Processo nº 5298197-80.2024.8.09.0024
ID: 308969388
Tribunal: TJGO
Órgão: 2ª Câmara Cível
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5298197-80.2024.8.09.0024
Data de Disponibilização:
26/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DENISE NAHAS DE GOUVEA BARBOSA
OAB/GO XXXXXX
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EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO CONTRATUAL DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. INVESTIDORA OCASIONAL. CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA. TAXA DE FRUIÇÃO. COMISSÃO DE C…
EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO CONTRATUAL DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. INVESTIDORA OCASIONAL. CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA. TAXA DE FRUIÇÃO. COMISSÃO DE CORRETAGEM. PARCELAMENTO DE RESTITUIÇÃO. APLICAÇÃO DO CDC. RECURSO DESPROVIDO.I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação de rescisão contratual cumulada com restituição de quantias pagas e indenização por danos morais, declarando a resolução de contrato de promessa de compra e venda de lote urbano, condenando a parte ré à devolução das parcelas pagas, com retenção de 25% e aplicação do IGPM, além do pagamento das custas e honorários advocatícios.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há seis questões em discussão: (i) definir se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor à relação contratual em exame; (ii) estabelecer a validade e os limites da cláusula penal prevista no contrato; (iii) determinar se é devida a taxa de fruição pelo uso do imóvel; (iv) verificar a legalidade da cobrança da comissão de corretagem; (v) decidir sobre o parcelamento da restituição dos valores pagos; (vi) definir o índice aplicável para correção monetária.III. RAZÕES DE DECIDIR3. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor à hipótese, pois, mesmo tendo o imóvel sido adquirido para investimento, não restou demonstrado que a parte autora atua profissionalmente no mercado imobiliário, caracterizando-se como investidora ocasional e hipossuficiente informacionalmente, conforme a teoria finalista mitigada.4. A cláusula penal estipulada em 20% sobre os valores pagos é válida e compatível com a jurisprudência do STJ, devendo prevalecer frente à fixação judicial de 25%, embora mantida por força da vedação à reformatio in pejus, já que apenas a parte ré interpôs recurso.5. É indevida a cobrança de taxa de fruição em contratos de promessa de compra e venda de terrenos não edificados, nos termos do entendimento consolidado pelo STJ, diante da inexistência de efetiva posse ou uso econômico do imóvel.6. A comissão de corretagem não pode ser exigida do comprador sem cláusula expressa e informação clara e destacada sobre o valor, o que não se verificou no caso concreto, caracterizando falha no dever de informação e prática abusiva.7. O pedido de parcelamento da restituição deve ser rejeitado, pois o contrato foi celebrado antes da vigência da Lei nº 13.786/2018, sendo aplicável a Súmula nº 543 do STJ, que determina a devolução imediata e em parcela única.8. A aplicação da Taxa SELIC é afastada, tendo em vista a existência de cláusula contratual estipulando o IGPM como índice de correção monetária, em consonância com o princípio do pacta sunt servanda e a autonomia privada.IV. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.Tese de julgamento:"1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor à aquisição de imóvel por investidor ocasional não profissional, diante da hipossuficiência informacional.”“2. A cláusula penal estipulada contratualmente deve prevalecer, não sendo admissível sua majoração judicial na ausência de recurso da parte favorecida.”“3. É indevida a cobrança de taxa de fruição em contratos de promessa de compra e venda de terrenos não edificados.”“4. A comissão de corretagem não pode ser cobrada do comprador sem cláusula expressa e informação prévia e destacada do valor.”“5. Em contratos celebrados antes da vigência da Lei nº 13.786/2018, os valores pagos devem ser restituídos de forma imediata e em parcela única, conforme a Súmula 543 do STJ.”“6. Prevalece o índice de correção monetária contratualmente pactuado, afastando-se a aplicação subsidiária da Taxa SELIC.”
PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁSGabinete do Desembargador Rodrigo de Silveira2ª Câmara Cível - gab.rsilveira@tjgo.jus.brAPELAÇÃO CÍVEL N. 5298197-80.2024.8.09.0024 COMARCA DE CALDAS NOVASAPELANTE: CIA MELHORAMENTOS DE CALDAS NOVASAPELADA: MARILENE COSTARELATOR: Desembargador RODRIGO DE SILVEIRA VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo.Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação cível interposto por CIA MELHORAMENTOS DE CALDAS NOVAS contra a sentença prolatada pelo Juízo da 2ª Vara (Cível, Faz Públicas Estadual e Residual e Registros Públicos) da Comarca de Caldas Novas, nos autos da ação rescisão contratual c/c restituição de quantia paga e indenização por danos morais ajuizada por MARILENE COSTA em desfavor da apelante. Após regular tramitação processual, o juízo de origem julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para (mov. 39): revisar e declarar a resolução do contrato de promessa de compra e venda entabulado entre as partes; condenar a parte requerida a restituir à autora, de forma única e imediata, o montante das parcelas efetivamente pagas, corrigido monetariamente pelo índice estabelecido no contrato (IGPM), a partir dos efetivos desembolsos, e com incidência de juros de mora de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado, sendo permitida apenas a dedução única de 25% sobre o total pago. Ante a sucumbência mínima da parte autora, condenou a requerida ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, eis que ainda não liquidada a condenação, nos termos dos artigos 85, § 2º e 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil.Irresignada, a apelante interpôs o presente recurso (mov. 50), em síntese requer: a) A inaplicabilidade do código do consumidor, pelo simples fato do “consumidor” não ser o destinatário final; b) A reforma da sentença para aplicação da cláusula 15ª do contrato de compra e venda ou, subsidiariamente, a consideração da culpa da autora pela rescisão imotivada, autorizando a retenção de 10% do valor atualizado do contrato e da comissão de corretagem; c) A condenação da parte apelada ao pagamento de taxa de fruição pela posse do imóvel; d) A aplicação da taxa SELIC para correção dos créditos oriundos da presente ação, nos termos do art. 406 do Código Civil, a qual deverá incidir a partir do trânsito em julgado da sentença; e) A restituição dos valores pagos de forma parcelada, em até 12 vezes, conforme art. 32-A, §1º da L. 6.766/1979; e, f) A condenação da parte apelada ao pagamento de honorários sucumbenciais, custas processuais e demais cominações legais.DA (IN)APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.Sustenta-se nas razões de apelação, que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) não deve ser aplicado ao caso, pois a autora não seria destinatária final do imóvel adquirido. Alega que a apelada comprou o lote em Caldas Novas com fins de investimento, e não para uso próprio, conforme demonstraria sua residência em outra cidade (Sorriso/MT). Cita jurisprudência para reforçar que, em situações em que a aquisição tem cunho especulativo ou comercial, o CDC é inaplicável. Argumenta, ainda, que a autora não comprovou hipossuficiência ou verossimilhança das alegações, o que impediria a inversão do ônus da prova e a aplicação da proteção especial conferida pelo CDC.Não obstante as alegações trazidas pela apelante, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em casos de aquisição de imóveis por pessoa física para fins de investimento, e não para uso próprio, deve ser analisada à luz da condição de destinatário final do bem e, para fins da Teoria Finalista Mitigada, da eventual hipossuficiência do comprador — seja técnica, econômica ou informacional.Caso o comprador realize a aquisição com finalidade de exploração econômica ou com propósito de investimento profissional e reiterado, não se enquadrando como destinatário final do bem, não há como aplicar o CDC.Segundo a jurisprudência do STJ, “o adquirente de unidade imobiliária, mesmo não sendo o destinatário final do bem e apenas possuindo o intuito de investir ou auferir lucro, poderá encontrar abrigo da legislação consumerista com base na teoria finalista mitigada se tiver agido de boa-fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem expertise em incorporação, construção e venda de imóveis, sendo evidente a sua vulnerabilidade. Em outras palavras, o CDC poderá ser utilizado para amparar concretamente o investidor ocasional (figura do consumidor investidor) (REsp 1.785.802/SP, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/2/2019, DJe de 6/3/2019). Esse é exatamente o caso dos autos. Ainda que a apelada resida em Estado diverso daquele em que se encontra o imóvel adquirido (Caldas Novas), no máximo ela poderia ser considerada investidora ocasional, uma vez que não há evidências nos autos de que atue no ramo imobiliário. Sendo assim, agiu corretamente o juízo de origem ao aplicar o Código de Defesa do Consumidor ao presente caso.DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS A SEREM APLICADASA presente ação foi ajuizada com o objetivo de rescindir contrato de promessa de compra e venda celebrado em 01/09/2016, referente ao Lote 06 da Quadra 153, no loteamento Lagoa Quente de Caldas Novas, pelo valor de R$ 139.000,00.Ressalte-se, desde logo, que não se aplica ao caso a Lei nº 13.786/2018 (Lei do Distrato), porquanto o contrato foi firmado anteriormente à sua vigência. Assim, a controvérsia deve ser analisada à luz da legislação então vigente, notadamente o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor.A parte autora fundamenta o pedido na impossibilidade de continuidade do pagamento das parcelas contratadas, demonstrando, assim, desinteresse na manutenção do vínculo contratual. Cuida-se, portanto, de resolução por iniciativa da compradora, por inadimplemento decorrente de dificuldades financeiras – situação comum nas relações consumeristas envolvendo aquisição de imóveis.Nesse contexto, é pacífico o entendimento de que a resolução contratual deve ser guiada pelos princípios da boa-fé objetiva, equilíbrio contratual e função social do contrato, assegurando ao promitente comprador o direito à restituição das quantias pagas, com a devida atualização monetária, autorizando-se a retenção apenas na proporção necessária para compensar eventuais prejuízos sofridos pela vendedora, evitando-se o enriquecimento sem causa.O contrato firmado entre as partes prevê, em sua Cláusula 15ª, §1º, alínea “C”, a retenção de 10% sobre o valor atualizado do contrato a título de lucros cessantes e, na alínea “D”, a perda de 20% das parcelas pagas para fins de ressarcimento de despesas operacionais, administrativas e comissões (mov. 30, doc. 2).Contudo, a cumulação dessas penalidades revela-se desproporcional e incompatível com os princípios do Direito Contratual Contemporâneo. A retenção de 10% do valor total do contrato, a título de lucros cessantes, configura previsão genérica e desvinculada de comprovação concreta de prejuízo. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema 970, firmou entendimento de que não se admite a cumulação de cláusula penal compensatória com lucros cessantes, sob pena de bis in idem, pois a penalidade contratual tem como finalidade justamente compensar as perdas e danos.Nesse sentido:APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR . AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/ INDENIZAÇÃO. CLÁUSULA PENAL COMPENSATÓRIA. LUCROS CESSANTES. CUMULAÇÃO . IMPOSSIBILIDADE. LUCROS CESSANTES. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA . 1. A cláusula penal compensatória não aceita qualquer indenização suplementar, pois tem como característica pré-fixar os danos decorrentes do inadimplemento total, compensando, assim, os danos. Inteligência dos arts. 410 e 416 do CC . Precedentes. 1.1. No caso, necessário o pagamento da cláusula compensatória prevista no contrato, sem, entretanto, cumulá-la com o pagamento de lucros cessantes, inclusive, considerando que o seu valor é mais benéfico ao consumidor . 2. Honorários advocatícios majorados. Art. 85, § 11, do CPC . 3.Recurso conhecido e provido. Sentença reformada. (TJ-DF 07247528820218070001 1646969, Relator.: ROMULO DE ARAUJO MENDES, Data de Julgamento: 07/12/2022, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: 14/12/2022)(Grifei) Por sua vez, é consolidada a jurisprudência do STJ no sentido de que, nas hipóteses de rescisão por iniciativa do comprador, admite-se a retenção entre 10% e 25% do valor pago, conforme as circunstâncias do caso concreto:AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL-DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA DEMANDADA. 1. Nos termos da jurisprudência do STJ, as arras confirmatórias não podem ser objeto de retenção na resolução de contrato de compra e venda por culpa do comprador. Incidência da Súmula 83 do STJ.2. A correção monetária das parcelas pagas, para efeitos de restituição, incide sobre cada desembolso. Incidência da Súmula 83 do STJ.3. Com relação à devolução das despesas com rateio e seguro, afasta-se o óbice da Súmula 284 do STF, já que a agravante apontou divergência jurisprudencial na interpretação dos artigos 51 da Lei 4.591/64, 2º da Lei 4.864/65 e 20 do Decreto-Lei 73/66.3.1. O acórdão recorrido encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte, a qual entende que o percentual de retenção de 25% (vinte e cinco por cento) dos valores pagos pelos adquirentes é adequado para indenizar o construtor das despesas gerais. (REsp 1723519/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/08/2019, DJe 02/10/2019). 4. Agravo interno parcialmente provido para tão somente afastar a incidência da Súmula 284 do STF, mantido o desprovimento ao agravo em recurso especial.(AgInt no AREsp n. 2.063.990/RJ, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 1/9/2022)(Grifei) Ocorre que a sentença, embora tenha afastado corretamente a cumulação de lucros cessantes com a cláusula penal, acabou por fixar, de ofício, percentual único de 25% a título de recomposição global dos prejuízos. Essa providência, no entanto, excede os limites do contrato celebrado entre as partes, que expressamente previu a cláusula penal compensatória em 20%, sem previsão de sua majoração.Ainda que se reconheça a possibilidade de o magistrado revisar cláusulas abusivas ou desproporcionais, não se mostra juridicamente admissível majorar cláusula penal previamente estipulada, especialmente diante da ausência de comprovação de danos concretos adicionais. A cláusula penal, nos termos do art. 416 do Código Civil, substitui as perdas e danos, salvo disposição contratual expressa em sentido contrário – o que não se verifica nos autos.Ressalte-se, por fim, que apenas a parte ré interpôs recurso, limitando sua pretensão ao reconhecimento da validade da cláusula penal contratualmente estipulada em 20%. Assim, ainda que se reconheça que a fixação judicial de 25% extrapolou os limites previamente pactuados, a ausência de impugnação pela parte autora impede qualquer redução do percentual, sob pena de violação ao princípio da non reformatio in pejus.Diante disso, embora a sentença tenha ultrapassado o montante contratualmente estabelecido, impõe-se sua manutenção, por força dos limites recursais e da vedação legal à reformatio in pejus.DA TAXA DE FRUIÇÃOA apelante defende o direito à indenização pela fruição do imóvel, mesmo sem edificação, com base no entendimento de que o comprador teve posse do lote e poderia dele usufruir. Argumenta que, após a rescisão, o comprador deve ressarcir o vendedor pelo uso do bem, sob pena de enriquecimento sem causa. Fundamenta-se em jurisprudência do STJ que reconhece a taxa de ocupação como compensação pelo uso do imóvel durante a vigência do contrato. Por isso, requer a aplicação da taxa de 0,25% sobre o valor do contrato, a título de indenização pela posse do terreno até a efetiva devolução.O contrato entabulado entre as partes prevê na cláusula 15ª o seguinte:E) INDENIZAÇÃO DE 0,25% (ZERO VÍRGULA VINTE E CINCO POR CENTO), AO MÊS, DO VALOR ATUALIZADO DESTE CONTRATO, A TÍTULO DE RESSARCIMENTO PELA OCUPAÇÃO, EXPLORAÇÃO E ALUGUEL DO LOTE/TERRENO (FRUIÇÃO), DURANTE O PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A DATA DE ASSINATURA E RESCISÃO DESTE CONTRATO, OU A DEVOLUÇÃO DA POSSE PRECÁRIA À VENDEDORA, CONSIDERANDO O QUE OCORRER POR ÚLTIMO. Nesse sentido, das disposições contratuais acima transcritas, evidencia-se a previsão de que, caracterizado a rescisão do contrato, a taxa de fruição será no percentual de 0,25% (zero vírgula vinte e cinco por cento) ao mês sobre o valor atualizado do imóvel, “durante o período compreendido entre a data de assinatura e rescisão deste contrato, ou a devolução da posse precária à vendedora, considerando o que ocorrer por último.”A taxa e fruição destina-se a afastar o enriquecimento sem causa de qualquer das partes (art. 844 do CC), tendo como requisitos “[…] o enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos […]” (STJ, EREsp 1.523.744/RS, Corte Especial, DJe 13/03/2019).Entretanto, de acordo com a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “é descabido o pagamento de taxa de fruição na hipótese de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de terreno não edificado, tendo em vista a ausência dos requisitos para configuração do enriquecimento sem causa” ( AgInt no REsp 2.060.756/SP , Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE , Terceira Turma, julgado em 5/6/2023, DJe de 9/6/2023). Sendo assim, agiu acertadamente o juízo de origem ao afastar a aplicação da cláusula 15ª, “E”, que prevê o pagamento de taxa de fruição. DA COMISSÃO DE CORRETAGEM.A apelante sustenta que a quantia paga a título de "entrada/sinal" na verdade corresponde à comissão de corretagem, devida ao corretor que intermediou a venda. Alega que o serviço foi prestado integralmente, justificando o pagamento, mesmo com a posterior rescisão do contrato. Invoca o artigo 725 do Código Civil e jurisprudência do STJ, que reconhecem a validade da cláusula que transfere ao comprador o pagamento da comissão, desde que previamente informada. Requer, portanto, a reforma da sentença para reconhecer a legalidade da cobrança da comissão de corretagem.O Tema 938 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabelece que a cláusula contratual que transfere ao comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem é válida, desde que previamente informado o preço total da aquisição, com destaque do valor correspondente à comissão. Na ausência de previsão contratual expressa, a jurisprudência tem entendido que a cobrança da comissão de corretagem é indevida, sendo cabível a restituição dos valores pagos. Não obstante os argumentos da apelante, no presente caso não há previsão contratual expressa que atribua ao consumidor a obrigação de pagar diretamente a comissão de corretagem, tampouco consta informação clara e destacada acerca do valor da comissão, separada do montante pago a título de “entrada/sinal”. Essa ambiguidade quanto à destinação dos valores pagos compromete o dever de informação previsto no artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, podendo configurar prática abusiva, nos termos do artigo 39, inciso V, do mesmo diploma legal.Nesse sentido:Recurso inominado. Repetição de Indébito em Contrato de Compra e Venda de Unidade Imobiliária tipo "Chalé". Causa sujeita à legislação consumerista. Valor da "entrada/sinal inicial" que se confunde com "comissão de corretagem" . TEMA 938 do STJ. Confusão contratual consistente na ausência de informação precisa da finalidade do pagamento da quantia, fazendo com que o consumidor pagasse a “entrada/sinal inicial”, mas que na verdade não se sabe se de fato é, ou se trata de corretagem. Recurso a que se dá parcial provimento, para determinar a restituição simples da quantia paga. (TJ-SP – RI: 10012701120198260185 SP 1001270-11.2019.8.26.0185, Relator.: Adílson Vagner Ballotti, Data de Julgamento: 26/03/2020, 2ª Turma Cível e Criminal, Data de Publicação: 30/03/2020)APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE IMPORTÂNCIAS PAGAS. INSTRUMENTO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. RESCISÃO UNILATERAL. RESPONSABILIDADE DO COMPRADOR. COMISSÃO DE CORRETAGEM. PREVISÃO CONTRATUAL. INFORMAÇÃO CLARA E PRECISA. RETENÇÃO DEVIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO. 1. É válida a cláusula contratual que transfere ao promitente comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição, com destaque do valor pago a título de comissão de corretagem, cuja matéria foi objeto de julgamento em sede de recurso repetitivo (REsp nº 1.551.956). 2. Rescindido o contrato por culpa do comprador, é devida a retenção da taxa de corretagem, porquanto no caso em discussão foi previamente informado no pacto o preço total da aquisição do imóvel, com destaque do valor pago a esse título. 3. Com o desprovimento do recurso, os honorários recursais devem ser majorados. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO – AC: 50515967320198090024 CALDAS NOVAS, Relator.: Des. Fernando Braga Viggiano, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 06/11/2023) Dessa forma, embora a apelante alegue que o valor pago corresponde à corretagem, a inexistência de cláusula contratual que fundamente essa cobrança, aliada à ausência de transparência na distinção entre entrada e comissão, conduz à rejeição do pedido recursal nesse ponto.DO PARCELAMENTO E DA APLICAÇÃO DA TAXA SELIC.A apelante requer, inicialmente, que a restituição dos valores pagos pela autora ocorra de forma parcelada, em até 12 vezes, nos termos do art. 32-A, §1º, da Lei nº 6.766/79 (Lei do Distrato), destacando que não há cláusula contratual que disponha em sentido diverso. Além disso, defende a aplicação da Taxa SELIC como índice de atualização dos valores devidos, por se tratar de índice que contempla, de forma unificada, correção monetária e juros moratórios, evitando, assim, a incidência em duplicidade (bis in idem). Para tanto, ampara-se no art. 406 do Código Civil e em precedentes do Superior Tribunal de JustiçaQuanto ao pedido de restituição, verifico que o contrato foi celebrado em 01/09/2016, antes da vigência da Lei nº 13.786/2018 (Lei do Distrato Imobiliário). Diante disso, aplica-se o entendimento consolidado na Súmula nº 543 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os valores pagos devem ser restituídos de forma imediata e em parcela única.Nesse sentido:EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. RESCISÃO CONTRATUAL E RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS. DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. LEI DO DISTRATO. INAPLICABILIDADE. IRRETROATIVIDADE. ENCERRAMENTO CONTRATUAL PELO PROMITENTE COMPRADOR. RESTITUIÇÃO PARCIAL DOS VALORES PAGOS. DEVOLUÇÃO IMEDIATA. IMPOSSIBILIDADE DE PARCELAMENTO. SÚMULA N. 543 DO STJ. CLÁUSULA PENAL. PERCENTUAL RAZOÁVEL. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. 1. As disposições da Lei Federal n. 13.786/2018 (Lei do Distrato) somente se aplicam aos contratos firmados após a sua vigência, em atenção ao princípio da irretroatividade das leis. 2. Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. Súmula 543 do STJ. (…) 4. Os valores a serem restituídos sofrerão correção monetária pelo INPC, pois índice mais favorável ao consumidor, contando a partir do desembolso de cada parcela paga; outro canto, os juros de mora são de 1% (um por cento) ao mês, a partir do trânsito em julgado da decisão, a par do Tema Repetitivo 1002 do Superior Tribunal de Justiça. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-GO – Apelação Cível: 5686996-13.2022.8.09.0051 GOIÂNIA, Relator.: Des. SEBASTIÃO LUIZ FLEURY, 7ª Câmara Cível, Data de Publicação: 07/06/2024) Dessa forma, não há amparo legal ou contratual para o deferimento do pedido de parcelamento da restituição.No que tange à aplicação da Taxa SELIC como critério de atualização dos valores a serem restituídos em razão da rescisão contratual de compra e venda de imóvel, esta somente se justifica na ausência de cláusula contratual específica que disponha sobre o índice de correção monetária aplicável. Tal entendimento encontra respaldo no artigo 406 do Código Civil, segundo o qual, na falta de estipulação contratual, os juros moratórios devem ser fixados conforme a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de tributos federais, ou seja, a SELIC, que, como se sabe, engloba juros de mora e correção monetária.Contudo, no caso em análise, observa-se que as partes convencionaram expressamente a aplicação do IGPM como índice de atualização monetária, conforme disposto na Cláusula 2ª do contrato (mov. 1, doc. 6, fl. 3). A existência de cláusula contratual clara e válida acerca do índice de correção afasta a incidência subsidiária da Taxa SELIC.Tal entendimento encontra respaldo na jurisprudência deste Tribunal, que reconhece a validade da pactuação expressa quanto ao índice de correção monetária:APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C RESSARCIMENTO DE PERDAS E DANOS E TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINARES. ERROR IN PROCEDENDO E JULGAMENTO EXTRA PETITA AFASTADOS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. PERCENTUAL DE RETENÇÃO. FORMA DE RESTITUIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. (…) VI. A taxa SELIC será adotada somente quando não houver convenção sobre a forma de correção no contrato (art. 406, do CC). VII. Restando prevista em contrato a incidência da correção monetária pelo Índice Geral de Preços Mercado (IGP-M), impõe-se a reforma, de ofício, da sentença a fim de fazer valer sua aplicação. VIII. De acordo com o art. 86, do CPC, se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA DE OFÍCIO. (TJ-GO 52309400920228090024, Relator.: RONNIE PAES SANDRE, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/03/2023) Dessa forma, mostra-se inviável a aplicação da Taxa SELIC ao presente caso, devendo prevalecer o índice contratualmente estipulado (IGPM) para fins de correção monetária dos valores a serem eventualmente restituídos, em conformidade com o princípio do pacta sunt servanda e a boa-fé objetiva. Assim, agiu acertadamente o juízo de origem ao aplicar o índice previsto no contrato. ANTE O EXPOSTO, conheço da apelação cível mas nego-lhe provimento, mantendo inalterada a sentença recorrida. De consequência, majoro os honorários advocatícios sucumbenciais com fundamento no §11, do art. 85, do Código de Processo Civil para 12% sobre o valor atualizado da causa.É como voto.Goiânia, data da assinatura eletrônica.Desembargador RODRIGO DE SILVEIRARelator ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Cível nº 5298197-80.2024.8.09.0024.Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Quarta Turma Julgadora de sua Segunda Câmara Cível, à unanimidade de votos, em conhecer da Apelação Cível e negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator.Presidente da sessão, Relator e Votantes nominados no extrato de ata de julgamento.A Procuradoria-Geral de Justiça esteve representada pelo membro também indicado no extrato da ata. (Datado e assinado em sistema próprio).Desembargador RODRIGO DE SILVEIRARelator
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