Mandado de Segurança Cível 5218180-03.2022.8.09.0000, Rel. Des. Altair Guerra da Costa, 6ª Câmara Cível, julgado em 05/09/2022, DJe de 05/09/2022) Oportunamente, cito os ensinamentos do processualista Daniel Amorim Assumpção Neves: A ideia de interesse de agir, também chamado de interesse processual, está intimamente associada à utilidade da prestação jurisdicional que se pretende obter com a movimentação da máquina jurisdicional. Cade ao autor demonstrar que o provimento jurisdicional pretende será capaz de lhe proporcionar uma melhora em uma situação fática, o que será o suficiente para justificar o tempo, a energia e o dinheiro que serão gastos pelo Poder Judiciário na resolução da demanda. (…). Não se deve analisar se o autor tem efetivamente o direito que alega ter e que, portanto, se sagrará vitorioso da demanda, porque esse é tema pertinente ao mérito e não às condições da ação. O juiz deve analisar em abstrato e hipoteticamente se o autor, sagrando-se vitorioso, terá efetivamente a melhora que pretendeu obter com o pedido de concessão da tutela jurisdicional que formulou por meio do processo. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil, 4 ed. rev. Atual. E ampl.; Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método; 2012; p. 95 e 96). Destaco que, em consulta ao sítio eletrônico do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, verifico que o autor já ajuizou nova demanda sob o n. 1001293-98.2025.4.01.3507, requerendo especificamente o fornecimento da nova medicação (Opdualag), o que reforça a configuração da perda superveniente do objeto quanto ao pedido de obrigação de fazer nos presentes autos. Dessarte, cessada a causa determinante que originou o pedido de obrigação de fazer (fornecimento dos medicamentos DABRAFENIBE e TRAMETINIBE), ante a inutilidade atual da medicação postulada, dada a alteração do quadro clínico do autor, impõe-se a extinção do feito sem resolução do mérito quanto à obrigação de fazer. No que se refere ao pedido de indenização por danos morais, merece prosperar a irresignação do primeiro apelante. A análise detida dos autos revela que o autor não demonstrou a prática de ato ilícito por parte do poder público, elemento essencial para a configuração da responsabilidade civil extracontratual. Embora na movimentação n. 7 dos autos o magistrado de primeiro grau tenha determinado que o autor emendasse a inicial para comprovar o indeferimento administrativo, o demandante limitou-se a informar que "ainda não houve resposta do Departamento de Saúde", sem ao menos demonstrar que foi formulado requerimento administrativo formal perante os réus. Sequer foram indicados os números dos supostos protocolos dos requerimentos administrativos. Cumpre destacar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 566.471/RN (Tema 06), estabeleceu requisitos cumulativos para o fornecimento de medicamento registrado na ANVISA mas não padronizado no SUS, sendo o primeiro deles a prova da “negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item '4' do Tema 1234 da repercussão geral”. Vejamos a tese fixada: 1. A ausência de inclusão de medicamento nas listas de dispensação do Sistema Único de Saúde - SUS (RENAME, RESME, REMUME, entre outras) impede, como regra geral, o fornecimento do fármaco por decisão judicial, independentemente do custo. 2. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação: (a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa, nos termos do item '4' do Tema 1234 da repercussão geral (...). A ausência de comprovação da negativa administrativa prévia inviabiliza não apenas o reconhecimento do direito ao fornecimento do medicamento, como também afasta a configuração de ato ilícito apto a ensejar reparação por danos morais. Não se pode falar em conduta antijurídica dos entes públicos quando sequer foi demonstrado que houve negativa de fornecimento na esfera administrativa. Assim, não há que se falar em condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Quanto aos honorários advocatícios fixados na sentença, considerando que o pedido de obrigação de fazer restou prejudicado pela perda superveniente do interesse processual e que o pedido de danos morais deve ser julgado improcedente, impõe-se a inversão da sucumbência, devendo o autor arcar com os honorários advocatícios em favor dos réus. Contudo, por ser beneficiário da assistência judiciária gratuita, a exigibilidade de tal verba permanecerá suspensa enquanto perdurar seu estado de hipossuficiência. Nesse contexto, resta prejudicado o terceiro recurso de apelação, interposto pelo autor, que querer a majoração dos honorários sucumbenciais. Ao teor do exposto, conheço da remessa necessária e dou-lhe provimento para reconhecer a perda superveniente do interesse processual em relação à obrigação de fazer (fornecimento dos medicamentos DABRAFENIBE e TRAMETINIBE) e, quanto a esse pedido, julgar extinto o processo sem resolução de mérito, a propósito do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. Julgo prejudicada a primeira apelação na parte em que se insurge quanto ao pedido de obrigação de fazer e dou-lhe provimento na parte em que se insurge contra a condenação em danos morais, para reformar a sentença fustigada, a fim de julgar improcedente o pedido indenizatório, por ausência de demonstração de ato ilícito do poder público, bem como para inverter os ônus sucumbenciais, observando-se a condição suspensiva de inexigibilidade, por ser o autor beneficiário da assistência judiciária. Julgo prejudicadas a segunda e terceira apelações. Certificado o trânsito em julgado, determino a remessa dos autos ao juízo de origem, com as respectivas baixas necessárias, inclusive desta relatoria no Sistema do Processo Judicial Digital. É o voto. Goiânia, datado e assinado digitalmente. Desembargador SEBASTIÃO LUIZ FLEURY Relator ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de duplo grau de jurisdição e tripla apelação cível, acordam os componentes da Quarta Turma Julgadora da Sétima Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade de votos, em conhecer da remessa necessária e provê-la, conhecer em parte do primeiro recurso e, nessa parte, provê-lo e julgar prejudicados o segundo e terceiro recursos, nos termos do voto do Relator. Votaram, além do Relator, o Dr. Ricardo Prata (subst. do Des. Fabiano Abel de Aragão Fernandes) e o Des. Sérgio Mendonça de Araújo. Presidiu a sessão a Desembargadora Ana Cristina Ribeiro Peternella França. Fez-se presente, como representante da Procuradoria-Geral de Justiça, o Dr. Benedito Torres Neto. Goiânia, datado e assinado digitalmente. Desembargador SEBASTIÃO LUIZ FLEURY Relator EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DE SAÚDE. REMESSA NECESSÁRIA E TRIPLA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS ONCOLÓGICOS. RELATÓRIO MÉDICO INDICANDO A INEFICÁCIA DOS MEDICAMENTOS PLEITEADOS. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE NEGATIVA ADMINISTRATIVA PRÉVIA. ATO ILÍCITO NÃO DEMONSTRADO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária e tripla apelação cível contra sentença que julgou procedente ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, condenando os réus ao fornecimento dos medicamentos Dabrafenibe e Trametinibe para tratamento de melanoma metastático e ao pagamento de danos morais no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Determinar se: (i) a alteração do quadro clínico que tornou desnecessário o uso dos medicamentos pleiteados configura perda superveniente do interesse processual; (ii) a ausência de comprovação de negativa administrativa prévia impede a condenação por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A perda superveniente do interesse processual constitui causa extintiva do processo sem resolução do mérito quando fatos posteriores à propositura da demanda tornam impossível ou desnecessária a prestação jurisdicional originalmente requerida. 4. A alteração do quadro clínico do autor, que tornou inútil a medicação, evidencia inequívoca perda do interesse processual superveniente em relação ao pedido de obrigação de fazer (fornecimento dos medicamentos DABRAFENIBE e TRAMETINIBE), uma vez que a tutela jurisdicional pleiteada perdeu sua utilidade prática e concreta. 5. A ausência de comprovação da negativa administrativa prévia afasta a configuração de ato ilícito apto a ensejar reparação por danos morais. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Remessa necessária provida. Primeira apelação parcialmente conhecida e, nessa parte, provida. Segunda e terceira apelações prejudicadas. Tese de julgamento: 1. A perda superveniente do interesse processual decorrente de alteração do quadro clínico, que torna desnecessário o medicamento pleiteado na inicial, enseja a extinção do processo sem resolução de mérito. 2. A ausência de comprovação da negativa administrativa prévia afasta a configuração de ato ilícito apto a ensejar reparação por danos morais em ações de fornecimento de medicamentos. _____________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 109, I; CPC, arts. 485, VI, 487, I, 493, caput, 85, §§ 2º, 3º, I, 4º, I, 8º e 8º-A, 292 e 496, I; Lei 9.494/97, art. 1º-F; Lei 11.960/2009; Lei 10.742/2003; EC 113/2021, art. 3º; Lei 12.016/2009, art. 6º, § 5º; Regimento Interno TJGO, art. 157; Súmulas 54 e 362/STJ. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 1.366.243/SC (Tema 1234); STF, RE 855178 (Tema 793); STF, RE 566.471/RN (Tema 06); STF, Reclamações 49.890 e 50.414; TJGO, AC e RN 5338611-78.2021.8.09.0072, 7ª Câmara Cível; TJGO, RN 0455509-64.2007.8.09.0134, 5ª Câmara Cível; TJGO, MS 5295516-83.2022.8.09.0000, 1ª Câmara Cível; TJGO, MS 5218180-03.2022.8.09.0000, 6ª Câmara Cível.

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Melaene Durcelina De Oliveira e outros x Biomedical Produtos Cientificos Medicos E Hospitalares S A

ID: 333864762

Tribunal: TRT3 Órgão: 9ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO Nº Processo: 0010364-24.2025.5.03.0009

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA THALES BITTENCOURT DE BARCELOS

Polo Passivo:

BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTIFICOS MEDICOS E HOSPITALARES S A

Notificação

Advogados:

ANA LUIZA PEREIRA FERNANDES

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DENISE FERREIRA MARCONDES

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GLAUCUS LEONARDO VEIGA SIMAS

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CAIO GABRIEL FERREIRA MARCONDES

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 9ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE ATOrd 0010364-24.2025.5.03.0009 AUTOR: MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA RÉU: B… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 9ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE ATOrd 0010364-24.2025.5.03.0009 AUTOR: MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA RÉU: BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTIFICOS MEDICOS E HOSPITALARES S A INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 4431530 proferida nos autos. Submetidos a julgamento, os pedidos formulados por MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA em desfavor de BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTIFICOS MEDICOS E HOSPITALARES S A a Meritíssima Juíza do Trabalho ÉRICA APARECIDA PIRES BESSA proferiu esta SENTENÇA: I – RELATÓRIO. MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA, devidamente qualificada, ajuizou, em 30/04/2025, ação trabalhista em face de BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTÍFICOS MÉDICOS E HOSPITALARES S A, e alegou, em síntese, que foi admitida pela reclamada, em 01/03/2024, para exercer as funções de assistente de operações de vendas, sendo arbitrariamente dispensada em 10/12/2024, em momento de extrema vulnerabilidade, doente e portadora de grave moléstia esclerose múltipla; aduziu que a abusiva demissão da reclamante ainda doente vem lhe causando inúmeros transtornos, sobretudo a insegurança diante da provável perda e/ou tempo limitado do Plano de Saúde, e a possibilidade da interrupção do fornecimento de remédio vital a sua sobrevivência, Natalizumabe, estimado na exorbitante quantia em torno de R$9.000,00 (nove mil reais), do qual se valerá por toda a vida, sob pena de inúmeras e temíveis sequelas, e até mesmo a morte; requereu a nulidade da dispensa e o pagamento de indenização por danos morais e materiais. Formulou os pedidos elencados no rol da exordial (ID. 9211e25, fls. 2/17 do PDF). Atribuiu à causa o valor de R$80.000,00. Decisão de tutela antecipada, ID. 08b5bf8, fls. 204/205 do PDF, na qual este juízo, diante da necessidade de subsistência da trabalhadora, concedeu a antecipação dos efeitos da tutela e determinou que a reclamada procedesse à reintegração da reclamante aos seus quadros, na mesma função anterior ou em função compatível, com a doença, garantidos os mesmos direitos, benefícios, inclusive quanto ao plano de assistência médica, e salários anteriores e observados, ainda, eventuais reajustes concedidos por norma coletiva, no prazo de 30 dias, após a ciência da publicação da decisão, nos moldes determinados, sob pena de multa diária de R$100,00 (cem reais), limitada a R$10.000,00 (dez mil reais) revertida em benefício da obreira. Regularmente notificada, a reclamada compareceu à audiência, ID. 1e6ce9e, fls. 461/466 PDF. Rejeitada a proposta de conciliação, foi recebida a defesa (ID. 8814b37, fls. 208/249 do PDF), na qual a reclamada arguiu preliminares e contestou os pedidos. Designada perícia médica. Impugnação aos documentos coligida pelo reclamante no ID. 89e60a2, fls. 689/703 do PDF. A reclamada comprovou a reintegração da reclamante, ID. 80bbdfc, fls. 783/795 do PDF. Laudo pericial coligido no ID. 2fb45fd, fls. 796/816 do PDF e esclarecimentos sob ID. 3b315c9, fls. 856/859 do PDF. Noticiada a distribuição de Mandado de Segurança pela reclamada, sendo, no entanto, indeferida a petição inicial (Lei 12.016/2009, art. 10) por não ser o caso de mandado de segurança (OJs nºs 04 da SDI 1 do TRT da 3ª Região, 64 e 142 da SDI 2 do TST e os arts. 6º, § 5º, 10 e 24 da Lei 12.016/2009), ID. 59c0a68, fls. 866/890 do PDF. Na audiência de instrução, ID. f68bb79, fls. 905/907 do PDF, presentes as partes, com respectivos procuradores. Colhido o depoimento pessoal da preposta da reclamada e de duas testemunhas. Sem mais provas a produzir, foi encerrada a instrução processual. Razões finais orais. Conciliação final rejeitada. É o breve relatório. Passo a decidir. II – FUNDAMENTOS. II.1 – QUESTÃO DE ORDEM. Elucido que as citações de folhas ao longo desta decisão referem-se à respectiva página do arquivo em PDF, do processo virtual, baixado em ordem crescente e cronológica. II.2 – INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. A reclamada alegou inépcia da petição inicial, sob o argumento de que a reclamante apresentou pedido genérico de indenização de danos materiais; de que a obreira promoveu a juntada de documentos aos autos de forma desorganizada, com arquivos repetidos e em posição invertida. Acrescentou ser a peça de ingresso prolixa e confusa, com repetição de fundamentos jurídicos, sem qualquer conexão lógica com os pedidos formulados. O art. 840, §1º, da CLT determina que a petição inicial trabalhista deverá conter uma breve exposição dos fatos, dos quais decorram logicamente os pedidos, em adstrição aos princípios da celeridade, oralidade, informalidade e economia processual. Desse modo, inepta é a inicial que contenha vícios no pedido ou causa de pedir, de forma a impedir que a parte contrária responda aos termos da demanda e que o juízo apreenda o efeito jurídico pretendido. Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho: "AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO MUNICÍPIO DE MOGI DAS CRUZES. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 . INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL . ARTIGO 840, § 1º, DA CLT. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que, quanto aos requisitos de validade da petição inicial, prevalece o princípio da simplicidade inscrito no art. 840, § 1º, da CLT, segundo o qual basta ao Autor inserir na petição inicial uma breve exposição dos fatos de que resulte a controvérsia. II. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento, com aplicação da multa de 1% sobre o valor da causa atualizado, em favor da parte Agravada ex adversa , com fundamento no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015" (Ag-RR-1000834-17.2021.5.02.0374, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 08/11/2024). "AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CORREÇÃO MONETÁRIA - REQUISITO DO ARTIGO 896, § 1º-A, INCISO I, DA CLT. NÃO OBSERVÂNCIA. TRANSCRIÇÃO DA ÍNTEGRA DO CAPÍTULO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INVIABILIDADE. Com efeito, cumpre registrar que, no presente caso, a decisão agravada aplicou o óbice contido no art. 896, § 1º-A, I, da CLT. De fato, a transcrição integral dos fundamentos do acórdão recorrido, sem indicação expressa e destacada do trecho que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista, não atende o disposto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT. Precedentes. Agravo interno a que se nega provimento. AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL - PRINCÍPIO DA SIMPLICIDADE . Nota-se que a decisão agravada, tal como proferida, está em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior. Isso porque, prevalece no processo do trabalho os princípios da informalidade e simplicidade, podendo ser a reclamação escrita ou verbal e ajuizada pelo próprio empregado, nos termos do disposto no art. 840, § 1º, da CLT. Assim, a peça inicial trabalhista, segundo o princípio da simplicidade, deve conter uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio e o respectivo pedido. Nesse contexto, a indicação clara e expressa de causa de pedir e pedido, na exordial, não prejudica a sua análise, nem redunda em inépcia da inicial, nem cerceamento de defesa, de modo que não há se falar em violação a dispositivo constitucional ou legal. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RRAg-674-18.2017.5.23.0001, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 08/11/2024). (grifei) Não verifico na peça de ingresso qualquer defeito que impossibilite a análise do mérito ou a contestação da reclamada que, por sua vez, apresentou defesa útil, não havendo prejuízo ao contraditório. A incorreção apontada quanto à orientação do extrato previdenciário - Portal CNIS, ID. 539dd20, fls. 31/40, foi devidamente suprida mediante a pesquisa realizada por este juízo junto ao sistema PREVJUD, com a juntada dos documentos de ID. ce3e13e, fls. 468/483 do PDF, sem qualquer prejuízo para as partes. Além disso, reverencia-se o princípio da primazia do mérito, norma fundamental sobre a qual se embasou o CPC/15. Ademais, ao revés da tese suscitada pela reclamada, o pedido de indenização por danos materiais foi devidamente fundamentado e liquidado. O dispositivo legal não exige apresentação de memória de cálculos e a reclamada não demonstrou nenhuma incompatibilidade entre o valor atribuído aos pedidos e a ordem de grandeza da pretensão. As questões invocadas serão averiguadas no mérito e, a ausência do apontado, na inicial, não caracteriza imprecisão do pedido. Rejeito, portanto, a preliminar. II.3 – LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES LIQUIDADOS NA INICIAL. A reclamada requereu que eventual condenação seja limitada aos valores liquidados na petição inicial e, em contrapartida, impugnou o valor da causa. As importâncias atribuídas aos pedidos na exordial, no âmbito do Processo do Trabalho, constituem mera estimativa econômica das pretensões, sendo relevantes para se aferir o rito processual a ser adotado (Lei nº 9.957/00), a recorribilidade ou não das decisões proferidas nos autos (causa de alçada, art. 2° da Lei n. 5.584/70), bem como a base de cálculo das custas processuais e dos honorários de sucumbência (art. 789 da CLT). Por conseguinte, a indicação de valores na peça de ingresso não limita o montante de condenação a ser apurado oportunamente em regular liquidação da sentença. Com efeito, trata-se de cumprimento das disposições contidas no art. 840, §1º, da CLT, o qual estabelece a formulação do pedido, na petição inicial, de forma certa, determinada e com indicação do respectivo valor, sem qualquer exigência de apresentação de memória de cálculos, tampouco de liquidação dos pleitos. Nesse sentido, a orientação contida no art. 12, §2º, da Instrução Normativa n. 41/2018 do TST estabelece que: "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil.". Ademais, no tocante ao rito sumaríssimo, analisando a questão, o Tribunal Regional do Trabalho desta 3ª Região, ao editar a Tese Jurídica Prevalecente n. 16, pacificou o entendimento de que "os valores indicados na petição inicial, conforme exigência do art. 852-B, I, da CLT, configuram estimativa para fins de definição do rito processual a ser seguido e não um limite para apuração das importâncias das parcelas objeto de condenação, em liquidação de sentença". Cito, ainda, o julgado do Tribunal Superior do Trabalho, de relatoria do Excelentíssimo Senhor Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão: "RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS EXPRESSAMENTE NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. REGISTRO DE MERA ESTIMATIVA QUANTO ÀS QUANTIAS ATRIBUÍDAS AOS PEDIDOS. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA E SISTEMÁTICA DO ARTIGO 840, §1º, DA CLT. OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 322, 324 E 492 DO CPC. PRINCÍPIOS DA INFORMALIDADE E SIMPLICIDADE QUE REGEM O PROCESSO DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. O artigo 840, §1º, da CLT, com a redação conferida pela Lei nº 13.467/2017, dispõe que: " Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante ". Tal regra deverá ser interpretada de modo consentâneo com os princípios que regem o Processo do Trabalho - em especial o da informalidade e simplicidade - , para que assim seja definida sua real finalidade. Além disso, sua aplicação não pode ser realizada de forma isolada, mas sim em conjunto com os demais preceitos constantes do ordenamento jurídico pátrio, a exemplo dos artigos 322, 324 e 492 do CPC, que auxiliam na objetivação do sentido e alcance da norma. Desse modo, numa primeira análise literal do artigo 840, §1º, da CLT, notadamente da expressão " com a indicação do seu valor ", enxerga-se, de fato, o intuito de estabelecer o ônus da parte em determinar o quantum pleiteado na lide trabalhista, sem que se obrigue, porém, a liquidação, com exatidão, dos pedidos. Outrossim, o próprio artigo 324 da lei adjetiva civil, com incidência no Processo do Trabalho, permite, em determinados casos, a formulação de pretensões genéricas (sem especificação da quantidade, qualidade ou valor). Entende-se, assim, que, frente a ocasiões que impossibilitem à parte a indicação precisa do valor do pedido, é razoável permitir sua delimitação por mera estimativa, com o intuito de atender a exigência contida no artigo 840, §1º, da CLT, desde que, para tanto, apresente justificativa no bojo da peça de ingresso. É a conclusão que também se depreende do artigo 12, §3º, da Instrução Normativa nº 41/2018 do TST. Por óbvio, haverá sempre a necessidade de observância da diretriz do artigo 492 do CPC, segundo o qual " é vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado ". Entretanto, o estabelecimento dos limites da lide levará em consideração a correta interpretação do pedido, que, segundo o artigo 322 do mesmo diploma processual, " considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé ". No caso concreto, constata-se que o reclamante consignou expressamente na inicial que " os valores atribuídos aos seus pedidos são meras estimativas de valores, não devendo, portanto, ser considerados como limites em caso de condenação ". Logo, a Corte de origem, ao concluir que os valores atribuídos às referidas pretensões devem ser considerados para fins de limitação da condenação, dissentiu do posicionamento desta Corte, razão pela qual merece reforma a decisão regional. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1000316-67.2022.5.02.0705, 7ª Turma, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 15/09/2023). Pelo exposto, rejeito a preliminar. II.4 – NULIDADE DA DISPENSA. Nos termos da inicial, a reclamante foi admitida pela reclamada, em 01/03/2024, para exercer as funções de assistente de operações de vendas, sendo arbitrariamente dispensada em 10/12/2024, em momento de extrema vulnerabilidade, doente e portadora de grave moléstia esclerose múltipla, razão pela qual a dispensa perpetrada afigura-se discriminatória. Arguiu a nulidade da dispensa e requereu seja determinada a sua imediata reintegração aos quadros da reclamada, restabelecimento do plano de saúde e pagamento das verbas devidas no período. Pois bem. O cerne da questão não repousa sobre eventual nexo de causalidade entre a doença da reclamante e o trabalho e sequer sobre a sua incapacidade ou aptidão para o exercício das atividades, como pretende fazer crer a reclamada. A pretensão fundamenta-se no alegado caráter discriminatório e preconceituoso da dispensa, tendo em vista o fato de a obreira ser portadora de doença grave. Esclareço que o portador de doença grave não é detentor de estabilidade ou garantia de emprego. Entretanto, o ordenamento jurídico, em atenção aos princípios da dignidade do trabalhador e continuidade da relação de trabalho, oferece proteção em face da dispensa ocorrida em razão da doença. A ausência de regulamentação da dispensa arbitrária, cuja previsão encontra-se no art. 7º, "I", da Constituição Federal, propicia situações em que seja possível a ocultação dos reais motivos da dispensa, ao argumento da permissividade do ordenamento com a dispensa sem justificativa. Assim, embora a resilição contratual ocorra em razão da doença, o empregador promove a dispensa sem justa causa, amparado por permissivo legal. Nesses casos, trata-se de trabalhador exposto a condição ainda mais vulnerável em razão da doença grave, o que justifica o caráter expansionista da esfera de proteção jurídica. Assim, presume-se como discriminatória a dispensa de empregado portador de doença grave que suscite estigma ou preconceito. Entendimento consolidado pelo Tribunal Superior do Trabalho na Súmula 443: PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego. Nesse contexto, a presunção da discriminação impõe ao empregador o ônus de comprovar os motivos que o levaram à resilição contratual. Presunção que também se justifica no princípio da aptidão para a prova. Registro que a justificativa não se trata propriamente das hipóteses tipificadas no art. 482 da CLT, mas em razões objetivas de caráter disciplinar, técnico, econômico ou financeiro, que tornaram necessária a dispensa do trabalhador. Assim, incumbe ao empregador comprovar a ocorrência de circunstâncias que permitam a conclusão de que a doença não foi o motivo determinante da resilição contratual sem justa causa e sim, outras razões razoáveis de cunho diverso. Caso contrário, presume-se que houve diferenciação do trabalhador com doença grave, para fins de manutenção da relação de trabalho sem fundamento objetivo, o que induz o tratamento discriminatório. No caso dos autos, não há qualquer indício de que a rescisão contratual tenha ocorrido por motivo técnico, financeiro, ou qualquer outra questão objetiva. O ASO expedido, em 28/02/2023 (ID. 9991dda, fl. 293 do PDF) foi realizado apenas de maneira clínica, sem exames complementares, com o parecer de “apto para função”, sem verificação de doença, ocupacional ou não, anterior. O relatório médico de ID. 64d9060, fls. 137/138 do PDF atesta que a reclamante encontra-se sob cuidados neurológicos devido à Esclerose Múltipla Remitente Recorrente (CID 10 G35), diagnóstico realizado através de avaliação clínica, radiológica e laboratorial conforme os Critérios de Mcdonald modificados. Relata ainda que a obreira apresentou primeiro surto em 2022, com melhora parcial, e nos últimos 12 meses apresentou 4 surtos incapacitantes, sendo 2 com sequelas. Consigna, por fim, que atualmente a paciente apresenta EDSS (escore de incapacidade) de 2.5, e apresenta como sequelas de surtos prévios: nistagmo horizontal, episódios de diplopia (visão dupla), desequilíbrio e instabilidade postural - que resultam em risco de quedas - urge incontinência urinária e alterações em reflexos osteotendíneos. Também apresenta, como sintoma paroxístico, episódios intermitentes de fraqueza em membro superior e inferior esquerdo. Outrossim, asseverou o perito médico designado por este juízo, conforme laudo de ID. 2fb45fd, fls. que a reclamante apresentou durante o contrato com a reclamada quadro depressivo e esclerose múltipla, não havendo elementos técnicos que justifiquem a existência de nexo causal ou concausal entre o trabalho na reclamada e a depressão ou a esclerose múltipla. Destacou que ambas as doenças têm etiologia multifatorial e concluiu: “A esclerose múltipla da reclamante já apresentava manifestações clínicas antes mesmo da contratação pela reclamada, embora o diagnóstico só tenha sido efetivamente estabelecido em setembro de 2024 após investigação neurológica adequada. O curso clínico da esclerose múltipla é tipicamente flutuante e imprevisível, com possibilidade de períodos de estabilidade intercalados com episódios de piora. As limitações neurológicas atualmente observadas na reclamante consistem em diplopia, diminuição de força do lado esquerdo do corpo e prejuízo da propriocepção. Tais limitações não tornam a reclamante inapta para o trabalho, mas dificultam a realização do trabalho e o deslocamento casa-trabalho. Trata-se de uma doença complexa, estigmatizante e que demanda não só suporte médico, mas também compreensão social e, sempre que possível, adaptações laborais que contribuam para a preservação da autonomia e da qualidade de vida do paciente. Quando viável, o trabalho em home-office é uma boa opção para estes casos.” Por outro lado, o ASO expedido, em 09/12/2024 (exame demissional), e juntado aos autos pela reclamada sob ID. bdb6b1c, fl. 302 do PDF é precário, pois acrescido de parecer positivo de “apto para a função”, entretanto destituído de procedimentos médicos a que foi submetida a reclamante, incluídos os respectivos exames complementares, nos moldes como determina o item 7.5.19.5, “c” da NR da Portaria 3.214/78 do MTE. A definição da doença a ser considerada grave, de maneira a gerar estigma ou preconceito, deve ser analisada no caso concreto, sobretudo tendo em vista que as práticas discriminatórias elencadas na Lei 9.029/95 são meramente exemplificativas. O Tribunal Superior do Trabalho, em diversas decisões, tem firmado entendimento no sentido de que a esclerose múltipla trata-se de doença estigmatizante, razão pela qual é ônus do empregador a prova de que a dispensa não se deu de forma discriminatória, na esteira da citada Súmula nº 443 daquela Corte Superior. Nesse sentido, transcrevo as seguintes ementas: (...) EMPREGADO DIAGNOSTICADO COM ESCLEROSE MÚLTIPLA. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. SÚMULA Nº 443 DO TST. A controvérsia cinge-se a definir se a dispensa do autor, diagnosticado com esclerose múltipla, teve caráter discriminatório. A jurisprudência desta Corte entende ser presumidamente discriminatória a dispensa, sem justa causa, de trabalhador com doença grave ou estigmatizante, invertendo-se, assim, o ônus da prova, de forma a atribuir à empresa a comprovação de que a dispensa não ocorrera de forma discriminatória. O entendimento consagrado no referido verbete sumular tem a finalidade de conferir eficácia ao princípio fundamental da continuidade da relação de emprego (artigo 7º, inciso I, da Constituição Federal) e proteger os trabalhadores que se encontrem em situações de vulnerabilidade, impondo ao empregador uma obrigação negativa, qual seja a comprovação robusta de que a dispensa não possui contorno discriminatório, alegando, para tanto, motivos técnicos, econômicos ou financeiros, buscando, assim, evitar a dispensa do empregado com dificuldades de reinserção no mercado de trabalho e concretizar o comando constitucional da busca do pleno emprego. Desse modo, na hipótese dos autos, constata-se que foi imputado, equivocadamente, ao autor o ônus da prova da conduta discriminatória por parte do empregador e, por ausência de prova nesse sentido, decidiu-se contra ele. Nesse contexto, a decisão da Turma, ao considerar discriminatória a dispensa do autor, está em consonância com a Súmula nº 443 desta Corte, razão pela qual não merece reforma. Agravo desprovido. (Ag-ED-E-ED-RR-11176-71.2014.5.01.0053, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Redator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 01/09/2023).". (grifei) "1. NULIDADE PROCESSUAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. 2. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. SÚMULAS 126 E 443 DO TST. DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR QUE DENEGA SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE REVISTA. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. Quanto à arguição de nulidade por negativa de prestação jurisdicional, o Tribunal Regional atendeu ao comando do art. 93, IX, da CF/1988, uma vez que a decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada. Na verdade, o Reclamado, ora Agravante, se insurge contra o posicionamento adotado pela Corte de origem no exame da matéria controvertida. Contudo, a discordância quanto à decisão proferida, a má apreciação das provas ou a adoção de posicionamento contrário aos interesses da parte não são causa de nulidade processual. II. No que se refere ao tema “dispensa discriminatória”, na hipótese, a Corte Regional esclareceu que, “ não comprovado que a dispensa ocorreu por motivo plausível, razoável e justificável, não vinculado ao estado de saúde da obreira, prevalece a presunção de seu caráter discriminatório, atraindo, assim, a incidência da Súmula nº 443 do TST”. Apenas com o revolvimento de fato e provas seria possível chegar à conclusão diversa da estabelecida no acórdão recorrido, o que atrai sobre o apelo o óbice da Súmula 126 do TST. III. Acresça-se que esta Corte Superior tem jurisprudência firmada no sentido de que a esclerose múltipla é doença incurável, de natureza degenerativa e progressiva, com possibilidade de causar estigma, razão pela qual é ônus do empregador a prova de que a dispensa não se deu de forma discriminatória, na esteira da Súmula nº 443 do TST. IV. Ademais, a jurisprudência desta Corte Superior, interpretando a Lei nº 9.029/95, entende que se presume discriminatória a dispensa de portador de enfermidade grave, quando o empregador tiver conhecimento de tal condição, a teor do entendimento sedimentado na Súmula nº 443 desta Corte. Logo, ileso o 5º, II, da CF. V. Fundamentos da decisão agravada não desconstituídos, confirmando-se a instranscendência da causa. VI. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento" (AIRR-0000976-60.2020.5.10.0015, 4ª Turma , Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 01/07/2024). "AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR ARBITRADO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA. Caso em que, em decisão monocrática, foi provido o recurso de revista do Reclamante, para, reconhecendo a hipótese de dispensa discriminatória, por se tratar de empregado portador de esclerose múltipla, doença estigmatizante, condenar a Reclamada ao pagamento indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O Tribunal Regional registrou que o Reclamante recebeu como último salário contratual o valor de R$ 5.743,54. O montante arbitrado a título de compensação por dano moral atende aos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade e está em consonância com jurisprudência consolidada no âmbito desta 5ª Turma, levando-se em consideração o julgamento de casos análogos em que houve o reconhecimento de dispensa discriminatória. Julgados. Ademais, os critérios previstos no artigo 223-G da CLT possuem natureza meramente orientativa, não vinculando o julgamento, tal como decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nºs 6.050, 6.069 e 6.082, que tratam sobre a constitucionalidade dos artigos. 223-A, 223-B e 223-G, § 1º, da CLT. Por fim, certo é que a reanálise do conjunto fático-probatório dos autos, com a finalidade de se concluir pela desproporcionalidade do montante arbitrado, tal como pretende o Agravante, esbarra no óbice da Súmula 126/TST. Nesse contexto, não afastados os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo merece a decisão. Agravo não provido, com acréscimo de fundamentação" (Ag-RRAg-1235-83.2018.5.09.0005, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 30/08/2024). (grifei) "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - DOENÇA GRAVE (ESCLEROSE MÚLTIPLA) - NULIDADE DA DESPEDIDA - REINTEGRAÇÃO DEVIDA. TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA NÃO EVIDENCIADA. O processamento do recurso de revista na vigência da Lei nº 13.467/2017 exige que a causa apresente transcendência com relação aos aspectos de natureza econômica, política, social ou jurídica (artigo 896-A da CLT). Sucede que, pelo prisma da transcendência, o recurso de revista empresarial não atende a nenhum dos requisitos referidos. No caso, não há transcendência política, porque a Corte Regional, tendo consignado que o reclamante é portador de doença grave (esclerose múltipla), da qual a empregadora tinha ciência, que ele foi despedido imotivadamente e que não foi infirmada por prova em contrário a presunção de despedida discriminatória, premissas insuscetíveis de revisão por este Tribunal, nos termos da Sumula 126 do TST, concluiu configurada a dispensa discriminatória do empregado por doença grave. Assim, a decisão proferida pela Corte regional está em consonância com Súmula nº 443 do TST, bem como em sintonia com a jurisprudência uniforme desta Corte, ao concluir que compete ao empregador o ônus da prova de que a dispensa não foi discriminatória, na medida em que há a presunção relativa de ser arbitrária e discriminatória a despedida imotivada de empregado portador de doença grave que cause estigma ou preconceito, nos moldes da aludida Súmula, não tendo a empregadora, na hipótese, comprovado que o ato da dispensa não guardou relação com a enfermidade do trabalhador. Ademais, não se verifica o preenchimento dos requisitos de natureza econômica, social ou jurídica a justificar o conhecimento do apelo. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...) (RRAg-1001293-65.2019.5.02.0058, 7ª Turma, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 20/11/2020). (grifei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. ESCLEROSE MÚLTIPLA. O acórdão regional foi prolatado em consonância com a Súmula nº 443 do TST, tendo em vista que a presunção do caráter discriminatório da dispensa da reclamante, empregada portadora de esclerose múltipla, doença grave e estigmatizante, não foi desconstituída pela demonstração de que a despedida decorreu de motivação lícita, não vinculada à saúde da trabalhadora. Agravo de instrumento conhecido e não provido" (AIRR-100739- 89.2016.5.01.0026, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 15/09/2017). Destaco, ainda, as considerações do perito médico acerca do significativo estigma social que paira sobre pessoas acometidas da esclerose múltipla: “É importante destacar que o diagnóstico de esclerose múltipla, além dos desafios físicos, frequentemente impõe um significativo estigma social, notadamente pela falta de conhecimento da sociedade. Nesse contexto, campanhas de conscientização, como o Agosto Laranja, desempenham um papel fundamental para a disseminação de informações precisas, o enfrentamento do preconceito e o empoderamento dos pacientes, suas famílias e cuidadores. O diagnóstico precoce, o início rápido do tratamento e a adoção de hábitos saudáveis são medidas essenciais para a modulação do curso da doença, prevenção de surtos e controle dos sintomas. Do ponto de vista funcional, a reclamante não apresenta incapacidade formal para o trabalho. Sob a ótica da Psiquiatria Forense, inclusive, está estável. Todavia, a esclerose múltipla é reconhecidamente uma doença de evolução incerta e potencialmente incapacitante, que demanda acompanhamento médico contínuo, sendo uma condição que pode trazer graves limitações futuras e dificuldades adaptativas. Pacientes com esclerose múltipla frequentemente enfrentam desafios para o deslocamento físico, especialmente quando há distúrbios motores, sensoriais ou visuais. Assim, em casos como o da reclamante, o trabalho remoto, quando viável, é uma alternativa geralmente recomendada para a manutenção da inserção do indivíduo no mercado de trabalho. Conforme consignou o Excelentíssimo Desembargador Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto, relator do Mandado de Segurança MSCiv 0012948-91.2025.5.03.0000, impetrado pela reclamada, a “dispensa imotivada da reclamante, obstativa da obtenção de novo auxílio-doença previdenciário (B-31) e sua possível conversão em aposentadoria por invalidez pelo INSS, haja vista a gravidade de doença identificada (progressiva e potencialmente incapacitante) foi nitidamente discriminatória (art. 4º, I e II da Lei 9.029/1995) e violou direitos fundamentais (arts. 1º, II, III e IV, 6º, 7º, XXII, 196 e 201, I e III da CF)”. O desconhecimento do estado de saúde prévio da reclamante não altera o posicionamento ora adotado, visto que os resultados dos exames médicos e complementares são privativos da obreira (arts. 8º e 168, § 5º da CLT c/c o art. 76 do Código de Ética Médica, Resolução CFM nº 2.217/2018 e a aplicação analógica da Súmula nº 244, I do Tribunal Superior do Trabalho) e sua divulgação indevida constitui violação de seu direito de intimidade (art. 5º, X da CF/88). De todo modo, a própria reclamada, em contestação, informou que estava ciente de que a obreira estava acometida de doença psicológica, o que por si só é suficiente para evidenciar a discriminação. Ausente qualquer justificativa para a extinção do contrato, entendo que o empregador não se desincumbiu do ônus de afastar a presunção de discriminação do ato da dispensa de empregada portadora de doença estigmatizante. Elucido que a prova oral produzida nos autos não socorreu a reclamada, porquanto a própria preposta da reclamada admitiu que a unidade em que a reclamante trabalhava permanece aberta. Com efeito, apenas o setor em que a obreira era lotada foi transferido de localidade. Sendo assim, possível a realocação da autora em outro setor, compatível com sua condição de saúde. Ademais, ambas as testemunhas indicadas pela empresa sequer souberam informar o critério utilizado para dispensa dos empregados, em virtude da alegada reestruturação empresarial. A primeira testemunha ouvida, Sra. Karen Alessandra da Silva e Souza, tampouco soube informar a quantidade de funcionários dispensados. Ademais, a segunda testemunha arrolada, Sr. Jonas Batista Toscano, declarou que foi remanejado de setor, assim como a colega Jamália, logo quando da ocorrência das alterações empresariais e suposta diminuição do quadro de funcionários no setor em que a reclamante estava lotada. O poder potestativo do empregador encontra limites na ordem legal e constitucional. Ao desamparar a reclamante, diante do seu quadro clínico, em momento que mais necessitava de cuidados, entendo que o empregador atentou frontalmente contra os princípios da não-discriminação e da dignidade. Por conseguinte, mantenho a determinação de reintegração da reclamante, proferida nos termos da decisão de ID. 08b5bf8, fls. 204/205 do PDF, nos quadros da reclamada, na mesma função anterior ou em função compatível com a doença, garantidos os mesmos direitos, benefícios, inclusive quanto ao plano de assistência médica, e salários anteriores e observados, ainda, eventuais reajustes concedidos por norma coletiva. Considerando-se a manutenção do contrato, defiro as seguintes verbas trabalhistas, observados os limites do pedido, devidas a partir de 10/12/2024, data da dispensa imotivada (ID. fed3d3a, fl. 139 do PDF), até 18/06/2025, data da reintegração (e-social de ID. a297833, fl. 785 do PDF): a) salários vencidos de forma simples; b) décimo terceiro; c) férias acrescidas do terço constitucional; d) FGTS a ser depositado na conta vinculada da reclamante. II.5 – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. A reclamante requereu o pagamento de indenização por danos morais em razão da dispensa abusiva e discriminatória. O pedido foi contestado pela reclamada. Em se tratando de dano extrapatrimonial, diante da impossibilidade de se demonstrar concretamente a ofensa a um bem jurídico personalíssimo e desprovido de materialidade, admite-se que basta a comprovação do fato suficiente a causar vilipêndio aos direitos da personalidade ínsitos à condição de pessoa humana, bem como a existência de conduta ilícita e do nexo de causalidade entre a conduta e a lesão. Consoante exposto em tópico anterior, a conduta ilícita da reclamada foi constatada, tendo em vista o reconhecimento da dispensa discriminatória da reclamante, portadora de doença grave. A lesão decorre da situação de a empregada estar doente e ter sido desamparada e achar-se sem fonte de sustento no momento em que mais precisa. Soma-se ao exposto a configuração no presente caso da lesão moral, presumida em razão da constatação da ilicitude da conduta e do nexo de causalidade, de forma a constituir o "danun in re ipsa", sendo desnecessária a prova do sofrimento íntimo da vítima. Assevero, que não cabe ao Poder Judiciário chancelar nenhuma conduta que possa resultar em um único tratamento discriminatório e desrespeitoso. É dever do Estado combater as práticas discriminatórias e garantir o pleno gozo dos direitos e garantias fundamentais tão arduamente conquistados. As decisões judiciais têm caráter punitivo pedagógico e exercem importante influência junto à sociedade no combate à discriminação e na disseminação da cultura do respeito ao Estado Democrático de Direito no qual vivemos. Neste contexto, evidenciados o dano extrapatrimonial, o nexo de causalidade e a atitude indevida da reclamada, acolho o pedido. As Convenções 110, 111, 98, 155 e 190 da Organização Internacional do Trabalho estabelecem normas sobre proteção à saúde, garantia de igualdade de gênero, combate às discriminações e ao tratamento diferenciado infundado, garantias de liberdade de expressão, sindical, participativa e normas contra o assédio moral organizacional, em prol de um meio ambiente de trabalho seguro e hígido. O conjunto de bens jurídicos tutelados, valores e dimensões da vida humana (dentre os quais a intimidade, a personalidade, o gênero, a autoestima, a privacidade e a própria vida, a incolumidade física e moral, o direito à desconexão etc.), cujas violações devem ser reparadas pela aplicação do instituto da responsabilidade por danos morais ou extrapatrimoniais, devem ser deduzidos da integralidade do ordenamento jurídico e dos valores compartilhados em nossa sociedade. Registro que na compensação do dano extrapatrimonial, deve o julgador atentar para extensão da ofensa e grau de culpabilidade do agente, a situação das partes (econômica e social), notadamente o porte financeiro do ofensor/empregador, as circunstâncias dos fatos e seu efeito multiplicador, o caráter pedagógico-punitivo da indenização, bem como a repercussão da ofensa na vida da vítima/empregado. Por conseguinte, com fundamento nos artigos 186, 187 e 927 do CC c/c art. 8º, §1º, da CLT, defiro à reclamante indenização por danos morais, no importe de R$10.000,00 (dez mil reais), considerando, os incisos do art. 223-G da CLT, mormente a extensão da ofensa e o grau de culpabilidade do agente, bem com a situação da empregadora, notadamente o porte financeiro e ainda as circunstâncias dos fatos e seu efeito multiplicador e o caráter pedagógico-punitivo da indenização. II.6 – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. Em se tratando de danos materiais, cabia à reclamante comprovar a diminuição do patrimônio que efetivamente sofreu, nos termos do artigo 402 do Código Civil, seja o prejuízo imediato (perdas e danos), seja o que razoavelmente deixou de ganhar (lucros cessantes). Na inicial, não foram apontados gastos suportados pela reclamante em razão da doença, sejam despesas médicas ou qualquer outro prejuízo imediato que pudesse ensejar o ressarcimento dos valores despendidos. No que se refere aos lucros cessantes, o laudo médico de ID. 2fb45fd, fls. 796/816 do PDF foi conclusivo em afirmar que a reclamante se encontra apta para o trabalho. Não há nos autos outros elementos que indiquem redução da capacidade, ainda que mínima. Por todo o exposto, indefiro à reclamante a indenização por danos materiais pretendida, uma vez que não foram comprovados prejuízos imediatos nem redução da capacidade laborativa. II.7 – BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. A atual redação do art. 790, §4º, da CLT assegura os benefícios da justiça gratuita à pessoa física que comprovar a insuficiência de recursos para pagamento das custas do processo. Presume-se, desde logo, tal condição àqueles que percebam salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, conforme disposto no §3º do art. 790 da CLT. Ademais, o Tribunal Superior do Trabalho, no julgamento do Tema 21 do Incidente de Recursos Repetitivos (IRR) aprovou a seguinte tese: I - independentemente de pedido da parte, o magistrado trabalhista tem o poder-dever de conceder o benefício da justiça gratuita aos litigantes que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, conforme evidenciado nos autos; II - o pedido de gratuidade de justiça, formulado por aquele que perceber salário superior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, pode ser instruído por documento particular firmado pelo interessado, nos termos da Lei nº 7.115/83, sob as penas do art. 299 do Código Penal; III - havendo impugnação à pretensão pela parte contrária, acompanhada de prova, o juiz abrirá vista ao requerente do pedido de gratuidade de justiça, decidindo, após, o incidente (art. 99, § 2º, do CPC) (grifei) Uma vez que o reclamante recebia salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, conforme e-social de ID. 5dea93c, fl. 793 do PDF, concedo-lhe os benefícios da justiça gratuita. II.8 – HONORÁRIOS PERICIAIS. Os honorários da perícia são devidos pela parte sucumbente quanto ao objeto da prova técnica, nos termos do art. 790-B da CLT, cabendo ao juiz aplicar a norma ao caso concreto, não se vinculando à conclusão do expert. Sucumbente a reclamada, arcará com os honorários periciais, os quais arbitro em R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), em favor do perito THALES BITTENCOURT DE BARCELOS . A verba honorária deverá ser atualizada consoante as diretrizes fixadas no art. 1º da Lei nº 6.899/81, conforme entendimento consubstanciado na Orientação Jurisprudencial n. 198 da SBDI-1 do TST, excluindo-se, contudo, a incidência de juros de mora. II.9 – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. Considerando a procedência parcial dos pedidos, são devidos honorários de sucumbência, nos termos do §3º, do art. 791-A da CLT, em prol de um dos procuradores da reclamante, os quais arbitro em 10%, diante da complexidade da demanda e zelo do profissional, a incidirem sobre o valor líquido da condenação, nos moldes da Orientação Jurisprudencial n. 348 da SBDI-1 do TST. Devidos, ainda, honorários de sucumbência, a um dos procuradores da reclamada, também arbitrados em 10%, sobre o valor total atribuído aos pedidos julgados totalmente improcedentes, os quais, todavia, ficarão sob condição suspensiva pelo prazo de dois anos, após o trânsito em julgado desta decisão, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de mérito da ADI n. 5.766. A declaração de inconstitucionalidade pela Suprema Corte apenas da expressão “desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa”, contida no §4º do art. 790 da CLT, afasta a interpretação de que a simples percepção de créditos judiciais descaracterizaria a condição de hipossuficiência da parte, assegurando-se, ainda, a garantia fundamental de acesso amplo ao Poder Judiciário (art. 5o, LXXIV, Constituição Federal). Nesse sentido, cito a seguinte jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho: "RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA . PROCESSO SOB A ÉGIDE DAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. RECLAMANTE BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. ART. 791-A, § 4º, DA CLT, INCLUÍDO PELA LEI 13.467/2017. JULGAMENTO DA ADI-5766 PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSÃO: "DESDE QUE NÃO TENHA OBTIDO EM JUÍZO, AINDA QUE EM OUTRO PROCESSO, CRÉDITOS CAPAZES DE SUPORTAR A DESPESA". A hipossuficiência econômica ensejadora do direito à gratuidade judiciária consiste na insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, sem comprometer o mínimo dispensável à própria subsistência da Parte ou de sua família, expressão do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). No âmbito do direito processual do trabalho, a realização do acesso à Justiça ao trabalhador hipossuficiente e beneficiário da justiça gratuita busca assegurar, no plano concreto, a efetividade dos direitos sociais trabalhistas, conferindo-lhes real sentido, com a consequente afirmação da dignidade da pessoa humana, da paz social e da redução das desigualdades sociais. Em vista da relevância do direito à gratuidade da justiça, com embasamento em preceitos da Constituição Federal de 1988, este Relator sempre entendeu pela flagrante inconstitucionalidade do § 4º do art. 791-A da CLT, por afronta direta ao art. 5º, XXXV, LXXIV, da CF/88. Isso porque a efetividade da norma contida no caput do artigo 791-A da CLT não pode se sobrepor aos direitos fundamentais do acesso à Justiça e da justiça gratuita (art. 5º, XXXV e LXXIV, da CF) - integrantes do núcleo essencial da Constituição da República e protegidos pela cláusula pétrea disposta no art. 60, § 4º, IV, da CF -, que visam a equacionar a igualdade das partes dentro do processo e a desigualdade econômico-social dos litigantes, com o fim de garantir, indistintamente, a tutela jurisdicional a todos, inclusive aos segmentos sociais vulneráveis, hipossuficientes e tradicionalmente excluídos do campo institucionalizado do Direito. Em virtude disso, inclusive, este Relator havia suscitado o incidente de inconstitucionalidade de referido dispositivo no âmbito desta 3ª Turma. Ocorre que, com o advento do recente julgamento da ADI 5766, pelo Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, que, por maioria, declarou inconstitucionais o caput e o § 4º do artigo 790-B da CLT, bem como do artigo 791-A, § 4º, da CLT, houve uma compreensão preliminar, pelo TST, a partir do teor da certidão de julgamento publicada em 20/10/2021, que a decisão abarcaria a inconstitucionalidade integral dos referidos dispositivos legais. Em razão disso, a matéria suscitada perante o Pleno no TST perdeu o objeto, tendo sido proferidas decisões no âmbito desta Corte. Ocorre que, publicado o acórdão principal do STF prolatado na ADI 5766, da lavra do Ministro Alexandre de Moraes, redator designado, e esclarecidos os pontos suscitados pela AGU nos Embargos de Declaração, verificou-se que a inconstitucionalidade do § 4º do art. 791-A da CLT não teve a extensão vislumbrada inicialmente pela jurisprudência desta Corte. Da leitura das decisões proferidas pelo STF, infere-se que a declaração de inconstitucionalidade abrangeu, em relação ao § 4º do art. 791-A da CLT, apenas a expressão "desde que não tenha obtido em Juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa". Assim, especificamente em relação aos honorários advocatícios sucumbenciais, depreende-se dos acórdãos prolatados na ADI 5766 que o § 4º do art. 791-A da CLT passou a vigorar com a seguinte redação: "vencido o beneficiário da justiça gratuita, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado, esse prazo, tais obrigações do beneficiário." Certo que a alteração da condição de hipossuficiência econômica do(a) trabalhador(a), ônus probatório do credor, não pode ser aquilatada a partir dos ganhos advindos de processo judicial. Assim, a modificação havida no § 4º do art. 791-A da CLT diz respeito à compreensão de que créditos judiciais - recebidos em qualquer processo - não são computáveis e não interferem na qualificação do obreiro como hipossuficiente. O estado de aptidão financeira do Reclamante deverá ser aferida - e provada pelo credor - por meio da existência de outros recursos financeiros alheios à percepção de créditos judiciais. Ademais, para a execução da obrigação, o credor tem o prazo de dois anos - após o trânsito em julgado da decisão que reconheceu o direito às obrigações decorrentes da sucumbência - para produzir a prova que lhe compete, ficando os encargos do devedor, nesse interregno, sob condição suspensiva de exigibilidade. Após o transcurso desse prazo, extinguem-se as obrigações do beneficiário da justiça gratuita. Dessa forma, na presente hipótese, reconhecida pela Instância Ordinária a condição de hipossuficiência econômica da Reclamante, com a concessão do benefício da justiça gratuita, a sua condenação ao pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais , a incidirem sobre os créditos obtidos na presente ação ou em outro processo , implica ofensa direta ao artigo 5º, XXXV, e LXXIV, da CF. Em respeito à decisão proferida pelo STF na ADI 5766, reafirmada na decisão proferida em embargos de declaração, conclui-se que, em relação aos honorários advocatícios sucumbenciais, fica suspensa a exigibilidade do seu pagamento pela Reclamante, beneficiária da justiça gratuita, que somente poderá ser executada se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que certificou as obrigações decorrentes de sua sucumbência, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, a referida obrigação da Reclamante. Reitere-se que a alteração da condição de hipossuficiência econômica do(a) trabalhador(a), ônus probatório do credor, não se verifica pela percepção de créditos advindos de processos judiciais. Assim, correta a decisão recorrida ao determinar "a suspensão de exigibilidade dos honorários advocatícios devidos pelo Reclamante, pelo prazo de dois anos subsequentes ao trânsito em julgado, extinguindo-se a obrigação após o decurso deste prazo, nos termos do art. 791-A, §4º, da CLT". Recurso de revista não conhecido" (RR-10157-87.2018.5.03.0003, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 01/09/2023). Desta feita, ressalvado o entendimento desta magistrada, observado o caráter vinculante da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, a parte beneficiária da gratuidade judiciária deve, em caso de sucumbência, ser condenada ao pagamento dos honorários advocatícios. Findo o prazo de dois anos, acaso não comprovada a extinção da situação de hipossuficiência econômica que ensejou a concessão dos benefícios da justiça gratuita à reclamante a obrigação será extinta. II.10 – PARÂMETROS DE LIQUIDAÇÃO. Sem prejuízo dos parâmetros fixados em capítulos próprios, a liquidação deverá observar os fixados neste, no que couber. a) Limites do pedido: Os valores atribuídos aos pleitos exordiais, tanto no rito sumaríssimo, quanto no ordinário, referem-se à mera estimativa do objetivo jurídico pretendido e não correspondem ao montante efetivamente devido, que, via de regra, somente será apurado em liquidação de sentença. Com efeito, o princípio da adstrição limita apenas os títulos e não os valores postulados. Logo, é inaplicável a limitação da condenação aos valores atribuídos aos pedidos iniciais. b) Atualização monetária: Relativamente à correção monetária e aos juros aplicáveis aos créditos trabalhistas ora deferidos, deve ser observado o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto das ADIs n. 5867 e 6.021 e ADCs n. 58 e 59, e as alterações dos artigos 389 e 406 do CC decorrentes da Lei nº 14.905/2024. Desse modo haverá incidência do IPCA-E e juros legais pela TR acumulada (art. 39, caput, da Lei nº 8.177, de 1991) na fase pré-judicial (item 6 da decisão do STF) e, a partir do ajuizamento da ação até 29/08/2024, será utilizada a taxa SELIC da Receita Federal, taxa essa que já incorpora atualização e juros de mora (item 7 da decisão do STF); a partir de 30/08/2024, a atualização observará a taxa legal prevista no art. 406 do CC e na Resolução CMN nº 5.171/24, com possibilidade de não incidência quando o resultado for igual a zero (item 5 da decisão do STF e artigos 389 e 406 do Código Civil). Nesse sentido, cito o seguinte julgado do Tribunal Superior do Trabalho: "RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. EXECUÇÃO. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DOS DÉBITOS TRABALHISTAS. ÍNDICE APLICÁVEL. Discute-se, no caso, a possibilidade de conhecimento do recurso de revista, por violação direta do art. 5º, II, da Constituição Federal, em razão da não observância da TRD estabelecida no art. 39 da Lei nº 8.177/91 para correção dos créditos trabalhistas. É pacífico, hoje, nesta Corte que a atualização monetária dos créditos trabalhistas pertence à esfera constitucional, ensejando o conhecimento de recurso de revista por violação do artigo 5º, II, da CF de forma direta, como o fez a e. 8ª Turma. Precedentes da SbDI-1 e de Turmas. Ademais, em se tratando de matéria pacificada por decisão do Supremo Tribunal Federal, com caráter vinculante, a sua apreciação, de imediato, se mostra possível, conforme tem decidido esta Subseção. No mérito, ultrapassada a questão processual e, adequando o julgamento da matéria à interpretação conferida pelo Supremo Tribunal Federal (ADC’s 58 e 59), bem como às alterações supervenientes promovidas pela Lei 14.905/2024 no Código Civil, com vigência a partir de 30/08/2024, e, considerando-se que, no presente caso, a e. 8ª Turma deu provimento ao recurso de revista da Fundação CEEE “para, reformando o acórdão regional, determinar a aplicação da TR como índice de atualização monetária dos créditos trabalhistas” (pág. 1327) e que aludido acórdão regional, em sede de agravo de petição, havia determinado a atualização monetária dos créditos trabalhistas pelo IPCA-E a partir de 30/06/2009 e TRD para o período anterior (vide págs. 1242-1250), impõe-se o provimento dos embargos, a fim de aplicar, para fins de correção dos débitos trabalhistas: a) o IPCA-E na fase pré-judicial acrescido dos juros de mora (art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991); b) a partir do ajuizamento da ação até 29/08/2024, a taxa SELIC, ressalvados os valores eventualmente pagos, nos termos da primeira parte do item "i" da modulação do STF, vedada a dedução ou compensação de eventuais diferenças pelo critério de cálculo anterior; c) a partir de 30/08/2024, no cálculo da atualização monetária, será utilizado o IPCA (art. 389, parágrafo único, do Código Civil); os juros de mora corresponderão ao resultado da subtração SELIC - IPCA (art. 406, parágrafo único, do Código Civil), com a possibilidade de não incidência (taxa 0), nos termos do § 3º do artigo 406. Recurso de embargos conhecido, por divergência jurisprudencial, e provido" (E-ED-RR-713-03.2010.5.04.0029, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 25/10/2024). Em relação à fase pré-judicial, o Supremo Tribunal Federal já esclareceu ser devida a utilização do IPCA-E acrescido dos juros legais (art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991), nos moldes ora determinados, conforme decisões proferidas nas seguintes reclamações: Rcl 50117/RS. Relator: Min. Nunes Marques, DJe de 19/04/2022; Rcl 52842 AgR/SP.AgR. na Rcl. Relator: Min. Alexandre de Moraes, DJe 19/05/2022, Primeira Turma; Rcl 54.248, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 5.7.2022; Rcl 54.742, Min. Rel. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, DJe 26.7.22; Rcl 53.659, Min. Rel. Ricardo Lewandowski, DJe 3.6.2022; Rcl 54391/SP. Relator: Min. Nunes Marques, DJe de 03/08/2022; Rcl 52.437 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 9.8.2022; Rcl 52.729 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 20.9.2022. A fase pré-judicial é a que antecede o ajuizamento da ação, sendo, nessa ocasião, inaugurada a fase judicial, aspecto esclarecido no julgamento dos embargos de declaração aviados em razão do julgamento das ADCs n. 58 e 59, e ADIs n. 5.867 e 6.021. No tocante à indenização por danos morais, considerando que o Supremo Tribunal Federal não fez distinção quanto à natureza do crédito trabalhista para efeito de aplicação da tese fixada no julgamento das aludidas ADC's, cabe esclarecer que se faz incidente unicamente a atualização pela taxa SELIC da Receita Federal, a contar do ajuizamento da ação, critério que deve ser observado até 29/08/2024, haja vista o advento da Lei 14.905/2024; a partir de 30/08/2024, a atualização observará a taxa legal prevista no art. 406 do CC e na Resolução CMN nº 5.171/24, com possibilidade de não incidência quando o resultado for igual a zero (item 5 da decisão do STF e artigos 389 e 406 do Código Civil). Sendo assim, não há se aplicar índices na fase pré- judicial quanto à indenização por danos morais. Conforme entendimento jurisprudencial consolidado na Súmula n. 200 do TST, a base de cálculo dos juros de mora corresponde ao valor total bruto da condenação, sem exclusão das deduções fiscais e previdenciárias. Inexiste regra que estabeleça a dedução da contribuição previdenciária antes do cálculo dos juros de mora. Também deverá ser observado o disposto na Súmula n. 381 do TST. c) Contribuição previdenciária: As contribuições previdenciárias incidirão sobre as parcelas de natureza salarial deferidas nesta decisão, mês a mês (art. 43, § 3º, da Lei nº 8.212/91) – salários vencidos de forma simples; décimo terceiro –, conforme art. 28 da Lei nº 8.212/91, autorizada a dedução da cota parte devida pela parte autora, mediante comprovação nos autos pela reclamada, até o dia 2 do mês seguinte ao da liquidação da sentença, nos termos do art. 276 do Decreto nº 3.048/99. Devida, ainda, a incidência das contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional das férias ora deferidas, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o Tema 985 do Ementário da Repercussão Geral. O fato gerador das contribuições previdenciárias para fatos ocorridos a partir de 05/03/2009 (data da vigência da MP nº 449/2008) é a data da prestação dos serviços, com apuração mês a mês, regime de competência, sujeito à aplicação das alíquotas respectivas, limites máximos de salário-contribuição e com as consequências daí decorrentes (como juros moratórios e multa), pela falta de pagamento na época própria (Lei nº 8.212/91, artigos 20, 22, I, 30, I, "b", 35 e 43, § 2º). Os recolhimentos previdenciários deverão ser efetuados e comprovados na forma da Lei nº 11.941/09 e da Súmula n. 368 do TST, sob pena de execução direta pela quantia equivalente (art. 114, inciso VIII, da Constituição Federal). Haverá incidência de juros de mora caso a reclamada não recolha as contribuições previdenciárias até o dia 02 do mês seguinte do pagamento, Súmula n. 368 do TST. d) Imposto de renda: O recolhimento do imposto de renda deverá ser comprovado pela reclamada na forma determinada pelo art. 46 da Lei nº 8.541/92 e será suportado pelo reclamante sobre as parcelas aqui deferidas, mês a mês, sendo tributado exclusivamente na fonte, no mês do recebimento ou crédito, em separado dos demais rendimentos recebidos no mês (art. 12-A da Lei nº 7.713/88 e artigos 26, 43 e 44 da IN nº 1.500/2014 da Receita Federal do Brasil), sob pena de ofício à DRRF. Ressalto que os juros de mora não configuram renda e proventos de qualquer natureza, mas meros componentes indissociáveis do valor total da indenização, motivo pelo qual devem ser excluídos da incidência do imposto de renda, diante de sua natureza indenizatória, conforme previsto no art. 404 do CC e na Orientação Jurisprudencial n. 400 da SBDI-I do TST. e) FGTS: Conforme previsto no art. 15 da Lei nº 8.036/90 e consoante entendimento consubstanciado nas Súmulas n. 63 e n. 305 e nas Orientações Jurisprudenciais n. 42 e n. 195 da SBDI-1, todas do Tribunal Superior do Trabalho, a base de cálculo do FGTS, com a respectiva multa de 40% consiste na remuneração do empregado, computando-se as parcelas de natureza salarial e parcelas reflexas. Os valores devidos a título de FGTS e correspondente à indenização de 40% deverão ser depositados na conta vinculada da parte autora, nos termos dos artigos 26, parágrafo único, e 26-A da Lei nº 8.036/90. Nesse sentido também é a jurisprudência consolidada do TST, reafirmada por meio por meio da seguinte tese fixada no Tema 68 (RRAg - 0000003-65.2023.5.02.0201) da sistemática dos recursos repetitivos: Nas reclamações trabalhistas, os valores relativos aos recolhimentos do FGTS e da respectiva indenização de 40% devem ser depositados na conta vinculada, e não pagos diretamente ao trabalhador. III – CONCLUSÃO. Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos deduzidos por MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA em desfavor de BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTÍFICOS MÉDICOS E HOSPITALARES S A para, I) manter a determinação de reintegração da reclamante, proferida nos termos da decisão de ID. 08b5bf8, fls. 204/205 do PDF, nos quadros da reclamada, na mesma função anterior ou em função compatível com a doença, garantidos os mesmos direitos, benefícios, inclusive quanto ao plano de assistência médica, e salários anteriores e observados, ainda, eventuais reajustes concedidos por norma coletiva; II) condenar a reclamada a pagar à reclamante, em até 48 horas após o trânsito em julgado, conforme se apurar em liquidação de sentença, com juros sobre o principal corrigido a partir do primeiro dia útil do mês subsequente ao trabalhado, autorizados os descontos legais cabíveis e observados os limites do pedido, tudo nos termos da fundamentação supra, que integra este dispositivo independentemente de transcrição: a) verbas trabalhistas devidas a partir de 10/12/2024, data da dispensa imotivada (ID. fed3d3a, fl. 139 do PDF), até 18/06/2025, data da reintegração (e-social de ID. a297833, fl. 785 do PDF), quais sejam, salários vencidos de forma simples; décimo terceiro; férias acrescidas do terço constitucional; FGTS a ser depositado na conta vinculada da reclamante; b) indenização por danos morais, no importe de R$10.000,00 (dez mil reais). As parcelas deferidas serão apuradas em liquidação de sentença, observadas as diretrizes estabelecidas nesta decisão. Deferidos os benefícios da justiça gratuita à reclamante. Sucumbente a reclamada, arcará com os honorários periciais, os quais arbitro em R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), em favor do perito THALES BITTENCOURT DE BARCELOS .A verba honorária deverá ser atualizada consoante as diretrizes fixadas no art. 1º da Lei nº 6.899/81, conforme entendimento consubstanciado na Orientação Jurisprudencial n. 198 da SBDI-1 do TST, excluindo-se, contudo, a incidência de juros de mora. Considerando a procedência parcial dos pedidos, são devidos honorários de sucumbência, nos termos do §3º, do art. 791-A da CLT, em prol de um dos procuradores da reclamante, os quais arbitro em 10%, diante da complexidade da demanda e zelo do profissional, a incidirem sobre o valor líquido da condenação, nos moldes da Orientação Jurisprudencial n. 348 da SBDI-1 do TST. Devidos, ainda, honorários de sucumbência, a um dos procuradores da reclamada, também arbitrados em 10%, sobre o valor total atribuído aos pedidos julgados totalmente improcedentes, os quais, todavia, ficarão sob condição suspensiva pelo prazo de dois anos, após o trânsito em julgado desta decisão, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de mérito da ADI n. 5.766. Findo o prazo de dois anos, acaso não comprovada a extinção da situação de hipossuficiência econômica que ensejou a concessão dos benefícios da justiça gratuita à reclamante a obrigação será extinta. O recolhimento do imposto de renda deverá ser comprovado pelo reclamado, na forma determinada pelo art. 46 da Lei nº 8.541/1992, sendo tributado exclusivamente na fonte, no mês do recebimento ou crédito (art. 12-A, da Lei nº 7.713/88 e art. 2º, II e § 1º, da IN nº 1.127/2011, da Receita Federal do Brasil), sob pena de ofício à DRRF. Declaro, para os fins do art. 832, §3º, da CLT, que, incidem contribuição previdenciária, sobre as seguintes parcelas objeto da condenação: salários vencidos de forma simples; décimo terceiro. Devida, ainda, a incidência das contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional das férias ora deferidas, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o Tema 985 do Ementário da Repercussão Geral. As demais parcelas têm natureza indenizatória. Custas, pela reclamada, no importe de R$500,00 calculadas sobre R$25.000,00 valor arbitrado à condenação. A União, a propósito dos encargos previdenciários e fiscais, será intimada desta decisão, ao término da execução trabalhista, somente se o valor final da execução total, nesta se compreendendo os créditos trabalhistas e de qualquer outra natureza, superar o limite a partir do qual sua intimação se torne, por lei, obrigatória. Intimem-se as partes e o perito. Nada mais. Encerrou-se. BELO HORIZONTE/MG, 23 de julho de 2025. ERICA APARECIDA PIRES BESSA Juíza Titular de Vara do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA

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Melaene Durcelina De Oliveira e outros x Biomedical Produtos Cientificos Medicos E Hospitalares S A

ID: 333864785

Tribunal: TRT3 Órgão: 9ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO Nº Processo: 0010364-24.2025.5.03.0009

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA THALES BITTENCOURT DE BARCELOS

Polo Passivo:

BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTIFICOS MEDICOS E HOSPITALARES S A

Notificação

Advogados:

ANA LUIZA PEREIRA FERNANDES

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DENISE FERREIRA MARCONDES

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GLAUCUS LEONARDO VEIGA SIMAS

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CAIO GABRIEL FERREIRA MARCONDES

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 9ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE ATOrd 0010364-24.2025.5.03.0009 AUTOR: MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA RÉU: B… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 9ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE ATOrd 0010364-24.2025.5.03.0009 AUTOR: MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA RÉU: BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTIFICOS MEDICOS E HOSPITALARES S A INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 4431530 proferida nos autos. Submetidos a julgamento, os pedidos formulados por MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA em desfavor de BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTIFICOS MEDICOS E HOSPITALARES S A a Meritíssima Juíza do Trabalho ÉRICA APARECIDA PIRES BESSA proferiu esta SENTENÇA: I – RELATÓRIO. MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA, devidamente qualificada, ajuizou, em 30/04/2025, ação trabalhista em face de BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTÍFICOS MÉDICOS E HOSPITALARES S A, e alegou, em síntese, que foi admitida pela reclamada, em 01/03/2024, para exercer as funções de assistente de operações de vendas, sendo arbitrariamente dispensada em 10/12/2024, em momento de extrema vulnerabilidade, doente e portadora de grave moléstia esclerose múltipla; aduziu que a abusiva demissão da reclamante ainda doente vem lhe causando inúmeros transtornos, sobretudo a insegurança diante da provável perda e/ou tempo limitado do Plano de Saúde, e a possibilidade da interrupção do fornecimento de remédio vital a sua sobrevivência, Natalizumabe, estimado na exorbitante quantia em torno de R$9.000,00 (nove mil reais), do qual se valerá por toda a vida, sob pena de inúmeras e temíveis sequelas, e até mesmo a morte; requereu a nulidade da dispensa e o pagamento de indenização por danos morais e materiais. Formulou os pedidos elencados no rol da exordial (ID. 9211e25, fls. 2/17 do PDF). Atribuiu à causa o valor de R$80.000,00. Decisão de tutela antecipada, ID. 08b5bf8, fls. 204/205 do PDF, na qual este juízo, diante da necessidade de subsistência da trabalhadora, concedeu a antecipação dos efeitos da tutela e determinou que a reclamada procedesse à reintegração da reclamante aos seus quadros, na mesma função anterior ou em função compatível, com a doença, garantidos os mesmos direitos, benefícios, inclusive quanto ao plano de assistência médica, e salários anteriores e observados, ainda, eventuais reajustes concedidos por norma coletiva, no prazo de 30 dias, após a ciência da publicação da decisão, nos moldes determinados, sob pena de multa diária de R$100,00 (cem reais), limitada a R$10.000,00 (dez mil reais) revertida em benefício da obreira. Regularmente notificada, a reclamada compareceu à audiência, ID. 1e6ce9e, fls. 461/466 PDF. Rejeitada a proposta de conciliação, foi recebida a defesa (ID. 8814b37, fls. 208/249 do PDF), na qual a reclamada arguiu preliminares e contestou os pedidos. Designada perícia médica. Impugnação aos documentos coligida pelo reclamante no ID. 89e60a2, fls. 689/703 do PDF. A reclamada comprovou a reintegração da reclamante, ID. 80bbdfc, fls. 783/795 do PDF. Laudo pericial coligido no ID. 2fb45fd, fls. 796/816 do PDF e esclarecimentos sob ID. 3b315c9, fls. 856/859 do PDF. Noticiada a distribuição de Mandado de Segurança pela reclamada, sendo, no entanto, indeferida a petição inicial (Lei 12.016/2009, art. 10) por não ser o caso de mandado de segurança (OJs nºs 04 da SDI 1 do TRT da 3ª Região, 64 e 142 da SDI 2 do TST e os arts. 6º, § 5º, 10 e 24 da Lei 12.016/2009), ID. 59c0a68, fls. 866/890 do PDF. Na audiência de instrução, ID. f68bb79, fls. 905/907 do PDF, presentes as partes, com respectivos procuradores. Colhido o depoimento pessoal da preposta da reclamada e de duas testemunhas. Sem mais provas a produzir, foi encerrada a instrução processual. Razões finais orais. Conciliação final rejeitada. É o breve relatório. Passo a decidir. II – FUNDAMENTOS. II.1 – QUESTÃO DE ORDEM. Elucido que as citações de folhas ao longo desta decisão referem-se à respectiva página do arquivo em PDF, do processo virtual, baixado em ordem crescente e cronológica. II.2 – INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. A reclamada alegou inépcia da petição inicial, sob o argumento de que a reclamante apresentou pedido genérico de indenização de danos materiais; de que a obreira promoveu a juntada de documentos aos autos de forma desorganizada, com arquivos repetidos e em posição invertida. Acrescentou ser a peça de ingresso prolixa e confusa, com repetição de fundamentos jurídicos, sem qualquer conexão lógica com os pedidos formulados. O art. 840, §1º, da CLT determina que a petição inicial trabalhista deverá conter uma breve exposição dos fatos, dos quais decorram logicamente os pedidos, em adstrição aos princípios da celeridade, oralidade, informalidade e economia processual. Desse modo, inepta é a inicial que contenha vícios no pedido ou causa de pedir, de forma a impedir que a parte contrária responda aos termos da demanda e que o juízo apreenda o efeito jurídico pretendido. Nesse sentido, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho: "AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO MUNICÍPIO DE MOGI DAS CRUZES. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 . INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL . ARTIGO 840, § 1º, DA CLT. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que, quanto aos requisitos de validade da petição inicial, prevalece o princípio da simplicidade inscrito no art. 840, § 1º, da CLT, segundo o qual basta ao Autor inserir na petição inicial uma breve exposição dos fatos de que resulte a controvérsia. II. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento, com aplicação da multa de 1% sobre o valor da causa atualizado, em favor da parte Agravada ex adversa , com fundamento no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015" (Ag-RR-1000834-17.2021.5.02.0374, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 08/11/2024). "AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CORREÇÃO MONETÁRIA - REQUISITO DO ARTIGO 896, § 1º-A, INCISO I, DA CLT. NÃO OBSERVÂNCIA. TRANSCRIÇÃO DA ÍNTEGRA DO CAPÍTULO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INVIABILIDADE. Com efeito, cumpre registrar que, no presente caso, a decisão agravada aplicou o óbice contido no art. 896, § 1º-A, I, da CLT. De fato, a transcrição integral dos fundamentos do acórdão recorrido, sem indicação expressa e destacada do trecho que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista, não atende o disposto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT. Precedentes. Agravo interno a que se nega provimento. AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL - PRINCÍPIO DA SIMPLICIDADE . Nota-se que a decisão agravada, tal como proferida, está em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior. Isso porque, prevalece no processo do trabalho os princípios da informalidade e simplicidade, podendo ser a reclamação escrita ou verbal e ajuizada pelo próprio empregado, nos termos do disposto no art. 840, § 1º, da CLT. Assim, a peça inicial trabalhista, segundo o princípio da simplicidade, deve conter uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio e o respectivo pedido. Nesse contexto, a indicação clara e expressa de causa de pedir e pedido, na exordial, não prejudica a sua análise, nem redunda em inépcia da inicial, nem cerceamento de defesa, de modo que não há se falar em violação a dispositivo constitucional ou legal. Agravo interno a que se nega provimento" (Ag-RRAg-674-18.2017.5.23.0001, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 08/11/2024). (grifei) Não verifico na peça de ingresso qualquer defeito que impossibilite a análise do mérito ou a contestação da reclamada que, por sua vez, apresentou defesa útil, não havendo prejuízo ao contraditório. A incorreção apontada quanto à orientação do extrato previdenciário - Portal CNIS, ID. 539dd20, fls. 31/40, foi devidamente suprida mediante a pesquisa realizada por este juízo junto ao sistema PREVJUD, com a juntada dos documentos de ID. ce3e13e, fls. 468/483 do PDF, sem qualquer prejuízo para as partes. Além disso, reverencia-se o princípio da primazia do mérito, norma fundamental sobre a qual se embasou o CPC/15. Ademais, ao revés da tese suscitada pela reclamada, o pedido de indenização por danos materiais foi devidamente fundamentado e liquidado. O dispositivo legal não exige apresentação de memória de cálculos e a reclamada não demonstrou nenhuma incompatibilidade entre o valor atribuído aos pedidos e a ordem de grandeza da pretensão. As questões invocadas serão averiguadas no mérito e, a ausência do apontado, na inicial, não caracteriza imprecisão do pedido. Rejeito, portanto, a preliminar. II.3 – LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES LIQUIDADOS NA INICIAL. A reclamada requereu que eventual condenação seja limitada aos valores liquidados na petição inicial e, em contrapartida, impugnou o valor da causa. As importâncias atribuídas aos pedidos na exordial, no âmbito do Processo do Trabalho, constituem mera estimativa econômica das pretensões, sendo relevantes para se aferir o rito processual a ser adotado (Lei nº 9.957/00), a recorribilidade ou não das decisões proferidas nos autos (causa de alçada, art. 2° da Lei n. 5.584/70), bem como a base de cálculo das custas processuais e dos honorários de sucumbência (art. 789 da CLT). Por conseguinte, a indicação de valores na peça de ingresso não limita o montante de condenação a ser apurado oportunamente em regular liquidação da sentença. Com efeito, trata-se de cumprimento das disposições contidas no art. 840, §1º, da CLT, o qual estabelece a formulação do pedido, na petição inicial, de forma certa, determinada e com indicação do respectivo valor, sem qualquer exigência de apresentação de memória de cálculos, tampouco de liquidação dos pleitos. Nesse sentido, a orientação contida no art. 12, §2º, da Instrução Normativa n. 41/2018 do TST estabelece que: "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil.". Ademais, no tocante ao rito sumaríssimo, analisando a questão, o Tribunal Regional do Trabalho desta 3ª Região, ao editar a Tese Jurídica Prevalecente n. 16, pacificou o entendimento de que "os valores indicados na petição inicial, conforme exigência do art. 852-B, I, da CLT, configuram estimativa para fins de definição do rito processual a ser seguido e não um limite para apuração das importâncias das parcelas objeto de condenação, em liquidação de sentença". Cito, ainda, o julgado do Tribunal Superior do Trabalho, de relatoria do Excelentíssimo Senhor Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão: "RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS EXPRESSAMENTE NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. REGISTRO DE MERA ESTIMATIVA QUANTO ÀS QUANTIAS ATRIBUÍDAS AOS PEDIDOS. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA E SISTEMÁTICA DO ARTIGO 840, §1º, DA CLT. OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 322, 324 E 492 DO CPC. PRINCÍPIOS DA INFORMALIDADE E SIMPLICIDADE QUE REGEM O PROCESSO DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. O artigo 840, §1º, da CLT, com a redação conferida pela Lei nº 13.467/2017, dispõe que: " Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante ". Tal regra deverá ser interpretada de modo consentâneo com os princípios que regem o Processo do Trabalho - em especial o da informalidade e simplicidade - , para que assim seja definida sua real finalidade. Além disso, sua aplicação não pode ser realizada de forma isolada, mas sim em conjunto com os demais preceitos constantes do ordenamento jurídico pátrio, a exemplo dos artigos 322, 324 e 492 do CPC, que auxiliam na objetivação do sentido e alcance da norma. Desse modo, numa primeira análise literal do artigo 840, §1º, da CLT, notadamente da expressão " com a indicação do seu valor ", enxerga-se, de fato, o intuito de estabelecer o ônus da parte em determinar o quantum pleiteado na lide trabalhista, sem que se obrigue, porém, a liquidação, com exatidão, dos pedidos. Outrossim, o próprio artigo 324 da lei adjetiva civil, com incidência no Processo do Trabalho, permite, em determinados casos, a formulação de pretensões genéricas (sem especificação da quantidade, qualidade ou valor). Entende-se, assim, que, frente a ocasiões que impossibilitem à parte a indicação precisa do valor do pedido, é razoável permitir sua delimitação por mera estimativa, com o intuito de atender a exigência contida no artigo 840, §1º, da CLT, desde que, para tanto, apresente justificativa no bojo da peça de ingresso. É a conclusão que também se depreende do artigo 12, §3º, da Instrução Normativa nº 41/2018 do TST. Por óbvio, haverá sempre a necessidade de observância da diretriz do artigo 492 do CPC, segundo o qual " é vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado ". Entretanto, o estabelecimento dos limites da lide levará em consideração a correta interpretação do pedido, que, segundo o artigo 322 do mesmo diploma processual, " considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé ". No caso concreto, constata-se que o reclamante consignou expressamente na inicial que " os valores atribuídos aos seus pedidos são meras estimativas de valores, não devendo, portanto, ser considerados como limites em caso de condenação ". Logo, a Corte de origem, ao concluir que os valores atribuídos às referidas pretensões devem ser considerados para fins de limitação da condenação, dissentiu do posicionamento desta Corte, razão pela qual merece reforma a decisão regional. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1000316-67.2022.5.02.0705, 7ª Turma, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 15/09/2023). Pelo exposto, rejeito a preliminar. II.4 – NULIDADE DA DISPENSA. Nos termos da inicial, a reclamante foi admitida pela reclamada, em 01/03/2024, para exercer as funções de assistente de operações de vendas, sendo arbitrariamente dispensada em 10/12/2024, em momento de extrema vulnerabilidade, doente e portadora de grave moléstia esclerose múltipla, razão pela qual a dispensa perpetrada afigura-se discriminatória. Arguiu a nulidade da dispensa e requereu seja determinada a sua imediata reintegração aos quadros da reclamada, restabelecimento do plano de saúde e pagamento das verbas devidas no período. Pois bem. O cerne da questão não repousa sobre eventual nexo de causalidade entre a doença da reclamante e o trabalho e sequer sobre a sua incapacidade ou aptidão para o exercício das atividades, como pretende fazer crer a reclamada. A pretensão fundamenta-se no alegado caráter discriminatório e preconceituoso da dispensa, tendo em vista o fato de a obreira ser portadora de doença grave. Esclareço que o portador de doença grave não é detentor de estabilidade ou garantia de emprego. Entretanto, o ordenamento jurídico, em atenção aos princípios da dignidade do trabalhador e continuidade da relação de trabalho, oferece proteção em face da dispensa ocorrida em razão da doença. A ausência de regulamentação da dispensa arbitrária, cuja previsão encontra-se no art. 7º, "I", da Constituição Federal, propicia situações em que seja possível a ocultação dos reais motivos da dispensa, ao argumento da permissividade do ordenamento com a dispensa sem justificativa. Assim, embora a resilição contratual ocorra em razão da doença, o empregador promove a dispensa sem justa causa, amparado por permissivo legal. Nesses casos, trata-se de trabalhador exposto a condição ainda mais vulnerável em razão da doença grave, o que justifica o caráter expansionista da esfera de proteção jurídica. Assim, presume-se como discriminatória a dispensa de empregado portador de doença grave que suscite estigma ou preconceito. Entendimento consolidado pelo Tribunal Superior do Trabalho na Súmula 443: PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego. Nesse contexto, a presunção da discriminação impõe ao empregador o ônus de comprovar os motivos que o levaram à resilição contratual. Presunção que também se justifica no princípio da aptidão para a prova. Registro que a justificativa não se trata propriamente das hipóteses tipificadas no art. 482 da CLT, mas em razões objetivas de caráter disciplinar, técnico, econômico ou financeiro, que tornaram necessária a dispensa do trabalhador. Assim, incumbe ao empregador comprovar a ocorrência de circunstâncias que permitam a conclusão de que a doença não foi o motivo determinante da resilição contratual sem justa causa e sim, outras razões razoáveis de cunho diverso. Caso contrário, presume-se que houve diferenciação do trabalhador com doença grave, para fins de manutenção da relação de trabalho sem fundamento objetivo, o que induz o tratamento discriminatório. No caso dos autos, não há qualquer indício de que a rescisão contratual tenha ocorrido por motivo técnico, financeiro, ou qualquer outra questão objetiva. O ASO expedido, em 28/02/2023 (ID. 9991dda, fl. 293 do PDF) foi realizado apenas de maneira clínica, sem exames complementares, com o parecer de “apto para função”, sem verificação de doença, ocupacional ou não, anterior. O relatório médico de ID. 64d9060, fls. 137/138 do PDF atesta que a reclamante encontra-se sob cuidados neurológicos devido à Esclerose Múltipla Remitente Recorrente (CID 10 G35), diagnóstico realizado através de avaliação clínica, radiológica e laboratorial conforme os Critérios de Mcdonald modificados. Relata ainda que a obreira apresentou primeiro surto em 2022, com melhora parcial, e nos últimos 12 meses apresentou 4 surtos incapacitantes, sendo 2 com sequelas. Consigna, por fim, que atualmente a paciente apresenta EDSS (escore de incapacidade) de 2.5, e apresenta como sequelas de surtos prévios: nistagmo horizontal, episódios de diplopia (visão dupla), desequilíbrio e instabilidade postural - que resultam em risco de quedas - urge incontinência urinária e alterações em reflexos osteotendíneos. Também apresenta, como sintoma paroxístico, episódios intermitentes de fraqueza em membro superior e inferior esquerdo. Outrossim, asseverou o perito médico designado por este juízo, conforme laudo de ID. 2fb45fd, fls. que a reclamante apresentou durante o contrato com a reclamada quadro depressivo e esclerose múltipla, não havendo elementos técnicos que justifiquem a existência de nexo causal ou concausal entre o trabalho na reclamada e a depressão ou a esclerose múltipla. Destacou que ambas as doenças têm etiologia multifatorial e concluiu: “A esclerose múltipla da reclamante já apresentava manifestações clínicas antes mesmo da contratação pela reclamada, embora o diagnóstico só tenha sido efetivamente estabelecido em setembro de 2024 após investigação neurológica adequada. O curso clínico da esclerose múltipla é tipicamente flutuante e imprevisível, com possibilidade de períodos de estabilidade intercalados com episódios de piora. As limitações neurológicas atualmente observadas na reclamante consistem em diplopia, diminuição de força do lado esquerdo do corpo e prejuízo da propriocepção. Tais limitações não tornam a reclamante inapta para o trabalho, mas dificultam a realização do trabalho e o deslocamento casa-trabalho. Trata-se de uma doença complexa, estigmatizante e que demanda não só suporte médico, mas também compreensão social e, sempre que possível, adaptações laborais que contribuam para a preservação da autonomia e da qualidade de vida do paciente. Quando viável, o trabalho em home-office é uma boa opção para estes casos.” Por outro lado, o ASO expedido, em 09/12/2024 (exame demissional), e juntado aos autos pela reclamada sob ID. bdb6b1c, fl. 302 do PDF é precário, pois acrescido de parecer positivo de “apto para a função”, entretanto destituído de procedimentos médicos a que foi submetida a reclamante, incluídos os respectivos exames complementares, nos moldes como determina o item 7.5.19.5, “c” da NR da Portaria 3.214/78 do MTE. A definição da doença a ser considerada grave, de maneira a gerar estigma ou preconceito, deve ser analisada no caso concreto, sobretudo tendo em vista que as práticas discriminatórias elencadas na Lei 9.029/95 são meramente exemplificativas. O Tribunal Superior do Trabalho, em diversas decisões, tem firmado entendimento no sentido de que a esclerose múltipla trata-se de doença estigmatizante, razão pela qual é ônus do empregador a prova de que a dispensa não se deu de forma discriminatória, na esteira da citada Súmula nº 443 daquela Corte Superior. Nesse sentido, transcrevo as seguintes ementas: (...) EMPREGADO DIAGNOSTICADO COM ESCLEROSE MÚLTIPLA. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. SÚMULA Nº 443 DO TST. A controvérsia cinge-se a definir se a dispensa do autor, diagnosticado com esclerose múltipla, teve caráter discriminatório. A jurisprudência desta Corte entende ser presumidamente discriminatória a dispensa, sem justa causa, de trabalhador com doença grave ou estigmatizante, invertendo-se, assim, o ônus da prova, de forma a atribuir à empresa a comprovação de que a dispensa não ocorrera de forma discriminatória. O entendimento consagrado no referido verbete sumular tem a finalidade de conferir eficácia ao princípio fundamental da continuidade da relação de emprego (artigo 7º, inciso I, da Constituição Federal) e proteger os trabalhadores que se encontrem em situações de vulnerabilidade, impondo ao empregador uma obrigação negativa, qual seja a comprovação robusta de que a dispensa não possui contorno discriminatório, alegando, para tanto, motivos técnicos, econômicos ou financeiros, buscando, assim, evitar a dispensa do empregado com dificuldades de reinserção no mercado de trabalho e concretizar o comando constitucional da busca do pleno emprego. Desse modo, na hipótese dos autos, constata-se que foi imputado, equivocadamente, ao autor o ônus da prova da conduta discriminatória por parte do empregador e, por ausência de prova nesse sentido, decidiu-se contra ele. Nesse contexto, a decisão da Turma, ao considerar discriminatória a dispensa do autor, está em consonância com a Súmula nº 443 desta Corte, razão pela qual não merece reforma. Agravo desprovido. (Ag-ED-E-ED-RR-11176-71.2014.5.01.0053, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Redator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 01/09/2023).". (grifei) "1. NULIDADE PROCESSUAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. 2. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. SÚMULAS 126 E 443 DO TST. DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR QUE DENEGA SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE REVISTA. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. Quanto à arguição de nulidade por negativa de prestação jurisdicional, o Tribunal Regional atendeu ao comando do art. 93, IX, da CF/1988, uma vez que a decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada. Na verdade, o Reclamado, ora Agravante, se insurge contra o posicionamento adotado pela Corte de origem no exame da matéria controvertida. Contudo, a discordância quanto à decisão proferida, a má apreciação das provas ou a adoção de posicionamento contrário aos interesses da parte não são causa de nulidade processual. II. No que se refere ao tema “dispensa discriminatória”, na hipótese, a Corte Regional esclareceu que, “ não comprovado que a dispensa ocorreu por motivo plausível, razoável e justificável, não vinculado ao estado de saúde da obreira, prevalece a presunção de seu caráter discriminatório, atraindo, assim, a incidência da Súmula nº 443 do TST”. Apenas com o revolvimento de fato e provas seria possível chegar à conclusão diversa da estabelecida no acórdão recorrido, o que atrai sobre o apelo o óbice da Súmula 126 do TST. III. Acresça-se que esta Corte Superior tem jurisprudência firmada no sentido de que a esclerose múltipla é doença incurável, de natureza degenerativa e progressiva, com possibilidade de causar estigma, razão pela qual é ônus do empregador a prova de que a dispensa não se deu de forma discriminatória, na esteira da Súmula nº 443 do TST. IV. Ademais, a jurisprudência desta Corte Superior, interpretando a Lei nº 9.029/95, entende que se presume discriminatória a dispensa de portador de enfermidade grave, quando o empregador tiver conhecimento de tal condição, a teor do entendimento sedimentado na Súmula nº 443 desta Corte. Logo, ileso o 5º, II, da CF. V. Fundamentos da decisão agravada não desconstituídos, confirmando-se a instranscendência da causa. VI. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento" (AIRR-0000976-60.2020.5.10.0015, 4ª Turma , Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 01/07/2024). "AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VALOR ARBITRADO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA. Caso em que, em decisão monocrática, foi provido o recurso de revista do Reclamante, para, reconhecendo a hipótese de dispensa discriminatória, por se tratar de empregado portador de esclerose múltipla, doença estigmatizante, condenar a Reclamada ao pagamento indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O Tribunal Regional registrou que o Reclamante recebeu como último salário contratual o valor de R$ 5.743,54. O montante arbitrado a título de compensação por dano moral atende aos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade e está em consonância com jurisprudência consolidada no âmbito desta 5ª Turma, levando-se em consideração o julgamento de casos análogos em que houve o reconhecimento de dispensa discriminatória. Julgados. Ademais, os critérios previstos no artigo 223-G da CLT possuem natureza meramente orientativa, não vinculando o julgamento, tal como decidido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nºs 6.050, 6.069 e 6.082, que tratam sobre a constitucionalidade dos artigos. 223-A, 223-B e 223-G, § 1º, da CLT. Por fim, certo é que a reanálise do conjunto fático-probatório dos autos, com a finalidade de se concluir pela desproporcionalidade do montante arbitrado, tal como pretende o Agravante, esbarra no óbice da Súmula 126/TST. Nesse contexto, não afastados os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo merece a decisão. Agravo não provido, com acréscimo de fundamentação" (Ag-RRAg-1235-83.2018.5.09.0005, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 30/08/2024). (grifei) "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - DOENÇA GRAVE (ESCLEROSE MÚLTIPLA) - NULIDADE DA DESPEDIDA - REINTEGRAÇÃO DEVIDA. TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA NÃO EVIDENCIADA. O processamento do recurso de revista na vigência da Lei nº 13.467/2017 exige que a causa apresente transcendência com relação aos aspectos de natureza econômica, política, social ou jurídica (artigo 896-A da CLT). Sucede que, pelo prisma da transcendência, o recurso de revista empresarial não atende a nenhum dos requisitos referidos. No caso, não há transcendência política, porque a Corte Regional, tendo consignado que o reclamante é portador de doença grave (esclerose múltipla), da qual a empregadora tinha ciência, que ele foi despedido imotivadamente e que não foi infirmada por prova em contrário a presunção de despedida discriminatória, premissas insuscetíveis de revisão por este Tribunal, nos termos da Sumula 126 do TST, concluiu configurada a dispensa discriminatória do empregado por doença grave. Assim, a decisão proferida pela Corte regional está em consonância com Súmula nº 443 do TST, bem como em sintonia com a jurisprudência uniforme desta Corte, ao concluir que compete ao empregador o ônus da prova de que a dispensa não foi discriminatória, na medida em que há a presunção relativa de ser arbitrária e discriminatória a despedida imotivada de empregado portador de doença grave que cause estigma ou preconceito, nos moldes da aludida Súmula, não tendo a empregadora, na hipótese, comprovado que o ato da dispensa não guardou relação com a enfermidade do trabalhador. Ademais, não se verifica o preenchimento dos requisitos de natureza econômica, social ou jurídica a justificar o conhecimento do apelo. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...) (RRAg-1001293-65.2019.5.02.0058, 7ª Turma, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 20/11/2020). (grifei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. ESCLEROSE MÚLTIPLA. O acórdão regional foi prolatado em consonância com a Súmula nº 443 do TST, tendo em vista que a presunção do caráter discriminatório da dispensa da reclamante, empregada portadora de esclerose múltipla, doença grave e estigmatizante, não foi desconstituída pela demonstração de que a despedida decorreu de motivação lícita, não vinculada à saúde da trabalhadora. Agravo de instrumento conhecido e não provido" (AIRR-100739- 89.2016.5.01.0026, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 15/09/2017). Destaco, ainda, as considerações do perito médico acerca do significativo estigma social que paira sobre pessoas acometidas da esclerose múltipla: “É importante destacar que o diagnóstico de esclerose múltipla, além dos desafios físicos, frequentemente impõe um significativo estigma social, notadamente pela falta de conhecimento da sociedade. Nesse contexto, campanhas de conscientização, como o Agosto Laranja, desempenham um papel fundamental para a disseminação de informações precisas, o enfrentamento do preconceito e o empoderamento dos pacientes, suas famílias e cuidadores. O diagnóstico precoce, o início rápido do tratamento e a adoção de hábitos saudáveis são medidas essenciais para a modulação do curso da doença, prevenção de surtos e controle dos sintomas. Do ponto de vista funcional, a reclamante não apresenta incapacidade formal para o trabalho. Sob a ótica da Psiquiatria Forense, inclusive, está estável. Todavia, a esclerose múltipla é reconhecidamente uma doença de evolução incerta e potencialmente incapacitante, que demanda acompanhamento médico contínuo, sendo uma condição que pode trazer graves limitações futuras e dificuldades adaptativas. Pacientes com esclerose múltipla frequentemente enfrentam desafios para o deslocamento físico, especialmente quando há distúrbios motores, sensoriais ou visuais. Assim, em casos como o da reclamante, o trabalho remoto, quando viável, é uma alternativa geralmente recomendada para a manutenção da inserção do indivíduo no mercado de trabalho. Conforme consignou o Excelentíssimo Desembargador Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto, relator do Mandado de Segurança MSCiv 0012948-91.2025.5.03.0000, impetrado pela reclamada, a “dispensa imotivada da reclamante, obstativa da obtenção de novo auxílio-doença previdenciário (B-31) e sua possível conversão em aposentadoria por invalidez pelo INSS, haja vista a gravidade de doença identificada (progressiva e potencialmente incapacitante) foi nitidamente discriminatória (art. 4º, I e II da Lei 9.029/1995) e violou direitos fundamentais (arts. 1º, II, III e IV, 6º, 7º, XXII, 196 e 201, I e III da CF)”. O desconhecimento do estado de saúde prévio da reclamante não altera o posicionamento ora adotado, visto que os resultados dos exames médicos e complementares são privativos da obreira (arts. 8º e 168, § 5º da CLT c/c o art. 76 do Código de Ética Médica, Resolução CFM nº 2.217/2018 e a aplicação analógica da Súmula nº 244, I do Tribunal Superior do Trabalho) e sua divulgação indevida constitui violação de seu direito de intimidade (art. 5º, X da CF/88). De todo modo, a própria reclamada, em contestação, informou que estava ciente de que a obreira estava acometida de doença psicológica, o que por si só é suficiente para evidenciar a discriminação. Ausente qualquer justificativa para a extinção do contrato, entendo que o empregador não se desincumbiu do ônus de afastar a presunção de discriminação do ato da dispensa de empregada portadora de doença estigmatizante. Elucido que a prova oral produzida nos autos não socorreu a reclamada, porquanto a própria preposta da reclamada admitiu que a unidade em que a reclamante trabalhava permanece aberta. Com efeito, apenas o setor em que a obreira era lotada foi transferido de localidade. Sendo assim, possível a realocação da autora em outro setor, compatível com sua condição de saúde. Ademais, ambas as testemunhas indicadas pela empresa sequer souberam informar o critério utilizado para dispensa dos empregados, em virtude da alegada reestruturação empresarial. A primeira testemunha ouvida, Sra. Karen Alessandra da Silva e Souza, tampouco soube informar a quantidade de funcionários dispensados. Ademais, a segunda testemunha arrolada, Sr. Jonas Batista Toscano, declarou que foi remanejado de setor, assim como a colega Jamália, logo quando da ocorrência das alterações empresariais e suposta diminuição do quadro de funcionários no setor em que a reclamante estava lotada. O poder potestativo do empregador encontra limites na ordem legal e constitucional. Ao desamparar a reclamante, diante do seu quadro clínico, em momento que mais necessitava de cuidados, entendo que o empregador atentou frontalmente contra os princípios da não-discriminação e da dignidade. Por conseguinte, mantenho a determinação de reintegração da reclamante, proferida nos termos da decisão de ID. 08b5bf8, fls. 204/205 do PDF, nos quadros da reclamada, na mesma função anterior ou em função compatível com a doença, garantidos os mesmos direitos, benefícios, inclusive quanto ao plano de assistência médica, e salários anteriores e observados, ainda, eventuais reajustes concedidos por norma coletiva. Considerando-se a manutenção do contrato, defiro as seguintes verbas trabalhistas, observados os limites do pedido, devidas a partir de 10/12/2024, data da dispensa imotivada (ID. fed3d3a, fl. 139 do PDF), até 18/06/2025, data da reintegração (e-social de ID. a297833, fl. 785 do PDF): a) salários vencidos de forma simples; b) décimo terceiro; c) férias acrescidas do terço constitucional; d) FGTS a ser depositado na conta vinculada da reclamante. II.5 – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. A reclamante requereu o pagamento de indenização por danos morais em razão da dispensa abusiva e discriminatória. O pedido foi contestado pela reclamada. Em se tratando de dano extrapatrimonial, diante da impossibilidade de se demonstrar concretamente a ofensa a um bem jurídico personalíssimo e desprovido de materialidade, admite-se que basta a comprovação do fato suficiente a causar vilipêndio aos direitos da personalidade ínsitos à condição de pessoa humana, bem como a existência de conduta ilícita e do nexo de causalidade entre a conduta e a lesão. Consoante exposto em tópico anterior, a conduta ilícita da reclamada foi constatada, tendo em vista o reconhecimento da dispensa discriminatória da reclamante, portadora de doença grave. A lesão decorre da situação de a empregada estar doente e ter sido desamparada e achar-se sem fonte de sustento no momento em que mais precisa. Soma-se ao exposto a configuração no presente caso da lesão moral, presumida em razão da constatação da ilicitude da conduta e do nexo de causalidade, de forma a constituir o "danun in re ipsa", sendo desnecessária a prova do sofrimento íntimo da vítima. Assevero, que não cabe ao Poder Judiciário chancelar nenhuma conduta que possa resultar em um único tratamento discriminatório e desrespeitoso. É dever do Estado combater as práticas discriminatórias e garantir o pleno gozo dos direitos e garantias fundamentais tão arduamente conquistados. As decisões judiciais têm caráter punitivo pedagógico e exercem importante influência junto à sociedade no combate à discriminação e na disseminação da cultura do respeito ao Estado Democrático de Direito no qual vivemos. Neste contexto, evidenciados o dano extrapatrimonial, o nexo de causalidade e a atitude indevida da reclamada, acolho o pedido. As Convenções 110, 111, 98, 155 e 190 da Organização Internacional do Trabalho estabelecem normas sobre proteção à saúde, garantia de igualdade de gênero, combate às discriminações e ao tratamento diferenciado infundado, garantias de liberdade de expressão, sindical, participativa e normas contra o assédio moral organizacional, em prol de um meio ambiente de trabalho seguro e hígido. O conjunto de bens jurídicos tutelados, valores e dimensões da vida humana (dentre os quais a intimidade, a personalidade, o gênero, a autoestima, a privacidade e a própria vida, a incolumidade física e moral, o direito à desconexão etc.), cujas violações devem ser reparadas pela aplicação do instituto da responsabilidade por danos morais ou extrapatrimoniais, devem ser deduzidos da integralidade do ordenamento jurídico e dos valores compartilhados em nossa sociedade. Registro que na compensação do dano extrapatrimonial, deve o julgador atentar para extensão da ofensa e grau de culpabilidade do agente, a situação das partes (econômica e social), notadamente o porte financeiro do ofensor/empregador, as circunstâncias dos fatos e seu efeito multiplicador, o caráter pedagógico-punitivo da indenização, bem como a repercussão da ofensa na vida da vítima/empregado. Por conseguinte, com fundamento nos artigos 186, 187 e 927 do CC c/c art. 8º, §1º, da CLT, defiro à reclamante indenização por danos morais, no importe de R$10.000,00 (dez mil reais), considerando, os incisos do art. 223-G da CLT, mormente a extensão da ofensa e o grau de culpabilidade do agente, bem com a situação da empregadora, notadamente o porte financeiro e ainda as circunstâncias dos fatos e seu efeito multiplicador e o caráter pedagógico-punitivo da indenização. II.6 – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. Em se tratando de danos materiais, cabia à reclamante comprovar a diminuição do patrimônio que efetivamente sofreu, nos termos do artigo 402 do Código Civil, seja o prejuízo imediato (perdas e danos), seja o que razoavelmente deixou de ganhar (lucros cessantes). Na inicial, não foram apontados gastos suportados pela reclamante em razão da doença, sejam despesas médicas ou qualquer outro prejuízo imediato que pudesse ensejar o ressarcimento dos valores despendidos. No que se refere aos lucros cessantes, o laudo médico de ID. 2fb45fd, fls. 796/816 do PDF foi conclusivo em afirmar que a reclamante se encontra apta para o trabalho. Não há nos autos outros elementos que indiquem redução da capacidade, ainda que mínima. Por todo o exposto, indefiro à reclamante a indenização por danos materiais pretendida, uma vez que não foram comprovados prejuízos imediatos nem redução da capacidade laborativa. II.7 – BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. A atual redação do art. 790, §4º, da CLT assegura os benefícios da justiça gratuita à pessoa física que comprovar a insuficiência de recursos para pagamento das custas do processo. Presume-se, desde logo, tal condição àqueles que percebam salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, conforme disposto no §3º do art. 790 da CLT. Ademais, o Tribunal Superior do Trabalho, no julgamento do Tema 21 do Incidente de Recursos Repetitivos (IRR) aprovou a seguinte tese: I - independentemente de pedido da parte, o magistrado trabalhista tem o poder-dever de conceder o benefício da justiça gratuita aos litigantes que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, conforme evidenciado nos autos; II - o pedido de gratuidade de justiça, formulado por aquele que perceber salário superior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, pode ser instruído por documento particular firmado pelo interessado, nos termos da Lei nº 7.115/83, sob as penas do art. 299 do Código Penal; III - havendo impugnação à pretensão pela parte contrária, acompanhada de prova, o juiz abrirá vista ao requerente do pedido de gratuidade de justiça, decidindo, após, o incidente (art. 99, § 2º, do CPC) (grifei) Uma vez que o reclamante recebia salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, conforme e-social de ID. 5dea93c, fl. 793 do PDF, concedo-lhe os benefícios da justiça gratuita. II.8 – HONORÁRIOS PERICIAIS. Os honorários da perícia são devidos pela parte sucumbente quanto ao objeto da prova técnica, nos termos do art. 790-B da CLT, cabendo ao juiz aplicar a norma ao caso concreto, não se vinculando à conclusão do expert. Sucumbente a reclamada, arcará com os honorários periciais, os quais arbitro em R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), em favor do perito THALES BITTENCOURT DE BARCELOS . A verba honorária deverá ser atualizada consoante as diretrizes fixadas no art. 1º da Lei nº 6.899/81, conforme entendimento consubstanciado na Orientação Jurisprudencial n. 198 da SBDI-1 do TST, excluindo-se, contudo, a incidência de juros de mora. II.9 – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. Considerando a procedência parcial dos pedidos, são devidos honorários de sucumbência, nos termos do §3º, do art. 791-A da CLT, em prol de um dos procuradores da reclamante, os quais arbitro em 10%, diante da complexidade da demanda e zelo do profissional, a incidirem sobre o valor líquido da condenação, nos moldes da Orientação Jurisprudencial n. 348 da SBDI-1 do TST. Devidos, ainda, honorários de sucumbência, a um dos procuradores da reclamada, também arbitrados em 10%, sobre o valor total atribuído aos pedidos julgados totalmente improcedentes, os quais, todavia, ficarão sob condição suspensiva pelo prazo de dois anos, após o trânsito em julgado desta decisão, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de mérito da ADI n. 5.766. A declaração de inconstitucionalidade pela Suprema Corte apenas da expressão “desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa”, contida no §4º do art. 790 da CLT, afasta a interpretação de que a simples percepção de créditos judiciais descaracterizaria a condição de hipossuficiência da parte, assegurando-se, ainda, a garantia fundamental de acesso amplo ao Poder Judiciário (art. 5o, LXXIV, Constituição Federal). Nesse sentido, cito a seguinte jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho: "RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA . PROCESSO SOB A ÉGIDE DAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. RECLAMANTE BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. ART. 791-A, § 4º, DA CLT, INCLUÍDO PELA LEI 13.467/2017. JULGAMENTO DA ADI-5766 PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSÃO: "DESDE QUE NÃO TENHA OBTIDO EM JUÍZO, AINDA QUE EM OUTRO PROCESSO, CRÉDITOS CAPAZES DE SUPORTAR A DESPESA". A hipossuficiência econômica ensejadora do direito à gratuidade judiciária consiste na insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, sem comprometer o mínimo dispensável à própria subsistência da Parte ou de sua família, expressão do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). No âmbito do direito processual do trabalho, a realização do acesso à Justiça ao trabalhador hipossuficiente e beneficiário da justiça gratuita busca assegurar, no plano concreto, a efetividade dos direitos sociais trabalhistas, conferindo-lhes real sentido, com a consequente afirmação da dignidade da pessoa humana, da paz social e da redução das desigualdades sociais. Em vista da relevância do direito à gratuidade da justiça, com embasamento em preceitos da Constituição Federal de 1988, este Relator sempre entendeu pela flagrante inconstitucionalidade do § 4º do art. 791-A da CLT, por afronta direta ao art. 5º, XXXV, LXXIV, da CF/88. Isso porque a efetividade da norma contida no caput do artigo 791-A da CLT não pode se sobrepor aos direitos fundamentais do acesso à Justiça e da justiça gratuita (art. 5º, XXXV e LXXIV, da CF) - integrantes do núcleo essencial da Constituição da República e protegidos pela cláusula pétrea disposta no art. 60, § 4º, IV, da CF -, que visam a equacionar a igualdade das partes dentro do processo e a desigualdade econômico-social dos litigantes, com o fim de garantir, indistintamente, a tutela jurisdicional a todos, inclusive aos segmentos sociais vulneráveis, hipossuficientes e tradicionalmente excluídos do campo institucionalizado do Direito. Em virtude disso, inclusive, este Relator havia suscitado o incidente de inconstitucionalidade de referido dispositivo no âmbito desta 3ª Turma. Ocorre que, com o advento do recente julgamento da ADI 5766, pelo Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, que, por maioria, declarou inconstitucionais o caput e o § 4º do artigo 790-B da CLT, bem como do artigo 791-A, § 4º, da CLT, houve uma compreensão preliminar, pelo TST, a partir do teor da certidão de julgamento publicada em 20/10/2021, que a decisão abarcaria a inconstitucionalidade integral dos referidos dispositivos legais. Em razão disso, a matéria suscitada perante o Pleno no TST perdeu o objeto, tendo sido proferidas decisões no âmbito desta Corte. Ocorre que, publicado o acórdão principal do STF prolatado na ADI 5766, da lavra do Ministro Alexandre de Moraes, redator designado, e esclarecidos os pontos suscitados pela AGU nos Embargos de Declaração, verificou-se que a inconstitucionalidade do § 4º do art. 791-A da CLT não teve a extensão vislumbrada inicialmente pela jurisprudência desta Corte. Da leitura das decisões proferidas pelo STF, infere-se que a declaração de inconstitucionalidade abrangeu, em relação ao § 4º do art. 791-A da CLT, apenas a expressão "desde que não tenha obtido em Juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa". Assim, especificamente em relação aos honorários advocatícios sucumbenciais, depreende-se dos acórdãos prolatados na ADI 5766 que o § 4º do art. 791-A da CLT passou a vigorar com a seguinte redação: "vencido o beneficiário da justiça gratuita, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado, esse prazo, tais obrigações do beneficiário." Certo que a alteração da condição de hipossuficiência econômica do(a) trabalhador(a), ônus probatório do credor, não pode ser aquilatada a partir dos ganhos advindos de processo judicial. Assim, a modificação havida no § 4º do art. 791-A da CLT diz respeito à compreensão de que créditos judiciais - recebidos em qualquer processo - não são computáveis e não interferem na qualificação do obreiro como hipossuficiente. O estado de aptidão financeira do Reclamante deverá ser aferida - e provada pelo credor - por meio da existência de outros recursos financeiros alheios à percepção de créditos judiciais. Ademais, para a execução da obrigação, o credor tem o prazo de dois anos - após o trânsito em julgado da decisão que reconheceu o direito às obrigações decorrentes da sucumbência - para produzir a prova que lhe compete, ficando os encargos do devedor, nesse interregno, sob condição suspensiva de exigibilidade. Após o transcurso desse prazo, extinguem-se as obrigações do beneficiário da justiça gratuita. Dessa forma, na presente hipótese, reconhecida pela Instância Ordinária a condição de hipossuficiência econômica da Reclamante, com a concessão do benefício da justiça gratuita, a sua condenação ao pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais , a incidirem sobre os créditos obtidos na presente ação ou em outro processo , implica ofensa direta ao artigo 5º, XXXV, e LXXIV, da CF. Em respeito à decisão proferida pelo STF na ADI 5766, reafirmada na decisão proferida em embargos de declaração, conclui-se que, em relação aos honorários advocatícios sucumbenciais, fica suspensa a exigibilidade do seu pagamento pela Reclamante, beneficiária da justiça gratuita, que somente poderá ser executada se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que certificou as obrigações decorrentes de sua sucumbência, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, a referida obrigação da Reclamante. Reitere-se que a alteração da condição de hipossuficiência econômica do(a) trabalhador(a), ônus probatório do credor, não se verifica pela percepção de créditos advindos de processos judiciais. Assim, correta a decisão recorrida ao determinar "a suspensão de exigibilidade dos honorários advocatícios devidos pelo Reclamante, pelo prazo de dois anos subsequentes ao trânsito em julgado, extinguindo-se a obrigação após o decurso deste prazo, nos termos do art. 791-A, §4º, da CLT". Recurso de revista não conhecido" (RR-10157-87.2018.5.03.0003, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 01/09/2023). Desta feita, ressalvado o entendimento desta magistrada, observado o caráter vinculante da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, a parte beneficiária da gratuidade judiciária deve, em caso de sucumbência, ser condenada ao pagamento dos honorários advocatícios. Findo o prazo de dois anos, acaso não comprovada a extinção da situação de hipossuficiência econômica que ensejou a concessão dos benefícios da justiça gratuita à reclamante a obrigação será extinta. II.10 – PARÂMETROS DE LIQUIDAÇÃO. Sem prejuízo dos parâmetros fixados em capítulos próprios, a liquidação deverá observar os fixados neste, no que couber. a) Limites do pedido: Os valores atribuídos aos pleitos exordiais, tanto no rito sumaríssimo, quanto no ordinário, referem-se à mera estimativa do objetivo jurídico pretendido e não correspondem ao montante efetivamente devido, que, via de regra, somente será apurado em liquidação de sentença. Com efeito, o princípio da adstrição limita apenas os títulos e não os valores postulados. Logo, é inaplicável a limitação da condenação aos valores atribuídos aos pedidos iniciais. b) Atualização monetária: Relativamente à correção monetária e aos juros aplicáveis aos créditos trabalhistas ora deferidos, deve ser observado o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento conjunto das ADIs n. 5867 e 6.021 e ADCs n. 58 e 59, e as alterações dos artigos 389 e 406 do CC decorrentes da Lei nº 14.905/2024. Desse modo haverá incidência do IPCA-E e juros legais pela TR acumulada (art. 39, caput, da Lei nº 8.177, de 1991) na fase pré-judicial (item 6 da decisão do STF) e, a partir do ajuizamento da ação até 29/08/2024, será utilizada a taxa SELIC da Receita Federal, taxa essa que já incorpora atualização e juros de mora (item 7 da decisão do STF); a partir de 30/08/2024, a atualização observará a taxa legal prevista no art. 406 do CC e na Resolução CMN nº 5.171/24, com possibilidade de não incidência quando o resultado for igual a zero (item 5 da decisão do STF e artigos 389 e 406 do Código Civil). Nesse sentido, cito o seguinte julgado do Tribunal Superior do Trabalho: "RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. EXECUÇÃO. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DOS DÉBITOS TRABALHISTAS. ÍNDICE APLICÁVEL. Discute-se, no caso, a possibilidade de conhecimento do recurso de revista, por violação direta do art. 5º, II, da Constituição Federal, em razão da não observância da TRD estabelecida no art. 39 da Lei nº 8.177/91 para correção dos créditos trabalhistas. É pacífico, hoje, nesta Corte que a atualização monetária dos créditos trabalhistas pertence à esfera constitucional, ensejando o conhecimento de recurso de revista por violação do artigo 5º, II, da CF de forma direta, como o fez a e. 8ª Turma. Precedentes da SbDI-1 e de Turmas. Ademais, em se tratando de matéria pacificada por decisão do Supremo Tribunal Federal, com caráter vinculante, a sua apreciação, de imediato, se mostra possível, conforme tem decidido esta Subseção. No mérito, ultrapassada a questão processual e, adequando o julgamento da matéria à interpretação conferida pelo Supremo Tribunal Federal (ADC’s 58 e 59), bem como às alterações supervenientes promovidas pela Lei 14.905/2024 no Código Civil, com vigência a partir de 30/08/2024, e, considerando-se que, no presente caso, a e. 8ª Turma deu provimento ao recurso de revista da Fundação CEEE “para, reformando o acórdão regional, determinar a aplicação da TR como índice de atualização monetária dos créditos trabalhistas” (pág. 1327) e que aludido acórdão regional, em sede de agravo de petição, havia determinado a atualização monetária dos créditos trabalhistas pelo IPCA-E a partir de 30/06/2009 e TRD para o período anterior (vide págs. 1242-1250), impõe-se o provimento dos embargos, a fim de aplicar, para fins de correção dos débitos trabalhistas: a) o IPCA-E na fase pré-judicial acrescido dos juros de mora (art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991); b) a partir do ajuizamento da ação até 29/08/2024, a taxa SELIC, ressalvados os valores eventualmente pagos, nos termos da primeira parte do item "i" da modulação do STF, vedada a dedução ou compensação de eventuais diferenças pelo critério de cálculo anterior; c) a partir de 30/08/2024, no cálculo da atualização monetária, será utilizado o IPCA (art. 389, parágrafo único, do Código Civil); os juros de mora corresponderão ao resultado da subtração SELIC - IPCA (art. 406, parágrafo único, do Código Civil), com a possibilidade de não incidência (taxa 0), nos termos do § 3º do artigo 406. Recurso de embargos conhecido, por divergência jurisprudencial, e provido" (E-ED-RR-713-03.2010.5.04.0029, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 25/10/2024). Em relação à fase pré-judicial, o Supremo Tribunal Federal já esclareceu ser devida a utilização do IPCA-E acrescido dos juros legais (art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991), nos moldes ora determinados, conforme decisões proferidas nas seguintes reclamações: Rcl 50117/RS. Relator: Min. Nunes Marques, DJe de 19/04/2022; Rcl 52842 AgR/SP.AgR. na Rcl. Relator: Min. Alexandre de Moraes, DJe 19/05/2022, Primeira Turma; Rcl 54.248, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 5.7.2022; Rcl 54.742, Min. Rel. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, DJe 26.7.22; Rcl 53.659, Min. Rel. Ricardo Lewandowski, DJe 3.6.2022; Rcl 54391/SP. Relator: Min. Nunes Marques, DJe de 03/08/2022; Rcl 52.437 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 9.8.2022; Rcl 52.729 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 20.9.2022. A fase pré-judicial é a que antecede o ajuizamento da ação, sendo, nessa ocasião, inaugurada a fase judicial, aspecto esclarecido no julgamento dos embargos de declaração aviados em razão do julgamento das ADCs n. 58 e 59, e ADIs n. 5.867 e 6.021. No tocante à indenização por danos morais, considerando que o Supremo Tribunal Federal não fez distinção quanto à natureza do crédito trabalhista para efeito de aplicação da tese fixada no julgamento das aludidas ADC's, cabe esclarecer que se faz incidente unicamente a atualização pela taxa SELIC da Receita Federal, a contar do ajuizamento da ação, critério que deve ser observado até 29/08/2024, haja vista o advento da Lei 14.905/2024; a partir de 30/08/2024, a atualização observará a taxa legal prevista no art. 406 do CC e na Resolução CMN nº 5.171/24, com possibilidade de não incidência quando o resultado for igual a zero (item 5 da decisão do STF e artigos 389 e 406 do Código Civil). Sendo assim, não há se aplicar índices na fase pré- judicial quanto à indenização por danos morais. Conforme entendimento jurisprudencial consolidado na Súmula n. 200 do TST, a base de cálculo dos juros de mora corresponde ao valor total bruto da condenação, sem exclusão das deduções fiscais e previdenciárias. Inexiste regra que estabeleça a dedução da contribuição previdenciária antes do cálculo dos juros de mora. Também deverá ser observado o disposto na Súmula n. 381 do TST. c) Contribuição previdenciária: As contribuições previdenciárias incidirão sobre as parcelas de natureza salarial deferidas nesta decisão, mês a mês (art. 43, § 3º, da Lei nº 8.212/91) – salários vencidos de forma simples; décimo terceiro –, conforme art. 28 da Lei nº 8.212/91, autorizada a dedução da cota parte devida pela parte autora, mediante comprovação nos autos pela reclamada, até o dia 2 do mês seguinte ao da liquidação da sentença, nos termos do art. 276 do Decreto nº 3.048/99. Devida, ainda, a incidência das contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional das férias ora deferidas, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o Tema 985 do Ementário da Repercussão Geral. O fato gerador das contribuições previdenciárias para fatos ocorridos a partir de 05/03/2009 (data da vigência da MP nº 449/2008) é a data da prestação dos serviços, com apuração mês a mês, regime de competência, sujeito à aplicação das alíquotas respectivas, limites máximos de salário-contribuição e com as consequências daí decorrentes (como juros moratórios e multa), pela falta de pagamento na época própria (Lei nº 8.212/91, artigos 20, 22, I, 30, I, "b", 35 e 43, § 2º). Os recolhimentos previdenciários deverão ser efetuados e comprovados na forma da Lei nº 11.941/09 e da Súmula n. 368 do TST, sob pena de execução direta pela quantia equivalente (art. 114, inciso VIII, da Constituição Federal). Haverá incidência de juros de mora caso a reclamada não recolha as contribuições previdenciárias até o dia 02 do mês seguinte do pagamento, Súmula n. 368 do TST. d) Imposto de renda: O recolhimento do imposto de renda deverá ser comprovado pela reclamada na forma determinada pelo art. 46 da Lei nº 8.541/92 e será suportado pelo reclamante sobre as parcelas aqui deferidas, mês a mês, sendo tributado exclusivamente na fonte, no mês do recebimento ou crédito, em separado dos demais rendimentos recebidos no mês (art. 12-A da Lei nº 7.713/88 e artigos 26, 43 e 44 da IN nº 1.500/2014 da Receita Federal do Brasil), sob pena de ofício à DRRF. Ressalto que os juros de mora não configuram renda e proventos de qualquer natureza, mas meros componentes indissociáveis do valor total da indenização, motivo pelo qual devem ser excluídos da incidência do imposto de renda, diante de sua natureza indenizatória, conforme previsto no art. 404 do CC e na Orientação Jurisprudencial n. 400 da SBDI-I do TST. e) FGTS: Conforme previsto no art. 15 da Lei nº 8.036/90 e consoante entendimento consubstanciado nas Súmulas n. 63 e n. 305 e nas Orientações Jurisprudenciais n. 42 e n. 195 da SBDI-1, todas do Tribunal Superior do Trabalho, a base de cálculo do FGTS, com a respectiva multa de 40% consiste na remuneração do empregado, computando-se as parcelas de natureza salarial e parcelas reflexas. Os valores devidos a título de FGTS e correspondente à indenização de 40% deverão ser depositados na conta vinculada da parte autora, nos termos dos artigos 26, parágrafo único, e 26-A da Lei nº 8.036/90. Nesse sentido também é a jurisprudência consolidada do TST, reafirmada por meio por meio da seguinte tese fixada no Tema 68 (RRAg - 0000003-65.2023.5.02.0201) da sistemática dos recursos repetitivos: Nas reclamações trabalhistas, os valores relativos aos recolhimentos do FGTS e da respectiva indenização de 40% devem ser depositados na conta vinculada, e não pagos diretamente ao trabalhador. III – CONCLUSÃO. Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos deduzidos por MELAENE DURCELINA DE OLIVEIRA em desfavor de BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTÍFICOS MÉDICOS E HOSPITALARES S A para, I) manter a determinação de reintegração da reclamante, proferida nos termos da decisão de ID. 08b5bf8, fls. 204/205 do PDF, nos quadros da reclamada, na mesma função anterior ou em função compatível com a doença, garantidos os mesmos direitos, benefícios, inclusive quanto ao plano de assistência médica, e salários anteriores e observados, ainda, eventuais reajustes concedidos por norma coletiva; II) condenar a reclamada a pagar à reclamante, em até 48 horas após o trânsito em julgado, conforme se apurar em liquidação de sentença, com juros sobre o principal corrigido a partir do primeiro dia útil do mês subsequente ao trabalhado, autorizados os descontos legais cabíveis e observados os limites do pedido, tudo nos termos da fundamentação supra, que integra este dispositivo independentemente de transcrição: a) verbas trabalhistas devidas a partir de 10/12/2024, data da dispensa imotivada (ID. fed3d3a, fl. 139 do PDF), até 18/06/2025, data da reintegração (e-social de ID. a297833, fl. 785 do PDF), quais sejam, salários vencidos de forma simples; décimo terceiro; férias acrescidas do terço constitucional; FGTS a ser depositado na conta vinculada da reclamante; b) indenização por danos morais, no importe de R$10.000,00 (dez mil reais). As parcelas deferidas serão apuradas em liquidação de sentença, observadas as diretrizes estabelecidas nesta decisão. Deferidos os benefícios da justiça gratuita à reclamante. Sucumbente a reclamada, arcará com os honorários periciais, os quais arbitro em R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), em favor do perito THALES BITTENCOURT DE BARCELOS .A verba honorária deverá ser atualizada consoante as diretrizes fixadas no art. 1º da Lei nº 6.899/81, conforme entendimento consubstanciado na Orientação Jurisprudencial n. 198 da SBDI-1 do TST, excluindo-se, contudo, a incidência de juros de mora. Considerando a procedência parcial dos pedidos, são devidos honorários de sucumbência, nos termos do §3º, do art. 791-A da CLT, em prol de um dos procuradores da reclamante, os quais arbitro em 10%, diante da complexidade da demanda e zelo do profissional, a incidirem sobre o valor líquido da condenação, nos moldes da Orientação Jurisprudencial n. 348 da SBDI-1 do TST. Devidos, ainda, honorários de sucumbência, a um dos procuradores da reclamada, também arbitrados em 10%, sobre o valor total atribuído aos pedidos julgados totalmente improcedentes, os quais, todavia, ficarão sob condição suspensiva pelo prazo de dois anos, após o trânsito em julgado desta decisão, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento de mérito da ADI n. 5.766. Findo o prazo de dois anos, acaso não comprovada a extinção da situação de hipossuficiência econômica que ensejou a concessão dos benefícios da justiça gratuita à reclamante a obrigação será extinta. O recolhimento do imposto de renda deverá ser comprovado pelo reclamado, na forma determinada pelo art. 46 da Lei nº 8.541/1992, sendo tributado exclusivamente na fonte, no mês do recebimento ou crédito (art. 12-A, da Lei nº 7.713/88 e art. 2º, II e § 1º, da IN nº 1.127/2011, da Receita Federal do Brasil), sob pena de ofício à DRRF. Declaro, para os fins do art. 832, §3º, da CLT, que, incidem contribuição previdenciária, sobre as seguintes parcelas objeto da condenação: salários vencidos de forma simples; décimo terceiro. Devida, ainda, a incidência das contribuições previdenciárias sobre o terço constitucional das férias ora deferidas, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o Tema 985 do Ementário da Repercussão Geral. As demais parcelas têm natureza indenizatória. Custas, pela reclamada, no importe de R$500,00 calculadas sobre R$25.000,00 valor arbitrado à condenação. A União, a propósito dos encargos previdenciários e fiscais, será intimada desta decisão, ao término da execução trabalhista, somente se o valor final da execução total, nesta se compreendendo os créditos trabalhistas e de qualquer outra natureza, superar o limite a partir do qual sua intimação se torne, por lei, obrigatória. Intimem-se as partes e o perito. Nada mais. Encerrou-se. BELO HORIZONTE/MG, 23 de julho de 2025. ERICA APARECIDA PIRES BESSA Juíza Titular de Vara do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - BIOMEDICAL PRODUTOS CIENTIFICOS MEDICOS E HOSPITALARES S A

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