Processo nº 5000236-38.2025.8.13.0005
ID: 334180195
Tribunal: TJMG
Órgão: Vara Única da Comarca de Aiuruoca
Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Nº Processo: 5000236-38.2025.8.13.0005
Data de Disponibilização:
25/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WAGNER KAUE MARTINS NASCIMENTO
OAB/MG XXXXXX
Desbloquear
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Aiuruoca / Vara Única da Comarca de Aiuruoca Rua Felipe Senador, 65, Centro, Aiuruoca - MG - CEP: 37450-000 PROCESS…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Aiuruoca / Vara Única da Comarca de Aiuruoca Rua Felipe Senador, 65, Centro, Aiuruoca - MG - CEP: 37450-000 PROCESSO Nº: 5000236-38.2025.8.13.0005 CLASSE: [CÍVEL] AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (64) ASSUNTO: [Enriquecimento ilícito] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: DANIVAL ROBERTO VIEIRA CPF: 004.095.346-76 SENTENÇA I - RELATÓRIO: Vistos, etc. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA C/C OBRIGAÇÃO DE RESSARCIMETNO AO ERÁRIO ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS em face de DANIVAL ROBERTO VIEIRA. O órgão ministerial alega o seguinte: O presente Inquérito Civil foi instaurado em 20 de março de 2024 após recebimento de denúncia através da Ouvidoria do Ministério Público (nº 640294112023-2), a qual informa sobre o aumento dos valores recebidos pelos vereadores da Câmara do município de Serranos no ano de 2023. Após o recebimento da denúncia, foi oficiada a Câmara Municipal para que encaminhasse cópia de toda a documentação referente ao recebimento de diárias pelos vereadores do município. Com o envio da documentação, verificaram-se várias irregularidades no recebimento de diárias pelos edis, sendo instaurado procedimentos autônomos. O motivo da apuração foi perquirição acerca de suspeita de ilícitos – gastos desprovidos de interesse ou proveito público, assim como ausentes adequada prestação de contas, justificativa ou mesmo comprovação de que realmente as despesas foram investidas. Assim, restou constatado que o requerido, Danival Roberto Vieira, dentre as várias diárias recebidas no ano de 2023, não comprovou documentalmente as viagens realizadas, descumprindo o previsto na Lei Municipal n.º 984/18. Não restaram devidamente comprovadas as viagens realizadas no período: 1 – De 24/10/2023 a 27/10/2023, com destino a Belo Horizonte, não apresentou certificado; não há certificado de comparecimento no curso de capacitação, somente seu cronograma. Não há comprovação hábil para pagamento de diárias (art. 2º, § 3º, da Lei Municipal n.º 984/2018). Devolução do valor integral recebido; 2 – De 14/11/2023 a 17/11/2023, com destino a Belo Horizonte não apresentou certificado; não há certificado de comparecimento no curso de capacitação, somente seu cronograma. Não há comprovação hábil para pagamento de diárias (art. 2º, § 3º, da Lei Municipal n.º 984/2018). Devolução do valor integral recebido; 3 – De 20/11/2023 a 26/11/2023, com destino à Brasília, não apresentou certificado; não há certificado de comparecimento no curso de capacitação, somente seu cronograma, constando 1 declaração de comparecimento na Câmara de Deputados no dia 21/11. Ademais, no cronograma do curso de capacitação consta como período do curso de 21 a 24/11/23. Não há comprovação hábil para pagamento de diárias. (art. 2º, § 3º da Lei Municipal n.º 984/2018). Devolução do valor integral recebido; verifica-se que o requerido foi ressarcido no valor de R$ 4.512,46 (quatro mil quinhentos e doze reais e quarenta e seis centavos) referente a restituição de metade do valor da despesa com passagem aérea. Ocorre que a fatura da compra foi realizada em nome da Câmara Municipal de Serranos, não havendo nenhuma comprovação de pagamento pelo requerido. Valor a ser ressarcido R$ 4.512,46. Ao final, pugna pela condenação do requerido a ressarcir, integralmente, os danos causados ao erário do município de Serranos/MG, consistente no valor desviado/apropriado/dilapidado de R$ 16.412,46 (dezesseis mil, quatrocentos e doze reais e quarenta e seis centavos), com juros e correção monetária e reconhecida a prática de ato de improbidade administrativa previsto no art. 9°, XI, da Lei n° 8.429/92, com as sanções impostas no art. 12, I, da mesma lei. Realizada audiência de conciliação as partes não chegaram a um acordo, id n° 10439809909. Apresentada contestação, id n° 10434348310, o requerido afirmou que houve devida comprovação de participação nos cursos e destinação das diárias, além da impossibilidade de caracterização do ato como improbidade administrativa, já que ausente o elemento volitivo, dolo. Impugnação à contestação, id n° 10449150212, em que o Ministério Público retificou o valor a ser ressarcido, passando para R$ 7.212, 46 (sete mil, duzentos e doze reais e quarenta e seis centavos). Ministério Público se manifestou pela ausência de novas provas a serem produzidas, id n° 10451727304. Pelo requerido, id n° 10462275152, solicitou a expedição de ofício à companhia aérea, com a finalidade de informar qual foi a forma de pagamento da transação de n° 8609280 de 16/11/2023 e designação de audiência de instrução e julgamento para oitiva de testemunhas. Logo depois, os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. II – DA FUNDAMENTAÇÃO: A conduta proba consiste na moral jurídica, pautada pela honestidade, pela boa-fé, não sujeita a corrupção. A probidade administrativa, por sua vez, traduz a noção do trato correto da coisa pública, da conduta pautada na moral e em observância aos princípios constitucionais administrativos. O art. 37, §4º da CF/88 trata da improbidade administrativa e traça as sanções a serem aplicadas nos casos em que resta configurada. Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) § 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. A improbidade administrativa foi disciplinada na Lei Federal nº 8.429 de 02/06/1992. Para que um fato se enquadre na Lei de Improbidade Administrativa, é necessário que a parte autora demonstre dois elementos essenciais: (a) a existência de um fato que se amolde à Lei de Improbidade, ou seja, um evento que configure violação aos princípios da administração pública, prejuízo ao erário ou enriquecimento ilícito – elemento objetivo; (b) e a intenção, representada pelo dolo específico do agente público e do particular em violar os princípios da administração pública, causar prejuízo ao erário ou enriquecer ilicitamente – elemento subjetivo. O primeiro é o elemento material e o segundo o elemento intencional. Ambos necessitam de prova. Logo, a demonstração do primeiro sem a comprovação do segundo não se perfaz ato de improbidade administrativa. O fato ímprobo imputado ao requerido pelo Ministério Público é o enriquecimento ilícito, na medida em que incorporou ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial do Município, ao receber as diárias sem comprovar a efetiva viagem (art. 9°, XI, da Lei de Improbidade Administrativa). Devido à complexidade do assunto, necessário explicar como ocorre a demonstração do elemento subjetivo dolo, nos termos da Lei de Improbidade Administrativa. A demonstração da intenção do indivíduo ao praticar uma conduta pode ocorrer de duas maneiras. A primeira forma ocorre quando a simples demonstração do fato permite inferir imediatamente a intenção. Nessas situações, a dedução do fato demonstrado conduz a uma única conclusão, sem margem para interpretações alternativas. Por essa razão, trata-se de casos simples, que demandam pouco esforço argumentativo para estabelecer o elemento volitivo. Sobre o tema, consigno a explicação de NICOLA FRAMARINO DEI MALATESTA: O que importa mencionar sob o ponto de vista da crítica criminal é que o elemento intencional, sendo uma coisa distinta do elemento material, necessita de uma prova especial. Na prática afirma-se muitas vezes sem mais nada o elemento intencional, mediante a simples prova do elemento material; e não direi que a prática nunca tenha razão, mas que certamente nem sempre a tem. A dedução do elemento intencional do elemento material é lógica somente quando o elemento material in se dolum habet. O homem, ser racional, não obra sem dirigir as suas ações a um fim. Ora quando um meio só corresponde a um dado fim criminoso, o agente não pode tê-lo empregado senão para alcançar aquele fim; a dedução, portanto, do elemento intencional da prova do elemento material é lógica neste caso, mesmo quando o fim criminoso se não tenha alcançado. Tício prendeu um laço corrediço a uma trave, e, introduzindo, nele à força o pescoço de Caio, fugiu deixando-o aí pendurado. Quer Caio morra disso, quer seja salvo por alguém que sobrevenha imediatamente, o elemento intencional necessário para se afirmar o homicídio no primeiro caso, e a tentativa de homicídio no segundo, ficará provado pela simples prova do elemento material. (A lógica das provas em matéria criminal. 1 ed. Leme/SP: Editora Edijur, 2022. Pag. 169/170). A segunda forma de demonstrar a intenção surge quando o fato material comprovado admite múltiplas interpretações, não conduzindo necessariamente a uma única conclusão. Nesses casos, faz-se necessária uma prova especial que vá além da mera materialidade do fato imputado, sendo indispensável circunstâncias adicionais que permitam esclarecer a real intenção do agente. Por essa razão, trata-se de casos complexos, que demandam muito esforço probatório e argumentativo para estabelecer o elemento volitivo. Sobre o tema, consigno a explicação de NICOLA FRAMARINO DEI MALATESTA: Mas fora destes casos em que a materialidade não tem mais que um sentido e um único fim possível, em todos os outros casos é necessário uma prova especial para a verificação do elemento intencional […] Se não provar a especialidade da intenção criminosa, a prova da materialidade da ação não serve de coisa alguma. (A lógica das provas em matéria criminal. 1 ed. Leme/SP: Editora Edijur, 2022. Pag. 170). Os fatos previstos nos artigos 9, 10 e 11 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) se enquadram na segunda forma de demonstração da intenção, pois não basta ao órgão ministerial comprovar que determinada conduta causou dano ao erário, enriquecimento ilícito ou violação a princípio; é imprescindível provar o elemento subjetivo especial, ou seja, a intenção deliberada do agente de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outrem, nos termos dos artigos 1, §§2 e 3, e 11, §§1 e 2, da LIA. Sobre o assunto, consigno o entendimento pacífico do STJ, conforme ementa do Tema 1.108: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. IMPROBIDADE. CONTRATAÇÃO DE SERVIDOR TEMPORÁRIO. AUTORIZAÇÃO. LEI LOCAL. DOLO. AFASTAMENTO. 1. Em face dos princípios a que está submetida a administração pública (art. 37 da CF/1988) e tendo em vista a supremacia deles, sendo representantes daquela os agentes públicos passíveis de serem alcançados pela lei de improbidade, o legislador ordinário quis impedir o ajuizamento de ações temerárias, evitando, com isso, além de eventuais perseguições políticas e o descrédito social de atos ou decisões político-administrativos legítimos, a punição de administradores ou de agentes públicos inexperientes, inábeis ou que fizeram uma má opção política na gerência da coisa pública ou na prática de atos administrativos, sem má-fé ou intenção de lesar o erário ou de enriquecimento. 2. A questão central objeto deste recurso, submetido ao regime dos recursos repetitivos, é saber se a contratação de servidores temporários sem concurso público, baseada em legislação municipal, configura ato de improbidade administrativa, em razão de eventual dificuldade de identificar o elemento subjetivo necessário à caracterização do ilícito administrativo. 3. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, desde há muito, a contratação de servidores públicos temporários sem concurso público baseada em legislação local afasta a caracterização do dolo genérico para a configuração de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública. 4. O afastamento do elemento subjetivo de tal conduta dá-se em razão da dificuldade de identificar o dolo genérico, situação que foi alterada com a edição da Lei n. 14.230/2021, que conferiu tratamento mais rigoroso, ao estabelecer não mais o dolo genérico, mas o dolo específico como requisito para a caracterização do ato de improbidade administrativa, ex vi do seu art. 1º, §§ 2º e 3º, em que é necessário aferir a especial intenção desonesta do agente de violar o bem jurídico tutelado. 5. Para os fins do art. 1.039 do CPC/2015, firma-se a seguinte tese: "A contratação de servidores públicos temporários sem concurso público, mas baseada em legislação local, por si só, não configura a improbidade administrativa prevista no art. 11 da Lei 8.429/1992, por estar ausente o elemento subjetivo (dolo) necessário para a configuração do ato de improbidade violador dos princípios da administração pública." 6. In casu, o Tribunal de origem reformou a sentença que condenou o demandado, levando em conta a existência de lei municipal que possibilitava a contratação temporária da servidora apontada nos autos, sem a prévia aprovação em concurso público, motivo pelo qual o acórdão deve ser confirmado. 7. Recurso especial desprovido. (REsp n. 1.913.638/MA, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, julgado em 11/5/2022, DJe de 24/5/2022.). A demonstração do dolo específico não se faz por meios diretos de prova, salvo nos casos de confissão, mas sim por meios indiretos, conhecidos como indícios ou indicadores externos. Quanto maior o número e a força desses indícios, maior será a possibilidade de se reconhecer a configuração do elemento subjetivo necessário para a caracterização do ato de improbidade. Explica NICOLA FRAMARINO DEI MALATESTA: […] só a confissão pode ser prova direta do elemento intencional. Excetuando o caso da confissão, não é possível chegar-se a verificação do elemento intencional, senão por meio de provas indiretas: percebem-se coisas diversas da intenção propriamente dita, e dessas coisas passa-se a concluir pela sua existência (A lógica das provas em matéria criminal. 1 ed. Leme/SP: Editora Edijur, 2022. Pag. 170). Diante disso, prevê o artigo 28 da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Decreto nº5.687/2009), que a intenção pode ser inferida a partir de circunstâncias fáticas objetivas. Segue a redação legal: Artigo 28. Conhecimento, intenção e propósito como elementos de um delito. O conhecimento, a intenção ou o propósito que se requerem como elementos de um delito qualificado de acordo com a presente Convenção poderão inferir-se de circunstâncias fáticas objetivas. Ao comentar o dispositivo, o ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DROGAS E CRIME – UNODOC explicou detidamente o propósito do dispositivo: O objetivo do artigo 28 é estabelecer que as disposições probatórias de cada Parte do Estado devem permitir inferências com relação à intencionalidade de um criminoso, com base em circunstâncias factuais objetivas, em vez de exigir evidências diretas, como a confissão, para que a intencionalidade removida. De fato, como o Tribunal não pode perceber diretamente a intencionalidade do acusado e raramente há evidências diretas de sua predisposição psicológica, na maioria dos estados Partias a prova do elemento subjetivo do crime pode ser alcançado através da evidência indicativa de So é, através de um processo de raciocínio lógico que permite inferir conclusões válidas sobre os elementos ausentes de fatos conhecidos e demonstrados por meio de evidências diretas (por exemplo, documentos, testemunhos e relatórios de especialistas), levando em consideração as circunstâncias pessoais do acusado e do geral contexto do caso, bem como as máximas da experiência e questões de conhecimento geral. Conforme explicado em um exame, com exceção da confissão espontânea, a intenção deve ser inferida, legalmente e racionalmente, de muitas circunstâncias que giram em torno do comportamento (antes, durante e depois) pelo qual é processado, em cuja análise não pode perder o estudo da personalidade, seu conhecimento, seu treinamento, seu profissionalismo, seu status social e suas integrais (econômicas, profissionais, altruístas ou outro tipo). Toda essa informação é usada para capturar a condenação íntima dos juízes e demonstrar além de qualquer dúvida razoável o elemento subjetivo do crime. A questão está intimamente ligada ao princípio da avaliação ("moral") das evidências, que geralmente é consagrada nos procedimentos criminais nacionais e que permite que os tribunais avaliem livremente todas as evidências que lhes foram presentes, sempre que: a) não contradiz os princípios da lógica, experiência e fundação científica solidamente estabelecida; e b) ditar decisões motivadas, indicando as evidências que serviram para demonstrar cada um dos supostos fatos e circunstâncias. (Tradução livre. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil//Topics_corruption/Publicacoes/V1704682s.pdf. Acesso em: 03/02/2025. Pag. 114/115). Posto isso, para demonstrar o dolo específico, não basta comprovar a prática de um fato que se amolda à Lei de Improbidade, é necessário, ainda, comprovar a má-fé, a intenção deliberada do agente de obter proveito patrimonial. Essa comprovação, por sua vez, deve considerar os indícios ou indicadores externos demonstrados no processo, tais como as circunstâncias pessoais do representado, o contexto geral do caso, os documentos produzidos e as máximas da experiência, entre outros. Afinal, somente a análise conjunta desses elementos permite aferir se houve ou não a intenção qualificada. Feita esta introdução, passa-se à análise do caso em comento. A imputação feita ao requerido é a prevista no art. 9, XI, da Lei n° 8.429/92. Nesse sentido: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei; O Ministério Público afirmou que o requerido não prestou contas das seguintes diárias recebidas: 1 – De 24/10/2023 a 27/10/2023, com destino a Belo Horizonte, não apresentou certificado; não há certificado de comparecimento no curso de capacitação, somente seu cronograma. Não há comprovação hábil para pagamento de diárias (art. 2º, § 3º, da Lei Municipal n.º 984/2018). Devolução do valor integral recebido; No que se refere ao primeiro período, de 24 a 27/10/2023, infere-se que o requerido comprovou, através do documento juntado no id n° 10434349714, a participação em curso realizado na cidade de Belo Horizonte/MG. 2 – De 14/11/2023 a 17/11/2023, com destino a Belo Horizonte não apresentou certificado; não há certificado de comparecimento no curso de capacitação, somente seu cronograma. Não há comprovação hábil para pagamento de diárias (art. 2º, § 3º, da Lei Municipal n.º 984/2018). Devolução do valor integral recebido; Para o período, apresentou comprovante de participação no 549° Curso de Capacitação com o tema: “Fiscalização e Acompanhamento da Gestão Orçamentária e Financeira Municipal”, nos dias 14 a 17 de novembro/2023, id n° 10434350350. 3 – De 20/11/2023 a 26/11/2023, com destino à Brasília, não apresentou certificado; não há certificado de comparecimento no curso de capacitação, somente seu cronograma, constando 1 declaração de comparecimento na Câmara de Deputados no dia 21/11. Ademais, no cronograma do curso de capacitação consta como período do curso de 21 a 24/11/23. Não há comprovação hábil para pagamento de diárias. (art. 2º, § 3º da Lei Municipal n.º 984/2018). Devolução do valor integral recebido; verifica-se que o requerido foi ressarcido no valor de R$ 4.512,46 (quatro mil quinhentos e doze reais e quarenta e seis centavos) referente a restituição de metade do valor da despesa com passagem aérea. Ocorre que a fatura da compra foi realizada em nome da Câmara Municipal de Serranos, não havendo nenhuma comprovação de pagamento pelo requerido. Valor a ser ressarcido R$ 4.512,46. No id n° 10434346924, comprovou, através de certificado, que participou do 552° CURSO DE CAPACITAÇÃO COM O TEMA: “ANÁLISE DA LEI ORGÂNICA E A COMPETÊNCIA LEGISLATIVA SUPLEMENTAR DO MUNICÍPIO.”, no período de 21 a 24/11/2023. Cumpre salientar que o referido curso foi realizado em Brasília/DF e o deslocamento da seguinte forma: Serranos x Belo Horizonte em veículo oficial e Belo Horizonte x Brasília de avião. A aquisição de passagem de avião foi comprovada por meio dos documentos de id n° 10434350351, em que consta o número da transação 8609280, as origens, destinos, dias e horários dos voos, além do passageiro. Apesar de não constar a forma de pagamento, fica evidente que os dados do passageiro são os do réu, além de que o valor restituído pela Câmara é exatamente aquele contido no documento. Diverso do apontado pela parte autora, inexiste elemento que indique que o valor foi depositado e pago pela Câmara diretamente à MaxMilhas. Pelo contrário, a transferência realizada pelo órgão público foi posterior à data da realização da viagem, em 30/11/2023, comprovando que ela foi efetivada com a finalidade de reembolsar as passagens mencionadas acima. Nesse sentido, desnecessária a expedição de ofício à empresa MaxMilhas para fornecimento dos dados do cartão de crédito em que foram pagas as passagens, já que os documentos contidos nos autos são suficientes para comprovar que o valor recebido da Câmara Municipal foi direcionado ao reembolso das despesas. Também não há razão para oitiva de testemunhas, visto que as provas documentais comprovam a participação do réu nos eventos mencionados. Concluída a análise de cada período indicado acima, denota-se que, além da devida comprovação de participação nos cursos, eventos e realização das viagens – fato reconhecido parcialmente pelo Ministério Público em sua réplica-, não ficou comprovada a vontade livre e consciente do requerido de praticar o ato ilícito, especificamente, de ter vantagem patrimonial indevida – elemento subjetivo. Frisa-se que, eventuais divergências, como a apontada pelo Ministério Público para justificar o ressarcimento das diárias para participação no curso ministrado entre 20/11/2023 e 26/11/2023, em Brasília/DF, não são suficientes para atrair a conclusão de vontade livre e consciente do agente público em se beneficiar de vantagem indevida, caracterizando-se mero erro da administração pública. Nesse sentido: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VEREADOR. DIÁRIAS DE VIAGEM. PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE REJEITADA. PARTICIPAÇÃO EM CURSOS DE CAPACITAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DOLO. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta por vereador condenado em ação civil pública por improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG), visando à devolução de valores recebidos a título de diárias de viagem para participação em cursos de capacitação e à suspensão dos direitos políticos. A sentença de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, condenando o réu nos termos do art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA), com fundamento na suposta obtenção indevida de recursos públicos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) verificar se o recurso foi tempestivo; (ii) definir se o apelante praticou ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 10, incisos I e X, da LIA, considerando as provas de participação nos cursos; e (iii) estabelecer se há comprovação de dolo na conduta, elemento essencial para a configuração da improbidade administrativa após as alterações promovidas pela Lei nº 14.230/2021. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O recurso é tempestivo, pois foi interposto dentro do prazo legal de 15 dias úteis, contado a partir da ciência da sentença, rejeitando-se a preliminar de intempestividade arguida pelo Ministério Público. 4. A configuração do ato de improbidade administrativa exige a comprovação do dolo específico, nos termos do entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal no Tema nº 1.199 da repercussão geral. 5. O conjunto probatório demonstra que os cursos foram efetivamente realizados e que o apelante apresentou certificados de participação, não desconstituídos pelo Ministério Público. 6. A mera inconsistência documental s obre a reserva de hotéis e a quantidade de diárias concedidas não constitui, por si só, prova suficiente da intenção de lesar o erário. 7. A reforma da sentença é necessária, pois não há elementos que comprovem a prática de ato ímprobo doloso pelo apelante, conforme exigido pela nova redação da LIA. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. O recurso de apelação interposto dentro do prazo legal deve ser conhecido, rejeitando-se a preliminar de intempestividade. 2. A configuração do ato de improbidade administrativa exige a comprovação do dolo específico, não sendo suficiente a mera irregularidade formal na concessão de diárias. 3. A apresentação de certificados válidos e não desconstituídos pela parte autora afasta a presunção de recebimento indevido de diárias de viagem. 4. A condenação por improbidade administrativa deve observar a necessidade de prova concreta de má-fé e de prejuízo ao erário. Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.429/1992, art. 10, incisos I e X; art. 12, inciso II; Código de Processo Civil, arts. 373, incisos I e II, e 1.003, § 5º. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE nº 843.989/PR, Tema nº 1.199; TJMG, Apelação Cível nº 1.0000.22.210455-6/001, Rel. Des. Luís Carlos Gambogi, 5ª Câmara Cível, julg. 27/07/2023. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.24.431892-9/001, Relator(a): Des.(a) Manoel dos Reis Morais , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 25/03/2025, publicação da súmula em 28/03/2025) APELAÇÃO CÍVEL - PRELIMINAR - NULIDADE - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - REJEIÇÃO - MÉRITO AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - APLICABILIDADE DA LEI FEDERAL Nº 14.230/2021 - TEMA 1199 - DIÁRIAS DE VIAGEM - IRREGULARIDADE - DOLO DO PREFEITO MUNICIPAL NÃO CONFIGURADO - CONDENAÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - DESCABIMENTO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - RECURSO DESPROVIDO. 1 - Não que se falar em nulidade da sentença por ausência de intimação pessoal do Ministério Público para a apresentação de alegações finais (que ocorreu em audiência de forma presencial) nos casos em que não fora comprovado o efetivo prejuízo à parte. Aplicação do princípio pás de nullité sans grief, sistematizado no art. 282, §1º do CPC. Preliminar rejeitada. 2 - A constitucionalidade da Lei Federal nº 14.230 de 2021 foi reconhecida pelo col. STF no julgamento do Tema nº 1199, sendo fixado o entendimento de que as inovações trazidas pelo ato normativo somente não se aplicam aos casos em que já tenha havido condenação definitiva e, em relação aos prazos prescricionais aplicáveis, sendo, portanto, aplicável à hipótese dos autos. 3 - O pagamento das diárias seguiu norma municipal vigente à época, que não exigia documentação detalhada para a comprovação das viagens, não sendo possível presumir a má-fé do agente público pela ausência de documentos mais detalhados. 4 - A jurisprudência do STJ e dos tribunais estaduais reforça que a irregularidade formal na prestação de contas não implica, por si só, em improbidade administrativa, na ausência de demonstração do dolo específico e do efetivo dano ao erário. 5 - Recurso desprovido. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.19.126670-9/002, Relator(a): Des.(a) Sandra Fonseca , 6ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 06/05/2025, publicação da súmula em 08/05/2025) Ademais, devidamente intimado para especificar as provas, o Ministério Público solicitou o julgamento antecipado da lide. Dessa forma, mesmo tendo sido garantida a oportunidade de produzir outras provas em contraditório, optou por não o fazer, satisfazendo-se com as contidas nos autos. Diante disso, não se desincumbiu de seu ônus probatório, conforme exige o artigo 373, inciso I, do CPC, que impõe ao autor da ação a responsabilidade de demonstrar os fatos constitutivos de seu direito. Assim, diante da ausência de comprovação do elemento subjetivo exigido para condenação em ato de improbidade administrativa, além da comprovação de participação nos eventos que motivaram o pagamento das diárias, os pedidos iniciais devem ser julgados improcedentes. III – DO DISPOSITIVO: Diante do exposto, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC c/c art. 17, §11, da Lei n° 8.429/92, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de condenação de DANIVAL ROBERTO VIEIRA nas penalidades do artigo 9, inciso XI, da Lei de Improbidade Administrativa e determinação de ressarcimento ao erário. Sem condenação em custas e honorários. Após o trânsito em julgado, arquive-se. Parabenizo os servidores e estagiários da Comarca de Aiuruoca pela celeridade processual, já que essa demanda foi ajuizada em 04/02/2025, sendo sentenciada nesta data, de modo que os autos tramitaram por menos de seis meses em primeira instância. P.R.I. Aiuruoca, data da assinatura eletrônica. LUCAS CARVALHO MURAD Juiz(íza) de Direito Vara Única da Comarca de Aiuruoca C.E.C
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear