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Processo nº 1017769-92.2023.8.11.0041

ID: 275129921

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1017769-92.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 21/05/2025

Polo Ativo:

LUIZ CEZAR REINERS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

UBIRAJARA GALVAO DE OLIVEIRA

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RODRIGO PALOMARES MAIOLINO DE MENDONCA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1017769-92.2023.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, INDENIZAÇÃO POR DANO… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1017769-92.2023.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL, EMPRÉSTIMO CONSIGNADO] RELATORA: EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [LUIZ CEZAR REINERS - CPF: 796.866.131-53 (APELANTE), RODRIGO PALOMARES MAIOLINO DE MENDONCA - CPF: 013.946.171-00 (ADVOGADO), UBIRAJARA GALVAO DE OLIVEIRA - CPF: 760.336.198-20 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELADO), SERGIO GONINI BENICIO - CPF: 177.915.568-98 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do Exmo. Sr. Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: “RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, APÓS RELATORA E A 2ª VOGAL ADERIREM AO VOTO 1º VOGAL”. EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. CONFIGURAÇÃO COMO EMPRÉSTIMO. PRÁTICA ABUSIVA. READEQUAÇÃO CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO SIMPLES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedente pedido de declaração de inexistência de débito, nulidade contratual, restituição e indenização por danos morais, fundado na alegação de que o autor acreditava ter contratado empréstimo consignado, mas recebeu cartão de crédito consignado. 2. O juízo entendeu comprovado o conhecimento da contratação pela utilização do cartão. A sentença foi proferida com base no art. 487, I, do CPC. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. Há quatro questões em discussão: (i) saber se a operação realizada configura cartão de crédito consignado ou empréstimo; (ii) saber se houve conduta abusiva e violação ao dever de informação na contratação; (iii) saber se é cabível indenização por danos morais; (iv) saber qual a forma de restituição dos valores pagos a maior e a taxa de juros aplicável. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A operação com depósito via TED e cobrança em fatura de cartão, sob a rubrica de saque, possui natureza de empréstimo, ainda que rotulada como cartão de crédito consignado. 5. A prática fere os princípios da transparência e informação previstos no CDC, ao ocultar as condições do contrato e promover endividamento contínuo, o que caracteriza conduta abusiva. 6. A restituição deve ocorrer de forma simples, conforme o art. 42, parágrafo único, do CDC. 7. A taxa de juros deve observar a média de mercado vigente para empréstimos consignados à época da contratação, conforme precedentes do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. A operação rotulada como cartão de crédito consignado que consiste no depósito de valores com cobrança em fatura mensal configura empréstimo e deve ser tratada como tal. 2. A prática de ocultação contratual e cobrança indevida nesse contexto caracteriza conduta abusiva à luz do CDC. 3. A taxa de juros deve observar a média de mercado vigente para empréstimos consignados à época da contratação”. Dispositivos relevantes citados: CC, art. 170; CDC, arts. 39, incs. III e V, 42, p.u., e 46; CPC, arts. 86 e 98, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1722322/MA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 14.11.2023; STJ, AREsp 1099613/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 05.10.2017; TJMT, Apelação Cível nº 1053654-36.2024.8.11.0041, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 31.03.2025. R E L A T Ó R I O EXMA SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia câmara: Trata-se de Apelação Cível interposta por Luiz Cezar Reiners contra a sentença proferida pelo Juízo da 4.ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá/MT, que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação declaratória de inexistência de débito c/c nulidade contratual, restituição e indenização por danos morais, proposta em face do Banco BMG S.A. Na petição inicial, o autor alegou ter sido induzido a erro ao contratar cartão de crédito consignado acreditando tratar-se de empréstimo consignado convencional, pleiteando a conversão da modalidade contratual, a restituição dos valores pagos, indenização por danos morais, além da revisão dos juros remuneratórios. O juízo a quo indeferiu a tutela provisória, inverteu o ônus da prova e, ao final, julgou improcedente a demanda, sob o fundamento de que restou comprovado o conhecimento do autor acerca da contratação do cartão de crédito, considerando-se a utilização reiterada do produto. Nas razões recursais, o apelante alega falha no dever de informação, erro essencial na contratação, vício de consentimento e prática abusiva, reiterando a tese de que acreditava estar contratando um empréstimo convencional. Sustenta, ainda, a abusividade dos encargos cobrados e requer a declaração de nulidade do contrato, a restituição dos valores descontados e a condenação em danos morais. O apelado apresentou contrarrazões, arguindo, preliminarmente, a inobservância ao princípio da dialeticidade, e no mérito, defende a regularidade da contratação e a improcedência do recurso, destacando a efetiva utilização do cartão pelo autor e a ausência de abusividade. É o relatório. V O T O (PRELIMINAR - PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE) EXMA SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Eminentes Pares: O apelado suscita a preliminar de não conhecimento do recurso por ausência de dialeticidade, afirmando que a peça de agravo não enfrentou os fundamentos da decisão. No entanto, verifico que a argumentação da apelante tem pertinência com o conteúdo decisório impugnado, ao defender a abusividade da conduta do apelado, afastada na origem, não havendo violação ao princípio da dialeticidade. Portanto, rejeito a preliminar. VOTO (MÉRITO) EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara Conheço do recurso. Trata-se de recurso de apelação interposto por João Luiz Ferreira contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação revisional de contrato cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais, na qual alegou erro na contratação de Cartão de Crédito Consignado com o banco apelado. De início, ressalto que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor, conforme Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." Conforme reconhecido em sentença, a hipossuficiência técnica e informacional da parte autora ficou demonstrada, bem como a verossimilhança de suas alegações, impondo-se a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Com base nessa premissa, verifica-se que o autor, policial militar, alegou que foi induzido em erro ao contratar o que acreditava ser um empréstimo consignado em folha de pagamento e que nunca recebeu o cartão de crédito, tampouco o utilizou. Afirma que desconhece efetivamente as informações referentes ao contrato. Contudo, verifica-se que o banco apelado demonstrou que a parte autora, no momento da contratação,tinha plena ciênciado produto financeiro que estava adquirindo. Em documentos anexados pela instituição bancária à contestação, ficou comprovada a contratação mediante assinatura do apelante no termo de adesão para utilização do cartão de crédito e débito BMG (ID 278823947), no qual constam expressamente as condições de pagamento, com desconto do valor mínimo da fatura: Além disso, as faturas acostadas pelo banco, nas quais constam expressamente os encargos incidentes, ficou comprovado que a parte autora realizou diversos saques após a contratação inicial e utilizava o cartão de crédito rotineiramente para compras (IDs 278823949 – págs. 1, 3, 4, 5, etc.). Evidencia-se, portanto, sua plena ciência quanto à modalidade contratada, não havendo fundamento para a conversão do contrato, tampouco para a revisão dos encargos aplicados. Este E. Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de quenão há nulidade contratual quando restar comprovada a ciência do consumidor sobre os termos pactuados: [...] EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES E COMPRAS – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. [...] Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de saques, inviável a aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (N.U 1022833-83.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/02/2025, Publicado no DJE 26/02/2025) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS –CARTÃODECRÉDITOCONSIGNADO– AUSÊNCIA DE VÍCIOS NA CONTRATAÇÃO – UTILIZAÇÃO DOCARTÃOPELO CONSUMIDOR – PRINCÍPIO DA BOA-FÉ – INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Na hipótese de contratação decartão de crédito consignado com utilização efetiva pelo consumidor paracomprasesaques, inexiste fundamento para nulidade contratual ou declaração de inexistência de débito, desde que o negócio tenha sido formalizado de maneira regular e informado. [...] A simples utilização docartãocontratualmente pactuado afasta a presunção de erro ou dolo na contratação, sendo descabida a alegação de indução em erro. Não se configura dano moral quando ausente ato ilícito ou falha na prestação do serviço bancário.” (N.U 1032530-65.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/01/2025, Publicado no DJE 30/01/2025). Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo integralmente a sentença. Majoro os honorários advocatícios fixados na sentença para 12% do valor da causa, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade concedida na origem. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes Pares, Apelação em Ação declaratória de inexistência de débito c/c nulidade contratual, restituição e indenização por danos morais cuja sentença foi proferida nestes termos: “Diante de todo o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento no art. 487, inciso I, do CPC, julgo improcedentes os pedidos formulados na inicial. Por consequência, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa. Sem custas finais.” O apelante afirma que sua intenção era contratar empréstimo consignado, e não cartão de crédito. Diz que ficou configurado o dano moral e pede a restituição em dobro do indébito. Nas contrarrazões o apelado suscita preliminar de ausência de dialeticidade. No mérito, pugna pelo não provimento do Recurso (ID. 278824369). V O T O (PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE RECURSAL) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes Pares, A apelada argui que não foram rechaçados os fundamentos da sentença, em violação ao princípio da dialeticidade recursal. Contudo, a apelante cumpriu o ônus argumentativo ao alegar que o contrato em discussão é irregular. Rejeito a preliminar. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes Pares, Segundo o Banco Central do Brasil, empréstimo “é um contrato entre o cliente e uma instituição financeira (banco, cooperativa de crédito, caixa econômica) pelo qual o cliente recebe uma quantia em dinheiro que deverá ser devolvida em prazo determinado, acrescida dos juros acertados e, na modalidade consignado, o desconto da prestação é feito diretamente na folha de pagamento ou de benefício previdenciário do contratante”. (https://www.bcb.gov.br/pre/pef/port/folder_serie_I_emprestimos_e_financiamentos.pdf e https://www.bcb.gov.br/nor/relcidfin/docs/art7_emprestimo_consignado.pdf) – acesso em 14/06/2020. Já o cartão de crédito consiste em transação financeira que “permite o pagamento de compras ou serviços até o limite do crédito previamente definido no contrato e”, quando consignado, “o valor mínimo da fatura é descontado diretamente da sua folha de pagamento ou benefício do INSS” (https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira/direitosdeveres e https://www.serasa.com.br/ecred/cartao-de-credito-consignado/) - acesso em 14/06/2020. Contudo, há uma terceira modalidade de contrato em que a instituição financeira credita em conta-corrente quantia fixa, mediante TED, e o valor é cobrado na fatura do mês subsequente, em parcela única. A operação é claramente de empréstimo, porém denominada de cartão de crédito consignado. Trata-se de versão híbrida e sem paralelo na legislação brasileira. Por isso, cumpre ao Judiciário analisar minuciosamente se o contrato não fere direitos consumeristas. O Decreto Estadual n. 691/2016 estabelece que no âmbito da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional do Poder Executivo do Estado de Mato Grosso, as consignações facultativas “realizadas pelas instituições financeiras, pelas cooperativas, pelas entidades de previdência privada, pelos serviços sociais autônomos, pelas compras por convênios firmados com sindicatos e associações, pelas seguradoras do ramo de vida, pelas clínicas odontológicas e pelo MT Saúde na coparticipação poderão atingir o limite de 35% (trinta e cinco por cento)” e “as realizadas pelas entidades administradoras de cartão de crédito poderão realizar consignações até o limite de 15% (quinze por cento), ficando restrita a contratação de no máximo 02 (dois) cartões de crédito por Consignado” (art. 24, I e II). Já a Lei n. 10.820/2003, alterada pela Lei n. 14.431/2022, limita o desconto concedido aos empregados regidos pela CLT em 35% para empréstimos, financiamentos e arrendamentos mercantis e 5% para as despesas contraídas por cartão de crédito; aos titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social e do benefício de prestação continuada admite, além dos percentuais anteriores, 5% para amortização de despesas com cartão consignado de benefício ou a utilização com a finalidade de saque por cartão consignado de benefício. O propósito do legislador ao criar o empréstimo consignado foi facilitar o acesso ao crédito bancário, com juros menores do que os praticados pelo mercado, uma vez que o pagamento automático é garantia de que o credor receberá a importância devida. Posto isso, a contratação “híbrida”, como nestes autos, em que é realizado um “saque” virtual e depois cobrada a quantia em parcela única na fatura de cartão de crédito, que tem juros astronômicos, desvirtua completamente o objetivo da Lei. Cabe ressaltar a decisão do Ministério da Justiça de investigar 23 bancos por possível fraude com a emissão não autorizada de cartão de crédito consignado e com a prática de desconto do pagamento mínimo em folha que amortizaria apenas os juros de financiamento do saldo devedor, impedindo a quitação da dívida principal (https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/bancos-serao-investigados-sobre-possivel-fraude-em-cartoes-de-credito-consignados). Se o autor ainda dispunha de margem consignável, o réu tinha de oferecer-lhe a modalidade de empréstimo mais benéfica e compatível com a sua expectativa. E se a situação fosse o inverso, ou seja, se a sua renda mensal não suportasse mais esse comprometimento, o requerido não podia “burlar” a legislação e disponibilizar cartão de crédito com a finalidade de “saque”. Além disso, como não há o pagamento de prestações fixas, mas apenas o refinanciamento automático da diferença entre o valor da fatura e aquele debitado no holerite, a quantia retirada do salário nunca é suficiente para quitar o “saque”, o que causa perpetuação da dívida e onerosidade excessiva ao consumidor. Essa atitude leva ao superendividamento da população, sobretudo da mais vulnerável. Portanto, é clara a violação aos princípios da transparência e informação, bem como ao art. 46 do CDC, já que se trata de conduta comercial abusiva, vedada pelos incisos III e V do art. 39 do CDC. A situação ora em análise é corriqueira e, após ser objeto de diversas Ações individuais, foram propostas algumas Ações Civis Públicas, entre elas a de n. 0010064-91.2015.8.10.0001 pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão, recentemente julgada pelo STJ (REsp 1722322/MA), tendo o Min. Marco Aurélio Belizze consignado o seguinte: “Na hipótese em apreço, era ofertado pelas instituições financeiras aos servidores/aposentados/pensionistas cartão de crédito com reserva de margem consignável, em substituição ao usual empréstimo consignado, sem a devida informação aos clientes - sobre o efetivo valor da operação de mútuo, da quantidade de parcelas a pagar, da taxa de juros, da possibilidade de pagamento antecipado e do valor líquido para quitação -, infringindo, assim, o direito de informação dos consumidores, a boa-fé, a segurança jurídica e a transparência”. Importante destacar que a utilização do cartão para compras não descaracteriza essa situação, pois o debate é sobre o valor disponibilizado ao consumidor como empréstimo. Logo, é inviável a continuidade do Contrato na forma realizada (art. 170 do CC). Consequentemente, no que concerne aos juros, aplica-se a taxa média praticada no mercado à época para empréstimos consignados (AREsp 1099613/MG) (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/txjuros). A propósito, julgado desta Câmara: “DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO.CARTÃODE CRÉDITOCONSIGNADO. CONFIGURAÇÃO COMO EMPRÉSTIMO. PRÁTICA ABUSIVA. READEQUAÇÃO CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES. DANO MORAL INEXISTENTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta em Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Nulidade Contratual, Restituição de Valores e Indenização por Danos Morais, julgada improcedente com base no art. 487, I, do CPC. O apelante sustenta que contratou empréstimoconsignadoe nãocartãode crédito, requer a conversão da modalidade contratual, a restituição em dobro dos valores pagos e a reparação por danos morais. O apelado apresentou contrarrazões, pugnando pelo não provimento do recurso. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.Há quatro questões em discussão: (i) Definir se a operação contratual realizada configura empréstimo oucartãode créditoconsignado; (ii) Determinar se a prática adotada pela instituição financeira caracteriza conduta abusiva à luz do Código de Defesa do Consumidor; (iii) Verificar se há configuração de dano moral decorrente da operação; e (iv) Estabelecer a forma de restituição dos valores pagos a maior pelo autor. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A operação contratual analisada, em que valores são depositados via TED em conta do consumidor e cobrados em parcela única na fatura docartãode crédito, reveste-se da natureza de empréstimo e não decartãode créditoconsignado, desvirtuando os objetivos do créditoconsignadoprevistos na legislação específica. 4. Tal prática configura conduta abusiva, por violar os deveres de transparência e informação exigidos pelo Código de Defesa do Consumidor, especialmente os arts. 39, III e V, e 46, além de gerar risco de superendividamento e perpetuação da dívida. 5.Não se configura o dano moral, uma vez que a cobrança indevida, por si só, não comprova sofrimento psíquico ou abalo emocional significativo apto a justificar a indenização. 6.Ausente má-fé da instituição financeira, a restituição do valor pago a maior deve ocorrer de forma simples, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 7.A taxa de juros deve ser limitada à média de mercado vigente para empréstimosconsignadosà época da contratação, fixada em 2,32% ao mês, conforme precedentes do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 8.Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1.A operação na qual o consumidor recebe valores via TED e os paga por meio de fatura decartãode crédito configura empréstimo e deve ser convertida para essa modalidade. 2.A cobrança dessa operação comocartãode crédito caracteriza prática abusiva, por infringir os princípios da transparência e da informação do CDC. 3.A restituição dos valores pagos a maior deve ser feita de forma simples, salvo prova de má-fé da instituição financeira. 4.A cobrança indevida, por si só, não configura dano moral indenizável. 5. A taxa de juros aplicável deve se limitar à média de mercado vigente para empréstimosconsignadosà época da contratação”. (N.U 1053654-36.2024.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 31/03/2025, Publicado no DJE 31/03/2025) Pelo exposto, dou parcial provimento ao Recurso para determinar a conversão da modalidade do contrato de cartão de crédito para empréstimo consignado, fixar a taxa de juros na média do mercado à época, condenar o apelado à restituição na forma simples da importância paga a maior pela apelante, com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação e correção monetária pelo INPC a partir de cada desconto. Em razão da sucumbência recíproca (art. 86 do CPC), cada parte deverá arcar com 50% desse ônus. Mantenho os honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, conforme estabelecido na sentença, suspensa a exigibilidade da obrigação em relação ao autor com amparo no art. 98, §3º, do CPC. V O T O EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (2º VOGAL): Acompanho o voto da relatora. EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (PRESIDENTE): Eminentes Pares, Em razão da divergência, fica suspenso o julgamento para aplicação da técnica de extensão de julgamento prevista no art. 942 do CPC, com a ampliação do quórum, nos termos do art. 23-A do RITJ/MT, em sessão futura. EM 23 DE ABRIL DE 2025: ADIADA A CONCLUSÃO DO JULGAMENTO PARA A PRÓXIMA SESSÃO, PARA APLICAÇÃO DA TÉCNICA DE JULGAMENTO DO ART. 942 DO CPC, COM A AMPLIAÇÃO DO QUORUM, NOS TERMOS DO ART. 23-A DO RITJ/MT. A RELATORA VOTOU PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO E FOI ACOMPANHADA PELA 2º VOGAL. O 1º VOGAL VOTOU PELO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. SESSÃO DE EM 30 DE ABRIL DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) ADIADA A CONCLUSÃO DO JULGAMENTO PARA A PRÓXIMA SESSÃO. A RELATORA VOTOU PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO. O 1º VOGAL VOTOU PELO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. A 2ª VOGAL PEDIU PARA REVISITAR O PROCESSO. SESSÃO DE 07 DE MAIO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (PRESIDENTE): Eminentes Pares, Este processo foi adiado o julgamento para aplicação da técnica de julgamento do art. 942 do CPC, após a relatora, Desa. Anglizey Solivan de Oliveira negar provimento ao recurso, o 1º vogal, Des. Rubens de Oliveira Santos Filho votou pelo parcial provimento ao recurso e a 2ª vogal, Serly Marcondes Alves, pediu para revisitar o processo. V O T O (RETIFICADO) EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (RELATORA): Senhor Presidente, Retifico meu voto e adiro integralmente ao voto de Vossa Excelência, para dar parcial provimento ao Recurso, em consonância com o entendimento já pacificado por esta colenda Câmara. É como voto. V O T O (RETIFICADO) EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (1ª VOGAL): Eminentes Pares, Retifico e acompanho o voto retificado da relatora. Data da sessão: Cuiabá-MT, 07/05/2025

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Processo nº 1017769-92.2023.8.11.0041

ID: 275129927

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1017769-92.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 21/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO BMG SA

Acórdão

Advogados:

SERGIO GONINI BENICIO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1017769-92.2023.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, INDENIZAÇÃO POR DANO… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1017769-92.2023.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL, EMPRÉSTIMO CONSIGNADO] RELATORA: EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [LUIZ CEZAR REINERS - CPF: 796.866.131-53 (APELANTE), RODRIGO PALOMARES MAIOLINO DE MENDONCA - CPF: 013.946.171-00 (ADVOGADO), UBIRAJARA GALVAO DE OLIVEIRA - CPF: 760.336.198-20 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELADO), SERGIO GONINI BENICIO - CPF: 177.915.568-98 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do Exmo. Sr. Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: “RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, APÓS RELATORA E A 2ª VOGAL ADERIREM AO VOTO 1º VOGAL”. EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. CONFIGURAÇÃO COMO EMPRÉSTIMO. PRÁTICA ABUSIVA. READEQUAÇÃO CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO SIMPLES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível contra sentença que julgou improcedente pedido de declaração de inexistência de débito, nulidade contratual, restituição e indenização por danos morais, fundado na alegação de que o autor acreditava ter contratado empréstimo consignado, mas recebeu cartão de crédito consignado. 2. O juízo entendeu comprovado o conhecimento da contratação pela utilização do cartão. A sentença foi proferida com base no art. 487, I, do CPC. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. Há quatro questões em discussão: (i) saber se a operação realizada configura cartão de crédito consignado ou empréstimo; (ii) saber se houve conduta abusiva e violação ao dever de informação na contratação; (iii) saber se é cabível indenização por danos morais; (iv) saber qual a forma de restituição dos valores pagos a maior e a taxa de juros aplicável. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A operação com depósito via TED e cobrança em fatura de cartão, sob a rubrica de saque, possui natureza de empréstimo, ainda que rotulada como cartão de crédito consignado. 5. A prática fere os princípios da transparência e informação previstos no CDC, ao ocultar as condições do contrato e promover endividamento contínuo, o que caracteriza conduta abusiva. 6. A restituição deve ocorrer de forma simples, conforme o art. 42, parágrafo único, do CDC. 7. A taxa de juros deve observar a média de mercado vigente para empréstimos consignados à época da contratação, conforme precedentes do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. A operação rotulada como cartão de crédito consignado que consiste no depósito de valores com cobrança em fatura mensal configura empréstimo e deve ser tratada como tal. 2. A prática de ocultação contratual e cobrança indevida nesse contexto caracteriza conduta abusiva à luz do CDC. 3. A taxa de juros deve observar a média de mercado vigente para empréstimos consignados à época da contratação”. Dispositivos relevantes citados: CC, art. 170; CDC, arts. 39, incs. III e V, 42, p.u., e 46; CPC, arts. 86 e 98, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1722322/MA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 14.11.2023; STJ, AREsp 1099613/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 05.10.2017; TJMT, Apelação Cível nº 1053654-36.2024.8.11.0041, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 31.03.2025. R E L A T Ó R I O EXMA SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia câmara: Trata-se de Apelação Cível interposta por Luiz Cezar Reiners contra a sentença proferida pelo Juízo da 4.ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá/MT, que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação declaratória de inexistência de débito c/c nulidade contratual, restituição e indenização por danos morais, proposta em face do Banco BMG S.A. Na petição inicial, o autor alegou ter sido induzido a erro ao contratar cartão de crédito consignado acreditando tratar-se de empréstimo consignado convencional, pleiteando a conversão da modalidade contratual, a restituição dos valores pagos, indenização por danos morais, além da revisão dos juros remuneratórios. O juízo a quo indeferiu a tutela provisória, inverteu o ônus da prova e, ao final, julgou improcedente a demanda, sob o fundamento de que restou comprovado o conhecimento do autor acerca da contratação do cartão de crédito, considerando-se a utilização reiterada do produto. Nas razões recursais, o apelante alega falha no dever de informação, erro essencial na contratação, vício de consentimento e prática abusiva, reiterando a tese de que acreditava estar contratando um empréstimo convencional. Sustenta, ainda, a abusividade dos encargos cobrados e requer a declaração de nulidade do contrato, a restituição dos valores descontados e a condenação em danos morais. O apelado apresentou contrarrazões, arguindo, preliminarmente, a inobservância ao princípio da dialeticidade, e no mérito, defende a regularidade da contratação e a improcedência do recurso, destacando a efetiva utilização do cartão pelo autor e a ausência de abusividade. É o relatório. V O T O (PRELIMINAR - PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE) EXMA SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Eminentes Pares: O apelado suscita a preliminar de não conhecimento do recurso por ausência de dialeticidade, afirmando que a peça de agravo não enfrentou os fundamentos da decisão. No entanto, verifico que a argumentação da apelante tem pertinência com o conteúdo decisório impugnado, ao defender a abusividade da conduta do apelado, afastada na origem, não havendo violação ao princípio da dialeticidade. Portanto, rejeito a preliminar. VOTO (MÉRITO) EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara Conheço do recurso. Trata-se de recurso de apelação interposto por João Luiz Ferreira contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação revisional de contrato cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais, na qual alegou erro na contratação de Cartão de Crédito Consignado com o banco apelado. De início, ressalto que a relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor, conforme Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." Conforme reconhecido em sentença, a hipossuficiência técnica e informacional da parte autora ficou demonstrada, bem como a verossimilhança de suas alegações, impondo-se a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Com base nessa premissa, verifica-se que o autor, policial militar, alegou que foi induzido em erro ao contratar o que acreditava ser um empréstimo consignado em folha de pagamento e que nunca recebeu o cartão de crédito, tampouco o utilizou. Afirma que desconhece efetivamente as informações referentes ao contrato. Contudo, verifica-se que o banco apelado demonstrou que a parte autora, no momento da contratação,tinha plena ciênciado produto financeiro que estava adquirindo. Em documentos anexados pela instituição bancária à contestação, ficou comprovada a contratação mediante assinatura do apelante no termo de adesão para utilização do cartão de crédito e débito BMG (ID 278823947), no qual constam expressamente as condições de pagamento, com desconto do valor mínimo da fatura: Além disso, as faturas acostadas pelo banco, nas quais constam expressamente os encargos incidentes, ficou comprovado que a parte autora realizou diversos saques após a contratação inicial e utilizava o cartão de crédito rotineiramente para compras (IDs 278823949 – págs. 1, 3, 4, 5, etc.). Evidencia-se, portanto, sua plena ciência quanto à modalidade contratada, não havendo fundamento para a conversão do contrato, tampouco para a revisão dos encargos aplicados. Este E. Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de quenão há nulidade contratual quando restar comprovada a ciência do consumidor sobre os termos pactuados: [...] EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR DIVERSOS SAQUES E COMPRAS – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. [...] Verificando-se que a contratação do empréstimo se deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de saques, inviável a aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (N.U 1022833-83.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/02/2025, Publicado no DJE 26/02/2025) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS –CARTÃODECRÉDITOCONSIGNADO– AUSÊNCIA DE VÍCIOS NA CONTRATAÇÃO – UTILIZAÇÃO DOCARTÃOPELO CONSUMIDOR – PRINCÍPIO DA BOA-FÉ – INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Na hipótese de contratação decartão de crédito consignado com utilização efetiva pelo consumidor paracomprasesaques, inexiste fundamento para nulidade contratual ou declaração de inexistência de débito, desde que o negócio tenha sido formalizado de maneira regular e informado. [...] A simples utilização docartãocontratualmente pactuado afasta a presunção de erro ou dolo na contratação, sendo descabida a alegação de indução em erro. Não se configura dano moral quando ausente ato ilícito ou falha na prestação do serviço bancário.” (N.U 1032530-65.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/01/2025, Publicado no DJE 30/01/2025). Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo integralmente a sentença. Majoro os honorários advocatícios fixados na sentença para 12% do valor da causa, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade concedida na origem. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes Pares, Apelação em Ação declaratória de inexistência de débito c/c nulidade contratual, restituição e indenização por danos morais cuja sentença foi proferida nestes termos: “Diante de todo o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento no art. 487, inciso I, do CPC, julgo improcedentes os pedidos formulados na inicial. Por consequência, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa. Sem custas finais.” O apelante afirma que sua intenção era contratar empréstimo consignado, e não cartão de crédito. Diz que ficou configurado o dano moral e pede a restituição em dobro do indébito. Nas contrarrazões o apelado suscita preliminar de ausência de dialeticidade. No mérito, pugna pelo não provimento do Recurso (ID. 278824369). V O T O (PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE RECURSAL) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes Pares, A apelada argui que não foram rechaçados os fundamentos da sentença, em violação ao princípio da dialeticidade recursal. Contudo, a apelante cumpriu o ônus argumentativo ao alegar que o contrato em discussão é irregular. Rejeito a preliminar. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes Pares, Segundo o Banco Central do Brasil, empréstimo “é um contrato entre o cliente e uma instituição financeira (banco, cooperativa de crédito, caixa econômica) pelo qual o cliente recebe uma quantia em dinheiro que deverá ser devolvida em prazo determinado, acrescida dos juros acertados e, na modalidade consignado, o desconto da prestação é feito diretamente na folha de pagamento ou de benefício previdenciário do contratante”. (https://www.bcb.gov.br/pre/pef/port/folder_serie_I_emprestimos_e_financiamentos.pdf e https://www.bcb.gov.br/nor/relcidfin/docs/art7_emprestimo_consignado.pdf) – acesso em 14/06/2020. Já o cartão de crédito consiste em transação financeira que “permite o pagamento de compras ou serviços até o limite do crédito previamente definido no contrato e”, quando consignado, “o valor mínimo da fatura é descontado diretamente da sua folha de pagamento ou benefício do INSS” (https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira/direitosdeveres e https://www.serasa.com.br/ecred/cartao-de-credito-consignado/) - acesso em 14/06/2020. Contudo, há uma terceira modalidade de contrato em que a instituição financeira credita em conta-corrente quantia fixa, mediante TED, e o valor é cobrado na fatura do mês subsequente, em parcela única. A operação é claramente de empréstimo, porém denominada de cartão de crédito consignado. Trata-se de versão híbrida e sem paralelo na legislação brasileira. Por isso, cumpre ao Judiciário analisar minuciosamente se o contrato não fere direitos consumeristas. O Decreto Estadual n. 691/2016 estabelece que no âmbito da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional do Poder Executivo do Estado de Mato Grosso, as consignações facultativas “realizadas pelas instituições financeiras, pelas cooperativas, pelas entidades de previdência privada, pelos serviços sociais autônomos, pelas compras por convênios firmados com sindicatos e associações, pelas seguradoras do ramo de vida, pelas clínicas odontológicas e pelo MT Saúde na coparticipação poderão atingir o limite de 35% (trinta e cinco por cento)” e “as realizadas pelas entidades administradoras de cartão de crédito poderão realizar consignações até o limite de 15% (quinze por cento), ficando restrita a contratação de no máximo 02 (dois) cartões de crédito por Consignado” (art. 24, I e II). Já a Lei n. 10.820/2003, alterada pela Lei n. 14.431/2022, limita o desconto concedido aos empregados regidos pela CLT em 35% para empréstimos, financiamentos e arrendamentos mercantis e 5% para as despesas contraídas por cartão de crédito; aos titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social e do benefício de prestação continuada admite, além dos percentuais anteriores, 5% para amortização de despesas com cartão consignado de benefício ou a utilização com a finalidade de saque por cartão consignado de benefício. O propósito do legislador ao criar o empréstimo consignado foi facilitar o acesso ao crédito bancário, com juros menores do que os praticados pelo mercado, uma vez que o pagamento automático é garantia de que o credor receberá a importância devida. Posto isso, a contratação “híbrida”, como nestes autos, em que é realizado um “saque” virtual e depois cobrada a quantia em parcela única na fatura de cartão de crédito, que tem juros astronômicos, desvirtua completamente o objetivo da Lei. Cabe ressaltar a decisão do Ministério da Justiça de investigar 23 bancos por possível fraude com a emissão não autorizada de cartão de crédito consignado e com a prática de desconto do pagamento mínimo em folha que amortizaria apenas os juros de financiamento do saldo devedor, impedindo a quitação da dívida principal (https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/bancos-serao-investigados-sobre-possivel-fraude-em-cartoes-de-credito-consignados). Se o autor ainda dispunha de margem consignável, o réu tinha de oferecer-lhe a modalidade de empréstimo mais benéfica e compatível com a sua expectativa. E se a situação fosse o inverso, ou seja, se a sua renda mensal não suportasse mais esse comprometimento, o requerido não podia “burlar” a legislação e disponibilizar cartão de crédito com a finalidade de “saque”. Além disso, como não há o pagamento de prestações fixas, mas apenas o refinanciamento automático da diferença entre o valor da fatura e aquele debitado no holerite, a quantia retirada do salário nunca é suficiente para quitar o “saque”, o que causa perpetuação da dívida e onerosidade excessiva ao consumidor. Essa atitude leva ao superendividamento da população, sobretudo da mais vulnerável. Portanto, é clara a violação aos princípios da transparência e informação, bem como ao art. 46 do CDC, já que se trata de conduta comercial abusiva, vedada pelos incisos III e V do art. 39 do CDC. A situação ora em análise é corriqueira e, após ser objeto de diversas Ações individuais, foram propostas algumas Ações Civis Públicas, entre elas a de n. 0010064-91.2015.8.10.0001 pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão, recentemente julgada pelo STJ (REsp 1722322/MA), tendo o Min. Marco Aurélio Belizze consignado o seguinte: “Na hipótese em apreço, era ofertado pelas instituições financeiras aos servidores/aposentados/pensionistas cartão de crédito com reserva de margem consignável, em substituição ao usual empréstimo consignado, sem a devida informação aos clientes - sobre o efetivo valor da operação de mútuo, da quantidade de parcelas a pagar, da taxa de juros, da possibilidade de pagamento antecipado e do valor líquido para quitação -, infringindo, assim, o direito de informação dos consumidores, a boa-fé, a segurança jurídica e a transparência”. Importante destacar que a utilização do cartão para compras não descaracteriza essa situação, pois o debate é sobre o valor disponibilizado ao consumidor como empréstimo. Logo, é inviável a continuidade do Contrato na forma realizada (art. 170 do CC). Consequentemente, no que concerne aos juros, aplica-se a taxa média praticada no mercado à época para empréstimos consignados (AREsp 1099613/MG) (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/txjuros). A propósito, julgado desta Câmara: “DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO.CARTÃODE CRÉDITOCONSIGNADO. CONFIGURAÇÃO COMO EMPRÉSTIMO. PRÁTICA ABUSIVA. READEQUAÇÃO CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES. DANO MORAL INEXISTENTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta em Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Nulidade Contratual, Restituição de Valores e Indenização por Danos Morais, julgada improcedente com base no art. 487, I, do CPC. O apelante sustenta que contratou empréstimoconsignadoe nãocartãode crédito, requer a conversão da modalidade contratual, a restituição em dobro dos valores pagos e a reparação por danos morais. O apelado apresentou contrarrazões, pugnando pelo não provimento do recurso. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.Há quatro questões em discussão: (i) Definir se a operação contratual realizada configura empréstimo oucartãode créditoconsignado; (ii) Determinar se a prática adotada pela instituição financeira caracteriza conduta abusiva à luz do Código de Defesa do Consumidor; (iii) Verificar se há configuração de dano moral decorrente da operação; e (iv) Estabelecer a forma de restituição dos valores pagos a maior pelo autor. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A operação contratual analisada, em que valores são depositados via TED em conta do consumidor e cobrados em parcela única na fatura docartãode crédito, reveste-se da natureza de empréstimo e não decartãode créditoconsignado, desvirtuando os objetivos do créditoconsignadoprevistos na legislação específica. 4. Tal prática configura conduta abusiva, por violar os deveres de transparência e informação exigidos pelo Código de Defesa do Consumidor, especialmente os arts. 39, III e V, e 46, além de gerar risco de superendividamento e perpetuação da dívida. 5.Não se configura o dano moral, uma vez que a cobrança indevida, por si só, não comprova sofrimento psíquico ou abalo emocional significativo apto a justificar a indenização. 6.Ausente má-fé da instituição financeira, a restituição do valor pago a maior deve ocorrer de forma simples, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 7.A taxa de juros deve ser limitada à média de mercado vigente para empréstimosconsignadosà época da contratação, fixada em 2,32% ao mês, conforme precedentes do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 8.Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1.A operação na qual o consumidor recebe valores via TED e os paga por meio de fatura decartãode crédito configura empréstimo e deve ser convertida para essa modalidade. 2.A cobrança dessa operação comocartãode crédito caracteriza prática abusiva, por infringir os princípios da transparência e da informação do CDC. 3.A restituição dos valores pagos a maior deve ser feita de forma simples, salvo prova de má-fé da instituição financeira. 4.A cobrança indevida, por si só, não configura dano moral indenizável. 5. A taxa de juros aplicável deve se limitar à média de mercado vigente para empréstimosconsignadosà época da contratação”. (N.U 1053654-36.2024.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 31/03/2025, Publicado no DJE 31/03/2025) Pelo exposto, dou parcial provimento ao Recurso para determinar a conversão da modalidade do contrato de cartão de crédito para empréstimo consignado, fixar a taxa de juros na média do mercado à época, condenar o apelado à restituição na forma simples da importância paga a maior pela apelante, com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação e correção monetária pelo INPC a partir de cada desconto. Em razão da sucumbência recíproca (art. 86 do CPC), cada parte deverá arcar com 50% desse ônus. Mantenho os honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, conforme estabelecido na sentença, suspensa a exigibilidade da obrigação em relação ao autor com amparo no art. 98, §3º, do CPC. V O T O EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (2º VOGAL): Acompanho o voto da relatora. EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (PRESIDENTE): Eminentes Pares, Em razão da divergência, fica suspenso o julgamento para aplicação da técnica de extensão de julgamento prevista no art. 942 do CPC, com a ampliação do quórum, nos termos do art. 23-A do RITJ/MT, em sessão futura. EM 23 DE ABRIL DE 2025: ADIADA A CONCLUSÃO DO JULGAMENTO PARA A PRÓXIMA SESSÃO, PARA APLICAÇÃO DA TÉCNICA DE JULGAMENTO DO ART. 942 DO CPC, COM A AMPLIAÇÃO DO QUORUM, NOS TERMOS DO ART. 23-A DO RITJ/MT. A RELATORA VOTOU PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO E FOI ACOMPANHADA PELA 2º VOGAL. O 1º VOGAL VOTOU PELO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. SESSÃO DE EM 30 DE ABRIL DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) ADIADA A CONCLUSÃO DO JULGAMENTO PARA A PRÓXIMA SESSÃO. A RELATORA VOTOU PELO NÃO PROVIMENTO DO RECURSO. O 1º VOGAL VOTOU PELO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. A 2ª VOGAL PEDIU PARA REVISITAR O PROCESSO. SESSÃO DE 07 DE MAIO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (PRESIDENTE): Eminentes Pares, Este processo foi adiado o julgamento para aplicação da técnica de julgamento do art. 942 do CPC, após a relatora, Desa. Anglizey Solivan de Oliveira negar provimento ao recurso, o 1º vogal, Des. Rubens de Oliveira Santos Filho votou pelo parcial provimento ao recurso e a 2ª vogal, Serly Marcondes Alves, pediu para revisitar o processo. V O T O (RETIFICADO) EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (RELATORA): Senhor Presidente, Retifico meu voto e adiro integralmente ao voto de Vossa Excelência, para dar parcial provimento ao Recurso, em consonância com o entendimento já pacificado por esta colenda Câmara. É como voto. V O T O (RETIFICADO) EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (1ª VOGAL): Eminentes Pares, Retifico e acompanho o voto retificado da relatora. Data da sessão: Cuiabá-MT, 07/05/2025

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