Banco Pan S.A. x Paulo Ricardo Paz
ID: 317445764
Tribunal: TJRS
Órgão: Secretaria da 11ª Câmara Cível
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 5102616-84.2025.8.21.7000
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO
OAB/RS XXXXXX
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GISLENE GOMES PAZ
OAB/RS XXXXXX
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CRISTIANO MORAES ZONTA
OAB/RS XXXXXX
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Agravo de Instrumento Nº 5102616-84.2025.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Superendividamento
RELATOR
: Desembargador AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI
AGRAVANTE
: BANCO PAN S.A.
ADVOGADO(A)
: ROBERTA BEATR…
Agravo de Instrumento Nº 5102616-84.2025.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Superendividamento
RELATOR
: Desembargador AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI
AGRAVANTE
: BANCO PAN S.A.
ADVOGADO(A)
: ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO (OAB RS099300)
AGRAVADO
: PAULO RICARDO PAZ
ADVOGADO(A)
: CRISTIANO MORAES ZONTA (OAB RS111060)
ADVOGADO(A)
: GISLENE GOMES PAZ (OAB RS117518)
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO.
PRELIMINAR:
JULGAMENTO MONOCRÁTICO.
POSSIBILIDADE. É CABÍVEL O NÃO CONHECIMENTO E O JULGAMENTO MONOCRÁTICO DE RECURSOS CUJA MATÉRIA POSSUI JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE NOS TRIBUNAIS SUPERIORES E NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, NA FORMA DO ART. 932, INCISOS iii E VIII, DO CPC, COMBINADO COM O ARTIGO 206, XXXVI DO REGIMENTO INTERNO E NA FORMA PRECONIZADA NA SÚMULA 568 DO STJ.
nulidade da decisão por violação ao Tema 1.085 do STJ.
não procede, pois a decisão atacada se baseou em uma correta distinção fática e jurídica, em consonância com o microssistema de proteção ao consumidor superendividado instituído pela Lei nº 14.181/2021.
MÉRITO:
o processo de repactuação de dívidas, regido pela lei federal n° 14.181/2021 exige a realização de prévia fase de conciliação, que pode se dar na via judicial (art. 104-A, do cdc) ou na via extrajudicial (art. 104-C, do cdc). caso concreto em que o consumidor superendividado optou pelo ajuizamento da demanda e realização da fase conciliatória na via judicial. Ausência de qualquer ressalva no procedimento de repactuação de dívidas, sendo possível a realização e a apreciação pelo juízo, do pedido de antecipação dos efeitos da tutela sediado nos termos do art. 300 do cpc. ausência de nulidade da decisão recorrida no ponto.
a lei federal 14.181/2021 introduz no código de defesa do consumidor ferramentas para prevenção e tratamento das situações de superendividamento. concessão da tutela de urgência que, no caso concreto, e com suporte na jurisprudência do stj e desta corte, visa assegurar a dignidade e subsistência pessoal e familiar do consumidor superendividado. garantia de acesso a valores indispensáveis para o custeio das despesas mais elementares da subsistência, tais como alimentação habitação e saúde.
a determinação de abstenção ou suspensão dos efeitos de inclusão em cadastros restritivos (SPC e SERASA) se justifica como medida de proteção ao consumidor em situação de vulnerabilidade, visando facilitar o processo de repactuação e evitar o agravamento da situação de endividamento, além de promover um ambiente propício para a conciliação.
A fixação da multa por desconto indevido, limitada ao valor da dívida pendente, mostra-se adequada e proporcional à gravidade do descumprimento, considerando a essencialidade do mínimo existencial para a parte Agravada.O valor arbitrado não configura enriquecimento ilícito do devedor, mas um meio de coerção para que as instituições financeiras cumpram a ordem judicial em tempo hábil. A manutenção da medida, portanto, é imperiosa para garantir a eficácia da tutela de urgência deferida e a proteção do consumidor.
RECURSO DESPROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA
1.
Trata-se de agravo de instrumento interposto por
BANCO PAN S.A.
, devidamente qualificado nos autos, contra a r. decisão interlocutória proferida pelo Juízo do Projeto de Gestão de Superendividamento da Comarca de Porto Alegre,
evento 12, DESPADEC1
, nos autos da
ação de repactuação de dívidas
nº 5002605-30.2025.8.21.5001, ajuizada por
PAULO RICARDO PAZ
..
Nas razões de recurso (
evento 1, INIC1
),
BANCO PAN S.A.
sustentou, em síntese: em sede de
preliminar
, arguiu a
nulidade da decisão proferida
, defendendo a impossibilidade de limitação de
todos
os empréstimos no mesmo patamar, porquanto a decisão teria desrespeitado o Recurso Especial Repetitivo referente ao Tema 1085 do STJ, que considera lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista para empréstimos consignados. No
mérito recursal
, alegou a impropriedade da decisão agravada, aduzindo que a antecipação de tutela foi deferida com base em premissas equivocadas, pois o Agravante nunca concedeu crédito de maneira irresponsável ou ultrapassou o limite consignável. Afirmou que, no caso de empréstimos consignados, sempre observou o limite de 30% (posteriormente 35%, com 5% adicionais para cartão de crédito, conforme Lei 14.131/2021) da margem consignável, apurada pela fonte pagadora. Insistiu que nem todos os empréstimos são consignados e, portanto, não deveriam ser tratados da mesma forma, defendendo a autonomia da vontade e a força obrigatória dos contratos (
pacta sunt servanda
), sem que o ajuizamento da ação descaracterize a mora. Mencionou o Decreto 11.150/2022, que fixou o mínimo existencial em R$ 600,00, excluindo desse valor os contratos de crédito consignado, o que, em sua visão, demonstraria a falta de interesse de agir do Agravado. Quanto aos
cadastros de proteção ao crédito
, defendeu a legalidade da inscrição do nome do Agravado em caso de inadimplência, tratando-se de exercício regular de direito. No que tange à
multa cominatória
, argumentou que o valor de R$ 500,00 por desconto indevido é injusto, indevido e exagerado, e que a multa somente poderia ser imposta após o trânsito em julgado da decisão, e não em sede de tutela antecipada. Requereu a atribuição de
efeito suspensivo ativo
ao agravo, para suspender a medida liminar deferida nos autos de origem, alegando perigo de dano grave e de difícil reparação, consubstanciado no enriquecimento sem causa do Agravado e no cerceamento de defesa do Agravante, além de ofensa à lei.
É o relatório.
2.
Recebo o recurso, porque atendidos os requisitos formais de admissibilidade.
3.
Inicialmente, cumpre referir que a decisão agravada foi proferida nos seguintes termos:
Passo a decidir na presente data, ressaltando que no mês de março tramitam junto ao Projeto de Gestão de Superendividamento mais de 11.600 ações.
Defiro a gratuidade judiciária.
Todavia, ressalvo que a concessão da gratuidade é modulada e restrita a determinados atos processuais, na forma do permissivo legal disposto no parágrafo 5º do artigo 98 do Código de Processo Civil.
A esse respeito, adianto que a vedação imposta pelo parágrafo 3º do artigo 104-B do Código de Defesa do Consumidor poderá ser relativizada, em caso de violação do dever de cooperação e lealdade processual, permitindo-se eventual oneração do credor com relação às despesas necessárias ao procedimento de repactuação, as quais poderão ser incluídas na sucumbência em ação de procedência.
Recebo a inicial com base na tutela legal prevista na Lei 14.181/21, tendo em vista que a causa de pedir noticiando o superendividamento do consumidor.
DA PROFISSÃO EXERCIDA: MILITAR
A Medida Provisória 2.215-10/2001 dispõe sobre a reestruturação da remuneração dos militares das Forças Armadas e dá outras providências, prevendo em seu artigo 14, § 3º regra específica sobre o percentual de desconto na remuneração ou proventos dos militares, trazendo a possibilidade de todos os descontos efetuados pelos bancos no contracheque, não ultrapassarem o limite legal de 70% (setenta por cento).
Posteriormente à mencionada medida provisória, foi promulgada a Lei n. 10.820/2003, trazendo o patamar dos descontos em folha de pagamento ao montante de 35% (trinta e cinco por cento). Cabe destacar que, nos termos do Art. 1º, §1º da Lei 10.820/2003, dentre o limite de 35% estipulado para o desconto em folha de pagamento, 5% (cinco por cento) devem ser destinados exclusivamente para a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
Ressalvo que, tais limites restaram alterados, acrescendo-se 5% aos percentuais máximos para contratação até então estipulados, consoante a Lei n. 14.131/20211, a qual converteu a Medida Provisória 1.006/2020, autorizando-se, assim, consignações de até 40% quando existente contratação de cartão de crédito:
Art. 1º Até 31 de dezembro de 2021, o percentual máximo de consignação nas hipóteses previstas no
inciso VI do
caput do art. 115 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991
, no
§ 1º do art. 1º
e no
§ 5º do art. 6º da Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003
, e no
§ 2º do art. 45 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990
, bem como em outras leis que vierem a sucedê-las no tratamento da matéria, será de 40% (quarenta por cento), dos quais 5% (cinco por cento) serão destinados exclusivamente para:
I - amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou
II - utilização com finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
Realizada a observação quanto aos limites, destaco que o conflito aparente destas duas normas já foi enfrentado pela Des. Cristina Teresa Gaulia, no Agravo de Instrumento n.: 0006021-55.2021.8.19.0000, 5ª Câmara Cível TJ/RJ, j. 27.04.2021,
in verbis:
Como medida prática a evitar que o consumidor seja submetido a situações constrangedoras e iníquas, são frequentes as decisões com base na Lei 10.820/2003, que regula as autorizações de desconto em folha para empregados celetistas, aplicada por analogia aos servidores públicos, em razão do art. 2o, VIII da referida lei3 mencionar a expressão “vencimentos” e “soldos”, o que representa a verba recebida pelo servidor público e militar respectivamente, sendo o último caso aplicável à autora. (...)
Conclui-se, por conseguinte, que o total dos descontos nos vencimentos da autora decorrentes dos empréstimos por ela contratados, não deve ultrapassar o patamar de 30% sobre seu soldo bruto, afastando-se portanto a aplicação da Medida Provisória no 2215-10/2001, utilizada como fundamento para autorizar descontos em patamares de até 70%.
Nessa senda, necessário fazer-se um diálogo de fontes em favor do consumidor vulnerável, pena de remetê-lo a uma espécie de morte civil, eis que sem crédito não sobrevive o homo economicus na contemporânea sociedade globalizada e financeirizada.
Ainda sobre este julgado, as professoras Dra. Cláudia Lima Marques e Dra. Andréia F. Almeida Rangel, publicaram na Revista de Direito do Consumidor n. 138 um comentário sobre esta decisão, intitulado "
O superendividamento do militar das Forças Armadas: inaplicabilidade da MP 2.215-10/2001 – Comentário ao Agravo de Instrumento no: 0006021-55.2021.8.19.0000"
, onde as mesmas afirmam que:
(...) julgado proferido traz a vanguarda da proteção do consumidor superendividado, encontra abrigo na recente Lei 14.181/2021 e representa um posicionamento de alicerce na dignidade da pessoa humana, uma vez que garantiu ao jurisdicionado o seu mínimo existencial.
A menção à Lei 14.181/2021 no trabalho acima, traz à baila o recente diploma legal, o qual foi promulgado com a finalidade de prevenir e tratar o consumidor superendividado.
DA FASE CONCILIATÓRIA:
Observado que a fase conciliatória não ocorreu anteriormente ao ajuizamento da ação, SUSPENDO o feito após o cumprimento da tutela de urgência deferida, se deferida, para DETERMINAR a remessa dos autos ao
CEJUSC
, para realização de audiência de conciliação, fase obrigatória da Lei 14.181/21, artigo 104-A.
Registro que, de fato, a fase consensual do procedimento é compulsória e prévia, de acordo com o artigo 104-A do CDC.
Excepcionalmente, evidenciada a necessidade, este Juízo tem analisado a tutela de urgência como forma de assegurar a preservação do mínimo existencial.
Por essa razão, consigno que
É OBRIGATÓRIA A PRESENÇA DO CONSUMIDOR
NA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO/MEDIAÇÃO
, pela aplicação do princípio da cooperação, porque fase compulsória do procedimento,
sob pena de reapreciação da tutela de urgência,
uma vez que esta se submete ao "
condicionamento de seu efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento
" (art. 104-A,§ 4.º, IV, do CDC).
A ausência deverá ser justificada comprovadamente e
de forma prévia
ao ato, salvo situação excepcional a ser apreciada.
A AUSÊNCIA INJUSTIFICADA DA PARTE AUTORA IMPORTARÁ NA REVOGAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA.
Outrossim, FICAM OS CREDORES ADVERTIDOS, desde já, que a
ausência injustificada
, bem como o
comparecimento do representante do credor
sem poderes reais e plenos para transigir
ou, ainda,
a
falta de proposta ou de proposta inviável dos credores
, contrariam a finalidade da norma e podem autorizar a aplicação de sanção, em especial e por analogia, do art. 104-A, § 2.º, do CDC, nos termos dos Enunciados n. 36
1
, n. 37
2
, n.º38
3
e n. 39
4
todos do FONAMEC (Fórum Nacional da Mediação e Conciliação).
Para composição, saliento às partes que:
1) A modificação da forma de pagamento pactuada no acordo, com a previsão de desconto em conta-corrente de débitos que foram contratados de forma originária mediante
pagamento por consignação em folha de pagamento
, altera o equilíbrio da relação originariamente pactuada, ante a possibilidade da incidência do Tema 1085 do STJ.
No entanto,
com a concordância expressa o consumidor
, na ausência de margem consignável em folha de pagamento, fica autorizado, TEMPORARIAMENTE, o pagamento mediante desconto em conta-corrente, desde que mantida a natureza da obrigação originária.
2) A pactuação deve observar as informações trazidas pela parte demandante no
plano preliminar
apresentado (
e que deve ser apresentado, OBRIGATORIAMENTE, antes da realização da audiência
), especialmente, a parcela disponível para pagamento dos credores, observado o mínimo existencial.
Eventual modificação nas possibilidades do requerente deverá ser justificada nos autos, sempre que possível, de forma prévia à audiência, com retificação do plano preliminar
.
Cite-se a parte demandada para comparecer à audiência de conciliação/mediação.
Não havendo entendimento, deverá apresentar contestação em 15 dias, contados da data da audiência.
Consigno que, nos termos do CPC, a citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando.
Ainda de acordo com o diploma legal as empresas privadas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por esse meio.
Ante a ausência de confirmação, no prazo de até 3 (três) dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, expeça-se Carta AR de citação pelo correio, nos termos do art. 246, §1°-A.
Tendo em vista que se considera ato atentatório à dignidade da justiça, passível de multa de até 5% (cinco por cento) do valor da causa, deixar de confirmar no prazo legal, sem justa causa, o recebimento da citação recebida por meio eletrônico, o réu deverá justificar a falta de confirmação no prazo da contestação.
DA TUTELA DE URGÊNCIA
Consoante determina a Lei 14.181/21, a audiência de conciliação é fase obrigatória, nos termos do artigo 104-A, tratando-se do primeiro ato a ser realizado.
Nada impede
, todavia, que o pedido de tutela de urgência possa ser apreciado tão logo distribuída a ação, até porque, a fase consensual é requisito para a fase de mérito, e não para a fase de cognição sumária.
Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU A LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR VIOLAÇÃO AO ART. 489, §1º, III, DO CPC: A decisão agravada apresenta fundamentos que são coerentes e se conectam diretamente com o caso concreto, observando suas particularidades, de modo que não há nulidade a ser reconhecida. POSSIBILIDADE DO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTES DA AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA: Uma vez instaurado o processo, não há obstáculo legal ao deferimento da tutelas antecipatória que, no caso concreto, se deu como meio de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional e a proteção do consumidor em situação de superendividamento (...). AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50725947720248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto José Ludwig, Julgado em: 18-03-2024)
Na lição de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:
"(...) Toda e qualquer providência capaz de alcançar um resultado prático à parte pode ser antecipada. Vale dizer: o pedido de tutela de urgência - satisfativa ou cautelar - não está limitado à proteção de apenas determinadas situações substanciais. A atipicidade da tutela de urgência, como da tutela jurisdicional geral, está ligada à necessidade de se oferecer uma cobertura o mais completa possível às situações substanciais carentes de proteção (...)".
11
Outrossim, incidente o artigo 318 do Código de Processo Civil a autorizar a prestação jurisdicional de cognição sumária no procedimento especial instaurado para tratamento do superendividamento, como forma de
assegurar o resultado útil do processo e a preservação do mínimo existencial
:
Art.318: Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei.
Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução.
Assim,
entendo pela possibilidade de análise do pedido de tutela antes da realização da audiência de conciliação
, o que passo a fazer, conforme fundamentação supra:
DO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE - DECRETO 11.567/2023
A leitura do Decreto n. 11.567, de 19 de junho de 2023, confrontou o superprincípio da dignidade da pessoa, cuja função precípua era conferir-lhe unidade material.
12
Nessa senda, o princípio da dignidade atua como fundamento à proteção do consumidor superendividado e criador do direito ao mínimo existencial, cuja previsão infraconstitucional foi sedimentada pelo Poder Legislativo na Lei n.14.181/21, que atualizou o Código de Defesa do Consumidor, instalando um microssistema de crédito ao consumo.
Para além da redação do regulamento determinado no Código do Consumidor atualizado, artigo 6
o
, XI, a eficácia horizontal direta dos direitos fundamentais nas relações privadas para a preservação da dignidade da pessoa era avanço doutrinário e jurisprudencial pátrios já reconhecidos, a partir da previsão do art. 5
o
, parágrafo 1
o
da CF/88.
13
A respeito da vigência do Decreto em apreço, duas demandas pendem de julgamento no STF, respectivamente, a ADPF 1.005 e a ADPF 1.006, sob o fundamento da inconstitucionalidade do conteúdo, cuja fundamentação encontra coro na doutrina brasileira e Notas Técnicas elaboradas pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor(Brasilcon), firmada pelo seu diretor-presidente (membro do Ministério Público e professor) Fernando Rodrigues Martins, e do Instituto de Defesa Coletiva, de Belo Horizonte, respectivamente publicadas em 27/7/2022 e 29/7/2022. Afinal, a garantia de R$ 600,00 (seiscentos reais) a qualquer família brasileira, sem considerar a situação sócio-econômica e individualizar as necessidades que comportam as despesas básicas de sobrevivência não representa interpretação harmônica com os valores constitucionais.
Além disso, a lei n. 14. 181/2021 padece de conceito de mínimo existencial, que é um termo indeterminado e amplo, sem regulamentação.
Portanto, passo à análise do caso concreto,
sem incidência do Decreto n.11.567/2023, em controle difuso de constitucionalidade.
CASO CONCRETO
De acordo com os documentos apresentados pela parte demandante (
evento 1, OUT5
e
evento 1, CHEQ29
/
evento 1, CHEQ34
), entendo que o requerimento de tutela de urgência merece acolhimento, pois a
demora no recebimento da citação
e consequente
espera na designação de audiência de conciliação
não pode atuar em prejuízo à parte demandante.
Além disso, os argumentos expostos pela parte autora (analisados em conjunto com a prova documental) revelam-se coerentes e, em sede de cognição sumária, demonstram a probabilidade do direito afirmado, pois a continuidade dos descontos,
na proporção efetuada atualmente
prejudica a sua própria subsistência, conforme demonstro a seguir:
Dos descontos em folha de pagamento e conta-corrente
Conforme os documentos anexados, observo que a parte demandante contratou empréstimos com modalidade de pagamento mediante desconto direto em folha de pagamento, bem como em conta-corrente, (
evento 1, OUT5
e
evento 1, CHEQ29
/
evento 1, CHEQ34
).
A Lei n. 10.820/2003 trouxe o patamar dos
descontos em folha de pagamento ao montante de 35% (trinta e cinco por cento)
. Cabe destacar que, nos termos do Art. 1º, §1º da Lei 10.820/2003, dentre o limite de 35% (trinta e cinco por cento) estipulado para o desconto em folha de pagamento, 5% (cinco por cento) deveriam ser destinados exclusivamente para a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
Tais limites restaram alterados, acrescendo-se 5% aos percentuais máximos para contratação até então estipulados, consoante a Lei n. 14.131/2021
1
, a qual converteu a Medida Provisória 1.006/2020, autorizando-se, assim,
consignações de até 40%
quando existente contratação de cartão de crédito:
Art. 1º Até 31 de dezembro de 2021, o percentual máximo de consignação nas hipóteses previstas no
inciso VI do
caput do art. 115 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991
, no
§ 1º do art. 1º
e no
§ 5º do art. 6º da Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003
, e no
§ 2º do art. 45 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990
, bem como em outras leis que vierem a sucedê-las no tratamento da matéria, será de 40% (quarenta por cento), dos quais 5% (cinco por cento) serão destinados exclusivamente para:
I - amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou
II - utilização com finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
DA NÃO INCIDÊNCIA DO TEMA 1085 DO STJ:
Não desconheço que os descontos em conta bancária de titularidade do consumidor decorrem de cláusula contratual pactuada de forma voluntária, tampouco da formação da tese repetitiva n. 1085 pelo Superior Tribunal de Justiça, com reconhecimento da ausência de analogia capaz de limitar o percentual de desconto em conta-corrente preponderando a autonomia da vontade das partes.
Contudo, o suporte fático descrito não apresenta, salvo melhor juízo, identidade de fundamentos com aquele que motivou a formação da tese repetitiva em comento, porquanto evidenciado que a globalidade das obrigações existentes apresentam como pano de fundo o superendividamento do consumidor, comprometendo o mínimo existencial, direito básico tutelado pelo artigo 6
o
, XI e XII, ambos do Código de Defesa do Consumidor, como outrora tivemos a oportunidade de diferenciar:
“A tese repetitiva proferida pelo STJ foi ao encontro da teoria dos contratos, no berço da autonomia da vontade, na
pacta sunt servanda
, aplicando todo o arcabouço de uma relação contratual sadia, celebrada e executada dentro da normalidade, sem patologia ou necessidade especial das partes envolvidas; é o desconto de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente de correntistas/consumidores saudáveis, os quais se encontram em condições de manter o pagamento das suas contas básicas, como luz, água e alimentação.
Situação diametralmente oposta são dos correntistas/consumidores superendividados, que buscam no Poder Judiciário a reorganização dos descontos efetuados tanto no contracheque como na conta-corrente sob o fundamento do excesso de descontos em detrimento da preservação do mínimo existencial. Neste cenário vem demonstrados descontos acima do limite legal e extrato bancário com saldo negativo, pois todo o valor líquido depositado em sua conta-corrente está sendo utilizado para pagamento de empréstimos bancários comuns, juros do cheque especial, seguro, entre outros. Nas hipóteses relatadas, verifica-se a diversidade do suporte fático daquele submetido à apreciação no julgado que ensejou a formação do convencimento na tese repetitiva nº. 1085, uma vez que não se estava diante de consumidor superendividado, sujeito destinatário da norma que introduziu no país a concreção da dignidade da pessoa com a preservação do mínimo existencial. Aliás, insta destacar, mínimo existencial já assegurado na fase da formação do contrato, quando da análise da capacidade de reembolso pelo concedente de crédito, de acordo com a inteligência do artigo 54-D do Código atualizado. Daí a interpretação sobre a necessidade de limitação dos descontos em conta-corrente quando evidenciada situação de superendividamento do consumidor.” (
A repactuação de dívidas do consumidor superendividado e os descontos bancários em conta-corrente, BERTONCELLO, Káren R. D.; RANGEL, Andréia Fernandes de Almeida. Extrato texto encaminhado para publicação no CONJUR, novembro/2022)
Na linha do entendimento que firmo, pertinentes as palavras da respeitável Desembargadora Carmem Maria Azambuja Farias, quando do julgamento do Agravo de Instrumento Nº 5308681-48.2024.8.21.7000/RS, relacionado a caso similar:
A tese do Tema 1.085 do STJ, invocada pelo agravante, refere-se a uma situação jurídica diversa, não aplicável ao caso de superendividamento regulado pela Lei nº 14.181/2021, que possui disposições específicas para proteção do consumidor nesta condição. A decisão agravada observou corretamente que o caso dos autos não se enquadra nos critérios do Tema 1.085, justificando, portanto, a limitação dos descontos de forma abrangente.
Ressalvada a questão sobre os percentuais a serem utilizados como balizadores e não aplicação do Tema 1085 do STJ, saliento que, ainda que respeitados os limites individuais das modalidades acima destacadas,
o conjunto dos descontos ultrapassa 50% da remuneração disponível
.
Daí porque, necessária a limitação, fins de possibilitar a reestruturação financeira da parte demandante.
Destaco que, a parte reservada ao pagamento das despesas de subsistência encontra identificação na proteção do mínimo existencial, enquanto direito fundamental social de defesa originário do princípio da dignidade da pessoa humana, assegurado na Constituição Federal, art. 1º, inciso III; e no Código de Defesa do Consumidor, artigo 6º, XII,
in verbis:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
Como tal, o direito fundamental ao mínimo existencial independe de atuação legislativa, uma vez que revestido de eficácia imediata, consoante vasta doutrina de Ingo Wolfgang Sarlet.
Consoante bem delineado pelo douto Desembargador Aymoré Roque Pottes de Mello, quando do julgamento de pretensão similar nos autos do Agravo de Instrumento Nº 51630265020218217000, a manutenção dos descontos "
coloca em risco o postulado constitucional da dignidade da pessoa humana e o princípio de garantia do mínimo existencial, materializados na garantia de subsistência do autor-agravante e de sua família, posto que os valores creditados na sua conta-corrente são utilizados
integralmente
para abater as suas dívidas, não havendo sobra de qualquer dinheiro para garantir o seu
mínimo existencial.
(...)".
Nesta linha de entendimento, situa-se a jurisprudência infra ao preservar a dignidade do consumidor mediante o deferimento da limitação dos descontos:
DIREITO DO CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS SOBRE PROVENTOS DO CONSUMIDOR. PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. AGRAVO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão proferida nos autos de ação de repactuação de dívidas, que deferiu parcialmente a tutela de urgência, determinando a limitação dos descontos sobre os comprovados do autor ao percentual máximo de 35%, com acréscimo de 5% para dívidas de cartão de crédito, sob pena de multa, bem como a abstenção de inscrição em cadastros de inadimplentes e protesto de títulos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é permitido a limitação dos descontos incidentes sobre os comprovados do consumidor superendividado, incluindo descontos automáticos em conta-corrente, garantindo o mínimo existencial; (ii) avaliar a razoabilidade da multa cominatória aplicada para garantir o cumprimento da tutela de urgência. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A decisão agravada observa os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial, previstos no art. 1º, III, da CF/1988, e assegurados pelo art. 6º, inciso XII, do Código de Defesa do Consumidor, com as alterações introduzidas pela Lei nº 14.181/2021 (Lei do Superendividamento). 4. A redução dos descontos em 35% dos rendimentos líquidos do consumidor, acrescidos de 5% para dívidas de cartão de crédito, está em conformidade com a exclusão consolidada e tem por objetivo resguardar a subsistência do consumidor em situação de superendividamento. 5. O suporte fático do caso, caracterizado pelo comprometimento substancial da renda da parte agravada, não guarda com o tema relação com Tema 1.085 do STJ, que trata da liberdade contratual em descontos em conta-corrente, aplicável a consumidores em condições regulares, não a superendividados. 6. A multa cominatória no valor de R$ 500,00 por desconto indevido, limitada ao valor da dívida, é adequada e proporcional, obrigando o cumprimento da decisão judicial sem configurar enriquecimento ilícito. 7. A proteção ao mínimo existencial, fundamentada na preservação da dignidade da pessoa humana, justifica a restrição abrangente dos descontos, inclusive para descontos automáticos em conta-corrente, conforme precedentes do TJRS e STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento : 1. A redução de descontos a 35% dos rendimentos líquidos, com acréscimo de 5% para dívidas de cartão de crédito, é aplicável às obrigações financeiras que comprometam a subsistência do consumidor superendividado, abrangendo descontos automáticos em conta-corrente. 2. A fixação de multa cominatória é válida, proporcional e visa garantir a efetividade da tutela judicial para resguardar o mínimo existencial do consumidor. Dispositivos relevantes citados : CF/1988, art. 1º, III; CDC, art. 6º, XII; PCC, arts. 300, 537 e 932, VIII; Lei nº 10.820/2003; Lei nº 14.181/2021. Jurisprudência relevante relevante : TJRS, Agravo de Instrumento nº 51553675320228217000, Rel. Des. Aimoré Roque Pottes de Mello, j. 24-03-2023; TJRS, Agravo de Instrumento nº 53445082320248217000, Rel. Des. Roberto José Ludwig, j. 25-11-2024; TJRS, Agravo de Instrumento nº 52789259120248217000, Rel. Des. Carla Patrícia Boschetti Marcon, j. 13-11-2024. (Agravo de Instrumento, Nº 53086814820248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carmem Maria Azambuja Farias, Julgado em: 16-01-2025)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU A LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM TUTELA DE URGÊNCIA. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA: A decisão agravada se valeu das disposições da Lei nº 10.820/2003 e da Lei nº 14.131/2021 para fundamentar que a ocorrência de descontos em patamar superior a 35% da renda do consumidor comprometeria o seu mínimo existencial. Esse critério vem sendo aceito por esta Câmara no âmbito das ações de repactuação de dívidas, pelo que está presente a probabilidade do direito e a urgência para justificar a concessão da medida. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DA MEDIDA: A multa tem caráter coercitivo, incidindo em razão do descumprimento da medida pelo destinatário da ordem. Dessa forma, falar em desnecessidade é desvirtuar o objetivo da previsão legal, que é se adiantar a eventual descumprimento e, sob pena de incidência de multa, obrigar o demandado ao cumprimento da obrigação imposta. No caso, a multa foi arbitrada pelo juízo de origem de forma adequada, tanto no valor, quanto na periodicidade. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.(Agravo de Instrumento, Nº 50280125520258217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto José Ludwig, Julgado em: 13-02-2025)
Em vista disso, com base no artigo 300, do Código de Processo Civil
DEFIRO parcialmente a tutela de urgência
a fim de determinar que:
a) A parte
ré LIMITE
os descontos relativos a todos os empréstimos consignados com desconto em folha de pagamento e empréstimos não consignados com débito automático na conta-corrente da parte autora ao percentual máximo de
35% dos proventos desta (abatidos os valores da previdência, IRPF e pensão alimentícia)
,
percentual que pode ser acrescido de
5%, em se tratando de dívida de cartão de crédito cujo pagamento decorre de débito em conta
;
dividindo-se o percentual de forma igualitária entre todos os credores demandados até elaboração do plano de pagamento ao final do processo;
b) No caso em discussão, pelas razões já expostas,
esta limitação também se aplica aos descontos no cheque especial
, dividindo-se o percentual entre todos os credores demandados até elaboração do plano de pagamento ao final do processo.
c) Outrossim, DETERMINO que o (os) credor (res) se
abstenha(m) de incluir a parte autora nos cadastros restritivos de crédito ou emitir títulos para fins de protesto
, enquanto pendente a lide. Caso já o tenham feito, seja SUSPENSO o efeito da restrição.
A esse respeito, a determinação não se aplica ao Sistema de Informações de Crédito do Banco Central - SCR, o qual, conforme a Resolução CMN n° 5.037 de 29/9/2022, em seu artigo 2º, possui duas finalidades:
Art. 2º O SCR é administrado pelo Banco Central do Brasil e tem por finalidades:
I - prover informações ao Banco Central do Brasil, para fins de monitoramento do crédito no sistema financeiro e para o exercício de suas atividades de fiscalização; e
II - propiciar o intercâmbio de informações entre instituições financeiras e entre demais entidades, conforme definido no art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, sobre o montante de responsabilidades de clientes em operações de crédito.
Conforme destacou a respeitável Ministra Maria Isabel Gallotti, quando do julgamento do Recurso Especial Nº 1.365.284 - SC (2011/0263949-3), ambas as finalidades do sistema dizem com interesse público:
(...) o interesse público primário, direto, imediato, de viabilizar a supervisão do Sistema Financeiro pelo Banco Central (inciso I do art 2º da Resolução 3658/2008) e o interesse público indireto, consistente em detectar e evitar operações financeiras arriscadas, causadoras de risco bancário sistêmico, protegendo os recursos depositados, tudo consultando o interesse do consumidor bom pagador de obter melhores taxas de juros (inciso II) do art 2º da Resolução 3658/2008 (...)".
Observadas as finalidades supra e considerando as disposições sobre a prevenção do superendividamento trazidas pela Lei 14.181/21, entendo que se trata de ferramenta protetiva, em verdade, que auxilia no controle da concessão de crédito sem capacidade de reembolso, evitando o agravamento da situação do superendividamento da parte consumidora.
Atua como ferramenta consultiva de relevância, visando ao controle das operações de crédito existentes e comprometimento de renda, evitando a concessão de crédito desmedida, penalizada pela legislação protetiva:
Art. 54-D. Na oferta de crédito, previamente à contratação, o fornecedor ou o intermediário deverá, entre outras condutas:
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
(...)
II - avaliar, de forma responsável, as condições de crédito do consumidor, mediante análise das informações disponíveis em bancos de dados de proteção ao crédito, observado o disposto neste Código e na legislação sobre proteção de dados;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
(...)
Parágrafo único. O descumprimento de qualquer dos deveres previstos no caput deste artigo e nos arts. 52 e 54-C deste Código poderá acarretar judicialmente a redução dos juros, dos encargos ou de qualquer acréscimo ao principal e a dilação do prazo de pagamento previsto no contrato original, conforme a gravidade da conduta do fornecedor e as possibilidades financeiras do consumidor, sem prejuízo de outras sanções e de indenização por perdas e danos, patrimoniais e morais, ao consumidor.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
Sobre a importância das informações disponibilizadas pelo sistema SCR, ponderou referida Ministra:
Trata-se, como visto, de cadastro público, de consulta restrita, necessário à atividade do BACEN, o qual ficaria seriamente comprometido com sua equiparação à regência legal e jurisprudencial dos cadastros de inadimplentes e mesmo de centrais de risco de crédito privadas.
Não pode, portanto, ser considerado como cadastro restritivo comum, exigindo tratamento diferenciado dos demais cadastros de inadimplentes como SPC e Serasa.
Dessa forma, a exclusão dos dados em relação aos débitos em repactuação não se aplica ao sistema SCR do Banco Central.
ADVIRTO, TAMBÉM a ambas as partes:
1. A tutela de urgência compreende, em cognição sumária, o restabelecimento do mínimo existencial ao consumidor que detem descontos em folha e/ou conta-corrente em percentuais que comprometam sua sobrevivência, na forma da fundamentação supra.
Daí por que NÃO
abrange eventuais obrigações pendentes, cujo pagamento deva ser efetuado mediante boleto bancário ou outra forma de pagamento voluntária.
2. Em preservação à cooperação das partes e boa-fé dos contrantes,
NÃO
podem ser abrangidos na presente repactuação, os
contratos celebrados após o ajuizamento da ação
, em razão da vedação, ao consumidor, da prática de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento, artigo 104-A, § 4º, IV, do CDC.
A esse respeito, pondero que o consumidor que adota tal prática enquadra-se na definição de superendividado ativo, conceito que, conforme a doutrina, pode ser dividido em ativo consciente, assim considerado aquele que agiu com a intenção deliberada de não pagar ou fraudar seu credor (consumidor de má-fé), ou, ativo inconsciente, o qual, ou age de forma impulsiva ou sem formular o cálculo correto no momento da contratação de novas dívidas (consumidor imprevidente e sem malícia).
1
3. Fica a parte demandada, ainda, ADVERTIDA de que
a concessão irresponsável de crédito após o ajuizamento da presente ação
, será igualmente valorada na decisão final, acarretando, inclusive, a aplicação das penalidades definidas pela lei.
4 Ademais, saliento que a presente decisão
NÃO
abrange
contratos com garantia real e/ou alienação fiduciária
, visto que não apresentam identidade com os pressupostos contidos no artigo 54-A do CDC.
5. Ainda,
INDEFIRO
a
suspensão indiscriminada de ações ou atos de constrição patrimonial
, ante a impossibilidade de determinação genérica e desprovida de fundamentação.
6. Fica a parte demandada CIENTIFICADA sobre a impossibilidade de proceder a cobranças
de forma abusiva
, bem como,
PRATICAR CONDUTAS
que importem no agravamento da situação de superendividamento da parte demandante.
7. Por fim, fica a parte demandante CIENTIFICADA sobre a
vedação da prática de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento
, sob pena de REVOGAÇÃO DA TUTELA PARCIAL AQUI DEFERIDA.
DO CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL
O DESCUMPRIMENTO desta decisão judicial importará incidência de multa de R$ 500,00 por cada desconto indevido até o limite da dívida pendente. Saliento que a presente decisão, deverá ser cumprida no prazo máximo de 30 dias. A data inicial de contagem do prazo do descumprimento iniciará do protocolo de entrega do ofício/despacho.
Esta decisão vale como ofício, que deverá ser encaminhado pela parte autora de forma pessoal aos credores réus, fins de atender a exigência da Súmula 410 do STJ.
DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Ficam os credores réus intimados a juntar aos autos cópia dos contratos firmados entre as partes e
extratos bancários em formato XLS
, em face da inversão do ônus da prova em favor da parte autora que, desde já determino, nos termos do disposto no artigo 6°, inciso VIII do CDC.
DO MÍNIMO EXISTENCIAL E DA INDICAÇÃO DAS DESPESAS DE SUBSISTÊNCIA
Oriento a parte demandante sobre a
importância da descrição da quantia a ser reservada ao mínimo existencial
e demonstração,
de forma documental e discriminada
, especialmente com relação às despesas de sobrevivência, fins de possibilitar a elaboração de plano de pagamento viável.
Assim,
deverá trazer aos autos
, se ainda não o fez, os comprovantes das despesas de subsistência (alimentação, luz, água, etc.), tendo em vista que serão objeto de análise quando da segunda fase do procedimento. Quando da nomeação do administrador,
deverá apresentar
os comprovantes de rendimentos atualizados.
Consigno que, a omissão da parte demandante quanto à comprovação das despesas de sobrevivência e apresentação dos documentos necessários influirá no plano de pagamento a ser elaborado pelo administrador judicial.
Tratando-se de Juízo 100% Digital e em atenção aos princípios da celeridade e eficiência, as respostas remetidas por carta não serão anexadas ao processo.
Por fim, cabe ressaltar que o sistema E-proc disponibiliza, no menu principal, a opção substabelecimento com reserva ou sem reserva, viabilizando ao procurador a atualização do cadastro de advogados, para recebimento de intimações,
sendo de responsabilidade do procurador tal gerenciamento e cadastro dos profissionais
, na forma do art. 2º da Lei 11.419/2006.
Sendo a parte Entidade, a retificação/alteração dos procuradores cabe apenas à própria, em atualização cadastral, ou ao procurador.
Para maiores informações sobre o rito da Lei n. 14.181/2021, destaco a leitura da Cartilha sobre Superendividamento do Conselho Nacional de Justiça -
CARTILHA SOBRE O TRATAMENTO DO SUPERENDIVIDAMENTO DO CONSUMIDOR
4.
Adiante, registro que o relator está autorizado a não conhecer e a julgar monocraticamente o recurso quando houver jurisprudência dominante sobre a matéria em discussão, seja no âmbito do STF, do STJ e mesmo do próprio Tribunal de Justiça. A este respeito, o art. 932, incisos III e VIII, do CPC dispõem:
"Art. 932. Incumbe ao relator:
(...)
III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida;
(...)
VIII - exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal.".
E no que respeita ao julgamento de mérito, monocraticamente, o Regimento Interno do Tribunal prevê em seu art. 206, XXXVI:
"Art. 206. Compete ao Relator:
(...)
XXXVI - negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca do tema no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça com relação, respectivamente, às matérias constitucional e infraconstitucional e deste Tribunal;".
Ainda neste sentido, o STJ editou a Súmula n° 568 e consolidou a possibilidade de julgamento monocrático quando a matéria em debate está consolidada na jurisprudência, como se vê:
"
Súmula 568.
O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.".
Passo ao exame do recurso, monocraticamente.
5. PRELIMINAR.
A principal premissa do Agravante, de que a decisão de primeiro grau teria violado o Tema 1.085 do Superior Tribunal de Justiça, não merece acolhimento. A decisão recorrida, de forma perspicaz e juridicamente fundamentada, estabeleceu a distinção fundamental entre o suporte fático que ensejou a tese repetitiva e a situação de superendividamento que caracteriza o caso concreto.
O Tema 1.085 do STJ, ao considerar lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, mesmo que utilizada para recebimento de salários, e ao afastar a analogia com o limite dos consignados, refere-se a uma
relação contratual sadia, celebrada e executada dentro da normalidade, sem patologia ou necessidade especial das partes envolvidas
, ou seja, "
o desconto de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente de correntistas/consumidores saudáveis, os quais se encontram em condições de manter o pagamento das suas contas básicas, como luz, água e alimentação
", como muito bem elucidado pela decisão de origem.
Em contrapartida, o cenário de superendividamento, revela uma situação diametralmente oposta, onde os "
correntistas/consumidores superendividados (...) buscam no Poder Judiciário a reorganização dos descontos efetuados tanto no contracheque como na conta-corrente sob o fundamento do excesso de descontos em detrimento da preservação do mínimo existencial
".
Nesta hipótese, o consumidor tem sua subsistência comprometida, com extratos bancários revelando saldo negativo e a integralidade dos valores líquidos sendo consumida pelos pagamentos de empréstimos. A intervenção judicial, nesse contexto, visa salvaguardar o direito ao mínimo existencial, que é a materialização da dignidade da pessoa, e já deveria ter sido objeto de análise responsável por parte do concedente de crédito, conforme o artigo 54-D do Código de Defesa do Consumidor atualizado.
Nesse sentido, a jurisprudência deste Tribunal tem reiteradamente se posicionado pela inaplicabilidade do Tema 1.085 do STJ aos casos de superendividamento, reconhecendo a especificidade da tutela conferida pela Lei nº 14.181/2021. Conforme julgado citado na decisão de origem, em caso similar, a tese do Tema 1.085 do STJ refere-se "
a uma situação jurídica diversa, não aplicável ao caso de superendividamento regulado pela Lei nº 14.181/2021, que possui disposições específicas para proteção do consumidor nesta condição. A decisão agravada observou corretamente que o caso dos autos não se enquadra nos critérios do Tema 1.085, justificando, portanto, a limitação dos descontos de forma abrangente
".
Isso fica evidente na ementa que já integra o acervo de conhecimento do
Projeto de Gestão de Superendividamento
e que o próprio Agravado trouxe à baila na decisão ora atacada:
DIREITO DO CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS SOBRE PROVENTOS DO CONSUMIDOR. PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. AGRAVO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão proferida nos autos de ação de repactuação de dívidas, que deferiu parcialmente a tutela de urgência, determinando a limitação dos descontos sobre os comprovados do autor ao percentual máximo de 35%, com acréscimo de 5% para dívidas de cartão de crédito, sob pena de multa, bem como a abstenção de inscrição em cadastros de inadimplentes e protesto de títulos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é permitido a limitação dos descontos incidentes sobre os comprovados do consumidor superendividado, incluindo descontos automáticos em conta-corrente, garantindo o mínimo existencial; (ii) avaliar a razoabilidade da multa cominatória aplicada para garantir o cumprimento da tutela de urgência. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A decisão agravada observa os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial, previstos no art. 1º, III, da CF/1988, e assegurados pelo art. 6º, inciso XII, do Código de Defesa do Consumidor, com as alterações introduzidas pela Lei nº 14.181/2021 (Lei do Superendividamento). 4. A redução dos descontos em 35% dos rendimentos líquidos do consumidor, acrescidos de 5% para dívidas de cartão de crédito, está em conformidade com a exclusão consolidada e tem por objetivo resguardar a subsistência do consumidor em situação de superendividamento. 5.
O suporte fático do caso, caracterizado pelo comprometimento substancial da renda da parte agravada, não guarda com o tema relação com Tema 1.085 do STJ, que trata da liberdade contratual em descontos em conta-corrente, aplicável a consumidores em condições regulares, não a superendividados.
6. A multa cominatória no valor de R$ 500,00 por desconto indevido, limitada ao valor da dívida, é adequada e proporcional, obrigando o cumprimento da decisão judicial sem configurar enriquecimento ilícito. 7. A proteção ao mínimo existencial, fundamentada na preservação da dignidade da pessoa humana, justifica a restrição abrangente dos descontos, inclusive para descontos automáticos em conta-corrente, conforme precedentes do TJRS e STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento : 1. A redução de descontos a 35% dos rendimentos líquidos, com acréscimo de 5% para dívidas de cartão de crédito, é aplicável às obrigações financeiras que comprometam a subsistência do consumidor superendividado, abrangendo descontos automáticos em conta-corrente. 2. A fixação de multa cominatória é válida, proporcional e visa garantir a efetividade da tutela judicial para resguardar o mínimo existencial do consumidor. Dispositivos relevantes citados : CF/1988, art. 1º, III; CDC, art. 6º, XII; PCC, arts. 300, 537 e 932, VIII; Lei nº 10.820/2003; Lei nº 14.181/2021. Jurisprudência relevante relevante : TJRS, Agravo de Instrumento nº 51553675320228217000, Rel. Des. Aimoré Roque Pottes de Mello, j. 24-03-2023; TJRS, Agravo de Instrumento nº 53445082320248217000, Rel. Des. Roberto José Ludwig, j. 25-11-2024; TJRS, Agravo de Instrumento nº 52789259120248217000, Rel. Des. Carla Patrícia Boschetti Marcon, j. 13-11-2024. (Agravo de Instrumento, Nº 53086814820248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carmem Maria Azambuja Farias, Julgado em: 16-01-2025)
Desse modo, o argumento do Agravante de nulidade da decisão por violação ao Tema 1.085 do STJ é completamente infundado, pois a decisão atacada se baseou em uma correta distinção fática e jurídica, em consonância com o microssistema de proteção ao consumidor superendividado instituído pela Lei nº 14.181/2021.
6. MÉRITO.
6.1 O Agravante insiste que a limitação dos descontos deveria aplicar-se apenas aos empréstimos consignados, nos quais, supostamente, agiu dentro dos limites legais. Contudo, a problemática do superendividamento, que é o cerne da ação originária, não se restringe à regularidade individual de cada contratação, mas sim ao impacto
global
dos descontos na capacidade de subsistência do consumidor.
Especificamente sobre a limitação dos descontos em folha de pagamento e dos lançamentos a débito em conta-corrente, embora exista discussão sobre o teto de endividamento voluntário de servidores públicos estaduais, servidores públicos federais, militares, aposentados e pensionistas do INSS e mesmo os trabalhadores da iniciativa privada, bem como seja suscitada a inexistência de limitação para descontos em folha de pagamento, entendo possível, sob a ótica da prevenção e tratamento de situação de superendividamento, a limitação imposta na decisão recorrida:
a) A parte
ré LIMITE
os descontos relativos a todos os empréstimos consignados com desconto em folha de pagamento e empréstimos não consignados com débito automático na conta-corrente da parte autora ao percentual máximo de
35% dos proventos desta (abatidos os valores da previdência, IRPF e pensão alimentícia)
,
percentual que pode ser acrescido de
5%, em se tratando de dívida de cartão de crédito cujo pagamento decorre de débito em conta;
b) No caso em discussão,
esta limitação também se aplica aos descontos no cheque especial
, dividindo-se o percentual entre todos os credores demandados até elaboração do plano de pagamento ao final do processo.
A jurisprudência do STJ admite, de longa data, a possibilidade de limitação de descontos em conta-corrente como mecanismo de proteção e tratamento do consumidor em situação de superendividamento.
É o que se extrai do julgamento do REsp n° 1.584.501/SP, sob a relatoria do Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
,
no qual a Terceira Turma do STJ, sob fundamentos de proteção de princípios da dignidade da pessoa humana e de garantia do mínimo existencial de devedor em situação de superendividamento afirmou a possibilidade de limitação de descontos realizados em conta-corrente do devedor a 30% da remuneração líquida. O objetivo da limitação é a preservação de valores mínimos para a garantia de subsistência pessoal e familiar, como se vê da ementa do julgado:
"RECURSO ESPECIAL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA. DESCONTO EM CONTA-CORRENTE. POSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO A 30% DA REMUNERAÇÃO DO DEVEDOR. SUPERENDIVIDAMENTO. PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. ASTREINTES. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL VIOLADO. ÓBICE DA SÚMULA 284/STF.
1. Validade da cláusula autorizadora de desconto em conta-corrente para pagamento das prestações do contrato de empréstimo, ainda que se trate de conta utilizada para recebimento de salário.
2. Os descontos, todavia, não podem ultrapassar 30% (trinta porcento) da remuneração líquida percebida pelo devedor, após deduzidos os descontos obrigatórios (Previdência e Imposto de Renda).
3. Preservação do mínimo existencial, em consonância com o princípio da dignidade humana. Doutrina sobre o tema.
4. Precedentes específicos da Terceira e da Quarta Turma do STJ.
5. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO."
(REsp n° 1.584.501/SP, TERCEIRA TURMA, STJ, Relator: Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe: 13/10/2016).
No corpo do voto, o Ministro invocou importantes fundamentos constitucionais para fundamentar a decisão:
"Eminentes colegas, o recurso especial não merece ser provido.
Inicialmente, esclareço que o juízo de admissibilidade do presente recurso será realizado com base nas normas do CPC/1973, por ser a lei processual vigente na data de publicação do decisum ora impugnado (cf. Enunciado Administrativo n. 2/STJ).
Relatam os autos que a parte demandante, ora recorrida, pactuou com o banco ora recorrente uma confissão e renegociação de dívida no valor de R$ 122.209,21, na modalidade empréstimo consignado, a ser quitado mediante o desconto de 72 parcelas mensais no valor de R$ 1.697,35 (cf. fls. 16/20). Esse montante, contudo, equivale à quase totalidade dos proventos de aposentadoria percebidos pela ora recorrida, no valor de R$ 1.673,91 (cf. fl. 22), nada lhe restando para garantir a subsistência.
Ante esse fato, a ora recorrida ajuizou ação de revisão contratual, pretendendo a limitação dos descontos a 30% de seus proventos líquidos, dentre outros pedidos. O pedido de limitação dos descontos foi julgado procedente pelo juízo a quo, em sentença mantida pelo Tribunal de origem. Daí a interposição do presente recurso especial, em que o banco pretende, essencialmente, o restabelecimento do valor integral dos descontos.
A questão devolvida ao conhecimento desta instância especial deve ser abordada à luz do princípio da dignidade da pessoa humana, relacionando-se com o fenômeno do superendividamento, que tem sido uma preocupação atual do Direito do Consumidor em todo o mundo, decorrente da imensa facilidade de acesso ao crédito nos dias de hoje.
CLÁUDIA LIMA MARQUES, em seu Contratos no Código de Defesa do Consumidor ( São Paulo: Ed. RT, 2002. pp. 590-591), ao tecer considerações acerca da oferta em massa de produtos e serviços diante da hipossuficiência do consumidor, refere: "Uma vontade protegida pelo direito, vontade liberta das pressões e dos desejos impostos pela publicidade e por outros métodos agressivos de venda, em suma, uma vontade racional. Não há como negar que o consumo massificado de hoje, pós-industrial, está ligado faticamente a uma série de perigos para o consumidor, vale lembrar os fenômenos atuais de superendividamento, de práticas comerciais abusivas, de abusos contratuais, da existência de monopólios naturais dos serviços públicos concedidos ou privatizados, de falhas na concorrência, no mercado, na informação e na liberdade material do contratante mais fraco na elaboração e conclusão dos contratos. Apesar de todos estes perigos e dificuldades, o novo direito contratual visa concretizar a função social dos contratos, impondo parâmetros de transparência e boa-fé.
Alguns sistemas jurídicos já alcançaram soluções legislativas para resolver a situação, como é o caso do Direito francês que já legislou acerca do superendividamento.
Assim, no Code de la consommation (Código do consumo) , artigo L.313-12 está disposto o seguinte: Article L313-12: L'exécution des obligations du débiteur peut être, notamment en cas de licenciement, suspendue par ordonnance du juge d'instance dans les conditions prévues aux articles 1244-1 à 1244-3 du code civil. L'ordonnance peut décider que, durant le délai de grâce, les sommes dues ne produiront point intérêt. En outre, le juge peut déterminer dans son ordonnance les modalités de paiement des sommes qui seront exigibles au terme du délai de suspension, sans que le dernier versement puisse excéder de plus de deux ans le terme initialement prévu pour le remboursement du prêt ; il peut cependant surseoir à statuer sur ces modalités jusqu'au terme du délai de suspension.
A execução do devedor pode, em particular, em caso de demissão, ser suspensa por ordem do juiz, nas condições previstas nos artigos 1244-1 a 1244-3 do Código Civil. A ordem pode decidir que, durante o período de graça, os valores devidos não terão juros cobrados. Além disso, o juiz pode determinar a seu modo as condições de pagamento dos montantes que serão devidos no final do período de suspensão, o pagamento final não pode exceder mais de dois anos o prazo inicialmente previsto para o reembolso do empréstimo e pode, contudo, ser adiado neste ponto dependendo da decisão sobre estes termos, até que o fim do período de suspensão. (tradução livre de autoria de Francelize Alves Morking, contida no artigo intitulado "O reconhecimento das diferenças na materialização de direitos fundamentais com relação aos direitos do consumidor superendividado", publicado na Revista Paradigma, Ribeirão Preto-SP, ano XIX, n. 23, p. 17/40, jan./dez. 2014)
E, nos artigos 1244-1 ao 1244-3 do Code Civil , concede-se um período para que o devedor possa solver suas obrigações, podendo o julgador, diante das peculiaridades do caso concreto, conceder uma moratória com prazo de dois anos; período em que estarão suspensas as execuções contra o devedor, consoante o artigo 1244-3 do Code Civil, conforme explicita JOSÉ REINALDO DE LIMA LOPES, in Crédito ao consumidor e superendividamento – uma problemática geral, Revista do Direito do Consumidor nº 17, janeiro/ março de 1996, São Paulo: Ed. RT., p.60.
No Brasil, está em tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n. 3.515/2015 (oriundo do Projeto de Lei do Senado n. 283/2012), dispondo acerca do superendividamento do consumidor e prevendo medidas judiciais para garantir o mínimo existencial ao consumidor endividado."
Nesta Corte estadual, também está consolidada a orientação de que possível a limitação de descontos em folha de pagamento e mesmo de débito em conta-corrente, como se vê dos seguintes julgados:
"APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS DAS PARCELAS DOS CONTRATOS. DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO.
- Consoante entendimento do STJ, os descontos em folha de pagamento/conta corrente devem obedecer ao patamar de 30% sobre a remuneração líquida do consumidor, após deduzidos os descontos legais.
- O polo passivo da ação é composto por mais de um banco ou financeira, dessa forma o juízo de origem determinou que "os empréstimos com consignação em folha de pagamento devem ser limitados em 30% da remuneração da parte após os descontos obrigatórios, isto é 961,86, devendo as instituições bancárias providenciar na adequação dos descontos das parcelas, no limite de até 7,5% dos vencimentos brutos do autor, fechando o percentual total de 30%, somados os descontos".
- De acordo com as informações colacionadas, a financeira apelante Crediare não ultrapassa o valor dos descontos em folha de pagamento, conforme estabelecido pelo juízo a quo.
APELO PROVIDO."
(Apelação Cível, Nº 50022065120198210073, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Desª. Ana Paula Dalbosco, Julgado em: 29-06-2021)
"APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE LIMITAÇÃO DE DÉBITOS BANCÁRIOS COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO.
CONFIGURADA HIPÓTESE DE SUPERENDIVIDAMENTO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO DO BANCO EM CONCEDER CRÉDITO DESPROPORCIONAL A CONDIÇÃO DO CLIENTE PARA CUMPRIR AS CONTRATAÇÕES. LIMITAÇÃO A 30% DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
PEDIDO DE INDENIZAÇÃO NÃO ATENDIDO. NÃO CONFIGURADA ABALO MORAL. É CERTO DIZER QUE OS CONTRATOS FORAM FIRMADOS ESPONTANEAMENTE PELA DEMANDANTE.
APELO PROVIDO EM PARTE. UNÂNIME."
(Apelação Cìvel, Nº 5000469-93.2020.8.21.0035/RS, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Desª. Katia Elenise Oliveira da Silva, Julgado em: 23-10-2020) - (grifei)
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO. REVISIONAL. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS. POSSIBILIDADE NO CASO. AUTORA IDOSA E APOSENTADA SEM RENDA EXTRA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA. TUTELA DE URGÊNCIA. REQUISITO DA VEROSSIMILHANÇA.
1. Admissibilidade. O interesse recursal liga-se ao decaimento. Carece de interesse a parte que recorre a fim de obter o que a decisão lhe concedeu. No caso, a decisão determinou que a parte ré apresente os documentos relacionados pela autora na exordial.
2
. Limitação de descontos em conta-corrente. Embora lícito o desconto de valores em conta-corrente, para pagamento de contratos firmados, a supressão em patamar quase integral dos valores recebidos a título de aposentadoria atenta contra a dignidade da pessoa, podendo conduzir a uma condição de penúria.
Caso em que a Autora, idosa e aposentada, aufere aproximadamente um salário mínimo mensal, e teve praticamente todo o benefício descontado para pagamento de mútuo firmado junto às instituições financeiras. Na hipótese, o elemento verossimilhança se mostrou presente. Limitação dos descontos em conta-corrente ao percentual de 30% da remuneração líquida da parte consumidora. Precedentes.
3. Contexto dos autos e princípio da dignidade humana.
AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA EXTENSÃO, PROVIDO."
(Agravo de Instrumento, Nº 70080743396, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Alberto Delgado Neto, Julgado em: 28-05-2019)
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO.
SUSPENSÃO
DE
DESCONTOS
EM CONTA CORRENTE.
SUPERENDIVIDAMENTO
.
Desconto mensal promovido pela instituição financeira agravada em montante que compromete a integralidade dos rendimentos do agravante. Situação de
superendividamento
. Possibilidade de limitação em 30% da renda bruta (e não de simples
suspensão
/cancelamento, como pleiteado), excetuando-se os
descontos
obrigatórios.
Necessidade de assegurar ao devedor, à luz do princípio da dignidade humana, um mínimo existencial.
AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO."
(Agravo de Instrumento, Nº 70076087220, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Desª. Mylene Maria Michel, Julgado em: 07-06-2018) - (grifei)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM PEDIDOS DE REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS, ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA E EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. DESCONTOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS NA FOLHA DE PAGAMENTO E NÃO CONSIGNADOS NA CONTA-CORRENTE BANCÁRIA DO CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO. SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO CARACTERIZADA. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA DEFERIDA EM PARTE PELO JUÍZO
A QUO
, PARA ABRANGER OS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. IRRESIGNAÇÃO RECURSAL DO AUTOR DEVEDOR SUPERENDIVIDADO. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL Nº 14.181/2021 AO CASO CONCRETO. INCLUSÃO CONCERTADA DE DÉBITOS NÃO CONSIGNADOS DO DEVEDOR SUPERENDIVIDADO, A FIM DE PRESERVAR OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA GARANTIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL À SOBREVIVÊNCIA DO CONSUMIDOR EM SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
1.
A PESSOA NATURAL SUPERENDIVIDADA É AQUELA CUJA RENDA MENSAL ESTÁ SEVERAMENTE COMPROMETIDA, A PONTO DE PERDER A CAPACIDADE DE PAGAR AS SUAS DÍVIDAS, COLOCANDO EM RISCO A SUA PRÓPRIA SUBSISTÊNCIA.
2.
EMBORA ADMITIDO O LANÇAMENTO A DÉBITO DIRETO EM CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR SUPERENDIVIDADO, A JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DO TJRS SINALIZAM A NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA GARANTIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL DO DEVEDOR SUPERENDIVIDADO À SUA SUBSISTÊNCIA PRÓPRIA.
3.
CASO CONCRETO EM QUE OS DESCONTOS DE EMPRÉSTIMOS MENSAIS NÃO CONSIGNADOS LANÇADOS NA CONTA-CORRENTE DO SERVIDOR PÚBLICO MILITAR ESTADUAL SUPERENDIVIDADO CONSOMEM TODA A SUA REMUNERAÇÃO MENSAL LÍQUIDA, COMPROMETENDO A SUA DIGNIDADE E SUBSISTÊNCIA PESSOAL E VEDANDO-LHE O ACESSO A VALORES INDISPENSÁVEIS À SUA SOBREVIVÊNCIA. LIMITAÇÃO DOS LANÇAMENTOS A DÉBITO DIRETO DE EMPRÉSTIMOS NÃO CONSIGNADOS NA CONTA-CORRENTE DO AUTOR-AGRAVANTE A 30% DA SUA REMUNERAÇÃO MENSAL LÍQUIDA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA, COM AMPLIAÇÃO DOS SEUS EFEITOS PARA OS DÉBITOS (NÃO CONSIGNADOS).
4.
NESTA MOLDURA, A FARTA PROVA DOCUMENTAL PRODUZIDA NO CADERNO RECURSAL INTEGRADO EVIDENCIA A SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO DO AGRAVANTE, CONFERINDO PROBABILIDADE AO
FUMUS BONIS JURIS
E AO
PERICULUM IN MORA
, COM PERIGO DE DANO DE DIFÍCIL REPARAÇÃO E RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO DE ORIGEM, NAS ALEGAÇÕES DEDUZIDAS NO PROCESSO DE ORIGEM E NESTE RECURSO, QUE DEMONSTRAM, À SACIEDADE, OS DESCONTOS OPERADOS NA SUA CONTA-CORRENTE E COLOCAM EM RISCO A SUA DIGNIDADE, SUBSISTÊNCIA E MANUTENÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL GARANTIDOS NÃO SÓ PELAS CLÁUSULAS GERAIS DE TUTELA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, MAS, TAMBÉM, E MUITO ESPECIALMENTE, COM ALTERAÇÕES QUE LHE INTRODUZIRAM A LEI FEDERAL Nº 14.181/2021, DE 01/07/2021 (DOU DE 02/07/2021).
5.
NO CASO CONCRETO E NO JULGAMENTO CONJUNTO DOS AGRAVOS DE INSTRUMENTO DE INTERESSES CONTRÁRIOS, PORTANTO, IMPENDE NÃO SÓ MANTER A DECISÃO RECORRIDA, MAS TAMBÉM ESTENDER OS SEUS EFEITOS, PARA ABRANGER OS DESCONTOS CONTRATUAIS MENSAIS LANÇADOS A DÉBITO NA CONTA-CORRENTE DO AUTOR-AGRAVANTE A 30% DA SUA REMUNERAÇÃO LÍQUIDA. PRECEDENTES DO STJ E DO TJRS.
6.
A MULTA ARBITRADA NA ORIGEM É ADEQUADA E ATENDE À SUA FINALIDADE PROCESSUAL PREVENTIVA, SENDO DESCABIDA A SUA MAJORAÇÃO. NO CASO CONCRETO, OS SEUS EFEITOS TAMBÉM VÃO ESTENDIDOS AOS LANÇAMENTOS CONTRATUAIS MENSAIS A DÉBITO EM CONTA-CORRENTE.
7. RECURSO PROVIDO EM PARTE.
M/AI 3.934 - S 22.10.2021 – P 37.
(Agravo de Instrumento, Nº 5163026-50.2021.8.21.7000/RS, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Aymoré Roque Pottes de Mello, Julgado em: 29-10-2021)
Desta forma, no caso concreto, é caso de manter a decisão recorrida nos seus exatos termos.
6.2 Passo seguinte, quanto ao mínimo existencial, adianto que entendo inaplicável o disposto no Decreto n° 11.150/2022 e atualizações. O Decreto foi publicado no Diário Oficial da União de 27/07/2022, com vigência a partir de 60 dias contados de sua publicação. O Decreto "
Regulamenta a preservação e o não comprometimento do mínimo existencial para fins de prevenção, tratamento e conciliação de situações de superendividamento em dívidas de consumo, nos termos do disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor".
Os artigos 3º e 4º estabelecem a definição do conceito de mínimo existencial e excluem diversos compromissos financeiros dos consumidores da base de cálculo para o cômputo de seu comprometimento de renda, para fins de reconhecimento de sua situação de superendividamento, respectivamente. Assim definem os citados artigos:
Art. 3º No âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto.
§ 1º A apuração da preservação ou do não comprometimento do mínimo existencial de que trata o caput será realizada considerando a base mensal, por meio da contraposição entre a renda total mensal do consumidor e as parcelas das suas dívidas vencidas e a vencer no mesmo mês.
§ 2º O reajustamento anual do salário mínimo não implicará a atualização do valor de que trata o caput.
§ 3º Compete ao Conselho Monetário Nacional a atualização do valor de que trata o caput.
Art. 4º Não serão computados na aferição da preservação e do não comprometimento do mínimo existencial as dívidas e os limites de créditos não afetos ao consumo.
Parágrafo único. Excluem-se ainda da aferição da preservação e do não comprometimento do mínimo existencial:
I - as parcelas das dívidas:
a) relativas a financiamento e refinanciamento imobiliário;
b) decorrentes de empréstimos e financiamentos com garantias reais;
c) decorrentes de contratos de crédito garantidos por meio de fiança ou com aval;
d) decorrentes de operações de crédito rural;
e) contratadas para o financiamento da atividade empreendedora ou produtiva, inclusive aquelas subsidiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES;
f) anteriormente renegociadas na forma do disposto no
Capítulo V do Título III da Lei nº 8.078, de 1990
;
g) de tributos e despesas condominiais vinculadas a imóveis e móveis de propriedade do consumidor;
h) decorrentes de operação de crédito consignado regido por lei específica; e
i) decorrentes de operações de crédito com antecipação, desconto e cessão, inclusive fiduciária, de saldos financeiros, de créditos e de direitos constituídos ou a constituir, inclusive por meio de endosso ou empenho de títulos ou outros instrumentos representativos;
II - os limites de crédito não utilizados associados a conta de pagamento pós-paga; e
III - os limites disponíveis não utilizados de cheque especial e de linhas de crédito pré-aprovadas."
Posteriormente, em 20/06/2023, foi publicado o Decreto n° 11.567/23 que alterou o art. 3º do Decreto 11.150/22 e aumentou o patamar mínimo considerado como mínimo existencial para R$600,00. Ainda assim, analisando detidamente a redação do Decreto 11.150/22, observo que seu propósito é neutralizar todo o aparato legislativo e o complexo de normas de prevenção, proteção, apoio e tratamento da situação de superendividamento do consumidor, na forma prevista na Lei n° 14.181/2021.
A alteração promovida pela Lei n° 14.181/2021 no Código de Defesa do Consumidor introduziu diversas disposições legais visando a prevenção e o tratamento das situações de superendividamento.
Neste norte, o Código de Defesa do Consumidor ampliou os direitos dos consumidores e, neste ponto, impôs aos fornecedores diversos deveres de cuidados na prestação de serviços e de produtos, visando inibir situações de superendividamento. Também foram diversas as disposições acrescidas ao CDC para o tratamento de situações de superendividamento já consolidadas.
Na contramão das disposições do CDC, o Decreto n° 11.150/22, sob pretexto de regulamentar a preservação da situação de superendividamento e o não comprometimento do mínimo existencial, restringe a aplicação da Lei do Superendividamento, no campo prático, a situações remotas.
Além disso, ao regulamentar a Lei n° 14.181/2021, o faz criando restrições não contempladas na própria lei regulamentada e viola seus princípios norteadores. Dessa forma, sua aplicabilidade está comprometida no caso concreto, pois representa verdadeiro retrocesso aos direitos assegurados pela Lei n° 14.181/2021.
Assim, cito as principais inovações legislativas introduzidas no CDC, de modo a alcançar a prevenção e o tratamento das situações de superendividamento:
Art. 4º
A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
[...]
X - prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
........................................................................................................................................
Art. 6º
São direitos básicos do consumidor:
[...]
XI - a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, por meio da revisão e da repactuação da dívida, entre outras medidas;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
-
A primeira garantia estabelecida pelo inciso XI do art. 6º, retro citado, prevê a prática de crédito responsável, com nítido objetivo de assegurar o mínimo existencial ao consumidor, como forma de prevenção à situação de superendividamento. Neste particular, de modo a que se alcance a concessão de crédito responsável ao segmento de consumidores endividados, é de rigor que se aplique a interpretação mais restritiva e protetiva dos interesses da parte mais vulnerável, exposta aos riscos da situação de superendividamento.
Além do mais, o CDC passou a dispor expressamente sobre prevenção e tratamento de situações de superendividamento em seu art. 54-A:
"Art. 54-A.
Este Capítulo dispõe sobre a prevenção do superendividamento da pessoa natural, sobre o crédito responsável e sobre a educação financeira do consumidor.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 1º
Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021
§
2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 3º
O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
6.3 O agravante sustenta que a decisão não observou o rito próprio estabelecido pela Lei Federal n° 14.181/2021. Refere que a Lei de Superendividamento estabelece a necessidade de prévia fase conciliatória, antes do ajuizamento da ação judicial. Neste sentido, não seria possível o deferimento de decisão judicial, porque necessária a prévia instauração de fase conciliatória extrajudicial.
O recurso não prospera no ponto. A Lei de Superendividamento estabeleceu rito próprio aos processo de repactuação de dívidas, sob fundamento de superendividamento, com a necessidade de instauração de fase conciliatória. Não obstante, a fase conciliatória pode se dar tanto na esfera administrativa, como na esfera judicial. No caso concreto, ao ajuizar a ação sem ter realizado a fase conciliatória de modo extrajudicial, esta fase realiza-se na esfera judicial, sem qualquer óbice. Aliás, o próprio legislador previu a conciliação na via judicial (art. 104-A, do CDC) antes mesmo da conciliação extrajudicial (art. 104-C, do CDC).
O art. 104-A do CDC dispõe que o tratamento de consumidor superendividado poderá se dar pelo processo de repactuação de dívidas, iniciada pela realização de audiência conciliatória, presidida pelo juiz ou por conciliador credenciado, com a participação de todos os credores de dívidas arrolados no art. 54-A do CDC. Nesta ocasião, deverá ser apresentada a proposta de plano de pagamento, que deve observar o prazo máximo de 5 anos, preservar o mínimo existencial do consumidor superendividado e preservar as garantias e as formas de pagamento originalmente contratadas. Além disso, os parágrafos do referido artigo estabelecem efeitos decorrentes do não comparecimento à conciliação, bem como atribuem ao acordo relativo ao plano de pagamento força de título executivo e proteção da coisa julgada. Assim dispõe o referido artigo:
Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.
§ 1º Excluem-se do processo de repactuação as dívidas, ainda que decorrentes de relações de consumo, oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar pagamento, bem como as dívidas provenientes de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 2º O não comparecimento injustificado de qualquer credor, ou de seu procurador com poderes especiais e plenos para transigir, à audiência de conciliação de que trata o caput deste artigo acarretará a suspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dos encargos da mora, bem como a sujeição compulsória ao plano de pagamento da dívida se o montante devido ao credor ausente for certo e conhecido pelo consumidor, devendo o pagamento a esse credor ser estipulado para ocorrer apenas após o pagamento aos credores presentes à audiência conciliatória.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 3º No caso de conciliação, com qualquer credor, a sentença judicial que homologar o acordo descreverá o plano de pagamento da dívida e terá eficácia de título executivo e força de coisa julgada.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 4º Constarão do plano de pagamento referido no § 3º deste artigo:
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
I - medidas de dilação dos prazos de pagamento e de redução dos encargos da dívida ou da remuneração do fornecedor, entre outras destinadas a facilitar o pagamento da dívida;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
II - referência à suspensão ou à extinção das ações judiciais em curso;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
III - data a partir da qual será providenciada a exclusão do consumidor de bancos de dados e de cadastros de inadimplentes;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
IV - condicionamento de seus efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 5º O pedido do consumidor a que se refere o caput deste artigo não importará em declaração de insolvência civil e poderá ser repetido somente após decorrido o prazo de 2 (dois) anos, contado da liquidação das obrigações previstas no plano de pagamento homologado, sem prejuízo de eventual repactuação.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
Em caso de não realização de acordo entre o autor e os credores, o processo avança para a fase judicial propriamente dita. Nesta fase, procede-se na revisão, integração e repactuação de dívidas. Aqui não há mais falar em plano de pagamentos (oriundo da fase conciliatória), mas de um plano judicial compulsório, que deverá observar os parâmetros estabelecidos nos parágrafos do art. 104-B, do CDC, que assim dispõe:
Art. 104-B. Se não houver êxito na conciliação em relação a quaisquer credores, o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 1º Serão considerados no processo por superendividamento, se for o caso, os documentos e as informações prestadas em audiência.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 2º No prazo de 15 (quinze) dias, os credores citados juntarão documentos e as razões da negativa de aceder ao plano voluntário ou de renegociar.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 3º O juiz poderá nomear administrador, desde que isso não onere as partes, o qual, no prazo de até 30 (trinta) dias, após cumpridas as diligências eventualmente necessárias, apresentará plano de pagamento que contemple medidas de temporização ou de atenuação dos encargos.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 4º O plano judicial compulsório assegurará aos credores, no mínimo, o valor do principal devido, corrigido monetariamente por índices oficiais de preço, e preverá a liquidação total da dívida, após a quitação do plano de pagamento consensual previsto no art. 104-A deste Código, em, no máximo, 5 (cinco) anos, sendo que a primeira parcela será devida no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado de sua homologação judicial, e o restante do saldo será devido em parcelas mensais iguais e sucessivas.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
Finalmente, o Código de Defesa do Consumidor estabelece a competência concorrente e facultativa dos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor para a realização da fase conciliatória, preventiva ao processo judicial de repactuação de dívidas e que deve observar, no que couber, as disposições estabelecidas pelo art. 104-A do CDC para regulação da fase conciliatória judicial. É o que se vê da redação do art. 104-C, do CDC:
Art. 104-C. Compete concorrente e facultativamente aos órgãos públicos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor a fase conciliatória e preventiva do processo de repactuação de dívidas, nos moldes do art. 104-A deste Código, no que couber, com possibilidade de o processo ser regulado por convênios específicos celebrados entre os referidos órgãos e as instituições credoras ou suas associações.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 1º Em caso de conciliação administrativa para prevenir o superendividamento do consumidor pessoa natural, os órgãos públicos poderão promover, nas reclamações individuais, audiência global de conciliação com todos os credores e, em todos os casos, facilitar a elaboração de plano de pagamento, preservado o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, sob a supervisão desses órgãos, sem prejuízo das demais atividades de reeducação financeira cabíveis.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
§ 2º O acordo firmado perante os órgãos públicos de defesa do consumidor, em caso de superendividamento do consumidor pessoa natural, incluirá a data a partir da qual será providenciada a exclusão do consumidor de bancos de dados e de cadastros de inadimplentes, bem como o condicionamento de seus efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento, especialmente a de contrair novas dívidas.
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
Sobre a coexistência das fases conciliatórias judicial e extrajudicial, a doutrina é tranquila ao admitir essa situação, como se vê:
"Assim, a conciliação é a fase inicial e obrigatória do procedimento de repactuação das dívidas, pois a autocomposição tem se mostrado uma via adequada e eficaz para o tratamento adequado de conflitos oriundos do superendividamento, além de contribuir para a de judicialização.
O consumidor poderá requerer a conciliação das dívidas de consumo no Judiciário (art. 104-A) ou no Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (art. 104-C). A escolha caberá ao consumidor já que a competência para a conciliação é concorrente, de modo que a conciliação administrativa não poderá ser exigida como condição ou forma de limitação ao acesso do consumidor ao Poder Judiciário, o que, aliás, afrontaria o princípio constitucional fundamental da inafastabilidade da jurisdição.
(...)
Na existência de atendimento pré-processual nos tribunais, resta a possibilidade de ajuizar o "processo de repactuação por dívidas" do art. 104-A, caso em que será necessária a capacidade postulatória e apresentação do plano de pagamento com prazo máximo de 5 anos."dia
1
Observo, no ponto, que em momento algum o legislador vedou a concessão de antecipação dos efeitos da tutela de urgência, ou postergou sua apreciação para momento posterior à fase de conciliação. Neste quadrante, distribuído o processo judicial, ainda que pendente a fase conciliatória, é possível o exame do pedido de concessão de tutela de urgência, mesmo antes da realização da audiência de conciliação. Neste sentido é a jurisprudência desta Corte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS CUMULADA COM PEDIDO DE LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL APOSENTADO. VIOLAÇÃO AO MÍNIMO EXISTENCIAL NÃO COMPROVADA. TUTELA DE URGÊNCIA. REVOGAÇÃO.
PRELIMINAR CONTRARRECURSAL DE INTEMPESTIVIDADE RECURSAL.
O art. 269, § 1º, do CPC, estabelece que o advogado poderá promover a intimação do advogado da parte adversa por meio do correio, juntando aos autos cópia do ofício de intimação e do aviso de recebimento.
Na espécie, a pate ré não havia sido citada ou intimada anteriormente, de modo que sequer possuía procurador constituído nos autos, o que impede o uso da faculdade prevista no art. 269, § 1º, do CPC, ou seja, intimação efetuada pela própria parte autora, por meio de seu advogado, consoante afirma o demandante no evento 15.
Portanto, em que pese tenha constado da decisão agravada que aquela valeria como ofício, considerando a ausência de intimação acerca do deferimento da liminar, é tempestiva a interposição do recurso.
PRELIMINAR CONTRARRECURSAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. INOCORRÊNCIA.
A preliminar de ausência de impugnação específica dos fundamentos da decisão agravada deve ser afastada. Consoante se depreende das razões recursais, o recorrente pretende a reforma da decisão que deferiu a tutela de urgência, defendendo a regularidade dos descontos em conta corrente e discorrendo sobre os parâmetros para cumprimento da limitação dos descontos consignados em folha. Ainda, pede o afastamento da multa cominatória e a alteração da periodicidade de incidência. Desse modo, o recurso atende ao disposto no art. 1.016 do CPC, pois o agravante expôs os fatos, o direito e as razões do pedido de reforma.
PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA. INOCORRÊNCIA.
Não prospera a alegação de nulidade da decisão agravada, uma vez que a lei que instituiu o procedimento da ação por superendividamento não veda o deferimento de tutela de urgência, a qual, contudo deve seguir os requisitos dispostos no art. 104-A do CDC e no rt. 300 do CPC.
MÉRITO. TUTELA DE URGÊNCIA.
I - O art. 104-A do CDC, introduzido pela Lei n.º 14.181/2021(Lei do superendividamento), instituiu o processo para repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, na qual estarão presentes os credores e o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento. Na ausência de conciliação em relação a quaisquer credores, o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento
para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório
(art. 104-B do CDC).
Visa-se à preservação do mínimo existencial da pessoa, conforme patamar estipulado no Decreto n.º 11.567/2023 — que alterou o art. 3º, do Decreto n.º 11.150/22 —
considera-se como mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a
R$ 600,00 (seiscentos reais)
.
Nesse contexto, a limitação dos descontos consignados e efetuados em conta bancária deferida com base no art. 104-A do CDC não se sustenta, pois não demonstrada a violação ao mínimo existencial nesse momento. Assim, impositiva a observância da legislação relativa à margem consignável de folha de pagamento,
descabendo o deferimento da tutela de urgência na extensão em que concedida na decisão agravada.
II - Em que pese esta Câmara possua entendimento de que aos servidores estaduais e municipais se aplica o limite de 30% de margem consignável, mantenho o percentual de 35%, sob pena de
reformatio in pejus
. Por outro lado, o limite de 35% deve incidir sobre a renda bruta, e não sobre a líquida como determinado na decisão agravada.
No caso, ocorre que os descontos consignados em folha de pagamento ultrapassam 38% da remuneração bruta (
evento 1, CHEQ3
), devendo ser mantida a limitação em 35% sobre a renda bruta, observada a ordem cronológica de contratação.
III - Descabe estender igual limitação de 35% da remuneração bruta aos empréstimos debitados em conta corrente. Aplicação da tese fixada no Tema 1085 do STJ:
São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento
.
MULTA COMINATÓRIA. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PERIODICIDADE.
A imposição de
astreintes
é medida adotada para garantir o cumprimento da ordem judicial, aplicável somente em caso de procrastinação pela parte ré, devendo ser arbitrada em
quantum
razoável para ser efetivamente meio de coerção ao cumprimento da obrigação de fazer imposta na decisão.
Multa de R$ 500,00 por desconto que se mostra adequada, sendo inclusive inferior aos parâmetros adotados por esta 24ª Câmara Cível.
PRELIMINARES REJEITADAS E AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO EM PARTE. UNÂNIME.
(Agravo de Instrumento, Nº 53170133820238217000, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Jorge Alberto Vescia Corssac, Julgado em: 13-12-2023)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E NA CONTA CORRENTE. LEI 14.181/21 - TRATAMENTO DAS PESSOAS EM SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR AUSÊNCIA DE AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA À ANÁLISE DO PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. REJEIÇÃO.
LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS SEM DIFERENCIAÇÃO ENTRE CREDORES. GARANTIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA PARA O FIM DE RECALCULAR O VALOR DAS PARCELAS DOS EMPRÉSTIMOS CELEBRADOS ATÉ APRESENTAÇÃO DO PLANO FINAL DE PAGAMENTO. INAPLICABILIDADE DO TEMA 1.085 DO STJ. HIPÓTESE DE
DISTINGUISHING
. ASTREINTES. PREVISÃO LEGAL. POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO COM VISTAS AO EFETIVO CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL. VALOR E PERIODICIDADE MANTIDOS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DECISÃO CONFIRMADA.
NÃO HÁ NULIDADE NA DECISÃO QUE CONCEDE TUTELA ANTECIPADA ANTES DA REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA PREVISTA NA LEI 14.181/21, DESDE QUE PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC. COMPATIBILIDADE DAS REGRAS DO CPC E DO CDC.
MEDIDA LIMINAR DEFERINDO A LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E NA CONTA CORRENTE DO DEVEDOR, COM O RECÁLCULO DAS PARCELAS MENSAIS CONTRATADAS, A FIM DE ASSEGURAR O MÍNIMO EXISTENCIAL DA PARTE AUTORA, EM SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. DEMONSTRAÇÃO DO COMPROMETIMENTO DE SUA RENDA MENSAL COM AS DÍVIDAS CONTRATADAS. RISCO CONCRETO DE DANO E PROBABILIDADE DO DIREITO INVOCADO QUANTO AO PEDIDO DE REPACTUAÇÃO DE ACORDO COM O PLANO FINAL DE PAGAMENTO A SER APRESENTADO E APROVADO PELOS CREDORES, EM CONFORMIDADE COM A LEI N. 14.181/2021. ENTENDIMENTO SEDIMENTADO NO STJ NO SENTIDO DA POSSIBILIDADE DE LIMITAR OS DESCONTOS DECORRENTES DE EMPRÉSTIMOS CONTRAÍDOS NO CONTRACHEQUE E NAS CONTAS-CORRENTES.NÃO INCIDÊNCIA DO TEMA 1.085 DO STJ AO CASO CONCRETO, PORQUE ENVOLVE TUTELA JUDICIAL QUE ASSEGURA O MÍNIMO EXISTENCIAL A DEVEDOR EM SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO.
MANUTENÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA CONCEDIDA NA ORIGEM, PRESENTES OS REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS QUE NÃO IMPLICA RESCISÃO OU CANCELAMENTO DOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO, A AFASTAR ALEGAÇÃO DE IRREVERSIBILIDADE DO PROVIMENTO ANTECIPATÓRIO DEFERIDO. PREVISÃO LEGAL PARA PROTEÇÃO ESPECIAL DO CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO ESTABELECIDA NA LEGISLAÇÃO CITADA, QUE ALTEROU EM PARTE O CDC E DISPÔS SOBRE A PREVENÇÃO E TRATAMENTO DO SUPERENDIVIDAMENTO.
POSSÍVEL A FIXAÇÃO DE ASTREINTES COM VISTAS AO EFETIVO CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL, CUJA PREVISÃO LEGAL ENCONTRA-SE NOS ARTS. 139, IV, E 537, AMBOS DO CPC. TRATANDO-SE DE MEDIDA COERCITIVA, O VALOR DAS ASTREINTES HÁ DE SER SUFICIENTE PARA IMPOR AO OBRIGADO O EFETIVO CUMPRIMENTO DO COMANDO JUDICIAL, PENA DE SE TORNAR INÓCUA. ESPECÍFICO CASO DOS AUTOS QUE RECOMENDA A MANUTENÇÃO DO VALOR ARBITRADO E A PERIODICIDADE ARBITRADA, POIS NECESSÁRIO CONSIDERAR QUE EVENTUAL DESCUMPRIMENTO DA ORDEM AGRAVARÁ AINDA MAIS A SITUAÇÃO DO CONSUMIDOR, CUJA DIGNIDADE JÁ SE ENCONTRA AFETADA COM O COMPROMETIMENTO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. DECISÃO CONFIRMADA.
RECURSO IMPROVIDO.
(Agravo de Instrumento, Nº 53122907320238217000, Vigésima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Ricardo Pippi Schmidt, Julgado em: 12-12-2023)
6.4 O Agravante argui a legalidade de inscrição em cadastros de proteção ao crédito, como SPC e SERASA, como exercício regular de direito. De fato, em condições normais de contratação, a inscrição de devedores inadimplentes é legítima. Todavia, no contexto de uma ação de superendividamento, e em sede de tutela de urgência, a determinação de abstenção ou suspensão dos efeitos de inclusão em cadastros restritivos (SPC e SERASA) se justifica como medida de proteção ao consumidor em situação de vulnerabilidade, visando facilitar o processo de repactuação e evitar o agravamento da situação de endividamento, além de promover um ambiente propício para a conciliação.
Assim, a finalidade do procedimento de superendividamento, que é a renegociação da dívida para permitir o pagamento e a recuperação da dignidade do consumidor, seria frustrada se o nome do devedor permanecesse em órgãos de restrição de crédito durante a fase de conciliação e elaboração do plano de pagamento.
A decisão de primeira instância, contudo, fez a ressalva pertinente quanto ao
Sistema de Informações de Crédito do Banco Central (SCR)
, que não pode ser equiparado aos cadastros de inadimplentes comuns.
O SCR possui finalidades de interesse público, voltadas ao monitoramento do crédito no sistema financeiro e ao intercâmbio de informações entre instituições financeiras sobre as responsabilidades de clientes em operações de crédito (Art. 2º da Resolução CMN nº 5.037/2022). Esse sistema, na verdade, atua como uma ferramenta preventiva ao superendividamento, auxiliando as instituições na avaliação responsável das condições de crédito dos consumidores, conforme previsto no artigo 54-D do CDC.
Dessa forma, a manutenção dos dados no SCR não prejudica o consumidor em processo de repactuação e é essencial para a saúde do sistema financeiro, ao contrário dos cadastros de inadimplentes, cuja restrição durante o processo de superendividamento busca proteger a dignidade do devedor e fomentar a solução consensual. A decisão agravada agiu com correção ao distinguir tais sistemas.
6.5 O recorrente pleiteia a revogação ou, subsidiariamente, a redução da multa cominatória de R$ 500,00 por cada desconto indevido, sob a alegação de ser injusta, indevida, exagerada e de que somente seria aplicável após o trânsito em julgado.
O artigo 537 do Código de Processo Civil expressamente autoriza o juiz a impor multa diária para compelir o devedor ao cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. As
astreintes
possuem natureza coercitiva, e não punitiva, e sua finalidade é justamente assegurar a efetividade das decisões judiciais, especialmente as de caráter provisório.
Assim, a alegação de que a multa só seria cabível após o trânsito em julgado não procede, visto que um dos principais papéis da multa cominatória é garantir o cumprimento de tutelas de urgência, que visam produzir efeitos imediatos.
A fixação da multa em R$ 500,00 por desconto indevido, limitada ao valor da dívida pendente, mostra-se adequada e proporcional à gravidade do descumprimento, considerando a essencialidade do mínimo existencial para a parte Agravada.
O valor arbitrado não configura enriquecimento ilícito do devedor, mas um meio de coerção para que as instituições financeiras cumpram a ordem judicial em tempo hábil. A manutenção da medida, portanto, é imperiosa para garantir a eficácia da tutela de urgência deferida e a proteção do consumidor.
7. Diante do exposto, com fundamento no art. 932, incisos III e VIII, do CPC, combinado com o art. 206, inc. XXXVI, do Regimento Interno, nego provimento ao agravo de instrumento interposto, nos termos da fundamentação.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Diligências legais.
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. E N U N C I A D O Nº36Deverá constar, na notificação encaminhada aoscredores, a advertência de que o não comparecimentoinjustificado à audiência de conciliação ou a presençade procurador sem poderes especiais e plenos paratransigir acarretará a aplicação, por força de lei, dassanções previstas no art. 104-A, parágrafo 2º, do Códigode Defesa do Consumidor.ENUNCIADOS | CADERNO DE ENUNCIADOS 1 7Enunciado aprovado naassembleia realizada em14/04/2023, em BeloHorizonte/MG, no 13ºEncontro do FONAMEC.Enunciado aprovado naassembleia realizada em14/04/2023, em BeloHorizonte/MG, no 13ºEncontro do FONAMEC.Justificativa: A expressa notificação prévia e padronizada dos credores sobre apossibilidade de incidência das sanções contidas no art.104-A, parágrafo 2o doCDC, assegura a preservação do princípio da ampla defesa, do contraditório eda não surpresa. Da mesma forma, contribui com o desenvolvimento dacultura de pacificação social e priorização das soluções autocompositivas,valores fundantes da Resolução n.125 do Conselho Nacional de Justiça e da Lein.14.181/21, que atualizou o Código de Defesa do Consumidor.
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. E N U N C I A D O Nº37Cabe ao Juiz Coordenador do CEJUSC a aplicação, porforça de lei, das sanções previstas no art. 104-A, § 2º, doCódigo de Defesa do Consumidor, em caso de ausênciainjustificada de qualquer credor ou de seu procuradorcom poderes especiais e plenos para transigir àaudiência conciliatória do superendividamento.Justificativa: A expressa previsão legal contida no art.104-A, § 2º do CDCautoriza o Juiz coordenador do CEJUSC a aplicar as sanções contempladas nodiploma, porque incidentes ex vi lege. Além disso, a previsão legal, do pontode vista topológico, está situada na fase consensual e independe da existênciade processo judicial ajuizado (art.104-B, caput) ou capacidade postulatória doconsumidor-devedor.
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. E N U N C I A D O Nº38Em caso de não comparecimento injustificado dequalquer credor à audiência de conciliação préprocessualdo superendividamento, o Juiz Coordenadordo CEJUSC poderá homologar a proposta de sujeiçãocompulsória desse credor ao plano de pagamento dadívida se o montante devido ao credor ausente for certoe conhecido pelo consumidor, consoante previsão do art.104-A, parágrafo 2º, do Código de Defesa doConsumidor.Justificativa: A expressa previsão legal contida no art.104-A, § 2º do CDCautoriza o Juiz coordenador do CEJUSC a aplicar as sanções contempladas nodiploma, porque incidentes ex vi lege. Por “montante devido” e valor “certo econhecido pelo consumidor” sugere-se a demonstração e registro em ata deaudiência, de acordo com as informações prestadas pelo consumidor, paraapreciação pelo Juiz coordenador do Cejusc.
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. E N U N C I A D O Nº39A simples apresentação de procuração com poderesespeciais para transigir não elide a aplicação dasuspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dosencargos da mora, caso o procurador não apresenteefetivas propostas de negociação para a formalização doplano de pagamento, em atenção ao dever decooperação, devendo constar tal advertência nanotificação encaminhada aos credores.Justificativa: A ausência injustificada, bem como o comparecimento dorepresentante do credor sem poderes reais e plenos para transigir ou, ainda, afalta de proposta dos credores, contrariam a finalidade da norma e autorizama aplicação de sanção, em especial do art. 104-A, § 2.º, do CDC.A lei não criou o dever de compor, pois violaria o princípio da autonomiaprivada. Contudo, uma das funções exercidas pela boa-fé, de criação dedeveres anexos, endereça o dever de cooperar e o dever de cuidado com ooutro, o cocontratante. No superendividamento, nasce um dever derenegociar, de repactuar, de cooperar vivamente para ajudar o leigo a sair daruína, desde que preenchidos os pressupostos legais. Logo, os credores têm afunção de boa-fé de apresentar propostas e contribuir para a construção doplano de pagamento voluntário. O tratamento diferenciado ao credor quecoopera na fase consensual é identificado ao longo da legislação, a exemploda prioridade de pagamento aos credores que compuseram nesta fase, dapossibilidade de homologação de plano de pagamento apresentado peloconsumidor na hipótese do Enunciado 04, por expressa previsão legal.O Código de Processo Civil de 2015 foi embasado em vários princípios, estandoentre ele o princípio da cooperação das partes, artigo 6.º e o princípio da boafé,artigo 5º. Na essência, significa que o legislador, ao instaurar procedimentode tratamento do superendividamento do consumidor, privilegiou a atuaçãopró-ativa, exigindo a presença qualificada dos credores na construção doplano de pagamento consensual. Nesse sentido, veja-se que o diploma legalem análise destinou tratamento diferenciado aos credores quando previurecebimento preferencial do pagamento no plano consensual, artigo 104-B doCDC.
11
. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sergio Cruz; MITIDIERO, Daniel. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: comentado. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 382.
13
. Sarlet, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais sociais, mínimo existencial e direito privado, p. 99.Jacintho, Jussara Maria Moreno. Dignidade humana: princípio constitucional. Curitiba: Juruá, 2006. p. 207.
1
. BERTONCELLO, Káren Rick Danilevicz; LIMA, Clarissa Costa de. ADESÃO AO PROJETO CONCILIAR É LEGAL - CNJ: PROJETO-PILOTO: TRATAMENTO DAS SITUAÇÕES DE SUPERENDIVIDAMENTO DO CONSUMIDOR. Revista de Direito do Consumidor.Vol. 63/2007, p 173 - 201, Jul - Set / 2007, apud, MARQUES, Maria Manuel Leitão et alii. O endividamento dos consumidores. Coimbra: Almedina, 2000, p. 237.
1
. BENJAMIN, Antonio Herman; MARQUES, Claudia Lima; LIMA, Clarissa Costa de; VIAL, Sophia Martini. Comentários à Lei 14.181/2021 : a atualização do CDC em matéria de superendividamento, São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2021.
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