Processo nº 5000295-78.2025.4.03.6135
ID: 291527371
Tribunal: TRF3
Órgão: 1ª Vara Federal de Caraguatatuba
Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL
Nº Processo: 5000295-78.2025.4.03.6135
Data de Disponibilização:
06/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARIANA BRANCATTI DE MORO CARDOSO
OAB/SP XXXXXX
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MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5000295-78.2025.4.03.6135 / 1ª Vara Federal de Caraguatatuba IMPETRANTE: FABIO GONCALVES CHIAPPETTA Advogado do(a) IMPETRANTE: MARIANA BRANCATTI DE MORO CARDOSO - …
MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5000295-78.2025.4.03.6135 / 1ª Vara Federal de Caraguatatuba IMPETRANTE: FABIO GONCALVES CHIAPPETTA Advogado do(a) IMPETRANTE: MARIANA BRANCATTI DE MORO CARDOSO - SP331895 IMPETRADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO) FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL D E C I S Ã O Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por FABIO GONCALVES CHIAPPETTA em face do DELEGADO DA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP, objetivando concessão de ordem para afastar o ato coator praticado pela Receita Federal do Brasil que impediu o ingresso da impetrante ao Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE, bem como determinar a inclusão da impetrante no PERSE para usufruir de todos os benefícios fiscais previstos na Lei nº 14.148/2021, em virtude da ilegalidade das condições estabelecidas na Portaria ME nº 7.163/2021 e do Ato Declaratório Executivo nº 2/2025 que impôs a extinção do benefício fiscal do PERSE baseado no artigo 4ª-A da Lei nº 14.148/2021. Narra, em síntese, que os principais benefícios do Programa são: (i) possibilidade de renegociar dívidas com descontos de até 70% (setenta por cento) sobre o valor total e no prazo de até 145 (cento e quarenta e cinco) meses; (ii) contratação de operações de crédito com instituições financeiras públicas e privadas sem a observância de diversas condições legais; (iii) Redução a zero das alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep, da Cofins e da CSLL incidentes sobre o seu resultado durante os próximos 05 anos; e (iv) e Recebimento de Indenização baseada nas despesas com empregados durante a Pandemia do COVID-19 para empresas que tiveram redução superior a 50% (cinquenta por cento) no faturamento entre 2019 e 2020. Aduz que o artigo 2º, §2º, da Lei nº 14.148/2021, dispôs que as atividades econômicas que seriam enquadradas no programa estariam listadas em ato a ser publicado pelo Ministério da Economia, o que veio a ser concretizado com a edição da Portaria ME nº 7.163/2021. Esclarece que requereu a adesão ao PERSE, contudo, o sistema da Receita Federal do Brasil não autorizou a adesão, em virtude da previsão da Portaria do Ministério da Economia nº 7.163/21, a qual restringiu o alcance dos benefícios concedidos pelo PERSE a empresas que, embora cumprissem os requisitos estabelecidos na Lei nº 14.148/2021 e possuíssem CNAE que estivesse enquadrado no Programa, necessitariam de inscrição preexistente no CADASTUR desde maio de 2021. Argumenta que a referida portaria (ato administrativo) exorbitou o poder regulamentar e se sobrepôs à lei (ato normativo), à proporção que criou outras condições para adesão ao programa emergencial que não estavam previstas na legislação. No seu entender, uma portaria não pode ir além do que a lei ordinária dispôs, não pode limitar direitos não restritos pela legislação, sob pena de violação dos princípios constitucionais da hierarquia das normas, da reserva legal, da legalidade, da isonomia e da segurança jurídica. Finalmente, esclarece que foi editada a Medida Provisória nº 1.202/2023, de 28/12/2023 que, dentre outras restrições impostas ao contribuinte, adotou a revogação de incentivos fiscais (alíquota zero) relacionados ao setor de eventos, do denominado PERSE, não só para empresas regularmente cadastradas no CADASTUR, como também aquelas cujo CADASTUR era optativo. Além disso, o artigo 4º-A introduzido na Lei nº 14.148/2021 impôs um limitador orçamentário como condicionante para a extinção total e imediata da alíquota zero do PERSE. O limite imposto é de R$ 15 bilhões para o “custo fiscal de gasto tributário”, a ser apurado pela Receita Federal do Brasil entre os meses de abril de 2024 e dezembro de 2026 que, em seguida, editou o Ato Declaratório Executivo nº 2/2025. A petição inicial foi instruída com documentos. É o relatório. DECIDO. O mandado de segurança é ação constitucional prevista no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal de 1988. Atualmente regido pela Lei nº 12.016/2009, objetiva proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça (artigo 1º). A via estreita do Mandado de Segurança também exige prova pré-constituída do direito alegado (artigo 1º, Lei nº 12.016/2009) e, neste caso concreto, a questão central consiste na devida aferição quanto ao procedimento regular ou irregular no estabelecimento de critérios para eleger empresas beneficiárias do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE previsto na Lei nº 14.148/2021, regulamentada pela Portaria ME nº 7.163/2021 e alterada pela Medida Provisória nº 1.202, de 28 de dezembro de 2023, bem como extinção do benefício fiscal com fulcro no limitador orçamentário previsto no artigo 4º-A da Lei nº 14.148/2021. Em um exame inicial dos fatos, estão presentes os pressupostos necessários à concessão da liminar requerida. Verifico da análise dos autos que os fundamentos alegados pela impetrante se enquadram nas hipóteses explícitas da legislação específica, porque houve em tese irregularidade na conduta da autoridade impetrada. As disposições da Lei nº 14.148/2021 trazem ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da Covid-19, instituindo o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE) e o Programa de Garantia aos Setores Críticos (PGSC). O PERSE foi instituído com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos pudesse mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública causado pela Pandemia da Covid-19 e reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20/03/2020. Vê-se que a intenção do legislador não foi indiscriminada para favorecer toda e qualquer empresa no âmbito nacional, ao contrário disso, o legislador buscou agasalhar fatia do mercado composta pelas empresas efetivamente ligadas ao Setor de Eventos, conforme disposto no artigo 1º e no artigo 2º da referida lei: “O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º Esta Lei estabelece ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de isolamento ou de quarentena realizadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19. Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. § 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente: I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos; II - hotelaria em geral; III - administração de salas de exibição cinematográfica; e IV - prestação de serviços turísticos, conforme o art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008. § 2º Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo. (...)” Conforme se lê literalmente o §1º acima transcrito, as pessoas jurídicas contempladas pelo benefício legal são aquelas que exercem as atividades econômicas enumeradas nos incisos que se seguem. O verbo exercer no tempo presente indica que o intuito do legislador foi alcançar as pessoas jurídicas que, ao tempo da inovação legal, já desempenhassem de fato atividades próprias do setor de eventos. Desse modo, o Fisco cercou a benesse fiscal de cautelas e exigências para inibir empresas oportunistas que, embora desempenhem atividades próprias que não se relacionem ao Setor de Eventos, pretendam disfarçar a posteriori seu vínculo com esse setor visando usufruir do programa pela via transversa. Com a finalidade de regulamentar a Lei nº 14.148/2021, o Ministério da Economia editou a Portaria ME nº 7.163/2021 e a Portaria ME nº 11.266/2022, indicando os códigos CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) que estariam contemplados pelo PERSE e explicitando a necessidade das empresas elegíveis ao PERSE possuírem situação cadastral regular perante o CADASTUR (Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos do Ministério do Turismo) quando da publicação da lei: “PORTARIA ME Nº 7.163, DE 21 DE JUNHO DE 2021 Define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021. O MINISTRO DE ESTADO DA ECONOMIA, no uso da atribuição que lhe confere o inciso II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e tendo em vista o disposto no § 2º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, , resolve: Art. 1º Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II. § 1º As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I a esta Portaria se enquadram no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - Perse. § 2º As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008. Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.” “PORTARIA ME Nº 11.266, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2022 Define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE abrangidos pelo disposto no art. 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021. O MINISTRO DE ESTADO DA ECONOMIA, substituto, no uso da atribuição que lhe confere o inciso II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2022, resolve: Art. 1º Esta Portaria define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE abrangidos pelo disposto no art. 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021. Art. 2º As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, em 18 de março de 2022, as atividades econômicas relacionadas nos Anexos I e II desta Portaria poderão usufruir do benefício de alíquota zero instituído pelo art. 4º da Lei nº 14.148, de 2021. Parágrafo único. A fruição do benefício previsto no caput pelas pessoas jurídicas que exerciam as atividades econômicas relacionadas no Anexo II fica condicionada à regularidade, em 18 de março de 2022, de sua situação perante o Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), nos termos dos arts. 21 e 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008. Art. 3º Esta Portaria entra em vigor no dia 1° de janeiro de 2023.” A Lei nº 14.1148/2021 no artigo 3º, §2º, inciso I, preconizou que a transação concernente ao PERSE “ (...) poderá ser realizada por adesão, na forma e nas condições constantes da regulamentação específica (...)”, delegando para ato infralegal o esclarecimento dos demais requisitos e pormenores necessários à adesão ao programa (o que foi disciplinado na Portaria ME nº 7.163/2021). Infere-se que a portaria supramencionada está em conformidade com a Lei nº 14.148/2021, porque não inovou no ordenamento jurídico e tão-somente expôs a necessidade de identificar as empresas eleitas ao PERSE com base na lista de CNAE e na regularidade de inscrição no CADASTUR, afinal o programa PERSE se restringe às pessoas jurídicas que atuavam no Setor de Turismo. A norma administrativa não exorbita de seu poder regulamentar em face da instituição do benefício fiscal, porque condicionar a adesão ao PERSE à regularidade de cadastro no CADASTUR é mera decorrência daquilo que a lei do programa dispõe, configurando um instrumento de identificação do contribuinte tanto quanto é o instrumento do número no CNAE (tais instrumentos CNAE e CADASTUR buscam conferir efetividade à própria lei). A jurisprudência do E. Tribunal Regional Federal da Terceira Região tem precedentes a esse respeito, não antevendo possíveis ilegalidades ou inconstitucionalidades nas exigências estampadas pela Portaria ME nº 7.163/2021: “EMENTA: TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADESÃO DE RESTAURANTE NO PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS (PERSE). AUSÊNCIA DE CADASTRO NO CADASTUR: IMPOSSIBILIDADE. 1. Ao instituir o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE) – com o objetivo de mitigar as perdas suportadas pelo setor de eventos em decorrência da COVID-19 –, a Lei Federal nº 14.148/21 enumerou as atividades econômicas que considerou pertencentes àquela categoria (eventos), dentre as quais citou: “prestação de serviços turísticos”. Delegou ao Ministério da Economia a publicação dos códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se beneficiariam com o programa. 2. A Portaria ME n.º 7.163, de 21 de junho de 2021, trouxe a lista de códigos CNAE considerados “prestadores de serviços turísticos”, para fins de enquadramento na hipótese do inciso IV do § 1º do artigo 2º da Lei nº 14.148/21, dentre os quais constava o código 5611-2/01 (Restaurantes e similares). A mesma norma ressaltou: “Art. 1º (...) § 2º As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.” 3. A norma não extrapolou os limites legais, eis que a hipótese de inclusão no PERSE prevista no inciso IV faz referência expressa à regra do artigo 21, da Lei Federal n.º 11.771/08. A mesma lei obriga o cadastro dos prestadores de serviços turísticos junto ao Ministério do Turismo (artigo 22). 4. Agravo de instrumento não provido.” (TRF – 3ª REGIÃO, Agravo de Instrumento nº 5012939-33.2022.4.03.0000, Relator Desembargador Federal PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Sexta Turma, j. 10/10/2022, Intimação via sistema DATA: 13/10/2022) “EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS – PERSE. LEI N. 14.148/2021. PORTARIA ME N. 7.163/2021. LEGALIDADE. MANTIDA A DECISÃO AGRAVADA. 1. O provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos, sendo certo, ainda, que o recurso apresentado pela agravante não trouxe nada de novo que pudesse infirmar o quanto decidido. 2. Decisão agravada mantida por seus próprios fundamentos. 3. Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, que preceitua que "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Precedentes do E. STF e do C. STJ. 4. A própria Lei n. 14.181/2021 estipulou, no artigo 3º, que a transação poderá ser realizada por adesão, na forma e nas condições constantes da regulamentação específica. 5. A exigência quanto à comprovação de cadastro junto ao Ministério do Turismo, no momento da publicação da lei, prevista na Portaria ME n. 7.163/2021, no momento da publicação da lei, não desborda da lei instituidora, como defendido pela agravante. 6. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” (TRF – 3ª REGIÃO, Agravo de Instrumento nº 5021402-61.2022.4.03.0000, Relatora Desembargadora Federal MARLI MARQUES FERREIRA, Quarta Turma, j. 08/02/2023, Intimação via sistema DATA: 10/02/2023) “EMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO. TUTELA DE URGÊNCIA. LEI 14.148/2021. PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS – “PERSE”. REGISTRO PRÉVIO NO MINISTÉRIO DO TURISMO. CADASTUR. PORTARIA ME 7.163/2021. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. 1. Consolidada a jurisprudência no sentido de que concessão de tutela de urgência exige mínima e concreta demonstração de fumus boni iuris e periculum in mora, nos termos do artigo 300 do CPC e, no caso de mandado de segurança, em conformidade com a previsão do artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009.No contexto da legislação específica e da jurisprudência consolidada, mera narrativa de periculum in mora, de forma genérica, abstrata, subjetiva ou condicionada, não se presta a demonstrar o cumprimento do requisito legal obrigatório para concessão de tutela provisória de urgência, seja em ação originária, seja na instância recursal. 2. A Lei 14.148/2021 instituiu o denominado Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE, com objetivo “de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020” (artigo 2º), possibilitando ao Executivo, entre outras medidas, a disponibilização de “modalidades de renegociação de dívidas tributárias e não tributárias, incluídas aquelas para com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), nos termos e nas condições previstos na Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020” (artigo 3º), bem como redução à “0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas de que trata o art. 2º desta Lei: I - Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição PIS/Pasep); II - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); III - Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); e IV - Imposto sobre a Renda das Pessoas Juridicas (IRPJ)” (artigo 4º). 3. Estipulou o artigo 22 da Lei 11.771/2008 a obrigatoriedade, para empresas atuantes no ramo de serviços turísticos, de cadastro junto Ministério do Turismo, o que regulamentado pela Portaria ME 7.163/2021, que “define os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021”. No caso, enquanto publicada a Lei 14.148/2021 em 04/05/2021, a agravante obteve inscrição regular junto ao Cadastur apenas em 28/04/2022, quase um ano após a entrada em vigor do ato legal, o que afasta a probabilidade do direito vindicado. 4. Os benefícios concedidos, especialmente de natureza tributária, podem ser objeto de normas complementares, nos termos do artigo 100, CTN, interpretando-se literalmente a legislação tributária que trate de suspensão ou exclusão de crédito tributário, outorga de isenção e dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias (artigo 111, CTN). A conjugação das Leis 14.148/2021 e 11.771/2008 evidencia que somente podem atuar como prestadores de serviços turísticos os previamente cadastrados no Ministério do Turismo, de modo que o benefício fiscal concedido a partir da Lei 14.148/2021 somente poderia atingir quem já atuava regularmente no setor, mediante registro da atividade, dada a própria natureza emergencial e temporária das ações adotadas para compensação das medidas de isolamento ou de quarentena no enfrentamento da pandemia sanitária. A legislação delimitou o alcance das pessoas jurídicas contempladas com o benefício fiscal, dela excluindo, claramente, diante de sua própria finalidade, a prestação de serviço de turismo irregular porque sem prévio cadastro junto ao Ministério do Turismo, ou a atuação econômica em período distinto e posterior ao atingido pelos efeitos da política para cuja compensação excepcional foi instituída a legislação em referência. A política de compensação excepcional não se destinou a toda e qualquer pessoa jurídica do setor de turismo, mas exclusivamente para aquelas que, previamente cadastradas conforme a lei, atuaram e sofreram os efeitos das políticas de restrição da pandemia no respectivo período. 5. É certo, pois, que a portaria ministerial não inovou o ordenamento legal, mas apenas a disciplinou de acordo com a finalidade, conteúdo e objeto da própria legislação, explicitando o alcance nela materialmente contido, conforme tem sido reconhecido pela jurisprudência da Corte, razão pela qual a pretensão de afastar a delimitação - que, como visto, decorre não da portaria em si, mas do regime vigente, seja a Lei 14.148/2021, que instituiu regime de benefícios, seja a Lei 11.771/2008, que trata da disciplina da prestação dos serviços de turismo - incorre em ilegalidade, ao almejar a ampliação do benefício fiscal, em detrimento não apenas do princípio da legalidade, como o da interpretação literal da legislação tributária em casos que tais. 6. Agravo de instrumento desprovido.” (TRF – 3ª REGIÃO, Agravo de Instrumento nº 5027552-58.2022.4.03.0000, Relator Desembargador Federal LUÍS CARLOS HIROKI MUTA, Terceira Turma, j. 16/02/2023, Intimação via sistema DATA: 17/02/2023) No caso concreto, faz-se indispensável destacar que o parcelamento é causa de suspensão do crédito tributário (artigo 151, VI, CTN) e, como configura favor fiscal opcional oferecido ao contribuinte, exige interpretação literal (artigo 111, CTN), a qual proíbe a ampliação para resultar dispensa do pagamento de tributo (artigo 108, §2º, CTN). Nesse panorama, o programa de parcelamento é aquele previsto em lei, não aquele que a parte pretende usufruir, consoante o perfil econômico-financeiro que entender conveniente ou sem as limitações (de prazo e modo) que reputar desconfortáveis. O referido programa PERSE sujeita-se ao princípio da estrita legalidade e se caracteriza por sua natureza de adesão. Dessa maneira, ao contribuinte só resta anuir com os termos instituídos, com o procedimento a ser adotado e com as cláusulas do favor concedido pelo Fisco. Salvo melhor juízo, a atividade básica empresarial ou da natureza dos serviços prestados pela empresa a terceiros é informação crucial para verificar se a empresa integra o Setor de Turismo. A documentação carreada aos autos revela que o CNAE da impetrante tem relação com turismo, “56.11-2-01 – Restaurantes e similares” (ID 365018419). Tais informações servem de base para afirmar que a impetrante é do ramo do turismo. Há de se averiguar prova concreta de que a impetrante desempenha atividades no setor turístico, o que ocorreu no presente caso. O próprio registro da empresa no CADASTUR (Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos do Ministério do Turismo) mostra que sua atividade se relaciona ao Setor de Turismo e autoriza a este Juízo verificar o liame de atuação da empresa no ramo turístico (ID 365018420). Em relação à Medida Provisória nº 1.202, de 28 de dezembro de 2023, que revoga os benefícios fiscais de que tratam o artigo 4º, da Lei nº 14.148/2021, verifica-se que a isenção foi concedida pelo prazo determinado de 60 (sessenta) meses e o artigo 178, do Código Tributário Nacional, veda sua revogação ou sua modificação a qualquer tempo para prevalecer a segurança jurídica, in verbis: “Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104.” A manobra orçamentária disposta no artigo 4º-A, da Lei nº 14.148/2021, com redação dada pela Lei nº 14.859/2024, como pretexto para extinguir a isenção fiscal não tem o condão de fulminar o benefício fiscal daquele contribuinte que preencheu todos requisitos para fruí-lo anteriormente à edição da lei modificadora. Eis o que diz o artigo 4º-A, da Lei nº 14.148/2021: “Art. 4º-A. O benefício fiscal estabelecido no art. 4º terá o seu custo fiscal de gasto tributário fixado, nos meses de abril de 2024 a dezembro de 2026, no valor máximo de R$ 15.000.000.000,00 (quinze bilhões de reais), o qual será demonstrado pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil em relatórios bimestrais de acompanhamento, contendo exclusivamente os valores da redução dos tributos das pessoas jurídicas de que trata o art. 4º que foram consideradas habilitadas na forma do art. 4º-B desta Lei, com desagregação dos valores por item da CNAE e por forma de apuração da base de cálculo do IRPJ, sendo discriminados no relatório os valores de redução de tributos que sejam objeto de discussão judicial não transitada em julgado, ficando o benefício fiscal extinto a partir do mês subsequente àquele em que for demonstrado pelo Poder Executivo em audiência pública do Congresso Nacional que o custo fiscal acumulado atingiu o limite fixado. (Incluído pela Lei nº 14.859, de 2024)” Em obediência à norma acima, a Receita Federal do Brasil editou o Ato Declaratório Executivo RFB nº 2/2025, para tornar pública a demonstração do preenchimento do limite orçamentário previsto no referido artigo 4º-A, da Lei nº 14.148/2021, nos seguintes termos: “Art. 1º A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil torna pública a demonstração do atingimento do limite previsto no art. 4º-A da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, realizada em audiência pública no Congresso Nacional, no dia 12 de março de 2025, a partir das 10h30, no Plenário nº 2 do Anexo Luís Eduardo Magalhães da Câmara dos Deputados, conforme comunicado datado de 6 de março de 2025 do Presidente da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização, com a consequente extinção do benefício fiscal para os fatos geradores a partir do mês de abril de 2025. Art. 2º O relatório bimestral e a listagem completa das pessoas jurídicas habilitadas para fruição do benefício fiscal concedido no âmbito do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - Perse e os correspondentes valores de benefícios fruídos a partir de abril de 2024, no site da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil na Internet, no endereço
. Art. 3º Este Ato Declaratório Executivo entra em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União.” A isenção fiscal veiculada originalmente no artigo 4º, caput, da Lei nº 14.148/2021 foi concedida por um lapso temporal definido e acompanhada de determinadas ações do contribuinte beneficiário para que ele pudesse dela usufruir. Em razão de tais características, isto é, tempo determinado e contrapartida do contribuinte (artigo 4º-B, da Lei nº 14.148/2021), não é possível se falar em revogação da isenção onerosa, devido à proteção conferida ao direito adquirido de seu beneficiário. A empresa, nessa hipótese legal, à primeira vista tem direito de permanecer usufruindo dos benefícios previstos no art. 4º da Lei nº 14.148/2021 (redução a zero das alíquotas de PIS, COFINS, IRPJ E CSLL), porque o benefício fiscal foi inicialmente concedido por prazo determinado de sessenta meses. O contribuinte que preenche os requisitos legais possui justa expectativa de contar com tal desoneração fiscal, para fins de planejamento tributário entre outras implicações relativas ao exercício de sua atividade econômica. Vislumbra-se neste momento processual a presença de prova inequívoca e verossimilhança das alegações, estando presente a evidência da probabilidade do direito (“fumus boni iuris”) – Lei nº 12.016/2009, art. 7º, inciso III. Outrossim, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (“periculum in mora”) restou demonstrado documentalmente, à medida que a ação objetiva suspender a exigibilidade de cobrança tida por indevida; portanto, é evidente que existe o risco de ineficácia da medida, caso seja apenas finalmente deferida, já que até isso ocorrer o contribuinte estará sujeito à vetusta e odiosa fórmula do "solve et repete", bem como estará exposto a protesto do título executivo e negativação nos cadastros de inadimplentes, nisso residindo o fundado receio de dano de difícil reparação. Em face do exposto, presentes os pressupostos necessários do artigo 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009, concedo a liminar com fundamento nos artigos 3º e seguintes da Lei nº 14.148/2021 para suspender os efeitos do ato coator e autorizar a impetrante a aderir ao PERSE (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos), usufruindo de todos os benefícios previstos na Lei nº 14.148/2021, afastando os efeitos da Medida Provisória nº 1.202/2023 e os efeitos do Ato Declaratório Executivo RFB nº 2/2025 publicado com base no artigo 4º-A, da Lei nº 14.148/2021 (introduzido pela Lei nº 14.859/2024). Notifique-se à autoridade impetrada para que preste as informações, no prazo legal de 10 (dez) dias, na forma do art. 7º, I, da Lei nº 12.016/2009. Deverá a autoridade impetrada, no prazo acima assinalado, também esclarecer detalhadamente os procedimentos fiscais realizados, inclusive considerando os fundamentos expostos neste mandado de segurança, instruindo-se a notificação com cópia desta decisão, da petição inicial e dos documentos que a instruem. Intime-se o órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, nos termos do inciso II do artigo 7º da Lei nº 12.016/2009, dando-lhe ciência desta ação para que venha a ingressar no feito, caso entenda necessário, no prazo de 10 (dez) dias. Oportunamente, abra-se vista dos autos ao Ministério Público Federal. Visando dar efetividade à garantia estabelecida no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, servirá cópia da presente decisão como OFÍCIO e MANDADO DE INTIMAÇÃO, que deverá ser encaminhada para cumprimento. Intime(m)-se. Cumpra-se. CARAGUATATUBA, na data da assinatura. BRUNO LUIZ AVELLAR SILVA Juiz Federal Substituto
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