Processo nº 5028973-03.2025.4.04.7000
ID: 290666966
Tribunal: TRF4
Órgão: 11ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PETIçãO CíVEL
Nº Processo: 5028973-03.2025.4.04.7000
Data de Disponibilização:
06/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DANIELA DA SILVA ALMEIDA
OAB/SP XXXXXX
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PETIÇÃO Nº 5028973-03.2025.4.04.7000/PR
REQUERENTE
: CHARLEX INDUSTRIA TEXTIL LTDA
ADVOGADO(A)
: DANIELA DA SILVA ALMEIDA (OAB SP502246)
DESPACHO/DECISÃO
I - RELATÓRIO
Em 29 de maio de 2025, a empre…
PETIÇÃO Nº 5028973-03.2025.4.04.7000/PR
REQUERENTE
: CHARLEX INDUSTRIA TEXTIL LTDA
ADVOGADO(A)
: DANIELA DA SILVA ALMEIDA (OAB SP502246)
DESPACHO/DECISÃO
I - RELATÓRIO
Em 29 de maio de 2025, a empresa CHARLEX INDÚSTRIA TÊXTIL EIRELI ingressou com a presente demanda, sob o rito comum, em face de UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL e INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (IBAMA), pretendendo a anulação de cobrança de TCFA - taxa de controle e fiscalização ambiental.
Para tanto, a autora disse atuar no setor de fabricação, importação, exportação por conta própria ou de terceiros, de fios de tecidos de qualquer natureza e origem. Até 2019 ela também teria atuado como tinturaria, atividade ensejadora de cobrança de taxa de controle e fiscalização ambiental - CFA. Disse ter deixado de atuar no referido setor no início de 2020, de modo que a tinturaria teria sido terceirizada para outras entidades mercantis.
A despeito da interrupção das atividades de tinturaria, ela teria sido notificada do lançamento de TCFA, promovido em 20/02/2025, compreendendo os fatos geradores alegadamente havidos entre abril/2019 e março/2024, o que sustentou ser indevido, por conta da atividade econômica por ela efetivamente executada no período.
Ela postulou a declaração da ilegalidade da cobrança do tributo em causa e requereu a concessão da antecipação dos efeitos da tutela, diante do risco de propositura da execução fiscal correspondente. Ela detalhou seus pedidos, atribuiu à causa o valor de R$ 28.185,98 (vinte e oito mil cento e oitenta e cinco reais e noventa e oito centavos).
II - FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Competência da Justiça Federal:
A Justiça Federal é competente para a presente causa, dado que a pretensão foi endereçada em face do IBAMA, autarquia federal, criada com força na
lei n. 7.735, de 22 de fevereiro de 1989
, bem como à União Federal, sendo aplicáveis ao caso o art. 109, I, Constituição e 10, lei n. 5.010/66.
2.2. Submissão do caso ao rito dos Juizados:
A competência dos Juizados Especiais Federais é absoluta, diante do previsto no art. 98, I, Constituição e art. 3º da lei n. 10.259, de 2001. Logo, em princípio, não pode ser ampliada ou reduzida, impondo sua apreciação de ofício pelo Poder Judiciário, conforme art. 64, CPC.
Não se submetem à "
competência do Juizado Especial Cível as causas: (...) para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal
."
Convém ter em conta, todavia, que o processo é individualizado pela conjugação do trinômio partes, pedido e causa de pedir (art. 337, §2 CPC). Em decorrência do princípio da substanciação, a parte autora é obrigada a detalhar, na peça inicial, a sua pretensão, indicando o pedido e também a motivação do pedido. Note-se ainda que, como notório, apenas o dispositivo transita em julgado, conforme se infere do rt. 504, I, CPC:
"
Não fazem coisa julgada: I - os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença
."
Assim, como têm entendido os tribunais, os Juizados Especiais são competentes para apreciação de pretensões nas quais a alegada nulidade do ato administrativo é invocada apenas como causa de pedir, e não como pedido:
"(....) Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º , § 1º , III , da Lei 10.259 ,
uma vez que a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
. Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal."
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50446614920184047000 PR 5044661-49.2018.4.04.7000, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, Data de Julgamento: 02/04/2020).
Ainda segundo a Turma Recursal,
"O valor da causa atribuído pela parte autora é inferior a 60 salários, o qual não foi impugnado, logo, não há o que discutir quanto a esse aspecto.
Por outro lado, não é o caso de aplicação da exceção prevista no art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259, uma vez que "a autora invocou a alegada nulidade da revisão administrativa apenas como causa de pedir, dado que a sua pretensão é efetivamente condenatória
". Desse modo, firma-se a competência absoluta dos Juizados Especiais Federais para o julgamento do feito, nos termos do artigo 98, I, da Constituição Federal. "
(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50029127820204047001 PR 5002912-78.2020.4.04.7001, Relator: GERSON LUIZ ROCHA, 22/10/2020, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR)
Atente-se para os julgados que transcrevo abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA INSTAURADO ENTRE JUÍZO FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. COMPETÊNCIA DESTA E. CORTE. SÚMULA 428 DO STJ. AÇÃO INDIVIDUAL DE DISPENSA DE PAGAMENTO DE PEDÁGIO. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. VALOR DA CAUSA INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. PRECEDENTES DESTA 2ª SEÇÃO. CONFLITO PROCEDENTE. 1 - Nos termos da Súmula 428 do Superior Tribunal de Justiça, compete a esta E. Corte dirimir o presente conflito negativo de competência entre Juízo Federal e Juizado Especial Federal Cível. 2 - Busca a autora tão somente o reconhecimento de seu direito individual à dispensa do pagamento de pedágio na praça de arrecadação instalada no entroncamento das rodovias BR 153 e BR 369, localizada no município de Jacarezinho/PR, com fundamento na Portaria do Ministério dos Transportes nº 155/2004 bem como na sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 2006.70.13.002434-3. 3 -
A questão relativa à desconstituição de ato administrativo não faz parte do pedido do autor, que dela tratou apenas de forma incidental, como causa de pedir, de modo que, no caso dos autos, resta afastada a aplicação do art. 3º, § 1º, III, da Lei 10.259/01. Precedentes desta Segunda Seçã
o. 4 - Aplicável à hipótese em tela a regra geral prevista no caput do artigo 3º da Lei 10.259/2001, que estabelece a competência dos Juizados Especiais Federais em se tratando de causas com valor inferior a sessenta salários mínimos. 5 - Conflito procedente, para declarar a competência do Juizado Especial Federal Cível de Ourinhos/SP.Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o conflito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
(CC - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - 21150 0000310-88.2017.4.03.0000, DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, TRF3 - SEGUNDA SEÇÃO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/07/2017).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. AÇÃO ORDINÁRIA QUE VISA O RECONHECIMENTO DE DIREITO. MERA REVISÃO DO ATO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DO INCISO III DO §1º DO ARTIGO 3º DA LEI Nº 10.250/01. A
parte autora pleiteia a declaração de direito à percepção de determinada vantagem pecuniária, não havendo pedido imediato de anulação de qualquer ato administrativo, o qual só seria atingido via reflexa, razão pela qual não se aplica, na espécie, a regra que excepciona da competência dos Juizados Especiais Federais para causas valoradas até sessenta salários mínimos. Inaplicável ao caso a exceção prevista no inc. III do §1º do art. 3º da Lei nº 10.259/01
. (TRF4 5018358-17.2016.4.04.0000, SEGUNDA SEÇÃO, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 22/12/2016).
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. COMPETÊNCIA DO STJ PARA APRECIAR O CONFLITO. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. COMPETÊNCIA. CRITÉRIOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL EM FACE DO VALOR DA CAUSA. 1. A jurisprudência do STJ é no sentido de que juízo de juizado especial não está vinculado jurisdicionalmente ao tribunal com quem tem vínculo administrativo, razão pela qual o conflito entre ele e juízo comum caracteriza-se como conflito entre juízos não vinculados ao mesmo tribunal, o que determina a competência do STJ para dirimi-lo, nos termos do art. 105, I, d, da Constituição. Precedentes. 2. A Lei 10.259/01, que instituiu os Juizados Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, estabeleceu que a competência desses Juizados têm natureza absoluta e que, em matéria cível, obedece como regra geral a do valor da causa: são da sua competência as causas com valor de até sessenta salários mínimos (art. 3º). 3. A essa regra foram estabelecidas exceções ditadas (a) pela natureza da demanda ou do pedido (critério material), (b) pelo tipo de procedimento (critério processual) e (c) pelos figurantes da relação processual (critério subjetivo).
Entre as exceções fundadas no critério material está a das causas que dizem respeito a "anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal". 4. No caso, a demanda tem valor da causa inferior a sessenta salários mínimos e visa a obter indenização por danos morais. A ilegitimidade dos atos administrativos constitui apenas fundamento do pedido, não seu objeto
. 5. Conflito conhecido, declarando-se a competência do Juízo Federal da 7ª Vara do Juizado Especial Cível da Subseção Judiciária de São Luís -MA, o suscitante. (STJ, CC 75314/MA, 1ª Seção, Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ 27/08/2007).
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXCEÇÃO DO ART. 3º, § 1º, INC. III, DA LEI Nº 10.259/01 AFASTADA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
A pretensão formulada nesta ação não se enquadra em nenhuma das hipóteses arroladas no § 1º do art. 3º da Lei nº 10.259, visto não tratar a ação de anulação ou cancelamento de ato administrativo típico.
O pedido envolve, apenas, reconhecimento de direito. Sendo o valor da causa inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, cabe ao Juizado Especial Federal a competência para processar, conciliar e julgar as causas de competência da Justiça Federal
. (TRF4, conflito de competência (Seção) Nº 5008065-61.2011.404.0000, 2ª Seção, Des. Federal VILSON DARÓS, POR UNANIMIDADE, em 08/09/11).
Assim, e atribuído à causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tem-se que competente para o processamento e julgamento da lide o Juizado Especial Federal
. Diante do exposto, nos termos do disposto no art. 120, § único, do CPC, conheço do presente conflito e declaro competente para o processamento e julgamento da lide o juízo suscitado (Juízo Substituto da 1ª Vara de Florianópolis). Publique-se. Comuniquem-se os juízos conflitantes e, com as formalidades de estilo, dê-se baixa na distribuição e arquivem-se os autos.
(TRF4 5013834-11.2015.404.0000, Segunda Seção, Relator Candido Alfredo Silva Leal Junior, 11/07/2015)
Eventual complexidade da demanda não afasta a sua submissão à alçada dos Juizados Especiais Federais, diante do disposto no art. 98, I, Constituição/88 e art. 3 da lei n. 10.259/2001:
"
Não há óbice na Lei nº 10.259/01 a produção de prova pericial nos processos de competência do Juizado Especial Federal. Ao contrário, há previsão expressa no seu Art. 12 relativa a realização de prova técnica. 2. É entendimento assente na jurisprudência que a complexidade da prova necessária ao julgamento da controvérsia não é incompatível com o rito do JEF, sendo certo que o legislador elegeu como único critério de delimitação de sua competência o valor da causa 3. Agravo de instrumento desprovido
."
(TRF-3 - AI: 50174760920214030000 SP, Relator: Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, Data de Julgamento: 07/12/2021, 10ª Turma, 10/12/2021).
No caso em exame, a autora atribuiu à causa o valor de R$ 28.185,98. Aludido montante não supera o limite de 60 salários mínimos, atentando-se para o decreto de 30 de dezembro de 2024 (valor do salário mínimo mensal: R$ 1.518,00, redundando no limite de R$ 91.080,00).
Ao que consta, a empresa é uma EIRELI, podendo caracterizar, em princípio, empresa de pequeno porte, o que aparentemente atende ao art. 6º, I, da Lei 10.259/2001 e lei complementar 123/2006. A questão deverá ser elucidada com indicação da receita bruta anual da demandante, para os fins do art. 3. da lei complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Por ora, parto da premissa de que se cuida de empresa de reduzido porte.
No caso, o pedido de anulação alcançou apenas lançamento tributário, não havendo pedido semelhante quanto a eventuais protestos. Logo, a causa deve tramitar sob o rito dos Juizados, cuja competência é absoluta.
2.3.
Competência da presente Subseção
de Curitiba:
Em princípio, poder-se-ia cogitar da competência do Juízo do local em que, se procedente a pretensão do autor, a obrigação em questão deva ser cumprida - art. 53, III, "d", CPC. Reporto-me, ademais, ao art. 3º, §3º, da lei n. 109.259/2001,
"
No foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta
."
Registro, porém, que o STF tem aplicado o art. 109,§2º, CF, também quando em causa pretensões endereçadas às autarquias federais e empresas públicas federais.
CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA. CAUSAS AJUIZADAS CONTRA A UNIÃO. ART. 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CRITÉRIO DE FIXAÇÃO DO FORO COMPETENTE. APLICABILIDADE ÀS AUTARQUIAS FEDERAIS, INCLUSIVE AO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. I - A faculdade atribuída ao autor quanto à escolha do foro competente entre os indicados no art. 109, § 2º, da Constituição Federal para julgar as ações propostas contra a União tem por escopo facilitar o acesso ao Poder Judiciário àqueles que se encontram afastados das sedes das autarquias. II –
Em situação semelhante à da União, as autarquias federais possuem representação em todo o território nacional. III - As autarquias federais gozam, de maneira geral, dos mesmos privilégios e vantagens processuais concedidos ao ente político a que pertencem. IV - A pretendida fixação do foro competente com base no art. 100, IV, a, do CPC nas ações propostas contra as autarquias federais resultaria na concessão de vantagem processual não estabelecida para a União, ente maior, que possui foro privilegiado limitado pelo referido dispositivo constitucional. V - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem decidido pela incidência do disposto no art. 109, § 2º, da Constituição Federal às autarquias federais. Precedentes. VI - Recurso extraordinário conhecido e improvido
. (STF - RE: 627709 DF, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 20/08/2014, Tribunal Pleno, Data de Publicação: REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO)
Nesse mesmo sentido, convergem os julgados: RE 499.093-AgR-segundo/PR e AI 793.409/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski; RE 234.059/AL, Rel. Min. Menezes Direito; RE 484.235-AgR/MG, Rel. Min. Ellen Gracie; RE 488.704/RJ, RE 527.498/SC e RE 603.311/RS, Rel. Min. Marco Aurélio; RE 590.649/RJ, RE 474.691/SC e RE 491.331/SC, Rel. Min. Cármen Lúcia; RE 474.825/PR, Rel. Min. Dias Toffoli.
Acrescento que o art. 109, §2º, CF, prevalece sobre o art. 3º, §3º, da lei n. 10.259, de 2001. Com efeito,
"A competência absoluta dos Juizados Especiais, referida no art. 3º , § 3º , da Lei n. 10.259 /01 não constitui obstáculo à redistribuição para fins de equalização de acervo, desde que o encaminhamento ocorra para outra Vara com competência também vinculada ao sistema dos Juizados Especiais Federais. 5. A norma que afirma que "no foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta" tem ligação histórica com a interpretação dada pela doutrina e pela jurisprudência à Lei nº 9.099 /95, no sentido de que "o ajuizamento da ação perante o juizado especial é uma opção do autor (art. 3 ., par.3., da Lei 9.099 /95)" ( REsp 151.703/RJ , Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 24/03/1998, DJ 08/06/1998, p. 124). 6.
O ajuizamento obrigatório de causas de até 60 salários mínimos nos Juizados Especiais Federais empresta a essas ações uma competência absoluta para o próprio sistema dos Juizados Especiais, mas não torna essas ações infensas às medidas de equalização. Nada impede, portanto, a incidência do art. 109 , § 2º , da Constituição Federal , no sentido de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal
."
(TRF-4 - CC: 50799694420214047000 PR 5079969-44.2021.4.04.7000, Relator: NICOLAU KONKEL JÚNIOR, Data de Julgamento: 24/02/2022, 1. TR/PR)
Por conseguinte,
considerando o alcance do art. 109, §2, CF, a tramitação desta causa perante esta Subseção Judiciária está em conformidade com a legislação
. Ademais, a declinação de competência territorial depende de prévia exceção de incompetência, na forma do art. 65, CPC/15, e súmula 33, Superior Tribunal de Justiça.
2.4. Competência desta unidade jurisdicional:
Esta 11ª VF da Subseção de Curitiba foi especializada na temática ambiental, minerária, desapropriação, e nos direitos das nações nativas, dentre outas matérias, por meio da resolução 39, de 05 de abril de 2005/TRF4 (Vara Ambiental de Curitiba), sendo renomeada por meio da Resolução n. 99, de 11 de junho de 2013, também do TRF4. A competência foi modificada por meio da Resolução 23, de 13 de abril de 2016, com regionalização promovida pela Resolução 63, de 25, de julho de 2018, e pela Resolução 43, de 26 de abril de 2019, TRF4.
Por força da referida resolução n. 23, de 13 de abril de 2016
, do TRF4, a presente unidade passou a deter atribuições para apreciar questões pertinentes ao meio ambiente, natural ou urbano, conflitos minerários, desapropriação, terrenos de marinha, situados no litoral paranaense, dentre outros temas. Isso compreende o exame da TCFA - enquanto tributo com escopo extrafiscal ambiental.
Assim, a distribuição da demanda perante esta unidade jurisdicional se deu de modo escorreito, diante do contéudo da pretensão da parte autora.
2.5. Competência do Juízo Substituto:
A presente demanda submete-se à alçada do juízo substituto desta unidade jurisdicional, por conta de sorteio, envolvendo os dois juízos atuantes nesta 11.VF, o que atendeu à garantia do Juízo Natural -
art. 5, LIII, CF
.
2.6. Cogitada conexão com alguma execução fiscal:
O processualista Bruno Silveira Dantas enfatiza que
"
com o início de vigência do CPC/2015, será considerado prevento o juízo perante o qual houver ocorrido o registro ou a distribuição (conforme o caso) da primeira de uma série de demandas conexas, ainda que tal registro ou distribuição tenha ocorrido durante a vigência do CPC/1973
. Desde que a prevenção, ela própria, não se tenha consumado sob a égide do CPC/1973 (por um dos alternativos critérios previstos nos seus arts. 106 e 2019), incidirá de plano o disposto no art. 59 da codificação de 2015 definindo-se o juízo prevento para um conjunto de demandas conexas pela anterioridade dos registros ou das distribuições (conforme o caso) das mesmas. Os arts. 60 e 61 do CPC/2015, por sua vez, praticamente repetem os arts. 107 e 108 do CPC/1973, dispensando, por tal razão, maiores comentários a respeito nesta oportunidade."
(DANTAS, Bruno Silveira
in
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al.
Breves comentários ao novo código de processo civil.
São Paulo: RT, 2015, p. 229).
Convém ter em conta a lição de Araken de Assis, sobre o tema:
"(...) O art. 55, caput, definiu a conexão como a identidade de pedido ou de causa inspirado no propósito de erradicar as tergiversações constatadas na vigência do CPC de 1939. A proposição legislativa, excepcional no direito estrangeiro, porque prepondera a tendência de encarregar o órgão judicial de indicar os casos do fenômeno, consonante controvérsia haurida do direito comum, e feita em sentido oposto à do CPC de 1939, em todo caso revela-se incompleta e insuficiente. Não abrange a totalidade das hipóteses de conexão. O art. 55, § 3.º (“… mesmo sem conexão entre eles”) alude à conexão em sentido estrito do art. 55, caput. Ao nosso ver, os vínculos que geram o risco da prolação de “decisões conflitantes ou contraditórias”, a teor do art. 55, § 3.º, inserem-se na rubrica da conexão em sentido amplo. Não há outro sítio adequado para situar o liame entre os objetos litigiosos
O art. 113 do NCPC, arrolando os casos em que se admite a demanda conjunta, ou litisconsórcio, demonstra que existem outros laços, mais tênues e distantes, que autorizam o processo cumulativo. E a outro juízo não se chega ao avaliar o nexo exigido pelo art. 343 na reconvenção, como ocorria no direito anterior. Retira-se, daí, segura conclusão. As duas hipóteses descritas no art. 55, caput – identidade de causa ou identidade de pedido – constituem “uma, entre as várias em que ocorre a conexão”. Por isso, antes do CPC de 1939, descreveu-se a conexão como “laço envolvente, que se insinua por entre as relações jurídicas, ora prendendo-as de um modo indissolúvel, por forma a exigir uma única decisão; ora criando entre elas pontos de contato mais ou menos íntimo, que aconselham a reunião em um só processo, ainda quando possam ser decididas separadamente, sem maior dano, a não ser a lentidão e o gravame de maiores despesas”.
Exemplos de causas conexas, segundo a literalidade do art. 55, caput: (a) A reivindica o imóvel x perante B, e, paralelamente, C também reivindica o imóvel x, do mesmo réu, hipótese em que a identidade recai sobre o pedido (objeto) mediato; (b) o locatário A propõe consignatória dos aluguéis perante o locador B, o qual, de seu turno, propõe ação de despejo, fundada no inadimplemento dos aluguéis, perante o inquilino.
Para os efeitos da modificação da competência, as hipóteses contempladas no art. 55, caput – identidade de causa de pedir ou identidade de pedido –, então, ainda consideram-se exemplificativas. Um laço menos intenso já serve para reunir os processos. O objetivo da regra reside em evitar decisões conflitantes, “por isso a indagação sobre o objeto ou a causa de pedir, que o artigo por primeiro quer que seja comum, deve ser entendida em termos, não se exigindo a perfeita identidade, senão que haja um liame que os faça passíveis de decisão unificada”. Em outra oportunidade, reiterou-se que “não é necessário que se cuide de causas idênticas (quanto aos fundamentos e ao objeto {rectius: pedido})”, bastando “que as ações sejam análogas, semelhantes”, insistiu no “escopo da junção das demandas para um único julgamento é a mera possibilidade da superveniência de julgamentos discrepantes”
.
Por conseguinte, a jurisprudência, atendendo às finalidades da modificação da competência, em que a derrogação das regras gerais se justifica pela economia de atividade e pela erradicação do risco de julgamentos conflitantes, rejeita a exigência de identidade absoluta de causa ou de pedido, aceitando simples analogia entre as ações
. Porém, preocupa-se com o risco de julgamentos contraditórios, evento apurado caso a caso, mas verificado em todas as hipóteses do art. 113, inclusive na afinidade de ponto comum de direito ou de fato (inc. III). Ora, parece difícil visualizar semelhante risco no cúmulo simples de pedidos, em que há total autonomia das pretensões deduzidas, no mesmo processo, contra o réu. Por isso, o intuito de erradicar pronunciamentos conflitantes não oferece a única e constante justificativa para o processo cumulativo e, muito menos, a prorrogação da competência. Ao menos na conexão subjetiva, no caso da cumulação simples de pedidos, impera o princípio da economia processual. E, de toda sorte, as finalidades visadas no processo cumulativo, e na reunião de causas inicialmente autônomas, mostram-se estranhas à verdadeira causa desses fenômenos, que residiria no vínculo entre partes, causa e pedido." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume I. São Paulo: RT, 2015, tópico 302)
Trata-se de medida orientada a assegurar consistência e racionalidade na prestação jurisdicional, inibindo-se deliberações contraditórias. Assim, sempre que duas ou mais demandas apresentarem a mesma causa de pedir ou o mesmo pedido, é salutar que sejam reunidas perante o mesmo Juízo, para deliberação em conjunto, conforme preconiza o art. 50, §1, Código de Processo Civil/15.
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ALEGAÇÃO DE CONEXÃO. IDENTIDADE DE PEDIDO ENTRE AS AÇÕES E SEMELHANÇA NA CAUSA DE PEDIR. NECESSIDADE DE REUNIÃO DOS PROCESSOS PARA JULGAMENTO CONJUNTO PERANTE O MESMO JUÍZO. ARTIGO 55, "CAPUT" E 55, § 2º, DO CPC/15. -
Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir - Reconhecendo a identidade no pedido entre as ações e semelhança na causa de pedir, imperioso a reunião dos processos para análise perante o mesmo Juízo
- Deverão também ser reunidos os processos para julgamento conjunto quando possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles. (TJ-MG - CC: 10000170908776000 MG, Relator: Luiz Artur Hilário, Data de Julgamento: 03/06/0018, Data de Publicação: 14/06/2018)
Eventual conexão não ensejará, porém, redistribuição/reunião de processos, quando o processo atrativo já se encontre sentenciado. Afinal de contas, como registrei, a redistribuição de demandas por conta de conexão se destina a viabilizar julgamento conjunto. E, quando o processo atrativo já se encontra sentenciado, isso resta impossibilitado, sem prejuízo de eventual reunião do processo com outras demandas, porventura também conexas.
Atente-se para o art. 55, §1º, parte final, CPC/15:
"Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta,
salvo se um deles já houver sido sentenciado
."
Semelhante é o conteúdo da mencionada súmula 235, STJ:
"
A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado
."
2.7. Respeito ao Juízo natural e eventual execução:
Nos termos do art. 5, LIII, Constituição, é assegurada a todas as pessoas a garantia do Juízo Natural. Isso implica que, em regra, não é dado ao presente Juízo de 1. instância interferir em processos submetidos ao julgamento de outro magistrado.
Tanto por isso, em princípio, não caberia ao presente Juízo determinar a extinção de uma execução fiscal, porventura processada perante outra unidade jurisdicional, mesmo quando tenha conexão com o tema sentenciado nesse processo. Tampouco é o caso de suspender a exigibilidade de alegados créditos da Fazenda Pública, tema a ser submetido ao exame do Juízo natural pertinente.
A fim de evitar tais conflitos, no mais das vezes os Tribunais determinam a reunião de processos, por conta da conexão, contanto que as causas ainda não tenham sido sentenciadas
(súmula 235, Superior Tribunal de Justiça e parte final do art. 55, §1º, CPC/15).
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CONEXÃO DE AÇÕES. AÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL E AÇÃO ANULATÓRIA. 1.
Existindo conexão entre a ação anulatória de débito fiscal e a execução fiscal, deve haver a reunião dos processos para julgamento conjunto dos feitos no juízo da execução, em face da competência funcional absoluta deste órgão especializado
. 2. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo Suscitante.(TRF4 5014510-61.2012.404.0000, Primeira Seção, Relator p/ Acórdão Otávio Roberto Pamplona, D.E. 30/10/2012)
TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. AJG. EXECUÇÃO FICAL. AÇÃO ANULATÓRIA. CONEXÃO. 1. Na inicial do agravo a parte recorrente diz-se "requerida de AJG", de forma que, mesmo não tendo havido manifestação anterior, entendo que a questão deve ser revista. Concedo, então, a AJG, dispensando a parte do ônus de recolher o porte de remessa e retorno. 2.
A jurisprudência reconhece a conexão entre a ação anulatória do débito e a execução fiscal, mas, em se tratando de competência funcional e, portanto, absoluta, devem os autos da anulatória ser remetidos no juízo da Vara de Execuções Fiscais, e não o contrário, como quer a agravante
. Causa espécie, e põe em dúvida a real intenção da executada, o fato de ter ajuizado a ação anulatória em Juízo diverso daquele em que tramitavam a execução fiscal e os respectivos embargos, se a própria autora reconhece a conexão entre os feitos e a necessidade de julgamento conjunto. (AG 00148359220104040000, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 08/09/2010.)
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido que, conquanto se cogite de eventual conexão entre demanda anulatória e execução fiscal, versando sobre o mesmo suposto débito fiscal, isso não ensejaria a reunião dos processos
. Havendo justa causa, a anulatória poderia vaticinar a suspensão da execução fiscal porventura em curso.
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PRETENSÃO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO EXECUTIVO . CONEXÃO ENTRE EXECUÇÃO FISCAL E AÇÃO ANULATÓRIA. NÃO OCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE CAUSA SUSPENSIVA DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ACÓRDÃO CONSONANTE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ . PROVIMENTO NEGADO. 1. Trata-se de pretensão de suspensão da execução fiscal afastada pela Corte de origem, ante a ausência de conexão entre execução e ação ordinária (ação anulatória) e inexistência de causa suspensiva da exigibilidade do crédito. 2 .
O acórdão recorrido está em consonância com o entendimento das turmas da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmado no sentido da impossibilidade de serem reunidas execução fiscal e ação anulatória de débito precedentemente ajuizada, quando o juízo em que tramita esta última não é Vara Especializada em Execução Fiscal, nos termos consignados nas normas de organização judiciária
. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 1883576 SP 2020/0169831-7, Relator.: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 09/09/2024, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/09/2024)
No caso em exame, a parte autora sustentou que o cogitado débito teria sido inscrito em dívida ativa - CDA, instrumento hábil a ensejar a deflagração de execuções fiscais em desfavor da demandante.
De todo modo, não há maiores indicativos de que tal cobrança já tenha sido promovida pelo IBAMA. Ressalvo, também aqui, nova apreciação do tema adiante
.
2.8. Eventual violação à coisa julgada:
Como sabido, a coisa julgada é assegurada constitucionalmente, na forma do art. 5, XXXVI, Lei Maior/88, enquanto projeção da garantia da segurança jurídica. Eventual sentença transitada em julgada em regra não pode ser alterada pelo Juízo e tampouco pela parte atingida, salvo eventual celebração de acordo com a parte reconhecida como credora na decisão (lógica, por exemplo, do art. 190, CPC).
"A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que
haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei
, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal,
estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo STF, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade
. A superveniência de decisão do STF, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia ex tunc - como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 - RTJ 164/506-509 - RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, in abstracto, da Suprema Corte." (RE 592.912-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 3-4-2012, Segunda Turma, DJE de 22-11-2012.)
Atente-se também para a lição de Humberto Theodoro Jr.:
"A coisa julgada é fenômeno próprio do processo de conhecimento, cuja sentença tende a fazer extinguir a incerteza provocada pela lide instalada entre as partes. Mas fazer cessar a incerteza jurídica não significa apenas fazer conhecer a solução cabível, mas impô-la, tornando-a obrigatória para todos os sujeitos do processo, inclusive o próprio juiz. Às vezes, o comando sentencial tem de ser executado por meio de realização coativa da prestação devida pelo vencido. Outras vezes, a declaração apenas é suficiente para eliminar o foco da desavença. Nem sempre, portanto, o processo civil está predisposto a providências executivas. Há acertamentos condenatórios, mas há também os não condenatórios, que se desenvolvem em torno de pretensões constitutivas ou apenas declaratórias.
Uma vez, porém, concluído o acertamento da controvérsia, seja por sentença de imposição de sanção, seja por sentença puramente declaratória, a coisa julgada se estabelece com a mesma função, ou seja, a certeza jurídica em torno da relação controvertida se implanta com plenitude, vinculando as partes e o juiz.
Essa situação jurídica cristalizada pela coisa julgada caracteriza-se por dois aspectos fundamentais: de um lado, vincula definitivamente as partes; de outro, impede, partes e juiz, de restabelecer a mesma controvérsia não só no processo encerrado, como em qualquer outro.
Admite-se, dessa maneira, uma
função negativa
e uma
função positiva
para a coisa julgada. Pela função negativa exaure ela a
ação exercida
, excluindo a possibilidade de sua
reproposição
. Pela função positiva, “impõe às partes obediência ao julgado como norma
indiscutível
de disciplina das relações extrajudiciais entre elas e obriga a autoridade judiciária a ajustar-se a ela, nos pronunciamento que a pressuponham e que a ela se devem coordenar
” (
apud
NEVES, Celso.
Coisa Julgada Civil.
São Paulo: RT, 1971, p. 383-383).
A coisa julgada, por sua força vinculativa e impeditiva, não permite que partes e juiz escapem da definitiva sujeição aos efeitos do acertamento consumado no processo de conhecimento. O resultado prático é caber a qualquer dos litigantes “a
exceptio rei iudicatae,
para excluir novo debate sobre a relação jurídica decidida” (
apud
NEVES, Celso. Op. Cit, p. 489), e ao juiz o poder de, até mesmo de ofício, extinguir o processo sem julgamento do mérito, sempre que encontrar configurada a ofensa à coisa julgada (ar. 267, V e § 3º).
Portanto, quando o art. 467 fala em
indiscutibilidade
e
imutabilidade
da sentença transitada em julgado refere-se a duas coisas distintas: a) pela
imutabilidade
, as partes estão proibidas de propor ação idêntica àquela em que se estabeleceu a coisa julgada; b) pela
indiscutibilidade
, o juiz é que em novo processo, no qual se tenha de tomar a situação jurídica definida anteriormente pela coisa julgada como razão de decidir, não poderá reexaminá-la ou rejulgá-la; terá de tomá-la simplesmente como
premissa
indiscutível. No primeiro caso atua a força
proibitiva
(ou negativa) da coisa julgada, e, no segundo, sua força
normativa
(ou positiva)
." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Curso de Direito Processual Civil:
Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 587-588).
Nesse mesmo sentido, leiam-se também os seguintes julgados: RE 444.816, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 29-5-2012, Primeira Turma, DJE de 27-8-2012; RE 594.350, rel. min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 25-5-2010, DJE de 11-6-2010.
Segundo o conhecido art. 502, CPC/15,
"
Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso
.
" O art. 503, do mesmo código, preconiza que
"A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida."
Merece ênfase, ademais, o art. 508, CPC:
"Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido."
Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero são precisos quando enfatizam que
"
A coisa julgada pressuposto do discurso jurídico - constitui uma regra sobre o discurso. Não admite, nesse sentido, ponderação. Representa evidente agressão ao Estado Constitucional e ao próprio discurso jurídico a tentativa de relativizar a coisa julgada
."
(MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.
Código de processo cvil.
6. ed. rev. atual. São Paulo: RT, 2014, p. 449).
Desse modo, a sentença transitada em julgado não pode ser alterada ou desconsiderada pelo Juízo, conforme lógica do art. 508, CPC/15. Tal alteração apenas seria admissível em casos de negócio processual, avençado entre as partes, versando sobre pretensões disponíveis, conforme art. 190, CPC/15. Também seria cabível em hipótese de ação rescisória, interposta perante o Tribunal competente e com atenção ao prazo do art. 975, CPC/15; em caso de
querela nullitatis insanabilis
ou de declaração, pela Suprema Corte, da inconstitucionalidade de norma tomada como fundamento para prolação da sentença (art. 535, §4º, CPC).
Em primeiro e precário exame
, a pretensão deduzida na peça inicial não parece esbarrar na garantia da coisa julgada.
2.9. Cogitada litispendência:
A
vedação de
bis in idem
impede que haja duplicação de uma demanda já em trâmite, contanto que sejam idênticos os pedidos, causa de pedir e partes, conforme
art. 337, §2º, CPC/15
:
"Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido."
A respeito do tema, menciono o seguinte excerto:
"
Sob outra perspectiva, dentre as espécies de preclusão, em relação aos protagonistas do processo, há ainda a denominada preclusão pro iudicato, pela qual é vedado ao juiz decidir questão já julgada. Assim, a preclusão, normalmente, atinge a atividade das partes, mas, igualmente, pode também ocorrer em relação ao órgão jurisdicional, impondo-lhe o obstáculo de não mais poder decidir matéria de direito disponível, a qual, nos termos do caput do art. 505, foi objeto de precedente julgamento
.
Cumpre deixar claro que a vedação no sentido de desautorizar o juiz a rever anterior ato decisório concerne apenas questões de direito disponível, uma vez que, consoante o disposto no art. 485, § 3.º, do CPC, não alcança a matéria de ordem pública, que pode ser reexaminada, pelo próprio juiz da causa, até o momento de proferir sentença.
Fredie Didier Júnior, enfrentando está questão já sob as novas regras processuais, sustenta diferente opinião, trazendo inúmeros argumentos que convidam à reflexão. Embora entendendo que o art. 485, § 3.º, do CPC, autoriza a cognição em qualquer grau e tempo de jurisdição da matéria ali especificada, isso somente ocorrerá se não tiver sido precedentemente examinada: “convém precisar a correta interpretação que se deve dar ao enunciado do § 3.º do art. 485 do CPC. O que ali se permite é o conhecimento, a qualquer tempo, das questões relacionadas à admissibilidade do processo – não há preclusão para a verificação de tais questões, que podem ser conhecidas ex officio, até o trânsito em julgado da decisão final, mesmo pelos tribunais. Mas não há qualquer referência no texto legal à inexistência de preclusão em torno das questões já decididas.
Se fosse consistente esta linha de raciocínio, quando já decidida, por exemplo, em primeiro grau uma preliminar de natureza processual, não impugnada a decisão por meio do recurso cabível, o tribunal estaria impedido de reexaminá-la de ofício, porque coberta pela preclusão. Na verdade, o tribunal não só pode como deve enfrentar as questões de ordem pública, visto que não há se falar em preclusão pro iudicato sobre esta matéri
a.
Atualmente, vinga esse posicionamento em nossos tribunais, como, v.g., colhe-se em acórdão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no Agravo Regimental no Recurso Especial 1.377.422-PR, relatado pelo Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva: “Nos termos da jurisprudência desta Corte as matérias de ordem pública decididas por ocasião do despacho saneador não precluem, podendo ser suscitadas na apelação, ainda que a parte não tenha interposto o recurso de agravo”. Em senso análogo, a 2.ª Turma, a seu turno, por ocasião do julgamento do Recurso Especial 1.483.180-PE, com voto condutor do Ministro Herman Benjamin, assentou, à unanimidade de votos, que: “Esta Corte Superior possui entendimento consolidado de que as matérias de ordem pública decididas por ocasião do despacho saneador não precluem, podendo ser suscitadas na apelação, ainda que a parte não tenha interposto o recurso de agravo.
Tive oportunidade de examinar esta problemática sob a égide do CPC re- vogado, valendo-me da lição de Galeno Lacerda. [4]Na verdade, há ensinamentos que se perpetuam. Como a redação do atual caput do art. 505 é praticamente a mesma da anterior (art. 471), invoco mais uma vez a dou- trina do insigne processualista gaúcho, ainda atual, ao refutar a posição de Liebman, no sentido da impossibilidade de ser reavivado, no curso do pro- cesso, o exame acerca de questões cujo deslinde já havia sido coberto pela preclusão.
Com efeito, após sistematizar as nulidades processuais e tentar solucionar os problemas que defluíam da atividade saneadora do juiz, Galeno Lacerda afirmava que: “a violação de normas imperativas, ao contrário do que ocorre com a anulabilidade, deve ser declarada de ofício pelo magistrado. Enquanto, porém, a ofensa à lei reclamada pelo interesse público provoca nulidade insanável, a infração de preceito imperativo ditado em consideração a interesse da parte impede o juiz a tentar o suprimento, antes de declarar a nulidade. Ora, o problema da preclusão de decisões no curso do processo é substancialmente diverso do problema da preclusão das decisões terminativas. Enquanto nestas o magistrado esgota a jurisdição, extinguindo a relação processual, naquelas ele conserva a função jurisdicional, continua preso à relação do processo. Em face desta premissa, a pergunta se impõe:
Pode o magistrado, que conserva a jurisdição, fugir ao mandamento de norma imperativa, que o obriga a agir de ofício, sob pre- texto de que a decisão interlocutória precluiu? Reconhecido o próprio erro, poderá a falta de impugnação da parte impedi-lo de retratar-se? Terá esta com sua anuência, tal poder de disposição sobre a atividade ulterior do juiz? A resposta, evidentemente, no caso, deve ser negativa
. Se o juiz conserva a jurisdição, para ele não preclui a faculdade de reexaminar a questão julgada, desde que ela escape à disposição da parte, por emanar de norma processual imperativa. Daí se conclui que a preclusão no curso do processo depende, em última análise da disponibilidade da parte em relação à matéria decidida. Se indisponível a questão, a ausência de recurso não impede o reexame pelo juiz. Se disponível, a falta de impugnação im- porta concordância tácita à decisão. Firma-se o efeito preclusivo não só para as partes, mas também para o juiz, no sentido de vedada se torna a retratação".
Desse modo, também sob a vigência do novo CPC, se no curso do processo, enquanto não esgotada a jurisdição, entender o juiz que se equivocara em decisão sobre as matérias arroladas nos incs. IV, V, VI e XI do art. 485, im- põem-lhe a função de dirigente do processo e o dever de velar pela duração razoável do processo (art. 139), reexaminá-la e resolvê-la novamente. É o que determina o art. 485, § 3.o, no sentido de autorizar ao juiz conhecer de ofício das supra aludidas matérias, até que, à evidência, não tenha exaurido a sua própria jurisdição
." (TUCCI, José.
Comentários ao Código de Processo Civil:
artigos 485 ao 538. São Paulo: RT. 2016, comentário ao art. 485).
Convém destacar esse último excerto:
"Desse modo, também sob a vigência do novo CPC, se no curso do processo, enquanto não esgotada a jurisdição, entender o juiz que se equivocara em decisão sobre as matérias arroladas nos incs. IV, V, VI e XI do art. 485, im- põem-lhe a função de dirigente do processo e o dever de velar pela duração razoável do processo (art. 139), reexaminá-la e resolvê-la novamente. É o que determina o art. 485, § 3.o, no sentido de autorizar ao juiz conhecer de ofício das supra aludidas matérias, até que, à evidência, não tenha exaurido a sua própria jurisdição."
De todo modo, no caso em análise, não diviso sinais de eventual litispendência, sem prejuízo de eventual nova apreciação adiante
.
2.10. Suspensão da demanda:
Não diviso a presença dos requisitos que ensejariam eventual suspensão do processo, nesta etapa da causa, por conta de alguma questão prejudicial - art. 313, Código de Processo Civil/15: "
Suspende-se o processo: (...) V -
quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente
; b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada a outro juízo. (...) § 4 O prazo de suspensão do processo nunca poderá exceder 1 (um) ano nas hipóteses do inciso V e 6 (seis) meses naquela prevista no inciso II. §5 O juiz determinará o prosseguimento do processo assim que esgotados os prazos previstos no §4."
A respeito dos aludidos preceitos, convém registrar aqui a análise detida promovida por Araken de Assis:
"Prejudicial externa civil – A hipótese mais frisante de suspensão do processo em razão de prejudicialidade externa homogênea é a prevista no art. 313, V, a, do NCPC.
Toda vez que o julgamento do mérito “depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente”, o juiz suspenderá o processo
. Derivações dessa regra avultam na possibilidade de o relator suspender os processos que dependam do julgamento da ação declaratória de constitucionalidade (art. 21 da Lei 9.868/1999) e da arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 5.º, § 3.º, da Lei 9.882/1999) – não, porém, a suspensão em decorrência do incidente de resolução das demandas repetitivas ou do julgamento do recurso extraordinário e do recurso especial repetitivos: a questão aí julgada é principal. O art. 313, V, a, trata da suspensão por causa prejudicial, que é a aptidão da prejudicial em tornar-se objeto litigioso em outro processo.
Fica evidente da redação da norma que a prejudicial é externa, porque há de consistir em “objeto principal de outro processo”. Não importa a circunstância de a questão prejudicial consistir no objeto originário do outro processo (v.g., A postula a invalidade do contrato firmado com B, mas B pleiteia o cumprimento da prestação devida por A) ou decorrer do alargamento desse objeto, por força de declaração incidente (v.g. B pleiteou de A, no primeiro processo, o principal da dívida, mas A reagiu pleiteando a declaração incidente da validade do contrato; no segundo processo, B pleiteia de A os juros da dívida). Importa a resolução da questão comum no outro processo, com autoridade de coisa julgada. E, nesse caso, o vínculo produzido na causa subordinante estender-se-á à causa subordinada ou, vencido o prazo máximo de suspensão – hipótese mais do que provável, vez que o interregno de um ano (art. 313, § 4.º) é muito curto, pressupondo-se elastério mais dilatado para o julgamento, por forçada ordem cronológica do art. 12, e o trânsito em julgado –, sobre a deliberação incidental na causa subordinada não recairá a coisa julgada (art. 503, § 1.º, III, in fine). Realmente, a questão comum não constitui o objeto principal da causa condicionada. Do contrário, configurar-se-ia um dos efeitos da litispendência, a proibição de renovação de causa idêntica. Cumprirá ao juiz julgá-la vencido o prazo hábil de espera, incidentalmente, apesar dos esforços de concatenação empreendidos pelo expediente da suspensão.
O exemplo ministrado, em que uma das partes pleiteia a decretação da invalidade do contrato e a outra reclama a prestação, releva que tampouco importa a diversidade da força da ação (declarativa, constitutiva, condenatória, executiva e mandamental) e a espécie de procedimento. A pretensão de A contra B para decretar a invalidade do contrato tem força constitutiva negativa, a de B contra A para realizar a prestação tem força condenatória. Nada obstante, o primeiro processo funciona como causa prejudicial relativamente à pretensão deduzida no segundo: decretada a invalidade do contrato naquele, fica predeterminado o desfecho deste (improcedência). Evidentemente, havendo a possibilidade de reunir os processos no mesmo juízo (retro, 305), para julgamento simultâneo, por força da conexão (retro, 303), inexiste a necessidade de suspender a causa condicionada, porque os processos conexos serão julgados simultaneamente (art. 55, § 1.º).
O objetivo da suspensão prevista no
art. 313
, V, a, consiste em evitar a emissão de provimentos conflitantes, logicamente incompatíveis, a respeito da questão prejudicial. Por esse motivo, causa prejudicial envolvendo partes distintas raramente constitui razão bastante para suspender outro processo, por mais relevante que seja a questão comum controvertida em ambos, ressalva feita às hipóteses de o julgamento da causa subordinante produzir efeitos erga omnes, como acontece na ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, § 2.º, da CF/1988). Aliás, essa é uma característica – a falta de identidade de partes – da prejudicial de constitucionalidade, objeto do controle concentrado, todavia alheio à incidência do art. 313, V, a. Em outras palavras, o juiz da causa condicionada não suspenderá o processo em que se controverta norma objeto de controle concentrado de constitucionalidade
. Em tal hipótese, ou o STF concedeu liminar, suspendendo a vigência da norma, e o juiz não poderá aplicá-la; ou não concedeu, e o juiz haverá de aplicá-la no julgamento do mérito, ou não, exercendo o controle difuso. A superveniência do julgamento do STF, pronunciando a inconstitucionalidade, será recepcionado no julgamento do mérito ou, havendo ocorrido o trânsito em julgado, a sentença se tornará inexequível, nas condições do art. 525, § 1.º, III, c/c § 12.
No tocante ao estágio do processo subordinado, a suspensão poderá ocorrer no primeiro e no segundo graus; em particular, “o fato de já ter sido proferida sentença no processo prejudicado não afasta, portanto, a possibilidade de sua suspensão”. Conforme deflui da cláusula final do art. 313, V, a, que alude a “outro processo pendente”, tampouco o estágio do processo subordinante se mostra relevante à suspensão, bastando que subsistam os efeitos da litispendência. Encontrando-se a causa prejudicial no tribunal, por força de apelação, admite-se a suspensão, hipótese em que, presumivelmente, o desfecho ocorrerá dentro do prazo de suspensão
.
Era particularmente difícil a interpretação da regra particular do direito anterior, declarando haver suspensão do processo que “tiver por pressuposto o julgamento de questão de estado, requerido como declaração incidente” (art. 265, IV, c, do CPC de 1973). A esse propósito, havia dois termos de alternativa: ou se cuidava de prejudicial externa, caracterizada pelo fato se tratar de questão de estado (v.g., na ação de divórcio, a validade do casamento), hipótese em que incorreria a lei em indesejável redundância; ou se tratava de prejudicial interna, caso em que ocorreria colisão com o sistema da declaração incidente, e, pior, nenhuma justificativa plausível para suspender o processo, pois o juiz da causa resolverá conjuntamente a questão prejudicial, e, conforme o teor da resolução, passando ou não à análise da questão prejudicada. Essa situação constitui simples subespécie da regra geral do art. 313, V, a, do NCPC. É digno de nota a possibilidade de o juízo não exibir competência em razão da matéria para julgar questões de estado em caráter principalmente, hipótese em que a resolução incidental porventura tomada não se revestirá de auctoritas rei iudicate, nos termos do art. 503, § 1.º, III." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume II. Tomo II. Parte geral: institutos fundamentais. São Paulo: RT. 2015. p. 809 e ss.)
No caso em apreço, não diviso a presença de causas ensejadoras da suspensão desta demanda, a exemplo de cogitada necessidade de se aguardar a evolução de algum outro processo
.
2.11. Pertinência subjetiva - considerações gerais:
As questões alusivas à pertinência subjetiva tangenciam, não raro, o próprio exame de mérito da causa. Nosso sistema ainda se vincula à concepção eclética do jurista Enrico Túlio Liebman, quem distinguia os chamados pressupostos processuais - competência, citação válida, imparcialidade etc. -, as condições para o escorreito exercício do direito de ação - legitimidade, interesse processual, possibilidade jurídica do pedido - e, por fim, as questões de mérito - a procedência/improcedência do pedido. O problema é que, no mais das vezes, os temas próprios ao mérito e os temas próprios às condições da ação não podem ser distinguidos de uma forma absolutamente precisa e sem ambiguidades.
Segundo se infere do seu 'Tratado das ações', Pontes de Miranda promovia uma distinção entre a ação em sentido material - como se fosse uma espécie de projeção do direito subjetivo - ainda vinculada à concepção imanentista do direito civil antigo, de um lado, e a ação em sentido processual e abstrato, de outro (ou seja, o direito de demandar em Juízo, mesmo quando não se tenha razão quanto à questão de fundo). Com base nessa diferenciação pontiana, é que o desembargador gaúcho Adroaldo Furtado Fabrício tem criticado a teoria eclética de Liebman, ao enfatizar que as 'condições da ação' também cuidariam, no geral, do mérito da pretensão (saber se a parte é legítima é, de certa forma, um exame conexo ao mérito: saber se ela poderia ser demandada, se teria a obrigação de indenizar etc).
Confira-se com a leitura do texto FABRÍCIO, Adroaldo Furtado. Extinção do Processo e Mérito da Causa in OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de (org).
Saneamento do processo:
Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1990. p. 33. Em outras palavras, deve-se aferir a pertinência subjetiva dos requeridos, tendo-se em conta a causa de pedir detalhada na peça inicial. E, com alguma frequência, isso invade o exame de mérito.
De todo modo, em sentido pontualmente distinto, e por conta dos dispositivos do Código de Processo Civil em vigor, atente-se para a lição de Araken de Assis:
"A legitimidade não condiciona a ação, como quer a opinião há pouco exposta, haja vista um motivo trivial: a sua falta jamais impedirá a formação do processo. A pessoa que toma a iniciativa de provocar o órgão judiciário, seja quem for, cria a relação processual, embora fadada a perecer através de juízo de admissibilidade negativo – item que constitui pressuposto lógico e cronológico do exame do mérito. Legitimidade é, descansando no direito material, problema distinto do juízo acerca do caráter fundado ou infundado da pretensão deduzida contra o réu. A demanda movida por alguém sem legitimidade é inadmissível, e, não, infundada. Sentença terminativa desse teor limita-se a repelir, a partir dos dados ministrados pelo direito material, sempre
in status assertionis,
a habilitação da parte para conduzir o processo, relativamente ao objeto litigioso alegado. Aos esquemas abstratos, traçados na lei, gerando tal capacidade, chamam-se de situações legitimadoras. Portanto, a dissociação entre o sujeito da lide e o do processo evidencia a verdadeira natureza da legitimidade e a situa no lugar próprio no conjunto das questões submetidas à apreciação do órgão judicial.
É um pressuposto processual preenchido mediante a simples enunciação do autor. Ninguém se atreverá a reputar respeitante ao mérito eventual juízo quanto à inexistência, em determinado caso concreto, do título legal para alguém pleitear em juízo direito alheio
. Descontada a errônea concepção que ilegitimidade do autor obsta à formação do processo, o art. 485, VI, Código de Processo Civil, houve-se com acerto ao situar o problema fora do mérito."
(ASSIS, Araken de.
Processo
civil
brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral: institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 178).
É importante sublinhar, dito isso, que saber se uma parte é legítima para uma determinada causa exige que se examine (a) a narrativa dos fatos, indicada como causa/motivação para sua pretensão; (b) aferir se, diante de tal narrativa e dos argumentos jurídicos por ela esgrimidos, a parte autora e/ou a parte requerida se revela(m) manifestamente impertinente(s) para a demanda, hipótese em que o processo há de ser extinto sem solução de mérito, na forma do art. 485, VI, CPC/15.
2.12. Legitimidade das partes - caso em exame:
A autora está legitimada para a causa, dado ter sido apontada como contribuinte da TCFA. Ela deduziu pretensão em nome próprio e quanto a interesses próprios,
não esbarrando na vedação do art. 18, CPC
.
Eventuais filiais da impetrante, enquanto estabelecimentos comerciais, não possuem capacidade jurídica e tampouco possui capacidade processual, para os fins do art. 75, CPC, dado não serem uma pessoa formal, ao contrário do que ocorre com espólio, condomínio, massa falida e assim por diante.
Em alguns casos, porém, os Tribunais têm reconhecido legitimidade à atuação processual de filiais, notadamente quanto aos tributos que decorram co conhecido princípio de autonomia tributária dos estabelecimentos quanto a alguns tributos
. No caso em exame, aludida questão não se coloca.
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS E CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A OUTRAS ENTIDADES . LEGITIMIDADE ATIVA DA FILIAL PARA A IMPETRAÇÃO. AUTONOMIA FISCAL E CONTÁBIL EM RELAÇÃO À MATRIZ. PESSOAS JURÍDICAS AUTÔNOMAS. INAPLICABILIDADE DO ART . 1.013, § 3º, I DO CPC. SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO . 1. Nos termos do art. 126 do CTN, a capacidade tributária passiva independe da capacidade civil, de modo que uma filial poderá ser considerada contribuinte independente da sua respectiva sede e de outras filiais da mesma pessoa jurídica. 2 . Não obstante a relação de subordinação jurídica existente entre a matriz e suas filiais, à luz da legislação tributária, cada ente configura um contribuinte distinto, com apurações próprias e apartadas das demais. 3. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, para fins fiscais, tratando-se de tributos com fatos geradores individualizados, a matriz e suas filiais constituem pessoas jurídicas autônomas, possuindo, inclusive, CNPJ diferentes. Precedentes . 4.
Sentença anulada para reconhecer a legitimidade ativa da apelante para a impetração e determinar o retorno dos autos ao Juízo de origem para que o feito tenha regular prosseguimento. 5. Impossibilidade de julgamento nos moldes do art . 1.013, § 3º, I, do CPC, tendo em vista o duplo grau obrigatório previsto no art. 14, § 1º, da Lei nº 12.016/09
. 6. Apelação provida. (TRF-3 - ApCiv: 00242901920164036105 SP, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, Data de Julgamento: 01/08/2019, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/08/2019)
O STJ tem enfatizado, de toda sorte, que a pessoa jurídica - ainda que seja composta de matriz e estabelecimentos industriais ou comericiais - detém legitimidade para atuar em nome dos interesses da totalidade das estruturas que a compõem.
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS . IMPETRAÇÃO POR FILIAL. IMPOSSIBILIDADE. LEGITIMIDADE DA MATRIZ. PRECEDENTES . 1.
Na linha adotada pelas Turmas que compõem a Primeira Seção do STJ, a legitimidade para ajuizamento de mandado de segurança relativamente à exigibilidade de contribuições previdenciárias é do estabelecimento matriz e não das filiais
. 2. Precedentes: AgInt nos EDcl no REsp n . 1.979.018/SP, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 30/11/2022; AgInt no REsp n. 1 .986.443/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 5/10/2022; AgInt nos EDcl no REsp n. 1.863 .775/SC, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 3/12/2020; 3. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 1494369 SP 2019/0119982-0, Relator.: SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 05/06/2023, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/06/2023)
Por seu turno, nos termos da
lei n. 10.165, de 27 de dezembro de 2000
, o IBAMA está encarregado de promover a fiscalização, o lançamento e a cobrança do aludido tributo, conforme redação atribuída ao
art.17-D da lei 6.938, de 31 de agosto de 1981
.
"
O IBAMA é competente para a cobrança porque o fato gerador da TCFA é o exercício regular do poder de polícia conferido a ele para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais. O TRF4 tem reiteradamente decidido pela constitucionalidade da TCFA e pela legitimidade do IBAMA para a sua cobrança
(precedentes: AC nº 2007.70.00.006004-2, Relator Eloy Bernst Justo, D.E. 14/01/2009; AC nº 2005.72.11.000864-2, Relator Otávio Roberto Pamplona, D.E. 03/12/2008; AMS nº 2003.72.01.003472-5, Relatora Marciane Bonzanini, D.E. 11/06/2008; AC nº 2007.70.00.023743-4, Relator Otávio Roberto Pamplona, D.E. 28/01/2009)
." (TRF-4 - AC: 50047868520174047104 RS 5004786-85.2017.4.04.7104, Relator: RÔMULO PIZZOLATTI, Data de Julgamento: 17/08/2021, SEGUNDA TURMA)
Dada a autonomia assegurada às autarquias - decreto-lei 200/67 -, a União não está legitimada para a presente causa. Cabe ao IBAMA responder à pretensão da autora.
"Não se deve confundir a União, entidade política, com as suas autarquias (no caso o IBAMA, criado pela Lei 7.735/89), pois estas são entidades, com personalidade jurídica própria, integrantes da administração pública indireta e que devem ser defendidas, em sede judicial, pela Procuradoria Federal, cujas atribuições atualmente se encontram descritas na MP 2 .229-43/2001. Ilegitimidade passiva da União, na espécie, representada pela Procuradoria da Fazenda Nacional."
(TRF-4 - AC: 41030 RS 2002.71.00.041030-6, Relator.: ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Data de Julgamento: 19/07/2006, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 02/08/2006 PÁGINA: 303)
2.13.
Litisconsórcio
necessário
- considerações gerais:
O litisconsórcio previsto inicialmente no art. 47, CPC/1973 e atualmente no art. 114, CPC/2015, decorre da lógica do
inauditus damnare potest,
imposto pelo art. 5º, LIV e LV, CF. A sentença apenas faz coisa julgada entre as partes, conforme art. 506, CPC/15, exceção feita à regra do art. 109. CPC/15.
Ora, justamente por força da necessidade de que as decisões judiciais sejam
consistentes
, é que o Código de Processo civil obriga o demandante, em determinados casos, a orientar a sua pretensão contra todas as pessoas intimamente vinculadas a determinado evento (causa de pedir). Busca-se, com isso, inibir soluções judiciais contraditórias, ao mesmo tempo em que também se otimiza a prestação jurisdicional e se assegura o postulado
nemo
inauditus
damnare
potest
.
Reporto-me à lição de Luiz Marinoni e Sérgio Arenhart:
"Em princípio, a determinação da formação do litisconsórcio necessário vem estipulada no caput do art. 47, CPC, que afirma que há litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. Portanto, da leitura desse artigo tem-se que duas causas podem gerar o litisconsórcio necessário; a lei ou a natureza da relação jurídica.
E, somando-se a isso, para a caracterização da necessidade da formação do litisconsórcio, será necessário que essas causas exijam que o juiz julgue o litígio de maneira uniforme para todas as partes (rectius, litisconsortes). Note-se, porém, que a redação do dispositivo é bastante defeituosa, podendo levar à conclusão de que as figuras do litisconsórcio necessário e unitário identificam-se, ou melhor, que o litisconsórcio unitário deve ser necessário e que o litisconsórcio necessário deve ser unitário
.
Nem sempre, porém, assim será. Imagine-se a hipótese em que a lei obriga, por qualquer causa, a formação de determinado litisconsórcio, ainda que a questão não precise, necessariamente, ser resolvida de maneira idêntica para todos os litisconsortes. Pense-se na hipótese da ação popular, em que a lei determina que devam ser citados para a ação todos aqueles que direta ou indiretamente tenham contribuído, por ação ou omissão, para a edição do ato inquinado como ilegal (art. 6º da lei 4.717/1965 - lei de ação popular), bem como seus beneficiários diretos. Ninguém duvida que esse é um litisconsórcio simples, não exigindo solução idêntica perante todos os litisconsortes. Não obstante isso, a lei impõe a formação de litisconsórcio. Seria, por acaso, indevida essa exigência do litisconsórcio? Poderia alguém questionar a exigibilidade desse litisconsórcio? Não parece que a resposta possa ser positiva. Em verdade, a exigência da formação do litisconsórcio, no caso, em que a lei o exija, independe do caráter unitário ou não da figura. Impõe simplesmente porque a lei o quer.
Somente na outra hipótese, em que a formação do litisconsórcio decorre da natureza da relação jurídica, é que efetivamente tem algum interesse a questão da unitariedade ou não da figura
. Aqui, sim, é possível que, diante da necessidade de que a solução da causa seja idêntica para várias pessoas, imponha-se o litisconsórcio ainda que a lei não o determine. E, como já visto, a unitariedade do litisconsórcio decorre não apenas do fato de que a sentença deve decidir a questão de forma uniforme para todos os litisconsortes, mas, sobretudo, da ideia de que essa imposição decorra da unitariedade da relação jurídica material deduzida em juízo. Vale dizer: no litisconsórcio unitário, exige uma relação jurídica material (cuja afirmação é o objeto da demanda) que possui vários sujeitos em um dos pólos. Pense-se no caso de um imóvel que possua vários coproprietários. Ou no negócio jurídico celebrado por marido e mulher com terceiro. Ou ainda em um ato administrativo (por exemplo, uma portaria) complexo, que é emitido por mais de uma entidade. Nesses casos, a relação jurídica material realizada possui, em pelo menos um dos seus pólos, mais de um sujeito. E é precisamente essa pluralidade subjetiva em um dos pólos da relação jurídica material deduzida em juízo que determina, na forma do que prevê o art. 47, CPC (natureza da relação jurídica), o litisconsórcio necessário." (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz.
Processo de conhecimento.
7. ed. São Paulo: RT, 2008, p. 173-174)
Atente-se também para a análise de Marcelo Abelha Rodrigues:
"A necessidade deste tipo de litisconsórcio, prevista no art. 47, CPC, decorre ou por força de lei, ou por natureza da relação jurídica. Será por força de lei no caso, por exemplo, do art. 6º da LAP, ou ainda no caso do art. 942, II, CPC.
Estaremos diante da segunda hipótese quando se cuidar de ação anulatória proposta contra todos os contratantes. Não se pode ser contra apenas um deles, pois a natureza da relação jurídica requer que possuam a mesma decisão. Outro exemplo, por força da lei, é o previsto no art. 10, §2º, CPC
."
(RODRIGUES, Marcelo Abelha.
Elementos de direito processual civil.
vol. 1. 2. ed. São Paulo: RT, 2000, p. 296)
O litisconsórcio pode ser necessário ou facultativo, no que toca à obrigatoriedade da sua formação. Também pode ser unitário ou simples, quanto à solução a ser dispensada às partes.
Como cediço, o litisconsórcio é facultativo quando determinadas pessoas aquiescem em litigar juntas contra um mesmo demandado; ou quando o autor endereça, a um só tempo, pretensões contra várias pessoas, desde sejam todas legítimas a figurar na causa (art. 17, CPC/15). A respeito do litisconsórcio necessário, convém atentar para a lição de Nelson Nery Júnior:
"
A obrigatoriedade da formação do litisconsórcio pode ser dada pela lei ou pela relação jurídica. São exemplos de litisconsórcio necessário por disposição de lei: a) CPC 246 §3º, que manda citar os confinantes nas ações de usucapião de imóvel; b) LAP 6º, que manda citar o funcionário que autorizou a prática do ato impugnado, bem como a pessoa jurídica de direito público ou privado a que ele pertence
; c) CPC, art. 76 §1º II, que manda citar ambos os cônjuges em ação na qual se discutam fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou atos praticados por eles (v.g., fiança - CC 1647 III) São exemplos de litisconsórcio necessário por força da relação jurídica: a) todos os partícipes de um contrato, para a ação anulatória do mesmo contrato, porque a sentença que decidir a lide não poderá anular o contrato para um dos contratantes e declará-lo válido para os demais que eventualmente não estivessem no processo como partes. Não sendo obrigatória a formação do litisconsórcio, este se caracteriza como facultativo, cujos casos mais comuns estão enumerados no CPC 113." (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade.
Comentários ao código de processo civil.
1ª. ed. São Paulo: RT, 2015)
2.14. Eventual litisconsórcio - caso em exame:
Na situação em análise, eventual procedência da pretensão do autor não atingirá diretamente terceiros, de modo que não há litisconsórcio necessário na espécie, conforme arats. 114, 115, 506, CPC/15, o que avalio de ofício, na forma do art. 485, §3, CPC/15.
2.15.
Interesse processual - considerações gerais:
Por conta do
monopólio do uso válido da força
- expressão de Max Weber -, exceção feita aos casos de legítima defesa, estado de necessidade, desforço incontinenti etc., as partes não podem resolver seus conflitos mediante o emprego da força (art. 345, Código Penal/40). Logo, sempre que as controvérsias não sejam solucionadas com base no consenso, na prevalência do melhor argumento, os sujeitos devem deduzir suas pretensões perante o Estado, na espera de que haja aplicação isenta, racional e célere da lei (
law enforcement
).
Nos termos impostos pela Constituição, o Poder Judiciário está obrigado a apreciar a alegação de que haja lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º, XXXV, CF), mecanismo indispensável para que haja efetivo império da razão pública, ao invés da prevalência dos poderes hegemônicos de ocasião. A prestação jurisdicional não se destina, todavia, a emitir meros pareceres ou cartas de intenções.
O ingresso em juízo deve estar fundado, tanto por isso, em uma situação de efetiva necessidade, de modo que o pedido - caso venha a ser acolhido - se traduza em uma utilidade para o demandante. O meio processual eleito deve ser adequado para tanto. Daí que os processualistas tratem do interesse processual em uma
troika:
a necessidade, a utilidade e a adequação. Por fim, o interesse processual deve persistir no curso da demanda, nos termos do art. 17 e art. 85, §10, CPC/15.
Ora,
"
Mediante a força declaratória, a aspiração do autor consiste na extirpação da incerteza
. Deseja tornar indiscutível, no presente e no futuro, graças à autoridade da coisa julgada, a existência ou a inexistência de relação jurídica, a autenticidade ou a falsidade de documento. É o que dispõe, fortemente inspirado no direito germânico e reproduzindo a regra anterior, o art. 19 do NCPC. Também comporta declaração a exegese de cláusula contratual (Súmula do STJ, n.º 181), ou seja, o modo de ser de uma relação jurídica. Na ação declarativa, ignora-se outra eficácia relevante que a de coisa julgada material. Neste sentido, a pretensão à declaração representa fonte autônoma de um bem valiosíssimo na vida social: a certeza. O autor que só pleiteia declaração ao juiz, e obtém êxito, dar-se-á por satisfeito, e cabalmente, desde o curso em julgado da sentença.
Então apropria-se do que pedira ao órgão judicial – certeza –, carecendo a regra jurídica emitida de qualquer atividade complementar em juízo. Focalizando o ponto com preciosa exatidão, diz-se que a sentença declaratória é instrumento autossuficiente de tutela jurisdicional, pois assegura, de maneira plena e completa, a efetividade da situação jurídica substancial deduzida em juízo
."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume I. Parte geral: fundamentos e distribuição de conflitos. São Paulo: RT. 2015. p. 675).
Ainda segundo Araken de Assis,
"
O provimento declaratório tem nítido caráter prescritivo. A parte adquire o direito incontestável de comportar-se em consonância ao comando sentencial, e, principalmente, não é dado àqueles que se vincularam à declaração impedi-la
. A finalidade da ação declaratória da inteligência e do alcance de cláusula contratual é a de prescrever aos parceiros do negócio, sucessivamente, determinada pauta de conduta, independentemente de execução alguma, de que não se cogita e de que não se pode cogitar."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 676).
Dado que o Poder Judiciário não é consultor jurídico das partes, impõe-se que haja uma situação de incerteza jurídica a justificar o ingresso com a demanda:
"
Impende recordar que a certeza implicará a vinculação futura das partes. O provimento exibirá caráter prescritivo para o futuro
. O ato judicial legitima a prática (ou a abstenção) de atos jurídicos “ao abrigo e em conformidade com o conteúdo da sentença. Em geral, a antevisão desse problema provoca o nascimento do interesse. Por assim dizer, o provimento declarativo tem os pés no passado, mas olhar no futuro. É preciso aceitar com reservas, portanto, o julgado da 4.ª Turma do STJ, que assentou: Não é detentor de interesse processual justificador da pretensão declarativa quem não está exposto à possibilidade de dano imediato e concreto. Ora, imediato é o interesse, pois o dano, em sentido amplíssimo, pode ser futuro. Por exemplo, não cabe declarar a inteligência da cláusula contratual em tese; o autor necessitará expor a dificuldade na interpretação da cláusula, os reflexos que este ou aquele entendimento provocará no programa contratual."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 661).
2.16. Interesse processual - caso em exame:
Na situação em exame, aludidos requisitos foram cumpridos. Ao que se infere do relato da autora, a pretensão não seria acolhida pelo IBAMA no âmbito extrajudicial. Assim, o ingresso em Juízo se revelou necessário, sendo projeção do direito do art. 5, XXXVIII, Constituição. O tema 350/STF não se aplica ao caso, dado que o caso não versa sobre prestações previdenciárias.
Caso a pretensão seja acolhida em sentença transitada em julgado, a medida lhe será útil, inibindo a redução do seu patrimônio. A via processual eleita se revela adequada, como registrei acima. Assim, o trinônimo necessidade/utilidade/adequação restou atendido.
2.17.
Aptidão da peça inicial:
A peça inicial apresentada atendeu ao disposto nos
arts. 305 e 319, CPC/15
. A autora apontou os pedidos e detalhou os argumentos invocados para tanto, encontrando-se instruídos com os documentos que a parte reputou serem suficientes para comprovação da alegada veracidade da narrativa dos fatos, veiculada na peça inicial (art. 320, CPC/15).
2.18. Valor atribuído à causa:
Como sabido, a toda causa deve ser atribuído algum valor econômico, por força do art. 291, CPC/2015 - projeção do art. 258, CPC/73 -, pois se cuida da base de cálculo da taxa judiciária. Referido valor pode influenciar, em muitos casos, a determinação da competência das unidades judiciais ou o procedimento aplicável, também surtindo reflexos sobre a definição de encargos sucumbenciais.
Trata-se, tanto por isso, de requisito para que a petição inicial seja válida - art. 319, CPC. Como explicita Araken de Assis,
"às vezes, na oportunidade da respectiva fixação (infra, 1.290), o conteúdo econômico real e imediato da pretensão mostra-se inestimável, ou seja, não pode ser quantificado precisamente. Tal circunstância não constitui motivo bastante para eliminar o ônus atribuído ao autor nos arts. 319, V, e 292, caput. É apenas causa de estimação voluntária do autor, pois o art. 291 dispõe expressamente que a toda causa será atribuído valor certo. Nada obstante, a indicação aproximar-se-á, tanto quanto possível, do conteúdo econômico mediato da pretensão. Não há incompatibilidade daquelas regras com a do art. 85, § 8.º. aludindo a causas de valor inestimável. Entende-se por tal as causas desprovidas de conteúdo econômico imediato, como é o caso da ação declaratória, e, por esse motivo, sujeitas à estimação do autor."
(ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo I: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 1695)
Convém atentar, tanto por isso, para o art. 292, CPC/15:
"O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: I - na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação; II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida; III - na ação de alimentos, a soma de 12 (doze) prestações mensais pedidas pelo autor; IV - na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, o valor de avaliação da área ou do bem objeto do pedido; V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; VI - na ação em que há cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; VII - na ação em que os pedidos são alternativos, o de maior valor; VIII - na ação em que houver pedido subsidiário, o valor do pedido principal. § 1º Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, considerar-se-á o valor de umas e outras. § 2º O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado ou por tempo superior a 1 (um) ano, e, se por tempo inferior, será igual à soma das prestações. § 3º O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
Atente-se novamente para a análise de Araken de Assis:
"
É exemplificativa a enumeração dos acessórios. Os juros compensatórios, por exemplo, dificilmente se quadram na figura de penalidade. A correção monetária integra o valor originário do crédito e, nesse aspecto, sua menção no art. 292, corrige o direito anterior
. Ressalva feita aos juros moratórios e à correção monetária, verbas implicitamente incluídas no pedido respeitante ao principal (art. 322, § 1.º), e, nada obstante, integrantes do valor da causa, quaisquer outras verbas devem ser objeto de pedido. É o caso, expressis verbis, da cláusula penal moratória ou compensatória e dos juros compensatórios. Omisso que seja o pedido, a respeito da cláusula penal (v.g., o autor quer evitar a controvérsia em torno da interpretação do contrato), tampouco conta-se o respectivo valor. Por óbvio, deixando o autor de pedir os juros moratórios, explicitamente, dificilmente realizará seu cômputo no valor da causa, ensejando a intervenção do órgão judiciário. E os juros vencidos posteriormente ao ajuizamento, automaticamente incluídos na condenação (art. 323), não entram na estimativa da causa.
O custo financeiro do processo (despesas processuais e honorários advocatícios), suportado pelo réu no caso de êxito do autor, não precisa ser computado para apurar o valor da causa. Tais verbas têm caráter eventual e decorrem da lei.
Em face do caráter imperativo do art. 292, I, mostra-se irrelevante a estimativa lançada pelo autor na petição inicial em desacordo com a regra. Prevalecerá o valorda importância reclamada no pedido.
O art. 292, I, aplica-se, por analogia, à pretensão a executar fundada em título judicial ou extrajudicial (infra, 1.292.2.2). O valor da causa é o total do crédito: o principal corrigido, os juros e os demais consectários legais ou contratuais, conforme, aliás, dispõe o art. 6.º, § 4.º, da Lei 6.830/1980. Esse valor constará na planilha aludida no art. 798, I, b, e parágrafo único
.
Também se poderia cogitar do enquadramento da pretensão a executar no art. 292, II, por que pretensão visando ao cumprimento do negócio jurídico, eventualmente consubstanciado em documento dotado de força executiva. O resultado final é idêntico, mas o art. 292, I, avantaja-se ao inciso precedente em ponto decisivo, ao impor um critério simples, direto e analítico ao valor da causa." (ARAKEN, Assis.
Obra citada.
p. 1698 e ss.)
Ora, não se pode perder de vista que o valor atribuído à causa deve corresponder, tanto quanto possível, ao conteúdo econômico da pretensão deduzida na peça inicial, como bem equaciona o art. 292, §3º, CPC/15:
"O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou
ao proveito econômico perseguido pelo autor
, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
No presente caso, o valor atribuído à demanda parece atender ao art. 292, CPC. Pode-se cogitar que a empresa deveria acrescentar ao valor da causa o montante correspondente a um ano de tributo - dívida vincenda -, por força do art. 292, §2, CPC. Por ora, acolho a atribuição de importância econômica à demanda.
2.19. Considerações gerais sobre a antecipação de tutela:
Como sabido, a cláusula do devido processo envolve alguma aporia. Por um lado, o processo há de ser adequado: deve assegurar defesa, contraditório, ampla produção probatória. E isso consome tempo. Todavia, o processo também deve ser eficiente, ele deve assegurar ao titular de um direito uma situação jurídica idêntica àquela que teria caso o devedor houvesse satisfeito sua obrigação na época e forma devidas.
A demora pode contribuir para um debate mais qualificado entre as partes; todavia, também leva ao grande risco de ineficácia da prestação jurisdicional, caso o demandante tenha realmente razão em seus argumentos.
Daí a relevância do prudente emprego da tutela de urgência, prevista nos
arts. 300 e ss. do CPC/15
. Desde que a narrativa do demandante seja verossímil, seus argumentos sejam fundados e a intervenção imediata do Poder Judiciário seja necessária - i.e., desde que haja
fumus boni iuris
e
periculum in mora -
a antecipação da tutela deverá ser deferida.
Sem dúvida, porém, que o tema exige cautela, eis que tampouco soa compatível com o devido processo a conversão da antecipação em um expediente rotineiro, o que violentaria a cláusula do art. 5º, LIV e LV, CF. Ademais, o provimento de urgência não pode ser deferido quando ensejar prejuízos irreversíveis ao demandado (art. 300, §3º, CPC/15). Daí o relevo da lição de Araken de Assis, como segue:
"A tutela de urgência e a tutela de evidência gravitam em torno de dois princípios fundamentais: (a) o princípio da necessidade; e (b) o princípio da menor ingerência.
-
Princípio da necessidade - Segundo o art. 301, in fine, a par do arresto, sequestro, arrolamento de bens, e protesto contra a alienação de bens, o órgão judiciário poderá determinar qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. Essa abertura aplica-se às medidas de urgência satisfativas (art. 303, caput): a composição do conflito entre os direitos fundamentais somente se mostrará legítima quando houver conflito real, hipótese em quase patenteia a necessidade de o juiz alterar o esquema ordinário de equilíbrio das partes perante o fator temporal do processo
. A necessidade de o juiz conceder medida de urgência apura-se através da comparação dos interesses contrastantes dos litigantes. Dessa necessidade resulta a medida adequada à asseguração ou à satisfação antecipada em benefício do interesse mais provável de acolhimento em detrimento do interesse menos provável.
- Princípio do menor gravame - O princípio do menor gravame ou da adequação é intrínseco à necessidade. É preciso que a medida de urgência seja congruente e proporcional aos seus fins, respectivamente a asseguração ou a realização antecipada do suposto direito do autor. Por esse motivo, a medida de urgência cautelar prefere à medida de urgência satisfativa, sempre que adequada para evitar o perigo de dano iminente e irreparável, e, na órbita das medidas de urgência satisfativas, o órgão judiciário se cingirá ao estritamente necessário para a mesma finalidade." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
volume II. Tomo II. Parge Geral: institutos fundamentais. São Paulo: RT, 2015, p. 370-371)
Quando se cuide-se, ademais, de pedido em desfavor da Fazenda Pública, a lei 8.437/1992 veda a antecipação de tutela que implique compensação de créditos tributários ou previdenciários
(art. 1º, §5º). A lei do mandado de segurança veda a concessão de liminares com o fim de se promover a entrega de mercadorias, a reclassificação de servidores públicos e o aumento ou extensão de vantagens de qualquer natureza (art. 7º, §2º, lei 12.016).
Registre-se que o STF já se manifestou sobre a constitucionalidade de algumas dessas limitações (lei 9.494/1997), conforme se infere da conhecida ADC 04-6/DF, rel. Min. Sydnei Sanches (DJU de 21.05.1999), com os temperamentos reconhecidos no informativo 248, STF. No âmbito do Direito Administrativo militar, há restrições ao emprego do
writ
, por exemplo, diante do que preconiza o art. 51, §3º, lei n. 6.880/1980, ao exigir o exaurimento da via administrativa.
O juízo não pode antecipar a eficácia meramente declaratória de uma cogitada sentença de procedência. Afinal de contas, a contingência é inerente aos provimentos liminares; de modo que a certeza apenas advém do trânsito em julgado (aliás, em muitos casos, sequer depois disso, dadas as recentes discussões sobre a relativização da
res iudicata
): "
É impossível a antecipação da eficácia meramente declaratória, ou mesmo conferir antecipadamente ao autor o bem certeza jurídica, o qual somente é capaz de lhe ser atribuído pela sentença declaratória. A cognição inerente ao juízo antecipatório é por sua natureza complemente inidônea para atribuir ao autor a declaração - ou a certeza jurídica por ele objetivada."
(MARINONI, Luiz Guilherme.
A antecipação da tutela.
7. ed. SP: Malheiros. p. 55). No âmbito do mandado de segurança, há regras pontuais no
art. 7 da lei n. 12.016/2009
.
2.20. Hipóteses de contraditório postergado:
Em regra, a antecipação de tutela apenas pode ser promovida quando assegurado prévio contraditório ao demandado, conforme art. 5, LIV e LV, CF e art. 7, parte final, CPC.
Isso não impede, todavia, que, em situações excepcionais, o contraditório seja postergado, em face da urgência documentada nos autos
.
PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR PARA DETERMINAR O PROCESSAMENTO DE RECURSO ESPECIAL. POSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS DO FUMUS BONI JURIS E DO PERICULUM IN MORA. 1. O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que a regra de obstar o recurso especial retido deve ser obtemperada para que não esvazie a utilidade daquele apelo extremo. 2.
O poder geral de cautela há que ser entendido com uma amplitude compatível com a sua finalidade primeira, que é a de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional. Insere-se aí a garantia da efetividade da decisão a ser proferida. A adoção de medidas cautelares (inclusive as liminares inaudita altera parte) é fundamental para o próprio exercício da função jurisdicional, que não deve encontrar obstáculos, salvo no ordenamento jurídico
. 3. O provimento cautelar tem pressupostos específicos para sua concessão. São eles: o risco de ineficácia do provimento principal e a plausibilidade do direito alegado (periculum in mora e fumus boni iuris), que, presentes, determinam a necessidade da tutela cautelar e a inexorabilidade de sua concessão, para que se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produção de efeitos concretos do provimento jurisdicional principal. 4. Em tais casos, pode ocorrer dano grave à parte, no período de tempo que mediar o julgamento no tribunal a quo e a decisão do recurso especial, dano de tal ordem que o eventual resultado favorável, ao final do processo, quando da decisão do recurso especial, tenha pouca ou nenhuma relevância. 5. Existência, em favor da requerente, da fumaça do bom direito e do perito da demora, em face da patente contrariedade ao art. 2º, da Lei nº 8.437/92, visto que, na hipótese dos autos, não há necessidade da prévia audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, vez que o ente Municipal sequer figura na relação processual. 6. Medida Cautelar procedente, para determinar o processamento do recurso especial. ..EMEN: (MC 200100113001, JOSÉ DELGADO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJ DATA:13/05/2002 PG:00150 ..DTPB:.)
Com efeito, citando novamente Araken de Assis, quando enfatiza o que transcrevo abaixo:
"
O processo constitucionalmente justo e equilibrado (faires Verfahren) exige a oportunidade de as partes influírem na atividade do órgão judiciário. O princípio do contraditório, na sua dimensão horizontal, assegura à parte a possibilidade de manifestação acerca das (a) razões de fato, (b) os meios de prova tendentes a demonstrar-lhes a veracidade, e (c) as razões de direito da contraparte
.
O processo criará inexoravelmente uma comunidade de trabalho, sem prejuízo da parcialidade das partes, e o contraditório assume dimensão vertical. Limitará a atuação do órgão judiciário no que concerne à matéria de direito, domínio que lhe toca na qualidade maître du droit -,79 impondo a manifestação prévia das partes sobre (a) a qualificação jurídica dos fatos afirmados, ou dos fatos não alegados, mas constantes dos autos, que o juiz possa considerar relevantes; (b) as normas legais que o juiz entenda aplicáveis à resolução da causa; e (c) as questões que se mostra lícito ao juiz conhecer sem alegação das partes (v.g., as “condições” da ação – legitimidade e interesse processual –, a teor do art. 485, § 3.º). O art. 357, IV, exige a delimitação das questões de direito na decisão de saneamento e de organização do processo para essas finalidades.
A urgência autoriza, entretanto, a postergação do contraditório em certas condições. É o que se infere do art. 300, § 2.º, segundo o qual “a tutela de urgência pode ser concedida liminarmente”. O art. 12, caput, da Lei 7.347/1985 determina o seguinte na ação civil pública: “Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo”. E o art. 7.º, III, da Lei 12.016/2009 estipula que o juiz, no mandado de segurança, ordenará a suspensão incontinenti do ato de autoridade “quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida
." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
volume II. Tomo II. Parge Geral: institutos fundamentais. São Paulo: RT, 2015, tópico 1.425).
Outrossim,
"Duas situações autorizam o juiz à concessão de liminar sem a audiência do réu (inaudita altera parte): (a) sempre que o réu, tomando prévio conhecimento da medida, encontre-se em posição que lhe permita frustrar a medida de urgência; (b) sempre que a urgência em impedir a lesão revele-se incompatível com o tempo necessário à integração do réu à relação processual. Essa última hipótese é objeto do seguinte precedente do STJ: “Justifica-se a concessão de liminar inaudita altera parte, ainda que ausente a possibilidade de o promovido frustrar a sua eficácia, desde que a demora de sua concessão possa importar em prejuízo, mesmo que parcial, para o promovente."
(ASSIS, Araken.
Obra citada.
tópico 1.426).
Com efeito,
"
É constitucional a decisão antecipatória de tutela que, liminarmente e adiando a observância do contraditório para momento posterior, concede a antecipação dos efeitos da tutela para homenagear outro direito em voga, cuja preterição se revelar mais danosa
. 2. O perigo de irreversibilidade da medida, não obstante existente no presente caso, não subsiste quando encarado frente ao perigo da demora, o qual milita em favor da parte agravada."
(TJ-PE - AI: 2784312 PE, Relator: Roberto da Silva Maia, Data de Julgamento: 21/05/2013, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 29/05/2013).
Note-se, por exemplo, que a compreensão e aplicação do art. 2, da lei n. 8.437, de 1992, não podem implicar inexorável vedação à antecipação de tutela
inaudita altera parte
, sobremodo quando em causa perigo de danos ambientais, dado o alcance do art. 225, da Constituição e legislação correlata. Assim, "
O Superior Tribunal de Justiça tem flexibilizado o disposto no art. 2º da Lei n.º 8.437/92 a fim de impedir que a aparente rigidez de seu enunciado normativo obste a eficiência do poder geral de cautela do Judiciário
."
(REsp 1130031/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, 2.T. julgado em 22/06/2010, DJe 03/08/2010)
Por sinal, "
Excepcionalmente, é possível conceder liminar sem prévia oitiva da pessoa jurídica de direito público, desde que não ocorra prejuízo a seus bens e interesses ou quando presentes os requisitos legais para a concessão de medida liminar em ação civil pública. Hipótese que não configura ofensa ao art. 2º da Lei n. 8.437/1992
."
(AgRg no REsp 1.372.950/PB, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/6/2013, DJe 19/6/2013.)
Sabe-se, pois, que
"
a jurisprudência do STJ tem mitigado, em hipóteses excepcionais, a regra que exige a oitiva prévia da pessoa jurídica de direito público nos casos em que presentes os requisitos legais para a concessão de medida liminar em ação civil pública
(art. 2º da Lei 8.437/92). Precedentes do STJ."
(REsp 1.018.614/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/6/2008, DJe 6/8/2008).
2.21. Prescrição - pretenção à inibição da cobrança tributária:
Como explicita Nelson Nery Jr.,
"O prazo previsto expressamente em lei para o exercício das pretensões que se ajuízam mediante ação constitutiva, positiva ou negativa, é de decadência, pois a pretensão constitutiva se caracteriza como direito potestativo.
As pretensões que se exercem mediante ação declaratória são perpétuas (imprescritíveis). Isto significa que podem ser ajuizadas mesmo se já estiver prescrita a pretensão condenatória do direito cuja existência ou inexistência se quer ver declarada
."
(NERY JR.
Novo Código Civil anotado.
SP: RT, 2002).
Convém atentar, ademais, para a lição de José Hable:
"
O termo prescrição advém do vocábulo latino praescriptio e é na história do direito romano que se pode esclarecer o conceito etimológico de sua expressão jurídica, como descrito por Câmara Leal, e que, por ' por uma evolução conceitual, passou o termo a significar, extensivamente, a matéria contida na parte preliminar da fórmula, e daí sua acepção de extinção da ação pela expiração do prazo de sua duração.
'
Segundo o mesmo autor, prescrição é a extinção de uma ação ajuizável, em virtude da inércia de seu titular durante um certo lapso de tempo, na ausência de causas preclusivas do seu curso. .
Sob a nova tese disciplinada no art. 189, Código Civil de 2002, Pablo Siolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho conceituam a prescrição como sendo a perda da pretensão de reparação do direito violado, em virtude da inércia do seu titular, no prazo previsto em lei.
Já sob a ótica tributária, nos temos do que disciplina o Código Tributário Nacional, de 1966, em seu art. 174, Zelmo Denari define prescrição como sendo a extinção da ação que protege o direto subjetivo de crédito, pela inércia continuada do ente público, que deixa de exercitá-la no prazo legal
.
O objeto da prescrição, nas palavras de Eurico Marcos Diniz Santi, é a relação jurídica linear que se estabelece entre o Fisco e o Estado-Juiz, ou seja, a prescrição extingue o direito de ação que se estabelece entre o sujeito-credor e o Estado-juiz." (HABLE, José.
A extinção do crédito tributário por decurso de prazo:
Decadência e prescrição tributárias. 4. ed. São Paulo: Método, 2014, p. 116-117)
Ora, é sabido que a prescrição da pretensão do contribuinte à restituição de indébito está regulada pelo art. 168, Código Tributário Nacional - CTN, cujo conteúdo segue:
"O direito de pleitear a
restituição
extingue-se com o decurso do prazo de
5 (cinco) anos
, contados: I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; II -
na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória
.
Segue o
art. 165, CTN/66
, que complementa aquele preceito: "
O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no
§4º do artigo 162
, nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III - reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória."
O adimplemento pelo contribuinte é uma das formas pelas quais o crédito tributário é extinto (
art. 156, I, CTN/66
). Por conseguinte, a leitura conjunta desses dispositivos enseja a conclusão de que o contribuinte contaria com o prazo de 05 anos, com termo inicial na data do alegado pagamento indevido (ou maior que o devido), para que postular em juízo a sua restituição.
Vigorou durante muito tempo, porém, a tese de que aludido prazo, quanto aos tributos submetidos ao lançamento por homologação (art. 150, CTN/66), deveria ser computado a partir do término dos 05 anos, previstos em lei para que a Fazenda Pública promovesse eventual lançamento de revisão, na forma do art 150, §4, CTN. A
lei complementar 118
, de de 9 de fevereiro de 2005, buscou alterar referido entendimento, de modo a reduzir o prazo para 05 anos, mesmo no âmbito dos tributos submetidos ao pagamento sem prévia liquidação estatal do
quantum debeatur.
Não se tratou de lei interpretativa, mas sim de evidente texto elaborado com pretensões retroativas, incompatível com o postulado da segurança jurídica (art. 5, XXXVI, Constituição/88).
Daí que, como sabido, ao apreciar o
RE 566.621/RS, a Suprema Corte tenha limitado a aplicação desse prazo de 05 anos às demandas deflagradas depois de vencido o período de
vacatio
dessa lei complementar 118
. A
vacatio
daquela lei complementar esgotou-se em
08 de junho de 2005
(conforme art. 4º, LC 118). Por conseguinte, as demandas iniciadas na data de 09 de junho de 2005 e no período subsequente já estão submetidas ao prazo prescricional quinquenal, mesmo que se cuide da pretensão à restituição de tributos submetidos ao lançamento por homologação.
TRIBUTÁRIO. CONSTITUCIONAL. COFINS. REVOGAÇÃO DE ISENÇÃO OUTORGADA ÀS SOCIEDADES CIVIS PRESTADORAS DE SERVIÇOS PROFISSIONAIS. LC N.º 70/91. LEI N.º 9.430/96. PARECER NORMATIVO COSIT N.º 03/94. prescrição. LC N.º 118/05. 1.
Segundo orientação do e. STJ e também desta Corte, tratando-se de ação ajuizada após o término da vacatio legis da LC n.º 118/05, objetivando a restituição ou compensação de tributos sujeitos a lançamento por homologação recolhidos indevidamente, o prazo prescricional é de cinco anos a contar da data do pagamento antecipado do tributo (art. 150, § 1º e 168, inciso I, ambos do CTN, c/c art. 3º da LC n.º 118/05)
. 2. Inexiste interesse de agir relativamente aos valores pagos indevidamente a título de COFINS por força da restrição imposta pelo Parecer Normativo COSIT n.º 03/94 em período anterior ao da vigência da lei n.º 9.430/96, porquanto, de acordo com seus atos constitutivos, a empresa somente começou as suas atividade em ago/98. 3. lei ordinária pode revogar isenção concedida por lei complementar, visto que dita matéria não se inclui dentre aquelas reservadas à competência da lei complementar. 4. É legítima a revogação operada pelo art. 56 da lei n.º 9.430/96 da isenção da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, prevista no art. 6º, inciso II, da lei Complementar n.º 70/91, relativamente às sociedades civis prestadoras de serviços profissionais de profissão regulamentada. 5. Sentença parcialmente reformada. (AMS 200571000298064, MARIA HELENA RAU DE SOUZA, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 18/04/2007.)
Anote-se, todavia, que a prescrição apenas atinge a pretensão à restituição de valores recolhidos antes de 05 anos da data do ingresso em juízo
(art. 240, CPC/15 c/ art. 206, CC/02). Sempre que a relação tributária implicar a obrigação de recolhimento, pelo contribuinte, de valores de modo periódico, será aplicada a lógica da súmula 85, STJ, ao preconizar que
"Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.
" Nos demais casos, cuidando-se de pretensão não periódica, eventual indeferimento na seara administrativa pode dar ensejo à prescrição de fundo de direito, caso se esgote o prazo para deflagrar a demanda judicial pertinente.
Ademais, no curso de eventual processo administrativo, versando sobre a delimitação dos tributos a serem recolhidos, o cômputo da prescrição respectiva resta suspenso, por força do
art. 4. do decreto 20.910/32
.
2.22. Eventual
prescrição
- situação em exame:
Desse modo, como regra, a prescrição da pretensão à repetição de indébito tributário opera-se com o esgotamento do
prazo de 5 anos,
contados da data do recolhimento totalmente indevido ou maior do que o devido - art. 168, Código Tributário Nacional. Há algumas peculiaridades quando se cuida de insurgência contra cobrança promovida pelo Estado, quanto a tributos não recolhidos, dada a necessidade de aplicação, então, do art 173, CTN.
Aludidas normas afastam, por sua especialidade, a aplicação do
art. 206, §3º, IV, Código Civil/2002
, conforme lógica do
art. 2º do decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942
. Atente-se para os julgados abaixo transcritos:
"ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PRESCRIÇÃO. SÚMULAS 150 E 383 DO STF. I.
É firme na jurisprudência a orientação no sentido de que a prescrição da ação de conhecimento e a da execução são distintas, exceto no tocante ao período de cinco anos. Assim, a partir do trânsito em julgado da sentença oriunda da ação coletiva, iniciou-se novo prazo quinquenal para a execução, e não o reinício do prazo anterior (único) pela metade. Nesse sentido, o enunciado da Súmula 150 do STF: "Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação". II. A Súmula n.º 383 do STF estabelece que "A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo
". III. O trânsito em julgado parcial da ação coletiva em comento se deu em 26/08/2009, e a parte exequente ajuizou Medida Cautelar de Protesto em 31/07/2014. Assim, como o ajuizamento do cumprimento de sentença ocorreu em 30/01/2017, antes dos dois anos e meio da data do protesto, não há prescrição. Com relação ao primeiro protesto, como bem referido pelo juízo a quo, não teve eficácia, visto que foi ajuizado antes do início da fluência do prazo prescricional." (TRF-4 - AG: 50184291420194040000 5018429-14.2019.4.04.0000, Relator: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 03/07/2019, QUARTA TURMA)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INOCORRÊNCIA. DECISÃO MANTIDA. (9) 1. "
Esta Corte já firmou entendimento no sentido de que a intimação da Fazenda deve ser pessoal, e que a prescrição intercorrente não pode ser reconhecida se a paralisação do feito ocorrer por falha do mecanismo judiciário, ao não proceder à intimação da forma devida
. (Precedentes: Resp 796.382 - RO, Relator: Ministro Peçanha Martins, DJ 31/3/2006; AgRg no Ag 275.934-RS, Relator: Ministro José Delgado, DJ 15/5/2000; REsp 646.392-PR, Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 28/9/2006)"Precedente. 2. In casu, restou demonstrado que os exeqüentes Augusto Machado Ribeiro, Ario Marinho, Estela Marinho dos Santos, João Rocha Nascimento e Petronilho Correa de Araújo não deram causa ao não prosseguimento do feito, o que impede o reconhecimento da prescrição intercorrente. Deveriam ter sido intimados para constituir novo procurador, mas, por uma falha do mecanismo do judiciário, isso não ocorreu. 3. Agravo regimental improvido. (TRF-1 - AGA: 26649220074010000 MG 0002664-92.2007.4.01.0000, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL ÂNGELA CATÃO, Data de Julgamento: 02/04/2013, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.34 de 21/05/2013)
A conjugação do
art. 1 do decreto 20.910/32 com os arts. 168 e ss., CTN
, evidencia que a pretensão anulatória do contribuinte prescreve em 05 anos, contados da data em que toma conhecimento do lançamento impugnado (
actio nata
). No curso do processo administrativo respectivo, o cômputo da prescrição resta suspenso -
art. 4 do decreto 20.910/32
.
Assim, em primeiro exame, não se operou a pretensão da parte autora, eis que se insurge contra lançamento tributário, havido em 20 de fevereiro de 2025.
2.23. Eventual decadência do direito invocado na inicial:
Em regra, os prazos decadenciais são oponíveis às pretensões constitutivas ou desconstitutivas. Atingem os chamados
direitos potestativos
- ou seja, direitos formativos geradores, na dicção de Francisco Pontes de Miranda, a exemplo do divórcio, rescisão unilateral de contratos de locação etc.
Sustenta-se que a
"decadência, ou caducidade, na definição de Câmara Leal, é a extinção ou perecimento do direito pelo decurso do prazo fixado ao seu exercício, sem que seu titular o tivesse feito.
O principal efeito da decadência, seguindo o raciocínio de Câmara Leal, é o de extinguir o direito
. Desta circunstância decorre o fato de que a decadência do direito faz desaparecer a ação que deveria assegurá-lo: a) quando direito e ação não se identificam, a ação não chega sequer a nascer; b) a decadência perece com o direito, quando ambos nascem simultaneamente."
(NERY, Rosa; NERY JR, Nelson.
Instituições de Direito Civil. vol. 1
São Paulo: RT. 2019. item 79).
No presente caso,
não está em debate a invocação de direito potestativo
, de modo que a situação jurídica, reclamada pela parte autora, não está submetida a prazos decadenciais. Esse exame não se confunde com a análise de eventual decadência do direito do Fisco em promover o lançamento, algo distinto - art. 150, §4, CTN.
2.24. Considerações sobre o TCFA:
Por meio do art. 8º da lei 9960/2000, a União Federal criou a chamada 'taxa de fiscalização ambiental' - TFA:
"
Constitui fato gerador da TFA, o exercício das atividades mencionadas no inciso II do art. 17 desta Lei, com a redação dada pela Lei no 7.804, de 18 de julho de 1989
."
O Supremo Tribunal Federal deferiu, em 29 de março de 2000, a tutela de urgência em sede de medida cautelar na
ADI 2178-MC
, rel. Ilmar Galvão, suspendendo a eficácia do aludido art. 8º. Mas o caso não chegou a ser julgado em definitivo, dada a superveniência da lei n. 10.165, de 27 de dezembro de 2000, cujo art. 1º criou a taxa de controle e fiscalização ambiental. Com isso aquela tutela de urgência acabou por perder o objeto.
Veiculadas pela
lei 10.165/2000
, referidas normas foram alvo, então, de inúmeras demandas judiciais, impugnando a sua validade. O Supremo Tribunal Federal concluiu, todavia, que a exação estaria em conformidade com a Lei Maior, conforme se infere do julgamento do
RE 416.601-1/DF
, rel. Min. Carlos Velloso: "
Lei 6.938/81, com a redação da Lei 10.165/2000, artigos 17-B, 17-C, 17-D, 17-G. C.F., art. 145, II. I. -
Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA - do IBAMA: Lei 6.938, com a redação da Lei 10.165/2000: constitucionalidade. II. - R.E. conhecido, em parte, e não provido
."
(STF, RE nº 416.601/DF, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 30/9/05).
Naquela ocasião, a Suprema Corte sustentou que se cuidaria realmente de uma taxa decorrente do poder de polícia exercido pelo IBAMA, na forma do art. 78, CTN. Referido entendimento é de aplicação cogente, diante dos
arts. 927 e 489, §1º, VI, CPC/15
, alvo dos lúcidos comentários de Araken de Assis:
"Por mais de uma razão só em sentido amplíssimo mostra-se possível conceber o julgamento segundo a legalidade, conseguintemente, a obediência do juiz à lei. O juiz não deve contas unicamente à sua consciência e aos pendores do seso de justiça próprio. Não julga porque quer, nem recebeu investidura nesse sentido. O Estado outorgou-lhe esse poder, consoante o modelo constitucional, exigindo-lhe modesta contrapartida: obediência ao ordenamento jurídico, principalmente à lei, ou seja, ao direito vigente no Estado, na sua inteireza, especialmente quanto às fontes formais do Poder Legislativo. E impõe essa exigência por razão básica, mas fundamental: a conduta prescrita aos particulares e aos agentes públicos e conhecida prévia e abstratamente nas normas legais, e o próprio juiz, o mais importante órgão estatal, não se furta desses comandos. O problema da legitimidade democrática da criação judicial não pode ser resolvidos pelos controles internos da magistratura, porque esses são exercidos por outros juízes.
Em matéria de previsibilidade dos pronunciamentos judiciais, e, portanto, de segurança e de certeza, que constituem o cimento imprescindível à ordem jurídica justa, a súmula vinculante significou notável avanço, agora acompanhado dos precedentes no julgamento dos casos repetitivos (art. 928, I e II). E, perante a súmula vinculante e o precedente, a obediência à lei (ou antes, à consciência da pessoa investida na função juridicamente) não serve de pretexto hábil ao seu descumprimento
.
À primeira vista,as operações intelectuais do órgão judiciário, perante o verbete, não se distinguiriam das feitas para aplicar o direito objetivo. Embora a aplicação da súmula vinculante e do precedente não seja mecânica e automática, pois a adequação da tese jurídica à questão de fato depende de interpretação, ensejando pronunciamento alternativo, tal questão não toca o ponto.
E, com efeito, se a tese jurídica consagrada na súmula e no precedente rege a espécie litigiosa, todavia, ao órgão judiciário faltará a liberdade de aplicá-la, ou não. É imperativo que a aplique ao objeto litigioso. Ficará impedido de rejeitá-la, oferecendo sua própria interpretação da questão constitucional. E deixando de aplicá-la, estritamente, ensejará a reclamação prevista no art. 103, §3º, CF e no art. 988, NCPC. O acolhimento da reclamação implicará nulidade do provimento contrário à súmula. Desaparece, correlatamente, a independência do juiz.
Essa situação de modo algum equivale à submissão do juiz ao ordenamento jurídico subentendida no art. 8º. O juiz é livre para negar aplicação à lei e para interpretá-la a seu modo, adotando entendimento minoritário ou vencido, o que nunca ocorrerá perante uma súmula vinculante ao precedente. Em suma, a liberdade de interpretação fica restrita à adequação da tese jurídica ao material de fato (art. 489, §1º, VI) e desaparece a liberdade de aplicação
." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo I. Parte geral. Institutos Fundamentais. Sâo Paulo: RT, 2015, p. 926-927)
Segundo o voto do Min. Carlos Velloso,
"
A hipótese de incidência da taxa é a fiscalização de atividades poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais, exercidas pelo IBAMA (lei 6938/1981, art. 17-B, com a redação dada pela lei 10.165/2000). Tem-se, pois, taxa que remunera o exercício do poder de polícia do Estado
."
(RE 416.601/DF, p. 20). Nesse mesmo sentido, leia-se:
"Agravo regimental no recurso extraordinário. Tributário. Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental. Ibama. Constitucionalidade. Precedentes. 1.
A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido de ser constitucional a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA). 2. Agravo regimental não provido
."
(STF - RE: 603513 MG, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 28/08/2012, Primeira Turma)
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - TCFA. CONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO” ( AI nº 648.201/SP-AgR, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia , DJe de 26/6/09).
“TRIBUTÁRIO. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL. CONSTITUCIONALIDADE. LEIS 6.938/81 E 10.165/2000. AGRAVO IMPROVIDO. I -
Constitucionalidade da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental, objeto da Lei 6.938/81, com a redação dada pela Lei 10.165/2000
. Precedente do Plenário. II - Agravo regimental improvido” (AI nº 638.092/SP-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski , DJe de 17/4/09).
Também há, todavia, alguns precedentes enfatizando que, a rigor,
cuidar-se-ia de uma contribuição de intervenção no domínio econômico
(p.ex., AC 200870090014330, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 01/06/2010.). Compartilho desse entendimento. De toda sorte, mesmo reconhecendo-se essa pretensa natureza de contribuição social, o fato é que os Tribunais têm julgado que referido gravame estaria em conformidade com os dispositivos constitucionais pertinentes.
Agravo regimental no recurso extraordinário. Tributário. Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental. Ibama. Constitucionalidade. Precedentes. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido de ser constitucional a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA)
. 2. Agravo regimental não provido. (RE-AgR 603513, DIAS TOFFOLI, STF.)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - TCFA. IBAMA. LEI N. 10.165/2000. CONSTITUCIONALIDADE. 1. Este Tribunal, ao julgar o RE n. 416.601, declarou a constitucionalidade da Taxa de Controle e fiscalização ambiental - TCFA. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (RE-AgR 452408, EROS GRAU, STF.)
Conforme se infere do
art. 17-I da lei 6938/1981
, com a redação veiculada pela lei 10.165/2000, preconizou-se a imposição de multa para os contribuintes que não promovessem a inscrição nos respectivos cadastros até o último dia útil do terceiro mês subsequente à publicação daquela lei. Trata-se de um dever instrumental, definido no art. 113, §2º, CTN. O tema foi tratado também na IN 10, de 17 de agosto de 2001, do IBAMA (com a atualização dada também pela IN 96/2006); seu art. 3º dispensou algumas empresas da obrigação de preencher dito cadastro.
A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, em seu art. 17, torna necessária a inscrição, por parte de determinadas empresas, no Cadastro Técnico Federal, sujeitando-as ademais ao pagamento de TCFA, da seguinte forma:
Art. 17. Fica instituído, sob a administração do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA: I - Cadastro Técnico Federal de atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental, para registro obrigatório de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a consultoria técnica sobre problemas ecológicos e ambientais e à indústria e comércio de equipamentos, aparelhos e instrumentos destinados ao controle de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; II - Cadastro Técnico Federal de atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, para registro obrigatório de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a atividades potencialmente poluidoras e/ou à extração, produção, transporte e comercialização de produtos potencialmente perigosos ao meio ambiente, assim como de produtos e subprodutos da fauna e flora.
Art. 17-B.
Fica instituída a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA, cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais
." (Redação dada pela Lei nº 10.165, de 2000)
Art. 17-C.
É sujeito passivo da TCFA todo aquele que exerça as atividades constantes do anexo VIII desta Lei
.(Redação dada pela Lei nº 10.165, de 2000) (...)
No anexo VIII, essa lei veicula a indicação das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais que, se desenvolvidas pela empresa, ensejam a inscrição no CTF e pagamento de TCFA. Convém ter em conta, por conseguinte, que é a lei
stricto sensu
que define a relação de atividades potencialmente poluidoras, submetidas ao recolhimento do tributo em questão, conforme
art. 17-C da lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981
, com a redação veiculada pela lei n. 10.165, de 27 de dezembro de 2000.
Em princípio, quando se trata de
empresa inativa
, a TCFA não pode ser cobrada, por conta da ausência de um fato jurídico tributário que se amolde à hipótese de incidência da aludida norma.
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL (TCFA). SOCIEDADE EMPRESÁRIA INATIVA. FATO GERADOR. INOCORRÊNCIA. 1. Nos termos do art. 17-B da Lei nº 6.938/81, a TCFA tem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia conferido ao IBAMA para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais, sendo sujeito passivo, de acordo com o art. 17-C, todo aquele que exerça as atividades constantes do Anexo VIII daquela Lei. 2.
Se a empresa está inativa, não há, por razão lógica, o desempenho de atividade potencialmente poluidora e/ou utilizadora de recursos naturais, de maneira que não cabe falar em ocorrência do fato gerador do tributo em tela, qual seja, o exercício do poder de polícia pelo Estado. Precedentes desta Corte
. 3. Verificado o encerramento da atividade da sociedade empresária, a cobrança da taxa de polícia pelo IBAMA é indevida, ainda que não tenha o contribuinte promovido a baixa do seu cadastro junto à citada autarquia. Isso porque o que é determinante para o surgimento da obrigação é a ocorrência do fato jurídico tributário, e não a situação cadastral do contribuinte, mera formalidade, a qual não pode prevalecer frente à realidade fática. 4. Hipótese em que, de acordo com o acervo probatório dos autos, a CDA que lastreia o executivo fiscal refere-se a períodos da TCFA (2011 a 2014) nos quais a embargante já estava inativa, de modo que é indevida a cobrança da taxa. 5. Apelação desprovida. (AC - Apelação Civel - 589422 0001462-14.2015.4.05.8302, Desembargador Federal Paulo Machado Cordeiro, TRF5 - Terceira Turma, DJE - Data::31/08/2016 - Página::107)
ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - TCFA. EMPRESA INATIVA ANTES DO FATO GERADOR. COBRANÇA INDEVIDA. PRECEDENTES. 1. Apelação interposta contra sentença julgou procedentes embargos à execução fiscal para desconstituir o crédito de TCFA, referente ao ano de 2007. 2. A TCFA, instituída pela Lei 10.165/00, tem por fato gerador o serviço de controle das atividades potencialmente poluidoras e a fiscalização da utilização de recursos naturais, sendo calculada em função da potencialidade poluidora da atividade exercida pelo contribuinte. 3. O STF já decidiu, quanto a referida taxa, que "não há invocar o argumento no sentido de que a taxa decorrente do poder de polícia fica restrita aos contribuintes cujos estabelecimentos tivessem sido efetivamente visitados pela fiscalização. Destarte, os que exercem atividades de impacto ambiental tipificadas na lei sujeitam-se à fiscalização do IBAMA, pelo que são contribuintes da taxa decorrente dessa fiscalização, fiscalização que consubstancia, vale repetir, o poder de polícia estatal". (RE nº 416601). 4.
In casu, a embargante, ao apresentar sua declaração anual de rendimentos à Receita Federal, comunicou ao referido órgão, desde o ano de 2003, sua inatividade. Com a comprovada inatividade, não poderia a embargante ser contribuinte da TCFA. Não há serviço a ser desempenhado pelo Estado, a ser remunerado pela taxa, mesmo que de forma potencial, em empresa que se encontra inativa desde antes do fato gerador cobrado.
5. O fato de a empresa não promover sua baixa junto ao IBAMA, não pode configurar motivo para a subsistência da cobrança perpetrada pela autarquia na execução fiscal, sob pena de se prestigiar as formalidades sobre a realidade dos fatos. 6. Precedente desta Corte: AG nº 131929, ReI. Des. Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, DJe 11/07/2013. 7. Apelação não-provida. (AC - Apelação Civel - 583966 0015847-93.2012.4.05.8100, Desembargador Federal Manuel Maia, TRF5 - Quarta Turma, DJE - Data::05/11/2015 - Página::106.)
Assim, por força da legislação, todos os estabelecimentos, obras ou atividades que
empreguem recursos naturais
- ou aqueles que sejam efetiva ou potencialmente lesivos ao ambiente -
somente podem operar validamente mediante prévia licença ambiental
, conforme art. 225, Constituição/88. Não apenas isso, tais atividades também devem ser inscritas no
Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental
, conforme art. 9º, VIII, da lei n. 6.938, de 1981, como detalho na sequência. A prática de tais atividades pode dar ensejo, ademais, à incidência da taxa de controle e fiscalização ambiental - TCFA (lei 10.165/2000).
Com a redação dada pela MP 687/15, o anexo VIII da lei 6.938/81 relaciona as atividades potencialmente poluidoras para fins de ensejar o pagamento da TCFA, com classificação do grau de utilização e do potencial poluidor.
"
É importante atentar que a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA não está vinculada à competência para o licenciamento ambiental, Independentemente de o licenciamento da atividade ser procedido pelo IBAMA, pelo órgão estadual ou mesmo municipal
."
(TRENNEPOHL, C; TRENNEPOHL, T. Obra citada. RB - 5.2). Na forma do art. 17-Q da lei n. 6.938/1981, os Estados-membros podem celebrar
convênios
com o IBAMA, a fim de exercerem fiscalização ambiental em determinadas atividades , a fim de receberem parcela de valores recolhidos a título de TCFA, exigível trimestralmente, conforme valores previstos na Portaria Interministerial no 812, de 29 de setembro de 2015.
2.25. Quanto ao cadastro técnico federal:
Com a redação dada pela
lei 7.804/1989
, a
lei 6.938/1981
preconizou a criação de um cadastro técnico federal - CTF:
Art. 17. Fica instituído, sob a administração do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA: (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989)
I - Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental, para registro obrigatório de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a consultoria técnica sobre problemas ecológicos e ambientais e à indústria e comércio de equipamentos, aparelhos e instrumentos destinados ao controle de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; (Incluído pela Lei nº 7.804, de 1989)
II -
Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, para registro obrigatório de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a atividades potencialmente poluidoras e/ou à extração, produção, transporte e comercialização de produtos potencialmente perigosos ao meio ambiente, assim como de produtos e subprodutos da fauna e flora
.
Por seu turno, ao regulamentar a lei 9.605/1998, o
Decreto 6.514/2008
dispôs o que segue:
Art. 76.
Deixar de inscrever-se no Cadastro Técnico Federal de que trata o art.17 da Lei 6.938, de 1981
: Multa de: I - R$ 50,00 (cinqüenta reais), se pessoa física; II - R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais), se microempresa; III - R$ 900,00 (novecentos reais), se empresa de pequeno porte; IV - R$ 1.800,00 (mil e oitocentos reais), se empresa de médio porte; e V - R$ 9.000,00 (nove mil reais), se empresa de grande porte.
Assim, constata-se que as empresas que se dediquem a atividades potencialmente poluidoras e também extração, produção, comercialização e transporte de produtos potencialmente perigosos devem se inscrever no aludido cadastro, sob pena de multa.
TRIBUTÁRIO. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - TCFA. FATO GERADOR. ATIVIDADE A 1.
As pessoas jurídicas que se dedicam a atividades potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos naturais são obrigadas a se cadastrar junto ao IBAMA, e, com tal cadastro, passam a ser contribuintes da TCFA
. 2. O art. 17-C da Lei nº 6.938/1981 define como sujeitos passivos do tributo todos aqueles que exercem as atividades fiscalizadas, devidamente elencadas no anexo VIII da referida lei. 3. No caso dos autos, a atividade exercida pela filial da empresa autora, por ser meramente administrativa, não se enquadra no anexo da Lei 6.938/81, não havendo obrigatoriedade de registro no Cadastro Técnico Federal e pagamento da TCFA. (TRF-4 - APL: 50068917220164047200 SC, Relator: ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA, Data de Julgamento: 10/05/2023, PRIMEIRA TURMA)
Sabe-se ainda que
"
Tratando-se de cobrança da TCFA, o mero registro cadastral junto à autarquia não constitui hipótese de incidência tributária
. A existência de inscrição no IBAMA não tem o condão de autorizar a cobrança da referida taxa, porquanto imprescindível, para a existência da obrigação tributária, o lastro ofertado pelo fato gerador."
(TRF-4 - AG: 50531112420214040000 5053111-24.2021.4.04.0000, Relator: LEANDRO PAULSEN, Data de Julgamento: 20/04/2022, PRIMEIRA TURMA) Note-se, por outro lado, que o TRF4 já chegou a decidir como segue:
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL. DESCONHECIMENTO DO TRIBUTO. INEXISTÊNCIA DE COBRANÇAS ANTERIORES. AUSÊNCIA DE CADASTRO NO IBAMA. OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR. CORRETO ENQUADRAMENTO DA EMPRESA. ALTERAÇÃO DE EMPRESA DE PEQUENO PORTE PARA MICROEMPRESA. FALTA DE COMUNICAÇÃO DO IBAMA. ALÍQUOTA DA TAXA. COMPROVAÇÃO DA NOTIFICAÇÃO NO PROCEDIMENTO DE LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. SIMPLES E TCFA. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. 1. Verificada a ocorrência do seu fato gerador, é devida a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental. 2. O desconhecimento do tributo, bem como a ausência de seu recolhimento em períodos pretéritos, não exime o contribuinte do seu pagamento. 3.
O cadastro no IBAMA tem fins administrativos, visando ao correto enquadramento do contribuinte como pessoa física, microempresa, ou empresa de pequeno, médio ou grande porte. 4. Ainda que não tenha feito cadastro no IBAMA, os tributos são devidos, pois verificada a ocorrência de seu fato gerador, estando correto o enquadramento inicial do contribuinte como empresa de pequeno porte
. 5. A alteração do enquadramento da empresa, que de pequeno porte passa a ser microempresa, tem efeitos tributários e deve ser comunicada ao IBAMA, sob pena de ter o contribuinte de pagar a taxa pelo enquadramento originário. 6. A TCFA é taxa e não está incluída no regime de tributação pelo SIMPLES, razão pela qual não há relação alguma entre eles. 7. Comprovada a notificação do contribuinte por meio de edital, uma vez que frustrada a tentativa de notificação pessoal, é regular o procedimento administrativo de lançamento. 8. A TCFA é tributo sujeito ao regime de lançamento por homologação. Não havendo o seu recolhimento pelo contribuinte, deve ser lançado de ofício, dispondo o ente tributante do prazo de cinco anos para exercício do direito formativo, contado a partir do marco estabelecido pelo artigo 173, I, do CTN. Constituído o crédito tributário vencido, tem início o curso do prazo prescricional de cinco anos. 9. Sendo realizada a constituição do crédito dentro do prazo previsto, assim como interrompida a prescrição antes de seu termo, não há falar em extinção da execução por tal causa. (TRF-4 - AC: 001461 RS 2009.71.04.001461-3, Relator: LUIZ CARLOS CERVI, Data de Julgamento: 19/02/2013, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: D.E. 27/02/2013)
Da fundamentação deste julgado, destaco:
"A atividade desenvolvida pela embargante - fabricação de produtos farmacêuticos -, encontra-se discriminada sob o código 15 na tabela referida no artigo 17-C. É ela, portanto, é sujeito passivo da exação.
A circunstância de nunca ter feito cadastro no IBAMA, ainda que tomada como verdadeira, não exime a embargante de pagar o tributo, pois o fato gerador não é tal cadastro, mas sim "o exercício regular do poder de polícia conferido ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais". Modo igual, o desconhecimento da exação também não a torna inexigível, mormente em razão do disposto no artigo 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
(Decreto-Lei nº 4.657, de 1942), segundo o qual "ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece". Por fim, ainda que nunca tenha sofrido cobrança da taxa, é ela devida. Tal situação, se verídica, não passa de mero inadimplemento de tributos, não sendo o reiterado descumprimento das normas tributárias pelo contribuinte causa para o afastamento de sua incidência."
2.26. Postulado da legalidade tributária:
Na República Federativa do Brasil ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5º, II, CF). D'outro tanto, nos termos do art. 150, Constituição/88,
"
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça
."
Humberto Ávila explicita que
"
A Constituição/88 ao prescrever que ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de falar alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5º, II), que não há crime sem lei anterior que o defina
(art. 5º, XXXIX), elipticamente determina que o Estado só pode instituir tributos se assim o fizer por meio de lei. Mesmo assim, a Constituição, no sistema tributário nacional, condiciona a instituição e o aumento de tributos à edição prévia de lei (art. 150, I), inclusive proibindo a concessão de benefício fiscal sem a prévia previsão em lei específica (art. 150, §6º)."
(ÁVILA, H.
Segurança jurídica:
entre permanência, mudança e realização no Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 234).
Ainda segundo Ávila,
"
A obrigatoriedade de edição prévia de lei para a instituição de para o aumento de tributos é instrumento de promoção dos ideias de confiabilidade e de previsibilidade do (e pelo ordenamento) jurídico, porquanto a exigência de lei favore: a inteligibilidade do ordenameto jurídico, já que o contrbuinte possui maiores condições de acesso às normasa que deverá obedecer e de compreensão do seu conteúdo; a confiabilidade do ordenamento jurídico, já que as normas legais só poderão ser modificadas por meio de outras normas legais - o que contribui para sua estabilidade; a calculabilidade do ordenamento, visto que o contribuinte apresenta melhores condições de prever as obrigações tributárias futuras
. Note-se que a generalidade da lei não é condição para a previsibilidade, pois, de um lado, uma norma individual pode servir de instrumento de planejamento para o seu destinatário de modo muito mais eficiente e, de outro lado, uma norma geral que não seja conhecida e estável também não serve de meio adequado para que o indívuo trace seus próprios ideais. A generalidade é, na verdade, um instrumento de planejamento para todos e não para alguns, baseado na preservação da exigência de legalidade conjuntamente com a igualdade."
(
Obra citada,
p. 235).
É sabido que a Emenda Constitucional n. 32, ao alterar o art. 62, Constituição, estipulou ser válido o emprego de medida provisória para majoração de tributos. Abstraindo aqui qualquer exame mais denso desse tema, é fato que, quando menos, aludida atividade legiferante do Poder Executivo apenas poderá ser aceita quando preenchidos os requisitos do art. 62,
caput,
CF (relevância e urgência).
Tema mais difícil diz respeito à
eventual redução de tributos diretamente pelo Poder Executivo
, sem prévia autorização legal para tanto. O fundamental é ter em conta que os postulados
"no taxation without representation'
e '
nullum tributum sine lege prævia
"
são uma limitação do Estado perante os potenciais contribuintes. Isso significa que, em princípio, a redução de alíquotas mediante decretos não afrontaria, sob a perspectiva histórica, o princípio da legalidade tributária, conquanto essa atividade legiferante do Executivo possa ser questionada frente a outros vetores (por exemplo, isonomia, responsabilidade fiscal).
Convém ter em conta o art. 97, II, CTN/66 quando estabelece o que segue:
"Somente a lei pode estabelecer: (...) II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39,57 e 65
."
A questão está em saber se aludido preceito foi recepcionado pelo ordenamento jurídico pós-1988, dado que os inúmeros preceitos aludidos anteriormente tratam da vedação da majoração de tributos sem prévia lei (art. 150, I, CF). A Constituição não chegou a vedar expressamente a redução de alíquotas sem prévia autorização legislativa, conquanto isso possa ser extraído obliquamente do postulado da legalidade autorizativa (art. 37,
caput,
CF), dado que o Estado apenas pode atuar nos limites previamente autorizados pela lei, sempre que isso implicar mitigação de direitos fundamentais alheios (não raro, a redução de alíquotas para determinados contribuintes/fatos tributários pode ensejar majoração de alíquotas para os demais).
Convém atentar, de outro tanto, para a regra do art. 150, §6º, CF, com a redação veiculada pela emenda 03/1993:
"
Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2, XII, g
."
Confrontado esse dispositivo, a Suprema Corte já reputou inconstitucional norma que delegava, ao Governador do Estado, a concessão de anistia e remissão (
ADI 3462/MC
). Em face da redação conferida pela EC nº 3/93 ao § 6º do art. 150 da CF/88, o STF tem sustentado que a outorga de qualquer benefício fiscal em matéria tributária estará sujeita ao princípio da estrita legalidade (reserva legal) e que a exigência constitucional de lei específica para a concessão de qualquer subsídio, isenção, redução de base de cálculo, crédito presumido, anistia ou remissão é uma garantia do contribuinte que visa: “
Coibir o uso desses institutos de desoneração tributária como moeda de barganha para a obtenção de vantagem pessoal pela autoridade pública, pois a fixação, pelo menos, pelo mesmo Poder instituidor do tributo, de requisitos objetivos para a concessão do benefício tende a mitigar arbítrio do Chefe do Poder Executivo, garantindo que qualquer pessoa física ou jurídica enquadrada nas hipóteses legalmente previstas usufrua da benesse tributária.”
(STF, ADI 3.462, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 15.02.2011)
A conjugação destes vetores envolve, como se percebe, alguma perplexidade
.
Por um lado, convém não inverter o sinal do princípio da legalidade: uma garantia dos sujeitos em face do Estado
. A vedação de majoração de tributos sem prévia lei que a estabeleça não poderia se traduzir também em vedação da redução de tributos sem prévia lei, caso a questão ficasse apenas nisso. Por outro lado, contudo, a Constituição Federal expressamente limita a atividade do Poder Executivo, no que toca à exoneração de tributos (redução da base de cálculo, p.ex.), o que parece implicar também a vedação a que o Poder Executivo,
sponte sua,
acabe por obter o mesmo efeito, aplicando outros institutos sem prévia franquia legislativa (p.ex., alíquota zero).
Assim, por força do art. 150, §6º, CF, deve-se aferir sempre com redobradas cautelas a atividade legiferante do Executivo, mesmo naquelas hipóteses em que há redução de tributos (art. 97, II, CTN c/ art. 146, CF).
2.27. Presunções fiscais e juízos de abdução:
Frente ao exposto, a obrigação tributária tem origem na prática de um comportamento ou na ocorrência de um fato amoldado às previsões típicas, lançadas em lei (
art. 150, I, CF e art. 113, §1º, CTN/66
). Ou seja, como regra, o recorte do fato efetivamente havido ou do comportamento praticado deve coincidir com a hipótese de incidência do tributo para que o Estado possa legitimamente exigir o pagamento da exação fiscal. Eventual cobrança de tributos com lastro em analogias prejudiciais ao contribuinte acabaria por aniquilar o postuldo da legalidade.
Em muitos casos, todavia, a legislação admite a aferição indireta dos tributos, amparando-se em
arbitramentos, pautas fiscais e presunções
iuris tantum
. Explica Sperb Paola, tratando da matéria tributária, que
"Há arbitramento quando o Fisco, à falta de informações diretas sobre a existência e dimensão do fato jurídico tributário, vê-se obrigado a recorrer a elementos indiretos, dentre os quais os indícios, para fazer o lançamento fiscal."
(PAOLA, Leonardo Sperb de.
Presunções e ficções no direito tributário.
BH: Del Rey. 1997, p. 246-247).
Sabe-se, por certo, que
"
O arbitramento não confere à autoridade lançadora uma carta em branco para tributar o que quer que seja, hipótese na qual teria caráter punitivo. O administrador continua vinculado à busca da verdade material, devendo apresentar resultados tão aproximados da verdade quanto possível
. Para isso, há que considerar, conjuntamente, uma variada gama de indícios, que deve buscar na própria empresa (dados do exercício considerado para tributação e dos exercícios anteriores, estes para fins de comparação) e no setor onde esta atua (para fazer uma análise comparativa)."
(PAOLA, Leonardo Sperb de.
Obra citada.
p. 250).
Para além da apuração indireta dos próprios tributos, a lei também preconiza a aplicação de
juízos de abdução
, fundados em regras de experiência (art. 375, CPC/2015) quando em causa a suspeita da prática de infrações administrativas. Cuida-se de exame fundado no exame de indícios, cabível até mesmo no âmbito do processo criminal, conforme art. 239, CPP.
Como sabido, indício
"
é todo rastro, vestígio, sinal e, em geral, todo fato conhecido, devidamente provado, suscetível de conduzir ao conhecimento de um fato desconhecido, a ele relacionado, por meio de um raciocínio indutivo-dedutivo
"
(MOURA, Maria Thereza.
A prova por indícios no processo penal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris. p. 109). Tais sinais, fundamentando juízos de abdução, podem amparar um decreto condenatório, contando que sejam coerentes, harmônicos entre si, e não refutados por contraindícios.
"
Indício não é uma prova menor, mas uma prova que deve ser verificada. O indício é idôneo para apurar a existência de um fato histórico delituoso somente quando presentes outras provas que excluam uma diversa reconstrução do acontecimento. O princípio é formulado no art. 192, inc. 2, do CPP [italiano]: a existência de um fato não pode ser deduzida por meio de indícios, a menos que estes sejam graves, precisos e consonantes
. Desta regra emerge, em primeiro lugar, que um único indício nunca é suficiente." (TONINI,
Paolo.
A prova no processo penal italiano.
SP:RT. p. 58)
"
Valor probatório dos indícios: como já afirmamos em nota anterior, os indícios são perfeitos tanto para sustentara a condenação, quanto para a absolvição. Há autorização legal para a sua utilização e não se pode descurar que há muito preconceito contra essa espécie de prova, embora seja absolutamente imprescindível ao juiz utilizá-la. Nem tudo se prova diretamente, pois há crimes camuflados - a grande maioria - que exigem a captação de indícios para a busca da verdade real
. Lucchini, mencionado por Espínola Filho, explica que a eficácia do indício não é menor que a data prova direta, tal como não é inferior a certeza racional à histórica e física. O indício é somente subordinado à prova, porque não pode subsistir sem uma premissa, que é a circunstância indiciante, ou seja, uma circunstância provada; e o valor crítico do indício está em relação direta com o valor intrínseco da circunstância indiciante. Quando esteja bem estabelecida, pode o indício adquirir uma importância predominante e decisiva no juízo (...) Assim também Bento de Faria, apoiado em Malatesta.
Realmente, o indício apóia-se e sustenta-se numa outra prova. No exemplo citado na nota anterior, quando se afirma que a coisa objeto do furto foi encontrada em poder do réu não se está provando o fato principal, que consiste na subtração, mas tem-se efetiva demonstração de que a circunstância ocorreu, através do auto de apreensão e de testemunhas. Em síntese, o indício é um fato provado e secundário (circunstância) que somente se torna útil para a construção do conjunto probatório ao ser usado o processo lógico da indução." (NUCCI, Guilherme de Souza.
Código de processo penal comentado.
8ª ed., SP: RT. p. 514)
"Inicialmente, é de ser recordar que todos os meios de prova no processo penal são relativos, não existindo hierarquia entre eles. Fixada essa premissa, é óbvio que os indícios podem servir para sustentar uma condenação, a depender evidentemente da sua qualidade. (...) [Nota de rodapé:] Em passagem pitoresca Denílson Pacheco afirma: É possível se condenar com base em indícios?
Desde que sejam veementes e insofismáveis, a resposta é positiva. Para ilustrar, vamos contar uma estória muito difundida no meio forense. Um gato e um passarinho foram colocados no interior de uma sala hermeticamente fechada e completamente vazia
. Várias testemunhas idôneas foram colocadas do lado de fora da sala durante todo o evento. A única saída foi fechada e, rapidamente, foi aberta novamente, com todas as testemunhas observando a única saída. No interior da sala, o passarinho tinha sumido. Havia somente penas pelo chão. O gato encontrava-se num canto da sala, lambendo os beiços, com sangue pelos bigodes e, ainda, umas penas pelos dentes. Alguém viu o gato comendo o passarinho? Alguém viu o assassinato do passarinho? Todas as provas são indiciárias: a sala hermeticamente fechada, o gato e passarinho sozinhos na sala, as testemunhas idôneas que observaram todo o evento etc. Mas, de todos esses indícios veementes, podemos tirar nossa firme conclusão: alguém tem dúvida de que foi o gato que comeu o passarinho? (Direito processual penal, Teoria, crítica e práxis, p. 896)" (BEDÊ JÚNIOR, Américo; SENNA, Gustavo.
Princípios do processo penal:
entre o garantismo e a efetividade da sanção. RT, p. 113)
"
A prova indiciária, ou prova por indícios, terá a sua eficiência probatória condicionada à natureza do fato ou da circunstância que por meio dela (prova indiciária) se pretender comprovar
. Por exemplo, tratando-se de prova do dolo ou da culpa, ou dos demais elementos subjetivos do tipo, que se situam no mundo das idéias e das intenções, a prova por indícios será de grande valia." (
PACELLI DE OLIVEIRA.
Curso de processo penal.
6. ed. Del Rey, p. 367).
"
Se é verdade que na investigação da subjetividade do agente, o fato externo é que indica o elemento interno, isto não quer dizer que o dolo possa ser presumido. O juiz deverá se convencer da ocorrência do dolo, ainda que - para tanto - deva se basear em elementos objetivos
. Estes dados objetivos devem estar provados e convencer o julgador, sem margem de dúvida, sobre qual era a intenção do acusado. A inferência do elemento subjetivo a partir de dados objetivos não significa que o dolo seja presumido." (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy.
Ônus da prova no processo penal.
SP: RT, 2.003, p. 307)
Transcrevo também alguns julgados a respeito desse tema:
"Uma sucessão de indícios e circunstancias, coerentes e concatenadas, podem ensejar a certeza fundada que e exigida para a condenação."
(STJ, 5ª turma, REsp n. 130.570, rel. Min. Felix Fischer, DJU de 06.10.97, p. 50.035)
"
Indícios e circunstâncias quando múltiplos, sucessivos, coerentes concatenados e veementes, como no caso dos autos, têm o mesmo valor das provas diretas e são suficientes para embasar uma decisão condenatória, ainda mais quando excluem quaisquer outras hipóteses favoráveis ao condenado
."
(TRF da 4ª Rg., 7ª Turma, Apelação criminal de autos 200104010635742/PR, rel. Des. Fed. José Luiz Borges Germano da Silva, DJU 01.09.2004, p. 802, omiti o restante da ementa).
"
Pressuposta a impenetrabilidade de consciência, se o réu não confessa, a prova do elemento subjetivo do delito só pode ser fornecida por meios indiretos, por indícios, vale dizer
."
(TRF 3ª Rg., ACR 17.877, DJU de 05.08.2005, p. 383, rel. Juiz Peixoto Júnior).
Assim, desde que haja efetiva justa causa para tanto, o Estado pode promover a aferição indireta de tributos, facultando-se ao contribuinte a apresentação de elementos de convicção que infirmem as suspeitas estatais. Note-se, a título de exemplo, que a legislação tributária inverte o ônus da prova, exigindo do contribuinte a comprovação da regularidade da importação, conforme se infere do art. 23, §2º do DL 1455/1976, com a redação veiculada pela lei 10.637
: "
Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não-comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregado
s."
Atente-se também para a lógica do art. 42 da lei 9430/1996: "
Caracterizam-se também omissão de receita ou de rendimento os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações."
Isso significa, portanto, que - desde que presentes indícios de sonegação de tributos - o Fisco pode exigir do contribuinte a apresentação dos comprovantes da operação, a fim de aferir a adequação dos montantes recolhidos, em face dos valores realmente devidos.
Ora,
"
A fiscalização tributária deve, em regra, ater-se à escrita contábil e demais documentos apresentados pela empresa. Entretanto, há casos em que a lei admite a apuração, por aferição indireta. O pressuposto do arbitramento é a omissão do sujeito passivo, recusa ou sonegação de informação ou, ainda, a irregularidade das declarações ou documentos que devem ser utilizados para o cálculo do tributo
. Assim, se a contabilidade da empresa não for confiável ou houver ausência de dados que possibilitem apurar a base de cálculo real da contribuição devida, o art. 33, §6º, da Lei nº 8.212/1991 outorga ao fisco a faculdade de realizar a aferição indireta, arbitrando o valor da mão-de-obra empregada. Importante ressaltar que, neste caso, firma-se uma presunção quanto à tributação com base no arbitramento, porém o contribuinte sempre poderá fazer prova em contrário a fim de afastá-la."
(ApCiv 5002395-04.2017.4.03.6000 -- TRF3 - 1ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/12/2019).
O lançamento fundado em juízos de abdução implica presunção
iuris tantum
da exigibilidade dos tributos
. Logo, isso não impede que o contribuinte promova a demonstração da insubsistência das premissas tomadas em conta pela Fazenda Pública:
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. AFERIÇÃO INDIRETA. LUCRO PRESUMIDO. DISPENSA DE REGISTRO CONTÁBIL MAS NÃO DE LIVRO CAIXA. 1. A aferição indireta é mecanismo substitutivo para efetuação do lançamento, disciplinada pelo CTN, outorgando ao Fisco a faculdade de arbitrar o valor tributável quando houver ou omissão do sujeito passivo ou a irregularidade das declarações, esclarecimentos ou documentos que devem ser utilizados para o cálculo do tributo. 2.
O arbitramento é iuris tantum acarretando a possibilidade de prova em contrário, a cargo do contribuinte, tanto em seara administrativa quanto na judicial, em atenção princípio da verdade material. Caso reste demonstrado que a quantia apontada pela aferição indireta não se coaduna com a realidade tributável, forçosa a revisão do valor exequendo
. 3. A legislação aplicável, art. 225, § 16. Do decreto 3048/99 com redação dada pelo decreto 3265/99, art. 45 da Lei 8.981/95, dispensa a empresa que opte pelo lucro presumido de registro tributário-contábil, desde que a empresa possua Livro Caixa ou Livro de Registro de Inventário. Documentação esta que deve ser mantida em ordem, de forma organizada e clara, mesmo que singelamente. (TRF-4 - AC: 10062 RS 2007.71.99.010062-4, Relator: CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Data de Julgamento: 04/08/2010, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: D.E. 10/08/2010).
Diante do exposto, constata-se que a aferição indireta será cabível quando a documentação da empresa se revelar inidônea:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE A FOLHA DE SALÁRIOS. INCABIMENTO DA AFERIÇÃO INDIRETA. DOCUMENTAÇÃO IDÔNEA. 1 -
Não se justifica a apuração das contribuições previdenciárias sobre a folha de salários, mediante aferição indireta, quando os documentos apresentados pela empresa - contracheques e Livro Caixa - são idôneos para registrar a remuneração de seus empregados e dos sócios-gerentes. 2 - A ausência do Livro Diário não ampara a presunção de que a contabilidade é irregular ou o argumento de que não foi apresentado documento necessário à fiscalização, pois o art. 45, § único, da Lei nº 8.981/85, dispensa a pessoa jurídica que opta pelo regime de tributação com base no lucro presumido de manter a escrituração contábil nos termos da legislação comercial, desde que tenha o Livro Caixa em dia, inclusive com a movimentação financeira e bancária
. 3 - Ainda que o art. 28, § 3º, da Lei nº 8.212/91, determine que o limite mínimo do salário-de-contribuição deve corresponder ao piso salarial da categoria, normativo ou legal, a fiscalização previdenciária não tem motivo para arbitrar salários, quando existem provas concretas indicando a percepção efetiva de valor inferior ao piso. A força cogente desse dispositivo opera-se quando a remuneração seguramente tem por base o piso salarial da categoria. 4 - Dada a ilegitimidade do arbitramento, o lançamento que respalda a CDA é insubsistente. (AC - APELAÇÃO CIVEL 2003.72.01.002038-6, WELLINGTON MENDES DE ALMEIDA, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, DJ 08/02/2006 PÁGINA: 336.)
No caso da TCFA, há uma presunção de potencial poluente, decorrente da prática das atividades listadas na lei 6.938/81. Quando se trata de indícios, coloca em causa muito mais a apuração dos fatos realmente existentes do que a sua valoração.
2.28. Breves considerações sobre o postulado da isonomia:
Como cediço, a forma republicana é incompatível com a atribuição de privilégios ou com a imposição de prejuízos para grupos específicos de indivíduos, de forma arbitrária (art. 5º,
caput
e art. 150, II, CF). Roque Antônio Carrazza sustenta, por exemplo, que
"
numa verdadeira República não pode haver distinções entre nobres e plebeus, entre grandes e pequenos, entre poderosos e humildes
. É que, juridicamente, nela não existem classes dominantes, nem classes dominadas. Assim, os títulos nobiliárquicos desaparecem e, com eles, os tribunais de exceção. Todos são cidadãos, não súditos."
(CARRAZZA, Roque Antônio.
Curso de direito constitucional tributário.
19. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 48).
José Afonso da Silva argumenta, por seu turno, que
"
a igualdade constitui o signo fundamental da democracia. Não admite privilégios e distinções que um regime simplesmente liberal consagra
."
(SILVA, José Afonso da.
Curso de direito constitucional positivo.
13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 206). Assim, é indiscutível a relevância do princípio da igualdade.
Isso não se traduz, todavia, na imposição de uma espécie de leito de Procusto, pela qual todos os sujeitos deveriam estar submetidos a normas absolutamente idênticas. A vingar algo do gênero, impondo tratamento rigorosamente homogêneo entre crianças, adultos e idosos, deficientes físicos e atletas, milionários e marginalizados, a
isonomia
viraria mero eufemismo.
Daí o relevo da observação de José Afonso da Silva quando enfatiza o que segue:
"O conceito de igualdade provocou posições extremadas. Há os que sustentam que a desigualdade é a característica do universo. Assim, os seres humanos, ao contrário da afirmativa do art. 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, nascem e perduram desiguais. Nesse caso, a igualdade não passaria de um simples
nome,
sem significação no mundo real, pelo que os adeptos dessa corrente são denominados de
nominalistas.
No polo oposto, encontram-se os
idealistas,
que postulam um igualitarismo absoluto entre as pessoas. Afirma-se, em verdade, uma igual liberdade natural ligada à hipótese do estado de natureza, em que reinava uma igualdade absoluta. (...)
Aristóteles vinculou a ideia de igualdade à ideia de justiça, mas, nele, trata-se de igualdade de justiça relativa que dá a cada um o seu, uma igualdade - como nota Chomé - impensável sem a desigualdade complementar e que é satisfeita se o legislador tratar de maneira igual os iguais e de maneira desigual os desiguais
. Cuida-se de uma justiça e de uma igualdade formais, tanto que não seria injusto tratar diferentemente escravo e seu proprietário (
sic
); sê-lo-ia, porém, se os escravos, ou seus senhores, entre si, fossem tratados desigualmente. No fundo, prevalece, nesse critério de igualdade, uma injustiça real. Essa verificação impôs a evolução do conceito de igualdade e de justiça, a fim de se ajustarem às concepções formais e reais ou materiais.
"
(SILVA, José Afonso da.
Obra citada.
p. 208)
Muito embora seja um truísmo, deve-se ter em conta que a Constituição não veda a diferenciação entre os sujeitos, eis que ela é mesmo da própria essência do regime jurídic
o.
O que a Lei Maior veda, isso sim, é a diferenciação despropositada, impertinente, fundada em mero capricho dos legisladores e administradores. O importante é aferir, tanto por isso, se o fator de
discrimen
empregado pelos servidores do povo convive harmonicamente com a Constituição - e essa é, a bem da verdade, a grande questão.
"A fórmula 'o igual deve ser tratado igualmente e o desigual desigualmente' não contém o critério material de um juízo de valor sobre a relação de igualdade (ou desigualdade). A questão da igualdade justa pode colocar-se nesses termos: o que é ´que nos leva a afirmar que uma lei trata dois indivíduos de uma forma igualmente justa? Qual o critério de valoração para a relação de igualdade?
Uma possível resposta, sufragada em algumas sentenças do Tribunal Constitucional [lusitano], reconduz-se à proibição geral do arbítrio: existe observância da igualdade quando indivíduos ou situações iguais não são arbitrariamente (proibição de arbítrio) tratados como desiguais. Por outras palavras:
o princípio da igualdade é violado quando a desigualdade de tratamento surge como arbitrária
.
O arbítrio da desigualdade seria condição necessária e suficiente da violação ao princípio da igualdade
. Embora ainda hoje seja corrente a associação do princípio da igualdade como princípio da proibição do arbítrio, este princípio, como simples princípio de limite, será também insuficiente se não transportar já, no seu enunciado normativo-material, critérios possibilitadores da valoração das relações de igualdade ou desigualdade. Esta a justificação de o princípio da proibição do arbítrio andar sempre ligado a um fundamento material ou critério material objectivo. Ele costuma ser sintetizado da forma seguinte: existe uma violação arbitrária da igualdade jurídica quando a disciplina jurídica não se basear num (i) fundamento sério; (ii) não tiver um sentido legítimo; (iii) estabelecer diferenciação jurídica sem um fundamento razoável. Todavia, a proibição do arbítrio intrinsecamente determinada pela exigência de um fundamento razoável implica, de novo, o problema de qualificação desse fundamento, isto é, a qualificação de um fundamento como razoável aponta para um problema de valoração.
A necessidade de valoração ou de critérios de qualificação bem como a necessidade de encontrar elementos de comparação subjacentes ao caráter relacional do princípio da igualdade implicam
: (1) a insuficiência do arbítrio como fundamento adequado de valoração; (2) a imprescindibilidade da análise da natureza, do peso, dos fundamentos ou motivos justificadores de soluções diferenciadas; (3) insuficiência da consideração do princípio da igualdade como um direito de natureza apenas defensiva ou negativa. Esta ideia de
igualdade
justa
deverá aplicar-se mesmo quando estamos em face de medidas legislativas de graça ou de clemência (perdão, amnistia), pois embora se trate de medidas que, pela sua natureza, transportam referências individuais ou individualizáveis, elas não dispensam a existência de fundamentos materiais justificativos de eventuais tratamentos diferenciadores." (CANOTILHO, J.J. Gomes.
Direito constitucional e teoria da Constituição.
7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 428-429)
Semelhante é a análise empreendida por Celso Antônio Bandeira de Mello, quando enfatiza o que segue:
"Parece-nos que o reconhecimento das diferenciações que não podem ser feitas sem quebra da isonomia se divide em três questões: (a) a primeira diz com o elemento tomado como fator de desigualização; (b) a segunda reporta-se à correlação lógica abstrata existente entre o fator erigido em critério de descrímen e a disparidade estabelecida no tratamento jurídico diversificado; (c) a terceira atina à consonância desta correlação lógica com os interesses absorvidos no sistema constitucional e destarte juridicizados.
Esclarecendo melhor: tem-se que investigar, de um lado, aquilo que é adotado como critério discriminatório; de outro, cumpre verificar se há justificativa racional, isto é, fundamento lógico para, à vista do traço desigualador acolhido, atribuir o específico tratamento jurídico construído em função da desigualdade proclamada. Finalmente, impende analisar se a correlação ou fundamento racional abstratamente existente é, in concreto, afinado com os valores prestigiados no sistema normativo constitucional. A dizer: se guarda ou não harmonia com eles.
Em suma: importa que exista mais que uma correlação lógica abstrata entre o fator diferencial e a diferenciação consequente. Exige-se, ainda, haja uma correlação lógica concreta, ou seja, aferida em função dos interesses abrigados no direito positivo constitucional. E isto se traduz na consonância ou dissonância dela com as finalidades reconhecidas como valiosas na Constituição.
Só a conjugação dos três aspectos é que permite a análise correta do problema. Isto é, a hostilidade ao preceito isonômico pode residir em quaisquer deles. Não basta, pois, reconhecer-se que uma regra de direito é ajustada ao princípio da igualdade no que pertine ao primeiro aspecto. Cumpre que o seja, também, com relação ao segundo e ao terceiro. É claro que a ofensa a requisitos do primeiro é suficiente para desqualificá-la. O mesmo, eventualmente, sucederá por desatenção a existências dos demais, porém quer-se deixar bem explícita a necessidade de que a norma jurídica observe cumulativamente aos reclamos provenientes de todos os aspectos mencionados para ser inobjetável em face do princípio isonômico
." (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio.
Conteúdo jurídico do princípio da igualdade.
3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 21-22)
Vale a pena atentar, ademais, para o seguinte excerto da obra de Bandeira de Mello:
"O ponto modular para exame da correção de uma regra em face do princípio isonômico reside na existência ou não de correlação lógica entre o fator erigido em critério de
discrímen
e a discriminação legal decidida em função dele. Na introdução deste estudo enfatizou-se este aspecto. Com efeito, há espontâneo e até inconsciente reconhecimento da juridicidade de uma norma diferenciadora quando é per perceptível a congruência entre a distinção de regimes estabelecida e a desigualdade de situações correspondentes. De revés, ocorre imediata e intuitiva rejeição de validade à regra que, ao apartar situações, para fins de regulá-las diversamente, calça-se em fatores que não guardam pertinência com a desigualdade de tratamento jurídico dispensado.
Tem-se, pois, que é o vínculo de conexão lógica entre os elementos diferenciais colecionados e a disparidade de disciplinas estabelecidas em vista deles, o quid determinante da validade ou invalidade de uma regra perante a isonomia
."
(BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio.
Obra citada.
p. 21-22)
Com efeito, é indispensável que se aprecie a correlação lógica entre o fator de diferenciação e o tratamento jurídico dispensado. No exemplo de Bandeira de Mello, uma norma que atribuísse vantagens funcionais apenas aos servidores magros deveria ser reputada inconstitucional, por inadequação do critério eleito... Talvez esse mesmo critério possa ser aceito, todavia, quando se trata de atribuir prêmios para atletas que tenham conseguido perder massa, p.ex.
A Suprema Corte brasileira já decidiu que
"
O atentado à isonomia consiste em se tratar desigualmente situações iguais, ou em se tratar igualmente situações diferenciadas, de forma arbitrária, e não fundamentada
. É na busca da isonomia que se faz necessário tratamento diferenciado, em decorrência de situações que exigem tratamento distinto, como forma de realização da igualdade."
(STF, RE 453.740, voto do Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 28-2-2007, Plenário, DJ de 24-8-2007.)
A isonomia impõe, isso sim, a adoção de critérios razoáveis de diferenciação entre os sujeitos de direito. O problema está justamente nessa eleição dos elementos que podem ser tomados em conta para a diferenciação entre os administrados, como bem explicita Marciano Seabra Godoi:
"A máxima da igualdade é violada quando para a diferenciação legal, ou para o tratamento legal igual não é possível encontrar uma razão razoável, que surja da natureza da coisa ou que, de alguma outra forma, seja concretamente compreensível, é dizer, quando a disposição tem que ser qualificada como arbitrária."
(GODOI, Marciano Seabra de.
Justiça, igualdade e Direito Tributário.
São Paulo: Dialética, 1999, p. 132).
2.29. Reflexos da eventual violação à isonomia:
A violação à isonomia impõe, não raras vezes, grandes dilemas ao Poder Judiciário
. Afinal de contas, concedido um privilégio para determinado grupo, em prejuízo dos demais, o que fazer? Deve-se cancelá-la para os beneficiários ou deve-se estendê-la àqueles que tenham sido olvidados?
Note-se que comumente se sustenta que o Poder Judiciário não pode atuar como legislador positivo. Desse modo, segundo essa lógica, a solução mais adequada seria, em princípio, cancelar o privilégio para aqueles que o receberam, reputando-o inconstitucional.
Isso enfrenta alguns percalços na matéria presente. Afinal de contas, cuidando-se de verba alimentar, os tribunais têm reconhecido ser incabível a sua restituição pelo beneficiário, desde que auferida de boa-fé:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. PERÍODOS DE FÉRIAS E LICENÇAS. JUROS DE MORA. ARTIGO 1º-F DA LEI N.º 9.494/97. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. INTERPRETAÇÃO EQUIVOCADA DE LEI. BOA-FÉ. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO INDEVIDA. 1. A matéria pertinente à aplicabilidade do art. 1º-F da Lei n.º 9.494/97 não foi apreciada pela instância judicante de origem, tampouco foram opostos, no ponto, embargos declaratórios para suprir eventual omissão. Portanto, ante a falta do necessário prequestionamento, incide o óbice da Súmula 282/STF. 2.
Indevida a restituição pelo servidor público dos valores recebidos de boa-fé em decorrência de interpretação equivocada da lei por parte da Administração Pública
. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AGARESP 201102476333, SÉRGIO KUKINA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:02/04/2013 ..DTPB:.)
Isso significa que não é algo assim tão simples obrigar o servidor a restituir valores que tenham sido auferidos de modo privilegiado, sem o respeito à isonomia. Daí que simplesmente determinar o corte da vantagem indevida não parece correto, em situações tais.
É fato que o Poder Judiciário já reconheceu e aplicou solução distinta, como se infere da conhecida discussão a respeito da diferença remuneratória dos
28,86%
, decorrentes das leis 8.622/1993 e 8.627/1993 (tema sob exame do STF, em sede de repercussão geral -
RE 584.313
). Nesse âmbito, como notório, o Poder Judiciário estendeu o aumento salarial para os servidores públicos prejudicados, ao invés de determinar a supressão no contracheque dos militares. Essa tem sido, todavia, uma exceção na atuação judicial brasileira. Comumente, os Tribunais têm sustentado que, por não poder funcionar como legislador positivo, o Poder Judiciário não poderia aumentar vantagens/benefícios de servidores públicos, calcado no postulado da isonomia. Esse é o conteúdo, por sinal, da conhecida súmula 339, STF:
"
Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia
."
Outro não é o conteúdo da
súmula vinculante 37
.
Aludidas súmulas têm sido invocadas não apenas quando em causa o pagamento de verbas remuneratórias, mas também quando em causa o pagamento de valores a título indenizatório.
PROCESSUAL CIVIL, CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. EQUIPARAÇÃO COM OUTROS SERVIDORES. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCIPIO DA ISONOMIA E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. 1. Rejeita-se a preliminar de ilegitimidade passiva, pois a apelada sendo uma Universidade, goza de autonomia financeira, administrativa e patrimonial, nos termos do art. 207 da Constituição Federal de 1988. O fato do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão ser o responsável pelo processamento e reajuste dos valores recebidos pelos servidores públicos a título de auxílio-alimentação não tem condão de suprimir a referida legitimidade na medida em que sendo, a Universidade, um ente autônomo elabora e gerencia a folha de pagamento de seus servidores. 2. Precedente deste Tribunal: Segunda Turma, AG 101015/PB, Relator: Des. Federal Manuel Maia - convoc., julg. 02/03/2010, publ. DJE: 25/03/2010, pág. 227, decisão unânime. 3. A pretensão do apelante encontra óbice no art. 37, XII, da CF de 1988, o qual veda a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal. 4. O auxílio-alimentação embora apresente natureza indenizatória, a competência para alterar seus parâmetros é do Poder Executivo, nos termos do art. 22, da Lei nº. 8.460/92. Deste modo não compete ao Poder Judiciário alterar os parâmetros de tal auxílio sob pena de afrontar o principio constitucional da separação dos poderes, considerando que os poderes são harmônicos e independentes entre si, nos termos do art. 2º, da Constituição Federal. 5. Não cabe ao Poder Judiciário a pretexto de aplicação da isonomia, majorar tal verba, nos termos da Súmula 339, do STF. 6. Precedente deste Tribunal: Quarta Turma, AC 494705/PE, Relator: Des. Federal Edílson Nobre, julg. 22/05/2012, publ. DJE: 24/05/2012, pág. 737, decisão unânime. 7. Apelação improvida. (AC 00000167220124058401, Desembargador Federal Marco Bruno Miranda Clementino, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::21/03/2013 - Página::253.)
ADMINISTRATIVO. FERROVIÁRIOS INATIVOS E PENSIONISTAS. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO/TICKET REFEIÇÃO PAGO AOS SERVIDORES EM ATIVIDADE. NATUREZA INDENIZATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE DE EXTENSÃO AOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA OU PENSÃO. SÚMULAS 680 E 339 DO STF. EXTINÇÃO DA RFFSA. MP 353/07. 1.
A jurisprudência pacífica do colendo Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal é no sentido de que os servidores aposentados ou pensionistas não têm direito ao auxílio-alimentação (ticket refeição), por se tratar de verba destinada aos gastos do servidor em atividade, com sua alimentação, de modo que não se incorpora à remuneração ou aos proventos de aposentadoria/pensão
. 2. O direito ao auxílio-alimentação não se estende aos servidores inativos (Súmula n. 680 do STF). 3.
Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, o aumento de vencimentos de servidores públicos sob o fundamento da isonomia (Súmula n. 339 do STF)
. 4. Com a extinção da RFFSA (MP 353, de 22.01.2007, posteriormente convertida na Lei 11.483, de 31.05.2007), a União passou a suceder-lhe em direitos e obrigações. 5. Apelação do(s) autor(es) não provida. (AC 200438000410402, JUÍZA FEDERAL CLÁUDIA OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO SCARPA (CONV.), TRF1 - SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA:18/05/2012 PAGINA:680.)
Concessa vênia,
nessa quadra da democracia brasileira a referida súmula deve ser empregada com muitos temperamentos. De partida, porquanto foi produzida há cerca de 50 anos! Ela representou a consolidação do entendimento do Supremo Tribunal a respeito do alcance da legislação, sei bem.
Mas também é sabido que os entendimentos evoluem no tempo.
Vários casos, julgados pela própria Suprema Corte, revelam alteração de seu posicionamento, como bem ilustra a proscrição de prisão de depositário judicial, a revisão do entendimento quanto à constitucionalidade da vedação de progressão de regime para os condenados pela prática de crimes hediondos. Menciono também a evolução do seu entendimento no que toca à invalidade da exigência de depósito recursal (súmula vinculante 21, STF).
Ora, deve-se ter em conta que a súmula 339 foi editada em 1963, sob a égide da CF/1946, muito tempo antes da efetiva constitucionalização do Direito, empreendida em período mais recente
. De outro tanto, ela não se caracteriza como súmula vinculante, não se submetendo ao disposto no art. 103-A, CF e art. 11.417/2006. Tal como tem ocorrido, as situações anti-isonômicas têm persistido. Afinal de contas, quando o prejudicado pelo tratamento discriminatório acorre ao Judiciário obtém como resposta que o problema seria meramente legislativo. Mas o problema não é apenas da alçada do Congresso, dado que a Constituição vincula a todos, e cabe ao Poder Judiciário assegurar o irrestrito respeito a todos os vetores constitucionais, com especial destaque para o seu art. 5º, caput.
Concordo, portanto, com a análise de Adilson Abreu Dallari quando enfatiza:
"
Entendemos que a própria Súmula 339 está equivocada. Ao aplicar ao caso concreto o princípio constitucional da isonomia o Judiciário não estará legislando, mas sim exercendo função tipicamente jurisdicional
. Se a Constituição determina que a trabalhos iguais deve corresponder a mesma remuneração, toda vez que isto for demonstrado, caberá ao juiz determinar o puro e simples cumprimento da Constituição."
(DALLARI, Adilson de Abreu.
Regime constitucional dos servidores públicos.
2. ed. São Paulo: RT, 1990, p. 65.)
Anoto que o próprio STJ já chegou a aplicar a isonomia, imposta pela Constituição, assegurando a paridade de vencimentos em um caso específico:
ISONOMIA DE VENCIMENTOS PARA CARGOS OU ATRIBUIÇÕES IGUAIS OU ASSEMELHADAS. AGENTE DE SEGURANÇA JUDICIÁRIA QUADRO PERMANENTE DO CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL. 1.
Verificada a situação de desigualdade em que se encontram os servidores impetrantes, tal em relação a ocupantes cargos iguais ou assemelhados de outros tribunais, portanto desigualdade entre iguais, cabe ao Poder Judiciário dirimir a questão, assegurando, em conseqüência, a isonomia de vencimentos
. 2. A Constituição de 1988, no art 39, §1º, dispôs sobre a isonomia, assegurando-a, talvez na forma da lei, e a Lei 8.112 de 1990, se necessário para a eficácia e aplicabilidade da norma constitucional, tornou-a eficaz e aplicável. 3. Segurança concedida, com efeitos patrimoniais a partir do ajuizamento da ação.' STJ, MS 997/DF, Reg. 91120685, Rel. Min. Nilson Naves, Corte Especial, DJ de 20-4-92.
Menciono também a seguinte decisão judicial, em cujo âmbito foi mencionada a necessidade de
aplicação moderada do entendimento
consolidado na súmula 339 da Suprema Corte:
"
Ademais, aplicar indiscriminadamente essa Súmula, sem maior reflexão, sem atenção a novos princípios constitucionais implantados após ela, representa, quando menos, nesse passo, deixar o Judiciário de mãos e pés atados, para a correção de afronta ao principio de igualdade, possibilitando que outros princípios, igualmente constitucionais, permaneçam no vazio, imprestáveis, sem aplicabilidade alguma.
A Constituição não iria criar uma regra princípio, para deixá-la inerte, inoperante, sem qualquer valia, porque isto seria simplesmente inaceitável.
A aplicação, pura e simples, da Súmula 339 contra aqueles que se sintam lesados, a possibilidade até de recurso ao Judiciário, pois ninguém o provará, se disso coisa alguma puder resultar
.
Ora, se nem a lei pode excluir da apreciação do Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, inc. XXXV, da Carta Magna), muito menos uma Súmula.
Dir-se-ia, com argumento contra, que a Súmula não está excluindo nada da apreciação do Poder Judiciário. Mas, no fundo, é como se estivesse, pois ninguém seria insano bastante para provocar a Justiça, visando a manter o resguardo de princípio constitucional, já sabendo que essa provocação não resultaria em nada, se prevalecer o argumento esposado pela peça de defesa, em casos como o dos presentes autos.
Convenço-me da necessidade de re-estudo da Súmula para que se desvende seu exato conteúdo, diante das normas e princípios hoje vigentes. Quando menos, que não mais lhe seja dada a inteligência até então adotada
." (Subseção Judiciária Federal do Rio de Janeiro. Demanda ordinária de autos n. 0126635-72.1991.4.02.5101, 11ª VF-RJ. DO 27-11-92)
A questão é complexa, eis que tampouco se pode reconhecer ao Judiciário a pura e simples equiparação entre distintos cargos
, a fim de impor despesas aos órgãos públicos sem maior exame de questões outras. Enfim, repiso que o tema é razoavelmente complicado. Anoto, todavia, que a questão discutida nestes autos não chega a esbarrar na súmula 339, STF, eis que se cuida de tema afeto à TCFA.
2.30. Postulado da proporcionalidade tributária:
Ao apreciar o
Recurso Extraordinário 586.693
, relatado pelo Ministro Marco Aurélio, os Ministros do Supremo Tribunal Federal consideraram, por unanimidade, ser legítima a previsão de alíquota progressiva na cobrança de imposto predial e territorial urbano - IPTU, prevista em lei municipal publicada sob a vigência do
art. 156, § 1º, da Constituição Federal
, com a redação veiculada pela emenda constitucional 29/2000. Examinou-se, então, a lei municipal 13.250/2001, de São Paulo, responsável por estabelecer cobrança progressiva de IPTU não apenas quanto à destinação – se residencial ou não –, com variação das alíquotas de 1 a 1,5%, como também no tocante ao valor venal do imóvel, com a aplicação de critérios de desconto ou acréscimo.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo havia dado provimento à apelação do contribuinte, declarando a incompatibilidade entre a progressividade das alíquotas do IPTU com os princípios da igualdade e da capacidade contributiva, alegando ter havido violação a cláusulas pétreas. O Município de São Paulo recorreu ao STF, invocando a norma de alínea a do art. 102 da Constituição Federal e sustentando ter havido violação aos arts. 97 e 156, § 1º, I e II, CF. A declaração da inconstitucionalidade da emenda constitucional 29/2000 pelo Tribunal de Justiça de São Paulo não teria observado a cláusula de reserva de plenário, prevista no art. 97 da CF. No mais, alegou haver a harmonia da previsão da progressividade de alíquotas com os princípios da isonomia e da capacidade contributiva.
O STF declarou haver repercussão geral; na sequência, a Procuradoria-Geral da República manifestou-se em prol do conhecimento e provimento do recurso
. O RE foi conhecido; o Supremo sustentou não ter havido
respeito à reserva de plenário
- art. 97, CF -; reportando-se ao art. 249, § 2º, do Código de Processo Civil/73, o Supremo reputou não ser caso de anulação da decisão do TJSP, impondo-se a sua substituição pelo acórdão prolatado pelo STF.
Enfatizou-se, então, que a validade da lei municipal discutida já teria sido apreciada por época do julgamento do RE 423.768/SP, no curso de 2010, reputando-a válida, na medida em que o sistema de progressividade teria sido vaticinado pela Lei Maior,
quanto àquele tributo. Sustentou-se que a própria redação original da Constituição teria consagrado tal progressividade, enquanto projeção da imposição de isonomia e respeito à capacidade contributiva.
Esse foi um caso em que o tema da progressividade restou submetida a debates junto à Suprema Corte
. Registro que a Constituição versou sobre a progressividade no art. 149, §1, Constituição, com a emenda constitucional 103/2019; art. 153, §2, I e §4, I; art. 155, §1, VI; art. 156, §1, dentre outros preceitos da Constituição/88. Debate-se, não raro, se a progressividade poderia ser aplicada, como critério de definição do valor do tributo, quanto às exações a cujo respeito isso não tenha sido previsto expressamente.
"No caso, o argumento da necessidade de previsão expressa é uma parte menor de princípios considerados abstratamente e muito significativos como o da legalidade e da segurança jurídica. Para tanto, a ênfase maior deveria ser dada à pletora de significados deriváveis de tais princípios, para aqueles que buscam restringir o alcance da intervenção estatal e a im- possibilidade da progressividade. Ademais, mesmo no campo dos argumentos favoráveis à progressividade estendida estão circunscritos limites atinentes à regra-matriz de incidência, como no caso do ICMS e do IPI, que vedariam a progressividade."
(LORENZETTO, Bruno; SCHAITZA, Letticia. 37. Tese é Constitucional a emenda constitucional 29, de 2000, no que estabeleceu a possibilidade de previsão legal de alíquotas progressivas para o iptu de acordo com o valor do imóvel
in
CLÈVE, Clèmerson; KENICKE, Pedro.
Teses jurídicas dos tribunais superiores:
Constitucional. SP: RT. 2017)
Aliás,
a proporcionalidade tributária não se confunde com a progressividade
. Esta trata do aumento percentual equivalente realizado entre base cálculo e alíquota, ao cuidar de importante dimensão da ordem tributária, qual seja, a constante no princípio da generalidade.
"Por sua vez, a proporcionalidade considerada de maneira estrita no campo tributário faz com que pessoas com diferentes capacidades contributivas paguem tributos com a mesma alíquota. Ao desconsiderar a capacidade econômica dos sujeitos, inscreve números que conduzem pessoas com capacidades contributivas díspares a pagar em proporção o mesmo imposto. Se isso passa pelo teste da igualdade formal, pode gerar paradoxos como na simples conta de atribuição de 10% na base de cálculo em que quem ganha 10 paga 1 e quem ganha 100 paga 10. Não há dúvidas que, em tal cenário, aquele que possui menos é mais sacrificado e que, ausente a progressividade, pode-se recair em flagrante injustiça substantiva."
(LORENZETTO, Bruno; SCHAITZA, Letticia.
37. Tese é Constitucional a emenda constitucional 29)
.
Conquanto haja filosofias libertarianas - a exemplo daquela que foi advogada por Robert Nozick, autor de
anarquia, estado e utopia
-, é fato que a Constituição Brasileira é projeção de um pacto em prol da redução da pobreza, eliminação da miséria, impondo ao Estado um conjunto de políticas redistributivas, a fim de assegurar a todos o direito à fruição do mínimo existencial. Ademais, essa ampliação atende às próprias necessidades do mercado, na linha propugnada por John Maynard Keynes, economista inglês. Abstraindo o valor da Justiça social, o Estado deveria assegurar o mínimo existencial também por conta de questões econômicas, a fim de assegurar a consolidação de um mercado consumidor, ao invés de concentrar os atos de consumo apenas entre os mais ricos, concentração que teria contribuído para a crise havida em 1929 - grande depressão.
No que toca à taxa, já se decidiu que:
"TAXA – PODER DE POLÍCIA – EXERCÍCIO – CUSTOS – ARRECADAÇÃO – INCONGRUÊNCIA.
Considerado o princípio da proporcionalidade, conflita com a Constituição Federal instituição de taxa ausente equivalência entre o valor exigido do contribuinte e os custos alusivos ao exercício do poder de polícia – artigo 145, inciso II, da Lei Maior –, sob pena de ter-se espécie tributária de caráter arrecadatório cujo alcance extrapola a obtenção do fim que lhe fundamenta a existência, dificultando ou mesmo inviabilizando o desenvolvimento da atividade econômica
." (STF, "Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6211)
D'outro tanto,
"Em matéria tributária, mais do que em qualquer outra, tem relevo a idéia de igualdade no sentido de proporcionalidade. Seria verdadeiramente absurdo pretender-se que todos pagassem o mesmo tributo. Assim, no campo da tributação o princípio da isonomia às vezes parece confundir-se com o princípio da capacidade contributiva. Explica e prova, contudo, referido autor, que são princípios distintos a igualdade tributária e a capacidade contributiva.
Refere-se à tributação extrafiscal, basicamente à utilização de isenções que, ferindo o princípio da capacidade contributiva, podem não atingir a igualdade. Em outro tomo desta dissertação, trataremos desse tema com pormenores
."
(BECHO, Renato.
Tributação das Cooperativas
. SP: RT. 2019. item 3.1.).
Segundo Elizabeth Carraza,
"
Afasta-se, assim, a possibilidade de tributação meramente proporcional, uma vez que a desigualdade patrimonial existente entre os contribuintes conduz, necessariamente, a alíquotas diferençadas de acordo com a variação da base de cálculo do tributo. Por outro lado, não há falar em proporcionalidade quando se cobra uma alíquota única de todos os contribuintes, uma vez que, nesta hipótese, o mais pobre acabará por pagar mais tributo que o mais rico, apesar de em termos absolutamente numéricos tal não ocorrer
. Até porque, “a proporcionalidade é princípio neutro, que não objetiva atenuar as grandes disparidades econômicas advindas dos fatos."
(NAZAR CARRAZZA, Elizabeth.
IPTU e progressividade:
igualdade e capacidade contributiva. 2 ed. São Paulo: Quartier Latin. 2015. p. 121).
D'outro tanto, a progressividade seria um dos caminhos para se atingir a justiça tributária.
"Com ela se coaduna, integralmente, a capacidade contributiva. Consideramos que seja, até, a única forma, em se tratando de alíquota e suas variações, de atingir esse princípio. Pagando-se um imposto maior à proporção que aumenta a base de cálculo, é possível que cada um contribua com o mesmo grau de sacrifícios para a manutenção do Estado, por via de arrecadação tributária. É o entendimento, também, de Elizabeth Nazar Carrazza:
A progressividade, longe de ser danosa ao sistema, é a única forma encontrável para que se afastem as injustiças tributárias, vedadas pela Constituição Federal. Sem tributação progressiva jamais se atinge a igualdade tributária. Diferente é a posição de Paulo de Barros Carvalho: É por mantê-la constante, sob a forma de fração, ou por fazê-la progredir, continuamente, ou por degraus, que o legislador busca realizar e assegurar o princípio da igualdade tributária
. Por
não adotar a teoria de uma real progressividade
, nosso País atingiu o infeliz podium de campeão mundial em desigualdades, segundo o
Banco Mundial, em que os 10% mais ricos possuem a fabulosa parcela de 51,3% da renda nacional, enquanto os 20% mais pobres ficam com escassos 2,1% da mesma renda
. Já quanto à regressividade, a situação é diversa. Como vimos, a regressividade ocorre quando a alíquota diminui com o aumento da base de cálculo. O melhor exemplo para se entender esse mecanismo é o do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR). Neste, quanto maior for a utilização da terra, menor será a alíquota. Explica Hugo de Brito Machado: O imposto poderá ser reduzido em até 90%, a título de estímulo fiscal, em função do grau de utilização da terra e da eficiência da exploração. Se a terra for mais utilizada, e de forma mais racional e eficiente, é crível que se deduza que seu proprietário, o contribuinte do imposto, terá capacidade contributiva maior, por essa análise. É a mesma dedução da capacidade contributiva do proprietário de imóvel residencial urbano que tenha propriedade mais valiosa, e do contribuinte do imposto sobre a renda que a tenha em abundância. Contudo, no caso do ITR e sua alíquota regressiva, que é o que ocorre na prática, essa tributação anda na contramão do prin- cípio da capacidade contributiva, posto a lume. Somos forçados a divergir de Elizabeth Nazar Carrazza, quando afirma que:
De outro lado, admite-se, também, a possibilidade de regressividade das alíquotas, de sorte a permitir uma justa distribuição tributária
. São, portanto, perfeitamente legítimas, as duas situações: a progressividade e a regressividade das alíquotas tributárias, a fim de que haja uma equitativa distribuição dos encargos tributários. Pagará mais imposto aquele que possui maior capacidade contributiva; pagará menos imposto aquele que a possui em menor grau; e não pagará nenhum imposto aquele que não a possui. Tema que nos parece conexo é o dos chamados impostos fixos. Estes são uma certa anomalia, um tanto quanto comum, quando o legislador infraconstitucional cria um imposto sem base de cálculo nem alíquota. Não existiria, pela estrutura da norma tributária identificada pela construção doutrinária de Paulo de Barros Carvalho, seu critério quantitativo. Vê-se que não se trata de uma inovação, mas de uma deturpação da teoria, em prejuízo do contribuinte, pois não há respeito a institutos que lhe protegem o bolso e ao sistema constitucional, que se vê ferido.
Não se tem como apurar o respeito ou não ao princípio da capacidade contributiva, pelo que, também por esse motivo, consideramos tal sistemática inconstitucional. A lição de Roque Antonio Carrazza, também a esse respeito, é lapidar: Do exposto, facilmente percebemos que, também por burla ao princípio da capacidade contributiva, são inconstitucionais os chamados impostos fixos, isto é, aqueles cujo montante é apontado pela lei, de modo invariável, sem qualquer preocupação com as condições pessoais do contribuinte.
É o caso, em certos Municípios, do ISS incidente sobre os serviços advocatícios, fixados, pela lei local, em X unidades (salários mínimos, unidades fiscais, valores de referência etc.) por ano, para cada advogado. Antes mesmo da ocorrência do fato imponível tributário, já se tem condições de saber o montante deste tributo, que será o mesmo, quer o profissional tenha uma banca florescente, quer esteja ensaiando os primeiros passos na profissão. Com isso, nestes Municípios, o ISS deixa de ter caráter pessoal, não sendo graduado segundo a capacidade econômica do contribuinte. Manifesta inconstitucionalidade, porquanto o ISS deve necessariamente obedecer ao princípio em exame."
(BECHO, Renato.
Tributação das Cooperativas
. São Paulo: RT. 2019. item 3.7.1.).
2.31. Retributividade das taxas:
Nos termos do
art. 145, II da Constituição/88
, as taxas podem ser instituídas e cobradas em função da necessidade de custeio ou de serviços públicos, específicos e divisíveis, ou do exercício do poder de polícia, definido no
art. 78, do CTN/66
. A Lei Fundamental detalhou, tanto por isso, as hipóteses que podem ensejar a exigência de tal tributo. Ademais, segundo a Constituição, elas não podem ser instituídas com as mesmas bases de cálculo dos impostos.
"(...)
As taxas, a exemplo dos impostos, são tributos de competência comum da União, estados, Distrito Federal e municípios, genericamente previstas no artigo 145, inciso II da Constituição. O pressuposto para a exigência de tal espécie tributária é a utilização, efetiva ou potencial, de um serviço público específico e divisível, ou o regular exercício do poder de polícia
.
Trata-se, como se vê, de tributos que se encaixam na categoria dos “vinculados”, para utilizar a classificação forjada por Geraldo Ataliba. São, pois, exigidos em face da existência de uma contraprestação estatal específica: a prestação de serviço público ou o exercício do poder de polícia. Além disso, diferente da regra geral dos impostos, o destino da arrecadação é determinado: as receitas se prestarão a financiar a atuação estatal que justifica a incidência da taxa, seja ela a utilização, efetiva ou potencial, de um serviço público específico e divisível, seja o exercício regular de poder de polícia mediante estrutura montada para tanto, ainda que não ocorra a fiscalização efetiva.
Ainda de uma perspectiva geral, a base de cálculo das taxas deve guardar correlação com a atuação estatal e, assim, refletir o custo daquela. Tal afirmação decorre diretamente da assunção de que as taxas são tributos cujo fim único é financiar a atividade pública e, assim, calculá-las sobre montante superior ao custo da comodidade entregue ao contribuinte seria extrapolar sua finalidade, com a assunção de caráter nitidamente confiscatório. Nesse sentido, a jurisprudência é uníssona:
Taxa: correspondência entre o valor exigido e o custo da atividade estatal. A taxa, enquanto contraprestação a uma atividade do poder público, não pode superar a relação de razoável equivalência que deve existir entre o custo real da atuação estatal referida ao contribuinte e o valor que o Estado pode exigir de cada contribuinte, considerados, para esse efeito, os elementos pertinentes às alíquotas e à base de cálculo fixadas em lei. Se o valor da taxa, no entanto, ultrapassar o custo do serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte, dando causa, assim, a uma situação de onerosidade excessiva, que descaracterize essa relação de equivalência entre os fatores referidos (o custo real do serviço, de um lado, e o valor exigido do contribuinte, de outro), configurar-se-á, então, quanto a essa modalidade de tributo, hipótese de ofensa à cláusula vedatória inscrita no art. 150, IV, da CF. (ADI 2.551 MC-QO, rel. min. Celso de Mello, j. 2-4-2003, P, DJ de 20-4-2006).
Ainda sobre o tema da base de cálculo, o artigo 145, parágrafo 2º veda que as taxas possuam a mesma base de cálculo de impostos. Igual proibição já estava contida no Código Tributário Nacional, no artigo 77, parágrafo único. Ambos os dispositivos reforçam a necessidade de coerência entre a dimensão econômica sobre a qual incide o tributo e o comportamento respectivo que gera a incidência.
Apresentadas as características gerais das taxas, cumpre-nos tratar dos tipos específicos de taxa, com as discussões afetas a cada qual.
- Taxa pela utilização, efetiva ou potencial, de serviço público
Nos termos do artigo 145, inciso II da Constituição, União, estados, Distrito Federal e municípios poderão cobrar taxas pela “utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição”. A instituição se dará mediante lei ordinária pelo ente prestador do serviço público. No mesmo sentido, é a redação do caput do artigo 77 do Código Tributário Nacional.
Como se vê, portanto, no núcleo da hipótese de incidência de tais taxas está a utilização de um serviço público que seja específico e divisível. A utilização, nos termos dos dispositivos acima referidos, pode ser potencial ou efetiva. A compreensão de todos esses conceitos, pois, mostra-se fundamental para a análise dessa espécie tributária.
Sobre o tema, dispõe o artigo 79 do Código Tributário Nacional que os serviços serão específicos “quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade pública” (inciso II), ao passo em que serão divisíveis nos casos em que sejam “suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários” (inciso III).
Tais características reforçam o caráter sinalagmático das taxas: trata-se de contraprestações a serviços públicos direcionados a um certo conjunto de usuários, que possam ser identificados individualmente ou como grupo determinado, ao mesmo tempo em que é possível destacar as comodidades prestadas a cada qual. Trata-se, pois, de afastar o financiamento, via taxas, de serviços gerais e universais; ou seja, aqueles que atendem indistintamente a toda comunidade, cujo financiamento se dará, em regra, pela receita de impostos.
Como exemplos de serviços públicos específicos e divisíveis, cite-se o serviço de emissão de passaportes e aqueles prestados pelas serventias notariais e registrais. A tais comodidades se opõem os serviços de segurança pública, limpeza de logradouros públicos, iluminação pública e outros, que têm por objetivo beneficiar toda a comunidade e não um grupo determinado de indivíduos.
Especificamente sobre o serviço de iluminação pública, vale destacar tentativa de diversos municípios de criarem taxas para a remuneração de tal serviço. A impossibilidade é evidente, diante do caráter geral e universal do serviço: não é possível nem identificar os usuários por ele beneficiados, já que alcança não apenas os residentes de um determinado logradouro, mas toda a população que se utiliza das vias públicas, nem sequer destacar o montante de utilização do serviço por aqueles que dele se utilizam – como medir a quantidade de iluminação pública utilizada por um pedestre, morador ou veículo que passa pela rua?
A controvérsia foi enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal que decidiu pela inconstitucionalidade da taxa, diante da ausência das características próprias e necessárias para a criação de tal tributo. Tal entendimento resultou na publicação da
Súmula Vinculante 41: O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa
.
Não basta, contudo, a identificação de um serviço público específico e divisível para que haja a cobrança de uma taxa. O comportamento que desencadeia tal possibilidade é a utilização, efetiva ou potencial, serviço público específico e divisível.
Ainda nos termos do
art. 79 do Código Tributário Nacional, consideram-se efetivamente utilizados pelo contribuinte os serviços públicos que sejam “por ele usufruídos a qualquer título” (inciso I, alínea a), situação, portanto, em que o usuário utiliza o serviço diretamente
. Como exemplo, cite-se, novamente, o serviço público de emissão de passaporte: nesse caso, o cidadão paga uma taxa pela emissão do documento (serviço público específico e divisível) e o faz apenas diante da requisição apresentada à Polícia Federal. Utiliza-se, pois, efetivamente do serviço em comento.
Já a cobrança de taxa pela mera utilização potencial do serviço público faz-se presente apenas nas situações em que a utilização do serviço público seja compulsória: nessas hipóteses, o simples fato de o serviço estar “à disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento
” seria suficiente para a cobrança da exação (inciso I, alínea b). O objetivo, aqui, é possibilitar o financiamento de necessidades públicas cuja infraestrutura se encontra à disposição do usuário mesmo que ele não a utilize efetivamente. A utilização compulsória do serviço se dá por razões de ordem pública.
Exemplo clássico dessa possibilidade é a taxa do lixo, que tem por pressuposto a utilização, efetiva ou potencial, de serviço de coleta de resíduos sólidos. Por razões de saúde pública, o descarte desses resíduos não pode ser realizado de outro modo senão pela utilização do serviço prestado pelas prefeituras. Trata-se, então, de serviço público cuja utilização é compulsória. Sendo assim, é possível a cobrança de taxa simplesmente pelo fato de tal serviço estar à disposição do usuário. Ou seja, ainda que uma determinada residência esteja desocupada e, assim, não faça uso efetivo desse serviço, caso haja lei municipal prevendo a exação, ela será devida em razão da existência de infraestrutura que assegura tal comodidade à população. Sobre a taxa do lixo, inclusive, cumpre tecer algumas considerações adicionais." (PISCITELLI,
Tathiane.
Curso de Direito Tributário.
SP: RT. 2022, item 5.2.1.0).
Ademais,
"
As taxas, como se sabe, são espécies tributárias cuja instituição e cobrança estão vinculadas à observância do regime constitucional tributário, com todas as garantias que lhe são inerentes. Já os preços públicos são receitas que decorrem da atuação estatal como agente privado e, assim, resultam não de um poder de imposição entre Estado e particular, como no caso das taxas, mas sim, de uma relação de coordenação entre eles, regida pela autonomia da vontade
. A despeito da diferença evidente de regimes jurídicos, não raro há confusão entre os conceitos em razão da semelhança da estrutura formal da relação jurídica presente quando se trata de examinar contraprestações já que, em ambos os casos, tem-se a prestação de um serviço público. O debate é antigo e foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal antes mesmo da Constituição de 1988. Na ocasião, o Tribunal aprovou a Súmula 545, que dispõe que “preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu. Como se vê da redação do enunciado, seriam dois os critérios para diferençar as taxas dos preços públicos: o primeiro seria a compulsoriedade, caraterística presente nas taxas, porque tributos, e ausentes nos preços públicos, porque prestações decorrentes da atuação do Estado como ente privado; o segundo seria a necessária observância, pelas taxas, do já não mais existente “princípio da anualidade”. Tratava-se, aqui, de comando previsto no artigo 150, parágrafo 29 da Carta de 1967, que condicionava a cobrança de tributos no exercício seguinte não apenas à observância da lei, mas, também, à prévia autorização orçamentária. Ausente, na Constituição de 1988, o princípio da anualidade, resta-nos analisar o requisito da compulsoriedade constante da súmula acima transcrita.
Nos termos do artigo 3º do Código Tributário Nacional, tributo é prestação pecuniária compulsória e, assim, objeto de uma relação jurídica que se forma entre Estado e particular e na qual o particular ingressa em razão da prática do comportamento previsto em lei como suficiente para gerar a incidência da exação. Não há espaço, portanto, para autonomia da vontade. Daí porque, se afirma que a obrigação tributária é ex lege: decorre de lei, sem que a manifestação de vontade do sujeito passivo seja relevante para sua existência e exigibilidade.Nesse sentido, então, que devemos interpretar a “compulsoriedade” que acompanha as taxas: não se trata, como uma leitura apressada pode sugerir, da compulsoriedade do pagamento como condição isolada, mas, sim, do fato de que a autonomia da vontade do particular não tem lugar quando estamos diante de tributo
. O ingresso na relação jurídica é obrigatório, à luz da realização da conduta prevista no antecedente da norma de tributação. Essa mesma compulsoriedade não se faz presente no caso dos preços públicos: tratando-se de contraprestação típica de direito privado, é escolha do particular o ingresso, ou não, na relação jurídica que tem o preço público por objeto. Um exemplo seria útil para ilustrar. Tome-se a situação relativa à taxa de emissão de passaportes. Caso o particular queira ver emitido tal documento, ele não possui escolha senão requerer a prestação do serviço perante a autoridade competente, mediante o pagamento da taxa respectiva. A única forma de obter essa comodidade (emissão do passaporte) é pelo acesso a esse serviço público específico e divisível prestado pela Polícia Federal. O mesmo, no entanto, não ocorre com o serviço de transporte público. A comodidade pretendida na hipótese é sair do ponto A e chegar no ponto B; desiderato que pode ser atingido seja pela utilização de transporte público viário, seja pelo uso de uma bicicleta, seja pela utilização de um veículo particular. Sendo assim, a contraprestação exigida pelo uso do transporte público viário jamais poderia ser uma taxa: nesse caso, a compulsoriedade quanto ao uso do serviço público não se faz presente; tal uso decorre, essencialmente, do exercício da autonomia de vontade do particular."
(PISCITELLI,
Tathiane.
Obra citada.
item 5.2.1.0).
Além disso,
"outra questão frequente se coloca nesse contexto: e os pedágios? São taxas ou preços públicos? Nos termos do artigo 150, inciso V da Constituição, é vedado à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios “estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público”. A redação do dispositivo não deixa dúvidas: o legislador constitucional incluiu o pedágio dentro da categoria geral de tributos, uma vez que excepciona esse tipo de prestação do princípio geral da limitação ao tráfego de pessoas e bens por meio de tributos.
Ainda segundo a interpretação constitucional, sendo o pedágio tributo, será ele da espécie “taxa de serviço público”, já que será exigido em função da “utilização de vias conservadas pelo Poder Público”. A despeito do texto da Constituição, porém, deve-se destacar que o simples fato de uma contraprestação ser denominada “pedágio” não lhe confere, automaticamente, o status de tributo. A denominação legal, nos termos do artigo 4º, inciso I do Código Tributário Nacional, não é elemento suficiente para definir a natureza jurídica de uma contraprestação. Dessa forma, somente teremos “pedágio tributo” se o caráter compulsório da utilização do serviço de conservação de vias públicas estiver presente. Por fim, para encerrar o debate, cumpre retomar a questão já analisada no Capítulo 03 por ocasião do estudo da imunidade recíproca: a natureza jurídica dos emolumentos notarias e registrais
. Conforme tratado anteriormente, tais valores possuem natureza jurídica de taxa. Nesse caso, a ausência de autonomia do particular é evidente: a única forma de obter a comodidade proporcionada pelas serventias (registro de imóveis, reconhecimento de firmas, autenticação de documentos) é pelo acesso a elas próprias, mediante o pagamento do valor de emolumento fixado em lei. Não há alternativa ou autonomia do cidadão no presente caso. Nesse sentido, confira-se trecho do acórdão da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.694, apenas um dos precedentes que firmam tal posição: II. Custas e emolumentos: serventias judiciais e extrajudiciais: natureza jurídica. É da jurisprudência do Tribunal que as custas e os emolumentos judiciais ou extrajudiciais têm caráter tributário de taxa. III. Lei tributária: prazo nonagesimal. Uma vez que o caso trata de taxas, devem observar-se as limitações constitucionais ao poder de tributar, dentre essas, a prevista no art. 150, III, c, com a redação dada pela EC 42/03 – prazo nonagesimal para que a lei tributária se torne eficaz. A despeito disso, porém, o Supremo Tribunal Federal negou o reconhecimento da imunidade recíproca nessas hipóteses, por considerar que a atividade das serventias era realizada com finalidade lucrativa – o que, por óbvio não guarda coerência com a natureza jurídica de taxa da contraprestação."
(PISCITELLI,
Tathiane.
Obra citada
, item 5.2.1.2).
Acrescento que,
"
Ao lado das taxas de serviço público, compete à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios a criação de taxas pelo exercício do poder de polícia. Trata-se, aqui, de financiar as atividades de fiscalização realizadas no âmbito das respectivas jurisdições e necessárias à preservação do interesse público
. O conceito de “poder de polícia” está definido no artigo 78 do Código Tributário Nacional, cuja redação dispõe: Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos."
(PISCITELLI,
Tathiane.
Obra citada.
item 5.2.1.0).
Nos termos do art. 77 do Código Tributário Nacional/66, a taxa deve ser exigida em função do exercício regular do poder de polícia. Nos termos do parágrafo único do artigo 78, tal exercício será considerado válido quando seja desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.
"Não há que se falar em cobrança de taxa dessa natureza em razão de potencial fiscalização ou restrição das atividades do particular em abstrato: o exercício do poder de polícia deve ser efetivo. Esse ponto, em específico, foi objeto de controvérsia nos tribunais superiores. Nos termos da compreensão firmada pelo Supremo Tribunal Federal, a existência, em si, do órgão fiscalizador, não seria requisito fundamental para viabilizar a cobrança da taxa, nem sequer a fiscalização in loco. De acordo com o Tribunal, o fundamental é a existência de estrutura administrativa para fiscalizar, sendo a existência do órgão apenas um dos elementos para se inferir o efetivo exercício do poder de polícia. Por fim, no mesmo sentido das taxas decorrentes da utilização de serviços públicos específicos e divisíveis, a base de cálculo das taxas cobradas pelo exercício do poder de polícia deve refletir o custo da atuação estatal, sob pena de assumirem caráter confiscatório e se revelarem ofensivas ao princípio da capacidade contributiva. Nesse sentido, é a postura consolidada do Supremo Tribunal Federal. Sobre o tema, confira-se, por todos, trecho da emenda da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6211."
(PISCITELLI,
T.
Obra cit..
item 5.2.2).
Atente-se para o seguinte julgado do STF:
"(...) É legítima a inserção da energia elétrica gerada como elemento de quantificação da obrigação tributária.
Razoável concluir que quanto maior a energia elétrica gerada por aquele que explora recursos energéticos, maior pode ser o impacto social e ambiental do empreendimento, e, portanto, maior também deve ser o grau de controle e fiscalização do Poder Público
. 4.
No entanto, os valores de grandeza fixados pela lei estadual (1 megawatt-hora) em conjunto com o critério da energia elétrica gerada fazem com que o tributo exceda desproporcionalmente o custo da atividade estatal de fiscalização, violando o princípio da capacidade contributiva, na dimensão do custo/benefício, que deve ser aplicado às taxas
. 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente. Fixação da seguinte tese: Viola o princípio da capacidade contributiva, na dimensão do custo/benefício, a instituição de taxa de polícia ambiental que exceda flagrante e desproporcionalmente os custos da atividade estatal de fiscalização (Destaques não contidos no original). .ADI 5489, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 24/02/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-047 DIVULG 11-03-2021 PUBLIC 12-03-2021.
Destaque-se ainda que
"
A proporcionalidade tributária não deve ser equiparada à progressividade. Esta trata do aumento percentual equivalente realizado entre base cálculo e alíquota, ao cuidar de importante dimensão da ordem tributária, qual seja, a constante no princípio da generalidade
. Por sua vez, a proporcionalidade considerada de maneira estrita no campo tributário faz com que pessoas com diferentes capacidades contributivas paguem tributos com a mesma alíquota. Ao desconsiderar a capacidade econômica dos sujeitos, inscreve números que conduzem pessoas com capacidades contributivas díspares a pagar em proporção o mesmo imposto. Se isso passa pelo teste da igualdade formal, pode gerar paradoxos como na simples conta de atribuição de 10% na base de cálculo em que quem ganha 10 paga 1 e quem ganha 100 paga 10. Não há dúvidas que, em tal cenário, aquele que possui menos é mais sacrificado e que, ausente a progressividade, pode-se recair em flagrante injustiça substantiva."
(LORENZETTO, Bruno; SCHAITZA, Letticia. 37. Tese É constitucional a emenda constitucional 29, de 2000, no que estabeleceu a possibilidade de previsão legal de alíquotas progressivas para o IPTU de acordo com o valor do imóvel
in
CLÈVE, Clèmerson; KENICKE, Pedro. Teses Jurídicas dos Tribunais Superiores: Direito Constitucional. SP: RT. 2017).
2.32. Progressividade da TCFA:
Como registrei acima, a TFA - taxa de fiscalização ambiental fora criada por força do art. 8º da lei 9960/2000, preconizando que ela seria seria devida por força do efetivo exercício de atividades relacionadas no art. 17, II da lei 6.938, de 31 agosto de 1981
. O STF deferiu tutela de urgência, em 29 de março de 2000, ao apreciar o pedido de medida cautelar na
ADI 2178-MC
, suspendendo a aplicação da norma do referido art. 8. Contudo, a ação direta de inconstitucionalidade não chegou a ser apreciada, em definitivo, por conta da superveniente publicação da lei n. 10.165, de 27 de dezembro de 2000, cujo art. 1º criou a taxa de controle e fiscalização ambiental.
Na sequência, o STF reputou que essa
lei 10.165/2000
estaria em conformidade com a Constituição, quanto aos pontos discutidos nos recursos que lá aportaram, a exemplo do
RE 416.601-1/DF
, rel. Min. Carlos Velloso. O Supremo reputou que aludido tributo teria a compleição jurídica de taxa. Repiso, contudo, que os Tribunais já chegaram a decidir que a TCFA deveria ser considerada uma espécie de contribuição de intervenção econômica:
TRIBUTÁRIO. LEI 10.165/00. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO.EMPRESA INCLUÍDA NO SIMPLES. LEI 9.317/96, ART. 3º, § 4º. 1.
A TCFA não se enquadra nos conceitos de taxa e de imposto, ajustando-se, à luz dos preceitos tributários e constitucionais, à categoria de contribuição especial de intervenção no domínio econômico, cuja finalidade é custear a atividade realizada pelo IBAMA na defesa do meio ambiente, de acordo com o quanto insculpido no art. 170, VI, da Constituição Federal. 2. A descrição nominal do tributo é despicienda para a sua qualificação, devendo-se ater o julgador na regra hermenêutica contida no art. 4º, I, do Código Tributário Nacional. 3. Constituindo-se a TCFA em uma contribuição de intervenção no domínio econômico e em não havendo menção às contribuições de intervenção nos dispositivos que estabelecem quais os tributos são ou não abarcados pelo SIMPLES, insere-se a TCFA nas contribuições em relação às quais há dispensa de recolhimento para as empresas incluídas no Sistema Integrado de Recolhimento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte, tendo em vista o comando insculpido no § 4º do art. 3º da Lei n.º 9.317/96. 4. Remessa oficial improvida
. (TRF-4 - REO: 6411 SC 2003.72.04.006411-2, Relator: WELLINGTON MENDES DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 10/08/2005, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 24/08/2005 PÁGINA: 702)
Aludido entendimento foi superado, porém, por conta da consolidação da tese de que se cuidaria de uma taxa, na forma do
art. 145, II, Constituição Federal/1988
.
EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL (TCFA). TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. DECADÊNCIA. PRESCRIÇÃO. 1.
Segundo o pronunciamento do STF, a TCFA classifica-se no conceito de taxa, restando superado, portanto, o entendimento desta Corte que a enquadrava na categoria de contribuição de intervenção no domínio econômico
. 2. Segundo a sistemática da Lei nº 6.938/1981, as pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam a atividades potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos naturais, mencionadas no anexo VIII da Lei, são obrigadas a se cadastrar junto ao IBAMA e, uma vez incluídas no Cadastro, tornam-se contribuintes da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental, que devem recolher na data e nos valores fixados pela Lei. 3. Inexistindo o pagamento da TCFA por parte do sujeito passivo no prazo legal, tem a Autoridade fiscal o prazo de 5 anos para constituir o crédito tributário, nos termos do art. 173, I, do CTN. 4. Considerando que a prescrição teve início em 19.08.2004 e tendo em vista que a execução fiscal foi ajuizada em 28.08.2009, percebe-se que, quando do próprio ajuizamento dos autos executivos, já havia transcorrido lapso superior a 5 anos, razão pela qual se faz necessário o reconhecimento da prescrição em relação à CDA que fundamenta este feito. 5. O prazo suspensivo de 180 dias previsto no art. 2º, § 3º, da Lei nº 6.830/80 só é aplicável à execução fiscal da dívida não-tributária, o que não é o caso. 6. Apelação improvida. (TRF-4 - AC: 50001186920114047011 PR 5000118-69.2011.4.04.7011, Relator: FRANCISCO DONIZETE GOMES, Data de Julgamento: 17/07/2013, PRIMEIRA TURMA)
No que diz respeito à base de cálculo, acrescento que
"
Para o cálculo do valor da taxa, segundo o anexo IX da lei, é levado em consideração o potencial de poluição da atividade ou o grau de utilização do recurso natural (pequeno, médio ou alto, definidos no Anexo VIII) e o porte do contribuinte (microempresa, empresa de pequeno, médio ou grande porte, definidos no art. 17-D)
. Um dispositivo que tem sido interpretado erroneamente pelos sujeitos passivos da TCFA é o art. 17-P, que autoriza a compensação de até sessenta por cento do valor lançado pelo IBAMA diante da comprovação do pagamento de taxa de fiscalização ambiental ao Estado, ao Município ou ao Distrito Federal. Comumente tem sido confundido o valor pago a título do licenciamento ambiental realizado pelo órgão estadual de meio ambiente (LP, LI e LO) ou mesmo o Alvará de Funcionamento emitido pelo Município que não tem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais. Nesse sentido, é muito claro o citado artigo, ao estabelecer: Art. 17-P. (…) § 1º Valores recolhidos ao Estado, ao Município e ao Distrito Federal a qualquer outro título, tais como taxas ou preços públicos de licenciamento e venda de produtos, não constituem crédito para compensação com a TCFA. Tratando-se de uma taxa, sujeita ao regime do direito tributário e prevista em norma específica, as disposições do Decreto 6.514/08 não se aplicam à Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA."
(TRENNEPOHL, Curt; TRENNEPOHL, Terence; TRENNEPOHL, Natascha. I
nfrações Ambientais: Comentários ao Decreto 6.514/2008.
São Paulo: RT. 2022. item 3.25.)
Menciono ainda o seguinte:
TRIBUTÁRIO. TCFA. FATO GERADOR. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA OU UTILIZADORA DE RECURSOS NATURAIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO NÃO CABIMENTO DA COBRANÇA DA TCFA. CONCESSIONÁRIA DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. INDISPENSABILIDADE DO PAGAMENTO. 1- A mera inscrição da empresa no Cadastro Técnico Federal do IBAMA não autoriza a cobrança da TCFA, sendo necessária a efetiva ocorrência do fato gerador do tributo. 2 - O "comprovante de inscrição e de situação cadastral da autora" apresentado pelo IBAMA indica as atividades principal e secundárias da empresa, compatíveis com o desenvolvimento de atividades potencialmente poluidoras. 3- O fato gerador da TCFA é o exercício do poder de polícia pelo IBAMA sobre as atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais, relacionadas no Anexo VIII da Lei nº 6.938/1981 (art. 17-B do referido diploma), alterada pela Lei nº 10.165/2000. Diante disso, o sujeito que não desenvolve quaisquer das atividades arroladas no referido anexo não se qualifica como contribuinte do tributo (art. 17-C da Lei nº 6.938/1981). 4- O serviço de troca de óleo lubrificante foi dispensado da cobrança de TCFA nas IN 05/2014 e 06/2016 do IBAMA. Tais previsões foram alteradas pela IN 11/2018, a qual introduziu a atividade de 'Depósito de produtos químicos e produtos perigosos" (Código 18-80), no qual se enquadra a atividade da impetrante. Apelação improvida. (TRF-4 - AC: 50759506320194047000, Relator: ANDREI PITTEN VELLOSO, Data de Julgamento: 07/12/2022, PRIMEIRA TURMA)
Logo, deve-se ter em conta, em princípio, para apuração do valor devido a título de TCFA, o porte econômico da empresa e o potencial poluidor e utilizador de recursos naturais
(PPGU) respectivo.
2.33. Devido processo administrativo:
De outro tanto, como cediço, a cláusula do
due
process
of law
submete-se tanto a um viés formal (procedimento, rito), quanto a um enfoque substancial ('justa causa' para a restrição a direitos fundamentais). O preceito deu causa à edição das conhecidas súmulas 70, 323, 523 e 547 do STF.
Transcrevo, por oportuno, o art. 5º, LIV e LV da Lei Fundamental/88:
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV -
aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes
.
Ora,
"A teoria do devido processo legal, construída na jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos, compreende duas perspectivas: substantive due process e procedural due process. A primeira é projeção do princípio no campo do direito material, enquanto a segunda funciona como garantia na esfera processual. O espectro da proteção é o trinômio vida-liberdade-propriedade."
(BACELLAR FILHO, Romeu Felipe.
Processo administrativo disciplinar.
São Paulo: Max Limonad. p. 223).
Desse modo,
"Quanto ao procedural du
process
, os dois interesses centrais podem ser identificados no caso Marschall versus Jerrico, inc. 446 US 238 (1980):
o governo não deve privar uma pessoa de um interesse importante a menos que a correta compreensão dos fatos e a lei permita; mesmo se o governo puder legalmente privar alguém de um interesse importante, o indivíduo tem o direito de ser ouvido perante uma Corte neutra antes da privação
. Enquanto a primeira regra prende-se à realidade da Justiça ('actuality of justice'), a segunda envolve a aparência de justiça ('appearance of justice')"
(BACELLAR FILHO.
Obra.
p. 224).
Reporto-me também à lição de Canotilho:
"
Processo devido em direito significa a obrigatoriedade da observância de um tipo de processo legalmente previsto antes de alguém ser privado da vida, da liberdade e da propriedade. Nestes termos, o processo devido é o processo previsto na lei para a aplicação de penas privativas da vida, da liberdade e da propriedade
. Dito por outras palavras: due process equivalente ao processo justo definido por lei para se dizer o direito no momento jurisdicional de aplicação de sanções criminais particularmente graves (...) o due process of law pressupõe que o processo legalmente previsto para a aplicação de penas seja ele próprio um processo devido, obedecendo aos trâmites procedimentais formalmente estabelecidos na Constituição ou plasmados em regras regimentais das assembléias legislativas." (CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito constitucional e teoria da Constituição.
7ª ed. Almedina, p. 493)
Sob o enfoque material, portanto, a cláusula do art. 5º, LIV, CF, condiciona a restrição a direitos fundamentais aos requisitos de idoneidade, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
2.34. D
ecadência
tributária - lançamento tributário:
Nelson Nery Jr. explicita que
"O prazo previsto expressamente em lei para o exercício das pretensões que se ajuízam mediante ação constitutiva, positiva ou negativa, é de decadência, pois a pretensão constitutiva se caracteriza como direito potestativo. As pretensões que se exercem mediante ação declaratória são perpétuas (imprescritíveis). Isto significa que podem ser ajuizadas mesmo se já estiver prescrita a pretensão condenatória do direito cuja existência ou inexistência se quer ver declarada."
(NERY JR.
Novo Código Civil anotado.
SP: RT, 2002).
Como sabido, o CTN estipula marcos peremptórios para a efetivação do lançamento, sobremodo quando em causa tributos submetidos ao pagamento antecipado à conferência estatal, impropriamente chamado de lançamento por homologação. Com efeito, o art. 150, §4º, CTN, dispõe que "
Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação
."
Daí o relevo da análise de José Souto Maior Borges, quando sustenta o que segue:
"Abstraída, para simplificação expositiva, a ocorrência de dolo, fraude ou simulação, podem ser discriminadas basicamente as seguintes situações jurídicas relacionadas com a atividade do sujeito passivo prévia à homologação:
a) o sujeito passivo paga integralmente o tributo devido;
b) o sujeito passivo paga tributo totalmente indevido;
c) o sujeito passivo paga o tributo com insuficiência;
d) o sujeito passivo paga tributo maior que o devido;
e) o sujeito passivo não paga tributo devido.
Para se evitar equívocos nessa matéria, tão eriçada de dificuldades, deve-se salientar que, consoante demonstrado, a homologação pelo Fisco é da atividade do sujeito passivo, não necessariamente do pagamento. Assim sendo, nos impostos não cumulativos, tais como o ICMS e o IPI, pode perfeitamente ser homologada atividade da qual não resulte pagamento de tributo.
Ora, em qualquer uma dessas hipóteses, o Código tributário Nacional atribui a eficácia de algo acontecido a algo que concretamente não ocorreu - o lançamento. A chamada homologação tácita nada mais significa senão uma deformação da realidade fática - a situação jurídica subjacente a essa disciplina normativa.
Trata-se, pois, seja qual for, dentre aquelas, a situação-origem, de uma ficção do Direito tributário. É irrelevante que tenha havido ou não o pagamento, porque relevante é apenas o transcurso do prazo sem pronunciamento - di-lo o CTN - do Fisco.
São pressupostos de fato diferentes a efetiva e concreta realização da homologação e a omissão desse ato, dentro do quinquênio. Mas o Código tributário Nacional lhes atribui, sob esse prisma, os mesmos efeitos jurídicos. Logo, a hipótese é, desenganadamente, de ficção de Direito tributário.
Transcorrido o prazo de cinco anos, previsto no art. 150, §4º, não mais poderá o fisco lançar o tributo." (BORGES, José Souto Maior
. Lançamento tributário.
2. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 399-400)
Por conseguinte, como bem enfatiza Souto Maior Borges, o efeito decadencial previsto no art. 150, §4º, CTN, impõe-se mesmo quando o contribuinte deixa de recolher tributo devido, nos 05 anos anteriores. Por seu turno, Eurico Marcos Diniz
de Santi
advoga tese pontualmente distinta:
"Regra da decadência do direito de lançar sem pagamento antecipado:
Essa regra apresenta na sua hipótese a seguinte combinação dos quatro primeiros critérios: não previsão de pagamento antecipado e, portanto, não ocorrência do pagamento antecipado; ou então previsão de pagamento antecipado, mas não ocorrência do pagamento antecipado. Não havendo pagamento antecipado, não ocorrência de dolo, fraude ou simulação, e não ocorrência da notificação por parte do Fisco.
Nessa configuração, o prazo decadencial é de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que tenha ocorrido o evento tributário (art. 173, I, CTN). Anote-se que a determinação do dies a quo desse prazo tem como pressuposto a constituição jurídica do fato tributário, no qual se identificará juridicamente o tempo no fato, que é, nesse caso, o marco temporal da ocorrência do mencionado evento.
O consequente normativo dessa regra ataca a competência administrativa de o Fisco produzir o ato-norma administrativo de lançamento tributário ou, o que é o mesmo, extingue o direito de a Fazenda Pública constituir o cr´3edito, na precisa dicção do caput do art. 173, CTN." (SANTI, Eurico Marcos Diniz de.
Decadência
e
prescrição
no Direito tributário.
4. ed. São Paulo: Saraiva, p. 2011, p. 120)
Por mais que o tema ainda seja polêmico na doutrina tributária brasileira, esse entendimento de Eurico de Santi tem encontrado ressonância junto ao Superior Tribunal de Justiça, como bem ilustram os seguintes julgados REsp. 512840/SP, 2ª Turma, DJ 23.05.2005; EDcl no REsp. 947988, DJe 19.12.2008; Ag Rg no REsp. 790875, DJe 11.02.2009 e REsp. 989421, DJe 10.12.2008.
PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO - DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO - TERMO INICIAL - ARTIGO 173, I, DO CTN - APLICAÇÃO CUMULATIVA DOS PRAZOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 150, § 4º, e 173, do CTN - IMPOSSIBILIDADE - REEXAME DE PROVAS: SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTE: REsp 973.733/SC. 1.
O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito
. 2. É inadmissível o recurso especial se a análise da pretensão da recorrente demanda o reexame de provas. 3. Recursos especiais conhecidos e não providos. (RESP 200702134298, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:01/09/2010 ..DTPB:.)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ART. 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - TCFA. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRAZO DECADENCIAL PARA A CONSTITUIÇÃO E PRAZO PRESCRICIONAL PARA A COBRANÇA DA EXAÇÃO.1. Não há que se falar em violação do art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem se manifesta suficientemente sobre o tema, muito embora não tenha adotado as teses e os artigos de lei invocados pelas partes.2. O STJ já assentou que a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA, prevista na Lei n. 6.938/81, sujeita-se a lançamento por homologação. Nessa sistemática, "[...] a legislação atribui ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa [...]" (art. 150, caput, do CTN). Precedente: REsp 1241735/SC, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011.3. Sendo assim, o pagamento do referido tributo deverá ocorrer antes da própria constituição do crédito tributário, isto é, a legislação (art. 17-G, da Lei n. 6.938/81) estabelece uma data de vencimento que antecede o ato de fiscalização da administração tributária.
4. Essa fiscalização posterior somente ensejará o lançamento do crédito tributário se o pagamento foi parcial (incompleto) ou se não houver pagamento em absoluto. Na primeira hipótese (pagamento parcial), a notificação ao contribuinte deverá se dar dentro do prazo decadencial de 5 (cinco) anos a contar da ocorrência do fato gerador (art. 150, §4º, do CTN).
Já na segunda hipótese (ausência completa de pagamento), a notificação ao contribuinte deverá ocorrer dentro do prazo decadencial de 5 (cinco) anos a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado
(art. 173, I, do CTN). Precedentes: REsp 1241735/SC, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011; REsp. Nº 973.733 - SC, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12.8.2009.
5. Notificado o contribuinte para pagar os valores faltantes ou se defender, dá-se a constituição definitiva do crédito tributário, o que inaugura o prazo prescricional para a sua cobrança (art. 174, do CTN), salvo em ocorrendo quaisquer das hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito tributário (art. 151, do CTN) ou interrupção do lustro prescricional (art. 174, parágrafo único, do CTN).6. No caso concreto, o débito de TCFA vencido em 30.12.2003 e não pago em absoluto foi notificado ao sujeito passivo em 04.08.2008, sendo que o prazo decadencial se findaria, na pior das hipóteses, em 01.01.2009 (cinco anos após o primeiro dia do exercício seguinte ao exercício de 2003 - art. 173, I, do CTN), não tendo, pois, ocorrido a decadência.7. Constituído o crédito tributário em 04.08.2008, na pior das hipóteses, a Administração Fazendária tinha até o dia 04.08.2013 para ajuizar a execução (cinco anos a contar da constituição definitiva). Sem deixar de observar que o despacho que ordena a citação interrompe a prescrição de forma retroativa à data da propositura da ação (itens "14" e "15" do citado recurso representativo da controvérsia REsp. Nº 1.120.295 - SP, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12.5.2010). Portanto, não ocorreu também a prescrição.8. Recurso especial parcialmente provido." (STJ, REsp 1259634 / SC, rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, T2 - SEGUNDA TURMA, DJe 19/09/2011 - grifei)
2.35.
Prescrição da pretensão de cobrança:
Atente-se para a lição de Nelson Nery Jr.:
"O prazo previsto expressamente em lei para o exercício das pretensões que se ajuízam mediante ação constitutiva, positiva ou negativa, é de decadência, pois a pretensão constitutiva se caracteriza como direito potestativo.
As pretensões que se exercem mediante ação declaratória são perpétuas (imprescritíveis). Isto significa que podem ser ajuizadas mesmo se já estiver prescrita a pretensão condenatória do direito cuja existência ou inexistência se quer ver declarada.
"
(NERY JÚNIOR, N.
Novo Código Civil anotado.
SP: RT, 2002).
Ao contrário do que ocorre com a decadência, a prescrição tributária diz respeito à pretensão decorrente do lançamento. O prazo de 05 anos, previsto no CTN - art. 174 - deve ser computado a partir do esgotamento do processo administrativo. Segue:
"A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005) II - pelo protesto judicial; III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; IV - por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor."
"Na regra da prescrição do direito do Fisco com constituição do crédito pelo contribuinte e com suspensão da exigibilidade e na regra da prescrição do direito do Fisco com lançamento e com suspensão da exigibilidade, a suspensão da exigibilidade se dá em momento anterior ao vencimento do prazo para pagamento do crédito e, por isso, desloca o dies a quo dos prazos prescricionais para o momento da supressão da causa suspensiva.
Com relação aos casos em que a suspensão da exigibilidade ocorre em momento posterior ao vencimento do prazo para pagamento do crédito, aplicam-se outras regras: a regra da prescrição do direito do Fisco com constituição do crédito pelo contribuinte e a regra da prescrição do direito do Fisco com lançamento. Essa suspensão da exigibilidade será configurada (i) pela moratória, que recebeu disciplina expressa a esse respeito, ex vi do parágrafo único, art. 155, CTN; (ii) pelo depósito do montante integral do crédito tributário; ou (iii) pela concessão de medida liminar em mandado de segurança, nos termos do art. 151, CTN.
Assim, estando o prazo prescricional já em curso, a realização de qualquer das aludidas hipóteses suspensivas tornará o crédito inexigível, de tal forma que naõ se poderá qualificar a conduta do Fisco como omissiva até que desapareça a cláusula suspensiva. Consequentemente, também a contagem do prazo de prescrição rsetará suspensa durante o período em que se suceder a suspensão da exigibilidade do crédito, sendo retomada com a supressão da causa suspensiva
." (SANTI, Eurico Marcos Diniz de.
Decadência e prescrição no Direito tributário.
4. ed. São Paulo: Saraiva, p. 2011, p. 162-163)
A título de exemplo, atente-se para o que transcrevo abaixo:
"TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PARCELAMENTO. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ENTENDIMENTO FIXADO NA ORIGEM COM BASE NO CONTEXTO FÁTICO DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1.
Nos termos da jurisprudência do STJ, a confissão espontânea de dívida seguida do pedido de parcelamento representa ato inequívoco de reconhecimento do débito, interrompendo, assim, o curso da prescrição tributária, nos termos do art. 174, parágrafo único, inciso IV, do CTN
. 2. O acórdão recorrido delineou a controvérsia dentro do universo fático-comprobatório, ao afirmar que não ocorreu a interrupção do lapso prescricional, haja vista que não ficou provada a ocorrência de parcelamento. Caso em que não há como aferir eventual violação dos dispositivos infraconstitucionais alegados sem que as provas sejam abertas ao reexame. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no AREsp: 553001 PR 2014/0181566-0, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 16/09/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/09/2014)"
2.36.
Protesto
de CDA:
Com a redação veiculada pela lei 12.767/2012, o art. 1º da lei 9.492/1997 dispõe que
"
Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida
. Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas."
Prima facie,
aludida medida poderia se revelar desnecessária, diante das prerrogativas reconhecidas à Administração Pública, quando em causa o lançamento e cobrança de tributos. De toda sorte, ao apreciar a ADIN n. 5135, a Suprema Corte concluiu, em 09 de novembro de 2016, que
"
O protesto das Certidões de Dívida Ativa constitui mecanismo constitucional e legítimo, por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política
."
Atente-se, ademais, para os seguintes julgados:
RECURSO DE APELAÇÃO. DÍVIDA ATIVA. PROTESTO DE CDA. 1.
O protesto não está limitado aos títulos de crédito, desvinculando-se dos títulos estritamente cambiais para abranger todos e quaisquer "títulos ou documentos de dívida"
. 2. Não é dado ao Poder Judiciário substituir-se à Administração para eleger, sob o enfoque da necessidade (utilidade ou conveniência), as políticas públicas para recuperação, no âmbito extrajudicial, da dívida ativa da Fazenda Pública. 3. A Lei das Execuções Fiscais não desautoriza a instituição ou utilização de mecanismos de cobrança extrajudicial. 4. Recurso de apelação não provido. (Ap 00266714920154036100, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. ART. 1.021, CPC. AÇÃO DECLARATÓRIA. PROTESTO DE CDA. LEGITIMIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A decisão ora agravada, prolatada em consonância com o permissivo legal, encontra-se supedaneada em jurisprudência consolidada do C. Supremo Tribunal Federal, inclusive quanto aos pontos impugnados no presente recurso. 2.
O E. Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 09.11.2016, julgou improcedente a ADIN nº 5135, para, por maioria, fixar a tese de que "o protesto das Certidões de Dívida Ativa constitui mecanismo constitucional e legítimo, por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política
". 3. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida. 4. Agravo interno improvido. (AC 00197021820154036100, DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/09/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Em princípio, por conseguinte, no rastro dos precedentes do STF e outros tribunais, o protesto de dívidas fiscais não se revela, em si, inválido. A autora sustentou, todavia, que se cuidaria de protesto de débitos cuja cobrança seria indevida, dado que não seria sujeito passivo da relação tributária, questão a ser apreciada adiante.
2.37. Inscrição em cadastro de inadimplentes:
D'outro tanto, segundo a jurisprudência predominante, a inibição do lançamento, no CADIN, do nome do interessado, pressupõe a realização do aludido depósito, por força do disposto no art. 7º, I, da lei n. 10.522, de 19 de julho de 2002:
"Será suspenso o registro no Cadin quando o devedor comprove que: I - tenha ajuizado ação, com o objetivo de discutir a natureza da obrigação ou o seu valor, com o oferecimento de garantia idônea e suficiente ao Juízo, na forma da lei."
Referido diploma deve ser aferido com cautelas, sabe-se bem. Afinal de contas, o poder geral de tutela, na temática civil, é projeção do art. 5º, XXXV, CF. Importa dizer: a Constituição exige um processo efetivo e, tanto por isso, a lei infraconstitucional não pode restringir demasiadamente a concessão de provimentos de urgência. Tanto por isso, em princípio, a lei infraconstitucional não poderia instituir uma espécie de
solve et repet,
de modo que a inibição de condutas lesivas fique na dependência do depósito em juízo.
De toda sorte, convém ter em conta que essa obrigatoriedade de contracautelas também se encontra prevista no art. 50, §1º, da lei n. 10.931/2001 (quanto à pretensão à revisão de contratos imobiliários), enquanto que a lei n. 13.105/2015 facultou ao Poder Judiciário condicionar a concessão do provimento de urgência à oferta de caução (art. 300, §1º, CPC). Acrescento que, ao apreciar o REsp 1137497/CE, com caráter repetivivo, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a mera discussão judicial da dívida não autorizaria a suspensão do registro no CADIN, sendo necessária a garantia idônea e suficiente do Juízo ou que a exigibilidade do crédito esteja suspensa por algum outro motivo.
Reporto-me também aos seguintes julgados:
TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. RECUSA. BEM SITUADO EM OUTRO ESTADO. CADIN. EXCLUSÃO DO NOME DO CADASTRO. 1. Mostra-se justificada a recusa do devedor considerando-se que o bem oferecido não representa efetiva garantia dos créditos exeqüendos, uma vez que o imóvel situa-se em outro Estado da federação. 2. Nos casos em que os contribuintes pleiteiam a exclusão de seu nome dos registros do CADIN, devem ser observados os requisitos de suspensão previstos no art. 7º da Lei nº 10.522/02, como o oferecimento de caução idônea ao juízo ou o depósito judicial dos valores contestados.
(AG 00088123320104040000, VÂNIA HACK DE ALMEIDA, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 26/05/2010.)
PROCESSUAL CIVIL. CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. CADIN. AFASTAMENTO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO FUNDADA NA APARÊNCIA DO BOM DIREITO. DEPÓSITO DE CAUÇÃO IDÔNEA. RESP. Nº 1.063.530/RS. . O simples ajuizamento de ação ou a mera existência de demanda judicial não autoriza o afastamento da parte requerente dos cadastros restritivos de crédito. . A liberação da inscrição nos cadastros restritivos de crédito respeita os seguintes requisitos, cumulativamente: (a) que a ação ajuizada pelo interessado seja fundada em questionamento integral ou parcial do débito; (b) que haja demonstração de que o questionamento à cobrança supostamente indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; e, (c) existência de depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz. . Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir.
(AC 200770060024893, NICOLAU KONKEL JÚNIOR, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 10/03/2010.)
PROCESSUAL CIVIL. CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. CADIN. AFASTAMENTO. RESSARCIMENTO AO SUS. AJUIZAMENTO DE AÇÃO. DEPÓSITO DE CAUÇÃO IDÔNEA. GARANTIA AO JUÍZO. . O simples ajuizamento de ação ou a mera existência de demanda judicial não autoriza o afastamento da parte requerente dos cadastros restritivos de crédito. . A liberação da inscrição nos cadastros restritivos de crédito condiciona-se ao depósito de caução idônea ou garantia ao juízo pela parte requerente. . Inteligência do art. 7º, I, da Lei nº 10.522 /2002. . Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. . Agravo de instrumento improvido.
(AG 200904000133210, NICOLAU KONKEL JÚNIOR, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 23/09/2009.)
2.38.
Suspensão da exigibilidade do tributo:
Sabe-se que há uma graduação da efetividade da obrigação juridico-tributária. A prática de comportamentos ou a consumação de fatos jurídico-tributários dá origem à obrigação de pagar determinados tributos em um dado prazo, com uma determinada alíquota e base de cálculo. Com isso, surge a dívida. Vencido o prazo de pagamento, a dívida torna-se vencida. Para que o Fisco possa cobrar aludido crédito, impõe-se que promova o lançamento de revisão, previsto no art. 150, §4, CTN - quanto aos tributos submetidos ao lançamento por homologação -, e art. 142, CTN. A execução depende da inscrição em dívida ativa etc
Com efeito,
"Exigibilidade. Surgimento. O crédito tributário, uma vez constituído pelo lançamento, é - por definição - líquido e certo. A exigibilidade surgirá com o inadimplemento no prazo legal."
(PAULSEN, Leandro.
Direito tributário:
constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência, 6ª ed., Livraria do advogado, p. 1013.
"
O crédito tributário passa por diferentes momentos de eficácia: crédito simplesmente constituído (pela ocorrência do fato gerador) torna-se crédito exigível (pelo lançamento notificado ou pela decisão administrativa definitiva) e finalmente, crédito exeqüível (pela inscrição nos livros da dívida ativa), dotado de liquidez e certeza
."
(TORRES, Ricardo Lobo.
Curso de direito financeiro e tributário.
14. ed., Rio de Janeiro: Renovar. p. 273)
Ademais,
"a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nas palavras do Código, ou da relação jurídica tributária e, mais especificamente, do objeto dessa relação, tal como adotaremos neste capítulo, tem por efeito impossibilitar que a administração tributária proceda a quaisquer atos de cobrança em face do sujeito passivo. Trata-se, nesse sentido, de suspensão da eficácia técnica da norma de tributação que, devidamente constituída, não poderá incidir enquanto tiver vigência a hipótese de suspensão. Explica-se melhor. Tome-se como exemplo a apresentação de defesa administrativa em face de lançamento de ofício. Nos termos do artigo 151, inciso III do Código Tributário Nacional, trata-se de causa de suspensão da exigibilidade. Um olhar mais atento aponta para o fato de que a apresentação de tal defesa resulta na introdução de norma individual e concreta no ordenamento jurídico, em cujo antecedente constará o fato de o sujeito passivo ter apresentado defesa administrativa ao lançamento. Como consequência inexorável deste fato, tem-se a constituição de relação jurídica que proíbe o ente tributante (agora, no papel de sujeito passivo) de exigir o crédito tributário, dada a suspensão de sua exigibilidade."
(PISCITELLI, Tathiane.
Curso de Direito Tributário.
São Paulo: RT. 2022, tópico 11).
Acrescente-se, de todo modo, que o Juízo pode e deve suspender a exigibilidade dos tributos, mediante antecipação de tutela, sempre que restarem preenchidos os requisitos previstos no art. 300, CPC e art. 151, CTN. Note-se que a antecipação de tutela é causa autônoma da suspensão, conquanto o Juízo possa condicioná-la à apresentação de cauções, conforme art. 300, §1, CPC/15.
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. SUSPENSÃO. TUTELA ANTECIPADA. CAUSA AUTÔNOMA. GARANTIA DO JUÍZO. DESNECESSIDADE. 1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista (Enunciado Administrativo n. 3). 2.
A concessão de medida liminar ou de tutela antecipada em demanda judicial é causa autônoma para a suspensão da exigibilidade do crédito, na forma do art. 151, V, do CTN
. 3. A legislação tributária não impõe nenhuma outra condição ao deferimento da referida suspensão da exigibilidade, senão o próprio atendimento dos pressupostos da tutela de urgência, não sendo possível restringir o alcance da norma complementar ao cumprimento de exigência estabelecida em lei ordinária para a atribuição de efeito suspensivo aos embargos à execução. 4. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AREsp: 1288110 PR 2018/0103865-1, Relator: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Julgamento: 21/09/2020, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/10/2020)
2.39. Eventual efetivação de depósito:
Como sabido, é direito do contribuinte promover depósito suspensivo da exigibilidade do tributo, na forma do art. 151, CTN.
“
O depósito do montante integral com o fim de suspender a exigibilidade é direito do contribuinte
(REsp 962.838/BA, Primeira Seção). É, portanto, facultativo e prescinde de autorização judicial, podendo ser realizado em qualquer ação antiexacional AgRg no REsp 835.067/SP Segunda Turma). Para que tenha efeito, bastam a comprovação nos autos judiciais e a comunicação desse ato à Fazenda pelo Estado Juiz ou mesmo pelo próprio Contribuinte."
(SEEFELDER, Claudio; CAMPOS, Rogério.
Constituição e Código Tributário Comentados.
São Paulo: RT. 2020).
Segundo o STJ,
"
A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que o depósito de que trata o art. 151 , II , do CTN constitui direito subjetivo do contribuinte, que pode efetuá-lo tanto nos autos da ação principal quanto em Ação Cautelar, sendo desnecessária a autorização do Juízo
. É facultado ao sujeito passivo da relação tributária efetivar o depósito do montante integral do valor da dívida, a fim de suspender a cobrança do tributo e evitar os efeitos decorrentes da mora, enquanto se discute na esfera administrativa ou judicial a exigibilidade da exação ( AgRg no REsp 517937/PE , Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/4/2009, DJe 17/6/2009)"
(STJ - REsp: 1691774 SP 2017/0202085-2, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 10/10/2017, T2 - 2. TURMA, Data de Publicação: DJe 16/10/2017)
Para surtir o efeito de suspender a exigibilidade do tributo, aludido depósito deve ser promovido com atenção à
súmula 112, STJ
. Os valores deverão permanecer, então, regidos em conta vinculada ao processo, corrigidos conforme variação da taxa SELIC, conforme
art. 1, da lei n. 9.703/1998
, regra especial se confrontada com o art. 14 da lei n. 9.289/1996, que impõe a adoção da taxa referencial como fator de correção dos depósitos promovidos em juízo. Menciono ainda a
lei 14.973, de 16 de setembro de 2024,
que tratou do tema dos depósitos judiciais nos arts. 35 e ss.
Em tal hipótese, caso, ao final, a pretensão do contribuinte venha a ser julgada improcedente, os valores devem ser convertidos em renda da demandada, com imputação em pagamento nas obrigações tributárias controvertidas, confomre art. 156, VI, CTN e demais normas do direito tributário, específicas se confrontadas com o direito civil - art. 354, CC.
Atente-se para os seguintes julgados:
"RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL.
TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO DO MONTANTE INTEGRAL. ART. 151,
II, DO CTN. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CONVERSÃO EM RENDA. DECADÊNCIA.
1.
Com o depósito do montante integral, tem-se verdadeiro
lançamento por homologação. O contribuinte calcula o valor do
tributo e substitui o pagamento antecipado pelo depósito, por
entender indevida a cobrança. Se a Fazenda aceita como integral o
depósito, para fins de suspensão da exigibilidade do crédito,
aquiesceu expressa ou tacitamente com o valor indicado pelo
contribuinte, o que equivale à homologação fiscal prevista no art.
150, § 4º, do CTN.
2. Uma vez ocorrido o lançamento tácito, encontra-se
constituído o crédito tributário, razão pela qual não há mais falar no transcurso do prazo decadencial nem na necessidade de lançamento de ofício das importâncias depositadas. Precedentes da Primeira
Seção.
3. A extinção do processo sem resolução de mérito, salvo o
caso de ilegitimidade passiva ad causam, impõe a conversão do
depósito em renda da Fazenda Pública respectiva. Precedentes:
AgRg nos EREsp 1.106.765⁄SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
Primeira Seção, DJe 30.11.2009, AgRg nos EDcl no Ag 1378036⁄CE,
Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, DJe 29⁄06⁄2011; REsp 901.052⁄SP,
Rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, DJe 03.03.2008.
4. Os fundamentos de fato trazidos pela agravante são premissas não contempladas no acórdão recorrido, de modo que não
podem aqui ser discutidas ou modificadas sob pena de inaceitável
incursão em matéria de prova, o que é vedado na instância especial,
nos termos da Súmula 7⁄STJ.
5. Agravo regimental não provido."
(AgRg no REsp 1.213.319⁄SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 17⁄05⁄2012, DJe 28⁄05⁄2012)
TRIBUTÁRIO. PROCESSO JUDICIAL. DEPÓSITO COM A FINALIDADE DE SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO EQUIVALENTE AO PAGAMENTO. DESNECESSIDADE DE LANÇAMENTO. 1. O depósito judicial do montante integral do débito é causa suspensiva de exigibilidade do crédito tributário, ex vi do artigo 151, II do CTN e, por força do seu desígnio, implica lançamento por homologação tácito, no montante exato do quantum depositado, conjurando eventual alegação de decadência do direito de constituir o crédito tributário. Precedentes: EREsp 898.992/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08.08.2007, DJ 27.08.2007; REsp 895.604/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01.04.2008, DJ 11.04.2008; AgRg no REsp 971.054/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06.12.2007, DJ 24.03.2008. .
Julgado improcedente o pedido da empresa e, em havendo depósito, torna-se desnecessária a constituição do crédito tributário no qüinqüênio legal, não restando consumada a decadência. Conseqüentemente, revela-se escorreita a conversão em renda dos depósitos judiciais efetuados no âmbito da ação ordinária, uma vez não configurada a decadência do direito de o Fisco constituir o crédito tributário e tendo em vista a improcedência do pedido do contribuinte
. 3. Indevidamente realizado o levantamento do depósito judicial pelo contribuinte, afasta-se a razão da suspensão do crédito tributário, forçando ao FISCO FEDERAL a realização do lançamento tributário, inscrevendo o contribuinte em CDA, não existindo decadência ou prescrição do crédito tributário. 4. Apelação do autor improvida e apelação da UNIÃO FEDERAL e Remessa Oficial providas. (APELREEX 200171000285040, MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 13/10/2009.)
Caso, do contrário, a pretensão do demandante venha a ser julgada total ou parcialmente procedente, com subsequente trânsito em julgado da decisão judicial, os valores hão de ser restituídos ao contribuinte, na proporção em que sua pretensão tenha sido acolhida, devidamente corrigidos pela variação da taxa SELIC, conforme arts. 35 e ss. da lei 14.973, de 16 de setembro de 2024, responsável pela revogação da lei n. 9.703/1998, norma especial em face do art. 11 da lei n. 9.289/1996.
Registro que, em princípio, ao contrário do que ocorre com a consignação em pagamento (art. 337, Código Civil) - que apenas afasta a mora, quando a pretensão venha a ser julgada procedente -, o depósito de tributos inibe a incidência de consectários moratórios no seu curso. De todo modo, a questão pode ser discutida no curso do processo, caso tal depósito seja efetivado.
2.40.
Eventual oferecimento de contracautelas:
Outra questão diz respeito ao oferecimento de bens em garantia, por parte do contribuinte, a fim de se suspender a exigibilidade do tributo e, com isso, obter a certidão positiva com efeitos de negativa. Anote-se que o Código Tributário Nacional dispõe sobre as causas de suspensão da exigibilidade dos tributos no seu art. 151:
Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: I - moratória; II - o depósito do seu montante integral; III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo; IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança. V - a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; VI - o parcelamento. Parágrafo único.
O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das obrigações assessórios dependentes da obrigação principal cujo crédito seja suspenso, ou dela conseqüentes
.
Percebe-se, pois, que, no mais das vezes, a garantia a ser constituída pelo contribuinte - por sua iniciativa - a fim de se suspender a exigibilidade do tributo é o depósito do montante integral do valor discutido. Nesse sentido, atente-se para a conhecida súmula 112 do Superior Tribunal de Justiça:
"O depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro."
Situação pontualmente distinta trata do oferecimento de caução no período compreendido entre a constituição definitiva do crédito - ou seja, lançamento já consolidado - e a deflagração da execução fiscal respectiva.
Nesse âmbito, vigora certo limbo, eis que o lançamento já se esgotou, mas o contribuinte ainda não foi citado/notificado para garantir o juízo. A respeito do tema, reporto-me ao precedente do STJ, submetido ao ritual dos recursos repetitivos
(art. 1º, lei 11.672).
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. AÇÃO CAUTELAR PARA ASSEGURAR A EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA. POSSIBILIDADE. INSUFICIÊNCIA DA CAUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1.
O contribuinte pode, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa
. (Precedentes: EDcl no AgRg no REsp 1057365/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/08/2009, DJe 02/09/2009; EDcl nos EREsp 710.153/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe 01/10/2009; REsp 1075360/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/06/2009, DJe 23/06/2009; AgRg no REsp 898.412/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 13/02/2009; REsp 870.566/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 11/02/2009; REsp 746.789/BA, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/11/2008, DJe 24/11/2008; EREsp 574107/PR, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA DJ 07.05.2007). 2. Dispõe o artigo 206 do CTN que: 'tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa.' A caução oferecida pelo contribuinte, antes da propositura da execução fiscal é equiparável à penhora antecipada e viabiliza a certidão pretendida, desde que prestada em valor suficiente à garantia do juízo. 3.
É viável a antecipação dos efeitos que seriam obtidos com a penhora no executivo fiscal, através de caução de eficácia semelhante. A percorrer-se entendimento diverso, o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco não se voltou judicialmente ainda
. 4. Deveras, não pode ser imputado ao contribuinte solvente, isto é, aquele em condições de oferecer bens suficientes à garantia da dívida, prejuízo pela demora do Fisco em ajuizar a execução fiscal para a cobrança do débito tributário. Raciocínio inverso implicaria em que o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco ainda não se voltou judicialmente. 5.
Mutatis mutandis
o mecanismo assemelha-se ao previsto no revogado art. 570 do CPC, por força do qual era lícito ao devedor iniciar a execução. Isso porque as obrigações, como vínculos pessoais, nasceram para serem extintas pelo cumprimento, diferentemente dos direitos reais que visam à perpetuação da situação jurídica nele edificadas. 6.
Outrossim, instigada a Fazenda pela caução oferecida, pode ela iniciar a execução, convertendo-se a garantia prestada por iniciativa do contribuinte na famigerada penhora que autoriza a expedição da certidão
. 7. In casu, verifica-se que a cautelar restou extinta sem resolução de mérito, impedindo a expedição do documento de regularidade fiscal, não por haver controvérsia relativa à possibilidade de garantia do juízo de forma antecipada, mas em virtude da insuficiência dos bens oferecidos em caução, consoante dessume-se da seguinte passagem do voto condutor do aresto recorrido, in verbis: 'No caso dos autos, por intermédio da análise dos documentos acostados, depreende-se que os débitos a impedir a certidão de regularidade fiscal perfazem um montante de R$ 51.802,64, sendo ofertados em garantia pela autora chapas de MDF adquiridas para revenda, às quais atribuiu o valor de R$ 72.893,00. Todavia, muito embora as alegações da parte autora sejam no sentido de que o valor do bem oferecido é superior ao crédito tributário, entendo que o bem oferecido como caução carece da idoneidade necessária para aceitação como garantia, uma vez que se trata de bem de difícil alienação. 8. Destarte, para infirmar os fundamentos do aresto recorrido, é imprescindível o revolvimento de matéria fático-probatória, o que resta defeso a esta Corte Superior, em face do óbice erigido pela Súmula 07 do STJ. 9. Por idêntico fundamento, resta inteditada, a este Tribunal Superior, a análise da questão de ordem suscitada pela recorrente, consoante infere-se do voto condutor do acórdão recorrido, litteris: 'Prefacialmente, não merece prosperar a alegação da apelante de que é nula a sentença, porquanto não foi observada a relação de dependência com o processo de nº 2007.71.00.007754-8. Sem razão a autora. Os objetos da ação cautelar e da ação ordinária em questão são diferentes. Na ação cautelar a demanda limita-se à possibilidade ou não de oferecer bens em caução de dívida tributária para fins de obtenção de CND, não se adentrando a discussão do débito em si, já que tal desbordaria dos limites do procedimento cautelar. Ademais, há que se observar que a sentença corretamente julgou extinto o presente feito, sem julgamento de mérito, em relação ao pedido que ultrapassou os limites objetivos de conhecimento da causa próprios do procedimento cautelar.' 10. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008. ..EMEN: (RESP 200900279896, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJE DATA:01/02/2010 ..DTPB:.)
Em sentido semelhante, reporto-me também ao seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. MEDIDA CAUTELAR. CAUÇÃO. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITO DE NEGATIVA. VIABILIDADE. 1.
É lícito ao contribuinte, antes do ajuizamento da execução fiscal, oferecer caução no valor do débito inscrito em dívida ativa com o objetivo de, antecipando a penhora que garantiria o processo de execução, obter certidão positiva com efeitos de negativa. Precedentes
. 2. Embargos de divergência não providos. ..EMEN: (ERESP 200502031098, TEORI ALBINO ZAVASCKI, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJ DATA:06/08/2007 PG:00452 ..DTPB:.)
Frente ao exposto, desde que se trate dessa situação pontual - período entre a constituição definitiva do crédito, mediante lançamento, e a deflagração da execução fiscal -, reputo, com cognição precária, que o contribuinte pode ofertar bens em caução, nos termos da jurisprudência do STJ. Para tanto, contudo, a garantia há de ser idônea e suficiente, deve respeitar a ordem legal (art. 11, lei 6.830). Não pode ofertar bens segundo apenas as suas conveniências, repiso.
TRIBUTÁRIO. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CAUÇÃO. EQUIPARAÇÃO À PENHORA. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA. CADIN.
Havendo débito definitivamente constituído contra o contribuinte e ainda não ajuizado
, é-lhe assegurado o direito de oferecer caução, antecipando a futura penhora, de forma a obter certidão positiva de débitos com efeito de negativa. O oferecimento de caução em medida cautelar equipara-se à penhora consolidada em execução fiscal. (TRF4, AC 2009.72.06.000784-7, Segunda Turma, Relatora Luciane Amaral Corrêa Münch, D.E. 24/02/2010)
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CAUTELAR. CAUÇÃO. ART. 206 DO CTN. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITO DE NEGATIVA. POSSIBILIDADE.1. É lícito ao contribuinte oferecer, antes do ajuizamento da execução fiscal, caução no valor do débito inscrito em dívida ativa com o objetivo de, antecipando a penhora que garantiria o processo de execução, obter certidão positiva com efeitos de negativa. Precedentes. 2.
Entendimento diverso do perfilhado pelo Tribunal de origem levaria à distorção inaceitável: o contribuinte que contra si já tivesse ajuizada execução fiscal, garantida por penhora, teria direito à certidão positiva com efeitos de negativa; já quanto àquele que, embora igualmente solvente, o Fisco ainda não houvesse proposto a execução, o direito à indigitada certidão seria negado
. 3. Embargos de divergência providos. (EREsp 779121/SC, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/03/2007, DJ 07/05/2007 p. 271)
Cuidando-se de seguro-garantia de débitos já inscritos em dívida ativa, deve-se atentar ainda para a Portaria 1.153/2009, da Fazenda Nacional (art. 2º). Por outro lado, a referida antecipação da penhora não surte todos os efeitos do art. 151, CTN, conforme os Tribunais têm deliberado:
"(...)
Consolidada a jurisprudência no sentido de que fiança bancária não suspende a exigibilidade fiscal, não se confundindo com o depósito integral do crédito tributário, nos termos do artigo 151, III, CTN, e Súmula 112/STJ, embora possa servir como garantia, em antecipação de penhora, para a emissão de certidão de regularidade fiscal, conforme artigo 206, CTN, e Súmula 38/TFR
." (AI 00106474420144030000, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/12/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
"(...) Quanto ao pleito de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, cujas hipóteses estão previstas no art. 151 do CTN, cabe destacar que a prestação de caução com o oferecimento de fiança bancária não se afigura apta para justificar o pedido,
já que somente garante o débito em execução, em equiparação ou prévia da efetiva penhora, para o fim específico da viabilização da expedição de certidão de regularidade fiscal, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.º 1.156.668
, representativo da controvérsia. Ademais, como assinala a própria agravante, o sistema da RFB não considerou os alegados pagamentos efetuados e a manifestação de desconformidade apresentada na seara administrativa não foi aceita por intempestividade.- Agravo de instrumento a que se dá provimento." (AI 00262465720134030000, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/11/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
"(...) 2.
Não há necessidade, para os fins de expedição de certidão positiva de débito com efeito de negativa que a caução seja em dinheiro, porque não se trata de suspensão da exigibilidade do débito, mas de antecipação de penhora para garantia do débito, nos termos do artigo 206 do CTN - Código Tributário Nacional
. 3. No caso concreto, a execução já teve início, mas o trâmite processual necessário para a formalização da penhora é o motivo para o ajuizamento da medida cautelar no Juízo a quo, a fim de obter desde logo a certidão positiva de débito com efeito de negativa. (...)" (AI 00254299020134030000, JUIZ CONVOCADO MÁRCIO MESQUITA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/02/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Note-se ainda que o Código de Processo Civil dispôs sobre a antecipação de tutela - art. 300, CPC -, facultando que a medida seja condicionada à apresentação de contracautelas pelo interessado, sempre que isso se apresente como medida necessária (art. 300, §1º, CPC), até por conta da responsabilização prevista no art. 302, CPC/15 e lógica da súmula 405, CPC. A antecipação de efeitos irreversíveis se revela vedada, como regra, por conta do art. 300, §3º, CPC.
2.41. Apresentação de
apólice
de seguro:
No âmbito das execuções fiscais, o art. 9.º, II, da Lei 6.830/1980 assegurou aos executados a apresentação de fiança bancária, enquanto que o art. 73 da lei n. 13.043/2014 tratou do "seguro garantia".
Segundo Araken de Assis,
"
À primeira vista, o dispositivo referido exclui a possibilidade de caução real, sem embargo das semelhanças desta espécie de garantia com o oferecimento de bens por terceiro (retro, 519). Inspirou-se a regra na solvabilidade das instituições financeiras
. Presume-se que, intimadas, incontinenti honrem a fiança, e as seguradoras a garantia, remindo a execução (art. 19, II, da Lei 6.830/1980). E, com efeito, esse é o procedimento constatado na prática. Fundamenta-se a regra , outrossim, no eventual interesse do executado em utilizar seu crédito bancário, livrando seus bens da imobilidade econômica inerente à penhora. Por isso, o STJ estimou possível a substituição da penhora de dinheiro por fiança bancária. Nada obstante, à caução fidejussória se afiguram estranhos os principais traços do ato executivo, e, conseguintemente, convém ler com reservas a artificial "equiparação" com a penhora, estabelecida pelo art. 9.º, § 3.º, da Lei 6.830/1980. Relativamente aos efeitos da penhora, o único objetivo discernível na fiança e no seguro é o de assegurar eventuais embargos, exigência que continua na execução fiscal, a teor do art. 16, I a III, da Lei 6.830/1980. Essa modalidade de fiança possui condições gerais predispostas pelo Conselho Monetário Nacional (art. 9.º, § 5.º, da Lei 6.830/1980), cabendo ao juízo da execução, no entanto, avaliar sua suficiência.."
(ASSIS, Araken.
Manual de execução.
São Paulo: RT. 2016. item 520.1)
Note-se ainda que a fiança deve ser prestada por terceiro, como já decidiu o STJ, repelindo a pretensão da empresa de banco de garantir a si mesma (2.ª T. do STJ, REsp. 283.648-SP, 26.03.2002, Rel. Min. Franciulli Netto, RJSTJ 163/212).
"
A fiança bancária é muito onerosa para o executado. É comum que se pretenda substituí-la, a certa altura, por outro bem. O juiz deverá sopesar os interesses em conflito e, se for o caso, deferir a substituição. Nessa linha, o STJ admitiu a substituição da fiança pelo percebimento futuro de dividendos
."
(ASSIS, Araken.
Obra citada.
item 520.2) Nesse sentido, confira-se: 2.ª T. do STJ, REsp. 1.163.553-RJ, 03.05.2011, Rel. Min. Herman BenjaMin. DJE 25.05.2011.
No âmbito de execuções fiscais, o depósito, a fiança e o seguro são irretratáveis. Nos termos do art. 9.º, § 2.º, da Lei 6.830/1980, devem ser comprovados por escrito, com anexação do documento aos autos. As providências concernentes à realização do depósito e à obtenção da fiança e do seguro, bem como sua comprovação nos autos do processo executivo, subordinam-se ao prazo usual de 5 (cinco) dias, contados da citação (art. 8.º, Lei de execuções fiscais - lei 6.830/1980).
Quando em causa a execução para pagamento de quantia certa, o art. 835, §2º, CPC/15 preconiza:
"
Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento
."
Também quanto ao tema, vale a pena atentar para a lição de Araken de Assis, como transcrevo abaixo:
"O art. 848, parágrafo único, autoriza a substituição da penhora por fiança bancária, à semelhança do art. 9.º, II, da Lei 6.830/1980.
O executado vale-se do seu crédito bancário e almeja livrar seus bens da imobilidade econômica (relativa) provocada pela penhora. Por óbvio, os efeitos da fiança não se equiparam aos da constrição patrimonial, porque se trata de negócio jurídico; porém, "segura" satisfatoriamente a execução
. O executado deverá juntar prova da fiança ao requerer a substituição no prazo hábil (art. 847, caput), porque o art. 848, parágrafo único, aplica-se só à iniciativa do executado.
O exequente não tem interesse na medida
.
Ao juiz caberá avaliar a suficiência da garantia, a idoneidade do garante - apesar da presunção de solvabilidade, há instituições financeiras que passam por dificuldades em alguns períodos -, investigando as cláusulas contratuais, após o debate das partes
(art. 853).
Em princípio, os requisitos da fiança hábil são os seguintes
: (a) o valor da fiança há de
exceder o valor do crédito (principal e acessórios, atentando para o possível aumento do valor dos honorários inicialmente fixados, a teor do art. 827, § 2.º) em trinta por cento
, conforme a letra expressa do art. 848, parágrafo único; (b) a
fiança há de vigorar por prazo indeterminado
,
admitindo-se cláusula fixando a extinção da execução como termo final da garantia
; (c) o pagamento há de ser feito em vinte e quatro horas após o recebimento da ordem do juiz; (d) o
valor da fiança, já superior em trinta por cento ao valor da execução, contemplará os eventuais reajustes monetários da dívida em execução pelo respectivo índice
(v.g., no caso da execução fiscal, a variação da taxa SELIC).
A jurisprudência do STJ, na execução fiscal, manifesta hostilidade à substituição da penhora de dinheiro por fiança bancária, o que promoveria "retrocesso na atividade executiva, impulsionando-a em sentido inverso da sua natural finalidade: a entrega do dinheiro ao exequente
". Em outro julgado, o STJ decidiu que, penhorado dinheiro, "
não cabe a sua substituição por fiança bancária de prazo determinado para após o trânsito em julgado, de complexa e incerta realização tendo em vista o princípio da satisfação do credor
".
Fixou-se o entendimento, na execução fiscal, no sentido de não se equivalerem dinheiro e fiança, admitindo-se a substituição daquele por esta em casos excepcionais
.
Linha seguida, de resto, na execução comum. Substancialmente correta, a tese da fungibilidade restrita entre dinheiro e fiança exige temperamentos. Na verdade, a fiança passada por empresa de banco, correspondente ao quod plerumque fit, constitui garantia é tão idônea e prestante quanto o depósito do dinheiro penhorado na conta corrente vinculada ao juízo
(art. 840, I).
Não há notícia de processo em que a garantia não seja honrada imediatamente
.
Na realidade, o problema é outro: a falta de atenção e controle pelo órgão judiciário quanto ao valor e ao termo final da garantia
.
Esse problema fica superado pela fixação de termo impróprio à fiança
. É preciso considerar, portanto, as características da fiança, antes de rejeitá-la de modo peremptório, e ponderar a necessidade do numerário imobilizado na conta do juízo pelo executado. E, sobretudo, não olvidar o custo da fiança bancária.
Ela é muito, muito dispendiosa e o executado paga-a antecipadamente. Por isso, o art. 835, § 2.º, dispõe em sentido contrária ao entendimento prevalecente no STJ, equiparando, para fins de substituição da penhora, a fiança bancária e o seguro garantia judicial, em valor não inferior ao débito constante da inicial, mais trinta por cento. Essa disposição se situaria melhor no art. 847. Seja como for, contraria os julgados citados, restando verificar a reação do STJ à mudança.
As considerações feitas no item precedente aplicam-se, com o clássico grão de sal, ao "seguro garantia judicial" (art. 848, parágrafo único), também previsto no art. 9.º, II, da Lei 6.830/1980, invertendo o intercâmbio legislativo. Tem o juiz a atribuição de avaliar a prova da garantia produzida pelo devedor juntamente com o requerimento. Sobreleva-se, neste item, a idoneidade do garante
." (ASSIS, Araken.
Obra citada.
item 5.2.316. 5.1).
Acrescento que,
"
Requerida a substituição, impõe-se ouvir a outra parte, no prazo de três dias, conforme dispõe o art. 853, caput, e, partindo a iniciativa do executado, o art. 847, § 4.º.A necessidade de contraditório avulta na possibilidade de o exequente impugnar a postulação do executado, funcionando o art. 848, I a VI, como espelho ao art. 847;451 porém, também interessa colher a manifestação do executado, pautada pela abstenção de "qualquer atitude que dificulte ou embarace a realização da penhora" (art. 847, § 2.º), sob pena da sanção prevista no art. 774, parágrafo único
."
(ASSIS, Araken.
Obra citada.
item 7.316. 7).
Intimada a contraparte da pretensão à substituição, eclodem duas hipóteses: (a) aceitação da troca, tácita ou implicitamente, caso em que reduzir-se-á, incontinenti, a penhora a termo (art. 849), guarnecido dos elementos do art. 838, CPC; (b) impugnação fundamentada substituição, controvertendo o fundamento alegado pela parte exequente. Segundo dispõe o art. 853, parágrafo único, CPC/15, o juiz decidirá de plano a impugnação. Cuida-se, portanto, de juízo sumário, sem exigência de dilações probatórias complexas. Temas probatórios, às vezes, surgem através da impugnação. O ônus é de quem alega. À parte que alegar incumbirá provar, a título de exemplo, a existência de bens no local da execução (art. 848, III) ou de bens livres e desembargados (art. 848, IV) documentalmente. Deve comprovar, ademais, a possibilidade de penhora em classe superior de bens (art. 835, I a XIII). O juiz pode determinar o comparecimento das partes (art. 772, I, CPC), quando necessário.
Além disso,
"Segundo o art. 849, deferida a substituição, haja ou não oposição da outra parte, lavrar-se-á termo de penhora. Desaparece, portanto, a constrição inicial. Torna-se sem efeito o auto de penhora lavrado pelo oficial de justiça. Não há, porém, outra intimação da penhora. A intimação da penhora enseja, justamente, o controle desta (art. 847, caput). É necessário designar depositário. Em princípio, concordando o exequente (art. 840, § 2.º), pode ser investido o executado no encargo. É imprescindível a manifestação de vontade do depositário (Súmula do STJ, n.º 304).Rejeitada a substituição requerida, porque o juiz se convence do acerto da impugnação da parte contrária, o prosseguimento da execução dependerá da atribuição, ou não, de efeito suspensivo aos embargos, na forma do art. 919, § 1.º. É digo de nota que tal efeito não obsta a adequação ulterior da penhora, por outro motivo (art. 919, § 5.º)."
(ASSIS, Araken.
Obra citada.
item 8.316.8).
Em alguma medida, aludida substituição é projeção do princípio da menor onerosidade da execução, previsto no art. 805, CPC/15:
"
Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado
. Parágrafo único. Ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados."
Aludido princípio, verbalizado no art. 805, CPC/15, é projeção do postulado da proporcionalidade, na medida em que não pode impor ao executado um meio mais gravoso do que o necessário para se efetivar o crédito demandado. Contudo, também é fato que o STJ tem enfatizado não haver preponderância, em abstrato, do princípio da menor onerosidade para o devedor sobre o da efetividade da tutela executiva. (AgRg no REsp 1.548.083⁄SP, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 8 - 6 - 2016).
Nesse sentido, entre outros, os seguintes julgados:
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CPC⁄1973. EXECUÇÃO DE DÉBITO CONDOMINIAL. EMBARGOS DE
TERCEIRO. ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE EXECUÇÃO.
DESCABIMENTO. JULGADOS DESTA CORTE. PENHORA.
SUBSTITUIÇÃO DE IMÓVEL RESIDENCIAL POR LOTE SITUADO EM
OUTRO MUNICÍPIO. DESCABIMENTO. PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE
DA EXECUÇÃO. DESINTERESSE DO CREDOR. PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA (ART. 10 DO CPC⁄2015). INAPLICABILIDADE A FATOS INCONTROVERSOS. 1. Controvérsia acerca da pretensão de se substituir a penhora de um imóvel residencial pela penhora de um lote em sede de execução de dívida condominial. 2. Descabimento da alegação de excesso de execução em embargos de terceiro. Julgados desta Corte Superior. . Possibilidade de o credor recusar a substituição da penhora de imóvel residencial localizado na capital por um lote situado em outro município, embora da mesma comarca por não se tratar de bem de maior liquidez ou com precedência na ordem legal das penhoras (art. 655 do CPC⁄1973). 4.
Prevalência do interesse do credor na efetividade da execução, ante o princípio da menor onerosidade ao devedor. Julgados desta Corte Superior
. 5. Inocorrência de surpresa processual na decisão que resolve, com base em fatos incontroversos da demanda, questão julgada pelas instâncias de cognição plena. Inaplicabilidade do art. 10 do CPC⁄2015. 6. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
(AgInt no REsp 1.456.204 ⁄PR, Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO , TERCEIRA TURMA, DJe de 6 ⁄ 11 ⁄ 2017)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DO EXCEDENTE DO BLOQUEIO DE ATIVOS FINANCEIROS À VISTA DA EXISTÊNCIA DE OUTRAS EXECUÇÕES FISCAIS. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL PREDOMINANTE NO STJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83⁄STJ. 1. A Primeira Seção do STJ, ao julgar como recurso repetitivo o REsp 1.337.790⁄PR (Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 7.10.2013), deixou assentado que inexiste preponderância, em abstrato, do princípio da
menor onerosidade para o devedor sobre o da efetividade da tutela
executiva. Exige-se, para a superação da ordem legal prevista no art.
655 do CPC, firme argumentação baseada em elementos do caso concreto. Em princípio, nos termos do art. 9º, III, da Lei 6.830⁄1980,
cumpre ao executado nomear bens à penhora, observada a ordem do artigo 11 do mesmo diploma legal. É dele [do devedor] o ônus de comprovar a imperiosa necessidade de afastar a ordem legal dos bens penhoráveis, e, para que essa providência seja adotada, mostra-se insuficiente a mera invocação genérica do art. 620 do CPC. 2. Conforme a orientação firmada pelo STJ, após o início da vigência da Lei nº 11.382⁄2006 - que alterou o Código de Processo Civil para incluir
os depósitos e aplicações em instituições financeiras como bens
preferenciais na ordem de constrição como se fossem dinheiro em espécie
(artigo 655, I) -, a penhora eletrônica de dinheiro depositado em conta
bancária não configura, por si só, violação do princípio da menor
onerosidade previsto no art.62000 doCPCC, mesmo com a existência de bem
imóvel garantindo a execução (AgRg no Ag 1.221.342⁄SP, 1ª Turma, Rel.
Min. Benedito Gonçalves, DJe de 15.4.2011). O art. 15, II, da Lei
6.830⁄1980 garante ao ente público a faculdade de pleitear, em qualquer
fase do processo, além do reforço, a substituição dos bens penhorados
por outros, independentemente da ordem listada no art. 11 da mesma lei,
o que significa a possibilidade de, a critério da Fazenda Pública,
trocar-se um bem por outro de maior ou menor liquidez (REsp
1.163.553⁄RJ, 2ª Turma, Rel. p⁄acórdão Min. Herman Benjamin, DJe de
25.5.2011). E em conformidade com o § 2º do art. 53 da Lei nº 8.212⁄91,
é razoável admitir que o excesso de penhora verificado num processo
específico não seja liberado, quando o mesmo devedor tenha contra si outras execuções
fiscais
(REsp 1.319.171⁄SC, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 11.9.2012). 3. No presente caso, ao entender pela admissibilidade da substituição da
penhora de outros bens por ativos financeiros bloqueados via Sistema
BacenJud, bem como ao manter o excedente do bloqueio dos ativos
financeiros para fins de substituição das garantias de outras execuções
fiscais, o Tribunal de origem não violou o art. 620 do CPC; muito pelo
contrário, decidiu em conformidade com a orientação jurisprudencial predominante no STJ. Aplica-se a Súmula 83⁄STJ. 4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1.414.778⁄SP, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 4⁄12⁄2013)
No que diz respeito à eventual substituição de bloqueio de ativos por seguro garantia, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu como segue:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DEFINITIVO DE SENTENÇA. PENHORA DE DINHEIRO. SUBSTITUIÇÃO POR SEGURO GARANTIA. ART. 835, § 2º, DO CPC/2015. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ABSOLUTO. ADMISSIBILIDADE EM CIRCUNSTÂNCIAS ESPECIAIS. ONEROSIDADE EXCESSIVA NÃO RECONHECIDA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. AGRAVO INTERNO PROVIDO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. 1.
O princípio da menor onerosidade da execução não é absoluto, devendo ser observado em consonância com o princípio da efetividade da execução, preservando-se o interesse do credor. Precedentes. 2. A substituição da penhora em dinheiro por seguro garantia, admitida na lei processual (CPC/2015, art. 835, § 2º), não constitui direito absoluto do devedor, devendo prevalecer, em princípio, a ordem legal de preferência estabelecida no art. 835 do CPC/2015
(art. 655 do CPC/1973). Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,
a substituição da penhora em dinheiro por fiança bancária ou seguro garantia judicial deve ser admitida apenas em hipóteses excepcionais, a fim de evitar dano grave ao devedor
. 3. No caso, tendo as instâncias ordinárias consignado a inexistência de circunstância que justifique a substituição da penhora em dinheiro já realizada por apólice de seguro garantia, não há que se impor ao credor a pretensão da seguradora executada. 4. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada, negando provimento ao recurso especial. (STJ - AgInt no AREsp: 1281694 SC 2018/0093400-6, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/09/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/09/2019)
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. CONCLUSÃO ESTADUAL NO SENTIDO DO DESCABIMENTO DA SUBSTITUIÇÃO DA PENHORA POR SEGURO-GARANTIA JUDICIAL. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7⁄STJ. CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO DESTA CORTE. SÚMULA 83⁄STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1.
Segundo a jurisprudência do STJ, admite-se a substituição da penhora de dinheiro por seguro-garantia apenas em hipóteses excepcionais, em que seja necessário evitar dano grave ao devedor, sem causar prejuízo ao exequente, situação não demonstrada no caso dos autos.
2. A revisão da conclusão alcançada na origem para acolher a pretensão recursal quanto à onerosidade da execução e presença dos requisitos necessários ao deferimento do seguro- garantia demandaria a incursão no acervo fático-probatório dos autos, providência vedada Súmula 7 do STJ. 3. Agravo interno improvido."
(AgInt no AREsp 1.086.974⁄RS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE , TERCEIRA TURMA, DJe de 22⁄8⁄2019)
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. 1. SUBSTITUIÇÃO DE PENHORA EM DINHEIRO POR SEGURO-GARANTIA. IMPOSSIBILIDADE NO CASO. PRINCÍPIO DA
SATISFAÇÃO DO CREDOR. ÓBICE DA SÚMULA 83⁄STJ. 2. AUSÊNCIA
DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE DO
DEVEDOR. REVISÃO DO JULGADO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INVIABILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA 7⁄STJ. 3. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Substituição de penhora em dinheiro por seguro-garantia judicial.
É assente nesta Corte o entendimento de que," realizada a penhora em
dinheiro, não cabe, em regra, a sua substituição por seguro garantia ou
fiança bancária, por força do princípio da satisfação do credor
"(AgRg no AREsp 730.565/SC, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 19/04/2016, DJe 26/4/2016). 2. Tendo a decisão impugnada decidido em consonância com a jurisprudência desta Casa, incide, na hipótese, o enunciado n. 83 da
Súmula do Superior Tribunal de Justiça, que abrange os recursos especiais interpostos com amparo nas alíneas a e⁄ou c do permissivo constitucional. Precedentes. 3. A convicção formada pelo Tribunal de origem acerca da observância da ordem legal do art. 655 do CPC⁄1973 e do princípio da menor
onerosidade, afastando a substituição pleiteada pela parte recorrente, decorreu dos elementos existentes nos autos, de forma que rever a decisão recorrida importaria necessariamente no reexame de provas. Incidência da Súmula n. 7 do STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento."
(AgRg no AREsp 781.274/SC, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE , TERCEIRA TURMA, DJe de 27/06/2019)
"AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. IRRESIGNAÇÃO DO AGRAVANTE. 1. É possível a decisão monocrática denegatória de seguimento proferida pelo relator nos casos de recurso manifestamente improcedente ou contrário à jurisprudência dominante do Tribunal, do STF ou de Tribunal Superior. Ademais, a interposição de agravo regimental para o colegiado
permite a apreciação de todas as questões suscitadas no reclamo, suprindo eventual violação do artigo 557, caput, do CPC⁄73. 2. Não caracteriza omissão ou falta de fundamentação a adoção de posicionamento contrário ao interesse da parte, nem está o magistrado obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde
que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão, como de fato ocorreu na hipótese dos autos. 3.
A substituição da penhora em dinheiro por seguro garantia somente deve ser admitida em hipóteses excepcionais, quando necessária para evitar onerosidade excessiva ao devedor, e desde que não ocasione prejuízo ao exequente. Inviável, no entanto, rever o acórdão recorrido quanto a essas circunstâncias, quando demande reexame de prova, a atrair o óbice da Súmula 7⁄STJ
. 4. A falta de debate prévio sobre a tese suscitada em sede de recurso especial implica a incidência da Súmula 282/STF. 5. Agravo interno desprovido."
(AgInt no REsp 1.588.575/PR, Rel. Ministro MARCO BUZZI , QUARTA TURMA, DJe de 2/5/2018)
Atente-se para a fundamentação do precedente do STJ, AgInt no
AREsp: 1281694 SC 2018/0093400-6
, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/09/2019:
"(...)
Pois bem. Nos termos do § 1º do art. 835 do CPC, a penhora em dinheiro é prioritária. A substituição do dinheiro por seguro garantia, tal
como possibilita o art. 835, § 2º, do CPC, não é automática. O dispositivo
textua que a penhora"pode"ser substituída por seguro garantia, o que denota que o juiz tem discricionariedade, dentro dos limites das circunstâncias do caso concreto, tal como, aliás, prevê a parte final do referido § 1º do art. 835
.
No caso presente, em que a exequente não aceitou a apólice, entendo que não se pode lhe impor, após 12 anos perseguindo a satisfação do seu direito a seguro, chegada a execução definitiva, nova apólice de seguro para garantir o pagamento, no lugar de dinheiro, que ocupa o primeiro lugar na ordem de preferência estipulada por lei.
É dizer, chega a ser irônico o oferecimento de apólice de seguro em garantia no caso dos autos, em que a parte exequente já tenta obter o valor de apólice de seguro da executada desde 2005.
Ademais, com a devida vênia, o princípio da menor onerosidade não pode significar retirar do credor - este sim demasiadamente onerado pelo tempo -a garantia que lhe é a assegurada por lei para satisfação do seu crédito. Há de se privilegiar o princípio da efetividade, sem que isso implique qualquer prejuízo à defesa da executada, que poderá oferecer a sua impugnação.
Destaco que a executada não se desincumbiu de seu ônus em demonstrar o prejuízo à atividade comercial da empresa, apenas proferiu mera alegação. Assim, inviável ser aceita a mera alegação ao princípio da menor onerosidade da execução (artigo 805 do Código de Processo Civil).
Outrossim, este Juízo entende que eventual penhora on line não ofende o principio da menor onerosidade da execução para a parte executada, diante do grande porte da sociedade empresária Sul America Companhia Nacional de Seguros S⁄A.
Além disso, assiste razão aos exequentes em relação à validade do seguro ofertado. A Apólice de Seguro Garantia possui o fim da vigência datada para 27⁄ 06 ⁄ 2018, outro motivo ensejador de sua não aceitação, haja vista gerar insegurança ao Juízo e, sobretudo, aos titulares do direito. No caso de eventual impugnação e suspensão da execução, há risco de a ação execucional ficar sem garantia, no transcurso do processo.
Destarte, a rejeição do seguro garantia é medida que se impõe e, de modo a corroborar, trago à baila remansosa jurisprudência sobre a não obrigatoriedade em aceitação da apólice de seguro pela parte executada (...)"
Nesse mesmo sentido, a manifestação do eg. Tribunal
a quo,
ao confirmar a decisão de primeiro grau (e-STJ, fls. 618-626).
Nesse contexto, portanto, uma vez verificada pelas instâncias ordinárias a inexistência de circunstância que justifique a substituição da penhora em dinheiro já realizada por apólice de seguro garantia, não há que se impor ao credor a pretensão da seguradora executada. Ante o exposto, dá-se provimento ao presente agravo interno para, reconsiderando a decisão agravada, conhecer do agravo da seguradora para negar provimento ao recurso especial."
Também há julgados, contudo, enfatizando que a substituição da penhora por seguro-garantia seria direito do executado, contanto que preenchidos os requisitos para tanto necessários.
"A aplicação dos dispositivos referidos foi objeto de recentíssima decisão do Superior Tribunal de Justiça que, por maioria de votos, entendeu que "o seguro- garantia judicial produz os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro, seja para fins de garantir o juízo, seja para possibilitar a substituição de outro bem objeto de anterior penhora, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida. Com efeito, restou assim ementado o REsp. nº 1.838.837/SP, julgado na Sessão da 3ª Turma do E. Superior Tribunal de Justiça, em 12/05/2020 e o REsp 1381254/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2019, DJe 28/06/2019."
(STJ - AgInt no REsp: 1934601 RS 2021/0121589-1, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, DJ 13/10/2021)
Por seu turno, o TRF4 tem enfatizado o seguinte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MULTA ADMINISTRATIVA. NATUREZA NÃO TRIBUTÁRIA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. POSSIBILIDADE. DEPÓSITO INTEGRAL EM DINHEIRO. INEXIGIBILIDADE. SEGURO GARANTIA. IDONEIDADE. TUTELA DE URGÊNCIA. POSSIBILIDADE. O art. 835, § 2º, do CPC/2015, para fins de substituição da penhora, equiparou a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento.
É inegável que o seguro garantia ganhou importância, porquanto equilibra o princípio da máxima eficácia da execução para o credor e o princípio da menor onerosidade para o executado, já que no final da ação com trânsito em julgado o valor é convertido em dinheiro, constituindo instrumentos determinantes para a manutenção das atividades de muitas empresas
. (TRF-4 - AG: 50318803820214040000 5031880-38.2021.4.04.0000, Relator: LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, Data de Julgamento: 29/09/2021, QUARTA TURMA)
Ainda segundo o TRF4, "
tanto a fiança bancária quanto o seguro-garantia judicial, naquilo que se refere à garantia do juízo, produzem no mundo jurídico os mesmos efeitos que o dinheiro. Portanto, se trata de modalidade de garantia preferencial, possuindo o condão de assegurar a satisfação do crédito independente de atos de constrição e expropriação
."
(TRF-4 - AG: 50230375020224040000 5023037-50.2022.4.04.0000, Relator: LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, 29/05/2022, PRIMEIRA TURMA)
2.42. Ainda quanto ao seguro-garantia e a súmula 112, STJ:
Anoto que os Tribunais têm enfatizado que, conquanto o seguro fiança possa ser ofertado como medida de inibição de protesto judicial ou mesmo para obtenção de certidões de regularidade fiscal, não teria o condão de ensejar efetiva suspensão da exigibilidade dos alegados tributos.
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. SUBSTITUIÇÃO DE GARANTIA APRESENTADA EM MANDADO DE SEGURANÇA PARA SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO QUESTIONADO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. INVIABILIDADE DA SUBSTITUIÇÃO DO DEPÓSITO EM DINHEIRO POR SEGURO GARANTIA. SÚMULA 112/STJ. FUMAÇA DO BOM DIREITO NÃO EVIDENCIADA. 1. É possível a formulação de medida cautelar atípica diretamente no STJ, considerando o permissivo contido no art. 800, parágrafo único, do CPC/73 (art. 299, parágrafo único, do novo CPC/2015). 2. Ausente, na espécie, o fumus boni iuris, pois, a teor da Súmula 112/STJ,
"O depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro", não sendo possível, em contexto de mandado de segurança, fundar a pretendida substituição nos arts. 9º, II e § 3º e 15, I, da Lei nº 6.830/80, sem que sucumba a própria suspensão da exigibilidade do crédito, de que cuida o art. 151, II, do CTN. 4. Agravo regimental a que se nega provimento
. (STJ - AgRg na MC: 25104 SP 2015/0276509-0, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 17/05/2016, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/05/2016)
"ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO NÃO TRIBUTÁRIO. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. INSCRIÇÃO NO CADIN. POSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO PROVIDOS. I. Nos termos do relatado, trata-se de julgar embargos de declaração opostos pela SUL AMERICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, alegando supostas omissões no Acórdão embargado, no que se refere à possibilidade de apresentação de seguro garantia para suspensão da exigibilidade do crédito de natureza não tributária; inscrição no CADIN; e emissão de certidão positiva com efeitos de negativa. II. A Lei nº 13.043/2014 alterou os Artigos 7º, 15 e 16, todos da Lei nº 6.830/1980, equiparando o seguro garantia judicial à fiança bancária para fins de garantia da execução, além do depósito em dinheiro. E tal orientação foi também adotada no atual CPC/2015, em seu Artigo 835, § 2º que determina que," Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento ". III.
Ocorre, no entanto, que a Primeira Seção do Eg. STJ, em regime de Recurso Repetitivo, decidiu, ao julgar o REsp nº 1.156.668/DF (Tema nº 378, Relator: Min. LUIZ FUX, DJe 10.12.2010), que a fiança bancária não é equiparável ao depósito integral do débito exequendo para fins de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, ante a taxatividade do Artigo 151, CTN e o teor da Súmula nº 112/STJ ("O depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro"). no julgado em questão, adotou-se entendimento no sentido de que"a suspensão da exigibilidade do crédito tributário (que implica óbice à prática de quaisquer atos executivos) encontra-se taxativamente prevista no art. 151 do CTN
, sendo certo que a prestação de caução, mediante o oferecimento de fiança bancária, ainda que no montante integral do valor devido, não ostenta o efeito de suspender a exigibilidade do crédito tributário, mas apenas de garantir o débito exequendo, em equiparação ou antecipação à penhora, com o escopo precípuo de viabilizar a expedição de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa e a oposição de embargos". IV. Assim, embora não seja cabível a suspensão da exigibilidade pretendida, ressalta-se que, estando garantido o débito por seguro fiança, deve-se obstar a inscrição no CADIN, viabilizando a expedição de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa, conforme decidido no REsp nº 1.156.668/DF. V. Embargos de declaração parcialmente providos." (acórdão mencionado no julgado (STJ - REsp: 1926938 RJ 2021/0072498-6, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação: DJ 26/03/2021)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. tributário. TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE. caução. suspensão da exigibilidade do crédito tributário. artigo 151 do ctn. fiança bancária. impossibilidade. cadin. certidão positiva com efeitos de negativa. possibilidade de renovação. 1. A prestação de caução, para garantir dívida tributária constituída em caráter definitivo, assegura ao contribuinte em favor de quem ela é prestada o direito de obter certidão positiva de débitos fiscais, com efeitos de negativa, mas não acarreta a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, a qual somente ocorre nas hipóteses taxativamente previstas no Código Tributário Nacional (artigo 151). 2.
A jurisprudência firmou-se no sentido de acolher a prestação de caução para evitar que, após a constituição definitiva do crédito tributário, a eventual demora no ajuizamento do processo de execução fiscal coloque o devedor em situação mais desfavorável que a do executado cuja dívida tiver sido garantida pela penhora, o qual tem direito à certidão positiva de débitos fiscais, com efeitos de negativa
. 3. A Fazenda Nacional não pode ser impedida de dar andamento à cobrança de créditos tributários definitivamente constituídos, nem podem os órgãos incumbidos do contencioso administrativo-tributário ser impedidos de processar e julgar reclamações, manifestações de inconformidade e recursos que poderão, eventualmente, acarretar a constituição definitiva de créditos tributários de grande valor. 4. Agravo de instrumento provido. (TRF-4 - AG: 50002004020184040000 5000200-40.2018.4.04.0000, Relator: SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Data de Julgamento: 26/03/2018, SEGUNDA TURMA)
Diferendo do que constou na decisão do evento 4, a decisão proferida nos autos 5034362- 37.2023.4.04.7000 apenas determinou a abstenção de protesto e inscrição no CADIN, sendo este o único objeto do feito, não ingressando no mérito sobre cabimento ou não de pagamento de TCFA ou de oferecimento de caução.
2.43. Requisitos do seguro-garantia:
Os requisitos do seguro-garantia estão detalhados na portaria PGFN/MF n. 2.044, de 30 de dezembro de 2024, cujo art. 1. segue:
Art. 1º
O seguro garantia, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, visa garantir o pagamento de débitos inscritos e débitos em vias de serem inscritos em dívida ativa da União ou do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, em execução fiscal ou em negociação administrativa, na forma e nas condições estabelecidas nesta Portaria
. § 1º Esta Portaria se aplica aos casos de
oferta antecipada de seguro garantia
à execução fiscal para a garantia de: I - débitos inscritos em dívida ativa da União e do FGTS; e II -
débitos não inscritos em dívida ativa da União e do FGTS quando houver intenção de discussão judicial pelo tomador do seguro garantia, após o encerramento do contencioso administrativo por julgamento definitivo, ou por renúncia às discussões na esfera administrativa nos termos do art. 38, parágrafo único, da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, observado o disposto no art. 3º, § 2º. § 2º A oferta e a renovação do seguro garantia para execução fiscal devem ser realizada
s: I - na execução fiscal, se os débitos inscritos em dívida ativa estiverem ajuizados; ou II - no REGULARIZE da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, na forma prevista no art. 11 da Portaria PGFN nº 33, de 8 de fevereiro de 2018, no caso de débitos em vias de serem inscritos em dívida ativa ou, quando já inscritos, se ainda não estiverem ajuizados. § 3º Após a aceitação da garantia no âmbito da execução fiscal, o tomador poderá solicitar, no REGULARIZE, a averbação nos sistemas da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, caso não tenha sido realizada após a intimação judicial. § 4º A oferta e a renovação do seguro garantia para negociação administrativa devem ser realizadas pelo REGULARIZE, conforme disposições do ato que regulamentar a negociação, observado o disposto no art. 3º, inciso XI, e art. 11.
Atente-se ainda para o seu art. 3, como transcrevo abaixo:
Art. 3º
A aceitação do seguro garantia de que trata o art. 1º fica condicionada à observância dos seguintes requisitos, que devem estar expressos nas cláusulas da respectiva apólice
: I - a definição do objeto do seguro; II -
o valor da garantia, observado que: a) no seguro garantia para execução fiscal deverá corresponder: 1. ao total do débito a ser garantido, com os encargos e acréscimos legais, devidamente atualizado até a data da emissão da apólice; ou 2. ao total do débito a ser garantido, com os encargos e acréscimos legais, acrescido dos honorários advocatícios, devidamente atualizado até a data da emissão da apólice, no caso dos créditos previdenciários inscritos antes da Lei nº 11.457, de 16 de março de 2007, e dos créditos rurais, sobre os quais não incide o encargo legal do art. 1º do Decreto Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969
; b) no seguro garantia para negociação administrativa, deverá corresponder ao total do débito consolidado a ser garantido, com os encargos e acréscimos legais, devidamente atualizado até a data da emissão da apólice, sem considerar para esse fim eventuais descontos legais previstos na negociação. III -
a previsão de atualização automática do valor da garantia pelos índices legais aplicáveis aos débitos inscritos em dívida ativa da União ou do FGTS, sem exigência de manifestação expressa do segurado ou do tomador
; IV -
a manutenção da vigência do seguro, mesmo quando o tomador não houver pago o prêmio nas datas convencionadas, com base no art. 16, § 1º, da Circular Susep nº 662, de 11 de abril de 2022, e em renúncia aos termos do art. 763 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, do art. 12 do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, e do art. 20 da Lei nº 15.040, de 9 de dezembro de 2024
; V -
a referência ao número da inscrição em dívida ativa da União ou do FGTS, ou do processo judicial, ou do processo administrativo fiscal ou de negociação administrativa, que identifique de forma inequívoca o objeto de garantia
; VI -
o prazo de vigência da apólice, que será: a) de no mínimo cinco anos no seguro garantia para execução fiscal, devendo a seguradora garantir a manutenção da cobertura enquanto houver risco a ser coberto, independentemente de solicitação do tomador, mediante renovações sucessivas da apólice que devem manter todas as cláusulas originais, com alterações limitadas à atualização do valor da garantia e ao prazo de vigência, sem prejuízo de eventuais alterações nas condições comerciais restritas à relação entre a seguradora e o tomador; ou b) igual ao prazo de duração da negociação no seguro garantia para negociação administrativa, podendo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional aceitar apólices com prazo de vigência inferior, desde que observado o disposto na alínea "a"
. VII - o estabelecimento das hipóteses caracterizadoras do sinistro, nos termos do art. 12; VIII - o endereço da seguradora; IX - a eleição do foro da Seção Judiciária ou da Subseção Judiciária da Justiça Federal com jurisdição sobre a unidade da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional competente para a cobrança do débito inscrito em dívida ativa, para dirimir questões entre o segurado e a seguradora, sendo inaplicável a cláusula compromissória de arbitragem; X - no caso de cosseguro, a previsão sobre: a) a seguradora líder e suas atribuições; b) a inexistência de responsabilidade solidária entre as seguradoras, salvo previsão em sentido diverso no contrato de cosseguro; e c) o nome e o Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ de todas as sociedades seguradoras participantes, e os respectivos limites de responsabilidade máxima assumida, no frontispício da apólice e por extenso. XI - a previsão de que permanecerá vigente a apólice do seguro garantia para execução fiscal, ainda que o tomador solicite negociação administrativa dos débitos ajuizados, enquanto não apresentada e aceita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a nova garantia em substituição à anterior; XII - em relação aos débitos inscritos em dívida ativa do FGTS: a) o seguro garantia para execução fiscal poderá englobar as contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001, e as contribuições previstas nos arts. 15 e 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990; b) o seguro garantia para negociação administrativa poderá englobar apenas as contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001, não se aplicando às contribuições previstas nos arts. 15 e 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990; c) aplica-se o índice de juros e a atualização monetária previstos no art. 22 da Lei nº 8.036, de 11 de maio 1990; d) aplica-se o encargo legal previsto no art. 2º, § 4º, da Lei nº 8.844, de 20 de janeiro de 1994, para as contribuições previstas nos arts. 15 e 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, e o encargo legal previsto no Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, para as contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001; e e) as apólices de seguro garantia deverão prever como segurado o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, representado no ato pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. XIII - a vedação de cláusula que estabeleça franquias, participações obrigatórias do segurado e prazo de carência. § 1º O seguro garantia deverá ser prestado por seguradora idônea e autorizada a funcionar no Brasil, nos termos da legislação. § 2º No caso de apólice ofertada antecipadamente à execução fiscal, o valor do seguro garantia deverá corresponder ao total do débito a ser garantido, com os acréscimos previstos no art. 3º, inciso II, alínea "a", inclusive o encargo legal exigível quando do ajuizamento da execução fiscal, previsto no art. 1º do Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, devidamente atualizado na data da emissão da apólice. § 3º Não se aplica o acréscimo de 30% (trinta por cento) ao valor garantido, constante dos arts. 835, § 2º, e 848, parágrafo único, da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 - Código de Processo Civil. § 4º Atos exclusivos do tomador, da seguradora ou de ambos não poderão gerar perdas ou prejuízo ao segurado. § 5º A apólice somente poderá ser alterada mediante pedido do segurado ou com sua expressa concordância. § 6º A seguradora deverá garantir que os procedimentos e a efetivação da manutenção da cobertura e da renovação da apólice ocorram antes do término do prazo de vigência da apólice. § 7º A seguradora somente poderá se manifestar pela não renovação do seguro garantia se não houver mais risco a ser coberto pela apólice ou se houver a substituição da apólice por nova garantia aceita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. § 8º O tomador não poderá se opor à manutenção da cobertura, exceto se ocorrer a substituição da apólice por nova garantia aceita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. § 9º Antes do término do prazo de vigência da apólice, e sob pena de caracterização de sinistro, deverá ser apresentada à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional: I - a renovação da apólice de seguro garantia, respeitados os termos do art. 3º, inciso VI e art. 6º, § 1º, pelo tomador ou pela seguradora; ou II - nova garantia, pelo tomador, considerada suficiente e idônea pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
O art. 4. da Portaria preconizou que
"Poderão ser objeto de cosseguro tanto as apólices de seguro garantia para execução fiscal quanto para negociação administrativa. Parágrafo único. Não é permitida operação de cosseguro com participação de seguradora sem assunção de responsabilidade."
Segundo o seu art. 5,
"As apólices de seguro garantia deverão seguir os modelos de apólice padrão definidos nos Anexos I e II.§ 1º As condições contratuais restritas à relação entre a seguradora e o tomador, cujo teor não poderá prejudicar os direitos do segurado, nem modificar as cláusulas dos Anexos I e II, deverão estar previstas em contrato apartado e dispensam a aceitação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.§ 2º Prevalecerá o disposto nesta Portaria e nos modelos dos Anexos I e II em caso de conflito com as condições contratuais descritas no § 1º.§ 3º O disposto nesta Portaria e nos modelos dos Anexos I e II não exclui a obrigatoriedade de observância de outros atos normativos editados pelos órgãos reguladores e fiscalizadores de seguros privados."
Nos termos do art. 6. da Portaria,
"
O tomador deverá apresentar os seguintes documentos no oferecimento e na renovação da garantia: I - apólice do seguro garantia; II - comprovação de registro da apólice junto à Superintendência de Seguros Privados - Susep; e III - certidões emitidas pela Susep que atestem a situação da seguradora
. § 1º A idoneidade e a autorização a que se referem o art. 3º, § 1º, serão aferidas pela apresentação de certidões emitidas pela Susep, que atestem a capacidade da seguradora e eventuais cosseguradoras para ofertarem o seguro garantia, ressalvada a situação prevista no art. 14, § 5º. § 2º O registro da apólice e a validade das certidões que atestem a situação da seguradora deverão ser conferidos no sítio eletrônico da Susep. § 3º A ocorrência dos apontamentos previstos no art. 5º, incisos I, II, XI, XII e XIII, da Circular Susep nº 691, de 24 de julho de 2023, impedem a aceitação e a renovação do seguro garantia, enquanto não regularizadas as situações identificadas, sem prejuízo da avaliação das demais circunstâncias constantes das certidões que atestem a situação da seguradora. § 4º A ocorrência dos apontamentos previstos no art. 5º, incisos I e II, da Circular Susep nº 691, de 24 de julho de 2023, não impedem a renovação do seguro garantia quando existente Plano de Regularização de Solvência - PRS ou Plano de Regularização de Suficiência de Cobertura - PRC em andamento, respectivamente. § 5º Caso verificada a ocorrência dos apontamentos descritos no § 3º após a aceitação do seguro, o tomador deverá providenciar perante a seguradora a regularização das situações que impedem a renovação do seguro garantia, ou apresentar nova garantia, suficiente e idônea. § 6º A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional poderá notificar a seguradora e o tomador para regularizar as situações que impedem a renovação do seguro garantia ou para apresentar nova garantia, na hipótese do § 5º. § 7º A Procuradoria-Geral Adjunta da Dívida Ativa da União e do FGTS da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional poderá expedir orientações sobre a avaliação das circunstâncias constantes das certidões emitidas pela Susep que atestem a situação da seguradora. § 8º A regularização das situações que impedem a renovação do seguro garantia, ou a apresentação de nova garantia, suficiente e idônea, devem ocorrer antes do término do prazo de vigência da apólice do seguro garantia, sob pena de caracterização do sinistro - art. 12, inciso III."
A Portaria também versou sobre as hipóteses caracterizadoras do sinistro (art. 12), dentre outros tópicos.
2.44. Certidões de regularidade
fiscal:
A Constituição da República preconiza, no seu art. 5º. XXXIV, que
"
são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: (...) b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal
."
No que toca à obtenção de certidões de regularidade fiscal, deve-se atentar, ademais, para o art. 205, CTN: "
A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feita por certidão negativa, expedida à vista de requerimento do interessado, que contenha todas as informações necessárias à identificação de sua pessoa, domicílio fiscal e ramo de negócio ou atividade e indique o período a que se refere o pedido
. Parágrafo único. A certidão negativa será sempre expedida nos termos em que tenha sido requerida e será fornecida dentro de 10 (dez) dias da data da entrada do requerimento na repartição."
Cumpre ter em conta, de partida, que, no âmbito federal, as certidões mais destacadas são a (a) certidão negativa de débitos - INSS; (b) certidão negativa de débitos expedida pela Receita Federal e (c) certidão negativa de inscrição em dívida ativa. Desde a publicação da portaria conjunta PGFN/SRF n º 3, de 22 de novembro de 2005 - emitida pela Procuradoria da Fazenda e pela Receita Federal -, tem sido emitida uma certidão única, na forma do seu art. 2º: "
A Certidão Conjunta Negativa de Débitos relativos a Tributos Federais e à Dívida Ativa da União será emitida quando não existirem pendências em nome do sujeito passivo: I - perante a SRF, relativas a débitos, a dados cadastrais e à apresentação de declarações; e II - perante a PGFN, relativas a inscrições em cobrança."
Referidos atestados são exigidos para a contratação com o Poder Público e para obtenção de benefícios e incentivos fiscais (art. 195, §3º, CF/88; art. 27, V e art. 29, III, lei 8666/93 etc). O fato é que, como regra, aludidas certidões de regularidade fiscal apenas podem ser negadas quando promovido o pertinente lançamento fiscal:
"
Só o crédito constituído pelo lançamento permite certificar a existência de débito. Falha de contribuições. Contribuições em aberto. Insuficiência. Não basta eventual presunção do Fisco de que o contribuinte não tenha cumprido suas obrigações tributárias. Não é suficiente, e.g., que deixe de constar do sistema de controle de arrecadação ingressos a título de determinada contribuição mensal. É preciso que o Fisco constitua o crédito pelo lançamento (art. 142), estabelecendo, com isso, sua certeza e liquidez
." (PAULSEN, Leandro.
Direito tributário:
Constituição e Código Tributário à luza da doutrina e da jurisprudência. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 1274).
Nos casos de tributos submetidos a lançamento por homologação - ou seja, tributos a cujo respeito o próprio contribuinte deve calcular o
quantum debeatur
e adimpli-los sem uma prévia conferência do Fisco -, como regra, as certidões de regularidade apenas podem ser recusadas pelo Estado depois de promovido o lançamento de revisão, previsto no art. 150, §4º, CTN.
RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSS. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
O contribuinte tem direito à certidão negativa de débito quando a recusa de seu fornecimento está fundada na ausência do procedimento administrativo concernente à homologação do tributo. Se é por meio do lançamento que o crédito tributário é constituído, sem ele não há cogitar de débito, afigurando-se, por isso mesmo, ilegal e abusiva a recusa da autoridade administrativa em expedir a certidão negativa de débito, uma vez que, antes do lançamento, existe tão-somente uma obrigação fiscal, despida de exigibilidade
. Precedentes da Primeira e Segunda Turmas e da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça. Não houve o necessário prequestionamento no que pertine aos dispositivos legais tidos como contrariados, que não foram enfrentados pelo v. acórdão guerreado, pelo que se impõe, igualmente, o não conhecimento do recurso especial pela ausência do prequestionamento explícito dos dispositivos de lei federal tidos por objurgados (Súmula n. 282 do Supremo Tribunal Federal), entendido como o necessário e indispensável exame da questão pela decisão atacada. Recurso especial não conhecido. Decisão por unanimidade. ..EMEN: (RESP 199900466560, FRANCIULLI NETTO, STJ - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:22/04/2002 PG:00185 ..DTPB:.)
Anote-se, todavia, que - nas situações em que o contribuinte apresenta DCTF (declaração de compensação de tributos federais)-, há julgados enfatizando que o requisito do lançamento seria suprido. Esse também é o entendimento de Leandro Paulsen, quando diz que "
suprem o lançamento, entretanto, a apresentação de DCTF ou outra qualquer confissão de dívida
."
(PAULSEN, Leandro. Direito tributário, p. 1274).
Compartilho, todavia, do entendimento de que, mesmo nesses casos - ou seja, de apresentação de DCTF -, a certidão negativa apenas poderá ser negada pelo Fisco caso tenha havido o pertinente lançamento de revisão, evidenciando falha/incorreção na declaração de compensação promovida pelo próprio contribuinte.
TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. COMPENSAÇÃO DECLARADA EM DCTF. NECESSIDADE DE LANÇAMENTO. 1. Nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, o pagamento feito pelo contribuinte extingue a obrigação, sob condição resolutória da ulterior verificação pela autoridade administrativa (art. 150, § 1º, do CTN). 2.
O fato de a compensação ter sido declarada em DCTF não exime o Fisco da instauração de prévio procedimento administrativo a fim de verificar a existência de irregularidades e lançar a obrigação, constituindo o crédito tributário. Não se trata, in casu, de tributo confessado e impago - fato que autorizaria a inscrição em dívida pelo valor declarado, dispensando o lançamento -, mas de declaração de quitação dos débitos mediante compensação, que se presume válida
. (TRF 4ª Região, AMS nº 2003.70.00.010127-0/PR, 1ª Turma, Rel. Maria Lúcia Luz Leiria, dec. unânime em 31.03.2004, Publ. DJU em 12.05.2004, p. 415)
A certidão poderá ser recusada, todavia, quando o próprio contribuinte tenha promovido declaração de valores (por exemplo, em GFIP - guia de recolhimento do FGTS e informações à Previdência Social), sem que os tenha recolhido integralmente. Nesse caso, não se tratará de impugnar declarações do administrado (o que demandaria o lançamento de revisão - art. 150, §4º, CTN), mas da simples constatação de que o contribuinte não teria recolhido sequer os valores que ele próprio reconhecera dever.
TRIBUTÁRIO. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS. DIVERGÊNCIAS ENTRE O VALOR DECLARADO E O RECOLHIDO. 1. A constituição definitiva do crédito tributário se dá pelo lançamento, nos moldes do art. 142 do CTN, podendo este ser substituído, nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por homologação, pela entrega de DCTF, GFIP, ou outro documento de confissão de dívida. 2.
Havendo divergências entre os valores declarados e aqueles efetivamente recolhidos pelo sujeito passivo, é incabível a expedição de certidão negativa de débitos, porquanto se trata de circunstância distinta daquela em que o contribuinte paga o montante declarado e o Fisco apura diferenças, hipótese em que é imprescindível o lançamento de ofício
. (AMS 200571000458286, DIRCEU DE ALMEIDA SOARES, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 08/02/2007.)
Outro tema diz respeito à graduação da efetividade da obrigação juridicotributária, a cujo respeito destaco o que segue:
"
Exigibilidade. Surgimento. O crédito tributário, uma vez constituído pelo lançamento, é - por definição - líquido e certo. A exigibilidade surgirá com o inadimplemento no prazo legal
."
(PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência, 6ª ed., Livraria do advogado, p. 1013.)
Ademais,
"O crédito tributário passa por
diferentes momentos de eficácia
: crédito simplesmente constituído (pela ocorrência do fato gerador) torna-se crédito exigível (pelo lançamento notificado ou pela decisão administrativa definitiva) e finalmente, crédito exeqüível (pela inscrição nos livros da dívida ativa), dotado de liquidez e certeza."
(TORRES, Ricardo Lobo.
Curso de direito financeiro e tributário.
14. ed., Renovar, p. 273)
Em princípio, a existência de lançamento, desde que definitivo,
já
basta para que a certidão negativa de débitos fiscais seja recusada (exceção feita ao disposto no art. 3º, §1º, I, da mencionada Portaria Conjunta 03/2005). Como destaquei acima, contanto que haja lançamento de revisão (art. 150, §4º, CTN/66) - e lançamento definitivo -, a certidão de regularidade poderá ser recusada, exceto no curso do prazo do art. 15 do decreto 70.235:
"
A impugnação, formalizada por escrito e instruída com os documentos em que se fundamentar, será apresentada ao órgão preparador no prazo de trinta dias, contados da data em que for feita a intimação da exigência.
"
Art. 3º A Certidão Conjunta Positiva com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Tributos Federais e à Dívida Ativa da União será emitida quando, em relação ao sujeito passivo, constar débito relativo a tributo federal ou a inscrição em Dívida Ativa da União, cuja exigibilidade esteja suspensa na forma do art. 151 da Lei n o 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional (CTN). §1º A certidão de que trata o caput também será emitida quando, em relação ao sujeito passivo, existir débito: I - relativo a tributo federal cujo lançamento se encontre no prazo legal de impugnação, conforme art. 15 do Decreto n o 70.235, de 6 de março de 1972; II - inscrito em Dívida Ativa da União, garantido mediante penhora de bens cuja avaliação seja igual ou superior ao montante do débito atualizado.
O fato de eventualmente não haver inscrição em dívida ativa não enseja, por si, que a certidão de regularidade em causa seja emitida. Em princípio, basta que haja lançamento, nos termos da legislação em vigor
(art. 205, CTN). Cumpre não confundir a exigibilidade do tributo, de um lado, com a exequibilidade do débito respectivo, de outro. Em princípio, todo tributo lançado já é exigível; por sinal, os consectários moratórios retroagem à data do vencimento original. Exequível é apenas o débito inscrito em dívida ativa.
"1. A inscrição em dívida ativa não é requisito para recusa à emissão de certidão negativa de débito, bastando, para tanto, a constituição definitiva do crédito tributário, regra que não se excepciona aos tributos sujeitos ao chamado lançamento por homologação, tal qual se dá na espécie." (RESP 200900581493, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:19/10/2009 ..DTPB:., omiti parte da ementa)
Enquanto estiver sob discussão administrativa o referido lançamento, o contribuinte tem o direito à emissão da certidão positiva com efeitos de negativa (art. 206, CTN), como explicita Hugo de Brito Machado
:
"Outra divergência profunda diz respeito ao momento em se deve considerar exercido o direito de construir o crédito tributário. Segundo as diversas correntes doutrinárias, esse momento seria:
(a) aquele em que o Fisco determinasse o montante a ser pago e intimasse o sujeito passivo para fazê-lo; (b) a decisão, pela procedência da ação fiscal, em primeira instância administrativa; (c) a decisão definitiva em esfera administrativa; (d) a inscrição do crédito tributário como dívida ativa.
Para quem se situa na posição 'a', um simples auto de infração seria o lançamento. Com a sua lavratura estaria exercido o direito de constituir o crédito tributário e, portanto, não se poderia mais cogitar de decadência.
Tal posição nos parece insustentável. O lançamento, como vimos ao estudar a constituição do crédito tributário, é procedimento administrativo integrado em duas fases. A lavratura do auto de infração é o encerramento apenas na primeira fase. Com a impugnação formulada pelo sujeito passivo tem início a fase litigiosa que é a segunda do procedimento administrativo de lançamento.
O Tribunal Federal de Recursos orientou suas decisões no sentido de que o auto de infração é lançamento tributário, e não apenas início do procedimento administrativo de lançamento. Essa posição, todavia, não se concilia com a tese, também adotada por aquele Colendo Tribunal, de que a Administração, quando tiver de fazer um lançamento tributário, há
de assegurar o direito de defesa ao contribuinte. A oportunidade de defesa é obviamente posterior à lavratura do auto de infração. Assim, ou o lançamento não se completa com o auto de infração, ou se se completa, a oportunidade de defesa não é essencial no lançamento.
Para os que se colocam na posição 'b' o auto de infração ainda não seria um lançamento por lhe faltar o pronunciamento de autoridade administrativa com poder decisório, não tendo sido assegurado ao sujeito passivo o direito de defender-se. Assim, com o julgamento da impugnação em primeira instância estaria suprida essa falta, completando-se o lançamento.
Também não nos parece que seja assim. Se a própria administração fazendária ainda admite discutir a exigência, é porque esta não está ainda perfeita, assentada em bases definitivas, o que na verdade só vem a ocorrer com o julgamento último, ou com a não interposição do recurso no prazo legal. A fragilidade da posição 'b' se revela sobretudo nos casos em que a decisão em primeira instância seja contrária à Fazenda Pública e venha a ser reformada, prevalecendo afinal a exigência.
Com efeito, acertada nos parece a posição 'c', pois somente quando a Administração, que é parte no procedimento e é quem efetua o lançamento, não mais admite discuti-lo, pode-se considerar consumado o lançamento.
Consuma-se, pois, o lançamento:
1º) não havendo impugnação, com a homologação do auto de infração;
2º) havendo impugnação e sendo a decisão primeira favorável à Fazenda, se o sujeito passivo não recorrer;
3º) havendo recurso, com a decisão definitiva, favorável à Fazenda.
Em resumo: o lançamento está consumado, e não se pode mais cogitar de decadência, quando a determinação do crédito tributário não possa mais ser discutida na esfera administrativa." (MACHADO, Hugo de Brito.
Curso de Direito Tributário.
5. ed., p. 135/137)
Também nesse sentido, menciono o seguinte julgado do STJ:
"1. Esta Corte, na ocasião do julgamento do REsp 128.524/RS, pacificou entendimento no sentido da impossibilidade de recusa de expedição de Certidão Negativa de Débitos (CND), enquanto não-constituído definitivamente o crédito tributário. 2. Considera-se definitivamente constituído o crédito tributário com o lançamento definitivo. Tratando-se de tributo sujeito a lançamento por homologação, nos termos do art. 150 do CTN, a constituição do crédito tributário dá-se com a declaração do débito pelo contribuinte, por meio de DCTF ou GIA (Precedentes). Por sua vez, em havendo lançamento de ofício, a constituição do crédito tributário ocorre quando o contribuinte é regularmente notificado do lançamento (Precedentes). 3.
Para que o crédito tributário seja definitivamente constituído, em se tratando de tributos lançados diretamente pela autoridade administrativa, o contribuinte deve ser notificado; após, lhe é aberto um prazo para impugnação; havendo a apresentação de recurso administrativo, o lançamento fica sujeito a futuras alterações, cujas ocorrências somente serão verificadas após decisão administrativa, momento em que o lançamento torna-se definitivo e, portanto, em que se constitui o crédito tributário
. 4.
A jurisprudência desta Corte tem consignado que somente quando exaurida a instância administrativa é que se configura a constituição definitiva do crédito fiscal
(REsp 239.106/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 24.4.2000, p. 48; REsp 32.843/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Adhemar Maciel, DJ de 26.10.1998, p. 99; REsp 649.684/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 28.3.2005, p. 211; REsp 173.284/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 31.3.2003, p. 183; REsp 620.283/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 19.9.2005, p. 270; REsp 264.041/AL, 1ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 4.6.2001, p. 63; REsp 195.667/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 26.4.1999, p. 60; AgRg no REsp 641.448/RS, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 1º.2.2005, p. 436). 5. Seguindo essa linha de raciocínio, no sentido de que a constituição definitiva do crédito tributário somente se implementa com a resolução na esfera administrativa das pendências existentes em relação ao lançamento do débito fiscal, e associando essa orientação ao entendimento de que, enquanto não estiver definitivamente constituído o crédito, deve ser deferida a expedição de Certidão Negativa de Débito (CND), infere-se que, no caso dos autos, foi acertada a conclusão do acórdão recorrido, que entendeu devido o fornecimento de certidão negativa de débitos fiscais, porquanto ainda não-constituído definitivamente o crédito tributário, na medida em que não houve encerramento das discussões acerca do lançamento na esfera administrativa. 6. Recurso especial desprovido. ..EMEN:" (RESP 200301682227, DENISE ARRUDA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJ DATA:13/03/2006 PG:00192 ..DTPB:.)
Por conseguinte, quando o contribuinte está discutindo, no âmbito administrativo, a validade do lançamento, a certidão positiva com efeitos de negativa não lhe pode ser recusada (art. 206, CTN).
2.45. Ônus da prova - exame precário:
No presente caso, há uma natural assimetria entre a parte autora e o IBAMA, dado o poderio burocrático da demandada. Isso não implica, porém, por si, a inversão do ônus da prova, prevista no art. 373, §1º, CPC/15. Ao menos, não para fins de antecipação de tutela.
Conquanto a teoria da distribuição dinâmica da prova, acolhida pelo art. 373, CPC/15, tenha seu relevo, cumprindo papel importante no processo, deve ser empregada como circunspeção, como anota Araken de Assis:
"(....)
Essa teoria tem cunho autoritário, porque concentra poderes no órgão judiciário, e, desse modo, traz consigo alto risco de subjetivismo
. Duas objeções principais, relevando o risco de prevaricação e o dever de fidelidade do juiz ao direito, opõem-se à doutrina: (a)
o já mencionado risco de subjetividade e, ademais, de relatividade: o que é fácil para certo juiz pode não o ser para outro
; e (b) a violação positiva ao direito fundamental processual do contraditório. Contra o risco de subjetividade, inexiste remédio; para a violação do contraditório, a medida cabível é a exigência de que haja motivo concreto, prévio e delimitado para a distribuição ope judicis. A distribuição do ônus da prova na decisão de saneamento e de organização do processo (art. 357, III) contrabalança os riscos, norteando a atividade das partes na instrução das causas. Seja como for, as objeções evidenciam que, entre nós, inexiste ainda densidade do direito fundamental à prova. O contraditório argumentativo (dizer e contradizer) não mais satisfaz.
As repercussões positivas ou negativas da repartição casuística podem ser aquilatadas e medidas nas relações de consumo. Em tal matriz, considerando o disposto no art. 6.º, VIII, da Lei 8.078/1990, passa-se à análise do tema, sublinhando que não se limita a tais espécies de litígio, em tese, a distribuição dinâmica." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo II: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 203-209)
Em primeiro exame, incumbe à parte autora o ônus de comprovar a veracidade da narrativa dos fatos, veiculada na peça inicial, o que tomo em conta para fins de avaliação do pedido de antecipação de tutela. RESSALVO nova análise desse tema por época do saneamento da demanda - art. 357, CPC.
2.46. Elementos de convicção - exame precário:
A empresa autora apresentou, com a peça inicial, cópia do instrumento de contrato societário, do que destaco:
Anotou-se que o capital social da requerente seria o seguinte:
O Fisco cobrou da empresa valores a título de TCFA:
Período de abril de 2019 a março de 2024.
Sustentou-se, então, que a requerente atuaria nos seguintes setores da economia nacional:
Ela apresentou cópia do registro junto ao cadastro técnico federal - CTF, emitido em 09 de março de 2020.
Anexou fotos do maquinário da empresa. Esses são os elementos de convicção veiculados no evento1.
2.47. Valoração precária dos elementos apresentados:
Detalhei alguns vetores relevantes para a apreciação do pedido de antecipação de tutela.
Enfatizo que se cuida de exame precário, contingente, suscetível de ser revisto no curso da demanda e na sentença, eis que fundado em cognição
prima facie,
sendo que por época da prolação de sentença todos os elementos veiculados nos autos deverão ser apreciados de modo exaustivo
.
No momento, reitero que a TCFA é tributo. Logo, não se cuida de multa cominada pela eventual prática de ilícito administrativo. Por conta disso, o valor pode ser cobrado pelo Erário mesmo quando a empresa estaja cumprindo suas obrigações para com a manutenção do equilíbrio ambiental. Conforme conceito verbalizado no art. 3 do Código Tributário Nacional, o tributo não se confunde com sanção decorrente da prática de infrações administrativas, civis, penais ou de alguma outra ordem.
Por outro lado, em primeira análise, a incidência da TCFA decorre da atividade econômica efetivamente exercida pela empresa, de modo a suscitar a necessidade de atos de fiscalização pelo IBAMA. Repiso que, ao veicular o art. 17-B na lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, a lei 10.165, de 27 de dezembro de 2000, estipulou
"Fica instituída a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA, cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia conferido ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais."
Aludida norma tem sido reputada válida pelos Tribunais:
APELAÇÃO CIVIL. MATÉRIA PRELIMINAR AFASTADA. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL ARRECADA PELO IBAMA. TAXA DE POLÍCIA . CONSTITUCIONALIDADE. ENQUADRAMENTO DA EMPRESA NO ROL DE ATIVIDADES POTENCIALMENTE POLUIDORAS E UTILIZADORAS DE RECURSOS AMBIENTAIS EM GRAU ALTO. TRIBUTO DEVIDO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA . RECURSOS DESPROVIDOS. 1. Agravo retido da autora desprovido. A primeira perícia foi realizada sem a intimação das partes, em clara violação do contraditório . 2. Matéria preliminar afastada. A sentença não é citra petita por "desconsiderar" os argumentos e provas que, no entender da apelante convalidam a sua tese. No sistema da persuasão racional o Juiz é livre na apreciação das provas, desde que indique os motivos e fundamentos do seu convencimento, justamente como ocorreu no caso dos autos . Caso em que a autora, que "reclama" de sentença claudicante quanto a fundamentação, não se deu ao trabalho de interpor embargos de declaração. 3. A Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA), nos termos do artigo 17-B da Lei nº 6.938/81 (alterada pela Lei nº 10 .165/2000), tem por fato gerador o exercício regular do poder de polícia conferido ao IBAMA para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais. Percebe-se que referido tributo se enquadra no conceito de "taxa de polícia", pois objetiva remunerar o custo da atividade de fiscalização, cuja efetividade é presumida em favor da Administração Pública (COSTA, REGINA HELENA. Curso de Direito Tributário - Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009) . 4.
No âmbito do STF, o entendimento de que a TCFA é constitucional foi firmado no julgamento do RECURSO EXTRAORDINÁRIO nº 416.601/DF, sob a relatoria do Ministro Carlos Velloso, que em seu voto asseverou:...Não há invocar o argumento no sentido de que a taxa decorrente do poder de polícia fica "restrita aos contribuintes cujos estabelecimentos tivessem sido efetivamente visitados pela fiscalização"...Destarte, os que exercem atividade de impacto ambiental tipificadas na lei sujeitam-se à fiscalização do IBAMA, pelo que são contribuintes da taxa decorrente dessa fiscalização, fiscalização que consubstancia, vale repetir, o poder de polícia estatal... Nesse sentido, portanto, é a jurisprudência acerca do tema (STF - AI 860067 AgR, Relatora Ministra ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 10/2/2015, publicado em 5/3/2015; STJ - AgRg no Ag 1419767/MG, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/6/2012, DJe 1/8/2012; TRF 3ª Região - QUARTA TURMA, AC 0016343-07.2008.4.03 .6100, Relatora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA, julgado em 27/11/2014, e-DJF3 15/1/2015; SEXTA TURMA, AC 0011754-21.2003.4.03 .6108, Relator Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, julgado em 27/11/2014, e-DJF3 5/12/2014)
. 5. Verificado que a apelante, dedicada à indústria e comércio de antenas, está inscrita no Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras e Utilizadoras de Recursos Ambientais (CTF/APP) na categoria 3 - INDÚSTRIA METALÚRGICA - fabricação de artefatos de ferro, aço e de metais não-ferrosos com ou sem tratamento de superfície, inclusive galvanoplastia - prevista no anexo VIII da Lei nº 6.938/81 . 6. O potencial de poluição (pp) e o grau de utilização de recursos naturais (gu) da categoria 3 - INDÚSTRIA METALÚRGICA está classificado como ALTO no anexo VIII da Lei nº 6.938/81, ensejando o recolhimento de TCFA. 7 . Diante desse quadro, a conclusão da perícia técnica de que a apelante "não possui potencial poluidor ao meio ambiente", em virtude da destinação ecologicamente correta dos efluentes industriais e dos resíduos sólidos oriundos de suas atividades fabris e administrativas, é insuficiente para afastar a incidência da TCFA. 8. Sentença de improcedência mantida. (TRF-3 - Ap: 00176335720084036100 SP, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, Data de Julgamento: 30/06/2016, SEXTA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/07/2016)
Por outro lado,
em primeiro exame
, a inscrição junto ao cadastro técnico federal
não
é condição necessária para a incidência do tributo. Caso a empresa desempenhe atividades que ensejem a incidência da taxa em questão, a ausência de inscrição junto ao CTF não impedirá a sua exigibilidade, tanto quanto a ausência de apresentação de declaração de imposto de renda não impede a cobrança do tributo pertinente.
Segundo já deliberado pelos Tribunais,
"
Cumpre esclarecer que a obrigação tributária do pagamento da TCFA somente nasce a partir do efetivo exercício de atividade potencialmente poluidora
ou
utilizadora de recursos ambientais
, de modo que ausente tal atividade deixa de existir o fato gerador do tributo, sendo irrelevante a informação constante nos cadastros do IBAMA para determinar o surgimento e o desaparecimento do fato gerador da obrigação tributária."
(TRF-5 - Ap: 08003275520204058205, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL BRUNO LEONARDO CAMARA CARRA (CONVOCADO), Data de Julgamento: 19/10/2021, 4ª TURMA)
Assim, com cognição precária, parece que a questão está em saber se a empresa autora teria desempenhado atividades que a submeteriam ao pagamento da taxa em questão. No caso, ela sustentou que a cobrança da TCFA teria decorrido do fato de que, no passado, ela teria atuado no setor de tinturaria, transferindo aludida atividade para terceirizadas, a partir do início de 2020.
Registro, porém, que, ao que consta, o IBAMA promoveu o lançamento da TCFA por conta das aventadas atividades da autora:
Repiso que no preenchimento do CTF de março de 2020, ela detalhou como sendo suas atividades a fabricação de resinas e fibras, fios artificiais, beneficiamento de fibras têxteis, fabricação de calçados. Aludida atividade consome recursos ambientais, podendo ensejar, em princípio, a incidência do aludido tributo.
Ademais, com cognição precário, reputo que peça inicial não foi instruída com comprovantes de que a empresa não teria exercidio atividade ensejadora da cobrança da TCFA quanto ao período em questão. De partida, quando menos parte do período em causa ensejaria a incidência do tributo, a vingar sua própria narrativa. Ela disse ter deixado de atuar no setor da tinturaria no início de 2020. O lançamento compreende valores pretensamente devidos no curso de 2019. Reitero ainda que o IBAMA parece não ter tomado em conta apenas a questão alusiva à tinturaria.
Ela juntou aos autos fotos de máquinas desligadas. Mas, isso não chega a servir como prova de que, ao tempo reportado pelo IBAMA para fins de lançamento, a empresa estaria realmente desvinculada da aludida atividade. Não fori comprovada a terceirização e a data correspondente. E tampouco foi demonstrado, em primeiro e precário exame - sem prejuízo de nova análise - que a empresa não tenha atuado em setores econômicos ensejadores da incidência da taxa de controle e fiscalização antes aludida.
INDEFIRO, por conta do exposto, o pedido de antecipação de tutela - art. 300, CPC.
III - EM CONCLUSÃO
3.1. DECLARO a competência desta unidade jurisdicional para o caso, na forma do art. 109, I, Constituição e do art. 10 da lei n. 5.010/66.
3.2. INTIME-SE a parte autora para informar e comprovar a sua receita bruta anual, a fim de que o Juízo possa avaliar se a causa há de tramitar sob o rito dos Juizados ou se haverá de ser processada sob o rito comum - art. 6 da lei n. 10.259/2001. Prazo de 15 dias úteis, contados da intimação.
3.3. VOLTEM-ME conclusos oportunamente para extinção da demanda sem solução do mérito, caso aludida emenda não seja promovida no prazo assinalado - art. 321 e art. 485, I, CPC.
3.4. A
NOTO que não diviso conexão desta demanda com alguma execução fiscal porventura em curso. Nâo há notícia de alguma execução fiscal em trâmite versando sobre a cobrança fiscal impugnada neste processo.
3.5. ACRESCENTO que, em primeiro exame, a presente demanda aparenta ser singular, não havendo indicativos de violar coisa julgada (art. 5, XXXVI, Constituição e art. 508, Código de Processo Civil) ou incorrer em litispendência, definida no art. 337, §2, CPC/15.
3.6. EXTINGO a demanda sem solução de mérito no que toca à pretensão endereçada à União Federal, eis que é parte ilegítima para o processo. A cobrança da TCFA é incumbência do IBAMA. Deixo de arbitrar honorários sucumbenciais eis que, mantido o rito dos Juizados, são incabíveis em 1. instância (arts 54 e 55 da lei n. 9.099/1995). Ademais, mesmo que assim não fosse, a requerida não chegou a ser citada nesta demanda.
3.7. REGISTRO que as demais partes estão legitimadas para a demanda e que a autora atua com interesse processual - art. 17, CPC. Não diviso um contexto que imponha a formação de litisconsórcio necessário nesse caso.
3.8. DESTACO que a pretensão deduzida pela empresa autora não foi atingida pela prescrição, na forma do art. 168, CTN. O instituto da decadência se não aplica no que toca ao direito por ela invocado na peça inicial.
3.9. EQUACIONEI acima, com cognição precária, alguns vetores relevantes para a apreciação do pedido de antecipação de tutela formulado pela autora. Tratei da compleição jurídica da TCFA, o entendimento dos tribunais a respeito da sua constitucionalidade, discorri sobre o cadastro técnico federal, sobre a eventual suspensão da exigibilidade de tributos, sobre o oferecimento de caução e os efeitos porventura disso decorrentes.
3.9. DETALHEI os elementos de convicção veiculados no movimento 1, com cognição precária.
3.10. REGISTRO que, para fins de antecipação de tutela, não se revela cabível a inversão do ônus da prova, na forma do art. 373, §1, CPC, de modo que incumbe à parte autora apresentar elementos de convicção densos a respeito da narrativa dos fatos promovida na peça inicial.
3.11. INDEFIRO, no caso em exame, o pedido de antecipação de tutela, conforme registrado acima.
3.12. INTIMEM-SE as partes a respeito desta decisão.
3.13. CITE-SE o IBAMA - tão logo a emenda seja promovida pela parte autora - para, querendo, apresentar resposta ou proposta de acordo em 30 dias úteis, contados na forma dos arts. 219, 224, 231 e 335, CPC. Deverá o demandado, na mesma oportunidade, juntar a documentação de que disponha para o esclarecimento da causa, conforme lógica do art. 438, CPC
3.14. INTIME-SE a parte autora para, querendo, apresentar réplica à contestação, tão logo seja juntada aos autos. Prazo de 15 dias úteis, contados da intimação, conforme arts. 219, 224, 351, CPC e art. 5 da lei n. 11.419/06.
3.15. VOLTEM-ME conclusos, na sequência, para deliberar a respeito do rito a ser empregado no caso, com imposição de retificação da autuação, eis que até o momento a causa tem tramitado como "petição".
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