Processo nº 0003351-65.2015.4.03.6133
ID: 339237079
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0003351-65.2015.4.03.6133
Data de Disponibilização:
31/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ELIANA CRISTINA NOGUEIRA DE FARIA OLIVEIRA
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 2ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003351-65.2015.4.03.6133 RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO APELANTE: CASA NOSSA MOGI DAS CRUZES EMPR…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 2ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003351-65.2015.4.03.6133 RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO APELANTE: CASA NOSSA MOGI DAS CRUZES EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS S/A, INMAX TECNOLOGIA DE CONSTRUCAO LTDA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) APELANTE: TACITO BARBOSA COELHO MONTEIRO FILHO - SP65812-A APELADO: EMMANUEL DE MORAES ANDREO CARDOSO Advogado do(a) APELADO: ELIANA CRISTINA NOGUEIRA DE FARIA OLIVEIRA - SP177169-A OUTROS PARTICIPANTES: D E C I S Ã O Trata-se de ação ordinária proposta por EMMANUEL DE MORAES ANDREO CARDOSO em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, CASA NOSSA MOGI DAS CRUZES EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS S/A e INMAX TECNOLOGIA DE CONSTRUCAO LTDA visando a entrega do imóvel adquirido, a declaração de nulidade da cláusula de tolerância prevista no contrato, a condenação das rés ao pagamento dos valores devidos à título de lucros cessantes e a condenação em razão dos danos morais. Em sentença (ID 7481896, pp. 11/33) o pleito foi julgado parcialmente procedente para reconhecer a ilegitimidade dos sócios da corré CASA NOSSA MOGI DAS CRUZES EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS S/A, declarar a resolução do contrato de financiamento, bem como condenar as rés ao pagamento de lucros cessantes, danos morais e à devolução dos valores pagos decorrentes do contrato de alienação fiduciária. Opostos embargos de declaração pela CASA NOSSA MOGI DAS CRUZES EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS S/A c/c INMAX TECNOLOGIA DE CONSTRUCAO LTDA (ID 7481896, pp. 37/43) e pela CAIXA (ID 7481896, pp. 45/46), que foram rejeitados (ID 7481896, pp. 47/49). Interposta apelação (ID 7481897, pp. 01/) pelas corrés CASA NOSSA e INMAX sustentando que a r. sentença é nula por configurar decisão ultra petita, tendo em vista que a parte autora não pleiteou a resolução do contrato firmado, nem a devolução das quantias pagas. Alega, ainda, ofensa ao artigo 1022, inciso II do CPC, em razão da omissão verificada pela parte ré e não apreciada no julgamento dos Embargos; e ofensa ao artigo 489 do CPC, em face da alegação de inépcia da inicial não apreciada na sentença. Interposta apelação (ID 7481900, pp. 01/17) pela CAIXA que alega, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva quanto à entrega da obra e impossibilidade jurídica do pedido. No mérito, afirma não ter responsabilidade, além do fornecimento dos recursos, pelo atraso na obra, danos materiais e morais pleiteado pela autora. Sem contrarrazões, subiram os autos a esta e. Corte. É o relato do necessário. Decido. Por estarem presentes os requisitos estabelecidos na Súmula/STJ n.º 568 e nos limites defluentes da interpretação sistemática das normas fundamentais do processo civil (artigos 1º ao 12) e artigo 932, todos do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), passo a decidir monocraticamente. O julgamento monocrático atende aos princípios da celeridade processual e da observância aos precedentes judiciais, ambos contemplados na novel legislação processual civil, e tal qual no modelo antigo, é passível de controle por meio de agravo interno (artigo 1.021 do CPC/2015), cumprindo o princípio da colegialidade. Inicialmente, analiso as preliminares arguidas pelas rés Casa Nossa Mogi das Cruzes Empreedimentos Imobiliários e Inmax Tecnologia de Construção Eireli. Sustentam a inépcia da inicial, porquanto deixou de atender aos requisitos do artigo 319, 322 e 324 do CPC. Nesse sentido, alegam a nulidade da sentença por infringência ao art. 489, I, II, III e IV, do §1º, do CPC, ante a ausência de indicação expressa e precisa dos fundamentos e dispositivos aplicados e a relação com o feito em análise. Não assiste razão aos apelantes. Argumenta a corré CASA NOSSA MOGI DAS CRUZES EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS S.A com a inépcia da inicial, porque confusa a causa de pedir. Com efeito, é possível, dos fatos narrados, compreender os pedidos formulados, que estão expressos e, a princípio, sem incompatibilidade entre si ou com ordenamento jurídico, o que não permite a caracterização da inépcia da inicial, nos termos do artigo 330, § 1º, do CPC. Por conseguinte, perfeitamente afastada a inépcia da inicial pelo magistrado de primeiro grau e ausente qualquer nulidade a ensejar falta de fundamentação na referida decisão, nos termos do art. 489, §1º, do CPC. Ademais, o art. 330, §1º, do CPC, expressamente dispõe sobre a inépcia da petição inicial: § 1º Considera-se inepta a petição inicial quando: I - lhe faltar pedido ou causa de pedir; II - o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV - contiver pedidos incompatíveis entre si. Analisando o pedido inicial, não identifico qualquer hipótese prevista no referido artigo; portanto, diante da clareza dos argumentos expostos, é possível compreender os pedidos formulados pela parte autora, sem prejuízo ao contraditório. Da mesma forma, afasto a alegação de que os embargos de declaração (ID 7481896, pp. 37/43 e pp. 45/46) foram sumariamente rejeitados. Na ocasião, a embargante buscou reforma do mérito da sentença, mas não logrou em comprovar a existência de obscuridade, omissão, contradição ou erro material, hipóteses cabíveis a esse instrumento recursal. Ainda, o juiz não está obrigado a responder, um a um, todos os argumentos expendidos pelas partes, mas somente aqueles que sejam suficientes para fundamentar o seu convencimento. Pois bem, passo ao exame dos recursos de apelação. Da alegação da sentença por decisão ultra petita As rés afirmam que a sentença é ultra petita, devendo ser declarada nula. Alegam que, sem mesmo haver na petição inicial pleito para que fossem devolvidos os valores pagos no âmbito do contrato, a sentença condenou as rés ao aludido pagamento. No tocante a fixação de perdas e danos com a consequente devolução dos valores pagos pela parte autora no contrato de financiamento, não merece prosperar as alegações da apelante. Verifico que no contrato de compra e venda a data para conclusão das obras foi junho de 2013. Ademais, anoto que o contrato de financiamento foi assinado no dia 19/04/2013, ficando ajustado o prazo para entrega das obras nos seguintes termos: Confira-se: Assim, apesar dos prazos distintos, a qual tecerei considerações, restou demonstrado de forma incontestável o longo atraso na conclusão das obras, sem justificativa plausível, porquanto a ação foi ajuizada em 20 de julho de 2015 e a edificação ainda não havia sido concluída. Com efeito, acertada a sentença ao converter a obrigação de fazer (entrega definitiva das chaves do imóvel) em indenização por perdas e danos. Nesse sentido, ante a impossibilidade de se determinar a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, aplicável o art. 499, do CPC: Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Corroborando a possibilidade de conversão da obrigação em perdas e danos, cito precedente do STJ: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CONVERSÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER EM PERDAS E DANOS. MULTA DÁRIA. SÚMULA N. 83 DO STJ. INCIDÊNCIA. VERIFICAÇÃO. SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Definida a obrigação pela prestação de tutela específica - seja ela obrigação de fazer, não fazer ou dar coisa certa -, é plenamente cabível, de forma automática, a conversão em perdas e danos, ainda que sem pedido explícito, quando impossível o seu cumprimento ou a obtenção de resultado prático equivalente (art. 461, § 1º, do CPC). Incidência da Súmula n. 83 do STJ. 2. Aplica-se a Súmula n. 7 do STJ na hipótese em que o acolhimento da tese defendida no recurso especial reclama a análise dos elementos probatórios produzidos ao longo da demanda. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 2.081.278/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 26/6/2023, DJe de 3/7/2023.) Dessa forma, não há que se falar em nulidade da sentença. Ademais, uma vez que patente o inadimplemento contratual, cabível a fixação de perdas e danos. Aplica-se, nesse caso, a inteligência do art. 475, do CC: "Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos." Do mesmo modo, a Súmula 543, do STJ, é expressa quanto a necessidade de devolução integral dos valores pagos nos casos de exclusiva responsabilidade do promitente vendedor/construtor: "Súmula 543, STJ: Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento." No mesmo sentido, cito precedentes dessa E. Corte: "APELAÇÃO. CIVIL. COMPRA E VENDA. MÚTUO. EMPREITADA. FINANCIAMENTO PARA CONSTRUÇÃO. ATRASO NA OBRA. INADIMPLEMENTO. RESOLUÇÃO POR CULPA DA CONSTRUTORA. APELAÇÃO IMPROVIDA. I - Pretende a parte Autora a resolução dos contratos firmados com as corrés com a consequente restauração do status quo ante sob o fundamento de que obra não seria concluída no prazo avençado. O pleito exposto na inicial sugere a incidência do art. 395, parágrafo único do CC, segundo o qual se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la e exigir a satisfação das perdas e danos, bem como o teor do art. 475 do CC, que prevê que a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. II - Nestas condições, considerando que as obras não foram concluídas nem há notícia de justificativa para o atraso nos termos contratados, é patente o inadimplemento das corrés, não subsistindo controvérsia quanto à configuração do atraso. A construtora não logrou concluir a obra no prazo avençado, razão pela qual deve ser mantida a decisão que reconheceu a resolução do contrato sem qualquer retenção, considerando a sua culpa. A consagrar o entendimento anteriormente esposado, cumpre citar o teor da Súmula 543 do STJ. [...] V - Apelação improvida. Honorários majorados. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000203-82.2020.4.03.6133, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 27/10/2022, Intimação via sistema DATA: 03/11/2022)" "APELAÇÃO. FINANCIAMENTO HABITACIONAL. PMCMV. SFH. RESCISÃO CONTRATUAL. CEF. LEGITIMIDADE PASSIVA. PROMOTORA DE POLÍTICAS PÚBLICAS. DEVER DE FISCALIZAÇÃO. VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. RESPONSABILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. [...] 4. Destarte, entendo estar presente a legitimidade e responsabilidade do banco apelado, o que enseja a rescisão do contrato de financiamento e a devolução dos valores conforme determinado na sentença recorrida. 5. Apelação desprovida, com majoração da verba honorária. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001182-58.2021.4.03.6117, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 29/03/2023, DJEN DATA: 03/04/2023)" Da legitimidade da CAIXA Inicialmente, entendo que a CEF possui legitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda. Quanto à responsabilidade da CEF em relação ao atraso na entrega de imóveis financiados conforme as normas do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), existem duas situações a extremar: (a) se a CEF opera como gestora de recursos e executora de políticas públicas federais com a finalidade de promover moradia para pessoas de baixa renda, atuando na elaboração do projeto ou na fiscalização das obras, é parte legítima para ser demandada; e (b) se a CEF atua apenas como agente financeiro, financiando a aquisição de imóvel já edificado ou que está sendo construído por outra pessoa jurídica, não pode ser responsabilizada por vícios de construção ou atrasos na entrega, nem pode ser demandada na ação que tenha por objeto a rescisão do contrato. No contexto do Programa Minha Casa Minha Vida, para atrair a responsabilidade da CEF e sua legitimidade passiva, é necessário que a instituição financeira tenha atuado na construção do imóvel ou como gestora de políticas públicas, subsidiando a aquisição de moradias, nos termos dos julgados do C. Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA RÉ. 1. Não se constata a alegada violação ao artigo 1.022, do NCPC, porquanto todos os argumentos expostos pela parte, na petição dos embargos de declaração, foram apreciados, com fundamentação clara, coerente e suficiente. 2. Conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça: "a legitimidade passiva da CEF nas lides que tenham por objeto imóveis adquiridos no programa minha casa, minha vida, somente se verifica nas hipóteses em que atua além de mero agente financiador da obra" (AgInt no REsp 1609473/RN, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/02/2019, DJe 13/02/2019). 3. Para infirmar as conclusões a que chegou o Tribunal de origem, demandaria, necessariamente, o reexame das provas carreadas aos autos, o que é vedado nesta instância, a teor das Súmulas 5 e 7/STJ. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.700.199/RN, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 20/2/2020, DJe de 3/3/2020.) g.n. Os precedentes desta E. Turma seguem o entendimento acima, vide ApCiv 0001995-65.2015.4.03.6123 de relatoria do Des. Fed. Wilson Zauhy Filho, julgado em 13/06/22. Compulsando os autos, verifico que a parte autora firmou, em 11/06/2012, por “Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra (ID 7481889, pp. 23/28) para a compra de um terreno no Condomínio Residencial Água Marinha, localizado na Rua Vereador João Affonso Netto número 389, no valor de R$ 110.000,00 à vista. Para adquirir o imóvel, a parte celebrou com a Caixa Econômica Federal, em 19/04/2013, “Contrato por Instrumento Particular de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional, com Fiança, Alienação Fiduciária em Garantia e Outras Obrigações – Programa Nacional de Habitação Urbana – PNHU - Imóvel na planta associativo - Minha Casa, Minha Vida - MCMV – Recurso FGTS com utilização dos recursos da conta vinculada do FGTS do(s) comprador(es) e devedor(es)/fiduciante(s) (IDs 7481886, pp. 09/14 e 7481889, pp. 01/09), por meio do qual financiou o valor de R$ 84.571,09. No contrato, a obrigação de a construtora contratar seguro com a cobertura de sinistros para garantir a retomada e a finalização das obras, bem como a legalização do empreendimento; a vigência é durante todo o prazo da construção até a conclusão do empreendimento (cláusula 20). A CEF atua, então, como garantidora da correta consecução da obra de engenharia. Nesse sentido: SFH. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE TERRENO E MÚTUO PARA CONSTRUÇÃO DE UNIDADE VINCULADA A EMPREENDIMENTO, COM FIANÇA, ALIENAÇÃO FIDUCÁRIA EM GARANTIA E OUTRAS OBRIGAÇÕES. RECURSOS SBPE. ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA E ENTREGA DO IMÓVEL. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF. ATUAÇÃO NA FISCALIZAÇÃO DAS OBRAS E NA GESTÃO DOS RECURSOS. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. MORA CONTRATUAL. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MATERIAIS CONFIGURADOS. APELO IMPROVIDO. 1. Com referência à responsabilidade da Caixa Econômica Federal - CEF para responder pelo descumprimento contratual relativo ao atraso na construção e entrega de imóvel vinculado a empreendimento financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, há que se distinguir duas situações, consoante jurisprudência sedimentada: 1ª) A CEF é parte legítima e pode responder, solidariamente, pelo descumprimento contratual, nas hipóteses em que tenha atuado na escolha da construtora, elaboração do projeto, execução ou fiscalização das obras do empreendimento ou opere como gestor de recursos e agente executor de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda; 2ª) não se reconhece a legitimidade passiva ad causam da CEF, caso esta instituição funcione como agente financeiro em sentido estrito, responsável, apenas, pelo financiamento da aquisição do imóvel já edificado e em nome de terceiro. 2. No âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para que se configure a responsabilidade da CEF por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis, e, por consequência, a sua legitimidade para compor lides a esse respeito, é necessário que a instituição financeira tenha atuado seja na construção do imóvel, seja na elaboração do projeto, sua execução ou fiscalização das obras do empreendimento, ou, ainda, que o contrato esteja relacionado ao Programa de Arrendamento Residencial (PAR), com recursos advindos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). 3. Das cláusulas do contrato de financiamento habitacional, é nítida a atuação da CEF tanto na fiscalização das obras do empreendimento, como na gestão dos recursos. 4. A relação jurídica contratual em discussão sujeita-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), consoante entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal (ADI nº 2591, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 7/6/06, DJ 29/9/06, Rel. para acórdão Min. Eros Grau) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297). 5. A sentença de primeiro grau reconheceu o atraso na entrega da unidade habitacional do autor, a partir de abril de 2020, incluso o período de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias, sendo este fato incontroverso nesta sede recursal. A mora contratual não se deve à culpa do adquirente do imóvel, mas exclusivamente à construtora, tecnicamente responsável pelo empreendimento, e à fiscalização deficitária da instituição financeira, aptas a amparar o dever de indenizar, ex vi do art. 389 do Código Civil. 6. O parágrafo único do art. 395 do Código Civil dispõe que, caso a prestação, devido à mora, torne-se inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e exigir perdas e danos. Ainda, o art. 475 do Código Civil, expressamente, faculta ao credor, diante do inadimplemento do devedor, escolher entre exigir o cumprimento da prestação ou rescindir o contrato, cabendo, em qualquer das hipóteses, a respectiva indenização. 7. O autor faz jus à resolução do contrato de compra e venda do imóvel objeto desta lide, que se estende ao financiamento contraído perante a CEF, bem como à devolução de todos os valores pagos em razão destes, discriminados na sentença. 8. Respondem, solidariamente, de acordo com a legislação consumerista, todos que tenham intervindo na relação de consumo e participado, de forma direta ou indireta, para a ocorrência do dano, independentemente de culpa, nos termos dos arts. 7º, parágrafo único e 14, do Código de Defesa do Consumidor. 9. Matéria preliminar rejeitada. Apelação improvida. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000805-44.2022.4.03.6120, Rel. Desembargador Federal HERBERT CORNELIO PIETER DE BRUYN JUNIOR, julgado em 03/05/2024, DJEN DATA: 08/05/2024) Assim, agiu a CEF como executor de política federal de promoção de moradia popular e fiscalizador da execução da obra, e não apenas como mero agente financeiro. A sua legitimidade passiva está demonstrada. Do termo final para o término da obra A parte autora firmou, em 11/06/2012, Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra. Em relação ao prazo de entrega do imóvel, ficou acordado que deveria acontecer em junho de 2013 contados da data da assinatura do contrato, podendo ser prorrogado por até 180 dias, conforme Cláusula Nona. (ID 7481889, p. 26). Nota-se, ainda, que a parte celebrou contrato de financiamento com a CAIXA. No Item 6.1 do Quadro Resumo do referido documento, consta o prazo de 13 meses para a construção/legalização da obra. Ainda, na Cláusula Terceira consta a possibilidade de prorrogação do referido prazo em 24 meses para o término da obra do imóvel. Portanto, em relação ao prazo para entrega das obras, foram fixados prazos distintos. Nesse sentido, requer a parte apelante que seja observado o prazo fixado no contrato de compra e venda. Em que pese já tenha afirmado no sentido de dever ser respeitado o prazo estipulado em acordo posterior, revejo meu posicionamento, passando a me curvar ao entendimento adotado pelo STJ no julgamento do Tema nº 996: 1.1. Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância; No voto de lavra do Relator Ministro Marco Aurélio Bellize, restou claro que “de nada adianta, por conseguinte, a estipulação de um prazo certo e expresso, assim como entendeu o acórdão impugnado, se ele for fixado de maneira apenas estimativa e condicional, ficando vinculado, ainda, a um evento futuro, no caso, à data de obtenção do financiamento pelo adquirente ou àquela que for determinada pelo agente financeiro no referido contrato. Isso acaba por atribuir à incorporadora o direito de postergar a entrega da obra por prazo excessivamente longo e oneroso para o comprador, a ponto de afastar, inclusive, o próprio risco da atividade, que pertence à empresa”. Ressalta ainda o Ministro que “a despeito de a promessa de compra e venda de imóvel ser contratada de maneira individual, o negócio envolve o interesse de uma coletividade, de modo que a vinculação da contagem do prazo de entrega da obra à data da obtenção do financiamento cria uma situação sui generis, na medida em que, para um mesmo empreendimento, cujas unidades deverão ser entregues de uma só vez – ainda que para uma etapa específica da construção previamente programada –, ter-se-á a configuração da mora de maneira individualizada, a depender da data em que cada contrato for assinado, o que significará, em última ratio, uma forma de não sujeitar a empresa aos efeitos da mora Em outras palavras, o Relator aduz que não deve ser contemplado a possibilidade de fixação de prazo meramente estimativo para entrega da unidade imobiliária, tampouco vinculado a evento futuro, devendo, no caso, ser considerado o prazo estipulado no contrato de compra e venda, acrescido tão somente do prazo de tolerância de 180 dias, dentro do qual a empresa poderá superar eventuais imprevistos, entraves burocráticos ou fatores climáticos. ] Não cabe, portanto, a previsão de cláusula prevendo a prorrogação do prazo em 24 meses. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a denominada “cláusula de tolerância” em contratos dessa espécie - que prevê a possibilidade de atraso na entrega do imóvel - não é abusiva, desde que o prazo máximo de prorrogação não ultrapasse 180 (cento e oitenta) dias. Vejamos: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. PRAZO DE TOLERÂNCIA. 180 DIAS CORRIDOS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SENTENÇA COLETIVA. EFICÁCIA TERRITORIAL. LIMITAÇÃO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA N. 1.075 DO STF. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. É válida a cláusula de tolerância firmada em promessa de compra e venda, desde que limitada ao prazo de 180 dias corridos. 2. A eficácia da sentença coletiva proferida em ação civil pública não está circunscrita "a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo" (Tema n. 480 do STJ). 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.781.140/DF, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 1/7/2024, DJe de 8/7/2024.) Por fim, conclui-se que as construtoras/incorporadoras devem, mediante programação administrativa e econômico-financeira, estabelecer em seus contratos o prazo para entrega do imóvel de maneira indene de dúvidas, utilizando-se de critérios dotados de objetividade e clareza e desvinculados a negócio jurídico futuro, mesmo que este se encontre associado a uma das etapas da contratação ou da realização da obra, como no caso, à data da obtenção do financiamento. Outra observação importante a se trazer é que durante o prazo de construção há incidência de atualização monetária pelo INCC (Índice Nacional de Construção Civil), bem como de juros de obra. Em razão disso, resta evidente que a fixação de um prazo incerto ou vinculado a evento futuro como o contrato de financiamento, tem como consequência a maior exposição do consumidor à cobrança dos referidos encargos, o que, obviamente, lhe acarretará um enorme prejuízo econômico. Com efeito, considero que o termo inicial para entrega das obras deve ser contado a partir de 11/06/2012 (momento da assinatura do contrato de compra e venda), acrescido do prazo de tolerância de 180 dias, nos termos da Tese 1.1 do Tema nº 996/STJ. Assim, encontra-se a construtora em mora, uma vez que a obra deveria ter sido entregue em dezembro de 2013, preservando-se os primados do direito à informação, da transparência e da boa-fé, além de assegurar às partes o necessário equilíbrio contratual e respeito as prestações e contraprestações envolvidas. Observando a Planilha de Evolução do Financiamento (ID7481892, pp. 37/50), não houve comprovação do término das obras na data prevista, nem sequer que a obra tenha sido de fato concluída. Portanto, inequívoca a responsabilidade das rés pela inadimplência dos contratos. Da indenização por danos morais No que diz respeito ao pleito de indenização por danos morais, a jurisprudência do STJ vem decidindo que o “simples inadimplemento contratual em virtude do atraso na entrega do imóvel não é capaz, por si só, de acarretar dano moral indenizável, sendo necessária a comprovação de circunstâncias excepcionais que possam configurar lesão extrapatrimonial” (AgInt no AgInt no AREsp n. 2.159.987/BA; AgInt no AREsp n. 2.034.823/PR). Contudo, no caso em análise, verifica-se que o prazo de tolerância contratualmente previsto foi extrapolado, resultando no atraso na entrega do imóvel ao autor, que deveria ter sido entregue em dezembro de 2013. Tal circunstância excepcional, por si só, evidencia que a situação superou os limites do mero aborrecimento cotidiano. O atraso na conclusão do empreendimento, bem como a prorrogação por 24 meses da data para a entrega das chaves geraram incertezas quanto à concretização do negócio, ocasionando angústia e frustração ao autor, que continuou a arcar mensalmente com os encargos do contrato sem a devida contraprestação, ou seja, sem a posse do bem adquirido. Ademais, para se fixar a quantia indenizatória se faz necessário observar os critérios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como a função de punir a conduta praticada pelo infrator para coibir eventuais reincidências, mas sem ocasionar o enriquecimento injustificado do autor e servindo para ressarcir a parte lesada pelo transtorno. Nestas circunstâncias, não merece reforma a r. sentença que fixou a indenização por danos morais no total de R$ 15.000,00 em virtude do prolongado atraso na entrega da obra e sem notícia da sua finalização. Dos lucros cessantes A parte apelante defende que o autor não faz jus à indenização por lucros cessantes em decorrência do atraso na entrega da obra Pois bem, entendo que não assiste razão ao apelante. O longo atraso na entrega no imóvel restou demonstrado nos autos, inclusive com a afirmação de que não ocorreu a entrega do bem mesmo depois de muitos anos da assinatura dos contratos. Por conseguinte, é de rigor a responsabilidade das apelantes pela indenização por danos materiais a título de lucros cessantes, diante da injusta privação do uso do bem, nos termos do art. 402 do CC: Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar. Nessa senda, o valor da indenização deverá ser o valor locatício de imóvel assemelhado, desde a configuração da mora contratual, até a data da disponibilização direta ao adquirente da unidade autônoma, de acordo com a tese firmada no Tema 996 do STJ: 1.2. No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma. Conforme se extrai da leitura do Tema 996 do STJ, o prejuízo ao comprador é presumido quando há descumprimento no prazo de entrega do imóvel, ou seja, não há necessidade de que o requerente comprove o pagamento de aluguel em outra moradia para ter direito à indenização. Todavia, cabe apontar que a parte autora pleiteou a indenização à razão de R$ 800,00 por mês contados desde o inadimplemento contratual no mês de junho de 2013, até a entrega do imóvel em questão. Contudo, ao contrário do que sustenta na inicial, o inadimplemento ocorreu somente em dezembro de 2013. Logo, fixo a indenização por lucros cessantes no importe de 0,5% do valor atualizado do imóvel por mês de atraso (com termo inicial em 12/2013 e final na data da publicação da sentença), a ser paga de forma solidária pelas rés. Para elucidar a questão, colaciono precedentes desta E. Corte: SFH. COMPRA E VENDA DE TERRENO E MÚTUO PARA CONSTRUÇÃO DE UNIDADE HABITACIONAL, COM FIANÇA, ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA E OUTRAS OBRIGAÇÕES. PROGRAMA NACIONAL DE HABITAÇÃO URBANA - PNHU - IMÓVEL NA PLANTA ASSOCIATIVO - MINHA CASA MINHA VIDA - MCMV. RECURSOS FGTS. ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA E ENTREGA DO IMÓVEL. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF. ATUAÇÃO NA FISCALIZAÇÃO DAS OBRAS E NA GESTÃO DOS RECURSOS. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE A CONSTRUTORA E O AGENTE FINANCEIRO. MORA CONTRATUAL. COMPRADOR. PREJUÍZO PRESUMIDO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MATERIAIS. VALOR IDÊNTICO AO ALUGUEL MENSAL DE IMÓVEL ASSEMELHADO. JUROS DE OBRA. REPETIÇÃO DE FORMA SIMPLES. DANOS MORAIS. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO DA CEF PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Com referência à responsabilidade da Caixa Econômica Federal - CEF para responder pelo descumprimento contratual relativo ao atraso na construção e entrega do imóvel vinculado a empreendimento financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, há que se distinguir duas situações, consoante jurisprudência sedimentada: 1ª) A CEF é parte legítima e pode responder, solidariamente, pelo descumprimento contratual, nas hipóteses em que tenha atuado na escolha da construtora, elaboração do projeto, execução ou fiscalização das obras do empreendimento ou opere como gestor de recursos e agente executor de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda; 2ª) não se reconhece a legitimidade passiva ad causam da CEF, caso esta instituição funcione como agente financeiro em sentido estrito, responsável, apenas, pelo financiamento da aquisição do imóvel já edificado e em nome de terceiro. 2. Das cláusulas do contrato celebrado pelo autor com a CEF, é nítida a atuação da instituição financeira tanto na fiscalização das obras do empreendimento, como na gestão dos recursos, sendo, portanto, parte legítima para figurar no polo passivo da demanda. 3. É firme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2.591-DF, DJ 29/09/2006, p. 31) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297) quanto à aplicabilidade dos princípios do Código de Defesa do Consumidor aos contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação. 4. Os integrantes da cadeia de consumo respondem solidariamente pelos danos causados ao consumidor. Precedentes. 5. O atraso na entrega do imóvel, configurado a partir de 28/01/2015 e atribuído exclusivamente à mora da construtora, tecnicamente responsável pelo empreendimento, e à fiscalização deficitária da instituição financeira, enseja o dever de indenizar, ex vi do art. 389 do Código Civil. 6. Segundo o entendimento jurisprudencial assente, a indenização por lucros cessantes é devida no valor equivalente ao aluguel de um imóvel similar, praticado pelo mercado, correspondente a 0,5% (meio por cento) ao mês do valor atualizado do imóvel por mês de atraso, até a efetiva entrega do bem. 7. A tese firmada no Tema 996 reconheceu a ilicitude da cobrança de "juros de obra ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância". 8. Em 17/10/2023, ainda não havia sido implantada a fase de amortização do financiamento mostrando-se, assim, indevida a cobrança de juros de obra, no período de mora contratual. 9. Consoante entendimento firmado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento conjunto dos embargos de divergência interpostos nos EAREsps 676.608/RS, 664.888/RS, 600.663/RS, 622.897/RS e EREsp 1.413.542/RS, "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EREsp 1.413.542/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, j. em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021), com modulação de efeitos. 10. Na hipótese vertente, a cobrança indevida remonta aos idos de 2015, não havendo que se falar em restituição em dobro dos valores indevidamente cobrados pela CEF, tendo em vista não ter sido comprovado dolo ou má fé da instituição financeira. 11. A indenização por danos morais visa compensar os prejuízos ao interesse extrapatrimonial sofridos pelo ofendido, que não são, por sua natureza, ressarcíveis, e não se confundem com os danos patrimoniais, estes sim, suscetíveis de recomposição ou, se impossível, de indenização pecuniária. 12. O tempo decorrido desde o prazo final para entrega do imóvel dos proponentes é relevante, sendo apto a determinar abalos morais acima de meros aborrecimentos, mormente porque relacionado ao direito social básico de moradia, tornando devida a indenização por danos morais. 13. É indispensável que exista uma mínima correlação entre o valor pedido a título de danos morais e os fatos trazidos a Juízo. 14. Esta Primeira Turma tem adotado o entendimento segundo o qual, na hipótese de cumulação de pedidos de proveito material e moral, o valor da indenização a título de danos morais deve ser fixado sem excesso, adequando-se aos parâmetros consolidados pela jurisprudência, que, em casos análogos à espécie, o vem estimando no valor total de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 15. Matéria preliminar rejeitada. Recurso da CEF parcialmente provido. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000680-16.2022.4.03.6140, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HERBERT CORNELIO PIETER DE BRUYN JUNIOR, julgado em 24/03/2025, DJEN DATA: 27/03/2025) APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. PMCMV. FAIXAS DE RENDA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. LUCROS CESSANTES. DANOS MORAIS. - Por se tratar de ação indenizatória, que tem por objetivo a condenação da parte ré em danos materiais e morais, deve-se aplicar o prazo prescricional geral, estabelecido no art. 205 do Código Civil. Precedentes do C. STJ. - No âmbito do PMCMV, quando o contrato está relacionado à Faixa 1, a CEF atua como verdadeira gestora de políticas públicas, subsidiando a aquisição de moradias para a população de baixa renda, por meio de recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Nas demais faixas de renda do PMCMV, também se configura a responsabilidade da CEF (e, consequentemente, sua legitimidade processual), pois a atuação da instituição financeira vai além da análise de risco de crédito, efetivamente fiscalizando e gerenciando a obra, além de verificar se o imóvel e o devedor cumprem os requisitos legais para enquadramento no Programa. - Ao examinar as cláusulas padrões desses contratos de adesão, observa-se que é permitido à CEF, p. ex., autorizar a prorrogação do prazo para conclusão da obra, substituir a construtora em casos de modificação do projeto, não conclusão da obra dentro do prazo contratual, retardamento ou paralisação da obra, dentre outras hipóteses. Ademais, o PMCMV é política pública habitacional (urbana e rural) destinada a garantir à população de baixa renda (Faixas 1, 2 e 3) o direito fundamental à moradia, que conta com subvenção econômica estatal e privada (p. ex., FNHIS, FAR, FGTS, FGHab e Funcap), cuja gestão operacional é realizada pela CEF, mediante pagamento de remuneração específica, conforme disposição expressa do art. 9º e parágrafo único, da Lei nº 11.977/2009, bem como do art. 6º, §20, da Lei nº 14.620/2023. Daí decorre a legitimidade processual da CEF em se tratando de PMCMV. - A atuação da CEF no caso concreto não se restringe à de agente financeiro, vez que financia a construção de um empreendimento habitacional que se enquadra nas regras de programa de habitação popular, com poderes para verificar os requisitos legais concernentes ao imóvel, à construtora e ao adquirente/beneficiário, além de fiscalizar o andamento da obra, atuando como executora de políticas públicas. - O atraso na entrega da obra é inconteste, de modo que tanto a CEF quanto a construtora deram causa aos infortúnios pelos quais passou a parte autora, descumprindo o prazo estipulado no contrato para que o imóvel adquirido lhe fosse entregue, sendo devida a reparação. - “No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma” (Tema 996 do C. STJ). - A narrativa acima demonstra que a falha na prestação do serviço, pelas rés, ultrapassou o mero dissabor, impondo-se reparação, notadamente em razão do atraso na entrega da obra, que perdura por mais de 10 anos, causando apreensão e angústia à parte autora, especialmente quanto à incerteza de vir a residir no imóvel adquirido. Assim, é devida a indenização por dano moral. - É excessiva a quantia de R$ 15.000,00 para a indenização a título de danos morais, que deve ser reduzida para o montante de R$ 10.000,00, eis que tal importância não proporcionará enriquecimento indevido e exagerado da parte autora e, ainda, é capaz de impor punição à parte ré, mormente na direção de evitar atuação reincidente. - Preliminares rejeitadas. Apelação provida em parte. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001866-96.2021.4.03.6144, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 26/08/2024, Intimação via sistema DATA: 29/08/2024) Ainda, destaco que a questão acerca da comprovação do pagamento dos valores referentes aos lucros cessantes deverá ser analisada em sede de liquidação de sentença, momento adequado para a apuração exata dos valores devidos ao autor com os acréscimos de juros e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal da 3ª Região. Por fim, mantenho o entendimento de ser incabível a fixação de multa diária para cumprimento da presente sentença ante o arbitramento de lucros cessantes. Dos honorários recursais Por fim, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, em atenção aos parâmetros do art. 85, § 2º do CPC, especialmente no tocante ao zelo profissional e ao trabalho despendido em grau recursal, majoro em 1% (um por cento) o montante fixado na instância de origem a título de honorários advocatícios a serem pagos pelas apelantes, totalizando 11% (onze por cento) sobre o valor da condenação. Ante o exposto, nego provimento às apelações das corrés, nos termos da fundamentação supra. Publique-se. Intimem-se. Decorrido o prazo legal, baixem os autos ao MM. Juízo de Origem, observadas as cautelas de estilo. São Paulo, data da assinatura digital. RENATA LOTUFO Desembargadora Federal
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