Resultados para "1001804-41.2024.8.26.0229" – Página 123 de 125

Processo nº 1005065-18.2024.8.11.0007

ID: 331726611

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1005065-18.2024.8.11.0007

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

MUNICÍPIO DE ALTA FLORESTA

Polo Passivo:

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005065-18.2024.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Taxa de Licenciamento de Estabeleci… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005065-18.2024.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Taxa de Licenciamento de Estabelecimento, Efeito Suspensivo / Impugnação / Embargos à Execução] Relator: Des(a). RODRIGO ROBERTO CURVO Turma Julgadora: [DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP] Parte(s): [MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME - CNPJ: 37.480.100/0001-72 (APELANTE), LUIS AUGUSTO CUISSI - CPF: 218.912.368-22 (ADVOGADO), EMILIA MARIA TARSITANO - CPF: 025.722.288-07 (APELADO), MUNICÍPIO DE ALTA FLORESTA - CNPJ: 15.023.906/0001-07 (APELANTE), MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME - CNPJ: 37.480.100/0001-72 (TERCEIRO INTERESSADO), ANTONIO FERREIRA LUCIO - CPF: 237.776.309-00 (TERCEIRO INTERESSADO), CAMILA MARIA DOMINGUES MARQUEZINI - CPF: 337.733.828-47 (ADVOGADO), MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME - CNPJ: 37.480.100/0001-72 (APELADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA EROTIDES KNEIP, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. EMENTA DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO. INATIVIDADE EMPRESARIAL NÃO COMPROVADA. ÔNUS PROBATÓRIO DO EMBARGANTE. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame: 1. Recurso de apelação cível interposto contra sentença que julgou procedentes os embargos à execução fiscal, desconstituindo certidão de dívida ativa relativa à taxa de localização e funcionamento, sob o fundamento de inexistência de fato gerador por inatividade empresarial no período correspondente. II. Questão em discussão: 2. A questão em discussão consiste em saber se a documentação apresentada pela parte embargante é suficiente para comprovar a inatividade empresarial e, por consequência, a inexistência do fato gerador da taxa de localização e funcionamento nos exercícios fiscais cobrados. III. Razões de decidir: 3. A taxa de localização e funcionamento tem como fato gerador o exercício do poder de polícia administrativa, vinculado à fiscalização de estabelecimentos em atividade. 4. A condição de “inapta” no CNPJ, derivada de obrigações acessórias descumpridas, não configura prova da inexistência de atividade empresarial. 5. Os documentos acostados aos autos, incluindo a declaração subscrita por contador e os registros de inatividade relativos a períodos anteriores, não produzem prova plena da inatividade empresarial, sendo necessário demonstrar, de forma robusta e contemporânea, a ausência de exercício de qualquer atividade econômica durante o exato período dos lançamentos tributários exigidos. 6. Ausente prova contemporânea e robusta da paralisação das atividades, não se pode acolher os embargos à execução fiscal. IV. Dispositivo e tese: 7. Recurso provido. Tese de julgamento: “Para o reconhecimento da inatividade empresarial e desconstituição do crédito tributário, é indispensável a comprovação efetiva da ausência de atividade no período correspondente aos lançamentos.” __________ Dispositivos relevantes citados: CRFB, art. 145, II; CTN, art. 77; Lei nº 9.430/1996, art. 81. Jurisprudência relevante citada: TJMT, apelação cível n. 0009139-16.2013.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, relator Des. Sebastiao de Moraes Filho, Segunda Câmara de Direito Privado, julgado em 02.5.2024, publicado no DJe em 02.5.2024. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR) Egrégia Câmara, Cuida-se de recurso de apelação cível interposto pelo MUNICÍPIO DE ALTA FLORESTA (MT) contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Comarca de Alta Floresta (MT) que, nos autos dos embargos à execução n. 1005065-18.2024.8.11.0007 manejados por EMÍLIA MARIA TARSITANO, julgou procedente a ação, declarando a nulidade da certidão de dívida ativa n. 450/2024. E ainda condenou a Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da certidão de dívida ativa. Como razões recursais, a parte apelante sustenta, em síntese, que as declarações de inatividade empresarial acostadas aos autos referem-se a períodos distintos daqueles que motivaram a constituição do crédito tributário, não se prestando, portanto, como prova documental inequívoca de que a empresa, de fato, encontrava-se inativa no período fiscal questionado. Aduz, ainda, a inexistência de qualquer documento comprobatório da dissolução, extinção ou liquidação formal da pessoa jurídica, bem como a ausência de comunicação oficial aos órgãos competentes acerca da suposta paralisação de suas atividades durante o intervalo temporal correspondente à exigência tributária. À vista disso, requer o provimento do recurso, com a reforma do ato sentencial recorrido. A parte apelada apresentou contrarrazões no movimento de Id. 293369366, pelo não provimento do recurso. Dispensada a intervenção do ente ministerial, nos termos da Súmula n. 189/STJ. É o relatório. VOTO EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR) Egrégia Câmara, Como exposto, trata-se de recurso de apelação cível interposto pelo MUNICÍPIO DE ALTA FLORESTA (MT) contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Comarca de Alta Floresta (MT) que, nos autos dos embargos à execução n. 1005065-18.2024.8.11.0007 manejados por EMÍLIA MARIA TARSITANO, julgou procedente a demanda, declarando a nulidade da certidão de dívida ativa n. 450/2024. Infere-se dos autos que a Fazenda Pública ajuizou ação de execução fiscal n. 1001804-45.2024.8.11.0007, visando ao recebimento de crédito inscrito na certidão de dívida ativa n. 450/2024, decorrente da taxa de localização e funcionamento, referentes aos exercícios de 2019 a 2023. Ciente, a executada EMÍLIA MARIA TARZITANO opôs os presentes embargos à execução alegando a ilegalidade da exação fiscal, sob o fundamento de que o fato gerador do tributo em questão teria ocorrido após o efetivo encerramento das atividades do estabelecimento empresarial, inexistindo, por conseguinte, vínculo jurídico entre a empresa ou seus sócios e a obrigação tributária discutida, razão pela qual entende ser indevida sua responsabilização pelo débito exequendo. Na sequência, sobreveio sentença reconhecendo a ilegitimidade ativa ad causam da embargante, sob o fundamento de que não lhe seria permitido pleitear, em nome próprio, direito alheio. Todavia, em sede recursal, esta c. Câmara deu provimento ao recurso interposto, reconhecendo a legitimidade ativa da embargante para a oposição dos embargos do devedor, ante sua inclusão como corresponsável na certidão de dívida ativa objeto da execução fiscal, bem como em razão do redirecionamento posterior do feito executivo em face dos sócios da pessoa jurídica, entre os quais se encontra a ora embargante, circunstância suficiente para configurar sua responsabilidade tributária e justificar sua intervenção no processo. Com o retorno dos autos ao juízo de origem e após a devida análise do mérito, em 09.4.2025, o d. Juízo a quo prolatou sentença julgando procedente a demanda, destacando-se, das razões de decidir, os seguintes trechos: “[...] Analisando-se os autos, constata-se que a empresa já se encontrava extinta por ocasião da inscrição do lançamento tributário. Dentre as provas juntadas nos autos, destaco o documento de ID 180268494, através do qual a embargante comunica ao embargado, em junho de 2017, a sua inatividade pelo período de 2004 a 2015. Igualmente, não é crível a tese de que a empresa continuaria a sua existência após todo o período, sem o exercício de qualquer atividade comercial. Nesse sentido, a testemunha Maria Lucia Franco, que era funcionária da embargante de 1998 a 2004, afirma que trabalhou na empresa MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA até seu fechamento (2004), que não houve qualquer atividade até uma empresa que trabalha na área de serraria assumir o local. Com efeito, restou comprovado que a empresa embargante de fato estava inativa por ocasião da inscrição dos débitos tributários (primeiro ponto controvertido). Ainda, houve a comunicação ao embargado acerca da inatividade da empresa, conforme documentos de ID 180268494. [...]”. (Sentença, Id. 190075225). [sem destaque no original]. O mérito recursal reside na defesa de que não há prova documental inequívoca de que a empresa estava inativa. Pois bem. É certo que, nos termos do artigo 145, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil, e do artigo 77, do Código Tributário Nacional, o fato gerador das taxas de localização e funcionamento é o exercício regular do poder de polícia administrativa, manifestado, notadamente, por meio da efetiva atividade fiscalizatória exercida pelo ente público. Ademais, é pacífico o entendimento de que a taxa de localização e funcionamento somente é devida quando há utilização efetiva ou potencial dos serviços públicos decorrentes do exercício do poder de polícia. No caso sub examine, visando ao reconhecimento da inatividade empresarial, foram acostados aos autos: (i) comprovante de situação cadastral da empresa junto à Receita Federal, indicando sua inaptidão desde 11.12.2018, em razão de omissão na entrega de declarações obrigatórias; (ii) declaração subscrita pelo contador responsável, atestando o encerramento das atividades da empresa no ano de 2004; e (iii) recibos das declarações de inatividade correspondentes ao período compreendido entre os anos de 2004 e 2015. No que se refere à situação cadastral da pessoa jurídica perante a Receita Federal, observa-se que a condição de “inapta”, decorrente da omissão na entrega de declarações obrigatórias (obrigação acessória), encontra respaldo na legislação tributária federal, notadamente no artigo 81 da Lei n. 9.430/1996, o qual autoriza a administração tributária a declarar a inaptidão da inscrição do CNPJ quando constatadas determinadas irregularidades formais. Nessa linha, a Instrução Normativa RFB n. 2.119, de 06 de dezembro de 2022, que disciplina o CNPJ, dispõe em seu artigo 9º que “as situações cadastrais da inscrição no CNPJ não se confundem com a condição de atividade ou inatividade para fins tributários”. [sem destaque no original]. A norma, ademais, elenca no artigo 38 um rol de hipóteses em que poderá ser declarada a inaptidão da inscrição, todas relacionadas à ausência de cumprimento de deveres instrumentais. Estabelece, ainda, no artigo 39, parágrafo único, que a empresa declarada inapta poderá regularizar sua situação mediante a entrega, via internet, das declarações e demonstrativos exigidos, prevendo, por fim, no artigo 47, que a inscrição será restabelecida após sanadas as causas que motivaram a inaptidão. Cuida-se, portanto, de irregularidade meramente administrativa, passível de regularização a qualquer tempo, razão pela qual não se pode confundir a condição de empresa inapta com a ausência de exercício de atividade empresarial. Assim sendo, mostra-se incabível a invocação da inaptidão do CNPJ como fundamento hábil à desconstituição da obrigação tributária exigida nos presentes autos. Nesse sentido, já decidiu este e. Tribunal de Justiça de Mato Grosso: “[...] A inaptidão do Cadastro de Pessoa Jurídica perante a Receita Federal não significa necessariamente inatividade da empresa, mas ausência de declarações de Imposto de Renda ou outra irregularidade, o que não impede o prosseguimento deste feito. [...]”. (TJMT, apelação cível n. 0009139-16.2013.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, relator Des. Sebastião de Moraes Filho, Segunda Câmara de Direito Privado, julgado em 02.5.2024, publicado no DJe em 02.5.2024). [sem destaque no original]. Ademais, conforme consulta pública realizada junto ao comprovante de inscrição estadual e à situação cadastral do CNPJ da empresa executada, verifica-se que a baixa da inscrição somente foi efetivada em 05.12.2023, indo de encontro à alegação de que a pessoa jurídica encontrava inativa desde o ano de 2004, sobretudo diante da presunção de veracidade que recai sobre os dados constantes dos registros cadastrais. No que tange à força probante dos documentos, é certo que a declaração unilateral – não constituídas sob o crivo do contraditório – possui eficácia probatória restrita, apta somente a demonstrar que determinado fato foi declarado pelo signatário, mas não a comprovar a veracidade do fato declarado, incumbindo tal ônus à parte interessada (artigos 408 e 412 do CPC). Nessa linha, a declaração subscrita pelo contador responsável, atestando o encerramento das atividades empresariais no ano de 2004, configura-se como manifestação unilateral da própria parte interessada, não podendo ser acolhida como meio exclusivo de prova, sobretudo diante da ausência de outros elementos probatórios que corroborem a alegação. As demais provas apresentadas limitam-se a documentos relativos a períodos anteriores aos lançamentos – em especial até o ano de 2015 – não sendo aptas a infirmar a ocorrência do fato gerador da exação (2019 a 2023). Diante do conjunto probatório constante dos autos, verifica-se não haver elementos suficientes para comprovar, de forma robusta e contemporânea aos exercícios fiscais questionados, a efetiva inatividade da empresa embargante. Nessas condições, a ausência de comprovação cabal da alegada inatividade inviabiliza o acolhimento dos embargos à execução, razão pela qual o recurso interposto merece provimento para reformar a sentença e restabelecer a exigibilidade do crédito tributário inscrito. Diante do exposto e em consonância com a fundamentação supra, DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pela Fazenda Pública para julgar improcedentes os pedidos deduzidos na inicial, invertendo-se o ônus sucumbencial fixado na sentença. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 1005065-18.2024.8.11.0007

ID: 331726624

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1005065-18.2024.8.11.0007

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

EMILIA MARIA TARSITANO

Acórdão

Advogados:

LUIS AUGUSTO CUISSI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005065-18.2024.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Taxa de Licenciamento de Estabeleci… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005065-18.2024.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Taxa de Licenciamento de Estabelecimento, Efeito Suspensivo / Impugnação / Embargos à Execução] Relator: Des(a). RODRIGO ROBERTO CURVO Turma Julgadora: [DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP] Parte(s): [MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME - CNPJ: 37.480.100/0001-72 (APELANTE), LUIS AUGUSTO CUISSI - CPF: 218.912.368-22 (ADVOGADO), EMILIA MARIA TARSITANO - CPF: 025.722.288-07 (APELADO), MUNICÍPIO DE ALTA FLORESTA - CNPJ: 15.023.906/0001-07 (APELANTE), MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME - CNPJ: 37.480.100/0001-72 (TERCEIRO INTERESSADO), ANTONIO FERREIRA LUCIO - CPF: 237.776.309-00 (TERCEIRO INTERESSADO), CAMILA MARIA DOMINGUES MARQUEZINI - CPF: 337.733.828-47 (ADVOGADO), MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - ME - CNPJ: 37.480.100/0001-72 (APELADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA EROTIDES KNEIP, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. EMENTA DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE LOCALIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO. INATIVIDADE EMPRESARIAL NÃO COMPROVADA. ÔNUS PROBATÓRIO DO EMBARGANTE. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame: 1. Recurso de apelação cível interposto contra sentença que julgou procedentes os embargos à execução fiscal, desconstituindo certidão de dívida ativa relativa à taxa de localização e funcionamento, sob o fundamento de inexistência de fato gerador por inatividade empresarial no período correspondente. II. Questão em discussão: 2. A questão em discussão consiste em saber se a documentação apresentada pela parte embargante é suficiente para comprovar a inatividade empresarial e, por consequência, a inexistência do fato gerador da taxa de localização e funcionamento nos exercícios fiscais cobrados. III. Razões de decidir: 3. A taxa de localização e funcionamento tem como fato gerador o exercício do poder de polícia administrativa, vinculado à fiscalização de estabelecimentos em atividade. 4. A condição de “inapta” no CNPJ, derivada de obrigações acessórias descumpridas, não configura prova da inexistência de atividade empresarial. 5. Os documentos acostados aos autos, incluindo a declaração subscrita por contador e os registros de inatividade relativos a períodos anteriores, não produzem prova plena da inatividade empresarial, sendo necessário demonstrar, de forma robusta e contemporânea, a ausência de exercício de qualquer atividade econômica durante o exato período dos lançamentos tributários exigidos. 6. Ausente prova contemporânea e robusta da paralisação das atividades, não se pode acolher os embargos à execução fiscal. IV. Dispositivo e tese: 7. Recurso provido. Tese de julgamento: “Para o reconhecimento da inatividade empresarial e desconstituição do crédito tributário, é indispensável a comprovação efetiva da ausência de atividade no período correspondente aos lançamentos.” __________ Dispositivos relevantes citados: CRFB, art. 145, II; CTN, art. 77; Lei nº 9.430/1996, art. 81. Jurisprudência relevante citada: TJMT, apelação cível n. 0009139-16.2013.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, relator Des. Sebastiao de Moraes Filho, Segunda Câmara de Direito Privado, julgado em 02.5.2024, publicado no DJe em 02.5.2024. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR) Egrégia Câmara, Cuida-se de recurso de apelação cível interposto pelo MUNICÍPIO DE ALTA FLORESTA (MT) contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Comarca de Alta Floresta (MT) que, nos autos dos embargos à execução n. 1005065-18.2024.8.11.0007 manejados por EMÍLIA MARIA TARSITANO, julgou procedente a ação, declarando a nulidade da certidão de dívida ativa n. 450/2024. E ainda condenou a Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da certidão de dívida ativa. Como razões recursais, a parte apelante sustenta, em síntese, que as declarações de inatividade empresarial acostadas aos autos referem-se a períodos distintos daqueles que motivaram a constituição do crédito tributário, não se prestando, portanto, como prova documental inequívoca de que a empresa, de fato, encontrava-se inativa no período fiscal questionado. Aduz, ainda, a inexistência de qualquer documento comprobatório da dissolução, extinção ou liquidação formal da pessoa jurídica, bem como a ausência de comunicação oficial aos órgãos competentes acerca da suposta paralisação de suas atividades durante o intervalo temporal correspondente à exigência tributária. À vista disso, requer o provimento do recurso, com a reforma do ato sentencial recorrido. A parte apelada apresentou contrarrazões no movimento de Id. 293369366, pelo não provimento do recurso. Dispensada a intervenção do ente ministerial, nos termos da Súmula n. 189/STJ. É o relatório. VOTO EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (RELATOR) Egrégia Câmara, Como exposto, trata-se de recurso de apelação cível interposto pelo MUNICÍPIO DE ALTA FLORESTA (MT) contra a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Comarca de Alta Floresta (MT) que, nos autos dos embargos à execução n. 1005065-18.2024.8.11.0007 manejados por EMÍLIA MARIA TARSITANO, julgou procedente a demanda, declarando a nulidade da certidão de dívida ativa n. 450/2024. Infere-se dos autos que a Fazenda Pública ajuizou ação de execução fiscal n. 1001804-45.2024.8.11.0007, visando ao recebimento de crédito inscrito na certidão de dívida ativa n. 450/2024, decorrente da taxa de localização e funcionamento, referentes aos exercícios de 2019 a 2023. Ciente, a executada EMÍLIA MARIA TARZITANO opôs os presentes embargos à execução alegando a ilegalidade da exação fiscal, sob o fundamento de que o fato gerador do tributo em questão teria ocorrido após o efetivo encerramento das atividades do estabelecimento empresarial, inexistindo, por conseguinte, vínculo jurídico entre a empresa ou seus sócios e a obrigação tributária discutida, razão pela qual entende ser indevida sua responsabilização pelo débito exequendo. Na sequência, sobreveio sentença reconhecendo a ilegitimidade ativa ad causam da embargante, sob o fundamento de que não lhe seria permitido pleitear, em nome próprio, direito alheio. Todavia, em sede recursal, esta c. Câmara deu provimento ao recurso interposto, reconhecendo a legitimidade ativa da embargante para a oposição dos embargos do devedor, ante sua inclusão como corresponsável na certidão de dívida ativa objeto da execução fiscal, bem como em razão do redirecionamento posterior do feito executivo em face dos sócios da pessoa jurídica, entre os quais se encontra a ora embargante, circunstância suficiente para configurar sua responsabilidade tributária e justificar sua intervenção no processo. Com o retorno dos autos ao juízo de origem e após a devida análise do mérito, em 09.4.2025, o d. Juízo a quo prolatou sentença julgando procedente a demanda, destacando-se, das razões de decidir, os seguintes trechos: “[...] Analisando-se os autos, constata-se que a empresa já se encontrava extinta por ocasião da inscrição do lançamento tributário. Dentre as provas juntadas nos autos, destaco o documento de ID 180268494, através do qual a embargante comunica ao embargado, em junho de 2017, a sua inatividade pelo período de 2004 a 2015. Igualmente, não é crível a tese de que a empresa continuaria a sua existência após todo o período, sem o exercício de qualquer atividade comercial. Nesse sentido, a testemunha Maria Lucia Franco, que era funcionária da embargante de 1998 a 2004, afirma que trabalhou na empresa MADEIRAS OREGON INDUSTRIA E COMERCIO LTDA até seu fechamento (2004), que não houve qualquer atividade até uma empresa que trabalha na área de serraria assumir o local. Com efeito, restou comprovado que a empresa embargante de fato estava inativa por ocasião da inscrição dos débitos tributários (primeiro ponto controvertido). Ainda, houve a comunicação ao embargado acerca da inatividade da empresa, conforme documentos de ID 180268494. [...]”. (Sentença, Id. 190075225). [sem destaque no original]. O mérito recursal reside na defesa de que não há prova documental inequívoca de que a empresa estava inativa. Pois bem. É certo que, nos termos do artigo 145, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil, e do artigo 77, do Código Tributário Nacional, o fato gerador das taxas de localização e funcionamento é o exercício regular do poder de polícia administrativa, manifestado, notadamente, por meio da efetiva atividade fiscalizatória exercida pelo ente público. Ademais, é pacífico o entendimento de que a taxa de localização e funcionamento somente é devida quando há utilização efetiva ou potencial dos serviços públicos decorrentes do exercício do poder de polícia. No caso sub examine, visando ao reconhecimento da inatividade empresarial, foram acostados aos autos: (i) comprovante de situação cadastral da empresa junto à Receita Federal, indicando sua inaptidão desde 11.12.2018, em razão de omissão na entrega de declarações obrigatórias; (ii) declaração subscrita pelo contador responsável, atestando o encerramento das atividades da empresa no ano de 2004; e (iii) recibos das declarações de inatividade correspondentes ao período compreendido entre os anos de 2004 e 2015. No que se refere à situação cadastral da pessoa jurídica perante a Receita Federal, observa-se que a condição de “inapta”, decorrente da omissão na entrega de declarações obrigatórias (obrigação acessória), encontra respaldo na legislação tributária federal, notadamente no artigo 81 da Lei n. 9.430/1996, o qual autoriza a administração tributária a declarar a inaptidão da inscrição do CNPJ quando constatadas determinadas irregularidades formais. Nessa linha, a Instrução Normativa RFB n. 2.119, de 06 de dezembro de 2022, que disciplina o CNPJ, dispõe em seu artigo 9º que “as situações cadastrais da inscrição no CNPJ não se confundem com a condição de atividade ou inatividade para fins tributários”. [sem destaque no original]. A norma, ademais, elenca no artigo 38 um rol de hipóteses em que poderá ser declarada a inaptidão da inscrição, todas relacionadas à ausência de cumprimento de deveres instrumentais. Estabelece, ainda, no artigo 39, parágrafo único, que a empresa declarada inapta poderá regularizar sua situação mediante a entrega, via internet, das declarações e demonstrativos exigidos, prevendo, por fim, no artigo 47, que a inscrição será restabelecida após sanadas as causas que motivaram a inaptidão. Cuida-se, portanto, de irregularidade meramente administrativa, passível de regularização a qualquer tempo, razão pela qual não se pode confundir a condição de empresa inapta com a ausência de exercício de atividade empresarial. Assim sendo, mostra-se incabível a invocação da inaptidão do CNPJ como fundamento hábil à desconstituição da obrigação tributária exigida nos presentes autos. Nesse sentido, já decidiu este e. Tribunal de Justiça de Mato Grosso: “[...] A inaptidão do Cadastro de Pessoa Jurídica perante a Receita Federal não significa necessariamente inatividade da empresa, mas ausência de declarações de Imposto de Renda ou outra irregularidade, o que não impede o prosseguimento deste feito. [...]”. (TJMT, apelação cível n. 0009139-16.2013.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, relator Des. Sebastião de Moraes Filho, Segunda Câmara de Direito Privado, julgado em 02.5.2024, publicado no DJe em 02.5.2024). [sem destaque no original]. Ademais, conforme consulta pública realizada junto ao comprovante de inscrição estadual e à situação cadastral do CNPJ da empresa executada, verifica-se que a baixa da inscrição somente foi efetivada em 05.12.2023, indo de encontro à alegação de que a pessoa jurídica encontrava inativa desde o ano de 2004, sobretudo diante da presunção de veracidade que recai sobre os dados constantes dos registros cadastrais. No que tange à força probante dos documentos, é certo que a declaração unilateral – não constituídas sob o crivo do contraditório – possui eficácia probatória restrita, apta somente a demonstrar que determinado fato foi declarado pelo signatário, mas não a comprovar a veracidade do fato declarado, incumbindo tal ônus à parte interessada (artigos 408 e 412 do CPC). Nessa linha, a declaração subscrita pelo contador responsável, atestando o encerramento das atividades empresariais no ano de 2004, configura-se como manifestação unilateral da própria parte interessada, não podendo ser acolhida como meio exclusivo de prova, sobretudo diante da ausência de outros elementos probatórios que corroborem a alegação. As demais provas apresentadas limitam-se a documentos relativos a períodos anteriores aos lançamentos – em especial até o ano de 2015 – não sendo aptas a infirmar a ocorrência do fato gerador da exação (2019 a 2023). Diante do conjunto probatório constante dos autos, verifica-se não haver elementos suficientes para comprovar, de forma robusta e contemporânea aos exercícios fiscais questionados, a efetiva inatividade da empresa embargante. Nessas condições, a ausência de comprovação cabal da alegada inatividade inviabiliza o acolhimento dos embargos à execução, razão pela qual o recurso interposto merece provimento para reformar a sentença e restabelecer a exigibilidade do crédito tributário inscrito. Diante do exposto e em consonância com a fundamentação supra, DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pela Fazenda Pública para julgar improcedentes os pedidos deduzidos na inicial, invertendo-se o ônus sucumbencial fixado na sentença. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou o que procurava? Faça login para ver mais resultados e detalhes completos.

Fazer Login para Ver Mais

Maira De Almeida Arruda x Gol Linhas Aéreas Inteligentes S.A.

ID: 256260669

Tribunal: TJMT Órgão: NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1001804-91.2024.8.11.0024

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

MAIRA DE ALMEIDA ARRUDA

Polo Passivo:

GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES S.A.

Sentença

Advogados:

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

CANDIDO NISVALDO FRANCA COELHO JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS SENTENÇA Processo: 1001804-91.2024.8.11.0024. REQUERENTE: MAIRA DE ALMEIDA ARRUDA REQUERIDO: GOL LINHAS AÉREAS … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS SENTENÇA Processo: 1001804-91.2024.8.11.0024. REQUERENTE: MAIRA DE ALMEIDA ARRUDA REQUERIDO: GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES S.A. Vistos, etc. Dispensado o relatório, nos moldes do art. 38 da Lei 9.099/95. Rejeito a preliminar quanto a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita ou sua impugnação não tem cabimento nesta fase processual, uma vez que o acesso ao primeiro grau em sede de Juizado Especial independe do recolhimento de custas, taxas ou despesas processuais, conforme dispõe o artigo 54 da Lei nº 9.099/95. rejeito a preliminar de aplicação do código aeronáutico, conforme entendimento da Suprema Corte e, ainda, considerando as disposições constitucionais de proteção e defesa do consumidor, havendo discussão acerca do dano moral, deve-se aplicar inteiramente o Código de Defesa do Consumidor. Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva arguida, o Código de Defesa do Consumidor estabelece sistema de responsabilidade ampla e solidária pela falha na prestação do serviço, alcançando a todos que de alguma forma tenham participado da relação, justamente para que o consumidor não se perca na imensa cadeia de produção/distribuição dos bens e dos serviços oferecidos ao mercado de consumo. Rejeito a preliminar de inépcia da inicial arguida pela Reclamada, uma vez que ausente qualquer vício capaz de ensejar a inépcia da inicial, conforme previsão do art. 330 do CPC. Quanto a alegação de conexão pela GOL LINHAS AÉREAS S/A, havendo conexão, o apensamento dos processos não é automático e obrigatório, pois necessário o juízo de conveniência, que deve ser feito de forma casuística, a partir das circunstâncias presentes em cada caso, contemplando inclusive a identidade de partes. Rejeito, 1001805-76.2024.8.11.0024, 1001806-61.2024.8.11.0024, pois possuem partes diversas. Tecidas essas considerações, destaco que é caso de julgamento antecipado do pedido, uma vez que não há necessidade de produção de outras provas além das já existentes (art. 355, I, do CPC). Trata-se de demanda movida pela parte autora em desfavor da requerida, alegando que adquiriu passagem aérea a ser operada pela ré para viagem em 03/10/2024, as 09h com saída de Cuiabá/MT para São Paulo/SP. Aduz que o voo de conexão em Florianopolis, sofreu atraso, e com previsão de saída as 21h55min, relata que na próxima conexão São Paulo, novo atraso, a saída da cidade de São Paulo/SP para Cuiabá/MT que seria para às 23:40 ocorreu apenas as 01:00hs do dia 17/10/2024. Com isso aduz que o atraso perfez 04 horas. Diante do narrado, ingressou com a presente ação visando a indenização por dano moral. Regularmente citada, a requerida informou que realmente houve o atraso do voo inicialmente contratado, alegando readequação da malha aérea, requerendo a improcedência da ação. Da análise dos autos, tem-se que é controverso, os fatos, que tenha ocorrido o atraso do voo contratado, e, que tenha havido significativo atraso para chegada ao destino final (art. 374, II e III, CPC). A Companhia Aérea que se dispõe a prestar o aludido serviço, deve zelar pela segurança dos seus passageiros, e pela observância dos horários estabelecidos, posto que imprescindíveis para a aquisição das passagens. A ora, consumidora, ao adquirir a passagem, confia na prestação de serviço para que o voo decole e aporte ao destino final, no horário e data aprazados, e cabe à ré honrar com tal obrigação. Conquanto a empresa ré tenha defendido que o “ínfimo” atraso do voo, tem-se que eventuais intercorrências técnicas, ainda que comprovadas, caracterizam-se como fortuito interno, eis que problemas operacionais e de gestão de voo estão inseridos nos desdobramentos naturais da atividade desenvolvida pela companhia aérea, e, por isso mesmo, evitáveis através de manutenções periódicas, de modo que não exclui a responsabilidade daquela por eventuais falhas na prestação do seu serviço. Este é o entendimento, aliás, da E. Turma Recursal deste Estado, em demandas análogas, como exemplifica-se: RECURSO INOMINADO Nº 1068168-51.2023.8.11.0001 ORIGEM: 3º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE CUIABÁ - MTRECORRENTE: TAM LINHAS AÉREAS S/ARECORRIDA: BEATRIZ AUGUSTA ZAQUE DE JESUS JUIZ RELATOR: ARISTEU DIAS BATISTA VILELLADATA DO JULGAMENTO: 19 a 22/08/2024 (PLENÁRIO VIRTUAL) E M E N T ARECURSO INOMINADO – TRANSPORTE AÉREO –ATRASO DE 04 (QUATRO) HORAS PARA CHEGADA AO DESTINO FINAL –– RISCO DA ATIVIDADE – SITUAÇÃO QUE NÃO EXCLUI A RESPONSABILIDADE – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – DANO MORAL CONFIGURADO – REDUÇÃO DO QUANTUM - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A tese da não ocorrência de overbooking não é suficiente para excluir a responsabilidade do prestador do serviço, pois representa risco da atividade, ou seja, fortuito interno e, por isso mesmo, evitável. 2. O cancelamento do voo que provoca a chegada ao destino final 04 (quatro) horas depois do horário inicialmente previsto, configura falha na prestação do serviço porque implica no descumprimento das obrigações assumidas e desorganiza as programações feitas pelo consumidor. 3. O valor da indenização a título de danos morais deve ser fixado em consonância com os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo ser reduzido se verificado excesso. 4. Recurso conhecido e parcialmente provido. (N.U 1068168-51.2023.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 19/08/2024, Publicado no DJE 22/08/2024) Além disso, embora a empresa tenha reacomodado a demandante em voo subsequente disponível, tal ato não é capaz de afastar sua responsabilidade acerca dos prejuízos experimentados pelo consumidor. Nesse sentido: RECURSO INOMINADO – TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO – REALOCAÇÃO PARA OUTRO VOO – ATRASO DE 24 HORAS PARA CHEGADA AO DESTINO FINAL – TESE DE REESTRUTURAÇÃO DA MALHA AÉREA – HIPÓTESE DE FORTUITO INTERNO – RISCO DA ATIVIDADE – SITUAÇÃO QUE NÃO EXCLUI A RESPONSABILIDADE – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM RAZOÁVEL CONSIDERANDO-SE O TOTAL DO ATRASO – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A Requerente ingressou com a presente ação aduzindo que contratou voo com itinerário Sinop/Guarulhos no dia 17/06/2023, com horário previsto para chegada às 19:30hs. Contudo, seu voo foi cancelado sem aviso prévio pela Requerida, obrigando o Autor a perder 01 (um) dia de viagem com reserva de hotel, chegando ao destino final somente no dia 18/06/2023 às 19:25hs, ou seja, com 01 (um) dia de atraso, razão pela qual pleiteia indenização por danos morais. 2. A sentença proferida nos autos julgou procedentes os pedidos da inicial condenando a Requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). 3. O artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor. 4. A alegação da Requerida de que o cancelamento se deu devido às condições climáticas, não possui o condão de afastar a responsabilidade do transportador aéreo pelo atraso do voo, uma vez que, no caso se qualifica como risco inerente a atividade. 5. O cancelamento do voo que provoca a realocação do consumidor horas depois do previsto, configura falha na prestação do serviço porque implica no descumprimento das obrigações assumidas, atraso ao destino final e desorganiza as programações feitas pelo consumidor, ainda mais quando há realocação em outro voo com chegada ao destino final após 24 horas do horário inicialmente contratado. 6. Não restando comprovada a ocorrência de caso fortuito, o atraso do voo do passageiro configura falha da prestação do serviço e gera a obrigação de indenizar a título de dano moral, decorrente dos transtornos, cansaço, frustração e desconforto sofridos pela parte consumidora. 7. O valor fixado a título de dano moral deve considerar as peculiaridades do caso em comento, de modo que a quantia fixada na sentença se encontra adequada aos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade, considerando-se o total do atraso e ainda, de acordo aos casos análogos já fixados por esta Turma Recursal. 8. No mesmo sentido, é o entendimento desta e. Turma Recursal: “RECURSO INOMINADO - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - TRANSPORTE AÉREO - TRECHO DE IDA ATRASO DE VOO SUPERIOR A 24 HORAS - TRECHO DE VOLTA CANCELAMENTO/ATRASO DE 05 DIAS - PARTE DO TRAJETO REALIZADO DE VAN (TERRESTRE) - ALEGAÇÃO DE MALHA AÉREA - NÃO EXCLUSÃO DO DEVER DE INDENIZAR - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - DANO MORAL CONFIGURADO - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Havendo atraso do voo sem a devida comunicação prévia, há falha na prestação do serviço, o que tipifica o ato ilícito e enseja o dever de indenizar, nos moldes dos artigos 186 e 927, do Código Civil, bem como artigo 14, do CDC, somando-se ainda ao fato de que pela alteração, o consumidor sofreu um atraso significativo tanto no trecho de ida, quanto no retorno. 2. Não há de se acolher a tese de malha aérea, como causa de exclusão da responsabilidade da empresa aérea pelo atraso dos voos, obrigando o passageiro a chegar a seu destino final, após horas do programado, fato que caracteriza abalo emocional indenizável economicamente. 3. Ressalte-se ser desnecessária a comprovação específica do prejuízo, pois o dano se extrai pela só verificação da conduta, ocorrendo o chamado dano in re ipsa. 4. Recurso conhecido e parcialmente provido. (N.U 1012467-39.2022.8.11.0002, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALDECI MORAES SIQUEIRA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 10/10/2023, Publicado no DJE 12/10/2023)” 9. A sentença não merece reparos e deve ser mantida por seus próprios fundamentos. A súmula do julgamento serve de acórdão, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. 10. Recurso conhecido e não provido. Condeno a Recorrente ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 55, da Lei nº 9.099/95. (N.U 1006082-09.2023.8.11.0045, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 04/12/2023, Publicado no DJE 11/12/2023). Caracterizada, então, a má prestação de serviço por parte da ré, e ainda que não logrou êxito em comprovar fatos para se eximir de sua responsabilidade. Por conseguinte, fica configurado o ato ilícito, ex vi dos arts. 186 e 927 do Código Civil, e a falha na prestação de serviços, a teor do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, sendo certo que a situação descrita ultrapassa a seara do mero aborrecimento ou simples descumprimento contratual, configurando verdadeira lesão à personalidade, passível de reparação moral. Configurado, portanto, o dever de indenizar, sabe-se que o valor da indenização deve ser proporcional, justo e razoável, se mostrando compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano e as condições sociais do ofendido. Da análise dos elementos existentes nos autos, entendo que a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais) se afigura consentânea com os parâmetros acima delineados e bem atende à hipótese e à extensão do dano, nos termos do art. 944 do Código Civil, considerando o lapso de tempo em que se estendeu a problemática. Nas hipóteses como a destes autos, em que não consta convenção expressa entre os litigantes ou previsão em lei específica acerca dos índices de juros e correção monetária a serem aplicados em caso de descumprimento da obrigação, os juros serão calculados pela taxa legal, definida como a Selic, e a atualização monetária pelo IPCA, tudo de acordo com a Lei n. 14.905/2024, que deu nova redação dos arts. 389 e 406, ambos do Código Civil. Ante o exposto, nos termos do artigo 487, I, do CPC, OPINO, pela PROCEDÊNCIA dos pedidos formulados pela autora para condenar a reclamada a indenizar a reclamante pelos danos morais suportados, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), devendo a quantia ser acrescida de juros de mora pela taxa SELIC, a partir da citação, já englobando a correção monetária. Sem custas e sem condenação em honorários advocatícios, nos termos do que dispõe o artigo 55, caput, da Lei n. 9.099/95. Após o trânsito em julgado remetam-se os autos ao arquivo, com as baixas necessárias. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Submeto o presente projeto de sentença ao MM. Juiz de Direito, para os fins estabelecidos no art. 40 da Lei 9.099/95. Bruno Ferreira Gomes Juiz Leigo SENTENÇA Vistos, etc. Homologo, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o projeto de sentença elaborado pelo Juiz Leigo, na forma do artigo 40 da Lei n. 9.099/1995. Preclusa a via recursal, em nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de estilo. Cumpra-se. Às providências. Lucas do Rio Verde/MT, data da assinatura digital. Maurício Alexandre Ribeiro Juiz de Direito

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0001240-64.2016.4.01.3309

ID: 317391904

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001240-64.2016.4.01.3309

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

CORNELIO JOSE LOPES DOUGLAS LOPES DA COSTA ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS JOSENAR MATOS VIEIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

KAREN SILVA ALMEIDA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A e MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas pelo Espólio de José Lopes dos Anjos (ID 423424188) e por Cornélio José Lopes, Douglas Lopes da Costa e Josemar Matos Vieira (ID 431641394) contra sentença (ID 423424181) proferida pelo Juízo Federal da Vara Única da Subseção Judiciária de Guanambi/BA que, em ação civil por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos e condenou: a) Espólio de José Lopes dos Anjos: a.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da última remuneração de Jose Lopes dos Anjos no cargo de Prefeito; a.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: ao pagamento de multa civil no valor de R$ 4.425,00. b) Josenar Matos Vieira, pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da sua última remuneração em razão do cargo que ocupava na gestão do ex-prefeito José Lopes dos Anjos. c) Cornelio José Lopes: c.1) Pela prática do ato ímprobo do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; c.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$ 1.525,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de quatro anos. d) Douglas Lopes da Costa: d.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; d.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$2.900,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 4 (quatro) anos. Além disso, julgou improcedentes os pedidos em relação ao requeridos Luciano Souza Santos, Sidnei Monteiro Alves e José Anfilofio de Menezes. O Espólio de José Lopes dos Anjos, em suas razões de apelar, suscita preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a ação, visto que os recursos federais transferidos incorporaram ao patrimônio do município, cabendo à Justiça Estadual julgar o feito; que deve ser aplicada retroativamente a Lei 14.230/2021 aos processos em trâmite; que a ação não obedeceu ao novo regramento legal, pois apresentou imputações genéricas, sem individualização das condutas, sem a demonstração do dolo e a intenção de causar dano ao patrimônio público; que foi consignado na sentença que não há prova de dano causado ao município, elemento necessário à caracterização dos atos do art. 10 e incisos; que o materiais de construção contratado pelo Município foram entregues, não havendo que se falar em proveito particular nem apropriação indevida; que a ausência de individualização da conduta implica em impossibilidade de defesa, restando evidente o cerceamento de defesa; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; requer o provimento da apelação para que sejam julgados improcedentes os pedido. Os demais apelantes, Cornélio e outros, argumentam que o Município de Novo Horizonte/BA possuía, à época dos fatos, apenas duas casas de materiais de construção, de propriedade de dois dos requeridos; que inconsistências formais no procedimento licitatório não são de responsabilidade dos referidos requeridos, pois não concorreram para essas irregularidades; que as duas casas possuíam a mesma empresa de contabilidade, razão pela qual eram idênticos os erros de assessoria; que os produtos foram entregues à prefeitura; que, em razão do princípio da insignificância, não justifica movimentar a máquina judiciária para impor sanção de improbidade administrativa por suposto prejuízo inferior a R$ 3.000,00; requer o provimento da apelação para julgar improcedentes os pedidos formulados na petição inicial e seja o apelado condenado em honorários sucumbenciais. O MPF apresentou contrarrazões, IDs 431641390 e 431641399, pugnando pelo improvimento das apelações. Nesta instância, o Ministério Público Federal, por meio do parecer ID 432616134, opinou pelo não provimento das apelações. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Da preliminar de incompetência da Justiça Federal Competente à Justiça Federal processar e julgar ação de improbidade que busca a responsabilização por malversação de verbas oriundas do FNDE. O entendimento jurisprudencial desta Corte é firme no sentido de que as ações civis públicas por ato de improbidade administrativa em que se busca a responsabilização por desvio de verbas federais devem ser processadas e julgadas pela Justiça Federal. Confiram-se: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; DE JULGAMENTO EXTRA PETITA; DE CERCEAMENTO DE DEFESA E INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. REJEIÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO MUNICÍPIO DE ENTRE FOLHAS-MG EM AUXÍLIO DE EMPRESA VENCEDORA DO CERTAME PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE DRENAGEM E PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. 1. Já encontra sedimentado nesta Corte o entendimento, segundo o qual, tratando-se de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, ante suposta prática de ato de improbidade administrativa por desvio e/ou malversação de recursos públicos federais, a competência para o conhecimento, o processamento e o julgamento da causa é da Justiça Federal, ainda que a União não tenha manifestado interesse em integrar a lide. (...) (AC 0000322-05.2013.4.01.3814, Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado, TRF1 - Quarta Turma, PJe 03/09/2021) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DE TRANSPARÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO. UNIÃO. INTERESSE EXPRESSO EM INTEGRAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. APLICAÇÃO DO ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão que, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Município de Maués/AM em desfavor de ex-prefeito municipal, declinou da competência em favor da Justiça Estadual do Amazonas. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF, visando apurar omissão de gestor municipal, em dar publicidade das verbas repassadas pela União ao município, por intermédio do Portal de Transparência. Precedentes: AG 0061340-18.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, Quarta Turma, e-DJF1 17/11/2017; AG 0061337-63.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Quarta Turma, e-DJF1 10/08/2017; AG 0061357-54.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, e-DJF1 24/03/2017. (...) (AG 1012824-08.2020.4.01.0000, Juiz Federal Érico Rodrigo Freitas Pinheiro (Conv.), TRF1 - Quarta Turma, PJe 04/08/2021) No caso, busca-se a responsabilização de ex-prefeito, e outros, por alegadas irregularidades na gestão de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação – FNDE. Registro, ainda, que, “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Do mérito Segundo consta da inicial, a ação de improbidade administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público Federal contra José Lopes dos Anjos, ex-prefeito do Município de Novo Horizonte/BA, Josemar Matos Vieira, ex-pregoeiro do município, José Anfilofio de Menezes e Sidnei Monteiro Alves, assessores do pregoeiro, Luciano Souza Santos, Controlador Geral do município, Douglas Lopes da Costa e Cornélio José Lopes, empresários, em face de fraudes praticadas nos Pregões Presenciais 005/2010 e 008/2010 realizados para a aquisição de fornecimento de materiais de construção para a prefeitura, condutas que foram enquadradas como atos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” À luz desse tema, as normas de direito material mais benéficas, introduzidas pela Lei 14.230/21, devem ser aplicadas às ações em curso, posto que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1º, § 4º, da LIA). Portanto, a norma mais benéfica retroage para beneficiar o réu. O autor atribuiu aos requeridos a prática dos atos ímprobos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, de cujos dispositivos se extrai: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência A nova redação desses dispositivos, após as alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, ficou assim estabelecida: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) O d. magistrado de primeiro grau, no entanto, recapitulou a tipificação da conduta ao condenar os requeridos pela prática dos atos típicos do art. 10, caput, e art. 11, V, da LIA, tipos legais diversos do capitulado pelo autor na petição inicial. Ressalto, entretanto, que a Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, vedou a possibilidade de modificação de capitulação da conduta apresentada pelo autor no âmbito da ação civil pública de improbidade administrativa (art. 17, § 10-C): § 10-C. Após a réplica do Ministério Público, o juiz proferirá decisão na qual indicará com precisão a tipificação do ato de improbidade administrativa imputável ao réu, sendo-lhe vedado modificar o fato principal e a capitulação legal apresentada pelo autor. No mesmo sentido, ainda, o disposto no § 10-F do referido artigo: § 10-F. Será nula a decisão de mérito total ou parcial da ação de improbidade administrativa que: (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) I - condenar o requerido por tipo diverso daquele definido na petição inicial; A propósito, em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se no sentido de não ser possível o reenquadramento, em outro dispositivo, do ato ilícito apontado pelo autor na ação civil pública de improbidade administrativa. Confira-se: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADVENTO DA LEI 14.231/2021. INTELIGÊNCIA DO ARE 843989 (TEMA 1.199). INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 AOS PROCESSOS EM CURSO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no inciso I do do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 revogou o referido dispositivo e a hipótese típica até então nele prevista ao mesmo tempo em que (iii) passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5. Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), pois o autor da demanda, na peça inicial, não requereu a condenação do recorrente como incurso no art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa e o próprio acórdão recorrido, mantido pelo Superior Tribunal de Justiça, afastou a possibilidade de condenação do recorrente pelo art. 10, sem que houvesse qualquer impugnação do titular da ação civil pública quanto ao ponto. 6. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento aos embargos de divergência, ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente. (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): Luiz Fux, Relator(a) p/ Acórdão: Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 22-08-2023, Processo Eletrônico DJe-s/n Divulg 05-09-2023 Public 06-09-2023). Grifo nosso. Dessa forma, tendo os requeridos sido condenados em tipos legais diversos daqueles indicados pelo autor, merece ser reformada a sentença para afastar a condenação dos apelantes pelas condutas típicas do art. 10, caput, e art. 11, V, considerando os termos do art. 17, §10-F, inciso I, da Lei 8.429/92. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observo que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerando o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”, existiu dano ao erário. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. Com efeito, o ato ímprobo, mais do que um ato ilegal, é um ato de desonestidade do agente público para com a administração, sendo imprescindível a demonstração de que tal conduta seja dolosa, evidenciadora de má-fé, para que se possa configurar. Assim, a má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. A ilegalidade passa a ter feições de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública pela má-fé do agente público. Se assim não fosse, qualquer irregularidade praticada por um agente público poderia ser enquadrada como improbidade por violação ao princípio da legalidade, sujeitando-o às pesadas sanções da respectiva lei, o que por certo tornaria inviável a própria atividade administrativa, pois o erro é da essência do ser humano e simples erro não pode ser havido como ato de desonestidade para com o Estado. Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas funcionais de improbidade, sujeitas às sanções da Lei n. 8.429/92. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregularidade constitui-se em ato de improbidade. A Lei de improbidade visa punir atos de corrupção e desonestidade. É a moralidade administrativa que está sendo defendida. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10 e incisos, da Lei 8.429/92. Fica prejudicada a análise de demonstração do dolo específico. Dos honorários Não prospera o pedido de condenação do autor, ora apelado, em honorários advocatícios. Isso porque a Lei 7.347/1985, que disciplina a ação civil pública, com a redação dada pela Lei 8.078/1990, dispõe no art. 18, que “Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais.” No mesmo sentido, o art. 23-B da Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, que trata sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, segundo o qual “Nas ações e nos acordos regidos por esta Lei, não haverá adiantamento de custas, de preparo, de emolumentos, de honorários periciais e de quaisquer outras despesas.” Ante o exposto, dou provimento às apelações e julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial. É o voto. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309/BA CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: JOSENAR MATOS VIEIRA, ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS, DOUGLAS LOPES DA COSTA, CORNELIO JOSE LOPES Advogados do(a) APELANTE: CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A Advogado do(a) APELANTE: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) E M E N T A ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, I, VIII E XII, E ART. 11, I, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 14.230/2021. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECAPITULAÇÃO PELO JUÍZO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA. APELAÇÕES PROVIDAS. 1. Rejeita-se a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, considerando que “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” (AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes). 2. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º,da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), neste também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 3. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". 4. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO;2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 5. O d. magistrado de primeiro grau recapitulou a tipificação das condutas dos requeridos e os condenou como incursos em tipos legais não capitulados pelo autor na petição inicial. Não é possível, contudo, a condenação por conduta diversa daquela capitulada pelo autor. Assim, merece ser reformada a sentença para ser afastada a condenação dos réus com fundamento no art. 10, caput, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. 6. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. 7. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observa-se que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. 8. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. 9. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerado o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” 10. No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. 11. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10, caput, da Lei 8.429/92, na forma pretendida pelo autor. 12. Não cabe a condenação, em ação civil pública, ao pagamento de honorários advocatícios, salvo comprovada má-fé do ente público autor, o que não ocorreu no caso concreto, de modo que não prospera o pedido de condenação do apelado em honorários sucumbenciais. 13. Apelações providas, para julgar improcedentes os pedidos iniciais. A C Ó R D Ã O Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF, 1º de julho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator G/M

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0001240-64.2016.4.01.3309

ID: 317391917

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001240-64.2016.4.01.3309

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

CORNELIO JOSE LOPES DOUGLAS LOPES DA COSTA ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS JOSENAR MATOS VIEIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

KAREN SILVA ALMEIDA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A e MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas pelo Espólio de José Lopes dos Anjos (ID 423424188) e por Cornélio José Lopes, Douglas Lopes da Costa e Josemar Matos Vieira (ID 431641394) contra sentença (ID 423424181) proferida pelo Juízo Federal da Vara Única da Subseção Judiciária de Guanambi/BA que, em ação civil por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos e condenou: a) Espólio de José Lopes dos Anjos: a.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da última remuneração de Jose Lopes dos Anjos no cargo de Prefeito; a.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: ao pagamento de multa civil no valor de R$ 4.425,00. b) Josenar Matos Vieira, pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da sua última remuneração em razão do cargo que ocupava na gestão do ex-prefeito José Lopes dos Anjos. c) Cornelio José Lopes: c.1) Pela prática do ato ímprobo do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; c.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$ 1.525,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de quatro anos. d) Douglas Lopes da Costa: d.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; d.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$2.900,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 4 (quatro) anos. Além disso, julgou improcedentes os pedidos em relação ao requeridos Luciano Souza Santos, Sidnei Monteiro Alves e José Anfilofio de Menezes. O Espólio de José Lopes dos Anjos, em suas razões de apelar, suscita preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a ação, visto que os recursos federais transferidos incorporaram ao patrimônio do município, cabendo à Justiça Estadual julgar o feito; que deve ser aplicada retroativamente a Lei 14.230/2021 aos processos em trâmite; que a ação não obedeceu ao novo regramento legal, pois apresentou imputações genéricas, sem individualização das condutas, sem a demonstração do dolo e a intenção de causar dano ao patrimônio público; que foi consignado na sentença que não há prova de dano causado ao município, elemento necessário à caracterização dos atos do art. 10 e incisos; que o materiais de construção contratado pelo Município foram entregues, não havendo que se falar em proveito particular nem apropriação indevida; que a ausência de individualização da conduta implica em impossibilidade de defesa, restando evidente o cerceamento de defesa; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; requer o provimento da apelação para que sejam julgados improcedentes os pedido. Os demais apelantes, Cornélio e outros, argumentam que o Município de Novo Horizonte/BA possuía, à época dos fatos, apenas duas casas de materiais de construção, de propriedade de dois dos requeridos; que inconsistências formais no procedimento licitatório não são de responsabilidade dos referidos requeridos, pois não concorreram para essas irregularidades; que as duas casas possuíam a mesma empresa de contabilidade, razão pela qual eram idênticos os erros de assessoria; que os produtos foram entregues à prefeitura; que, em razão do princípio da insignificância, não justifica movimentar a máquina judiciária para impor sanção de improbidade administrativa por suposto prejuízo inferior a R$ 3.000,00; requer o provimento da apelação para julgar improcedentes os pedidos formulados na petição inicial e seja o apelado condenado em honorários sucumbenciais. O MPF apresentou contrarrazões, IDs 431641390 e 431641399, pugnando pelo improvimento das apelações. Nesta instância, o Ministério Público Federal, por meio do parecer ID 432616134, opinou pelo não provimento das apelações. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Da preliminar de incompetência da Justiça Federal Competente à Justiça Federal processar e julgar ação de improbidade que busca a responsabilização por malversação de verbas oriundas do FNDE. O entendimento jurisprudencial desta Corte é firme no sentido de que as ações civis públicas por ato de improbidade administrativa em que se busca a responsabilização por desvio de verbas federais devem ser processadas e julgadas pela Justiça Federal. Confiram-se: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; DE JULGAMENTO EXTRA PETITA; DE CERCEAMENTO DE DEFESA E INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. REJEIÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO MUNICÍPIO DE ENTRE FOLHAS-MG EM AUXÍLIO DE EMPRESA VENCEDORA DO CERTAME PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE DRENAGEM E PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. 1. Já encontra sedimentado nesta Corte o entendimento, segundo o qual, tratando-se de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, ante suposta prática de ato de improbidade administrativa por desvio e/ou malversação de recursos públicos federais, a competência para o conhecimento, o processamento e o julgamento da causa é da Justiça Federal, ainda que a União não tenha manifestado interesse em integrar a lide. (...) (AC 0000322-05.2013.4.01.3814, Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado, TRF1 - Quarta Turma, PJe 03/09/2021) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DE TRANSPARÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO. UNIÃO. INTERESSE EXPRESSO EM INTEGRAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. APLICAÇÃO DO ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão que, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Município de Maués/AM em desfavor de ex-prefeito municipal, declinou da competência em favor da Justiça Estadual do Amazonas. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF, visando apurar omissão de gestor municipal, em dar publicidade das verbas repassadas pela União ao município, por intermédio do Portal de Transparência. Precedentes: AG 0061340-18.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, Quarta Turma, e-DJF1 17/11/2017; AG 0061337-63.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Quarta Turma, e-DJF1 10/08/2017; AG 0061357-54.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, e-DJF1 24/03/2017. (...) (AG 1012824-08.2020.4.01.0000, Juiz Federal Érico Rodrigo Freitas Pinheiro (Conv.), TRF1 - Quarta Turma, PJe 04/08/2021) No caso, busca-se a responsabilização de ex-prefeito, e outros, por alegadas irregularidades na gestão de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação – FNDE. Registro, ainda, que, “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Do mérito Segundo consta da inicial, a ação de improbidade administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público Federal contra José Lopes dos Anjos, ex-prefeito do Município de Novo Horizonte/BA, Josemar Matos Vieira, ex-pregoeiro do município, José Anfilofio de Menezes e Sidnei Monteiro Alves, assessores do pregoeiro, Luciano Souza Santos, Controlador Geral do município, Douglas Lopes da Costa e Cornélio José Lopes, empresários, em face de fraudes praticadas nos Pregões Presenciais 005/2010 e 008/2010 realizados para a aquisição de fornecimento de materiais de construção para a prefeitura, condutas que foram enquadradas como atos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” À luz desse tema, as normas de direito material mais benéficas, introduzidas pela Lei 14.230/21, devem ser aplicadas às ações em curso, posto que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1º, § 4º, da LIA). Portanto, a norma mais benéfica retroage para beneficiar o réu. O autor atribuiu aos requeridos a prática dos atos ímprobos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, de cujos dispositivos se extrai: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência A nova redação desses dispositivos, após as alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, ficou assim estabelecida: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) O d. magistrado de primeiro grau, no entanto, recapitulou a tipificação da conduta ao condenar os requeridos pela prática dos atos típicos do art. 10, caput, e art. 11, V, da LIA, tipos legais diversos do capitulado pelo autor na petição inicial. Ressalto, entretanto, que a Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, vedou a possibilidade de modificação de capitulação da conduta apresentada pelo autor no âmbito da ação civil pública de improbidade administrativa (art. 17, § 10-C): § 10-C. Após a réplica do Ministério Público, o juiz proferirá decisão na qual indicará com precisão a tipificação do ato de improbidade administrativa imputável ao réu, sendo-lhe vedado modificar o fato principal e a capitulação legal apresentada pelo autor. No mesmo sentido, ainda, o disposto no § 10-F do referido artigo: § 10-F. Será nula a decisão de mérito total ou parcial da ação de improbidade administrativa que: (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) I - condenar o requerido por tipo diverso daquele definido na petição inicial; A propósito, em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se no sentido de não ser possível o reenquadramento, em outro dispositivo, do ato ilícito apontado pelo autor na ação civil pública de improbidade administrativa. Confira-se: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADVENTO DA LEI 14.231/2021. INTELIGÊNCIA DO ARE 843989 (TEMA 1.199). INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 AOS PROCESSOS EM CURSO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no inciso I do do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 revogou o referido dispositivo e a hipótese típica até então nele prevista ao mesmo tempo em que (iii) passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5. Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), pois o autor da demanda, na peça inicial, não requereu a condenação do recorrente como incurso no art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa e o próprio acórdão recorrido, mantido pelo Superior Tribunal de Justiça, afastou a possibilidade de condenação do recorrente pelo art. 10, sem que houvesse qualquer impugnação do titular da ação civil pública quanto ao ponto. 6. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento aos embargos de divergência, ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente. (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): Luiz Fux, Relator(a) p/ Acórdão: Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 22-08-2023, Processo Eletrônico DJe-s/n Divulg 05-09-2023 Public 06-09-2023). Grifo nosso. Dessa forma, tendo os requeridos sido condenados em tipos legais diversos daqueles indicados pelo autor, merece ser reformada a sentença para afastar a condenação dos apelantes pelas condutas típicas do art. 10, caput, e art. 11, V, considerando os termos do art. 17, §10-F, inciso I, da Lei 8.429/92. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observo que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerando o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”, existiu dano ao erário. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. Com efeito, o ato ímprobo, mais do que um ato ilegal, é um ato de desonestidade do agente público para com a administração, sendo imprescindível a demonstração de que tal conduta seja dolosa, evidenciadora de má-fé, para que se possa configurar. Assim, a má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. A ilegalidade passa a ter feições de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública pela má-fé do agente público. Se assim não fosse, qualquer irregularidade praticada por um agente público poderia ser enquadrada como improbidade por violação ao princípio da legalidade, sujeitando-o às pesadas sanções da respectiva lei, o que por certo tornaria inviável a própria atividade administrativa, pois o erro é da essência do ser humano e simples erro não pode ser havido como ato de desonestidade para com o Estado. Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas funcionais de improbidade, sujeitas às sanções da Lei n. 8.429/92. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregularidade constitui-se em ato de improbidade. A Lei de improbidade visa punir atos de corrupção e desonestidade. É a moralidade administrativa que está sendo defendida. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10 e incisos, da Lei 8.429/92. Fica prejudicada a análise de demonstração do dolo específico. Dos honorários Não prospera o pedido de condenação do autor, ora apelado, em honorários advocatícios. Isso porque a Lei 7.347/1985, que disciplina a ação civil pública, com a redação dada pela Lei 8.078/1990, dispõe no art. 18, que “Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais.” No mesmo sentido, o art. 23-B da Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, que trata sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, segundo o qual “Nas ações e nos acordos regidos por esta Lei, não haverá adiantamento de custas, de preparo, de emolumentos, de honorários periciais e de quaisquer outras despesas.” Ante o exposto, dou provimento às apelações e julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial. É o voto. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309/BA CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: JOSENAR MATOS VIEIRA, ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS, DOUGLAS LOPES DA COSTA, CORNELIO JOSE LOPES Advogados do(a) APELANTE: CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A Advogado do(a) APELANTE: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) E M E N T A ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, I, VIII E XII, E ART. 11, I, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 14.230/2021. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECAPITULAÇÃO PELO JUÍZO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA. APELAÇÕES PROVIDAS. 1. Rejeita-se a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, considerando que “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” (AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes). 2. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º,da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), neste também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 3. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". 4. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO;2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 5. O d. magistrado de primeiro grau recapitulou a tipificação das condutas dos requeridos e os condenou como incursos em tipos legais não capitulados pelo autor na petição inicial. Não é possível, contudo, a condenação por conduta diversa daquela capitulada pelo autor. Assim, merece ser reformada a sentença para ser afastada a condenação dos réus com fundamento no art. 10, caput, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. 6. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. 7. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observa-se que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. 8. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. 9. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerado o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” 10. No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. 11. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10, caput, da Lei 8.429/92, na forma pretendida pelo autor. 12. Não cabe a condenação, em ação civil pública, ao pagamento de honorários advocatícios, salvo comprovada má-fé do ente público autor, o que não ocorreu no caso concreto, de modo que não prospera o pedido de condenação do apelado em honorários sucumbenciais. 13. Apelações providas, para julgar improcedentes os pedidos iniciais. A C Ó R D Ã O Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF, 1º de julho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator G/M

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0001240-64.2016.4.01.3309

ID: 317391927

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001240-64.2016.4.01.3309

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

CORNELIO JOSE LOPES DOUGLAS LOPES DA COSTA ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS JOSENAR MATOS VIEIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

KAREN SILVA ALMEIDA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A e MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas pelo Espólio de José Lopes dos Anjos (ID 423424188) e por Cornélio José Lopes, Douglas Lopes da Costa e Josemar Matos Vieira (ID 431641394) contra sentença (ID 423424181) proferida pelo Juízo Federal da Vara Única da Subseção Judiciária de Guanambi/BA que, em ação civil por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos e condenou: a) Espólio de José Lopes dos Anjos: a.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da última remuneração de Jose Lopes dos Anjos no cargo de Prefeito; a.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: ao pagamento de multa civil no valor de R$ 4.425,00. b) Josenar Matos Vieira, pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da sua última remuneração em razão do cargo que ocupava na gestão do ex-prefeito José Lopes dos Anjos. c) Cornelio José Lopes: c.1) Pela prática do ato ímprobo do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; c.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$ 1.525,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de quatro anos. d) Douglas Lopes da Costa: d.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; d.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$2.900,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 4 (quatro) anos. Além disso, julgou improcedentes os pedidos em relação ao requeridos Luciano Souza Santos, Sidnei Monteiro Alves e José Anfilofio de Menezes. O Espólio de José Lopes dos Anjos, em suas razões de apelar, suscita preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a ação, visto que os recursos federais transferidos incorporaram ao patrimônio do município, cabendo à Justiça Estadual julgar o feito; que deve ser aplicada retroativamente a Lei 14.230/2021 aos processos em trâmite; que a ação não obedeceu ao novo regramento legal, pois apresentou imputações genéricas, sem individualização das condutas, sem a demonstração do dolo e a intenção de causar dano ao patrimônio público; que foi consignado na sentença que não há prova de dano causado ao município, elemento necessário à caracterização dos atos do art. 10 e incisos; que o materiais de construção contratado pelo Município foram entregues, não havendo que se falar em proveito particular nem apropriação indevida; que a ausência de individualização da conduta implica em impossibilidade de defesa, restando evidente o cerceamento de defesa; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; requer o provimento da apelação para que sejam julgados improcedentes os pedido. Os demais apelantes, Cornélio e outros, argumentam que o Município de Novo Horizonte/BA possuía, à época dos fatos, apenas duas casas de materiais de construção, de propriedade de dois dos requeridos; que inconsistências formais no procedimento licitatório não são de responsabilidade dos referidos requeridos, pois não concorreram para essas irregularidades; que as duas casas possuíam a mesma empresa de contabilidade, razão pela qual eram idênticos os erros de assessoria; que os produtos foram entregues à prefeitura; que, em razão do princípio da insignificância, não justifica movimentar a máquina judiciária para impor sanção de improbidade administrativa por suposto prejuízo inferior a R$ 3.000,00; requer o provimento da apelação para julgar improcedentes os pedidos formulados na petição inicial e seja o apelado condenado em honorários sucumbenciais. O MPF apresentou contrarrazões, IDs 431641390 e 431641399, pugnando pelo improvimento das apelações. Nesta instância, o Ministério Público Federal, por meio do parecer ID 432616134, opinou pelo não provimento das apelações. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Da preliminar de incompetência da Justiça Federal Competente à Justiça Federal processar e julgar ação de improbidade que busca a responsabilização por malversação de verbas oriundas do FNDE. O entendimento jurisprudencial desta Corte é firme no sentido de que as ações civis públicas por ato de improbidade administrativa em que se busca a responsabilização por desvio de verbas federais devem ser processadas e julgadas pela Justiça Federal. Confiram-se: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; DE JULGAMENTO EXTRA PETITA; DE CERCEAMENTO DE DEFESA E INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. REJEIÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO MUNICÍPIO DE ENTRE FOLHAS-MG EM AUXÍLIO DE EMPRESA VENCEDORA DO CERTAME PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE DRENAGEM E PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. 1. Já encontra sedimentado nesta Corte o entendimento, segundo o qual, tratando-se de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, ante suposta prática de ato de improbidade administrativa por desvio e/ou malversação de recursos públicos federais, a competência para o conhecimento, o processamento e o julgamento da causa é da Justiça Federal, ainda que a União não tenha manifestado interesse em integrar a lide. (...) (AC 0000322-05.2013.4.01.3814, Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado, TRF1 - Quarta Turma, PJe 03/09/2021) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DE TRANSPARÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO. UNIÃO. INTERESSE EXPRESSO EM INTEGRAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. APLICAÇÃO DO ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão que, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Município de Maués/AM em desfavor de ex-prefeito municipal, declinou da competência em favor da Justiça Estadual do Amazonas. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF, visando apurar omissão de gestor municipal, em dar publicidade das verbas repassadas pela União ao município, por intermédio do Portal de Transparência. Precedentes: AG 0061340-18.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, Quarta Turma, e-DJF1 17/11/2017; AG 0061337-63.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Quarta Turma, e-DJF1 10/08/2017; AG 0061357-54.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, e-DJF1 24/03/2017. (...) (AG 1012824-08.2020.4.01.0000, Juiz Federal Érico Rodrigo Freitas Pinheiro (Conv.), TRF1 - Quarta Turma, PJe 04/08/2021) No caso, busca-se a responsabilização de ex-prefeito, e outros, por alegadas irregularidades na gestão de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação – FNDE. Registro, ainda, que, “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Do mérito Segundo consta da inicial, a ação de improbidade administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público Federal contra José Lopes dos Anjos, ex-prefeito do Município de Novo Horizonte/BA, Josemar Matos Vieira, ex-pregoeiro do município, José Anfilofio de Menezes e Sidnei Monteiro Alves, assessores do pregoeiro, Luciano Souza Santos, Controlador Geral do município, Douglas Lopes da Costa e Cornélio José Lopes, empresários, em face de fraudes praticadas nos Pregões Presenciais 005/2010 e 008/2010 realizados para a aquisição de fornecimento de materiais de construção para a prefeitura, condutas que foram enquadradas como atos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” À luz desse tema, as normas de direito material mais benéficas, introduzidas pela Lei 14.230/21, devem ser aplicadas às ações em curso, posto que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1º, § 4º, da LIA). Portanto, a norma mais benéfica retroage para beneficiar o réu. O autor atribuiu aos requeridos a prática dos atos ímprobos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, de cujos dispositivos se extrai: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência A nova redação desses dispositivos, após as alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, ficou assim estabelecida: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) O d. magistrado de primeiro grau, no entanto, recapitulou a tipificação da conduta ao condenar os requeridos pela prática dos atos típicos do art. 10, caput, e art. 11, V, da LIA, tipos legais diversos do capitulado pelo autor na petição inicial. Ressalto, entretanto, que a Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, vedou a possibilidade de modificação de capitulação da conduta apresentada pelo autor no âmbito da ação civil pública de improbidade administrativa (art. 17, § 10-C): § 10-C. Após a réplica do Ministério Público, o juiz proferirá decisão na qual indicará com precisão a tipificação do ato de improbidade administrativa imputável ao réu, sendo-lhe vedado modificar o fato principal e a capitulação legal apresentada pelo autor. No mesmo sentido, ainda, o disposto no § 10-F do referido artigo: § 10-F. Será nula a decisão de mérito total ou parcial da ação de improbidade administrativa que: (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) I - condenar o requerido por tipo diverso daquele definido na petição inicial; A propósito, em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se no sentido de não ser possível o reenquadramento, em outro dispositivo, do ato ilícito apontado pelo autor na ação civil pública de improbidade administrativa. Confira-se: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADVENTO DA LEI 14.231/2021. INTELIGÊNCIA DO ARE 843989 (TEMA 1.199). INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 AOS PROCESSOS EM CURSO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no inciso I do do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 revogou o referido dispositivo e a hipótese típica até então nele prevista ao mesmo tempo em que (iii) passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5. Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), pois o autor da demanda, na peça inicial, não requereu a condenação do recorrente como incurso no art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa e o próprio acórdão recorrido, mantido pelo Superior Tribunal de Justiça, afastou a possibilidade de condenação do recorrente pelo art. 10, sem que houvesse qualquer impugnação do titular da ação civil pública quanto ao ponto. 6. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento aos embargos de divergência, ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente. (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): Luiz Fux, Relator(a) p/ Acórdão: Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 22-08-2023, Processo Eletrônico DJe-s/n Divulg 05-09-2023 Public 06-09-2023). Grifo nosso. Dessa forma, tendo os requeridos sido condenados em tipos legais diversos daqueles indicados pelo autor, merece ser reformada a sentença para afastar a condenação dos apelantes pelas condutas típicas do art. 10, caput, e art. 11, V, considerando os termos do art. 17, §10-F, inciso I, da Lei 8.429/92. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observo que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerando o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”, existiu dano ao erário. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. Com efeito, o ato ímprobo, mais do que um ato ilegal, é um ato de desonestidade do agente público para com a administração, sendo imprescindível a demonstração de que tal conduta seja dolosa, evidenciadora de má-fé, para que se possa configurar. Assim, a má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. A ilegalidade passa a ter feições de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública pela má-fé do agente público. Se assim não fosse, qualquer irregularidade praticada por um agente público poderia ser enquadrada como improbidade por violação ao princípio da legalidade, sujeitando-o às pesadas sanções da respectiva lei, o que por certo tornaria inviável a própria atividade administrativa, pois o erro é da essência do ser humano e simples erro não pode ser havido como ato de desonestidade para com o Estado. Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas funcionais de improbidade, sujeitas às sanções da Lei n. 8.429/92. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregularidade constitui-se em ato de improbidade. A Lei de improbidade visa punir atos de corrupção e desonestidade. É a moralidade administrativa que está sendo defendida. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10 e incisos, da Lei 8.429/92. Fica prejudicada a análise de demonstração do dolo específico. Dos honorários Não prospera o pedido de condenação do autor, ora apelado, em honorários advocatícios. Isso porque a Lei 7.347/1985, que disciplina a ação civil pública, com a redação dada pela Lei 8.078/1990, dispõe no art. 18, que “Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais.” No mesmo sentido, o art. 23-B da Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, que trata sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, segundo o qual “Nas ações e nos acordos regidos por esta Lei, não haverá adiantamento de custas, de preparo, de emolumentos, de honorários periciais e de quaisquer outras despesas.” Ante o exposto, dou provimento às apelações e julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial. É o voto. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309/BA CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: JOSENAR MATOS VIEIRA, ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS, DOUGLAS LOPES DA COSTA, CORNELIO JOSE LOPES Advogados do(a) APELANTE: CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A Advogado do(a) APELANTE: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) E M E N T A ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, I, VIII E XII, E ART. 11, I, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 14.230/2021. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECAPITULAÇÃO PELO JUÍZO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA. APELAÇÕES PROVIDAS. 1. Rejeita-se a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, considerando que “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” (AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes). 2. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º,da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), neste também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 3. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". 4. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO;2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 5. O d. magistrado de primeiro grau recapitulou a tipificação das condutas dos requeridos e os condenou como incursos em tipos legais não capitulados pelo autor na petição inicial. Não é possível, contudo, a condenação por conduta diversa daquela capitulada pelo autor. Assim, merece ser reformada a sentença para ser afastada a condenação dos réus com fundamento no art. 10, caput, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. 6. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. 7. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observa-se que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. 8. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. 9. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerado o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” 10. No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. 11. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10, caput, da Lei 8.429/92, na forma pretendida pelo autor. 12. Não cabe a condenação, em ação civil pública, ao pagamento de honorários advocatícios, salvo comprovada má-fé do ente público autor, o que não ocorreu no caso concreto, de modo que não prospera o pedido de condenação do apelado em honorários sucumbenciais. 13. Apelações providas, para julgar improcedentes os pedidos iniciais. A C Ó R D Ã O Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF, 1º de julho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator G/M

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0001240-64.2016.4.01.3309

ID: 317391932

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001240-64.2016.4.01.3309

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

CORNELIO JOSE LOPES DOUGLAS LOPES DA COSTA ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS JOSENAR MATOS VIEIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

KAREN SILVA ALMEIDA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: JOSENAR MATOS VIEIRA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A e MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas pelo Espólio de José Lopes dos Anjos (ID 423424188) e por Cornélio José Lopes, Douglas Lopes da Costa e Josemar Matos Vieira (ID 431641394) contra sentença (ID 423424181) proferida pelo Juízo Federal da Vara Única da Subseção Judiciária de Guanambi/BA que, em ação civil por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos e condenou: a) Espólio de José Lopes dos Anjos: a.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da última remuneração de Jose Lopes dos Anjos no cargo de Prefeito; a.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: ao pagamento de multa civil no valor de R$ 4.425,00. b) Josenar Matos Vieira, pela prática do ato do art. 11, inciso V: ao pagamento de multa civil correspondente a 5 (cinco) vezes o valor atualizado da sua última remuneração em razão do cargo que ocupava na gestão do ex-prefeito José Lopes dos Anjos. c) Cornelio José Lopes: c.1) Pela prática do ato ímprobo do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; c.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$ 1.525,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; e à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de quatro anos. d) Douglas Lopes da Costa: d.1) Pela prática do ato do art. 11, inciso V: à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 2 (dois) anos; d.2) Pela prática do ato do art. 10, caput: à perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, no valor apurado de R$2.900,00; ao pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 4 (quatro) anos. Além disso, julgou improcedentes os pedidos em relação ao requeridos Luciano Souza Santos, Sidnei Monteiro Alves e José Anfilofio de Menezes. O Espólio de José Lopes dos Anjos, em suas razões de apelar, suscita preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar a ação, visto que os recursos federais transferidos incorporaram ao patrimônio do município, cabendo à Justiça Estadual julgar o feito; que deve ser aplicada retroativamente a Lei 14.230/2021 aos processos em trâmite; que a ação não obedeceu ao novo regramento legal, pois apresentou imputações genéricas, sem individualização das condutas, sem a demonstração do dolo e a intenção de causar dano ao patrimônio público; que foi consignado na sentença que não há prova de dano causado ao município, elemento necessário à caracterização dos atos do art. 10 e incisos; que o materiais de construção contratado pelo Município foram entregues, não havendo que se falar em proveito particular nem apropriação indevida; que a ausência de individualização da conduta implica em impossibilidade de defesa, restando evidente o cerceamento de defesa; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; requer o provimento da apelação para que sejam julgados improcedentes os pedido. Os demais apelantes, Cornélio e outros, argumentam que o Município de Novo Horizonte/BA possuía, à época dos fatos, apenas duas casas de materiais de construção, de propriedade de dois dos requeridos; que inconsistências formais no procedimento licitatório não são de responsabilidade dos referidos requeridos, pois não concorreram para essas irregularidades; que as duas casas possuíam a mesma empresa de contabilidade, razão pela qual eram idênticos os erros de assessoria; que os produtos foram entregues à prefeitura; que, em razão do princípio da insignificância, não justifica movimentar a máquina judiciária para impor sanção de improbidade administrativa por suposto prejuízo inferior a R$ 3.000,00; requer o provimento da apelação para julgar improcedentes os pedidos formulados na petição inicial e seja o apelado condenado em honorários sucumbenciais. O MPF apresentou contrarrazões, IDs 431641390 e 431641399, pugnando pelo improvimento das apelações. Nesta instância, o Ministério Público Federal, por meio do parecer ID 432616134, opinou pelo não provimento das apelações. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Da preliminar de incompetência da Justiça Federal Competente à Justiça Federal processar e julgar ação de improbidade que busca a responsabilização por malversação de verbas oriundas do FNDE. O entendimento jurisprudencial desta Corte é firme no sentido de que as ações civis públicas por ato de improbidade administrativa em que se busca a responsabilização por desvio de verbas federais devem ser processadas e julgadas pela Justiça Federal. Confiram-se: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; DE JULGAMENTO EXTRA PETITA; DE CERCEAMENTO DE DEFESA E INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. REJEIÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO MUNICÍPIO DE ENTRE FOLHAS-MG EM AUXÍLIO DE EMPRESA VENCEDORA DO CERTAME PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE DRENAGEM E PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. 1. Já encontra sedimentado nesta Corte o entendimento, segundo o qual, tratando-se de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, ante suposta prática de ato de improbidade administrativa por desvio e/ou malversação de recursos públicos federais, a competência para o conhecimento, o processamento e o julgamento da causa é da Justiça Federal, ainda que a União não tenha manifestado interesse em integrar a lide. (...) (AC 0000322-05.2013.4.01.3814, Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado, TRF1 - Quarta Turma, PJe 03/09/2021) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DE TRANSPARÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO. UNIÃO. INTERESSE EXPRESSO EM INTEGRAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. APLICAÇÃO DO ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão que, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Município de Maués/AM em desfavor de ex-prefeito municipal, declinou da competência em favor da Justiça Estadual do Amazonas. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF, visando apurar omissão de gestor municipal, em dar publicidade das verbas repassadas pela União ao município, por intermédio do Portal de Transparência. Precedentes: AG 0061340-18.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, Quarta Turma, e-DJF1 17/11/2017; AG 0061337-63.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Quarta Turma, e-DJF1 10/08/2017; AG 0061357-54.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, e-DJF1 24/03/2017. (...) (AG 1012824-08.2020.4.01.0000, Juiz Federal Érico Rodrigo Freitas Pinheiro (Conv.), TRF1 - Quarta Turma, PJe 04/08/2021) No caso, busca-se a responsabilização de ex-prefeito, e outros, por alegadas irregularidades na gestão de recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB, repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação – FNDE. Registro, ainda, que, “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Do mérito Segundo consta da inicial, a ação de improbidade administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público Federal contra José Lopes dos Anjos, ex-prefeito do Município de Novo Horizonte/BA, Josemar Matos Vieira, ex-pregoeiro do município, José Anfilofio de Menezes e Sidnei Monteiro Alves, assessores do pregoeiro, Luciano Souza Santos, Controlador Geral do município, Douglas Lopes da Costa e Cornélio José Lopes, empresários, em face de fraudes praticadas nos Pregões Presenciais 005/2010 e 008/2010 realizados para a aquisição de fornecimento de materiais de construção para a prefeitura, condutas que foram enquadradas como atos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” À luz desse tema, as normas de direito material mais benéficas, introduzidas pela Lei 14.230/21, devem ser aplicadas às ações em curso, posto que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1º, § 4º, da LIA). Portanto, a norma mais benéfica retroage para beneficiar o réu. O autor atribuiu aos requeridos a prática dos atos ímprobos do art. 10, I, VIII e XII, e art. 11, I, da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, de cujos dispositivos se extrai: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (Vigência) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência A nova redação desses dispositivos, após as alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, ficou assim estabelecida: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) O d. magistrado de primeiro grau, no entanto, recapitulou a tipificação da conduta ao condenar os requeridos pela prática dos atos típicos do art. 10, caput, e art. 11, V, da LIA, tipos legais diversos do capitulado pelo autor na petição inicial. Ressalto, entretanto, que a Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, vedou a possibilidade de modificação de capitulação da conduta apresentada pelo autor no âmbito da ação civil pública de improbidade administrativa (art. 17, § 10-C): § 10-C. Após a réplica do Ministério Público, o juiz proferirá decisão na qual indicará com precisão a tipificação do ato de improbidade administrativa imputável ao réu, sendo-lhe vedado modificar o fato principal e a capitulação legal apresentada pelo autor. No mesmo sentido, ainda, o disposto no § 10-F do referido artigo: § 10-F. Será nula a decisão de mérito total ou parcial da ação de improbidade administrativa que: (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) I - condenar o requerido por tipo diverso daquele definido na petição inicial; A propósito, em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se no sentido de não ser possível o reenquadramento, em outro dispositivo, do ato ilícito apontado pelo autor na ação civil pública de improbidade administrativa. Confira-se: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADVENTO DA LEI 14.231/2021. INTELIGÊNCIA DO ARE 843989 (TEMA 1.199). INCIDÊNCIA IMEDIATA DA NOVA REDAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992 AOS PROCESSOS EM CURSO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípio da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843989 (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações da introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no inciso I do do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 revogou o referido dispositivo e a hipótese típica até então nele prevista ao mesmo tempo em que (iii) passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5. Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10º da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), pois o autor da demanda, na peça inicial, não requereu a condenação do recorrente como incurso no art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa e o próprio acórdão recorrido, mantido pelo Superior Tribunal de Justiça, afastou a possibilidade de condenação do recorrente pelo art. 10, sem que houvesse qualquer impugnação do titular da ação civil pública quanto ao ponto. 6. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento aos embargos de divergência, ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente. (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): Luiz Fux, Relator(a) p/ Acórdão: Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 22-08-2023, Processo Eletrônico DJe-s/n Divulg 05-09-2023 Public 06-09-2023). Grifo nosso. Dessa forma, tendo os requeridos sido condenados em tipos legais diversos daqueles indicados pelo autor, merece ser reformada a sentença para afastar a condenação dos apelantes pelas condutas típicas do art. 10, caput, e art. 11, V, considerando os termos do art. 17, §10-F, inciso I, da Lei 8.429/92. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observo que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerando o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”, existiu dano ao erário. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. Com efeito, o ato ímprobo, mais do que um ato ilegal, é um ato de desonestidade do agente público para com a administração, sendo imprescindível a demonstração de que tal conduta seja dolosa, evidenciadora de má-fé, para que se possa configurar. Assim, a má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. A ilegalidade passa a ter feições de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública pela má-fé do agente público. Se assim não fosse, qualquer irregularidade praticada por um agente público poderia ser enquadrada como improbidade por violação ao princípio da legalidade, sujeitando-o às pesadas sanções da respectiva lei, o que por certo tornaria inviável a própria atividade administrativa, pois o erro é da essência do ser humano e simples erro não pode ser havido como ato de desonestidade para com o Estado. Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas funcionais de improbidade, sujeitas às sanções da Lei n. 8.429/92. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregularidade constitui-se em ato de improbidade. A Lei de improbidade visa punir atos de corrupção e desonestidade. É a moralidade administrativa que está sendo defendida. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10 e incisos, da Lei 8.429/92. Fica prejudicada a análise de demonstração do dolo específico. Dos honorários Não prospera o pedido de condenação do autor, ora apelado, em honorários advocatícios. Isso porque a Lei 7.347/1985, que disciplina a ação civil pública, com a redação dada pela Lei 8.078/1990, dispõe no art. 18, que “Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais.” No mesmo sentido, o art. 23-B da Lei 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, que trata sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, segundo o qual “Nas ações e nos acordos regidos por esta Lei, não haverá adiantamento de custas, de preparo, de emolumentos, de honorários periciais e de quaisquer outras despesas.” Ante o exposto, dou provimento às apelações e julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial. É o voto. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0001240-64.2016.4.01.3309 PROCESSO REFERÊNCIA: 0001240-64.2016.4.01.3309/BA CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: JOSENAR MATOS VIEIRA, ESPOLIO DE JOSE LOPES DOS ANJOS, DOUGLAS LOPES DA COSTA, CORNELIO JOSE LOPES Advogados do(a) APELANTE: CATHARINA AYRES COSTA DE FIGUEIREDO - BA46363-A, KAREN SILVA ALMEIDA - BA45903-A, MAILSON JOSE PORTO MAGALHAES TANAJURA - BA45735-A Advogado do(a) APELANTE: THIAGO CARNEIRO VILASBOAS GUTEMBERG - BA19647-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) E M E N T A ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, I, VIII E XII, E ART. 11, I, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 14.230/2021. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECAPITULAÇÃO PELO JUÍZO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA. APELAÇÕES PROVIDAS. 1. Rejeita-se a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, considerando que “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” (AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes). 2. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º,da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), neste também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 3. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". 4. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO;2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 5. O d. magistrado de primeiro grau recapitulou a tipificação das condutas dos requeridos e os condenou como incursos em tipos legais não capitulados pelo autor na petição inicial. Não é possível, contudo, a condenação por conduta diversa daquela capitulada pelo autor. Assim, merece ser reformada a sentença para ser afastada a condenação dos réus com fundamento no art. 10, caput, e art. 11, I, da Lei 8.429/92. 6. Ainda que assim não fosse, não seria o caso de condenação dos requeridos na forma pretendida pelo autor. 7. No que se refere à conduta tipificada no inciso I do art. 11 da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021, observa-se que foi revogada, não mais subsistindo a imputação por violação ao respectivo dispositivo de lei, de modo que se torna incabível a condenação por suposta violação ao referido tipo legal que deixou de existir no mundo jurídico. 8. Para a configuração dos atos de improbidade do art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade de demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico e o efetivo prejuízo ao erário. 9. No caso concreto, conforme consignado na sentença, não foi comprovado efetivo prejuízo ao Poder Público, tendo sido considerado o dano presumido (in re ipsa), visto que o Juízo entendeu que, “Ao simular procedimento licitatório, direcionando seu objeto, os demandados frustraram, dentre outros, a escolha da melhor proposta e a contratação economicamente mais viável e menos dispendiosa para a Administração.”. Ademais, também foi afirmado na sentença que “... não há provas de que os bens contratados não tenham sido entregues, ou que os preços tenham sido dissonantes daqueles praticados pelo mercado. Todas as irregularidades comprovadas estão ligadas ao procedimento em si.” 10. No entanto, o ato de improbidade administrativa não pode ser entendido como mera atuação do agente público em desconformidade com a lei. A intenção do legislador ordinário na produção da norma (Lei n. 8.429/92), em observância ao texto constitucional (CF, art. 37, § 4º), não foi essa. Mas sim a de impor a todos os agentes públicos o dever de, no exercício de suas funções, pautarem as suas condutas pelos princípios da legalidade e moralidade, sob pena de sofrerem sanções pelos seus atos considerados ímprobos. 11. Dessa forma, não havendo nos autos a comprovação do efetivo prejuízo ao patrimônio público, não há espaço, no caso, para a condenação por ato de improbidade administrativa do art. 10, caput, da Lei 8.429/92, na forma pretendida pelo autor. 12. Não cabe a condenação, em ação civil pública, ao pagamento de honorários advocatícios, salvo comprovada má-fé do ente público autor, o que não ocorreu no caso concreto, de modo que não prospera o pedido de condenação do apelado em honorários sucumbenciais. 13. Apelações providas, para julgar improcedentes os pedidos iniciais. A C Ó R D Ã O Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF, 1º de julho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator G/M

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0004338-56.2013.4.01.3311

ID: 326468101

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0004338-56.2013.4.01.3311

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

ALESSANDRA SILVA SANTOS FERNANDO BEZERRA LEITE MARIA AUGUSTA CARILLO MARQUES MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOAO VICTOR DUTRA DE ALMEIDA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

RENATO DATTOLI NETO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

IRUMAN RAMOS CONTREIRAS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JERBSON ALMEIDA MORAES

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

VLADIMIR SOARES SANTOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: MARIA CLAUDIA ARAGAO… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS - BA9465-A, VLADIMIR SOARES SANTOS - BA40043-A, LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, JERBSON ALMEIDA MORAES - BA16599-A, IRUMAN RAMOS CONTREIRAS - BA10889-A, GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO - BA14566-A, RENATO DATTOLI NETO - BA42446-A, AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR - BA50343-A e JOAO VICTOR DUTRA DE ALMEIDA - BA69987 POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas por Fernando Bezerra Leite (ID 421365335), Maria Augusta Carillo Marques (ID 421365339), Maria Cláudia Aragão Padilha Lima (ID 421365346) e Alessandra Silva Santos (ID 421365350) contra sentença (ID 421365325) prolatada pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Itabuna/BA que, nos autos da ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos e, com fulcro no art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, condenou: a) Edivaldo Souza Lima, Fernando Bezerra Leite, Maria Augusta Carillo Marques, Neide Rocha dos Santos e Maria Cláudia Aragão Padilha Lima: ao ressarcimento integral do dano, no valor total de R$ 1.129.248,60 (um milhão, cento e vinte e nove mil, duzentos e quarenta e oito reais e sessenta centavos); à perda da função pública; à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos. b) Fernando Moreira Amaral, Alberto Clécio Oliveira Viana, Aldai Marino Barreto, Valéria Santos Amaral, Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos: ao ressarcimento integral do dano, no valor total de R$ 1.129.248,60 (um milhão, cento e vinte e nove mil, duzentos e quarenta e oito reais e sessenta centavos); e à proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócias majoritárias, pelo prazo de 12 (doze) anos. O apelante Fernando Bezerra Leite argumenta que não demonstrada, de forma inequívoca, sua desonestidade na condução de suas atividades; alega não ser parte legítima para figurar no polo passivo da ação, pois não obteve qualquer vantagem indevida ou qualquer outro benefício; suscita preliminar de inépcia da inicial, pois os fatos articulados na inicial não conduzem a uma conclusão lógica, tampouco foram individualizadas as condutas, de forma que prejudicada a defesa; que não foi demonstrada conduta típica dolosa, com o fim de causar prejuízo ao erário; que a pena não foi individualizada; que incidiu a prescrição no caso concreto, visto que o mandato de prefeito finalizou-se em 31/12/2008 e ação foi proposta após o transcurso do prazo quinquenal da prescrição; requer o provimento da apelação. A recorrente Maria Augusta Carillo Marques suscita preliminar de prescrição, alegando que as investigações ocorreram no período de 25/08 a 05/09/2008, e ação de improbidade somente foi ajuizada em 12/11/2013, após transcorrido o prazo quinquenal da prescrição; suscita também preliminar de prescrição intercorrente, na forma do § 8º do art. 23 da Lei 8.429/92, com as alterações da Lei 14.230/2021; que a sentença é nula, pois não individualizou a conduta de cada requerido, tampouco apresentou a devida fundamentação; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; requer o reconhecimento da nulidade da sentença, a incidência da prescrição ou seja dado provimento ao recurso para que afaste a sua condenação. Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, em suas razões de apelar, suscita preliminar de nulidade processual, decretando a invalidade de todos os atos do final da instrução, e lhe seja devolvido prazo para apresentar alegações finais, a fim de que possa fazer considerações sobre as provas produzidas, solicitar diligências e outras medidas pertinentes; que não lhe foi oportunizada a manifestação sobre a Lei 14.230/2021, o que também é uma nulidade processual; que a sentença padece de falta de fundamentação; que não foi definida a parte que cabe a cada requerido em relação ao valor a ser ressarcido (R$1.129.248,60); que não foi demonstrado na sentença o prejuízo causado ao erário; suscita preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, assim como ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; que não restou demonstrada de forma inequívoca a ocorrência de fatos ímprobos; requer o reconhecimento e a decretação da nulidade da sentença em face das preliminares suscitadas ou o provimento da apelação para que seja julgada improcedente a ação, e seja revista a condenação em honorários advocatícios, por ser descabida. Alessandra Silva Santos, em suas razões de recorrer, requer o deferimento da justiça gratuita; suscita preliminar de prescrição, alegando que as investigações ocorreram no período de 25/08 a 05/09/2008, e ação de improbidade somente foi ajuizada em 12/11/2013, após transcorrido o prazo quinquenal da prescrição; suscita também preliminar de prescrição intercorrente, na forma do § 8º do art. 23 da Lei 8.429/92, com as alterações da Lei 14.230/2021; que a sentença é nula, pois não foi intimada para a apresentação das alegações finais; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; que não foi individualizada a conduta dos requeridos, tampouco individualização da pena; requer o deferimento da justiça gratuita, para que sejam reconhecidas as nulidades suscitadas ou seja provido o apelo e afastada a sua condenação. Foram apresentadas as contrarrazões, ID 421365353, 421365354. Nesta instância, a Procuradoria Regional da República da 1ª Região opinou pela manutenção da sentença, ID 422108183. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Das preliminares Da incompetência da Justiça Federal Competente à Justiça Federal processar e julgar ação de improbidade que busca a responsabilização por malversação de verbas federais. Confiram-se: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; DE JULGAMENTO EXTRA PETITA; DE CERCEAMENTO DE DEFESA E INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. REJEIÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO MUNICÍPIO DE ENTRE FOLHAS-MG EM AUXÍLIO DE EMPRESA VENCEDORA DO CERTAME PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE DRENAGEM E PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. 1. Já encontra sedimentado nesta Corte o entendimento, segundo o qual, tratando-se de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, ante suposta prática de ato de improbidade administrativa por desvio e/ou malversação de recursos públicos federais, a competência para o conhecimento, o processamento e o julgamento da causa é da Justiça Federal, ainda que a União não tenha manifestado interesse em integrar a lide. (...) (AC 0000322-05.2013.4.01.3814, Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado, TRF1 - Quarta Turma, PJe 03/09/2021) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DE TRANSPARÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO. UNIÃO. INTERESSE EXPRESSO EM INTEGRAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. APLICAÇÃO DO ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão que, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Município de Maués/AM em desfavor de ex-prefeito municipal, declinou da competência em favor da Justiça Estadual do Amazonas. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF, visando apurar omissão de gestor municipal, em dar publicidade das verbas repassadas pela União ao município, por intermédio do Portal de Transparência. Precedentes: AG 0061340-18.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, Quarta Turma, e-DJF1 17/11/2017; AG 0061337-63.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Quarta Turma, e-DJF1 10/08/2017; AG 0061357-54.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, e-DJF1 24/03/2017. (...) (AG 1012824-08.2020.4.01.0000, Juiz Federal Érico Rodrigo Freitas Pinheiro (Conv.), TRF1 - Quarta Turma, PJe 04/08/2021) No caso, busca-se a responsabilização de ex-prefeito e outros por alegadas irregularidades na gestão de recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação – FNDE, recursos federais. Registro, ainda, que, “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Da ilegitimidade ativa do MPF Rejeito, também, a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, considerando que “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Inépcia da petição inicial Foram expostos na petição inicial fundados indícios da prática de atos de improbidade administrativa pelos requeridos, bem como foi individualizada a conduta dos requeridos e a respectiva capitulação, o que, a teor do § 8º, art. 17, da Lei 8.429/92, desautoriza a rejeição da petição inicial ação. Assim, deve ser rejeitada a preliminar. Das nulidades da sentença Não vislumbro na hipótese elementos que conduzam à nulidade da sentença, visto que foram apresentados os fatos e definidos os elementos para caracterização da conduta atribuída aos requeridos, bem como foi adequadamente fundamentada a conclusão do juízo, individualizada a conduta de cada réu e finalizada com dispositivo claro e fundamentado, no que se refere à condenação dos réus e da dosimetria da pena. Ademais, considerando que concluiu o juízo pela prática do ato típico do art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, cujas sanções aplicadas foram as do inciso II do art. 12 da LIA, nenhuma nulidade há na sentença, visto que está de acordo com os termos da Lei de Improbidade Administrativa na atual vigência. Ainda que ausente a intimação para manifestação quanto às inovações legislativas da Lei 14.230/2021 previamente à prolação da sentença, tal fato não tem o condão, por si, de tornar nula a sentença, tendo em vista a oportunidade de se manifestar sobre o tema na apelação, não havendo que se falar em prejuízo à defesa que justifique a declaração de nulidade da sentença. Da ilegitimidade passiva Quanto à ilegitimidade passiva, considerando que essa se confunde com o mérito da ação, será analisada juntamente com os fatos atribuídos a cada réu. Da prescrição Quanto à prejudicial de mérito suscitada, ressalto que não incidiu a prescrição no caso concreto. Isso porque, conformo informam os apelantes, os fatos tidos por ímprobos ocorreram na gestão do ex-prefeito Edivaldo Souza Lima, cujo mandato encerrou-se no dia 31/12/2008. Tendo a ação sido ajuizada em 18/12/2013, o foi antes de transcorrido o prazo quinquenal da prescrição. Confira-se, a propósito, a previsão legal respectiva: Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança; Dessa forma, rejeitada a prescrição. Do mérito Segundo consta na petição inicial, a ação civil pública foi ajuizada pelo Ministério Público Federal em desfavor do ex-prefeito do Município de Itaju do Colônia/BA, do ex-Secretário Municipal de Finanças, da ex-Secretária Municipal de Educação, da ex-Diretora do Setor de Contabilidade do município, da ex-Procuradora Jurídica do município e outros particulares, em face de diversas irregularidades perpetradas nos anos de 2007 e 2008, consistentes na malversação de recursos federais repassados ao município pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, condutas que foram enquadradas pelo autor como atos típicos do art. 10, VIII, XI e XII, e art. 11, caput, da Lei 8.429/92. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente" Assim, a responsabilização do agente com base nos tipos descritos na Lei de Improbidade, com as alterações da Lei 14.230/2021, passou a exigir agora a demonstração da intenção dolosa. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” À luz desse tema, as normas de direito material mais benéficas, introduzidas pela Lei 14.230/21, devem ser aplicadas às ações em curso, posto que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1º, § 4º, da LIA). Portanto, a norma mais benéfica retroage para beneficiar o réu. Além disso, no que se refere ao regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021, o STF firmou tese no sentido de se irretroativo, cujos novos marcos temporais serão aplicados a partir da publicação da Lei, ocorrida em 26/10/2021, razão pela qual não incidiu, no caso concreto, a prescrição intercorrente. Prosseguindo, observo que os apelantes foram condenados pela prática dos atos típicos art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, na redação posterior à Lei 14.230/2021, de cujos dispositivos se extrai: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade da demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico, bem como a comprovação do efetivo dano ao erário. No caso em exame, ficaram demonstrados, na sentença, a autoria das condutas atribuídas aos apelantes, assim como o dolo em seus atos, conforme se verifica do trecho abaixo da sentença: "(...) Debruçando-me sobre a prova documental carreada aos fólios, verifico que os processos licitatórios objeto desta demanda foram montados por funcionários da Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia em conluio com os particulares que controlavam as empresas utilizadas nas simulações, a fim de justificar o desvio de recursos públicos. O requerido Edivaldo Souza Lima, então prefeito municipal, realizou pagamentos a empresas fictícias pertencente aos particulares acionados, com o intuito de justificar despesas ilícitas e desvio de verbas públicas de origens diversas. O demandado, na qualidade de prefeito, determinou a montagem de certames com objetos fracionados, simulando a aquisição de gêneros alimentícios, materiais de expediente e materiais de higiene e limpeza nos anos de 2007 e 2008. Restou apurado que o referido gestor simulou a realização de 25 (vinte e cinco) licitações no período compreendido entre janeiro de 2007 e julho de 2008, forjando licitações em que supostamente teriam concorrido as empresas integrantes da associação criminosa formada pelos requeridos. De fato, há provas no inquérito policial nº 307/2011, notadamente diálogos interceptados durante as investigações (anexo), demonstrando que o então prefeito Edivaldo Souza Lima, o secretário de finanças Fernando Bezerra Leite, a secretária de educação Maria Augusta Carillo Marques, a diretora do setor de contabilidade Neide Rocha dos Santos e a procuradora jurídica do município Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, associaram-se com os particulares no intuito de praticar as fraudes objeto desta ação. Restou comprovado no decorrer das investigações que os agentes públicos municipais possuíam relação direta com os particulares acionados, mantendo contatos frequentes com os controladores das empresas que participavam das licitações em Itaju do Colônia, nos quais negociavam propinas e outras vantagens que receberiam em razão da empreitada. Na diligência de busca e apreensão realizada na Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia/BA foi encontrada pasta contendo documentação de empresas integrantes do aludido grupo, notadamente certidões negativas fiscais das pessoas jurídicas F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, A. M. Barreto Representações, Manoel Pereira Palmeira e JLS – Joan Lima Santos. Registre-se que na Prefeitura foram encontrados carimbos de todas as empresas licitantes tratadas nesta ação. No cumprimento do mandado de busca e apreensão na residência da secretária de educação Maria Augusta Carillo Marques foi apreendido, dentre outros documentos, um talonário de notas fiscais da empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, com notas fiscais emitidas para várias prefeituras, inclusive Itaju do Colônia, conforme relatório de análise de material apreendido. Na residência do ex-prefeito Edivaldo Souza Lima foi apreendido processo licitatório no qual figuravam como licitantes as empresas A. M. Barreto Representações e a F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, bem como processos de pagamento destinados à empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios. Já na residência da diretora de contabilidade Neide Rocha dos Santos foram apreendidos, dentre outros documentos, cópias de cheques com manuscritos “passagens Cláudia” e “AM Barreto parte pgt° mat. Limpeza p UMS”, notas fiscais e comprovantes de depósito bancários realizados na conta da acionada Maria Cláudia. Nos áudios transcritos na inicial, o requerido Fernando Amaral mantinha constante contato com o prefeito municipal, dentre outros funcionários da Prefeitura, em diálogos nos quais eram acertados valores de notas fiscais, valores de propinas, datas de liberação de recursos públicos, dentre outros temas. Noutro passo, em relação à requerida Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, procuradora jurídica do município, restou comprovado pelos diálogos a exigência do pagamento de valores por Fernando Amaral, que seriam transferidos pela Prefeitura de Itaju do Colônia, demonstrando a participação da demandada no esquema das fraudes. Foi observado pelo MPF que em todos os processos licitatórios fraudados, a requerida Maria Cláudia atestou falsamente a regularidade desses certames por supostamente cumprirem os procedimentos da Lei n° 8.666/93 (...) Por outro lado, durante as investigações realizadas em sede policial, constatou-se a existência de grupo composto por Fernando Moreira Amaral, Valéria Santos Amaral, Geisa Cristina Lombardo Maciel, Alessandra Silva Santos, Alberto Clécio Oliveira Viana, vulgo “Birro”, e Aldai Marino Barreto, fraudando licitações e desviando recursos públicos. Restou apurado que o requerido Fernando Moreira Amaral controlava a grande maioria das empresas que eram regularmente contratadas pela prefeitura municipal de Itaju do Colônia, utilizando-as para emissão de notas fiscais “frias” ou parcialmente “frias”, sempre com o intuito de obter vantagens indevidas e desviar verbas federais. Ficou comprovado que Fernando Amaral era proprietário da firma F. M. Amaral Gêneros Alimentícios e também controlava diretamente a empresa Valéria Santos Amaral ME – Valéria Comercial de Alimentos, que constitui firma individual da requerida Valéria Santos Amaral, sobrinha de Fernando Amaral, mas era este que de fato controlava a pessoa jurídica, restando a Valéria Amaral exercer a função de verdadeira funcionária subordinada a seu tio. As provas foram obtidas em diligência de busca e apreensão realizada na sede da empresa Valéria Santos Amaral ME, onde foram encontradas procurações assinadas por Valéria Santos Amaral e outorgadas a Fernando Amaral e a duas funcionárias deste, as requeridas Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos, que também participavam ativamente dos esquemas fraudulentos em análise. (...) Além disso, na busca e apreensão realizada na empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios foram apreendidos diversos documentos, evidenciando que Fernando Amaral possuía ingerência direta nas demais empresas integrantes da organização, notadamente na A. M. Barreto Representações – Comercial Barreto e na Manoel Pereira Palmeiras – Comercial Tend Tudo, que supostamente disputaram diversos certames licitatórios com a F. M. Amaral Gêneros Alimentícios (firma individual de Fernando Amaral). Durante a fiscalização realizada pela CGU na Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia, constatou-se, ainda, que Fernando Amaral detinha o controle da firma individual Márcio Santos de Souza, a qual era utilizada nas fraudes descritas na inicial. (...) Em relação às acionadas Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos, observa-se que as mesmas eram funcionárias de Fernando Amaral e atuavam na confecção de notas fiscais “frias”, na representação das empresas fictícias e no recebimento de valores indevidamente pagos pelos municípios para as empresas envolvidas. (...) Consoante áudios transcritos, Geisa Cristina Maciel e Alessandra Silva Santos secretariavam os negócios ilícitos de Fernando Amaral, atuando diretamente na confecção de notas fiscais ideologicamente falsas e documentos que eram utilizados nas licitações fraudulentas. (...) Descabida, ainda, a alegação de falta de dolo, tendo em vista o modus operandi explicitamente fraudulento empregado pelos acionados a fim de concretizar os atos ímprobos em voga, o que denota o pleno conhecimento acerca dos mesmos. (...) Assim, parece-me que as condutas do gestor municipal, dos agentes públicos da prefeitura, participando da negociação de notas fiscais ideologicamente falsas, bem como de documentos para compor procedimentos licitatórios forjados, do pagamento de “propinas”, junto aos particulares empresários, demonstram a prática de ato doloso de improbidade administrativa. (...)” No entanto, não restou comprovado que essas condutas dos requeridos resultaram em dano ao erário, tampouco que os bens ou serviços contratados não foram entregues ao município, ou que tenham sido adquiridos com sobrepreço. No que se refere ao prejuízo, após a exposição dos fatos e autoria, afirmou o Juízo, na sentença, que “Esses dados, analisados em conjunto, mostram-se suficientemente comprobatórios da existência de desvio de recursos públicos para o atendimento de finalidades particulares, o que impõe a devolução da quantia.”. Ou seja, verifica-se que a condenação amparou-se em prejuízo foi presumido. No entanto, o prejuízo presumido não mais é suficiente para a caracterização do ato de improbidade administrativa, após as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021 à Lei 8.429/92. Ressalto, por fim, que não obstante a ausência de recurso de apelação dos demais réus, mas considerando os termos do art. 1.005 do CPC, a conclusão da improcedência dos pedidos a eles alcança. Pelo exposto, dou provimento às apelações e julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, cujos efeitos são extensíveis aos demais litisconsortes. Defiro o pedido de justiça gratuita formulado por Alessandra Silva Santos, nos termos do art. 98 do CPC. É o voto. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311/BA CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: ALESSANDRA SILVA SANTOS, FERNANDO BEZERRA LEITE, MARIA AUGUSTA CARILLO MARQUES, MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA Advogados do(a) APELANTE: ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS - BA9465-A, LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, VLADIMIR SOARES SANTOS - BA40043-A Advogados do(a) APELANTE: LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, RENATO DATTOLI NETO - BA42446-A Advogados do(a) APELANTE: AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR - BA50343-A, JERBSON ALMEIDA MORAES - BA16599-A Advogados do(a) APELANTE: GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO - BA14566-A, IRUMAN RAMOS CONTREIRAS - BA10889-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) E M E N T A ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, VIII, XI E XII, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO POSTERIOR À LEI 14.230/2021. EFETIVO DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 1.005 DO CPC. APELAÇÕES PROVIDAS. EFEITO EXTENSÍVEL AOS DEMAIS RÉUS. 1. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), neste também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 2. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". 3. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses :“1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 4. Para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade da demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico, bem como a comprovação do efetivo dano ao erário. 6. No caso em exame, não obstante a demonstração da autoria e dolo na conduta dos apelantes, não restou comprovado que essas condutas resultaram em dano ao erário, tampouco que os bens ou serviços contratados não foram entregues ao município, ou que tenham sido adquiridos com sobrepreço. 7. Após a exposição dos fatos e autoria, afirmou o Juízo, na sentença, que “Esses dados, analisados em conjunto, mostram-se suficientemente comprobatórios da existência de desvio de recursos públicos para o atendimento de finalidades particulares, o que impõe a devolução da quantia.”. Portanto, a condenação amparou-se em prejuízo presumido. 8. Não obstante a ausência de recurso de apelação dos demais réus, mas considerando os termos do art. 1.005 do CPC, a conclusão pela improcedência dos pedidos a eles alcança. 9. Apelações providas, com efeitos extensíveis aos demais litisconsortes. A C Ó R D Ã O Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações, com efeitos extensíveis aos demais litisconsortes, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF, 8 de julho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator G/M

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0004338-56.2013.4.01.3311

ID: 326468123

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0004338-56.2013.4.01.3311

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

ALESSANDRA SILVA SANTOS FERNANDO BEZERRA LEITE MARIA AUGUSTA CARILLO MARQUES MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOAO VICTOR DUTRA DE ALMEIDA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

RENATO DATTOLI NETO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

IRUMAN RAMOS CONTREIRAS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JERBSON ALMEIDA MORAES

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

VLADIMIR SOARES SANTOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: MARIA CLAUDIA ARAGAO… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS - BA9465-A, VLADIMIR SOARES SANTOS - BA40043-A, LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, JERBSON ALMEIDA MORAES - BA16599-A, IRUMAN RAMOS CONTREIRAS - BA10889-A, GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO - BA14566-A, RENATO DATTOLI NETO - BA42446-A, AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR - BA50343-A e JOAO VICTOR DUTRA DE ALMEIDA - BA69987 POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas por Fernando Bezerra Leite (ID 421365335), Maria Augusta Carillo Marques (ID 421365339), Maria Cláudia Aragão Padilha Lima (ID 421365346) e Alessandra Silva Santos (ID 421365350) contra sentença (ID 421365325) prolatada pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Itabuna/BA que, nos autos da ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos e, com fulcro no art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, condenou: a) Edivaldo Souza Lima, Fernando Bezerra Leite, Maria Augusta Carillo Marques, Neide Rocha dos Santos e Maria Cláudia Aragão Padilha Lima: ao ressarcimento integral do dano, no valor total de R$ 1.129.248,60 (um milhão, cento e vinte e nove mil, duzentos e quarenta e oito reais e sessenta centavos); à perda da função pública; à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos. b) Fernando Moreira Amaral, Alberto Clécio Oliveira Viana, Aldai Marino Barreto, Valéria Santos Amaral, Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos: ao ressarcimento integral do dano, no valor total de R$ 1.129.248,60 (um milhão, cento e vinte e nove mil, duzentos e quarenta e oito reais e sessenta centavos); e à proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócias majoritárias, pelo prazo de 12 (doze) anos. O apelante Fernando Bezerra Leite argumenta que não demonstrada, de forma inequívoca, sua desonestidade na condução de suas atividades; alega não ser parte legítima para figurar no polo passivo da ação, pois não obteve qualquer vantagem indevida ou qualquer outro benefício; suscita preliminar de inépcia da inicial, pois os fatos articulados na inicial não conduzem a uma conclusão lógica, tampouco foram individualizadas as condutas, de forma que prejudicada a defesa; que não foi demonstrada conduta típica dolosa, com o fim de causar prejuízo ao erário; que a pena não foi individualizada; que incidiu a prescrição no caso concreto, visto que o mandato de prefeito finalizou-se em 31/12/2008 e ação foi proposta após o transcurso do prazo quinquenal da prescrição; requer o provimento da apelação. A recorrente Maria Augusta Carillo Marques suscita preliminar de prescrição, alegando que as investigações ocorreram no período de 25/08 a 05/09/2008, e ação de improbidade somente foi ajuizada em 12/11/2013, após transcorrido o prazo quinquenal da prescrição; suscita também preliminar de prescrição intercorrente, na forma do § 8º do art. 23 da Lei 8.429/92, com as alterações da Lei 14.230/2021; que a sentença é nula, pois não individualizou a conduta de cada requerido, tampouco apresentou a devida fundamentação; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; requer o reconhecimento da nulidade da sentença, a incidência da prescrição ou seja dado provimento ao recurso para que afaste a sua condenação. Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, em suas razões de apelar, suscita preliminar de nulidade processual, decretando a invalidade de todos os atos do final da instrução, e lhe seja devolvido prazo para apresentar alegações finais, a fim de que possa fazer considerações sobre as provas produzidas, solicitar diligências e outras medidas pertinentes; que não lhe foi oportunizada a manifestação sobre a Lei 14.230/2021, o que também é uma nulidade processual; que a sentença padece de falta de fundamentação; que não foi definida a parte que cabe a cada requerido em relação ao valor a ser ressarcido (R$1.129.248,60); que não foi demonstrado na sentença o prejuízo causado ao erário; suscita preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, assim como ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; que não restou demonstrada de forma inequívoca a ocorrência de fatos ímprobos; requer o reconhecimento e a decretação da nulidade da sentença em face das preliminares suscitadas ou o provimento da apelação para que seja julgada improcedente a ação, e seja revista a condenação em honorários advocatícios, por ser descabida. Alessandra Silva Santos, em suas razões de recorrer, requer o deferimento da justiça gratuita; suscita preliminar de prescrição, alegando que as investigações ocorreram no período de 25/08 a 05/09/2008, e ação de improbidade somente foi ajuizada em 12/11/2013, após transcorrido o prazo quinquenal da prescrição; suscita também preliminar de prescrição intercorrente, na forma do § 8º do art. 23 da Lei 8.429/92, com as alterações da Lei 14.230/2021; que a sentença é nula, pois não foi intimada para a apresentação das alegações finais; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; que não foi individualizada a conduta dos requeridos, tampouco individualização da pena; requer o deferimento da justiça gratuita, para que sejam reconhecidas as nulidades suscitadas ou seja provido o apelo e afastada a sua condenação. Foram apresentadas as contrarrazões, ID 421365353, 421365354. Nesta instância, a Procuradoria Regional da República da 1ª Região opinou pela manutenção da sentença, ID 422108183. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Das preliminares Da incompetência da Justiça Federal Competente à Justiça Federal processar e julgar ação de improbidade que busca a responsabilização por malversação de verbas federais. Confiram-se: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; DE JULGAMENTO EXTRA PETITA; DE CERCEAMENTO DE DEFESA E INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. REJEIÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO MUNICÍPIO DE ENTRE FOLHAS-MG EM AUXÍLIO DE EMPRESA VENCEDORA DO CERTAME PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE DRENAGEM E PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. 1. Já encontra sedimentado nesta Corte o entendimento, segundo o qual, tratando-se de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, ante suposta prática de ato de improbidade administrativa por desvio e/ou malversação de recursos públicos federais, a competência para o conhecimento, o processamento e o julgamento da causa é da Justiça Federal, ainda que a União não tenha manifestado interesse em integrar a lide. (...) (AC 0000322-05.2013.4.01.3814, Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado, TRF1 - Quarta Turma, PJe 03/09/2021) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DE TRANSPARÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO. UNIÃO. INTERESSE EXPRESSO EM INTEGRAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. APLICAÇÃO DO ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão que, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Município de Maués/AM em desfavor de ex-prefeito municipal, declinou da competência em favor da Justiça Estadual do Amazonas. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF, visando apurar omissão de gestor municipal, em dar publicidade das verbas repassadas pela União ao município, por intermédio do Portal de Transparência. Precedentes: AG 0061340-18.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, Quarta Turma, e-DJF1 17/11/2017; AG 0061337-63.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Quarta Turma, e-DJF1 10/08/2017; AG 0061357-54.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, e-DJF1 24/03/2017. (...) (AG 1012824-08.2020.4.01.0000, Juiz Federal Érico Rodrigo Freitas Pinheiro (Conv.), TRF1 - Quarta Turma, PJe 04/08/2021) No caso, busca-se a responsabilização de ex-prefeito e outros por alegadas irregularidades na gestão de recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação – FNDE, recursos federais. Registro, ainda, que, “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Da ilegitimidade ativa do MPF Rejeito, também, a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, considerando que “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Inépcia da petição inicial Foram expostos na petição inicial fundados indícios da prática de atos de improbidade administrativa pelos requeridos, bem como foi individualizada a conduta dos requeridos e a respectiva capitulação, o que, a teor do § 8º, art. 17, da Lei 8.429/92, desautoriza a rejeição da petição inicial ação. Assim, deve ser rejeitada a preliminar. Das nulidades da sentença Não vislumbro na hipótese elementos que conduzam à nulidade da sentença, visto que foram apresentados os fatos e definidos os elementos para caracterização da conduta atribuída aos requeridos, bem como foi adequadamente fundamentada a conclusão do juízo, individualizada a conduta de cada réu e finalizada com dispositivo claro e fundamentado, no que se refere à condenação dos réus e da dosimetria da pena. Ademais, considerando que concluiu o juízo pela prática do ato típico do art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, cujas sanções aplicadas foram as do inciso II do art. 12 da LIA, nenhuma nulidade há na sentença, visto que está de acordo com os termos da Lei de Improbidade Administrativa na atual vigência. Ainda que ausente a intimação para manifestação quanto às inovações legislativas da Lei 14.230/2021 previamente à prolação da sentença, tal fato não tem o condão, por si, de tornar nula a sentença, tendo em vista a oportunidade de se manifestar sobre o tema na apelação, não havendo que se falar em prejuízo à defesa que justifique a declaração de nulidade da sentença. Da ilegitimidade passiva Quanto à ilegitimidade passiva, considerando que essa se confunde com o mérito da ação, será analisada juntamente com os fatos atribuídos a cada réu. Da prescrição Quanto à prejudicial de mérito suscitada, ressalto que não incidiu a prescrição no caso concreto. Isso porque, conformo informam os apelantes, os fatos tidos por ímprobos ocorreram na gestão do ex-prefeito Edivaldo Souza Lima, cujo mandato encerrou-se no dia 31/12/2008. Tendo a ação sido ajuizada em 18/12/2013, o foi antes de transcorrido o prazo quinquenal da prescrição. Confira-se, a propósito, a previsão legal respectiva: Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança; Dessa forma, rejeitada a prescrição. Do mérito Segundo consta na petição inicial, a ação civil pública foi ajuizada pelo Ministério Público Federal em desfavor do ex-prefeito do Município de Itaju do Colônia/BA, do ex-Secretário Municipal de Finanças, da ex-Secretária Municipal de Educação, da ex-Diretora do Setor de Contabilidade do município, da ex-Procuradora Jurídica do município e outros particulares, em face de diversas irregularidades perpetradas nos anos de 2007 e 2008, consistentes na malversação de recursos federais repassados ao município pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, condutas que foram enquadradas pelo autor como atos típicos do art. 10, VIII, XI e XII, e art. 11, caput, da Lei 8.429/92. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente" Assim, a responsabilização do agente com base nos tipos descritos na Lei de Improbidade, com as alterações da Lei 14.230/2021, passou a exigir agora a demonstração da intenção dolosa. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” À luz desse tema, as normas de direito material mais benéficas, introduzidas pela Lei 14.230/21, devem ser aplicadas às ações em curso, posto que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1º, § 4º, da LIA). Portanto, a norma mais benéfica retroage para beneficiar o réu. Além disso, no que se refere ao regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021, o STF firmou tese no sentido de se irretroativo, cujos novos marcos temporais serão aplicados a partir da publicação da Lei, ocorrida em 26/10/2021, razão pela qual não incidiu, no caso concreto, a prescrição intercorrente. Prosseguindo, observo que os apelantes foram condenados pela prática dos atos típicos art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, na redação posterior à Lei 14.230/2021, de cujos dispositivos se extrai: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade da demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico, bem como a comprovação do efetivo dano ao erário. No caso em exame, ficaram demonstrados, na sentença, a autoria das condutas atribuídas aos apelantes, assim como o dolo em seus atos, conforme se verifica do trecho abaixo da sentença: "(...) Debruçando-me sobre a prova documental carreada aos fólios, verifico que os processos licitatórios objeto desta demanda foram montados por funcionários da Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia em conluio com os particulares que controlavam as empresas utilizadas nas simulações, a fim de justificar o desvio de recursos públicos. O requerido Edivaldo Souza Lima, então prefeito municipal, realizou pagamentos a empresas fictícias pertencente aos particulares acionados, com o intuito de justificar despesas ilícitas e desvio de verbas públicas de origens diversas. O demandado, na qualidade de prefeito, determinou a montagem de certames com objetos fracionados, simulando a aquisição de gêneros alimentícios, materiais de expediente e materiais de higiene e limpeza nos anos de 2007 e 2008. Restou apurado que o referido gestor simulou a realização de 25 (vinte e cinco) licitações no período compreendido entre janeiro de 2007 e julho de 2008, forjando licitações em que supostamente teriam concorrido as empresas integrantes da associação criminosa formada pelos requeridos. De fato, há provas no inquérito policial nº 307/2011, notadamente diálogos interceptados durante as investigações (anexo), demonstrando que o então prefeito Edivaldo Souza Lima, o secretário de finanças Fernando Bezerra Leite, a secretária de educação Maria Augusta Carillo Marques, a diretora do setor de contabilidade Neide Rocha dos Santos e a procuradora jurídica do município Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, associaram-se com os particulares no intuito de praticar as fraudes objeto desta ação. Restou comprovado no decorrer das investigações que os agentes públicos municipais possuíam relação direta com os particulares acionados, mantendo contatos frequentes com os controladores das empresas que participavam das licitações em Itaju do Colônia, nos quais negociavam propinas e outras vantagens que receberiam em razão da empreitada. Na diligência de busca e apreensão realizada na Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia/BA foi encontrada pasta contendo documentação de empresas integrantes do aludido grupo, notadamente certidões negativas fiscais das pessoas jurídicas F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, A. M. Barreto Representações, Manoel Pereira Palmeira e JLS – Joan Lima Santos. Registre-se que na Prefeitura foram encontrados carimbos de todas as empresas licitantes tratadas nesta ação. No cumprimento do mandado de busca e apreensão na residência da secretária de educação Maria Augusta Carillo Marques foi apreendido, dentre outros documentos, um talonário de notas fiscais da empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, com notas fiscais emitidas para várias prefeituras, inclusive Itaju do Colônia, conforme relatório de análise de material apreendido. Na residência do ex-prefeito Edivaldo Souza Lima foi apreendido processo licitatório no qual figuravam como licitantes as empresas A. M. Barreto Representações e a F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, bem como processos de pagamento destinados à empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios. Já na residência da diretora de contabilidade Neide Rocha dos Santos foram apreendidos, dentre outros documentos, cópias de cheques com manuscritos “passagens Cláudia” e “AM Barreto parte pgt° mat. Limpeza p UMS”, notas fiscais e comprovantes de depósito bancários realizados na conta da acionada Maria Cláudia. Nos áudios transcritos na inicial, o requerido Fernando Amaral mantinha constante contato com o prefeito municipal, dentre outros funcionários da Prefeitura, em diálogos nos quais eram acertados valores de notas fiscais, valores de propinas, datas de liberação de recursos públicos, dentre outros temas. Noutro passo, em relação à requerida Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, procuradora jurídica do município, restou comprovado pelos diálogos a exigência do pagamento de valores por Fernando Amaral, que seriam transferidos pela Prefeitura de Itaju do Colônia, demonstrando a participação da demandada no esquema das fraudes. Foi observado pelo MPF que em todos os processos licitatórios fraudados, a requerida Maria Cláudia atestou falsamente a regularidade desses certames por supostamente cumprirem os procedimentos da Lei n° 8.666/93 (...) Por outro lado, durante as investigações realizadas em sede policial, constatou-se a existência de grupo composto por Fernando Moreira Amaral, Valéria Santos Amaral, Geisa Cristina Lombardo Maciel, Alessandra Silva Santos, Alberto Clécio Oliveira Viana, vulgo “Birro”, e Aldai Marino Barreto, fraudando licitações e desviando recursos públicos. Restou apurado que o requerido Fernando Moreira Amaral controlava a grande maioria das empresas que eram regularmente contratadas pela prefeitura municipal de Itaju do Colônia, utilizando-as para emissão de notas fiscais “frias” ou parcialmente “frias”, sempre com o intuito de obter vantagens indevidas e desviar verbas federais. Ficou comprovado que Fernando Amaral era proprietário da firma F. M. Amaral Gêneros Alimentícios e também controlava diretamente a empresa Valéria Santos Amaral ME – Valéria Comercial de Alimentos, que constitui firma individual da requerida Valéria Santos Amaral, sobrinha de Fernando Amaral, mas era este que de fato controlava a pessoa jurídica, restando a Valéria Amaral exercer a função de verdadeira funcionária subordinada a seu tio. As provas foram obtidas em diligência de busca e apreensão realizada na sede da empresa Valéria Santos Amaral ME, onde foram encontradas procurações assinadas por Valéria Santos Amaral e outorgadas a Fernando Amaral e a duas funcionárias deste, as requeridas Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos, que também participavam ativamente dos esquemas fraudulentos em análise. (...) Além disso, na busca e apreensão realizada na empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios foram apreendidos diversos documentos, evidenciando que Fernando Amaral possuía ingerência direta nas demais empresas integrantes da organização, notadamente na A. M. Barreto Representações – Comercial Barreto e na Manoel Pereira Palmeiras – Comercial Tend Tudo, que supostamente disputaram diversos certames licitatórios com a F. M. Amaral Gêneros Alimentícios (firma individual de Fernando Amaral). Durante a fiscalização realizada pela CGU na Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia, constatou-se, ainda, que Fernando Amaral detinha o controle da firma individual Márcio Santos de Souza, a qual era utilizada nas fraudes descritas na inicial. (...) Em relação às acionadas Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos, observa-se que as mesmas eram funcionárias de Fernando Amaral e atuavam na confecção de notas fiscais “frias”, na representação das empresas fictícias e no recebimento de valores indevidamente pagos pelos municípios para as empresas envolvidas. (...) Consoante áudios transcritos, Geisa Cristina Maciel e Alessandra Silva Santos secretariavam os negócios ilícitos de Fernando Amaral, atuando diretamente na confecção de notas fiscais ideologicamente falsas e documentos que eram utilizados nas licitações fraudulentas. (...) Descabida, ainda, a alegação de falta de dolo, tendo em vista o modus operandi explicitamente fraudulento empregado pelos acionados a fim de concretizar os atos ímprobos em voga, o que denota o pleno conhecimento acerca dos mesmos. (...) Assim, parece-me que as condutas do gestor municipal, dos agentes públicos da prefeitura, participando da negociação de notas fiscais ideologicamente falsas, bem como de documentos para compor procedimentos licitatórios forjados, do pagamento de “propinas”, junto aos particulares empresários, demonstram a prática de ato doloso de improbidade administrativa. (...)” No entanto, não restou comprovado que essas condutas dos requeridos resultaram em dano ao erário, tampouco que os bens ou serviços contratados não foram entregues ao município, ou que tenham sido adquiridos com sobrepreço. No que se refere ao prejuízo, após a exposição dos fatos e autoria, afirmou o Juízo, na sentença, que “Esses dados, analisados em conjunto, mostram-se suficientemente comprobatórios da existência de desvio de recursos públicos para o atendimento de finalidades particulares, o que impõe a devolução da quantia.”. Ou seja, verifica-se que a condenação amparou-se em prejuízo foi presumido. No entanto, o prejuízo presumido não mais é suficiente para a caracterização do ato de improbidade administrativa, após as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021 à Lei 8.429/92. Ressalto, por fim, que não obstante a ausência de recurso de apelação dos demais réus, mas considerando os termos do art. 1.005 do CPC, a conclusão da improcedência dos pedidos a eles alcança. Pelo exposto, dou provimento às apelações e julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, cujos efeitos são extensíveis aos demais litisconsortes. Defiro o pedido de justiça gratuita formulado por Alessandra Silva Santos, nos termos do art. 98 do CPC. É o voto. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311/BA CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: ALESSANDRA SILVA SANTOS, FERNANDO BEZERRA LEITE, MARIA AUGUSTA CARILLO MARQUES, MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA Advogados do(a) APELANTE: ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS - BA9465-A, LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, VLADIMIR SOARES SANTOS - BA40043-A Advogados do(a) APELANTE: LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, RENATO DATTOLI NETO - BA42446-A Advogados do(a) APELANTE: AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR - BA50343-A, JERBSON ALMEIDA MORAES - BA16599-A Advogados do(a) APELANTE: GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO - BA14566-A, IRUMAN RAMOS CONTREIRAS - BA10889-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) E M E N T A ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, VIII, XI E XII, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO POSTERIOR À LEI 14.230/2021. EFETIVO DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 1.005 DO CPC. APELAÇÕES PROVIDAS. EFEITO EXTENSÍVEL AOS DEMAIS RÉUS. 1. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), neste também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 2. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". 3. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses :“1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 4. Para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade da demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico, bem como a comprovação do efetivo dano ao erário. 6. No caso em exame, não obstante a demonstração da autoria e dolo na conduta dos apelantes, não restou comprovado que essas condutas resultaram em dano ao erário, tampouco que os bens ou serviços contratados não foram entregues ao município, ou que tenham sido adquiridos com sobrepreço. 7. Após a exposição dos fatos e autoria, afirmou o Juízo, na sentença, que “Esses dados, analisados em conjunto, mostram-se suficientemente comprobatórios da existência de desvio de recursos públicos para o atendimento de finalidades particulares, o que impõe a devolução da quantia.”. Portanto, a condenação amparou-se em prejuízo presumido. 8. Não obstante a ausência de recurso de apelação dos demais réus, mas considerando os termos do art. 1.005 do CPC, a conclusão pela improcedência dos pedidos a eles alcança. 9. Apelações providas, com efeitos extensíveis aos demais litisconsortes. A C Ó R D Ã O Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações, com efeitos extensíveis aos demais litisconsortes, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF, 8 de julho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator G/M

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 0004338-56.2013.4.01.3311

ID: 326468140

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0004338-56.2013.4.01.3311

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

ALESSANDRA SILVA SANTOS FERNANDO BEZERRA LEITE MARIA AUGUSTA CARILLO MARQUES MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOAO VICTOR DUTRA DE ALMEIDA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

RENATO DATTOLI NETO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

IRUMAN RAMOS CONTREIRAS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JERBSON ALMEIDA MORAES

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

VLADIMIR SOARES SANTOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: MARIA CLAUDIA ARAGAO… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS - BA9465-A, VLADIMIR SOARES SANTOS - BA40043-A, LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, JERBSON ALMEIDA MORAES - BA16599-A, IRUMAN RAMOS CONTREIRAS - BA10889-A, GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO - BA14566-A, RENATO DATTOLI NETO - BA42446-A, AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR - BA50343-A e JOAO VICTOR DUTRA DE ALMEIDA - BA69987 POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas por Fernando Bezerra Leite (ID 421365335), Maria Augusta Carillo Marques (ID 421365339), Maria Cláudia Aragão Padilha Lima (ID 421365346) e Alessandra Silva Santos (ID 421365350) contra sentença (ID 421365325) prolatada pelo Juízo Federal da 1ª Vara da Subseção Judiciária de Itabuna/BA que, nos autos da ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos e, com fulcro no art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, condenou: a) Edivaldo Souza Lima, Fernando Bezerra Leite, Maria Augusta Carillo Marques, Neide Rocha dos Santos e Maria Cláudia Aragão Padilha Lima: ao ressarcimento integral do dano, no valor total de R$ 1.129.248,60 (um milhão, cento e vinte e nove mil, duzentos e quarenta e oito reais e sessenta centavos); à perda da função pública; à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 8 (oito) anos. b) Fernando Moreira Amaral, Alberto Clécio Oliveira Viana, Aldai Marino Barreto, Valéria Santos Amaral, Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos: ao ressarcimento integral do dano, no valor total de R$ 1.129.248,60 (um milhão, cento e vinte e nove mil, duzentos e quarenta e oito reais e sessenta centavos); e à proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócias majoritárias, pelo prazo de 12 (doze) anos. O apelante Fernando Bezerra Leite argumenta que não demonstrada, de forma inequívoca, sua desonestidade na condução de suas atividades; alega não ser parte legítima para figurar no polo passivo da ação, pois não obteve qualquer vantagem indevida ou qualquer outro benefício; suscita preliminar de inépcia da inicial, pois os fatos articulados na inicial não conduzem a uma conclusão lógica, tampouco foram individualizadas as condutas, de forma que prejudicada a defesa; que não foi demonstrada conduta típica dolosa, com o fim de causar prejuízo ao erário; que a pena não foi individualizada; que incidiu a prescrição no caso concreto, visto que o mandato de prefeito finalizou-se em 31/12/2008 e ação foi proposta após o transcurso do prazo quinquenal da prescrição; requer o provimento da apelação. A recorrente Maria Augusta Carillo Marques suscita preliminar de prescrição, alegando que as investigações ocorreram no período de 25/08 a 05/09/2008, e ação de improbidade somente foi ajuizada em 12/11/2013, após transcorrido o prazo quinquenal da prescrição; suscita também preliminar de prescrição intercorrente, na forma do § 8º do art. 23 da Lei 8.429/92, com as alterações da Lei 14.230/2021; que a sentença é nula, pois não individualizou a conduta de cada requerido, tampouco apresentou a devida fundamentação; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; requer o reconhecimento da nulidade da sentença, a incidência da prescrição ou seja dado provimento ao recurso para que afaste a sua condenação. Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, em suas razões de apelar, suscita preliminar de nulidade processual, decretando a invalidade de todos os atos do final da instrução, e lhe seja devolvido prazo para apresentar alegações finais, a fim de que possa fazer considerações sobre as provas produzidas, solicitar diligências e outras medidas pertinentes; que não lhe foi oportunizada a manifestação sobre a Lei 14.230/2021, o que também é uma nulidade processual; que a sentença padece de falta de fundamentação; que não foi definida a parte que cabe a cada requerido em relação ao valor a ser ressarcido (R$1.129.248,60); que não foi demonstrado na sentença o prejuízo causado ao erário; suscita preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, assim como ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; que não restou demonstrada de forma inequívoca a ocorrência de fatos ímprobos; requer o reconhecimento e a decretação da nulidade da sentença em face das preliminares suscitadas ou o provimento da apelação para que seja julgada improcedente a ação, e seja revista a condenação em honorários advocatícios, por ser descabida. Alessandra Silva Santos, em suas razões de recorrer, requer o deferimento da justiça gratuita; suscita preliminar de prescrição, alegando que as investigações ocorreram no período de 25/08 a 05/09/2008, e ação de improbidade somente foi ajuizada em 12/11/2013, após transcorrido o prazo quinquenal da prescrição; suscita também preliminar de prescrição intercorrente, na forma do § 8º do art. 23 da Lei 8.429/92, com as alterações da Lei 14.230/2021; que a sentença é nula, pois não foi intimada para a apresentação das alegações finais; que não foi demonstrado dolo em sua conduta; que não foi individualizada a conduta dos requeridos, tampouco individualização da pena; requer o deferimento da justiça gratuita, para que sejam reconhecidas as nulidades suscitadas ou seja provido o apelo e afastada a sua condenação. Foram apresentadas as contrarrazões, ID 421365353, 421365354. Nesta instância, a Procuradoria Regional da República da 1ª Região opinou pela manutenção da sentença, ID 422108183. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Das preliminares Da incompetência da Justiça Federal Competente à Justiça Federal processar e julgar ação de improbidade que busca a responsabilização por malversação de verbas federais. Confiram-se: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.. PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; DE JULGAMENTO EXTRA PETITA; DE CERCEAMENTO DE DEFESA E INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. REJEIÇÃO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS DO MUNICÍPIO DE ENTRE FOLHAS-MG EM AUXÍLIO DE EMPRESA VENCEDORA DO CERTAME PARA EXECUÇÃO DE OBRAS DE DRENAGEM E PAVIMENTAÇÃO ASFÁLTICA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÕES DOS RÉUS PROVIDAS. 1. Já encontra sedimentado nesta Corte o entendimento, segundo o qual, tratando-se de ação ajuizada pelo Ministério Público Federal, ante suposta prática de ato de improbidade administrativa por desvio e/ou malversação de recursos públicos federais, a competência para o conhecimento, o processamento e o julgamento da causa é da Justiça Federal, ainda que a União não tenha manifestado interesse em integrar a lide. (...) (AC 0000322-05.2013.4.01.3814, Juiz Federal Pablo Zuniga Dourado, TRF1 - Quarta Turma, PJe 03/09/2021) ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FALTA DE IMPLANTAÇÃO DO PORTAL DE TRANSPARÊNCIA. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO. UNIÃO. INTERESSE EXPRESSO EM INTEGRAR O POLO ATIVO DA DEMANDA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. APLICAÇÃO DO ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DECISÃO REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. 1. Agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal contra decisão que, em ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Município de Maués/AM em desfavor de ex-prefeito municipal, declinou da competência em favor da Justiça Estadual do Amazonas. 2. A jurisprudência deste Tribunal é firme no sentido de que compete à Justiça Federal o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo MPF, visando apurar omissão de gestor municipal, em dar publicidade das verbas repassadas pela União ao município, por intermédio do Portal de Transparência. Precedentes: AG 0061340-18.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Olindo Menezes, Quarta Turma, e-DJF1 17/11/2017; AG 0061337-63.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Cândido Ribeiro, Quarta Turma, e-DJF1 10/08/2017; AG 0061357-54.2016.4.01.0000, Rel. Desembargador Federal Ney Bello, Terceira Turma, e-DJF1 24/03/2017. (...) (AG 1012824-08.2020.4.01.0000, Juiz Federal Érico Rodrigo Freitas Pinheiro (Conv.), TRF1 - Quarta Turma, PJe 04/08/2021) No caso, busca-se a responsabilização de ex-prefeito e outros por alegadas irregularidades na gestão de recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento de Educação – FNDE, recursos federais. Registro, ainda, que, “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal. Da ilegitimidade ativa do MPF Rejeito, também, a preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, considerando que “Nas demandas em que se apura possível malversação de recursos públicos federais, a competência é da Justiça Federal, mesmo que a verba tenha sido incorporada ao patrimônio da municipalidade, sendo esta a situação dos autos, onde se discute malversação e ausência de prestação de contas de recursos repassados pelo FNDE ao Município” AC 1001804-80.2017.4.01.3700, Desembargadora Federal Monica Sifuentes, TRF1 - Terceira Turma, PJe 21/10/2021). Inépcia da petição inicial Foram expostos na petição inicial fundados indícios da prática de atos de improbidade administrativa pelos requeridos, bem como foi individualizada a conduta dos requeridos e a respectiva capitulação, o que, a teor do § 8º, art. 17, da Lei 8.429/92, desautoriza a rejeição da petição inicial ação. Assim, deve ser rejeitada a preliminar. Das nulidades da sentença Não vislumbro na hipótese elementos que conduzam à nulidade da sentença, visto que foram apresentados os fatos e definidos os elementos para caracterização da conduta atribuída aos requeridos, bem como foi adequadamente fundamentada a conclusão do juízo, individualizada a conduta de cada réu e finalizada com dispositivo claro e fundamentado, no que se refere à condenação dos réus e da dosimetria da pena. Ademais, considerando que concluiu o juízo pela prática do ato típico do art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, cujas sanções aplicadas foram as do inciso II do art. 12 da LIA, nenhuma nulidade há na sentença, visto que está de acordo com os termos da Lei de Improbidade Administrativa na atual vigência. Ainda que ausente a intimação para manifestação quanto às inovações legislativas da Lei 14.230/2021 previamente à prolação da sentença, tal fato não tem o condão, por si, de tornar nula a sentença, tendo em vista a oportunidade de se manifestar sobre o tema na apelação, não havendo que se falar em prejuízo à defesa que justifique a declaração de nulidade da sentença. Da ilegitimidade passiva Quanto à ilegitimidade passiva, considerando que essa se confunde com o mérito da ação, será analisada juntamente com os fatos atribuídos a cada réu. Da prescrição Quanto à prejudicial de mérito suscitada, ressalto que não incidiu a prescrição no caso concreto. Isso porque, conformo informam os apelantes, os fatos tidos por ímprobos ocorreram na gestão do ex-prefeito Edivaldo Souza Lima, cujo mandato encerrou-se no dia 31/12/2008. Tendo a ação sido ajuizada em 18/12/2013, o foi antes de transcorrido o prazo quinquenal da prescrição. Confira-se, a propósito, a previsão legal respectiva: Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança; Dessa forma, rejeitada a prescrição. Do mérito Segundo consta na petição inicial, a ação civil pública foi ajuizada pelo Ministério Público Federal em desfavor do ex-prefeito do Município de Itaju do Colônia/BA, do ex-Secretário Municipal de Finanças, da ex-Secretária Municipal de Educação, da ex-Diretora do Setor de Contabilidade do município, da ex-Procuradora Jurídica do município e outros particulares, em face de diversas irregularidades perpetradas nos anos de 2007 e 2008, consistentes na malversação de recursos federais repassados ao município pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, condutas que foram enquadradas pelo autor como atos típicos do art. 10, VIII, XI e XII, e art. 11, caput, da Lei 8.429/92. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente" Assim, a responsabilização do agente com base nos tipos descritos na Lei de Improbidade, com as alterações da Lei 14.230/2021, passou a exigir agora a demonstração da intenção dolosa. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” À luz desse tema, as normas de direito material mais benéficas, introduzidas pela Lei 14.230/21, devem ser aplicadas às ações em curso, posto que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1º, § 4º, da LIA). Portanto, a norma mais benéfica retroage para beneficiar o réu. Além disso, no que se refere ao regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021, o STF firmou tese no sentido de se irretroativo, cujos novos marcos temporais serão aplicados a partir da publicação da Lei, ocorrida em 26/10/2021, razão pela qual não incidiu, no caso concreto, a prescrição intercorrente. Prosseguindo, observo que os apelantes foram condenados pela prática dos atos típicos art. 10, VIII, XI e XII, da Lei 8.429/92, na redação posterior à Lei 14.230/2021, de cujos dispositivos se extrai: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; Para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade da demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico, bem como a comprovação do efetivo dano ao erário. No caso em exame, ficaram demonstrados, na sentença, a autoria das condutas atribuídas aos apelantes, assim como o dolo em seus atos, conforme se verifica do trecho abaixo da sentença: "(...) Debruçando-me sobre a prova documental carreada aos fólios, verifico que os processos licitatórios objeto desta demanda foram montados por funcionários da Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia em conluio com os particulares que controlavam as empresas utilizadas nas simulações, a fim de justificar o desvio de recursos públicos. O requerido Edivaldo Souza Lima, então prefeito municipal, realizou pagamentos a empresas fictícias pertencente aos particulares acionados, com o intuito de justificar despesas ilícitas e desvio de verbas públicas de origens diversas. O demandado, na qualidade de prefeito, determinou a montagem de certames com objetos fracionados, simulando a aquisição de gêneros alimentícios, materiais de expediente e materiais de higiene e limpeza nos anos de 2007 e 2008. Restou apurado que o referido gestor simulou a realização de 25 (vinte e cinco) licitações no período compreendido entre janeiro de 2007 e julho de 2008, forjando licitações em que supostamente teriam concorrido as empresas integrantes da associação criminosa formada pelos requeridos. De fato, há provas no inquérito policial nº 307/2011, notadamente diálogos interceptados durante as investigações (anexo), demonstrando que o então prefeito Edivaldo Souza Lima, o secretário de finanças Fernando Bezerra Leite, a secretária de educação Maria Augusta Carillo Marques, a diretora do setor de contabilidade Neide Rocha dos Santos e a procuradora jurídica do município Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, associaram-se com os particulares no intuito de praticar as fraudes objeto desta ação. Restou comprovado no decorrer das investigações que os agentes públicos municipais possuíam relação direta com os particulares acionados, mantendo contatos frequentes com os controladores das empresas que participavam das licitações em Itaju do Colônia, nos quais negociavam propinas e outras vantagens que receberiam em razão da empreitada. Na diligência de busca e apreensão realizada na Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia/BA foi encontrada pasta contendo documentação de empresas integrantes do aludido grupo, notadamente certidões negativas fiscais das pessoas jurídicas F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, A. M. Barreto Representações, Manoel Pereira Palmeira e JLS – Joan Lima Santos. Registre-se que na Prefeitura foram encontrados carimbos de todas as empresas licitantes tratadas nesta ação. No cumprimento do mandado de busca e apreensão na residência da secretária de educação Maria Augusta Carillo Marques foi apreendido, dentre outros documentos, um talonário de notas fiscais da empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, com notas fiscais emitidas para várias prefeituras, inclusive Itaju do Colônia, conforme relatório de análise de material apreendido. Na residência do ex-prefeito Edivaldo Souza Lima foi apreendido processo licitatório no qual figuravam como licitantes as empresas A. M. Barreto Representações e a F. M. Amaral Gêneros Alimentícios, bem como processos de pagamento destinados à empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios. Já na residência da diretora de contabilidade Neide Rocha dos Santos foram apreendidos, dentre outros documentos, cópias de cheques com manuscritos “passagens Cláudia” e “AM Barreto parte pgt° mat. Limpeza p UMS”, notas fiscais e comprovantes de depósito bancários realizados na conta da acionada Maria Cláudia. Nos áudios transcritos na inicial, o requerido Fernando Amaral mantinha constante contato com o prefeito municipal, dentre outros funcionários da Prefeitura, em diálogos nos quais eram acertados valores de notas fiscais, valores de propinas, datas de liberação de recursos públicos, dentre outros temas. Noutro passo, em relação à requerida Maria Cláudia Aragão Padilha Lima, procuradora jurídica do município, restou comprovado pelos diálogos a exigência do pagamento de valores por Fernando Amaral, que seriam transferidos pela Prefeitura de Itaju do Colônia, demonstrando a participação da demandada no esquema das fraudes. Foi observado pelo MPF que em todos os processos licitatórios fraudados, a requerida Maria Cláudia atestou falsamente a regularidade desses certames por supostamente cumprirem os procedimentos da Lei n° 8.666/93 (...) Por outro lado, durante as investigações realizadas em sede policial, constatou-se a existência de grupo composto por Fernando Moreira Amaral, Valéria Santos Amaral, Geisa Cristina Lombardo Maciel, Alessandra Silva Santos, Alberto Clécio Oliveira Viana, vulgo “Birro”, e Aldai Marino Barreto, fraudando licitações e desviando recursos públicos. Restou apurado que o requerido Fernando Moreira Amaral controlava a grande maioria das empresas que eram regularmente contratadas pela prefeitura municipal de Itaju do Colônia, utilizando-as para emissão de notas fiscais “frias” ou parcialmente “frias”, sempre com o intuito de obter vantagens indevidas e desviar verbas federais. Ficou comprovado que Fernando Amaral era proprietário da firma F. M. Amaral Gêneros Alimentícios e também controlava diretamente a empresa Valéria Santos Amaral ME – Valéria Comercial de Alimentos, que constitui firma individual da requerida Valéria Santos Amaral, sobrinha de Fernando Amaral, mas era este que de fato controlava a pessoa jurídica, restando a Valéria Amaral exercer a função de verdadeira funcionária subordinada a seu tio. As provas foram obtidas em diligência de busca e apreensão realizada na sede da empresa Valéria Santos Amaral ME, onde foram encontradas procurações assinadas por Valéria Santos Amaral e outorgadas a Fernando Amaral e a duas funcionárias deste, as requeridas Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos, que também participavam ativamente dos esquemas fraudulentos em análise. (...) Além disso, na busca e apreensão realizada na empresa F. M. Amaral Gêneros Alimentícios foram apreendidos diversos documentos, evidenciando que Fernando Amaral possuía ingerência direta nas demais empresas integrantes da organização, notadamente na A. M. Barreto Representações – Comercial Barreto e na Manoel Pereira Palmeiras – Comercial Tend Tudo, que supostamente disputaram diversos certames licitatórios com a F. M. Amaral Gêneros Alimentícios (firma individual de Fernando Amaral). Durante a fiscalização realizada pela CGU na Prefeitura Municipal de Itaju do Colônia, constatou-se, ainda, que Fernando Amaral detinha o controle da firma individual Márcio Santos de Souza, a qual era utilizada nas fraudes descritas na inicial. (...) Em relação às acionadas Geisa Cristina Lombardo Maciel e Alessandra Silva Santos, observa-se que as mesmas eram funcionárias de Fernando Amaral e atuavam na confecção de notas fiscais “frias”, na representação das empresas fictícias e no recebimento de valores indevidamente pagos pelos municípios para as empresas envolvidas. (...) Consoante áudios transcritos, Geisa Cristina Maciel e Alessandra Silva Santos secretariavam os negócios ilícitos de Fernando Amaral, atuando diretamente na confecção de notas fiscais ideologicamente falsas e documentos que eram utilizados nas licitações fraudulentas. (...) Descabida, ainda, a alegação de falta de dolo, tendo em vista o modus operandi explicitamente fraudulento empregado pelos acionados a fim de concretizar os atos ímprobos em voga, o que denota o pleno conhecimento acerca dos mesmos. (...) Assim, parece-me que as condutas do gestor municipal, dos agentes públicos da prefeitura, participando da negociação de notas fiscais ideologicamente falsas, bem como de documentos para compor procedimentos licitatórios forjados, do pagamento de “propinas”, junto aos particulares empresários, demonstram a prática de ato doloso de improbidade administrativa. (...)” No entanto, não restou comprovado que essas condutas dos requeridos resultaram em dano ao erário, tampouco que os bens ou serviços contratados não foram entregues ao município, ou que tenham sido adquiridos com sobrepreço. No que se refere ao prejuízo, após a exposição dos fatos e autoria, afirmou o Juízo, na sentença, que “Esses dados, analisados em conjunto, mostram-se suficientemente comprobatórios da existência de desvio de recursos públicos para o atendimento de finalidades particulares, o que impõe a devolução da quantia.”. Ou seja, verifica-se que a condenação amparou-se em prejuízo foi presumido. No entanto, o prejuízo presumido não mais é suficiente para a caracterização do ato de improbidade administrativa, após as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021 à Lei 8.429/92. Ressalto, por fim, que não obstante a ausência de recurso de apelação dos demais réus, mas considerando os termos do art. 1.005 do CPC, a conclusão da improcedência dos pedidos a eles alcança. Pelo exposto, dou provimento às apelações e julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, cujos efeitos são extensíveis aos demais litisconsortes. Defiro o pedido de justiça gratuita formulado por Alessandra Silva Santos, nos termos do art. 98 do CPC. É o voto. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região GAB. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004338-56.2013.4.01.3311 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004338-56.2013.4.01.3311/BA CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: ALESSANDRA SILVA SANTOS, FERNANDO BEZERRA LEITE, MARIA AUGUSTA CARILLO MARQUES, MARIA CLAUDIA ARAGAO PADILHA LIMA Advogados do(a) APELANTE: ALVARO LUIZ FERREIRA SANTOS - BA9465-A, LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, VLADIMIR SOARES SANTOS - BA40043-A Advogados do(a) APELANTE: LUIZ FERNANDO MARON GUARNIERI - BA26001-A, RENATO DATTOLI NETO - BA42446-A Advogados do(a) APELANTE: AUGUSTO ABILIO POMBAL DO ROSARIO JUNIOR - BA50343-A, JERBSON ALMEIDA MORAES - BA16599-A Advogados do(a) APELANTE: GERVASIO FIRMO DOS SANTOS SOBRINHO - BA14566-A, IRUMAN RAMOS CONTREIRAS - BA10889-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) E M E N T A ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, VIII, XI E XII, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO POSTERIOR À LEI 14.230/2021. EFETIVO DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 1.005 DO CPC. APELAÇÕES PROVIDAS. EFEITO EXTENSÍVEL AOS DEMAIS RÉUS. 1. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que regulamentou o art. 37, § 4º, da Constituição Federal de 1988, tem como finalidade impor sanções aos agentes públicos pela prática de atos de improbidade nos casos em que: a) importem enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário (art. 10); e c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), neste também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 2. Com a superveniência da Lei 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei 8.429/92, para que o agente público possa ser responsabilizado por ato de improbidade administrativa, faz-se necessária a demonstração do dolo específico, conforme o artigo 1º, §2º, da Lei 8.429/92, ao dispor: "§ 2º considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos artigos 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente". 3. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 1.199 (ARE 843989 RG, Relator Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, publicado em 04.03.2022), após analisar as questões submetidas ao respectivo tema em decorrência da superveniência da Lei 14.230/2021 que introduziu as alterações promovidas na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), fixou as seguintes teses :“1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 4. Para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 10 e incisos, da Lei nº 8.429/92, com as alterações promovidas pela Lei 14.230/21, ficou afastado o elemento culposo, persistindo a necessidade da demonstração do elemento subjetivo doloso, considerando o dolo específico, bem como a comprovação do efetivo dano ao erário. 6. No caso em exame, não obstante a demonstração da autoria e dolo na conduta dos apelantes, não restou comprovado que essas condutas resultaram em dano ao erário, tampouco que os bens ou serviços contratados não foram entregues ao município, ou que tenham sido adquiridos com sobrepreço. 7. Após a exposição dos fatos e autoria, afirmou o Juízo, na sentença, que “Esses dados, analisados em conjunto, mostram-se suficientemente comprobatórios da existência de desvio de recursos públicos para o atendimento de finalidades particulares, o que impõe a devolução da quantia.”. Portanto, a condenação amparou-se em prejuízo presumido. 8. Não obstante a ausência de recurso de apelação dos demais réus, mas considerando os termos do art. 1.005 do CPC, a conclusão pela improcedência dos pedidos a eles alcança. 9. Apelações providas, com efeitos extensíveis aos demais litisconsortes. A C Ó R D Ã O Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento às apelações, com efeitos extensíveis aos demais litisconsortes, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília/DF, 8 de julho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator G/M

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou 1243 resultados. Faça login para ver detalhes completos e mais informações.

Fazer Login para Ver Detalhes