Resultados para "5019643-10.2024.4.04.7002" – Página 13 de 13

Processo nº 5019643-22.2025.8.24.0038

ID: 320930590

Tribunal: TJSC Órgão: 1º Juizado Especial Cível da Comarca de Joinville Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 5019643-22.2025.8.24.0038

Data de Disponibilização: 09/07/2025

Polo Ativo:

RONALDO EDUARDO JERKE - ME

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

LUIS FELIPE BISELLI

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

MARCIO LUIS NUNES DA SILVA JUNIOR

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5019643-22.2025.8.24.0038/SC AUTOR : RONALDO EDUARDO JERKE - ME ADVOGADO(A) : LUIS FELIPE BISELLI (OAB SC035032) ADVOGADO(A) : MARCIO LUIS NUNES DA SILVA JU… PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5019643-22.2025.8.24.0038/SC AUTOR : RONALDO EDUARDO JERKE - ME ADVOGADO(A) : LUIS FELIPE BISELLI (OAB SC035032) ADVOGADO(A) : MARCIO LUIS NUNES DA SILVA JUNIOR (OAB SC036664) DESPACHO/DECISÃO Trata-se de ação proposta por RONALDO EDUARDO JERKE - ME contra FELIPE DUTKA , não havendo pedido liminar. AUDIÊNCIA: Designo audiência de conciliação a realizar-se de forma presencial . Da data da audiência: - Deverá o cartório incluir a sessão em pauta de audiência e gerar o link de acesso virtual, intimando-se as partes. Faculto a participação por videoconferência na audiência aprazada. O acesso à sala virtual se dará por link que será disponibilizado posteriormente nos autos. Para participar da audiência por videoconferência é necessário equipamento (computador ou celular) com acesso à internet, som e vídeo, bastando clicar no link que será fornecido e autorizar o uso do microfone e da câmera. Caso não possua tal acesso, deverá obrigatoriamente comparecer pessoalmente na sala de audiências do 1º Juizado Especial Cível da Comarca de Joinville . Não será aceita justificativa de ausência por falta de conexão . CITAÇÃO: Cite-se , nos termos do art. 18 da Lei n. 9.099/1995, cientificando a parte ré acerca das advertências contidas no art. 20 da Lei n. 9.099/1995 e no Enunciado n. 78 do Fonaje, bem como que, não obtida a conciliação, deverá ser apresentada contestação ou pedido contraposto, de forma escrita ou oral, no ato. Pedido de Citação por WhatsApp: Mediante requerimento, defiro desde já a citação via WhatsApp , devendo o oficial de justiça observar os seguintes requisitos para validade do ato: a) encaminhar contrafé; b) solicitar comprovação de identificação e recebimento por escrito do destinatário; c) acostar com a certidão os prints da conversa no aplicativo de mensagens. Da busca de endereços: - Frustrada a citação no endereço indicado na inicial, encaminhem-se os autos à Camp para pesquisa de endereço nos sistemas disponíveis. - Encontrados registros, intime-se a parte demandante para que, no prazo de 15 dias, indique expressamente quais endereços/telefones são atualizados, e em qual deve ser realizada a citação, sob pena de extinção. - Cumprido, proceda-se à citação no endereço informado. - Salienta-se que a pesquisa nos sistemas informatizados disponíveis ao juízo substitui a expedição de alvará para busca de endereços em instituições públicas e privadas. - Havendo endereço mais recente da parte ré nos sistemas disponíveis renove-se o ato. - Em caso negativo (da consulta ou diligência), intime-se a parte autora para atualizar o endereço, sob pena de extinção. Prazo: 30 dias. GRATUIDADE DA JUSTIÇA: O acesso aos Juizados Especiais Cíveis é gratuito no primeiro grau, independentemente de requerimento, não havendo cobrança de taxas ou despesas e nem condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Assim, mostra-se dispensável a análise de eventuais pedidos de gratuidade da justiça formulados pelas partes, que deverão reapresentá-los em sede recursal, cabendo ao relator da Turma decidir a respeito (art. 99, § 7º, do Código de Processo Civil). DA COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS: Sabe-se que no rito dos Juizados Especiais: - não é admitida a citação por edital; - não é possível formular pedido ilíquido (art. 38, parágrafo único da lei 9.099/95); - a soma de todos os pedidos não pode ultrapassar o valor de alçada de 40 salários mínimos nas causas patrocinadas por Advogado, ou 20 nos demais casos (art. 3, I e art. 9, da lei 9.099/95), ressalvadas as exceções dos incisos II e III do mesmo dispositivo; - não é permitida a realização de prova complexa, incluindo-se a prova pericial. Salienta-se que o valor da causa deve necessariamente coincidir com o proveito econômico almejado pela parte autora, incluindo todos os pedidos pretendidos, tanto os de cunho indenizatório (danos materiais e morais), quanto os pedidos constitutivos e de obrigação de fazer (art. 292, VI do CPC), somando-se todos os valores pretendidos, sendo ineficaz a sentença condenatória na parte que exceder a alçada estabelecida (art. 39 da lei 9.099/95). Assim, consideram-se incluídos na soma: o valor total do contrato em caso de ação constitutiva; todos os valores indenizatórios por danos materiais e morais nas ações indenizatórias; todos os valores pretendidos nas ações de cobrança; o valor total de eventuais perdas e danos em caso de conversão da obrigação de fazer, dentre outros. Deste modo, fica a parte autora ciente de que: a) em não sendo encontrada a parte ré após utilização dos sistemas disponibilizados ao Juízo, e não sendo indicado pela parte autora endereço atualizado, o feito será extinto sem análise do mérito; b) não será proferida sentença ilíquida, sendo obrigação da parte autora formular pedido líquido; c) o valor total da causa ficará limitado a 40 salários mínimos, e a opção pelo procedimento previsto nesta lei importará em renuncia a todo crédito excedente ao limite de 40 (quarenta) salários mínimos vigentes à época da propositura da ação, somando-se todos os valores pretendidos; d) sendo constatada a necessidade de prova complexa, este Juízo extinguirá o feito in continenti , sem redistribuição para vara cível. Ante o exposto , em havendo discordância quanto aos limites estabelecidos acima, deverá a parte autora manifestar expressamente sua discordância de forma justificada, no prazo de 15 dias, sob pena de preclusão . Estratégias para tramitação ágil - recursos tecnológicos do Eproc Sr.(a) Advogado(a), veja como é simples contribuir para a celeridade da tramitação do processo: Acesse as DICAS PARA CONTRIBUIR COM UM PROCESSO MAIS RÁPIDO - CLIQUE AQUI! O adequado funcionamento das ferramentas de automação necessariamente depende da colaboração dos advogados e jurisdicionados, que deverão se atentar à correta alimentação dos dados no momento do peticionamento. Ou seja, cada documento deverá ser nomeado de acordo com a pretensão ("pedido de extinção do processo", "pedido de homologação de acordo", "pedido de suspensão do processo" etc.), evitando-se peticionamentos genéricos (documentos nomeados simplesmente como “PETIÇÃO”). RECOMENDADO: Assistir os vídeos com DICAS OFICIAIS DO TJSC PARA UTILIZAÇÃO DAS FERRAMENTAS - CLIQUE AQUI

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 5019643-81.2022.4.04.7001

ID: 294598864

Tribunal: TRF4 Órgão: 6ª Vara Federal de Londrina Classe: CUMPRIMENTO DE SENTENçA CONTRA A FAZENDA PúBLICA Nº Processo: 5019643-81.2022.4.04.7001

Data de Disponibilização: 10/06/2025

Polo Ativo:

ANTONIO YUKISHIGUE TANAKA

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

RENATA SILVA BRANDÃO CANELLA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

Cumprimento de Sentença contra Fazenda Pública (JEF) Nº 5019643-81.2022.4.04.7001/PR REQUERENTE : ANTONIO YUKISHIGUE TANAKA ADVOGADO(A) : RENATA SILVA BRANDÃO CANELLA (OAB PR030452) DESPACHO/DECISÃO… Cumprimento de Sentença contra Fazenda Pública (JEF) Nº 5019643-81.2022.4.04.7001/PR REQUERENTE : ANTONIO YUKISHIGUE TANAKA ADVOGADO(A) : RENATA SILVA BRANDÃO CANELLA (OAB PR030452) DESPACHO/DECISÃO 1. As partes divergem acerca do cálculo da RMI do benefício deferido à parte autora nestes autos, por totalização, com inclusão de período laborado no Japão. Alega a parte autora que faz jus ao benefício no valor do salário mínimo, não podendo ser inferior, em razão do que dispõe o art. 201, §2º da CF. Não assiste razão a parte autora. Isso porque o artigo 17 do acordo assegura unicamente o aproveitamento de "períodos de cobertura", ignorando-se os salários-de-contribuição: Artigo 17 Totalização e Regras de Cálculo 1. Quando uma pessoa não for elegível a um benefício sob a legislação do Brasil por não ter acumulado períodos de cobertura suficientes de acordo com aquela legislação, os períodos de cobertura sob a legislação do Japão serão também considerados para determinar a elegibilidade daquela pessoa. Para aplicar o acima mencionado, a instituição competente do Brasil deverá : a) calcular o valor teórico do benefício que seria pago se todos os períodos de cobertura houvessem sido completados sob a legislação do Brasil; b) sobre a base daquele valor teórico, calcular, então, o valor real do benefício a ser pago de acordo com a razão entre a duração dos períodos de cobertura completados sob a legislação do Brasil e a duração total dos períodos de cobertura sob a legislação de ambos os Estados Contratantes. Contudo, se esta duração total exceder o período mínimo necessário para estabelecer o direito ao benefício sob a legislação do Brasil, a duração total será considerada igual ao período mínimo. Neste sentido, ainda, as disposições regulamentares da IN nº 128/2022: Art. 403. Os Acordos Internacionais de Previdência Social preveem o cômputo do tempo de contribuição ou seguro cumprido em países signatários para aquisição de direito a benefícios, aplicando-se a regra da totalização . Art. 404. A regra da totalização prevê o cômputo dos tempos de contribuição ou seguro dos países acordantes para fins da elegibilidade do benefício, com pagamento proporcional ao tempo de contribuição vertido para cada país, se alcançados todos os requisitos necessários ao reconhecimento do direito. § 1º Com a aplicação da regra da proporcionalidade , o valor do benefício poderá ser inferior ao salário mínimo, salvo regra expressa do Acordo dispondo em sentido contrário. § 2º O valor da prestação teórica não poderá ser inferior ao salário mínimo. Art. 405. Para o reconhecimento de direito, será levado em consideração a validação do tempo de contribuição ou seguro do país acordante, o qual será computado ao tempo de contribuição da legislação brasileira, para fins de aquisição da carência, tempo de contribuição e manutenção da qualidade de segurado. Parágrafo único. A totalização dos períodos de cobertura não considera os valores das contribuições do país acordante para o cálculo do benefício. Não há, no acordo de seguridade, disposição que determina e/ou que sugira a possibilidade de aproveitamento recíprocos dos salários para apuração da RMI. No que se refere à garantia do salário mínimo, os itens 17.2 e 17.3 do acordo dispõem que: 1. Quando uma pessoa não for elegível a um benefício sob a legislação do Brasil por não ter acumulado períodos de cobertura suficientes de acordo com aquela legislação, os períodos de cobertura sob a legislação do Japão serão também considerados para determinar a elegibilidade daquela pessoa. Para aplicar o acima mencionado, a instituição competente do Brasil deverá : a) calcular o valor teórico do benefício que seria pago se todos os períodos de cobertura houvessem sido completados sob a legislação do Brasil; b) sobre a base daquele valor teórico, calcular, então, o valor real do benefício a ser pago de acordo com a razão entre a duração dos períodos de cobertura completados sob a legislação do Brasil e a duração total dos períodos de cobertura sob a legislação de ambos os Estados Contratantes. Contudo, se esta duração total exceder o período mínimo necessário para estabelecer o direito ao benefício sob a legislação do Brasil, a duração total será considerada igual ao período mínimo. 2. O valor teórico do benefício mencionado no parágrafo 1, alínea (a), deste Artigo não será, sob nenhuma circunstância, inferior ao valor mínimo garantido pela legislação do Brasil. 3. Caso uma pessoa seja elegível a um benefício sob a legislação do Brasil sem a aplicação do parágrafo 1 deste Artigo, a instituição competente do Brasil determinará o valor do benefício a ser pago com base exclusivamente nos períodos de cobertura completados por esta pessoa sob a legislação do Brasil. Não há, portanto, garantia de "valor mínimo" de benefício. Há referência no acordo à utilização do mínimo nacional apenas para definição da "base de cálculo" da apuração. Assim, de fato, a sistemática prevista no acordo acaba permitindo o pagamento de benefício previdenciário de valor inferior ao mínimo pelo RGPS brasileiro. E esse método de cálculo deve ser assim porque o acordo internacional em análise não prevê a compensação entre os regimes previdenciários envolvidos (brasileiro e japonês). Assim, como o tempo de serviço realizado no Japão teve o recolhimento previdenciário efetivado naquele país, o RGPS brasileiro não pode se responsabilizar pelo pagamento integral de benefício em face da ausência da correspondente fonte de custeio total. Diante desse panorama, infere-se que o acordo busca harmonizar as disposições da Constituição Federal contidas nos arts. 201, §2º, e 195, §5º, em perfeita observância ao princípio de unidade da Constituição, que deve nortear sua interpretação. Afinal, de um lado, determina que o valor teórico do benefício do segurado não seja inferior ao patamar mínimo (respeitando o art. 201, § 2º) mas, de outro, onera o fundo previdenciário apenas na proporção das contribuições que foram pagas em favor do regime brasileiro, respeitando o equilíbrio financeiro e atuarial (art. 195, §5º). Neste sentido, ainda, o art. 35 do RPS: Art. 35. A renda mensal do benefício de prestação continuada que substituir o salário-de-contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado não terá valor inferior ao do salário mínimo nem superior ao limite máximo do salário-de-contribuição, exceto no caso previsto no art. 45. § 1º A renda mensal inicial pro rata dos benefícios por totalização , concedidos com base em acordos internacionais, será proporcional ao tempo de contribuição para previdência social brasileira e poderá ter valor inferior ao do salário-mínimo . (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020). 2. Assim, indefiro a impugnação da parte autora. Intimem-se (prazo: 15 dias). 3. Após, expeça-se RPV com base no cálculo do INSS, intimando-se as partes.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou o que procurava? Faça login para ver mais resultados e detalhes completos.

Fazer Login para Ver Mais

Processo nº 5019643-30.2025.4.04.0000

ID: 325659461

Tribunal: TRF4 Órgão: SECRETARIA DA 11a. TURMA Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 5019643-30.2025.4.04.0000

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

CHARLES CAGOL DO NASCIMENTO

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

BRUNO ANGELI BONEMER

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

Agravo de Instrumento Nº 5019643-30.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo … Agravo de Instrumento Nº 5019643-30.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo de Instrumento: (1) 5019929-08.2025.4.04.0000 (interposto pela União); (2) 5019643-30.2025.4.04.0000 (interposto pelo IBAMA); (3) 5019645-97.2025.4.04.0000 (interposto pela ANA) e (4) 5019644-15.2025.4.04.0000 (interposto pelo ICMBIO). Os referidos Agravos de Instrumento foram interpostos em face de decisão com o seguinte teor ( 24.1 ): (...) a) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem um ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR26 sobre a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, que compreenda a bacia hidrográfica da região, incluindo os diversos elementos hídricos relevantes para a LAGOA DO PERI, a fim de, inter alia, avaliarem a capacidade de suporte da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI em relação às presentes e futuras intervenções ou empreendimentos na localidade (e.g., para garantir a compatibilidade dos parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água), bem como a identificarem as possíveis fontes de poluição e contaminação da LAGOA DO PERI, tais como ligações clandestinas na rede pluvial e lançamento direto ou indireto de efluentes não-tratados nos corpos hídricos relevantes de sua bacia hidrográfica, dentro do prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desatendimento; b) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem e implementarem um PLANO DE TRABALHO que contemple a execução de medidas de análise e fiscalização nos locais identificados naquele ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR (com, por exemplo, os parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água, as possíveis fontes de poluição e contaminação da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, etc), o qual deve ser iniciado no prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desobediência; c) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para elaborar um PLANO DE EMERGÊNCIA E CONTINGÊNCIA, com ações corretivas de curto, médio e longo prazos, sempre que se detectarem riscos à saúde (humana ou não), pelo consumo da água da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, tais como pela concentração de toxinas acima dos limites permitidos ou pela contaminação de suas águas por outros fatores de poluição, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de inobservância; d) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para garantir que as atividades das comunidades tradicionais relacionadas com a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI (tal como a pesca artesanal e a extração de mariscos) sejam realizadas sem riscos da presença de patógenos de grave repercussão à saúde, tais como as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, como, por exemplo, as medidas indicadas pelo IBAMA na Informação Técnica nº 178/2022-NUBIO-SC/DITEC-SC: d.1) Ampliação do número de sítios de monitoramento, incluindo-se pontos de análise de qualidade de água, da composição da comunidade fitoplanctônica e monitoramento de cianotoxinas no canal do Rio Sangradouro, na desembocadura do rio e em pontos estratégicos na praia do Matadeiro e Armação do Pântano do Sul, considerando as condições oceanográficas da zona de mistura na foz do rio; d.2) Monitoramento contínuo de bivalves marinhos, com amostragens periódicas na praia do Matadeiro e Armação, para avaliação do grau de acumulação de cianotoxinas nos tecidos destes organismos, com vistas à adoção de medidas sanitárias de suspensão de coleta e/ou cultivo quando os níveis destas toxinas se tornarem danosos à saúde humana; d.3) Estabelecimento de plano de análises ecotoxicológicas, para avaliação contínua dos efeitos de toxicidade de R. raciborskii em organismos chave para a alimentação da população tradicional local, incluindo moluscos, peixes, e outras espécies que sejam relevantes para a comunidade”. Em caso de recalcitrância, deverá ser imposta pena de multa diária de R$5.000,00 a cada uma das pessoas físicas responsáveis. (...) A União opõe-se à decisão a partir dos seguintes argumentos: (i) inexistência de responsabilidade sobre a água da Lagoa do Peri, pois não se trata de corpo hídrico federal, mas de unidade de conservação municipal; (ii) não há qualquer conduta comissiva ou omissiva imputada à União; (iii) a decisão proferida é genérica e não se alicerça em fundamentos fáticos e jurídicos concretos; (iv) a multa foi fixada em valor excessivo ( processo 5019929-08.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O IBAMA questiona a decisão recorrida a partir dos seguintes fundamentos: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos apresentados pelas entidades públicas, ignorando que se trata, a Lagoa do Peri, de corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) não há risco imediato de dano irreparável ou de difícil reparação; (iii) a decisão proferida ignorou que o IBAMA pode atuar somente de modo subsidiário, conforme o entendimento do STF; (iv) a competência primária em fiscalização ambiental na área em comento não compete ao IBAMA, mas à municipalidade ou ao Estado de Santa Catarina; (v) deveria ter sido observado o disposto no Tema 698/STF; (vi) a multa fixada é indevida e excessiva ( processo 5019643-30.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). A ANA - Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico alegou em seu recurso: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos deduzidos pelos corréus, indicativos de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) a ANA seria parte passiva ilegítima porque os pedidos formulados não se relacionam com as suas atribuições; (iii) inexiste risco imediato de dano irreparável; (iv) as determinações impostas são inexequíveis e desnecessárias; (v) a multa fixada é descabida e foi fixada em montante excessivo ( processo 5019645-97.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O ICMBIO , por sua vez, apresenta as seguintes razões recursais: (i) foram ignorados, pela decisão recorrida, os fatos apresentados pelas entidades públicas, comprobatórios de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) o ICMBIO seria parte parte passiva ilegítima, pois os fatos apresentados não se inserem no âmbito de suas competências; (iii) não há risco de dano irreparável no local; (iv) as imposições da decisão recorrida são inexequíveis e descabidas; (v) a multa fixada é excessiva ( processo 5019644-15.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). É o relatório. Decido. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF em face do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis , da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento , da União , do IBAMA , do ICMBIO e da ANA , com o seguinte objeto ( 1.1 ): A PROCURADORIA DA REPÚBLICA, por meio desta ação, busca garantir, entre outras medidas, que as atividades relacionadas com a coleta, o tratamento e a distribuição de água feita pela LAGOA DO PERI para consumo (humano ou não) não ofereça riscos à saúde, bem como que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, resguardando, assim, os atributos físicos, bióticos e sociais dessa área geográfica ambientalmente sensível. Esta demanda visa, ainda, à responsabilização solidária do MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, da FLORAM, da CASAN, da UNIÃO, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA, por sua omissão ou atuação ineficiente/deficiente quanto ao dever de prestar o serviço público de saneamento urbano de modo eficiente e eficaz, bem como de garantir que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii. Ainda que a legitimidade da parte pressuponha, como regra, uma análise anterior ao mérito, a partir de um exame alicerçado in status assertionis , ou seja, baseado nos argumentos apresentados na fase postulatória (TRF4, AG 5019715-51.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator RODRIGO KOEHLER RIBEIRO, julgado em 26/11/2024), isso, por si só, não autoriza que qualquer pretensão, principalmente se não especificar o âmbito da responsabilidade que se busca apurar, possa ser deduzida judicialmente. Por isso se afirma que "a legitimidade passiva ad causam é definida pela narrativa dos fatos e fundamentos jurídicos constante na petição inicial (teoria da asserção) (...)" (TRF4, AG 5049639-15.2021.4.04.0000, 4ª Turma, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, julgado em 30/03/2022). Na situação dos autos, o MPF imputou a todos os corréus uma série de deveres decorrentes, em tese, da omissão, tanto na fiscalização ambiental como no exercício do respectivo poder de polícia, que culminou com a ocorrência de danos ambientais junto ao entorno da Lagoa do Peri, em Florianópolis. A situação posta nos autos, contudo, demanda apuração mais cuidadosa, pois a petição inicial do feito de origem limitou-se a apontar, de forma ampla, a legitimidade passiva da União, do ICMBIO, do IBAMA e da ANA a partir de premissas flagrantemente genéricas. A narrativa da peça inicial busca abarcar, a pretexto de salvaguardar o meio ambiente, uma multiplicidade de atuações administrativas que sequer foram objetivamente indicadas, admitindo, sem acurada explicação, a mescla de competências estaduais, municipais e federais. Trata-se de perspectiva que, em um primeiro momento, sugere a própria inépcia da petição inicial, pois, como consabido, "considera-se inepta a petição inicial quando o o pedido for indeterminado e da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão" (TRF4, AC 5038641-14.2024.4.04.7200, 2ª Turma, Relator para Acórdão EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA, julgado em 17/06/2025). Além disso, conforme já decidiu esta Corte (TRF4, AC 5022913-50.2012.4.04.7200, 4ª Turma, Relator para Acórdão LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 14/12/2016), "a causa de pedir - pressuposto processual necessário para o desenvolvimento válido e regular do processo (art. 295 do CPC/73) - é constituída pelos fundamentos do pedido do autor da ação - motivos que legitimam a sua pretensão. Examinando a causa de pedir, o juiz verifica se o pedido deduzido tem ou não fundamento para ser acolhido. Verificando-se que a petição inicial é clara e possui os fundamentos jurídicos e fáticos necessários à identificação do pedido e da causa de pedir, deve ser afastada a alegação de inépcia da petição inicial". Consequentemente, verificando-se que a causa de pedir é genérica e incerta, ou ampla a ponto de impedir a apuração objetiva das alegadas responsabilidades, cabível, em tese, o reconhecimento de inépcia da peça vestibular. Acerca das potenciais responsabilidades em face dos riscos ambientais verificados na Lagoa do Peri, aponta a petição inicial as seguintes hipóteses de legitimidade passiva ( 1.1 , p. 31 e seguintes): LEGITIMIDADE PASSIVA FUNDAMENTOS DA LEGITIMIDADE UNIÃO (p. 31) "A legitimação passiva da UNIÃO se fundamenta na competência administrativa da SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU para, no âmbito patrimonial, zelar pela integridade dos imóveis pertencentes à UNIÃO, devendo, assim, fiscalizar e defender seu domínio (tais como terras e acrescidos de marinha) contra toda e qualquer ameaça ou efetiva intervenção ilegal, como turbações, ocupações e esbulhos, não se discutindo suas atribuições para agir quando se cuida de terras e acrescidos de marinha, ainda mais quando se cuida de espaços territoriais especialmente protegidos e ambientalmente sensíveis (APP de curso d’água e Zona Costeira)". ANA (p. 32) "A ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO é responsável por implementar a gestão dos recursos hídricos brasileiros e por regular o saneamento básico. É obrigação da ANA fiscalizar as condições de operação de reservatórios, o uso de recursos hídricos e o cumprimento das normas de saneamento básico, além de monitorar os sedimentos dos rios (Lei nº 9.984/2000, art. 4º e seus incisos)". IBAMA e ICMBIO (p. 33 e 37) "evidente a presença do interesse do IBAMA e do ICMBio em estabelecer parâmetros adequados de gestão ambiental (inclusive em prol da REBIO DO ARVOREDO e da APA DA BALEIA FRANCA) e, ainda, de adotar medidas efetivas para prevenção de contaminação". "o IBAMA e o ICMBio, no âmbito administrativo, possuem poder de polícia para fiscalizar atividades ilícitas contra o meio ambiente, mesmo em área cuja competência para licenciamento ambiental seja do Estado, seja do Município". "o IBAMA também é competente para o caso por haver FLORESTA PÚBLICA FEDERAL na localidade (vegetação do ecossistema de restinga)". "compete ao ICMBio e ao IBAMA o exercício do poder de polícia não apenas na área inserida dentro da UC, mas também em seu entorno, a fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas e, ainda, garantir a defesa dessas áreas protegidas". ICMBIO (p. 36) "O ICMBio, a seu turno, assim como o IBAMA, deveria ter garantido o respeito à integridade física da REBIO DO ARVOREDO (UC federal cuja Zona de Amortecimento é lindeira à LAGOA DO PERI) e da APA DA BALEIA FRANCA (UC federal cujos limites estão justapostos àquela localidade - Decreto federal s/nº, de 14.9.2000, arts. 1º, 3º, caput e incs. V, VI e X, 4º, 6º e 7º), ou, pelo menos, deveria ter exercitado suas atribuições fiscalizatórias, a teor do artigo 1º do Decreto de criação da APA DA BALEIA FRANCA". Apesar disso, o próprio MPF pontua ( 1.1 ): A despeito de a LAGOA DO PERI (reservatório e principal fonte para captação e abastecimento de água para a região sul e leste da Ilha de Florianópolis) ser um corpo hídrico de domínio estadual , suas águas percorrem o Rio Sangradouro, que sofre influência de marés e deságua no mar. (p. 32) Mas, em vez de adotarem alguma medida efetiva, o IBAMA e o ICMBio optam por direcionar ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS a atribuição para a recuperação das áreas afetadas . Ao final, NADA de efetivo é feito para proteger e recuperar o Meio Ambiente local. (p. 34) (Grifei) Depreende-se que a Lagoa do Peri, área que se busca preservar sob o aspecto ambiental, trata-se, segundo o MPF, de corpo hídrico que não é de domínio federal. O local foi protegido a partir da edição da Lei Municipal de Florianópolis nº 10.530/2019 que criou a Unidade de Conservação Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri (MONA DA LAGOA DO PERI), com expressa indicação de que o " MONA da Lagoa do Peri fica vinculado à Fundação Municipal do Meio Ambiente (FLORAM) , a quem caberá a gestão técnica, administrativa e operacional da Unidade de Conservação" (art. 3º - Grifei). Não remanescem dúvidas - inclusive por expressa vinculação legal, conforme dispõe a Lei nº 10.530/2019 - que a titularidade do MONA da Lagoa do Peri compete ao Município de Florianópolis, a partir da atuação da FLORAM. Trata-se de constatação que se verifica inclusive no endereço eletrônico da Prefeitura Municipal de Florianópolis, consultado nesta data, indicando que a Gestão do Programa no local compete à FLORAM e referindo, no Plano de Manejo do Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri , o histórico protetivo da Lagoa do Peri: Em 1976, percebendo a importância do manancial hídrico, o município de Florianópolis realizou o tombamento da Bacia Hidrográfica da Lagoa do Peri por meio do Decreto Municipal nº 1.408/1976 (Florianópolis, 1976), cujos limites foram utilizados para a criação da UC pela Lei Municipal nº 1.828/1981 (Florianópolis, 1981), denominada Parque Municipal da Lagoa do Peri, sendo a primeira UC municipal, com o principal objetivo de conservação do recurso hídrico. Com características peculiares, a UC foi regulamentada pelo Decreto Municipal nº 91/1982 (Florianópolis, 1982), que dispôs sobre o zoneamento da área, os usos definidos para as populações tradicionais e os usos públicos de lazer, de modo a compatibilizá-los com a proteção das paisagens, da flora, da fauna e dos ecossistemas. O dispositivo estabeleceu também regramentos para o uso e ocupação do solo, bem como para seu parcelamento e edificações, buscando compatibilizar esses usos com a manutenção da paisagem e seus processos ecológicos. Ao longo do processo de implantação da UC, então Parque Municipal da Lagoa do Peri, devido a vários fatores como suas dimensões e complexidade intrínseca, falta de implementação pelo poder público e as profundas transfor - mações ocorridas na cidade, houve êxitos e equívocos, tanto por parte da gestão pública, como por parte de proprietários, moradores e usuários. Somente em 2007 foi criado seu Conselho Gestor e, a partir de então, o debate se concentrou na necessidade de adequação ao SNUC, pois a categoria “Parque Natural” não permite a propriedade privada e os respectivos usos historicamente existentes e reconhecidos no interior da UC pelas comunidades tradicionais do Sertão do Ribeirão e Porto do Contrato. Desta maneira, surgiu a proposta de recategorização para Monumento Natural, fato que ganhou corpo com a criação da Comissão Especial para Adequa - ção das Unidades de Conservação (CEAUC), com a Portaria SMAD 3.167/2013 (Florianópolis, 2013), e com a retomada dos trabalhos do conselho gestor em 2015. Assim, após rigoroso estudo técnico e ampla participação social, em 2018 foi encaminhada a proposta de mudança de categoria e de alteração dos limites que culminou no Projeto de Lei nº 17.493/2018 e, posteriormente, na Lei Municipal nº 10.530/2019 (Florianópolis, 2019a). Verifica-se que o local foi historicamente submetido à competência municipal. Consequentemente, mitiga-se a ampliação do escopo protetivo como requereu o MPF, pois a alegação de que o Município ou a FLORAM não direcionam os devidos cuidados à região não justifica, por si só, sem provas robustas nesse sentido, a propositura da ação em face de outros entes que não contribuíram objetivamente para a ação ou para a omissão que, em tese, geraram os alegados danos ou riscos ambientais. Não remanescem dúvidas acerca da importância da atuação conjunta de todos os entes da Federação para a proteção ambiental, inclusive porque se trata de competência constitucional comum. Assim, como já decidiu o STJ, "diante de uma infração ambiental, os agentes de fiscalização ambiental federal, estadual ou municipal terão o dever de agir imediatamente, obstando a perpetuação da infração" (STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp 1.499.874/SC, Rel. Mauro Campbell Marques, julgamento: 19/11/2019, publicação: 22/11/2019). Isso não significa, entretanto, que, a pretexto de implementar uma atuação conjunta, possam ser suplantadas competências legais, pois mesmo a proteção ambiental - cujo interesse é de todos os entes federativos - encontra como limite a titularidade do bem afetado. O entendimento desta Corte correlaciona a responsabilidade civil pelo dano ambiental - e, consequentemente, também a legitimidade passiva do suposto responsável - (i) à titularidade do bem e (ii) à ação ou omissão que foram decisivas para a configuração do dano. Nesse sentido: AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AMBIENTAIS. TERRENO DE MARINHA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE. 1. A legitimidade passiva ad causam consiste na pertinência subjetiva da parte à relação de direito material objeto da lide e, como toda e qualquer condição da ação, é aferível com base na narrativa veiculada na petição inicial (teoria da asserção), bastando, para sua configuração, que os argumentos lá deduzidos permitam a inferência, em um exame puramente abstrato, de que o réu pode ser o sujeito responsável pela violação do direito subjetivo do autor. 2. O poder de polícia do órgão ambiental não impede ou não tolhe a intervenção judicial, seja quando a Administração Pública extrapola, seja quando se omite, total ou parcialmente, na aplicação de incumbências preceituadas, máxime as de licenciamento fiscalização e repressão de ilícitos (STJ, 2ª Turma, REsp 1.745.033/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 20/10/2020, DJe 17/12/2021). 3. Demonstrado que o dano ambiental ocorreu em área de preservação permanente e de propriedade da União , bem como que a ocupação irregular resultou de ações omissivas do ente federal, impõe-se sua responsabilização. (TRF4, AC 5006129-77.2021.4.04.7201, 4ª Turma, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, julgado em 02/10/2024) Grifei. [...] A legitimidade passiva da União decorre da infração ambiental ter ocorrido em terreno de marinha , bem do ente federal, ex vi do art. 20, VI e VII, da Constituição Federal e pela caracterização omissiva no dever de fiscalizar , independemente do local onde o dano tenha sido perpetrado , além de ter afetado o livre acesso à praia, bem integrante do domínio público da União, o que evidencia sobremaneira o interesse federal na sua salvaguarda, inclusive com fiscalização e punição de infrações administrativas de degradação. [...](TRF4, AC 5027902-28.2014.4.04.7201, 4ª Turma, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 12/07/2023) Grifei. A situação posta em exame, como visto, apresenta particularidades que não podem ser meramente desconsideradas. A área que se sujeita aos alegados riscos ambientais é de titularidade do Município de Florianópolis, com regramento próprio e perspectiva protetiva específica. Não se trata, portanto, de local sujeito ao controle da União e, portanto, está igualmente afastado do policiamento administrativo de autarquias federais. Há, no caso dos autos, dificuldade inclusive em compreender os limites da proteção ambiental desejada pelo MPF, principalmente quando se verifica que os possíveis danos ou riscos são hipotéticos e potenciais, sem que se possa afirmar, a partir da narrativa da petição inicial ( 1.1 ), que efetivamente decorrem de uma ação ou de uma omissão da União, do IBAMA, do ICMBIO e mesmo da ANA. A premissa adotada pelo MPF pressupõe - "a despeito de a LAGOA DO PERI ser um um corpo hídrico de domínio estadual" ( 1.1 ) - que as suas águas podem sofrer influência "em parte da sua extensão" de marés e isso teria, em tese, o potencial de afetar áreas contíguas, essas sim sujeitas à proteção ambiental da União, do ICMBIO e do IBAMA: Assim, por exemplo, no caso da presença de saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii tem potencialidade de contaminar moluscos e outros organismos que tenham relevância ecológica, tais como aqueles que compõem a fauna ou a flora integrante da UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL DA RESERVA BIOLÓGICA MARINHA – REBIO DO ARVOREDO ou da ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL – APA DA BALEIA FRANCA ou que, mesmo não a integrando, sejam de algum modo ecologicamente relevantes para essas UCs. Trata-se, obviamente, de hipótese sem alicerce probatório robusto para que se possa avaliar, de forma objetiva, o risco a que as áreas sujeitas à proteção ambiental da União estão submetidas. Essa pressuposição persiste em toda a narrativa da petição inicial: No dia 14.5.2021, notícia jornalística relatou que pesquisadores do Laboratório de Ficologia da UFSC – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA constataram a presença de quantidades elevadas de uma toxina proveniente de cianobactérias na LAGOA DO PERI e a possibilidade de essa substância atingir o mar, por meio da Praia do Matadeiro. O Parecer Técnico nº 749/2021 conclui que o documento subscrito pelo Professor Leonardo Rubi Rörig não esclarece se cianobactérias da LAGOA DO PERI e suas toxinas foram transportadas até o mar , tampouco se podem afetar organismos aquáticos na natureza. Em 15.10.2021, a Assessoria Pericial do MPF elaborou o Laudo Técnico nº 1.197/2021-ANPMA/CNP, que conclui que as pesquisas científicas realizadas pelo LAFIC indicam, em tese, um potencial risco de consumo de cionobactéria tóxica proveniente da LAGOA DO PERI por moluscos bivalves existentes na Praia do Matadeiro . Porém, em que pese esse risco potencial, não há dados científicos robustos sobre a capacidade de sobrevivência de Raphidiopsis raciborskii em ambientes tipicamente marinhos. a FLORAM elaborou o Parecer Técnico nº 933/2021-DILIC, que consigna que há um risco potencial de contaminação de moluscos , que possuem a capacidade de bioacumular substâncias diversas, o que poderia levar a concentrações de ficotoxinas significativamente mais elevadas do que as encontradas nas águas. a despeito do risco de exposição de moluscos comestíveis na Praia do Matadeiro e circunvizinhanças às toxinas produzidas por cianobactérias que florescem na LAGOA DO PERI haver sido evidenciado experimentalmente, não há confirmação da acumulação das toxinas naqueles animais, mediante análises diretas em amostras de moluscos colhidos no ambiente, tampouco estudos que estabeleçam o alcance do aporte da biomassa tóxica oriunda da LAGOA DO PERI na região costeira adjacente. Essas citações, retiradas da petição inicial ( 1.1 ), demonstram que a alegada legitimidade passiva da União (e, por reflexo, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA) decorre de uma suposição de que pode haver uma contaminação, supostamente já existente na Lagoa do Peri (até mesmo quanto a isso remanescem dúvidas consideráveis), na região costeira adjacente, sujeita, em tese, ao poder de polícia dos corréus, ora recorrentes. Sobreleva-se, a partir disso, a necessidade de adequada compreensão dos limites que possibilitam a atuação fiscalizatória da União em matéria ambiental, perspectiva que alcança, observadas as particularidades inerentes a cada órgão e entidade administrativa, não apenas a União mas também o IBAMA, o ICMBIO e, no caso dos autos, a própria ANA. Essa é a dicção do art. 17, § 3º, da Lei Complementar nº 140/2011: Art. 17. Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada. § 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput. Sobre essa norma se manifestou o STF (ADI 4.757. Rel. Rosa Weber. Julgamento: 13/12/2022. Publicação: 17/03/2023), consignando que "referida legislação não trata sobre os deveres de tutela ambiental de forma genérica e ampla, como disciplina o art. 225, §1º, IV, tampouco regulamenta o agir legislativo, marcado pela repartição concorrente de competências, inclusive no tocante à normatização do licenciamento em si". Em razão disso, concluiu o STF que " o nível de ação do agir político-administrativo nos domínios das competências partilhadas, próprio do modelo do federalismo cooperativo, deve ser medido pelo princípio da subsidiariedade . Ou seja, na conformação dos arranjos cooperativos, a ação do ente social ou político maior no menor, justifica-se quando comprovada a incapacidade institucional desse e demonstrada a eficácia protetiva daquele" . A consequência é inequívoca: " Um dos princípios fundamentais do funcionamento do sistema legal de tutela do meio ambiente é o da atuação supletiva do órgão federal, seja em matéria de licenciamento seja em matéria de controle e fiscalização das atividades ou empreendimentos potencialmente poluidores ou degradantes do meio ambiente . No exercício da cooperação administrativa, portanto, cabe atuação suplementar – ainda que não conflitiva – da União com a dos órgãos estadual e municipal". Não basta, portanto, ampliar imotivadamente a atuação administrativa a fim de abarcar, a um só tempo, ações estaduais, municipais e federais. Como visto, a tutela ambiental, segundo o STF, alicerça-se na premissa de um federalismo cooperativo, o que implica, por sua vez, que a atuação de órgãos ou entidades federais - quando já há órgãos ou entidades estaduais ou municipais com competência ambiental regularmente instituídos - dá-se em caráter supletivo . A supletividade exige, a seu turno, comprovação suficiente de que os órgãos ou entidades estaduais e municipais não atuaram a partir das competências legalmente fixadas. Isso autorizaria, em tese, a ação supletiva da União e, por via reflexa, do IBAMA, do ICMBIO e, in casu , da ANA. Esa comprovação, entretanto, não resta evidenciada no caso dos autos, já que, como visto, a indicação dos corréus foi efetuada a partir de potenciais riscos que poderiam, em tese, afetar - e disso não há sequer indícios robustos - áreas que a União, por seus órgãos ou pelas respectivas entidades, deveria proteger. Deve ser ponderado, ainda, que o STF assentou a importância de respeito às diversidades locais, inclusive como critério interpretativo, como ilustra a ADI 5.996 (Rel. Alexandre de Moraes, julgamento: 15/04/2020, publicação: 30/04/2020): O princípio geral que norteia a repartição de competência entre os entes componentes do Estado Federal brasileiro, portanto, é o princípio da predominância do interesse, não apenas para as matérias cuja definição foi preestabelecida pelo texto constitucional, mas também em termos de interpretação em hipóteses que envolvem várias e diversas matérias, como na presente ação direta de inconstitucionalidade. (...) Essa opção inicial do legislador constituinte, ao centralizar nos poderes enumerados da União (CF, artigo 22) a maioria das matérias legislativas mais importantes, contudo, não afastou da Constituição de 1988 os princípios básicos de nossa tradição republicana federalista, que gravita em torno do princípio da autonomia, da participação política e da existência de competências legislativas próprias dos Estados/Distrito Federal e Municípios, indicando ao intérprete a necessidade de aplicá-los como vetores principais em cada hipótese concreta em que haja a necessidade de análise da predominância do interesse, para que se garanta a manutenção, fortalecimento e, principalmente, o equilíbrio federativo (GERALDO ATALIBA. República e constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 10), que se caracteriza pelo respeito às diversidades locais, como bem salientado por MICHAEL J. MALBIN, ao apontar que a intenção dos elaboradores da Carta Constitucional Americana foi justamente estimular e incentivar a diversidade, transcendendo as facções e trabalhando pelo bem comum (A ordem constitucional americana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987, p. 144), consagrando, ainda, a pluralidade de centros locais de poder, com autonomia de autogoverno e autoadministração, para que se reforçasse a ideia de preservação da autonomia na elaboração do federalismo, como salientado por ALEXIS DE TOCQUEVILLE, ao comentar a formação da nação americana (Democracia na América: leis e costumes. São Paulo: Martins Fontes, 1988. p. 37 e ss.), que serviu de modelo à nossa Primeira Constituição Republicana em 1891. Nos regimes federalistas, respeitadas as opções realizadas pelo legislador constituinte e previamente estabelecidas no próprio texto constitucional, quando surgem dúvidas sobre a distribuição de competências e, consequentemente, a necessidade de definição do ente federativo competente para legislar sobre determinado e específico assunto, que engloba uma ou várias matérias com previsão ou reflexos em diversos ramos do Direito, caberá ao interprete priorizar o fortalecimento das autonomias locais e o respeito às suas diversidades como pontos caracterizadores e asseguradores do convívio no Estado Federal , que garantam o imprescindível equilíbrio federativo (...) Grifei. A partir desses parâmetros, depreende-se a necessidade de valorização das autonomias locais - e de suas respectivas competências constitucionais e legais - para atuarem em proteção ao meio ambiente. Não há como simplesmente equiparar, nos moldes desejados pela petição inicial, as atribuições da União, do IBAMA, do ICMBIO, da ANA, do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento. Cada órgão/entidade possui atribuições específicas que, sob pena de enfraquecimento da própria proteção ambiental, devem ser minimamente observadas. Como critérios para a fixação de competência, em casos dessa natureza, sobreleva-se a importância de adequadamente sopesar (i) a supletividade da atuação dos órgãos federais, o que decorre do modelo de federalismo cooperativo e (ii) a priorização das autonomias locais. O cotejo de tais fatores (supletividade e priorização das autonomias locais) possibilita estabelecer um critério geral em matéria de responsabilidade ambiental: a indicação de órgãos e entidades federais como responsáveis por ações ou omissões de natureza ambiental, quando não se trata de bem de titularidade federal, revela-se cabível se houver a comprovação, ao menos indiciária, da incapacidade institucional dos órgãos ou entidades estaduais ou municipais, no âmbito de suas respectivas competências. Somente se restar evidenciada essa situação justificar-se-á a ação do ente social ou político maior no menor, conforme entendimento do STF. No caso dos autos, não há, sob qualquer aspecto, efetiva comprovação de que os órgãos ou entidades estaduais ou municipais estejam desempenhando de modo insatisfatório as suas atribuições legais. Não há como afirmar, dada a ausência de indicativos robustos nesse sentido, a incapacidade institucional, in casu , do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento para a tutela ambiental na Lagoa do Peri. Evidenciada, assim, a ilegitimidade passiva da União , do IBAMA , do ICMBIO e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA . Trata-se de questão que, embora tenha sido apresentada pelas partes em suas razões recursais, constitui matéria de ordem pública, podendo, em razão disso, ser arguida e conhecida em qualquer grau de jurisdição, até mesmo de ofício ( v.g. TRF4, AC 5013560-05.2020.4.04.7200, 1ª Turma, Relator LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, julgado em 15/10/2024). Verifico, por outro lado, que a ação de origem foi proposta também em face, como já dito, do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento e, em relação a eles, seja em razão (i) da premissa do federalismo cooperativo, seja por força (ii) da priorização das autonomias locais, seja em virtude (iii) da titularidade do MONA da Lagoa do Peri, não há que se falar em ilegitimidade passiva. Assenta-se, assim, a competência da Justiça Estadual para o processo e julgamento da ação de origem, perspectiva que se dá, inclusive, a partir do que dispõem as Súmulas 150, 224 e 254, todas do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, declino da competência em favor da Justiça Estadual de Santa Catarina e determino a remessa dos autos para a Comarca de Florianópolis / SC. Intimem-se.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 5019643-90.2025.4.03.6100

ID: 328870787

Tribunal: TRF3 Órgão: 17ª Vara Cível Federal de São Paulo Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 5019643-90.2025.4.03.6100

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

ADVENTURE BR DESIGN E PROJETOS DE LOCACOES LTDA

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

DOUGLAS FERREIRA DA COSTA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5019643-90.2025.4.03.6100 / 17ª Vara Cível Federal de São Paulo IMPETRANTE: ADVENTURE BR DESIGN E PROJETOS DE LOCACOES LTDA Advogado do(a) IMPETRANTE: DOUGLAS FERR… MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5019643-90.2025.4.03.6100 / 17ª Vara Cível Federal de São Paulo IMPETRANTE: ADVENTURE BR DESIGN E PROJETOS DE LOCACOES LTDA Advogado do(a) IMPETRANTE: DOUGLAS FERREIRA DA COSTA - SP289168 IMPETRADO: DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO) SUCEDIDO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL D E C I S Ã O MANDADO DE SEGURANÇA. PERSE. LEI 14.859/2024. TETO DE GASTOS COM O BENEFÍCIO FISCAL. ATO DECLARATÓRIO RFB N. 02/2025. ATINGIMENTO DO VALOR MÁXIMO. TÉRMINO DO BENEFÍCIO. ISENÇÃO SEM CONDIÇÃO ESTABELECIDA. POSSIBILIDADE DE REVOGAÇÃO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. LIMINAR INDEFERIDA. Trata-se de mandado de segurança impetrado por ADVENTURE BR DESIGN E PROJETOS DE LOCAÇÕES LTDA., em face do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SÃO PAULO visando assegurar a continuidade da fruição do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE até 03/2027, nos termos da redação original do art. 4º da Lei nº 14.148/2021 e Portaria ME nº 7.163/2021, suspendendo a exigibilidade dos débitos de IRPJ/CSLL/PIS/COFINS (alíquota zero) e afastando-se as previsões trazidas pela Lei 14.859/2024 e pelo ADE RFB 02/2025. Subsidiariamente, requerer a concessão da medida liminar, para suspender a exigibilidade dos débitos tributários do IRPJ até janeiro de 2026 do PIS/COFINS/CSLL até junho de 2025, em virtude dos dos princípios da anterioridade geral e nonagesimal, respectivamente. É o relatório. Decido. A parte impetrante questiona as alterações introduzidas no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE pela Lei nº 14.859, de 23/05/2024. O PERSE foi instituído pela Lei nº 14.148/2021 com o objetivo de mitigar as perdas do setor de eventos oriundas do estado de calamidade pública da COVID 19. Entre os vários dispositivos, o programa estabeleceu a redução a zero das alíquotas dos tributos PIS/PASEP, COFINS, CSLL e IRPJ “pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei”, conforme previsto no art. 4º da Lei n. 14.148/2021. Antes do término do prazo de 60 (sessenta) meses, a Medida Provisória nº 1.202, de 29/12/2023, revogou justamente o art. 4º da Lei nº 14.148/2021, eliminando a previsão da alíquota zero. A referida medida provisória continha dispositivos que respeitavam os princípios da anualidade e da anterioridade nonagesimal. Fruto do debate legislativo iniciado pela MP nº 1.202/2023, a Lei nº 14.859, de 23/05/2024, modificou os dispositivos da Lei nº 14.148/2021, alterando as regras do benefício fiscal, limitando-o e estabelecendo nova regra para o seu término. A parte impetrante questiona as alterações especialmente o disposto no artigo 4º-A, introduzido pela Lei nº 14.859/24, que introduziu um limite financeiro global do benefício fiscal, nos seguintes termos: Art. 4º-A. O benefício fiscal estabelecido no art. 4º terá o seu custo fiscal de gasto tributário fixado, nos meses de abril de 2024 a dezembro de 2026, no valor máximo de R$ 15.000.000.000,00 (quinze bilhões de reais), o qual será demonstrado pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil em relatórios bimestrais de acompanhamento, contendo exclusivamente os valores da redução dos tributos das pessoas jurídicas de que trata o art. 4º que foram consideradas habilitadas na forma do art. 4º-B desta Lei, com desagregação dos valores por item da CNAE e por forma de apuração da base de cálculo do IRPJ, sendo discriminados no relatório os valores de redução de tributos que sejam objeto de discussão judicial não transitada em julgado, ficando o benefício fiscal extinto a partir do mês subsequente àquele em que for demonstrado pelo Poder Executivo em audiência pública do Congresso Nacional que o custo fiscal acumulado atingiu o limite fixado. Por sua vez, o Ato Declaratório Executivo RFB nº 2, de 21 de março de 2025, tornou público o atingimento do limite previsto no art. 4º-A da Lei nº 14.148/21, na redação acima transcrita. Tal ato também é alvo de questionamento. Sem razão a parte impetrante. As modificações na legislação tributária aumentando, reduzindo ou restabelecendo a carga tributária são previstas desde que respeitado o devido processo legislativo. A rigor, a isenção é instituto diverso da alíquota zero aqui tratada. Enquanto a primeira afasta a hipótese de incidência da norma tributária (antecedente), a segunda opera no elemento quantitativo do consequente da norma. No entanto, em termos práticos, as consequências para as finanças dos contribuintes são as mesmas, motivo pelo qual aprecio a revogação do dispositivo como se fosse uma isenção, cujo devido processo legislativo é mais rigoroso na proteção do contribuinte. Assim, apreciamos a revogação das regras do PERSE inicialmente previstas na redação original da Lei nº 14.148/21, como se fosse uma revogação de isenção. O artigo 178 do CTN trata da possibilidade de revogação das isenções, nos seguintes termos: "Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104." As isenções podem ser revogadas, salvo na concomitância de dois requisitos: concessão por prazo certo e em função de determinadas condições. São dois requisitos cumulativos. A ausência de um deles possibilita a revogação. No caso em tela, a “isenção” pode ter sido concedida por prazo certo, mas não foram impostas condições ao contribuinte beneficiado. O instituto da condição está definido no direito brasileiro pelo artigo 121 do Código Civil nos seguintes termos: "Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto." Uma condição refere-se a um fato futuro que poderá ocorrer e não fato passado. A lição de Sílvio de Salvo Venosa é bem didática a respeito: "A condição deve referir-se a fato futuro. Fato passado não pode constituir-se condição. Se disser respeito a fato pretérito, o fato já ocorreu ou deixou de ocorrer. Se o fato ocorreu, o negócio deixou de ser condicional, tornando-se puro ou simples." (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral, 20 ed. São Paulo: Atlas, 2020, pg. 513.) Uma isenção sujeita à condições tem sua eficácia sujeita a um evento futuro e incerto. Exemplo simplório de uma isenção condicionada seria a concessão de isenção de IPTU por cinco anos condicionada à instalação de um estabelecimento industrial no município no referido prazo. Em tal hipótese, estaria vedada a revogação antecipada da isenção, pois configurados os dois requisitos da exceção à regra geral prevista no artigo 178 do CTN. A impetrante confunde dois institutos diversos, o requisito legal com uma condição. A habilitação ao PERSE não exige a efetivação de contraprestações futuras pelo contribuinte, como, por exemplo, a realização de investimentos ou construção de empreendimentos em determinados locais. O próprio programa tem como causa eventos passados, os prejuízos do setor de eventos na pandemia da COVID COVID-19. O contribuinte ter atividade vinculada ao setor de eventos e ter tido prejuízos com a pandemia, por exemplo, são requisitos legais e não condições. Os benefícios fiscais estabelecidos no âmbito do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - PERSE possuem natureza de isenções simples, porque não estabelecem condições onerosas ao beneficiário a fim de que possa ter direito de usufrui-los. Como consequência é possível a modificação ou revogação antecipada, nos exatos termos do permissivo contido no art. 178 do CTN. Não há direito adquirido ao regime jurídico estabelecido pela redação original da Lei nº 14.148/21. As alterações introduzidas pela Lei nº 14.859/24, ora questionadas, foram fruto da vontade do legislador e não violam nem a Constituição Federal, nem o Código Tributário Nacional. A previsão de limite do custo total do PERSE tem respaldo na própria Constituição Federal, em seu art. 113 do ADCT, assim redigido. Art. 113. A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro. Há um debate nacional sobre desequilíbrio das contas públicas, déficit fiscal etc. Neste cenário, há também um clamor público para que o Estado brasileiro seja transparente em relação às suas renúncias fiscais. Em relação ao PERSE, o legislador decidiu impor um limite quantitativo ao benefício concedido compatível com o orçamento aprovado. É uma medida decorrente da tão clamada responsabilidade fiscal. Em relação aos questionamentos sobre o efetivo atingimento do limite máximo de renúncia fiscal do PERSE, não vislumbro qualquer vício. A apuração dos tributos envolvidos é toda mensal, a previsão de receita por projeção é técnica de contabilidade pública reconhecida e praticada há mais de um século nos orçamentos públicos. Verifico inclusive que no ora atacado Ato Declaratório Executivo RFB nº 2, de 21 de março de 2025, há um anexo no qual constam os valores da renúncia fiscal por empresa contribuinte beneficiária. Nos limites da cognição judicial compatível com a deliberação sobre liminar em mandado de segurança, impossível chegar a uma conclusão contrária aos cálculos governamentais, pois requereria uma autêntica auditoria pública. Vale aqui a presunção de legitimidade dos atos administrativos. Registro também que a jurisprudência do E. TRF da 3ª Região tem sido construída em sentido oposto à tese principal apresentada pela parte impetrante.: AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. BENEFÍCIOS DO PERSE. MP 1.202/2023. LEGALIDADE DA REVOGAÇÃO. ISENÇÃO SIMPLES. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL E DA SÚMULA 544/STF. RECURSO PROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. 1 – Para concessão de medida liminar é necessária a demonstração do fumus boni iuris e do periculum in mora. 2 - A Lei n.º 14.148/2021 estabeleceu ações emergenciais e temporárias destinadas ao setor de eventos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de isolamento ou de quarentena realizadas para enfrentamento da pandemia da Covid-19. 3 - Instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos – PERSE, com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos pudesse mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública. 4 - Dentre os benefícios do Programa foi prevista, inicialmente, a redução a zero 0% (zero por cento), pelo prazo de 60 (sessenta) meses, das alíquotas da tributação de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ, incidentes sobre as receitas e o resultado auferido pelas pessoas jurídicas do setor de eventos. 5 - Posteriormente, com a vigência da Medida Provisória n.º 1.147/2022, convertida na Lei n.º 14.592/2023, referida redução a zero 0% (zero por cento) das alíquotas tributárias passou a incidir, restritivamente, sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos nas atividades relacionadas no ato do Ministério da Economia. 6 - A fim de delimitar as pessoas jurídicas do denominado setor de eventos, a Lei n.º 14.148/2021 estabeleceu o o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), disciplinando-o em seu artigo 2º. 7 - Com vistas à regulamentação da lei destacada, com amparo no §2º do artigo 2º, em 23/01/2021, foi publicada a Portaria do Ministério da Economia nº 7.163/21, que definiu os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) para determinação das empresas destinatárias da benesse fiscal. 8 - Ocorre que, diante da modificação do artigo 4º da Lei do PERSE pelo advento da Medida Provisória nº 1.147/22 – delimitando o benefício para “as receitas e os resultados das atividades do setor de eventos” -, em 02/01/2023, por orientação do §4º do mesmo dispositivo, em substituição à Portaria ME nº 7.163/21, foi publicada nova Portaria do Ministério da Economia, de nº 11.266/22, que excluiu alguns códigos CNAEs do benefício fiscal previsto. 9 - O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal. 10 - Na seara tributária, isso se reflete na vedação do Estado de promover modificações legislativas repentinas, com efeitos concretos imediatos, que elevem a carga tributária. Assegura, ainda, ao contribuinte, um tempo mínimo para conhecer a modificação na legislação tributária e planejar a atividade econômica para suportar seus efeitos. 11 - É justamente para impedir tais “surpresas”, que o artigo 150, III, da Constituição Federal confere ao contribuinte a proteção dos princípios da anterioridade genérica e da anterioridade. 12 - Em sua modalidade genérica, o princípio da anterioridade veda que a lei que institua ou majore tributo produza efeitos no mesmo exercício financeiro em que ela foi publicada, nos termos do artigo 150, III, alínea ‘b’ da Constituição Federal. Já de acordo com o princípio da anterioridade nonagesimal, a lei que institui ou majora tributos só produz efeitos após 90 (noventa) dias da data de sua publicação. 13 - A matéria em questão, inicialmente, foi apenas tratada como limitação ao poder de tributar, consoante decorre explicitamente do texto constitucional. No entanto, passou-se também a questionar a aplicação principiológica para os benefícios fiscais concedidos. 14 - O debate faz sentido na medida em que a retirada de benesses fiscais - tal como a criação ou aumento dos tributos –, da mesma forma, é passível de gerar surpresa aos contribuintes, caracterizando, na realidade, espécie de majoração indireta de tributos. 15 - Não se questiona a possibilidade de eventual alteração legislativa ou mesmo da reedição de atos infralegais que tenham por consequência a supressão de benefícios, seja pela alteração do entendimento do Parlamento ou mesmo por diversa compreensão da Administração. 16 - A bem da verdade, compreende-se com naturalidade que se sucedam modificações normativas, inclusive, em curto espaço tempo, o que decorre de novos cenários e demandas. Todavia, preza-se, apenas, pela aplicação dos mesmos princípios constitucionais para situação equivalente, isto é, de exasperação da carga tributária. 17 - Assim, a Lei que estabelece restrição a benefício fiscal, que implique na sua redução ou revogação, está sujeita ao princípio da anterioridade, seja a anterioridade de exercício (artigo 150, III, b, da CF), seja a anterioridade nonagesimal (alínea c), de acordo com o respectivo tributo (§ 1º), conforme entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. 18 - Por seu turno, dispõe o artigo 178 do Código Tributário Nacional que “a isenção, salvo se concedida por prazo certo ou em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei a qualquer tempo, observado o disposto no inc. III do CTN, art. 104”. Exsurgem, portanto, duas modalidades de isenção: as simples e as onerosas. 19 - As isenções simples são passíveis de revogação a qualquer tempo, apenas sendo de rigor a observância dos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. 20 - Já as isenções onerosas, por sua vez, são concedidas por um lapso temporal definido e, necessariamente, para a sua caracterização, devem vir acompanhadas de determinadas ações do seu beneficiário para que possam dela usufruir (“em função de determinadas condições”). 21 - Em razão de tais características, isto é, tempo determinado e contrapartida do contribuinte, não é possível se falar em revogação da isenção onerosa, devido à proteção conferida ao direito adquirido de seu beneficiário. 22 - Como elemento chave na caracterização das isenções onerosas e com conceito jurídico bem definido no ordenamento pátrio, as condições não são diferentes na esfera tributária e também se caracterizam como eventos futuros e incertos. 23 - Figura como requisito legal (e não condição) para a obtenção das benesses fiscais o exercício de atividades no setor de eventos na data de publicação da Lei instituidora do PERSE. 24 - No caso em apreço, não se visualiza a suposta ilegalidade na edição da Medida Provisória nº 1.202, de dezembro de 2023. 25 - A rigor, não foi estabelecido na legislação discutida qualquer ônus às empresas para a fruição dos benefícios previstos, o que implica em reconhecer a ausência de violação do artigo 178 do CTN e de distinção da situação abrangida pela Súmula 544 do STF (“Isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas”). 26 - Portanto, como isenção simples, não há qualquer sentido em se falar em hipotético direito adquirido de usufruir dos benefícios do PERSE pelo prazo quinquenal em detrimento da nova legislação, que regularmente a revogou. 27 - Assim, em um juízo de cognição sumária, a decisão agravada não deve subsistir. 28 - Agravo de instrumento provido. Prejudicado o agravo interno". (TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5010607-25.2024.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 12/08/2024, Intimação via sistema DATA: 12/08/2024) - Por fim, quanto ao pedido subsidiário da impetrante, também não assiste razão à impetrante. Para evitar surpresas e garantir a segurança jurídica ao contribuinte, a Constituição estabeleceu o princípio da anterioridade, ora evocado pelo impetrante para fundamentar seu pedido subsidiário e previsto em seu art. 150, III : Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) III - cobrar tributos: a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado; b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (grifei) Em relação à contribuições sociais (PIS/COFINS/CSLL), há dispositivo próprio no art. 195, § 6º, assim redigido: Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: § 6º As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b". (grifei) O princípio da anterioridade tributária, nos remete à eficácia da lei. A seu respeito, a lição de Roque Antonio Carrazza é lapidar: "Mas, que pretende significar a precitada norma constitucional? Simplesmente, que a lei que cria ou amenta tributo - esta é a regra geral -, ao entrar em vigor, fica com sua eficácia suspensa paralisada até o início do próximo exercício financeiro, quando, aí, sim, incidirá, ou seja, passará a produzir todos os efeitos, na ordem jurídica." (CARRAZZA, Antonio Roque. Curso de direito constitucional tributário, 19º ed. São Paulo: Malheiros, 2003, pg 172). Portanto, pelo princípio da anterioridade, após a publicação, a lei tributária entra em vigor, mas tem sua eficácia suspensa pelos períodos previstos na Constituição. O princípio tem como referência a data da publicação da lei. No caso concreto em que se questiona a Lei nº 14.859, de 22/05/2024, publicada em 23/05/2024, por ter inserido o art. 4º-A da Lei 14.148/2021, já houve a observância da anterioridade geral, para o IRPJ, bem como da anterioridade nonagesimal para a CSLL, a PIS e a COFINS, pois o prazo tem como termo inicial de contagem a entrada em vigor da lei. É a data da publicação da lei que deve servir de parâmetro para verificação da anterioridade tributária e não o Ato Declaratório Executivo RFB nº 2, de 21 de março de 2025, inclusive porque o art. 4º-A da Lei 14.148/2021, incluído pela Lei nº 14.859/2024, já previa que seriam feitos relatórios bimestrais para verificação do limite de gasto e que ficaria “o benefício fiscal extinto a partir do mês subsequente àquele em que for demonstrado pelo Poder Executivo em audiência pública do Congresso Nacional que o custo fiscal acumulado atingiu o limite fixado”. Não houve qualquer surpresa por parte do contribuinte, as novas regras sobre o término do benefício estavam em vigor desde 22/05/2024, ou seja há quase um ano atrás. Isso posto, INDEFIRO o pedido liminar. À CPE: Intimem-se. Notifique a autoridade coatora, nos termos do art. 7ª, inciso I, da Lei 12.016/09 para informações em dez dias. Dê-se ciência do feito ao representante legal, nos termos do art. 7º, inciso II, da Lei 12.016/09. Após as informações, abra-se vista ao Ministério Público Federal e, por derradeiro, tornem os autos conclusos para sentença. SÃO PAULO, 17 de julho de 2025. mv

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 5019929-08.2025.4.04.0000

ID: 325659180

Tribunal: TRF4 Órgão: SECRETARIA DA 11a. TURMA Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 5019929-08.2025.4.04.0000

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

BRUNO ANGELI BONEMER

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

Agravo de Instrumento Nº 5019929-08.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo … Agravo de Instrumento Nº 5019929-08.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo de Instrumento: (1) 5019929-08.2025.4.04.0000 (interposto pela União); (2) 5019643-30.2025.4.04.0000 (interposto pelo IBAMA); (3) 5019645-97.2025.4.04.0000 (interposto pela ANA) e (4) 5019644-15.2025.4.04.0000 (interposto pelo ICMBIO). Os referidos Agravos de Instrumento foram interpostos em face de decisão com o seguinte teor ( 24.1 ): (...) a) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem um ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR26 sobre a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, que compreenda a bacia hidrográfica da região, incluindo os diversos elementos hídricos relevantes para a LAGOA DO PERI, a fim de, inter alia, avaliarem a capacidade de suporte da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI em relação às presentes e futuras intervenções ou empreendimentos na localidade (e.g., para garantir a compatibilidade dos parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água), bem como a identificarem as possíveis fontes de poluição e contaminação da LAGOA DO PERI, tais como ligações clandestinas na rede pluvial e lançamento direto ou indireto de efluentes não-tratados nos corpos hídricos relevantes de sua bacia hidrográfica, dentro do prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desatendimento; b) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem e implementarem um PLANO DE TRABALHO que contemple a execução de medidas de análise e fiscalização nos locais identificados naquele ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR (com, por exemplo, os parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água, as possíveis fontes de poluição e contaminação da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, etc), o qual deve ser iniciado no prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desobediência; c) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para elaborar um PLANO DE EMERGÊNCIA E CONTINGÊNCIA, com ações corretivas de curto, médio e longo prazos, sempre que se detectarem riscos à saúde (humana ou não), pelo consumo da água da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, tais como pela concentração de toxinas acima dos limites permitidos ou pela contaminação de suas águas por outros fatores de poluição, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de inobservância; d) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para garantir que as atividades das comunidades tradicionais relacionadas com a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI (tal como a pesca artesanal e a extração de mariscos) sejam realizadas sem riscos da presença de patógenos de grave repercussão à saúde, tais como as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, como, por exemplo, as medidas indicadas pelo IBAMA na Informação Técnica nº 178/2022-NUBIO-SC/DITEC-SC: d.1) Ampliação do número de sítios de monitoramento, incluindo-se pontos de análise de qualidade de água, da composição da comunidade fitoplanctônica e monitoramento de cianotoxinas no canal do Rio Sangradouro, na desembocadura do rio e em pontos estratégicos na praia do Matadeiro e Armação do Pântano do Sul, considerando as condições oceanográficas da zona de mistura na foz do rio; d.2) Monitoramento contínuo de bivalves marinhos, com amostragens periódicas na praia do Matadeiro e Armação, para avaliação do grau de acumulação de cianotoxinas nos tecidos destes organismos, com vistas à adoção de medidas sanitárias de suspensão de coleta e/ou cultivo quando os níveis destas toxinas se tornarem danosos à saúde humana; d.3) Estabelecimento de plano de análises ecotoxicológicas, para avaliação contínua dos efeitos de toxicidade de R. raciborskii em organismos chave para a alimentação da população tradicional local, incluindo moluscos, peixes, e outras espécies que sejam relevantes para a comunidade”. Em caso de recalcitrância, deverá ser imposta pena de multa diária de R$5.000,00 a cada uma das pessoas físicas responsáveis. (...) A União opõe-se à decisão a partir dos seguintes argumentos: (i) inexistência de responsabilidade sobre a água da Lagoa do Peri, pois não se trata de corpo hídrico federal, mas de unidade de conservação municipal; (ii) não há qualquer conduta comissiva ou omissiva imputada à União; (iii) a decisão proferida é genérica e não se alicerça em fundamentos fáticos e jurídicos concretos; (iv) a multa foi fixada em valor excessivo ( processo 5019929-08.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O IBAMA questiona a decisão recorrida a partir dos seguintes fundamentos: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos apresentados pelas entidades públicas, ignorando que se trata, a Lagoa do Peri, de corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) não há risco imediato de dano irreparável ou de difícil reparação; (iii) a decisão proferida ignorou que o IBAMA pode atuar somente de modo subsidiário, conforme o entendimento do STF; (iv) a competência primária em fiscalização ambiental na área em comento não compete ao IBAMA, mas à municipalidade ou ao Estado de Santa Catarina; (v) deveria ter sido observado o disposto no Tema 698/STF; (vi) a multa fixada é indevida e excessiva ( processo 5019643-30.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). A ANA - Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico alegou em seu recurso: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos deduzidos pelos corréus, indicativos de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) a ANA seria parte passiva ilegítima porque os pedidos formulados não se relacionam com as suas atribuições; (iii) inexiste risco imediato de dano irreparável; (iv) as determinações impostas são inexequíveis e desnecessárias; (v) a multa fixada é descabida e foi fixada em montante excessivo ( processo 5019645-97.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O ICMBIO , por sua vez, apresenta as seguintes razões recursais: (i) foram ignorados, pela decisão recorrida, os fatos apresentados pelas entidades públicas, comprobatórios de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) o ICMBIO seria parte parte passiva ilegítima, pois os fatos apresentados não se inserem no âmbito de suas competências; (iii) não há risco de dano irreparável no local; (iv) as imposições da decisão recorrida são inexequíveis e descabidas; (v) a multa fixada é excessiva ( processo 5019644-15.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). É o relatório. Decido. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF em face do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis , da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento , da União , do IBAMA , do ICMBIO e da ANA , com o seguinte objeto ( 1.1 ): A PROCURADORIA DA REPÚBLICA, por meio desta ação, busca garantir, entre outras medidas, que as atividades relacionadas com a coleta, o tratamento e a distribuição de água feita pela LAGOA DO PERI para consumo (humano ou não) não ofereça riscos à saúde, bem como que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, resguardando, assim, os atributos físicos, bióticos e sociais dessa área geográfica ambientalmente sensível. Esta demanda visa, ainda, à responsabilização solidária do MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, da FLORAM, da CASAN, da UNIÃO, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA, por sua omissão ou atuação ineficiente/deficiente quanto ao dever de prestar o serviço público de saneamento urbano de modo eficiente e eficaz, bem como de garantir que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii. Ainda que a legitimidade da parte pressuponha, como regra, uma análise anterior ao mérito, a partir de um exame alicerçado in status assertionis , ou seja, baseado nos argumentos apresentados na fase postulatória (TRF4, AG 5019715-51.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator RODRIGO KOEHLER RIBEIRO, julgado em 26/11/2024), isso, por si só, não autoriza que qualquer pretensão, principalmente se não especificar o âmbito da responsabilidade que se busca apurar, possa ser deduzida judicialmente. Por isso se afirma que "a legitimidade passiva ad causam é definida pela narrativa dos fatos e fundamentos jurídicos constante na petição inicial (teoria da asserção) (...)" (TRF4, AG 5049639-15.2021.4.04.0000, 4ª Turma, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, julgado em 30/03/2022). Na situação dos autos, o MPF imputou a todos os corréus uma série de deveres decorrentes, em tese, da omissão, tanto na fiscalização ambiental como no exercício do respectivo poder de polícia, que culminou com a ocorrência de danos ambientais junto ao entorno da Lagoa do Peri, em Florianópolis. A situação posta nos autos, contudo, demanda apuração mais cuidadosa, pois a petição inicial do feito de origem limitou-se a apontar, de forma ampla, a legitimidade passiva da União, do ICMBIO, do IBAMA e da ANA a partir de premissas flagrantemente genéricas. A narrativa da peça inicial busca abarcar, a pretexto de salvaguardar o meio ambiente, uma multiplicidade de atuações administrativas que sequer foram objetivamente indicadas, admitindo, sem acurada explicação, a mescla de competências estaduais, municipais e federais. Trata-se de perspectiva que, em um primeiro momento, sugere a própria inépcia da petição inicial, pois, como consabido, "considera-se inepta a petição inicial quando o o pedido for indeterminado e da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão" (TRF4, AC 5038641-14.2024.4.04.7200, 2ª Turma, Relator para Acórdão EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA, julgado em 17/06/2025). Além disso, conforme já decidiu esta Corte (TRF4, AC 5022913-50.2012.4.04.7200, 4ª Turma, Relator para Acórdão LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 14/12/2016), "a causa de pedir - pressuposto processual necessário para o desenvolvimento válido e regular do processo (art. 295 do CPC/73) - é constituída pelos fundamentos do pedido do autor da ação - motivos que legitimam a sua pretensão. Examinando a causa de pedir, o juiz verifica se o pedido deduzido tem ou não fundamento para ser acolhido. Verificando-se que a petição inicial é clara e possui os fundamentos jurídicos e fáticos necessários à identificação do pedido e da causa de pedir, deve ser afastada a alegação de inépcia da petição inicial". Consequentemente, verificando-se que a causa de pedir é genérica e incerta, ou ampla a ponto de impedir a apuração objetiva das alegadas responsabilidades, cabível, em tese, o reconhecimento de inépcia da peça vestibular. Acerca das potenciais responsabilidades em face dos riscos ambientais verificados na Lagoa do Peri, aponta a petição inicial as seguintes hipóteses de legitimidade passiva ( 1.1 , p. 31 e seguintes): LEGITIMIDADE PASSIVA FUNDAMENTOS DA LEGITIMIDADE UNIÃO (p. 31) "A legitimação passiva da UNIÃO se fundamenta na competência administrativa da SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU para, no âmbito patrimonial, zelar pela integridade dos imóveis pertencentes à UNIÃO, devendo, assim, fiscalizar e defender seu domínio (tais como terras e acrescidos de marinha) contra toda e qualquer ameaça ou efetiva intervenção ilegal, como turbações, ocupações e esbulhos, não se discutindo suas atribuições para agir quando se cuida de terras e acrescidos de marinha, ainda mais quando se cuida de espaços territoriais especialmente protegidos e ambientalmente sensíveis (APP de curso d’água e Zona Costeira)". ANA (p. 32) "A ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO é responsável por implementar a gestão dos recursos hídricos brasileiros e por regular o saneamento básico. É obrigação da ANA fiscalizar as condições de operação de reservatórios, o uso de recursos hídricos e o cumprimento das normas de saneamento básico, além de monitorar os sedimentos dos rios (Lei nº 9.984/2000, art. 4º e seus incisos)". IBAMA e ICMBIO (p. 33 e 37) "evidente a presença do interesse do IBAMA e do ICMBio em estabelecer parâmetros adequados de gestão ambiental (inclusive em prol da REBIO DO ARVOREDO e da APA DA BALEIA FRANCA) e, ainda, de adotar medidas efetivas para prevenção de contaminação". "o IBAMA e o ICMBio, no âmbito administrativo, possuem poder de polícia para fiscalizar atividades ilícitas contra o meio ambiente, mesmo em área cuja competência para licenciamento ambiental seja do Estado, seja do Município". "o IBAMA também é competente para o caso por haver FLORESTA PÚBLICA FEDERAL na localidade (vegetação do ecossistema de restinga)". "compete ao ICMBio e ao IBAMA o exercício do poder de polícia não apenas na área inserida dentro da UC, mas também em seu entorno, a fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas e, ainda, garantir a defesa dessas áreas protegidas". ICMBIO (p. 36) "O ICMBio, a seu turno, assim como o IBAMA, deveria ter garantido o respeito à integridade física da REBIO DO ARVOREDO (UC federal cuja Zona de Amortecimento é lindeira à LAGOA DO PERI) e da APA DA BALEIA FRANCA (UC federal cujos limites estão justapostos àquela localidade - Decreto federal s/nº, de 14.9.2000, arts. 1º, 3º, caput e incs. V, VI e X, 4º, 6º e 7º), ou, pelo menos, deveria ter exercitado suas atribuições fiscalizatórias, a teor do artigo 1º do Decreto de criação da APA DA BALEIA FRANCA". Apesar disso, o próprio MPF pontua ( 1.1 ): A despeito de a LAGOA DO PERI (reservatório e principal fonte para captação e abastecimento de água para a região sul e leste da Ilha de Florianópolis) ser um corpo hídrico de domínio estadual , suas águas percorrem o Rio Sangradouro, que sofre influência de marés e deságua no mar. (p. 32) Mas, em vez de adotarem alguma medida efetiva, o IBAMA e o ICMBio optam por direcionar ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS a atribuição para a recuperação das áreas afetadas . Ao final, NADA de efetivo é feito para proteger e recuperar o Meio Ambiente local. (p. 34) (Grifei) Depreende-se que a Lagoa do Peri, área que se busca preservar sob o aspecto ambiental, trata-se, segundo o MPF, de corpo hídrico que não é de domínio federal. O local foi protegido a partir da edição da Lei Municipal de Florianópolis nº 10.530/2019 que criou a Unidade de Conservação Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri (MONA DA LAGOA DO PERI), com expressa indicação de que o " MONA da Lagoa do Peri fica vinculado à Fundação Municipal do Meio Ambiente (FLORAM) , a quem caberá a gestão técnica, administrativa e operacional da Unidade de Conservação" (art. 3º - Grifei). Não remanescem dúvidas - inclusive por expressa vinculação legal, conforme dispõe a Lei nº 10.530/2019 - que a titularidade do MONA da Lagoa do Peri compete ao Município de Florianópolis, a partir da atuação da FLORAM. Trata-se de constatação que se verifica inclusive no endereço eletrônico da Prefeitura Municipal de Florianópolis, consultado nesta data, indicando que a Gestão do Programa no local compete à FLORAM e referindo, no Plano de Manejo do Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri , o histórico protetivo da Lagoa do Peri: Em 1976, percebendo a importância do manancial hídrico, o município de Florianópolis realizou o tombamento da Bacia Hidrográfica da Lagoa do Peri por meio do Decreto Municipal nº 1.408/1976 (Florianópolis, 1976), cujos limites foram utilizados para a criação da UC pela Lei Municipal nº 1.828/1981 (Florianópolis, 1981), denominada Parque Municipal da Lagoa do Peri, sendo a primeira UC municipal, com o principal objetivo de conservação do recurso hídrico. Com características peculiares, a UC foi regulamentada pelo Decreto Municipal nº 91/1982 (Florianópolis, 1982), que dispôs sobre o zoneamento da área, os usos definidos para as populações tradicionais e os usos públicos de lazer, de modo a compatibilizá-los com a proteção das paisagens, da flora, da fauna e dos ecossistemas. O dispositivo estabeleceu também regramentos para o uso e ocupação do solo, bem como para seu parcelamento e edificações, buscando compatibilizar esses usos com a manutenção da paisagem e seus processos ecológicos. Ao longo do processo de implantação da UC, então Parque Municipal da Lagoa do Peri, devido a vários fatores como suas dimensões e complexidade intrínseca, falta de implementação pelo poder público e as profundas transfor - mações ocorridas na cidade, houve êxitos e equívocos, tanto por parte da gestão pública, como por parte de proprietários, moradores e usuários. Somente em 2007 foi criado seu Conselho Gestor e, a partir de então, o debate se concentrou na necessidade de adequação ao SNUC, pois a categoria “Parque Natural” não permite a propriedade privada e os respectivos usos historicamente existentes e reconhecidos no interior da UC pelas comunidades tradicionais do Sertão do Ribeirão e Porto do Contrato. Desta maneira, surgiu a proposta de recategorização para Monumento Natural, fato que ganhou corpo com a criação da Comissão Especial para Adequa - ção das Unidades de Conservação (CEAUC), com a Portaria SMAD 3.167/2013 (Florianópolis, 2013), e com a retomada dos trabalhos do conselho gestor em 2015. Assim, após rigoroso estudo técnico e ampla participação social, em 2018 foi encaminhada a proposta de mudança de categoria e de alteração dos limites que culminou no Projeto de Lei nº 17.493/2018 e, posteriormente, na Lei Municipal nº 10.530/2019 (Florianópolis, 2019a). Verifica-se que o local foi historicamente submetido à competência municipal. Consequentemente, mitiga-se a ampliação do escopo protetivo como requereu o MPF, pois a alegação de que o Município ou a FLORAM não direcionam os devidos cuidados à região não justifica, por si só, sem provas robustas nesse sentido, a propositura da ação em face de outros entes que não contribuíram objetivamente para a ação ou para a omissão que, em tese, geraram os alegados danos ou riscos ambientais. Não remanescem dúvidas acerca da importância da atuação conjunta de todos os entes da Federação para a proteção ambiental, inclusive porque se trata de competência constitucional comum. Assim, como já decidiu o STJ, "diante de uma infração ambiental, os agentes de fiscalização ambiental federal, estadual ou municipal terão o dever de agir imediatamente, obstando a perpetuação da infração" (STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp 1.499.874/SC, Rel. Mauro Campbell Marques, julgamento: 19/11/2019, publicação: 22/11/2019). Isso não significa, entretanto, que, a pretexto de implementar uma atuação conjunta, possam ser suplantadas competências legais, pois mesmo a proteção ambiental - cujo interesse é de todos os entes federativos - encontra como limite a titularidade do bem afetado. O entendimento desta Corte correlaciona a responsabilidade civil pelo dano ambiental - e, consequentemente, também a legitimidade passiva do suposto responsável - (i) à titularidade do bem e (ii) à ação ou omissão que foram decisivas para a configuração do dano. Nesse sentido: AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AMBIENTAIS. TERRENO DE MARINHA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE. 1. A legitimidade passiva ad causam consiste na pertinência subjetiva da parte à relação de direito material objeto da lide e, como toda e qualquer condição da ação, é aferível com base na narrativa veiculada na petição inicial (teoria da asserção), bastando, para sua configuração, que os argumentos lá deduzidos permitam a inferência, em um exame puramente abstrato, de que o réu pode ser o sujeito responsável pela violação do direito subjetivo do autor. 2. O poder de polícia do órgão ambiental não impede ou não tolhe a intervenção judicial, seja quando a Administração Pública extrapola, seja quando se omite, total ou parcialmente, na aplicação de incumbências preceituadas, máxime as de licenciamento fiscalização e repressão de ilícitos (STJ, 2ª Turma, REsp 1.745.033/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 20/10/2020, DJe 17/12/2021). 3. Demonstrado que o dano ambiental ocorreu em área de preservação permanente e de propriedade da União , bem como que a ocupação irregular resultou de ações omissivas do ente federal, impõe-se sua responsabilização. (TRF4, AC 5006129-77.2021.4.04.7201, 4ª Turma, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, julgado em 02/10/2024) Grifei. [...] A legitimidade passiva da União decorre da infração ambiental ter ocorrido em terreno de marinha , bem do ente federal, ex vi do art. 20, VI e VII, da Constituição Federal e pela caracterização omissiva no dever de fiscalizar , independemente do local onde o dano tenha sido perpetrado , além de ter afetado o livre acesso à praia, bem integrante do domínio público da União, o que evidencia sobremaneira o interesse federal na sua salvaguarda, inclusive com fiscalização e punição de infrações administrativas de degradação. [...](TRF4, AC 5027902-28.2014.4.04.7201, 4ª Turma, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 12/07/2023) Grifei. A situação posta em exame, como visto, apresenta particularidades que não podem ser meramente desconsideradas. A área que se sujeita aos alegados riscos ambientais é de titularidade do Município de Florianópolis, com regramento próprio e perspectiva protetiva específica. Não se trata, portanto, de local sujeito ao controle da União e, portanto, está igualmente afastado do policiamento administrativo de autarquias federais. Há, no caso dos autos, dificuldade inclusive em compreender os limites da proteção ambiental desejada pelo MPF, principalmente quando se verifica que os possíveis danos ou riscos são hipotéticos e potenciais, sem que se possa afirmar, a partir da narrativa da petição inicial ( 1.1 ), que efetivamente decorrem de uma ação ou de uma omissão da União, do IBAMA, do ICMBIO e mesmo da ANA. A premissa adotada pelo MPF pressupõe - "a despeito de a LAGOA DO PERI ser um um corpo hídrico de domínio estadual" ( 1.1 ) - que as suas águas podem sofrer influência "em parte da sua extensão" de marés e isso teria, em tese, o potencial de afetar áreas contíguas, essas sim sujeitas à proteção ambiental da União, do ICMBIO e do IBAMA: Assim, por exemplo, no caso da presença de saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii tem potencialidade de contaminar moluscos e outros organismos que tenham relevância ecológica, tais como aqueles que compõem a fauna ou a flora integrante da UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL DA RESERVA BIOLÓGICA MARINHA – REBIO DO ARVOREDO ou da ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL – APA DA BALEIA FRANCA ou que, mesmo não a integrando, sejam de algum modo ecologicamente relevantes para essas UCs. Trata-se, obviamente, de hipótese sem alicerce probatório robusto para que se possa avaliar, de forma objetiva, o risco a que as áreas sujeitas à proteção ambiental da União estão submetidas. Essa pressuposição persiste em toda a narrativa da petição inicial: No dia 14.5.2021, notícia jornalística relatou que pesquisadores do Laboratório de Ficologia da UFSC – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA constataram a presença de quantidades elevadas de uma toxina proveniente de cianobactérias na LAGOA DO PERI e a possibilidade de essa substância atingir o mar, por meio da Praia do Matadeiro. O Parecer Técnico nº 749/2021 conclui que o documento subscrito pelo Professor Leonardo Rubi Rörig não esclarece se cianobactérias da LAGOA DO PERI e suas toxinas foram transportadas até o mar , tampouco se podem afetar organismos aquáticos na natureza. Em 15.10.2021, a Assessoria Pericial do MPF elaborou o Laudo Técnico nº 1.197/2021-ANPMA/CNP, que conclui que as pesquisas científicas realizadas pelo LAFIC indicam, em tese, um potencial risco de consumo de cionobactéria tóxica proveniente da LAGOA DO PERI por moluscos bivalves existentes na Praia do Matadeiro . Porém, em que pese esse risco potencial, não há dados científicos robustos sobre a capacidade de sobrevivência de Raphidiopsis raciborskii em ambientes tipicamente marinhos. a FLORAM elaborou o Parecer Técnico nº 933/2021-DILIC, que consigna que há um risco potencial de contaminação de moluscos , que possuem a capacidade de bioacumular substâncias diversas, o que poderia levar a concentrações de ficotoxinas significativamente mais elevadas do que as encontradas nas águas. a despeito do risco de exposição de moluscos comestíveis na Praia do Matadeiro e circunvizinhanças às toxinas produzidas por cianobactérias que florescem na LAGOA DO PERI haver sido evidenciado experimentalmente, não há confirmação da acumulação das toxinas naqueles animais, mediante análises diretas em amostras de moluscos colhidos no ambiente, tampouco estudos que estabeleçam o alcance do aporte da biomassa tóxica oriunda da LAGOA DO PERI na região costeira adjacente. Essas citações, retiradas da petição inicial ( 1.1 ), demonstram que a alegada legitimidade passiva da União (e, por reflexo, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA) decorre de uma suposição de que pode haver uma contaminação, supostamente já existente na Lagoa do Peri (até mesmo quanto a isso remanescem dúvidas consideráveis), na região costeira adjacente, sujeita, em tese, ao poder de polícia dos corréus, ora recorrentes. Sobreleva-se, a partir disso, a necessidade de adequada compreensão dos limites que possibilitam a atuação fiscalizatória da União em matéria ambiental, perspectiva que alcança, observadas as particularidades inerentes a cada órgão e entidade administrativa, não apenas a União mas também o IBAMA, o ICMBIO e, no caso dos autos, a própria ANA. Essa é a dicção do art. 17, § 3º, da Lei Complementar nº 140/2011: Art. 17. Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada. § 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput. Sobre essa norma se manifestou o STF (ADI 4.757. Rel. Rosa Weber. Julgamento: 13/12/2022. Publicação: 17/03/2023), consignando que "referida legislação não trata sobre os deveres de tutela ambiental de forma genérica e ampla, como disciplina o art. 225, §1º, IV, tampouco regulamenta o agir legislativo, marcado pela repartição concorrente de competências, inclusive no tocante à normatização do licenciamento em si". Em razão disso, concluiu o STF que " o nível de ação do agir político-administrativo nos domínios das competências partilhadas, próprio do modelo do federalismo cooperativo, deve ser medido pelo princípio da subsidiariedade . Ou seja, na conformação dos arranjos cooperativos, a ação do ente social ou político maior no menor, justifica-se quando comprovada a incapacidade institucional desse e demonstrada a eficácia protetiva daquele" . A consequência é inequívoca: " Um dos princípios fundamentais do funcionamento do sistema legal de tutela do meio ambiente é o da atuação supletiva do órgão federal, seja em matéria de licenciamento seja em matéria de controle e fiscalização das atividades ou empreendimentos potencialmente poluidores ou degradantes do meio ambiente . No exercício da cooperação administrativa, portanto, cabe atuação suplementar – ainda que não conflitiva – da União com a dos órgãos estadual e municipal". Não basta, portanto, ampliar imotivadamente a atuação administrativa a fim de abarcar, a um só tempo, ações estaduais, municipais e federais. Como visto, a tutela ambiental, segundo o STF, alicerça-se na premissa de um federalismo cooperativo, o que implica, por sua vez, que a atuação de órgãos ou entidades federais - quando já há órgãos ou entidades estaduais ou municipais com competência ambiental regularmente instituídos - dá-se em caráter supletivo . A supletividade exige, a seu turno, comprovação suficiente de que os órgãos ou entidades estaduais e municipais não atuaram a partir das competências legalmente fixadas. Isso autorizaria, em tese, a ação supletiva da União e, por via reflexa, do IBAMA, do ICMBIO e, in casu , da ANA. Essa comprovação, entretanto, não resta evidenciada no caso dos autos, já que, como visto, a indicação dos corréus foi efetuada a partir de potenciais riscos que poderiam, em tese, afetar - e disso não há sequer indícios robustos - áreas que a União, por seus órgãos ou pelas respectivas entidades, deveria proteger. Deve ser ponderado, ainda, que o STF assentou a importância de respeito às diversidades locais, inclusive como critério interpretativo, como ilustra a ADI 5.996 (Rel. Alexandre de Moraes, julgamento: 15/04/2020, publicação: 30/04/2020): O princípio geral que norteia a repartição de competência entre os entes componentes do Estado Federal brasileiro, portanto, é o princípio da predominância do interesse, não apenas para as matérias cuja definição foi preestabelecida pelo texto constitucional, mas também em termos de interpretação em hipóteses que envolvem várias e diversas matérias, como na presente ação direta de inconstitucionalidade. (...) Essa opção inicial do legislador constituinte, ao centralizar nos poderes enumerados da União (CF, artigo 22) a maioria das matérias legislativas mais importantes, contudo, não afastou da Constituição de 1988 os princípios básicos de nossa tradição republicana federalista, que gravita em torno do princípio da autonomia, da participação política e da existência de competências legislativas próprias dos Estados/Distrito Federal e Municípios, indicando ao intérprete a necessidade de aplicá-los como vetores principais em cada hipótese concreta em que haja a necessidade de análise da predominância do interesse, para que se garanta a manutenção, fortalecimento e, principalmente, o equilíbrio federativo (GERALDO ATALIBA. República e constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 10), que se caracteriza pelo respeito às diversidades locais, como bem salientado por MICHAEL J. MALBIN, ao apontar que a intenção dos elaboradores da Carta Constitucional Americana foi justamente estimular e incentivar a diversidade, transcendendo as facções e trabalhando pelo bem comum (A ordem constitucional americana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987, p. 144), consagrando, ainda, a pluralidade de centros locais de poder, com autonomia de autogoverno e autoadministração, para que se reforçasse a ideia de preservação da autonomia na elaboração do federalismo, como salientado por ALEXIS DE TOCQUEVILLE, ao comentar a formação da nação americana (Democracia na América: leis e costumes. São Paulo: Martins Fontes, 1988. p. 37 e ss.), que serviu de modelo à nossa Primeira Constituição Republicana em 1891. Nos regimes federalistas, respeitadas as opções realizadas pelo legislador constituinte e previamente estabelecidas no próprio texto constitucional, quando surgem dúvidas sobre a distribuição de competências e, consequentemente, a necessidade de definição do ente federativo competente para legislar sobre determinado e específico assunto, que engloba uma ou várias matérias com previsão ou reflexos em diversos ramos do Direito, caberá ao interprete priorizar o fortalecimento das autonomias locais e o respeito às suas diversidades como pontos caracterizadores e asseguradores do convívio no Estado Federal , que garantam o imprescindível equilíbrio federativo (...) Grifei. A partir desses parâmetros, depreende-se a necessidade de valorização das autonomias locais - e de suas respectivas competências constitucionais e legais - para atuarem em proteção ao meio ambiente. Não há como simplesmente equiparar, nos moldes desejados pela petição inicial, as atribuições da União, do IBAMA, do ICMBIO, da ANA, do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento. Cada órgão/entidade possui atribuições específicas que, sob pena de enfraquecimento da própria proteção ambiental, devem ser minimamente observadas. Como critérios para a fixação de competência, em casos dessa natureza, sobreleva-se a importância de adequadamente sopesar (i) a supletividade da atuação dos órgãos federais, o que decorre do modelo de federalismo cooperativo e (ii) a priorização das autonomias locais. O cotejo de tais fatores (supletividade e priorização das autonomias locais) possibilita estabelecer um critério geral em matéria de responsabilidade ambiental: a indicação de órgãos e entidades federais como responsáveis por ações ou omissões de natureza ambiental, quando não se trata de bem de titularidade federal, revela-se cabível se houver a comprovação, ao menos indiciária, da incapacidade institucional dos órgãos ou entidades estaduais ou municipais, no âmbito de suas respectivas competências. Somente se restar evidenciada essa situação justificar-se-á a ação do ente social ou político maior no menor, conforme entendimento do STF. No caso dos autos, não há, sob qualquer aspecto, efetiva comprovação de que os órgãos ou entidades estaduais ou municipais estejam desempenhando de modo insatisfatório as suas atribuições legais. Não há como afirmar, dada a ausência de indicativos robustos nesse sentido, a incapacidade institucional, in casu , do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento para a tutela ambiental na Lagoa do Peri. Evidenciada, assim, a ilegitimidade passiva da União , do IBAMA , do ICMBIO e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA . Trata-se de questão que, embora tenha sido apresentada pelas partes em suas razões recursais, constitui matéria de ordem pública, podendo, em razão disso, ser arguida e conhecida em qualquer grau de jurisdição, até mesmo de ofício ( v.g. TRF4, AC 5013560-05.2020.4.04.7200, 1ª Turma, Relator LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, julgado em 15/10/2024). Verifico, por outro lado, que a ação de origem foi proposta também em face, como já dito, do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento e, em relação a eles, seja em razão (i) da premissa do federalismo cooperativo, seja por força (ii) da priorização das autonomias locais, seja em virtude (iii) da titularidade do MONA da Lagoa do Peri, não há que se falar em ilegitimidade passiva. Assenta-se, assim, a competência da Justiça Estadual para o processo e julgamento da ação de origem, perspectiva que se dá, inclusive, a partir do que dispõem as Súmulas 150, 224 e 254, todas do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, declino da competência em favor da Justiça Estadual de Santa Catarina e determino a remessa dos autos para a Comarca de Florianópolis / SC. Intimem-se.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 5020774-40.2025.4.04.0000

ID: 325659250

Tribunal: TRF4 Órgão: SECRETARIA DA 11a. TURMA Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 5020774-40.2025.4.04.0000

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

CHARLES CAGOL DO NASCIMENTO

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

ANTONIO ELPIDIO FAGUNDES

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

ANTONIO ELPIDIO FAGUNDES

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

BRUNO ANGELI BONEMER

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

Agravo de Instrumento Nº 5020774-40.2025.4.04.0000/SC AGRAVANTE : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO A questão suscitada pela parte agravante foi enfrentada nos aut… Agravo de Instrumento Nº 5020774-40.2025.4.04.0000/SC AGRAVANTE : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO A questão suscitada pela parte agravante foi enfrentada nos autos do Agravo de Instrumento nº 5019929-08.2025.4.04.0000 , interposto pela União, nos seguintes termos: Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo de Instrumento: (1) 5019929-08.2025.4.04.0000 (interposto pela União); (2) 5019643-30.2025.4.04.0000 (interposto pelo IBAMA); (3) 5019645-97.2025.4.04.0000 (interposto pela ANA) e (4) 5019644-15.2025.4.04.0000 (interposto pelo ICMBIO). Os referidos Agravos de Instrumento foram interpostos em face de decisão com o seguinte teor ( 24.1 ): (...) a) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem um ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR26 sobre a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, que compreenda a bacia hidrográfica da região, incluindo os diversos elementos hídricos relevantes para a LAGOA DO PERI, a fim de, inter alia, avaliarem a capacidade de suporte da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI em relação às presentes e futuras intervenções ou empreendimentos na localidade (e.g., para garantir a compatibilidade dos parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água), bem como a identificarem as possíveis fontes de poluição e contaminação da LAGOA DO PERI, tais como ligações clandestinas na rede pluvial e lançamento direto ou indireto de efluentes não-tratados nos corpos hídricos relevantes de sua bacia hidrográfica, dentro do prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desatendimento; b) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem e implementarem um PLANO DE TRABALHO que contemple a execução de medidas de análise e fiscalização nos locais identificados naquele ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR (com, por exemplo, os parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água, as possíveis fontes de poluição e contaminação da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, etc), o qual deve ser iniciado no prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desobediência; c) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para elaborar um PLANO DE EMERGÊNCIA E CONTINGÊNCIA, com ações corretivas de curto, médio e longo prazos, sempre que se detectarem riscos à saúde (humana ou não), pelo consumo da água da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, tais como pela concentração de toxinas acima dos limites permitidos ou pela contaminação de suas águas por outros fatores de poluição, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de inobservância; d) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para garantir que as atividades das comunidades tradicionais relacionadas com a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI (tal como a pesca artesanal e a extração de mariscos) sejam realizadas sem riscos da presença de patógenos de grave repercussão à saúde, tais como as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, como, por exemplo, as medidas indicadas pelo IBAMA na Informação Técnica nº 178/2022-NUBIO-SC/DITEC-SC: d.1) Ampliação do número de sítios de monitoramento, incluindo-se pontos de análise de qualidade de água, da composição da comunidade fitoplanctônica e monitoramento de cianotoxinas no canal do Rio Sangradouro, na desembocadura do rio e em pontos estratégicos na praia do Matadeiro e Armação do Pântano do Sul, considerando as condições oceanográficas da zona de mistura na foz do rio; d.2) Monitoramento contínuo de bivalves marinhos, com amostragens periódicas na praia do Matadeiro e Armação, para avaliação do grau de acumulação de cianotoxinas nos tecidos destes organismos, com vistas à adoção de medidas sanitárias de suspensão de coleta e/ou cultivo quando os níveis destas toxinas se tornarem danosos à saúde humana; d.3) Estabelecimento de plano de análises ecotoxicológicas, para avaliação contínua dos efeitos de toxicidade de R. raciborskii em organismos chave para a alimentação da população tradicional local, incluindo moluscos, peixes, e outras espécies que sejam relevantes para a comunidade”. Em caso de recalcitrância, deverá ser imposta pena de multa diária de R$5.000,00 a cada uma das pessoas físicas responsáveis. (...) A União opõe-se à decisão a partir dos seguintes argumentos: (i) inexistência de responsabilidade sobre a água da Lagoa do Peri, pois não se trata de corpo hídrico federal, mas de unidade de conservação municipal; (ii) não há qualquer conduta comissiva ou omissiva imputada à União; (iii) a decisão proferida é genérica e não se alicerça em fundamentos fáticos e jurídicos concretos; (iv) a multa foi fixada em valor excessivo ( processo 5019929-08.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O IBAMA questiona a decisão recorrida a partir dos seguintes fundamentos: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos apresentados pelas entidades públicas, ignorando que se trata, a Lagoa do Peri, de corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) não há risco imediato de dano irreparável ou de difícil reparação; (iii) a decisão proferida ignorou que o IBAMA pode atuar somente de modo subsidiário, conforme o entendimento do STF; (iv) a competência primária em fiscalização ambiental na área em comento não compete ao IBAMA, mas à municipalidade ou ao Estado de Santa Catarina; (v) deveria ter sido observado o disposto no Tema 698/STF; (vi) a multa fixada é indevida e excessiva ( processo 5019643-30.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). A ANA - Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico alegou em seu recurso: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos deduzidos pelos corréus, indicativos de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) a ANA seria parte passiva ilegítima porque os pedidos formulados não se relacionam com as suas atribuições; (iii) inexiste risco imediato de dano irreparável; (iv) as determinações impostas são inexequíveis e desnecessárias; (v) a multa fixada é descabida e foi fixada em montante excessivo ( processo 5019645-97.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O ICMBIO , por sua vez, apresenta as seguintes razões recursais: (i) foram ignorados, pela decisão recorrida, os fatos apresentados pelas entidades públicas, comprobatórios de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) o ICMBIO seria parte parte passiva ilegítima, pois os fatos apresentados não se inserem no âmbito de suas competências; (iii) não há risco de dano irreparável no local; (iv) as imposições da decisão recorrida são inexequíveis e descabidas; (v) a multa fixada é excessiva ( processo 5019644-15.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). É o relatório. Decido. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF em face do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis , da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento , da União , do IBAMA , do ICMBIO e da ANA , com o seguinte objeto ( 1.1 ): A PROCURADORIA DA REPÚBLICA, por meio desta ação, busca garantir, entre outras medidas, que as atividades relacionadas com a coleta, o tratamento e a distribuição de água feita pela LAGOA DO PERI para consumo (humano ou não) não ofereça riscos à saúde, bem como que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, resguardando, assim, os atributos físicos, bióticos e sociais dessa área geográfica ambientalmente sensível. Esta demanda visa, ainda, à responsabilização solidária do MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, da FLORAM, da CASAN, da UNIÃO, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA, por sua omissão ou atuação ineficiente/deficiente quanto ao dever de prestar o serviço público de saneamento urbano de modo eficiente e eficaz, bem como de garantir que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii. Ainda que a legitimidade da parte pressuponha, como regra, uma análise anterior ao mérito, a partir de um exame alicerçado in status assertionis , ou seja, baseado nos argumentos apresentados na fase postulatória (TRF4, AG 5019715-51.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator RODRIGO KOEHLER RIBEIRO, julgado em 26/11/2024), isso, por si só, não autoriza que qualquer pretensão, principalmente se não especificar o âmbito da responsabilidade que se busca apurar, possa ser deduzida judicialmente. Por isso se afirma que "a legitimidade passiva ad causam é definida pela narrativa dos fatos e fundamentos jurídicos constante na petição inicial (teoria da asserção) (...)" (TRF4, AG 5049639-15.2021.4.04.0000, 4ª Turma, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, julgado em 30/03/2022). Na situação dos autos, o MPF imputou a todos os corréus uma série de deveres decorrentes, em tese, da omissão, tanto na fiscalização ambiental como no exercício do respectivo poder de polícia, que culminou com a ocorrência de danos ambientais junto ao entorno da Lagoa do Peri, em Florianópolis. A situação posta nos autos, contudo, demanda apuração mais cuidadosa, pois a petição inicial do feito de origem limitou-se a apontar, de forma ampla, a legitimidade passiva da União, do ICMBIO, do IBAMA e da ANA a partir de premissas flagrantemente genéricas. A narrativa da peça inicial busca abarcar, a pretexto de salvaguardar o meio ambiente, uma multiplicidade de atuações administrativas que sequer foram objetivamente indicadas, admitindo, sem acurada explicação, a mescla de competências estaduais, municipais e federais. Trata-se de perspectiva que, em um primeiro momento, sugere a própria inépcia da petição inicial, pois, como consabido, "considera-se inepta a petição inicial quando o o pedido for indeterminado e da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão" (TRF4, AC 5038641-14.2024.4.04.7200, 2ª Turma, Relator para Acórdão EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA, julgado em 17/06/2025). Além disso, conforme já decidiu esta Corte (TRF4, AC 5022913-50.2012.4.04.7200, 4ª Turma, Relator para Acórdão LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 14/12/2016), "a causa de pedir - pressuposto processual necessário para o desenvolvimento válido e regular do processo (art. 295 do CPC/73) - é constituída pelos fundamentos do pedido do autor da ação - motivos que legitimam a sua pretensão. Examinando a causa de pedir, o juiz verifica se o pedido deduzido tem ou não fundamento para ser acolhido. Verificando-se que a petição inicial é clara e possui os fundamentos jurídicos e fáticos necessários à identificação do pedido e da causa de pedir, deve ser afastada a alegação de inépcia da petição inicial". Consequentemente, verificando-se que a causa de pedir é genérica e incerta, ou ampla a ponto de impedir a apuração objetiva das alegadas responsabilidades, cabível, em tese, o reconhecimento de inépcia da peça vestibular. Acerca das potenciais responsabilidades em face dos riscos ambientais verificados na Lagoa do Peri, aponta a petição inicial as seguintes hipóteses de legitimidade passiva ( 1.1 , p. 31 e seguintes): LEGITIMIDADE PASSIVA FUNDAMENTOS DA LEGITIMIDADE UNIÃO (p. 31) "A legitimação passiva da UNIÃO se fundamenta na competência administrativa da SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU para, no âmbito patrimonial, zelar pela integridade dos imóveis pertencentes à UNIÃO, devendo, assim, fiscalizar e defender seu domínio (tais como terras e acrescidos de marinha) contra toda e qualquer ameaça ou efetiva intervenção ilegal, como turbações, ocupações e esbulhos, não se discutindo suas atribuições para agir quando se cuida de terras e acrescidos de marinha, ainda mais quando se cuida de espaços territoriais especialmente protegidos e ambientalmente sensíveis (APP de curso d’água e Zona Costeira)". ANA (p. 32) "A ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO é responsável por implementar a gestão dos recursos hídricos brasileiros e por regular o saneamento básico. É obrigação da ANA fiscalizar as condições de operação de reservatórios, o uso de recursos hídricos e o cumprimento das normas de saneamento básico, além de monitorar os sedimentos dos rios (Lei nº 9.984/2000, art. 4º e seus incisos)". IBAMA e ICMBIO (p. 33 e 37) "evidente a presença do interesse do IBAMA e do ICMBio em estabelecer parâmetros adequados de gestão ambiental (inclusive em prol da REBIO DO ARVOREDO e da APA DA BALEIA FRANCA) e, ainda, de adotar medidas efetivas para prevenção de contaminação". "o IBAMA e o ICMBio, no âmbito administrativo, possuem poder de polícia para fiscalizar atividades ilícitas contra o meio ambiente, mesmo em área cuja competência para licenciamento ambiental seja do Estado, seja do Município". "o IBAMA também é competente para o caso por haver FLORESTA PÚBLICA FEDERAL na localidade (vegetação do ecossistema de restinga)". "compete ao ICMBio e ao IBAMA o exercício do poder de polícia não apenas na área inserida dentro da UC, mas também em seu entorno, a fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas e, ainda, garantir a defesa dessas áreas protegidas". ICMBIO (p. 36) "O ICMBio, a seu turno, assim como o IBAMA, deveria ter garantido o respeito à integridade física da REBIO DO ARVOREDO (UC federal cuja Zona de Amortecimento é lindeira à LAGOA DO PERI) e da APA DA BALEIA FRANCA (UC federal cujos limites estão justapostos àquela localidade - Decreto federal s/nº, de 14.9.2000, arts. 1º, 3º, caput e incs. V, VI e X, 4º, 6º e 7º), ou, pelo menos, deveria ter exercitado suas atribuições fiscalizatórias, a teor do artigo 1º do Decreto de criação da APA DA BALEIA FRANCA". Apesar disso, o próprio MPF pontua ( 1.1 ): A despeito de a LAGOA DO PERI (reservatório e principal fonte para captação e abastecimento de água para a região sul e leste da Ilha de Florianópolis) ser um corpo hídrico de domínio estadual , suas águas percorrem o Rio Sangradouro, que sofre influência de marés e deságua no mar. (p. 32) Mas, em vez de adotarem alguma medida efetiva, o IBAMA e o ICMBio optam por direcionar ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS a atribuição para a recuperação das áreas afetadas . Ao final, NADA de efetivo é feito para proteger e recuperar o Meio Ambiente local. (p. 34) (Grifei) Depreende-se que a Lagoa do Peri, área que se busca preservar sob o aspecto ambiental, trata-se, segundo o MPF, de corpo hídrico que não é de domínio federal. O local foi protegido a partir da edição da Lei Municipal de Florianópolis nº 10.530/2019 que criou a Unidade de Conservação Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri (MONA DA LAGOA DO PERI), com expressa indicação de que o " MONA da Lagoa do Peri fica vinculado à Fundação Municipal do Meio Ambiente (FLORAM) , a quem caberá a gestão técnica, administrativa e operacional da Unidade de Conservação" (art. 3º - Grifei). Não remanescem dúvidas - inclusive por expressa vinculação legal, conforme dispõe a Lei nº 10.530/2019 - que a titularidade do MONA da Lagoa do Peri compete ao Município de Florianópolis, a partir da atuação da FLORAM. Trata-se de constatação que se verifica inclusive no endereço eletrônico da Prefeitura Municipal de Florianópolis, consultado nesta data, indicando que a Gestão do Programa no local compete à FLORAM e referindo, no Plano de Manejo do Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri , o histórico protetivo da Lagoa do Peri: Em 1976, percebendo a importância do manancial hídrico, o município de Florianópolis realizou o tombamento da Bacia Hidrográfica da Lagoa do Peri por meio do Decreto Municipal nº 1.408/1976 (Florianópolis, 1976), cujos limites foram utilizados para a criação da UC pela Lei Municipal nº 1.828/1981 (Florianópolis, 1981), denominada Parque Municipal da Lagoa do Peri, sendo a primeira UC municipal, com o principal objetivo de conservação do recurso hídrico. Com características peculiares, a UC foi regulamentada pelo Decreto Municipal nº 91/1982 (Florianópolis, 1982), que dispôs sobre o zoneamento da área, os usos definidos para as populações tradicionais e os usos públicos de lazer, de modo a compatibilizá-los com a proteção das paisagens, da flora, da fauna e dos ecossistemas. O dispositivo estabeleceu também regramentos para o uso e ocupação do solo, bem como para seu parcelamento e edificações, buscando compatibilizar esses usos com a manutenção da paisagem e seus processos ecológicos. Ao longo do processo de implantação da UC, então Parque Municipal da Lagoa do Peri, devido a vários fatores como suas dimensões e complexidade intrínseca, falta de implementação pelo poder público e as profundas transfor - mações ocorridas na cidade, houve êxitos e equívocos, tanto por parte da gestão pública, como por parte de proprietários, moradores e usuários. Somente em 2007 foi criado seu Conselho Gestor e, a partir de então, o debate se concentrou na necessidade de adequação ao SNUC, pois a categoria “Parque Natural” não permite a propriedade privada e os respectivos usos historicamente existentes e reconhecidos no interior da UC pelas comunidades tradicionais do Sertão do Ribeirão e Porto do Contrato. Desta maneira, surgiu a proposta de recategorização para Monumento Natural, fato que ganhou corpo com a criação da Comissão Especial para Adequa - ção das Unidades de Conservação (CEAUC), com a Portaria SMAD 3.167/2013 (Florianópolis, 2013), e com a retomada dos trabalhos do conselho gestor em 2015. Assim, após rigoroso estudo técnico e ampla participação social, em 2018 foi encaminhada a proposta de mudança de categoria e de alteração dos limites que culminou no Projeto de Lei nº 17.493/2018 e, posteriormente, na Lei Municipal nº 10.530/2019 (Florianópolis, 2019a). Verifica-se que o local foi historicamente submetido à competência municipal. Consequentemente, mitiga-se a ampliação do escopo protetivo como requereu o MPF, pois a alegação de que o Município ou a FLORAM não direcionam os devidos cuidados à região não justifica, por si só, sem provas robustas nesse sentido, a propositura da ação em face de outros entes que não contribuíram objetivamente para a ação ou para a omissão que, em tese, geraram os alegados danos ou riscos ambientais. Não remanescem dúvidas acerca da importância da atuação conjunta de todos os entes da Federação para a proteção ambiental, inclusive porque se trata de competência constitucional comum. Assim, como já decidiu o STJ, "diante de uma infração ambiental, os agentes de fiscalização ambiental federal, estadual ou municipal terão o dever de agir imediatamente, obstando a perpetuação da infração" (STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp 1.499.874/SC, Rel. Mauro Campbell Marques, julgamento: 19/11/2019, publicação: 22/11/2019). Isso não significa, entretanto, que, a pretexto de implementar uma atuação conjunta, possam ser suplantadas competências legais, pois mesmo a proteção ambiental - cujo interesse é de todos os entes federativos - encontra como limite a titularidade do bem afetado. O entendimento desta Corte correlaciona a responsabilidade civil pelo dano ambiental - e, consequentemente, também a legitimidade passiva do suposto responsável - (i) à titularidade do bem e (ii) à ação ou omissão que foram decisivas para a configuração do dano. Nesse sentido: AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AMBIENTAIS. TERRENO DE MARINHA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE. 1. A legitimidade passiva ad causam consiste na pertinência subjetiva da parte à relação de direito material objeto da lide e, como toda e qualquer condição da ação, é aferível com base na narrativa veiculada na petição inicial (teoria da asserção), bastando, para sua configuração, que os argumentos lá deduzidos permitam a inferência, em um exame puramente abstrato, de que o réu pode ser o sujeito responsável pela violação do direito subjetivo do autor. 2. O poder de polícia do órgão ambiental não impede ou não tolhe a intervenção judicial, seja quando a Administração Pública extrapola, seja quando se omite, total ou parcialmente, na aplicação de incumbências preceituadas, máxime as de licenciamento fiscalização e repressão de ilícitos (STJ, 2ª Turma, REsp 1.745.033/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 20/10/2020, DJe 17/12/2021). 3. Demonstrado que o dano ambiental ocorreu em área de preservação permanente e de propriedade da União , bem como que a ocupação irregular resultou de ações omissivas do ente federal, impõe-se sua responsabilização. (TRF4, AC 5006129-77.2021.4.04.7201, 4ª Turma, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, julgado em 02/10/2024) Grifei. [...] A legitimidade passiva da União decorre da infração ambiental ter ocorrido em terreno de marinha , bem do ente federal, ex vi do art. 20, VI e VII, da Constituição Federal e pela caracterização omissiva no dever de fiscalizar , independemente do local onde o dano tenha sido perpetrado , além de ter afetado o livre acesso à praia, bem integrante do domínio público da União, o que evidencia sobremaneira o interesse federal na sua salvaguarda, inclusive com fiscalização e punição de infrações administrativas de degradação. [...](TRF4, AC 5027902-28.2014.4.04.7201, 4ª Turma, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 12/07/2023) Grifei. A situação posta em exame, como visto, apresenta particularidades que não podem ser meramente desconsideradas. A área que se sujeita aos alegados riscos ambientais é de titularidade do Município de Florianópolis, com regramento próprio e perspectiva protetiva específica. Não se trata, portanto, de local sujeito ao controle da União e, portanto, está igualmente afastado do policiamento administrativo de autarquias federais. Há, no caso dos autos, dificuldade inclusive em compreender os limites da proteção ambiental desejada pelo MPF, principalmente quando se verifica que os possíveis danos ou riscos são hipotéticos e potenciais, sem que se possa afirmar, a partir da narrativa da petição inicial ( 1.1 ), que efetivamente decorrem de uma ação ou de uma omissão da União, do IBAMA, do ICMBIO e mesmo da ANA. A premissa adotada pelo MPF pressupõe - "a despeito de a LAGOA DO PERI ser um um corpo hídrico de domínio estadual" ( 1.1 ) - que as suas águas podem sofrer influência "em parte da sua extensão" de marés e isso teria, em tese, o potencial de afetar áreas contíguas, essas sim sujeitas à proteção ambiental da União, do ICMBIO e do IBAMA: Assim, por exemplo, no caso da presença de saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii tem potencialidade de contaminar moluscos e outros organismos que tenham relevância ecológica, tais como aqueles que compõem a fauna ou a flora integrante da UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL DA RESERVA BIOLÓGICA MARINHA – REBIO DO ARVOREDO ou da ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL – APA DA BALEIA FRANCA ou que, mesmo não a integrando, sejam de algum modo ecologicamente relevantes para essas UCs. Trata-se, obviamente, de hipótese sem alicerce probatório robusto para que se possa avaliar, de forma objetiva, o risco a que as áreas sujeitas à proteção ambiental da União estão submetidas. Essa pressuposição persiste em toda a narrativa da petição inicial: No dia 14.5.2021, notícia jornalística relatou que pesquisadores do Laboratório de Ficologia da UFSC – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA constataram a presença de quantidades elevadas de uma toxina proveniente de cianobactérias na LAGOA DO PERI e a possibilidade de essa substância atingir o mar, por meio da Praia do Matadeiro. O Parecer Técnico nº 749/2021 conclui que o documento subscrito pelo Professor Leonardo Rubi Rörig não esclarece se cianobactérias da LAGOA DO PERI e suas toxinas foram transportadas até o mar , tampouco se podem afetar organismos aquáticos na natureza. Em 15.10.2021, a Assessoria Pericial do MPF elaborou o Laudo Técnico nº 1.197/2021-ANPMA/CNP, que conclui que as pesquisas científicas realizadas pelo LAFIC indicam, em tese, um potencial risco de consumo de cionobactéria tóxica proveniente da LAGOA DO PERI por moluscos bivalves existentes na Praia do Matadeiro . Porém, em que pese esse risco potencial, não há dados científicos robustos sobre a capacidade de sobrevivência de Raphidiopsis raciborskii em ambientes tipicamente marinhos. a FLORAM elaborou o Parecer Técnico nº 933/2021-DILIC, que consigna que há um risco potencial de contaminação de moluscos , que possuem a capacidade de bioacumular substâncias diversas, o que poderia levar a concentrações de ficotoxinas significativamente mais elevadas do que as encontradas nas águas. a despeito do risco de exposição de moluscos comestíveis na Praia do Matadeiro e circunvizinhanças às toxinas produzidas por cianobactérias que florescem na LAGOA DO PERI haver sido evidenciado experimentalmente, não há confirmação da acumulação das toxinas naqueles animais, mediante análises diretas em amostras de moluscos colhidos no ambiente, tampouco estudos que estabeleçam o alcance do aporte da biomassa tóxica oriunda da LAGOA DO PERI na região costeira adjacente. Essas citações, retiradas da petição inicial ( 1.1 ), demonstram que a alegada legitimidade passiva da União (e, por reflexo, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA) decorre de uma suposição de que pode haver uma contaminação, supostamente já existente na Lagoa do Peri (até mesmo quanto a isso remanescem dúvidas consideráveis), na região costeira adjacente, sujeita, em tese, ao poder de polícia dos corréus, ora recorrentes. Sobreleva-se, a partir disso, a necessidade de adequada compreensão dos limites que possibilitam a atuação fiscalizatória da União em matéria ambiental, perspectiva que alcança, observadas as particularidades inerentes a cada órgão e entidade administrativa, não apenas a União mas também o IBAMA, o ICMBIO e, no caso dos autos, a própria ANA. Essa é a dicção do art. 17, § 3º, da Lei Complementar nº 140/2011: Art. 17. Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada. § 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput. Sobre essa norma se manifestou o STF (ADI 4.757. Rel. Rosa Weber. Julgamento: 13/12/2022. Publicação: 17/03/2023), consignando que "referida legislação não trata sobre os deveres de tutela ambiental de forma genérica e ampla, como disciplina o art. 225, §1º, IV, tampouco regulamenta o agir legislativo, marcado pela repartição concorrente de competências, inclusive no tocante à normatização do licenciamento em si". Em razão disso, concluiu o STF que " o nível de ação do agir político-administrativo nos domínios das competências partilhadas, próprio do modelo do federalismo cooperativo, deve ser medido pelo princípio da subsidiariedade . Ou seja, na conformação dos arranjos cooperativos, a ação do ente social ou político maior no menor, justifica-se quando comprovada a incapacidade institucional desse e demonstrada a eficácia protetiva daquele" . A consequência é inequívoca: " Um dos princípios fundamentais do funcionamento do sistema legal de tutela do meio ambiente é o da atuação supletiva do órgão federal, seja em matéria de licenciamento seja em matéria de controle e fiscalização das atividades ou empreendimentos potencialmente poluidores ou degradantes do meio ambiente . No exercício da cooperação administrativa, portanto, cabe atuação suplementar – ainda que não conflitiva – da União com a dos órgãos estadual e municipal". Não basta, portanto, ampliar imotivadamente a atuação administrativa a fim de abarcar, a um só tempo, ações estaduais, municipais e federais. Como visto, a tutela ambiental, segundo o STF, alicerça-se na premissa de um federalismo cooperativo, o que implica, por sua vez, que a atuação de órgãos ou entidades federais - quando já há órgãos ou entidades estaduais ou municipais com competência ambiental regularmente instituídos - dá-se em caráter supletivo . A supletividade exige, a seu turno, comprovação suficiente de que os órgãos ou entidades estaduais e municipais não atuaram a partir das competências legalmente fixadas. Isso autorizaria, em tese, a ação supletiva da União e, por via reflexa, do IBAMA, do ICMBIO e, in casu , da ANA. Esa comprovação, entretanto, não resta evidenciada no caso dos autos, já que, como visto, a indicação dos corréus foi efetuada a partir de potenciais riscos que poderiam, em tese, afetar - e disso não há sequer indícios robustos - áreas que a União, por seus órgãos ou pelas respectivas entidades, deveria proteger. Deve ser ponderado, ainda, que o STF assentou a importância de respeito às diversidades locais, inclusive como critério interpretativo, como ilustra a ADI 5.996 (Rel. Alexandre de Moraes, julgamento: 15/04/2020, publicação: 30/04/2020): O princípio geral que norteia a repartição de competência entre os entes componentes do Estado Federal brasileiro, portanto, é o princípio da predominância do interesse, não apenas para as matérias cuja definição foi preestabelecida pelo texto constitucional, mas também em termos de interpretação em hipóteses que envolvem várias e diversas matérias, como na presente ação direta de inconstitucionalidade. (...) Essa opção inicial do legislador constituinte, ao centralizar nos poderes enumerados da União (CF, artigo 22) a maioria das matérias legislativas mais importantes, contudo, não afastou da Constituição de 1988 os princípios básicos de nossa tradição republicana federalista, que gravita em torno do princípio da autonomia, da participação política e da existência de competências legislativas próprias dos Estados/Distrito Federal e Municípios, indicando ao intérprete a necessidade de aplicá-los como vetores principais em cada hipótese concreta em que haja a necessidade de análise da predominância do interesse, para que se garanta a manutenção, fortalecimento e, principalmente, o equilíbrio federativo (GERALDO ATALIBA. República e constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 10), que se caracteriza pelo respeito às diversidades locais, como bem salientado por MICHAEL J. MALBIN, ao apontar que a intenção dos elaboradores da Carta Constitucional Americana foi justamente estimular e incentivar a diversidade, transcendendo as facções e trabalhando pelo bem comum (A ordem constitucional americana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987, p. 144), consagrando, ainda, a pluralidade de centros locais de poder, com autonomia de autogoverno e autoadministração, para que se reforçasse a ideia de preservação da autonomia na elaboração do federalismo, como salientado por ALEXIS DE TOCQUEVILLE, ao comentar a formação da nação americana (Democracia na América: leis e costumes. São Paulo: Martins Fontes, 1988. p. 37 e ss.), que serviu de modelo à nossa Primeira Constituição Republicana em 1891. Nos regimes federalistas, respeitadas as opções realizadas pelo legislador constituinte e previamente estabelecidas no próprio texto constitucional, quando surgem dúvidas sobre a distribuição de competências e, consequentemente, a necessidade de definição do ente federativo competente para legislar sobre determinado e específico assunto, que engloba uma ou várias matérias com previsão ou reflexos em diversos ramos do Direito, caberá ao interprete priorizar o fortalecimento das autonomias locais e o respeito às suas diversidades como pontos caracterizadores e asseguradores do convívio no Estado Federal , que garantam o imprescindível equilíbrio federativo (...) Grifei. A partir desses parâmetros, depreende-se a necessidade de valorização das autonomias locais - e de suas respectivas competências constitucionais e legais - para atuarem em proteção ao meio ambiente. Não há como simplesmente equiparar, nos moldes desejados pela petição inicial, as atribuições da União, do IBAMA, do ICMBIO, da ANA, do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento. Cada órgão/entidade possui atribuições específicas que, sob pena de enfraquecimento da própria proteção ambiental, devem ser minimamente observadas. Como critérios para a fixação de competência, em casos dessa natureza, sobreleva-se a importância de adequadamente sopesar (i) a supletividade da atuação dos órgãos federais, o que decorre do modelo de federalismo cooperativo e (ii) a priorização das autonomias locais. O cotejo de tais fatores (supletividade e priorização das autonomias locais) possibilita estabelecer um critério geral em matéria de responsabilidade ambiental: a indicação de órgãos e entidades federais como responsáveis por ações ou omissões de natureza ambiental, quando não se trata de bem de titularidade federal, revela-se cabível se houver a comprovação, ao menos indiciária, da incapacidade institucional dos órgãos ou entidades estaduais ou municipais, no âmbito de suas respectivas competências. Somente se restar evidenciada essa situação justificar-se-á a ação do ente social ou político maior no menor, conforme entendimento do STF. No caso dos autos, não há, sob qualquer aspecto, efetiva comprovação de que os órgãos ou entidades estaduais ou municipais estejam desempenhando de modo insatisfatório as suas atribuições legais. Não há como afirmar, dada a ausência de indicativos robustos nesse sentido, a incapacidade institucional, in casu , do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento para a tutela ambiental na Lagoa do Peri. Evidenciada, assim, a ilegitimidade passiva da União , do IBAMA , do ICMBIO e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA . Trata-se de questão que, embora tenha sido apresentada pelas partes em suas razões recursais, constitui matéria de ordem pública, podendo, em razão disso, ser arguida e conhecida em qualquer grau de jurisdição, até mesmo de ofício ( v.g. TRF4, AC 5013560-05.2020.4.04.7200, 1ª Turma, Relator LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, julgado em 15/10/2024). Verifico, por outro lado, que a ação de origem foi proposta também em face, como já dito, do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento e, em relação a eles, seja em razão (i) da premissa do federalismo cooperativo, seja por força (ii) da priorização das autonomias locais, seja em virtude (iii) da titularidade do MONA da Lagoa do Peri, não há que se falar em ilegitimidade passiva. Assenta-se, assim, a competência da Justiça Estadual para o processo e julgamento da ação de origem, perspectiva que se dá, inclusive, a partir do que dispõem as Súmulas 150, 224 e 254, todas do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, declino da competência em favor da Justiça Estadual de Santa Catarina e determino a remessa dos autos para a Comarca de Florianópolis / SC. Intimem-se. A referida decisão expressamente consignou - no que pertine ao recurso ora em exame - que "a ação de origem foi proposta também em face, como já dito, do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento e, em relação a eles, seja em razão (i) da premissa do federalismo cooperativo, seja por força (ii) da priorização das autonomias locais, seja em virtude (iii) da titularidade do MONA da Lagoa do Peri, não há que se falar em ilegitimidade passiva" . Reconhecida a competência da Justiça Estadual para o processo e julgamento da ação de origem (processo nº 5021175-70.2025.4.04.7200) e, portanto, a incompetência desta Justiça Federal, a decisão recorrida deixou de produzir quaisquer efeitos em relação a todos os corréus. Eventuais obrigações de responsabilidade da CASAN, a (in)existência de urgência de medidas protetivas e mesmo a superveniente perda do objeto da ação constituem argumentos que devem ser apreciados, agora, pelo Juízo competente. Ante o exposto, declino da competência em favor da Justiça Estadual de Santa Catarina e determino a remessa dos autos para a Comarca de Florianópolis / SC.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 5019644-15.2025.4.04.0000

ID: 325659318

Tribunal: TRF4 Órgão: SECRETARIA DA 11a. TURMA Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 5019644-15.2025.4.04.0000

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

CHARLES CAGOL DO NASCIMENTO

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

BRUNO ANGELI BONEMER

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

Agravo de Instrumento Nº 5019644-15.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo … Agravo de Instrumento Nº 5019644-15.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo de Instrumento: (1) 5019929-08.2025.4.04.0000 (interposto pela União); (2) 5019643-30.2025.4.04.0000 (interposto pelo IBAMA); (3) 5019645-97.2025.4.04.0000 (interposto pela ANA) e (4) 5019644-15.2025.4.04.0000 (interposto pelo ICMBIO). Os referidos Agravos de Instrumento foram interpostos em face de decisão com o seguinte teor ( 24.1 ): (...) a) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem um ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR26 sobre a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, que compreenda a bacia hidrográfica da região, incluindo os diversos elementos hídricos relevantes para a LAGOA DO PERI, a fim de, inter alia, avaliarem a capacidade de suporte da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI em relação às presentes e futuras intervenções ou empreendimentos na localidade (e.g., para garantir a compatibilidade dos parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água), bem como a identificarem as possíveis fontes de poluição e contaminação da LAGOA DO PERI, tais como ligações clandestinas na rede pluvial e lançamento direto ou indireto de efluentes não-tratados nos corpos hídricos relevantes de sua bacia hidrográfica, dentro do prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desatendimento; b) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem e implementarem um PLANO DE TRABALHO que contemple a execução de medidas de análise e fiscalização nos locais identificados naquele ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR (com, por exemplo, os parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água, as possíveis fontes de poluição e contaminação da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, etc), o qual deve ser iniciado no prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desobediência; c) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para elaborar um PLANO DE EMERGÊNCIA E CONTINGÊNCIA, com ações corretivas de curto, médio e longo prazos, sempre que se detectarem riscos à saúde (humana ou não), pelo consumo da água da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, tais como pela concentração de toxinas acima dos limites permitidos ou pela contaminação de suas águas por outros fatores de poluição, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de inobservância; d) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para garantir que as atividades das comunidades tradicionais relacionadas com a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI (tal como a pesca artesanal e a extração de mariscos) sejam realizadas sem riscos da presença de patógenos de grave repercussão à saúde, tais como as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, como, por exemplo, as medidas indicadas pelo IBAMA na Informação Técnica nº 178/2022-NUBIO-SC/DITEC-SC: d.1) Ampliação do número de sítios de monitoramento, incluindo-se pontos de análise de qualidade de água, da composição da comunidade fitoplanctônica e monitoramento de cianotoxinas no canal do Rio Sangradouro, na desembocadura do rio e em pontos estratégicos na praia do Matadeiro e Armação do Pântano do Sul, considerando as condições oceanográficas da zona de mistura na foz do rio; d.2) Monitoramento contínuo de bivalves marinhos, com amostragens periódicas na praia do Matadeiro e Armação, para avaliação do grau de acumulação de cianotoxinas nos tecidos destes organismos, com vistas à adoção de medidas sanitárias de suspensão de coleta e/ou cultivo quando os níveis destas toxinas se tornarem danosos à saúde humana; d.3) Estabelecimento de plano de análises ecotoxicológicas, para avaliação contínua dos efeitos de toxicidade de R. raciborskii em organismos chave para a alimentação da população tradicional local, incluindo moluscos, peixes, e outras espécies que sejam relevantes para a comunidade”. Em caso de recalcitrância, deverá ser imposta pena de multa diária de R$5.000,00 a cada uma das pessoas físicas responsáveis. (...) A União opõe-se à decisão a partir dos seguintes argumentos: (i) inexistência de responsabilidade sobre a água da Lagoa do Peri, pois não se trata de corpo hídrico federal, mas de unidade de conservação municipal; (ii) não há qualquer conduta comissiva ou omissiva imputada à União; (iii) a decisão proferida é genérica e não se alicerça em fundamentos fáticos e jurídicos concretos; (iv) a multa foi fixada em valor excessivo ( processo 5019929-08.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O IBAMA questiona a decisão recorrida a partir dos seguintes fundamentos: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos apresentados pelas entidades públicas, ignorando que se trata, a Lagoa do Peri, de corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) não há risco imediato de dano irreparável ou de difícil reparação; (iii) a decisão proferida ignorou que o IBAMA pode atuar somente de modo subsidiário, conforme o entendimento do STF; (iv) a competência primária em fiscalização ambiental na área em comento não compete ao IBAMA, mas à municipalidade ou ao Estado de Santa Catarina; (v) deveria ter sido observado o disposto no Tema 698/STF; (vi) a multa fixada é indevida e excessiva ( processo 5019643-30.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). A ANA - Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico alegou em seu recurso: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos deduzidos pelos corréus, indicativos de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) a ANA seria parte passiva ilegítima porque os pedidos formulados não se relacionam com as suas atribuições; (iii) inexiste risco imediato de dano irreparável; (iv) as determinações impostas são inexequíveis e desnecessárias; (v) a multa fixada é descabida e foi fixada em montante excessivo ( processo 5019645-97.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O ICMBIO , por sua vez, apresenta as seguintes razões recursais: (i) foram ignorados, pela decisão recorrida, os fatos apresentados pelas entidades públicas, comprobatórios de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) o ICMBIO seria parte parte passiva ilegítima, pois os fatos apresentados não se inserem no âmbito de suas competências; (iii) não há risco de dano irreparável no local; (iv) as imposições da decisão recorrida são inexequíveis e descabidas; (v) a multa fixada é excessiva ( processo 5019644-15.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). É o relatório. Decido. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF em face do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis , da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento , da União , do IBAMA , do ICMBIO e da ANA , com o seguinte objeto ( 1.1 ): A PROCURADORIA DA REPÚBLICA, por meio desta ação, busca garantir, entre outras medidas, que as atividades relacionadas com a coleta, o tratamento e a distribuição de água feita pela LAGOA DO PERI para consumo (humano ou não) não ofereça riscos à saúde, bem como que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, resguardando, assim, os atributos físicos, bióticos e sociais dessa área geográfica ambientalmente sensível. Esta demanda visa, ainda, à responsabilização solidária do MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, da FLORAM, da CASAN, da UNIÃO, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA, por sua omissão ou atuação ineficiente/deficiente quanto ao dever de prestar o serviço público de saneamento urbano de modo eficiente e eficaz, bem como de garantir que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii. Ainda que a legitimidade da parte pressuponha, como regra, uma análise anterior ao mérito, a partir de um exame alicerçado in status assertionis , ou seja, baseado nos argumentos apresentados na fase postulatória (TRF4, AG 5019715-51.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator RODRIGO KOEHLER RIBEIRO, julgado em 26/11/2024), isso, por si só, não autoriza que qualquer pretensão, principalmente se não especificar o âmbito da responsabilidade que se busca apurar, possa ser deduzida judicialmente. Por isso se afirma que "a legitimidade passiva ad causam é definida pela narrativa dos fatos e fundamentos jurídicos constante na petição inicial (teoria da asserção) (...)" (TRF4, AG 5049639-15.2021.4.04.0000, 4ª Turma, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, julgado em 30/03/2022). Na situação dos autos, o MPF imputou a todos os corréus uma série de deveres decorrentes, em tese, da omissão, tanto na fiscalização ambiental como no exercício do respectivo poder de polícia, que culminou com a ocorrência de danos ambientais junto ao entorno da Lagoa do Peri, em Florianópolis. A situação posta nos autos, contudo, demanda apuração mais cuidadosa, pois a petição inicial do feito de origem limitou-se a apontar, de forma ampla, a legitimidade passiva da União, do ICMBIO, do IBAMA e da ANA a partir de premissas flagrantemente genéricas. A narrativa da peça inicial busca abarcar, a pretexto de salvaguardar o meio ambiente, uma multiplicidade de atuações administrativas que sequer foram objetivamente indicadas, admitindo, sem acurada explicação, a mescla de competências estaduais, municipais e federais. Trata-se de perspectiva que, em um primeiro momento, sugere a própria inépcia da petição inicial, pois, como consabido, "considera-se inepta a petição inicial quando o o pedido for indeterminado e da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão" (TRF4, AC 5038641-14.2024.4.04.7200, 2ª Turma, Relator para Acórdão EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA, julgado em 17/06/2025). Além disso, conforme já decidiu esta Corte (TRF4, AC 5022913-50.2012.4.04.7200, 4ª Turma, Relator para Acórdão LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 14/12/2016), "a causa de pedir - pressuposto processual necessário para o desenvolvimento válido e regular do processo (art. 295 do CPC/73) - é constituída pelos fundamentos do pedido do autor da ação - motivos que legitimam a sua pretensão. Examinando a causa de pedir, o juiz verifica se o pedido deduzido tem ou não fundamento para ser acolhido. Verificando-se que a petição inicial é clara e possui os fundamentos jurídicos e fáticos necessários à identificação do pedido e da causa de pedir, deve ser afastada a alegação de inépcia da petição inicial". Consequentemente, verificando-se que a causa de pedir é genérica e incerta, ou ampla a ponto de impedir a apuração objetiva das alegadas responsabilidades, cabível, em tese, o reconhecimento de inépcia da peça vestibular. Acerca das potenciais responsabilidades em face dos riscos ambientais verificados na Lagoa do Peri, aponta a petição inicial as seguintes hipóteses de legitimidade passiva ( 1.1 , p. 31 e seguintes): LEGITIMIDADE PASSIVA FUNDAMENTOS DA LEGITIMIDADE UNIÃO (p. 31) "A legitimação passiva da UNIÃO se fundamenta na competência administrativa da SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU para, no âmbito patrimonial, zelar pela integridade dos imóveis pertencentes à UNIÃO, devendo, assim, fiscalizar e defender seu domínio (tais como terras e acrescidos de marinha) contra toda e qualquer ameaça ou efetiva intervenção ilegal, como turbações, ocupações e esbulhos, não se discutindo suas atribuições para agir quando se cuida de terras e acrescidos de marinha, ainda mais quando se cuida de espaços territoriais especialmente protegidos e ambientalmente sensíveis (APP de curso d’água e Zona Costeira)". ANA (p. 32) "A ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO é responsável por implementar a gestão dos recursos hídricos brasileiros e por regular o saneamento básico. É obrigação da ANA fiscalizar as condições de operação de reservatórios, o uso de recursos hídricos e o cumprimento das normas de saneamento básico, além de monitorar os sedimentos dos rios (Lei nº 9.984/2000, art. 4º e seus incisos)". IBAMA e ICMBIO (p. 33 e 37) "evidente a presença do interesse do IBAMA e do ICMBio em estabelecer parâmetros adequados de gestão ambiental (inclusive em prol da REBIO DO ARVOREDO e da APA DA BALEIA FRANCA) e, ainda, de adotar medidas efetivas para prevenção de contaminação". "o IBAMA e o ICMBio, no âmbito administrativo, possuem poder de polícia para fiscalizar atividades ilícitas contra o meio ambiente, mesmo em área cuja competência para licenciamento ambiental seja do Estado, seja do Município". "o IBAMA também é competente para o caso por haver FLORESTA PÚBLICA FEDERAL na localidade (vegetação do ecossistema de restinga)". "compete ao ICMBio e ao IBAMA o exercício do poder de polícia não apenas na área inserida dentro da UC, mas também em seu entorno, a fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas e, ainda, garantir a defesa dessas áreas protegidas". ICMBIO (p. 36) "O ICMBio, a seu turno, assim como o IBAMA, deveria ter garantido o respeito à integridade física da REBIO DO ARVOREDO (UC federal cuja Zona de Amortecimento é lindeira à LAGOA DO PERI) e da APA DA BALEIA FRANCA (UC federal cujos limites estão justapostos àquela localidade - Decreto federal s/nº, de 14.9.2000, arts. 1º, 3º, caput e incs. V, VI e X, 4º, 6º e 7º), ou, pelo menos, deveria ter exercitado suas atribuições fiscalizatórias, a teor do artigo 1º do Decreto de criação da APA DA BALEIA FRANCA". Apesar disso, o próprio MPF pontua ( 1.1 ): A despeito de a LAGOA DO PERI (reservatório e principal fonte para captação e abastecimento de água para a região sul e leste da Ilha de Florianópolis) ser um corpo hídrico de domínio estadual , suas águas percorrem o Rio Sangradouro, que sofre influência de marés e deságua no mar. (p. 32) Mas, em vez de adotarem alguma medida efetiva, o IBAMA e o ICMBio optam por direcionar ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS a atribuição para a recuperação das áreas afetadas . Ao final, NADA de efetivo é feito para proteger e recuperar o Meio Ambiente local. (p. 34) (Grifei) Depreende-se que a Lagoa do Peri, área que se busca preservar sob o aspecto ambiental, trata-se, segundo o MPF, de corpo hídrico que não é de domínio federal. O local foi protegido a partir da edição da Lei Municipal de Florianópolis nº 10.530/2019 que criou a Unidade de Conservação Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri (MONA DA LAGOA DO PERI), com expressa indicação de que o " MONA da Lagoa do Peri fica vinculado à Fundação Municipal do Meio Ambiente (FLORAM) , a quem caberá a gestão técnica, administrativa e operacional da Unidade de Conservação" (art. 3º - Grifei). Não remanescem dúvidas - inclusive por expressa vinculação legal, conforme dispõe a Lei nº 10.530/2019 - que a titularidade do MONA da Lagoa do Peri compete ao Município de Florianópolis, a partir da atuação da FLORAM. Trata-se de constatação que se verifica inclusive no endereço eletrônico da Prefeitura Municipal de Florianópolis, consultado nesta data, indicando que a Gestão do Programa no local compete à FLORAM e referindo, no Plano de Manejo do Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri , o histórico protetivo da Lagoa do Peri: Em 1976, percebendo a importância do manancial hídrico, o município de Florianópolis realizou o tombamento da Bacia Hidrográfica da Lagoa do Peri por meio do Decreto Municipal nº 1.408/1976 (Florianópolis, 1976), cujos limites foram utilizados para a criação da UC pela Lei Municipal nº 1.828/1981 (Florianópolis, 1981), denominada Parque Municipal da Lagoa do Peri, sendo a primeira UC municipal, com o principal objetivo de conservação do recurso hídrico. Com características peculiares, a UC foi regulamentada pelo Decreto Municipal nº 91/1982 (Florianópolis, 1982), que dispôs sobre o zoneamento da área, os usos definidos para as populações tradicionais e os usos públicos de lazer, de modo a compatibilizá-los com a proteção das paisagens, da flora, da fauna e dos ecossistemas. O dispositivo estabeleceu também regramentos para o uso e ocupação do solo, bem como para seu parcelamento e edificações, buscando compatibilizar esses usos com a manutenção da paisagem e seus processos ecológicos. Ao longo do processo de implantação da UC, então Parque Municipal da Lagoa do Peri, devido a vários fatores como suas dimensões e complexidade intrínseca, falta de implementação pelo poder público e as profundas transfor - mações ocorridas na cidade, houve êxitos e equívocos, tanto por parte da gestão pública, como por parte de proprietários, moradores e usuários. Somente em 2007 foi criado seu Conselho Gestor e, a partir de então, o debate se concentrou na necessidade de adequação ao SNUC, pois a categoria “Parque Natural” não permite a propriedade privada e os respectivos usos historicamente existentes e reconhecidos no interior da UC pelas comunidades tradicionais do Sertão do Ribeirão e Porto do Contrato. Desta maneira, surgiu a proposta de recategorização para Monumento Natural, fato que ganhou corpo com a criação da Comissão Especial para Adequa - ção das Unidades de Conservação (CEAUC), com a Portaria SMAD 3.167/2013 (Florianópolis, 2013), e com a retomada dos trabalhos do conselho gestor em 2015. Assim, após rigoroso estudo técnico e ampla participação social, em 2018 foi encaminhada a proposta de mudança de categoria e de alteração dos limites que culminou no Projeto de Lei nº 17.493/2018 e, posteriormente, na Lei Municipal nº 10.530/2019 (Florianópolis, 2019a). Verifica-se que o local foi historicamente submetido à competência municipal. Consequentemente, mitiga-se a ampliação do escopo protetivo como requereu o MPF, pois a alegação de que o Município ou a FLORAM não direcionam os devidos cuidados à região não justifica, por si só, sem provas robustas nesse sentido, a propositura da ação em face de outros entes que não contribuíram objetivamente para a ação ou para a omissão que, em tese, geraram os alegados danos ou riscos ambientais. Não remanescem dúvidas acerca da importância da atuação conjunta de todos os entes da Federação para a proteção ambiental, inclusive porque se trata de competência constitucional comum. Assim, como já decidiu o STJ, "diante de uma infração ambiental, os agentes de fiscalização ambiental federal, estadual ou municipal terão o dever de agir imediatamente, obstando a perpetuação da infração" (STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp 1.499.874/SC, Rel. Mauro Campbell Marques, julgamento: 19/11/2019, publicação: 22/11/2019). Isso não significa, entretanto, que, a pretexto de implementar uma atuação conjunta, possam ser suplantadas competências legais, pois mesmo a proteção ambiental - cujo interesse é de todos os entes federativos - encontra como limite a titularidade do bem afetado. O entendimento desta Corte correlaciona a responsabilidade civil pelo dano ambiental - e, consequentemente, também a legitimidade passiva do suposto responsável - (i) à titularidade do bem e (ii) à ação ou omissão que foram decisivas para a configuração do dano. Nesse sentido: AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AMBIENTAIS. TERRENO DE MARINHA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE. 1. A legitimidade passiva ad causam consiste na pertinência subjetiva da parte à relação de direito material objeto da lide e, como toda e qualquer condição da ação, é aferível com base na narrativa veiculada na petição inicial (teoria da asserção), bastando, para sua configuração, que os argumentos lá deduzidos permitam a inferência, em um exame puramente abstrato, de que o réu pode ser o sujeito responsável pela violação do direito subjetivo do autor. 2. O poder de polícia do órgão ambiental não impede ou não tolhe a intervenção judicial, seja quando a Administração Pública extrapola, seja quando se omite, total ou parcialmente, na aplicação de incumbências preceituadas, máxime as de licenciamento fiscalização e repressão de ilícitos (STJ, 2ª Turma, REsp 1.745.033/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 20/10/2020, DJe 17/12/2021). 3. Demonstrado que o dano ambiental ocorreu em área de preservação permanente e de propriedade da União , bem como que a ocupação irregular resultou de ações omissivas do ente federal, impõe-se sua responsabilização. (TRF4, AC 5006129-77.2021.4.04.7201, 4ª Turma, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, julgado em 02/10/2024) Grifei. [...] A legitimidade passiva da União decorre da infração ambiental ter ocorrido em terreno de marinha , bem do ente federal, ex vi do art. 20, VI e VII, da Constituição Federal e pela caracterização omissiva no dever de fiscalizar , independemente do local onde o dano tenha sido perpetrado , além de ter afetado o livre acesso à praia, bem integrante do domínio público da União, o que evidencia sobremaneira o interesse federal na sua salvaguarda, inclusive com fiscalização e punição de infrações administrativas de degradação. [...](TRF4, AC 5027902-28.2014.4.04.7201, 4ª Turma, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 12/07/2023) Grifei. A situação posta em exame, como visto, apresenta particularidades que não podem ser meramente desconsideradas. A área que se sujeita aos alegados riscos ambientais é de titularidade do Município de Florianópolis, com regramento próprio e perspectiva protetiva específica. Não se trata, portanto, de local sujeito ao controle da União e, portanto, está igualmente afastado do policiamento administrativo de autarquias federais. Há, no caso dos autos, dificuldade inclusive em compreender os limites da proteção ambiental desejada pelo MPF, principalmente quando se verifica que os possíveis danos ou riscos são hipotéticos e potenciais, sem que se possa afirmar, a partir da narrativa da petição inicial ( 1.1 ), que efetivamente decorrem de uma ação ou de uma omissão da União, do IBAMA, do ICMBIO e mesmo da ANA. A premissa adotada pelo MPF pressupõe - "a despeito de a LAGOA DO PERI ser um um corpo hídrico de domínio estadual" ( 1.1 ) - que as suas águas podem sofrer influência "em parte da sua extensão" de marés e isso teria, em tese, o potencial de afetar áreas contíguas, essas sim sujeitas à proteção ambiental da União, do ICMBIO e do IBAMA: Assim, por exemplo, no caso da presença de saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii tem potencialidade de contaminar moluscos e outros organismos que tenham relevância ecológica, tais como aqueles que compõem a fauna ou a flora integrante da UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL DA RESERVA BIOLÓGICA MARINHA – REBIO DO ARVOREDO ou da ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL – APA DA BALEIA FRANCA ou que, mesmo não a integrando, sejam de algum modo ecologicamente relevantes para essas UCs. Trata-se, obviamente, de hipótese sem alicerce probatório robusto para que se possa avaliar, de forma objetiva, o risco a que as áreas sujeitas à proteção ambiental da União estão submetidas. Essa pressuposição persiste em toda a narrativa da petição inicial: No dia 14.5.2021, notícia jornalística relatou que pesquisadores do Laboratório de Ficologia da UFSC – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA constataram a presença de quantidades elevadas de uma toxina proveniente de cianobactérias na LAGOA DO PERI e a possibilidade de essa substância atingir o mar, por meio da Praia do Matadeiro. O Parecer Técnico nº 749/2021 conclui que o documento subscrito pelo Professor Leonardo Rubi Rörig não esclarece se cianobactérias da LAGOA DO PERI e suas toxinas foram transportadas até o mar , tampouco se podem afetar organismos aquáticos na natureza. Em 15.10.2021, a Assessoria Pericial do MPF elaborou o Laudo Técnico nº 1.197/2021-ANPMA/CNP, que conclui que as pesquisas científicas realizadas pelo LAFIC indicam, em tese, um potencial risco de consumo de cionobactéria tóxica proveniente da LAGOA DO PERI por moluscos bivalves existentes na Praia do Matadeiro . Porém, em que pese esse risco potencial, não há dados científicos robustos sobre a capacidade de sobrevivência de Raphidiopsis raciborskii em ambientes tipicamente marinhos. a FLORAM elaborou o Parecer Técnico nº 933/2021-DILIC, que consigna que há um risco potencial de contaminação de moluscos , que possuem a capacidade de bioacumular substâncias diversas, o que poderia levar a concentrações de ficotoxinas significativamente mais elevadas do que as encontradas nas águas. a despeito do risco de exposição de moluscos comestíveis na Praia do Matadeiro e circunvizinhanças às toxinas produzidas por cianobactérias que florescem na LAGOA DO PERI haver sido evidenciado experimentalmente, não há confirmação da acumulação das toxinas naqueles animais, mediante análises diretas em amostras de moluscos colhidos no ambiente, tampouco estudos que estabeleçam o alcance do aporte da biomassa tóxica oriunda da LAGOA DO PERI na região costeira adjacente. Essas citações, retiradas da petição inicial ( 1.1 ), demonstram que a alegada legitimidade passiva da União (e, por reflexo, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA) decorre de uma suposição de que pode haver uma contaminação, supostamente já existente na Lagoa do Peri (até mesmo quanto a isso remanescem dúvidas consideráveis), na região costeira adjacente, sujeita, em tese, ao poder de polícia dos corréus, ora recorrentes. Sobreleva-se, a partir disso, a necessidade de adequada compreensão dos limites que possibilitam a atuação fiscalizatória da União em matéria ambiental, perspectiva que alcança, observadas as particularidades inerentes a cada órgão e entidade administrativa, não apenas a União mas também o IBAMA, o ICMBIO e, no caso dos autos, a própria ANA. Essa é a dicção do art. 17, § 3º, da Lei Complementar nº 140/2011: Art. 17. Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada. § 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput. Sobre essa norma se manifestou o STF (ADI 4.757. Rel. Rosa Weber. Julgamento: 13/12/2022. Publicação: 17/03/2023), consignando que "referida legislação não trata sobre os deveres de tutela ambiental de forma genérica e ampla, como disciplina o art. 225, §1º, IV, tampouco regulamenta o agir legislativo, marcado pela repartição concorrente de competências, inclusive no tocante à normatização do licenciamento em si". Em razão disso, concluiu o STF que " o nível de ação do agir político-administrativo nos domínios das competências partilhadas, próprio do modelo do federalismo cooperativo, deve ser medido pelo princípio da subsidiariedade . Ou seja, na conformação dos arranjos cooperativos, a ação do ente social ou político maior no menor, justifica-se quando comprovada a incapacidade institucional desse e demonstrada a eficácia protetiva daquele" . A consequência é inequívoca: " Um dos princípios fundamentais do funcionamento do sistema legal de tutela do meio ambiente é o da atuação supletiva do órgão federal, seja em matéria de licenciamento seja em matéria de controle e fiscalização das atividades ou empreendimentos potencialmente poluidores ou degradantes do meio ambiente . No exercício da cooperação administrativa, portanto, cabe atuação suplementar – ainda que não conflitiva – da União com a dos órgãos estadual e municipal". Não basta, portanto, ampliar imotivadamente a atuação administrativa a fim de abarcar, a um só tempo, ações estaduais, municipais e federais. Como visto, a tutela ambiental, segundo o STF, alicerça-se na premissa de um federalismo cooperativo, o que implica, por sua vez, que a atuação de órgãos ou entidades federais - quando já há órgãos ou entidades estaduais ou municipais com competência ambiental regularmente instituídos - dá-se em caráter supletivo . A supletividade exige, a seu turno, comprovação suficiente de que os órgãos ou entidades estaduais e municipais não atuaram a partir das competências legalmente fixadas. Isso autorizaria, em tese, a ação supletiva da União e, por via reflexa, do IBAMA, do ICMBIO e, in casu , da ANA. Esa comprovação, entretanto, não resta evidenciada no caso dos autos, já que, como visto, a indicação dos corréus foi efetuada a partir de potenciais riscos que poderiam, em tese, afetar - e disso não há sequer indícios robustos - áreas que a União, por seus órgãos ou pelas respectivas entidades, deveria proteger. Deve ser ponderado, ainda, que o STF assentou a importância de respeito às diversidades locais, inclusive como critério interpretativo, como ilustra a ADI 5.996 (Rel. Alexandre de Moraes, julgamento: 15/04/2020, publicação: 30/04/2020): O princípio geral que norteia a repartição de competência entre os entes componentes do Estado Federal brasileiro, portanto, é o princípio da predominância do interesse, não apenas para as matérias cuja definição foi preestabelecida pelo texto constitucional, mas também em termos de interpretação em hipóteses que envolvem várias e diversas matérias, como na presente ação direta de inconstitucionalidade. (...) Essa opção inicial do legislador constituinte, ao centralizar nos poderes enumerados da União (CF, artigo 22) a maioria das matérias legislativas mais importantes, contudo, não afastou da Constituição de 1988 os princípios básicos de nossa tradição republicana federalista, que gravita em torno do princípio da autonomia, da participação política e da existência de competências legislativas próprias dos Estados/Distrito Federal e Municípios, indicando ao intérprete a necessidade de aplicá-los como vetores principais em cada hipótese concreta em que haja a necessidade de análise da predominância do interesse, para que se garanta a manutenção, fortalecimento e, principalmente, o equilíbrio federativo (GERALDO ATALIBA. República e constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 10), que se caracteriza pelo respeito às diversidades locais, como bem salientado por MICHAEL J. MALBIN, ao apontar que a intenção dos elaboradores da Carta Constitucional Americana foi justamente estimular e incentivar a diversidade, transcendendo as facções e trabalhando pelo bem comum (A ordem constitucional americana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987, p. 144), consagrando, ainda, a pluralidade de centros locais de poder, com autonomia de autogoverno e autoadministração, para que se reforçasse a ideia de preservação da autonomia na elaboração do federalismo, como salientado por ALEXIS DE TOCQUEVILLE, ao comentar a formação da nação americana (Democracia na América: leis e costumes. São Paulo: Martins Fontes, 1988. p. 37 e ss.), que serviu de modelo à nossa Primeira Constituição Republicana em 1891. Nos regimes federalistas, respeitadas as opções realizadas pelo legislador constituinte e previamente estabelecidas no próprio texto constitucional, quando surgem dúvidas sobre a distribuição de competências e, consequentemente, a necessidade de definição do ente federativo competente para legislar sobre determinado e específico assunto, que engloba uma ou várias matérias com previsão ou reflexos em diversos ramos do Direito, caberá ao interprete priorizar o fortalecimento das autonomias locais e o respeito às suas diversidades como pontos caracterizadores e asseguradores do convívio no Estado Federal , que garantam o imprescindível equilíbrio federativo (...) Grifei. A partir desses parâmetros, depreende-se a necessidade de valorização das autonomias locais - e de suas respectivas competências constitucionais e legais - para atuarem em proteção ao meio ambiente. Não há como simplesmente equiparar, nos moldes desejados pela petição inicial, as atribuições da União, do IBAMA, do ICMBIO, da ANA, do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento. Cada órgão/entidade possui atribuições específicas que, sob pena de enfraquecimento da própria proteção ambiental, devem ser minimamente observadas. Como critérios para a fixação de competência, em casos dessa natureza, sobreleva-se a importância de adequadamente sopesar (i) a supletividade da atuação dos órgãos federais, o que decorre do modelo de federalismo cooperativo e (ii) a priorização das autonomias locais. O cotejo de tais fatores (supletividade e priorização das autonomias locais) possibilita estabelecer um critério geral em matéria de responsabilidade ambiental: a indicação de órgãos e entidades federais como responsáveis por ações ou omissões de natureza ambiental, quando não se trata de bem de titularidade federal, revela-se cabível se houver a comprovação, ao menos indiciária, da incapacidade institucional dos órgãos ou entidades estaduais ou municipais, no âmbito de suas respectivas competências. Somente se restar evidenciada essa situação justificar-se-á a ação do ente social ou político maior no menor, conforme entendimento do STF. No caso dos autos, não há, sob qualquer aspecto, efetiva comprovação de que os órgãos ou entidades estaduais ou municipais estejam desempenhando de modo insatisfatório as suas atribuições legais. Não há como afirmar, dada a ausência de indicativos robustos nesse sentido, a incapacidade institucional, in casu , do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento para a tutela ambiental na Lagoa do Peri. Evidenciada, assim, a ilegitimidade passiva da União , do IBAMA , do ICMBIO e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA . Trata-se de questão que, embora tenha sido apresentada pelas partes em suas razões recursais, constitui matéria de ordem pública, podendo, em razão disso, ser arguida e conhecida em qualquer grau de jurisdição, até mesmo de ofício ( v.g. TRF4, AC 5013560-05.2020.4.04.7200, 1ª Turma, Relator LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, julgado em 15/10/2024). Verifico, por outro lado, que a ação de origem foi proposta também em face, como já dito, do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento e, em relação a eles, seja em razão (i) da premissa do federalismo cooperativo, seja por força (ii) da priorização das autonomias locais, seja em virtude (iii) da titularidade do MONA da Lagoa do Peri, não há que se falar em ilegitimidade passiva. Assenta-se, assim, a competência da Justiça Estadual para o processo e julgamento da ação de origem, perspectiva que se dá, inclusive, a partir do que dispõem as Súmulas 150, 224 e 254, todas do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, declino da competência em favor da Justiça Estadual de Santa Catarina e determino a remessa dos autos para a Comarca de Florianópolis / SC. Intimem-se.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Processo nº 5019645-97.2025.4.04.0000

ID: 325659389

Tribunal: TRF4 Órgão: SECRETARIA DA 11a. TURMA Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 5019645-97.2025.4.04.0000

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

CHARLES CAGOL DO NASCIMENTO

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

BRUNO ANGELI BONEMER

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

Agravo de Instrumento Nº 5019645-97.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo … Agravo de Instrumento Nº 5019645-97.2025.4.04.0000/SC INTERESSADO : COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN DESPACHO/DECISÃO Decisão conjunta, proferida nos seguintes recursos de Agravo de Instrumento: (1) 5019929-08.2025.4.04.0000 (interposto pela União); (2) 5019643-30.2025.4.04.0000 (interposto pelo IBAMA); (3) 5019645-97.2025.4.04.0000 (interposto pela ANA) e (4) 5019644-15.2025.4.04.0000 (interposto pelo ICMBIO). Os referidos Agravos de Instrumento foram interpostos em face de decisão com o seguinte teor ( 24.1 ): (...) a) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem um ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR26 sobre a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, que compreenda a bacia hidrográfica da região, incluindo os diversos elementos hídricos relevantes para a LAGOA DO PERI, a fim de, inter alia, avaliarem a capacidade de suporte da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI em relação às presentes e futuras intervenções ou empreendimentos na localidade (e.g., para garantir a compatibilidade dos parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água), bem como a identificarem as possíveis fontes de poluição e contaminação da LAGOA DO PERI, tais como ligações clandestinas na rede pluvial e lançamento direto ou indireto de efluentes não-tratados nos corpos hídricos relevantes de sua bacia hidrográfica, dentro do prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desatendimento; b) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de elaborarem e implementarem um PLANO DE TRABALHO que contemple a execução de medidas de análise e fiscalização nos locais identificados naquele ESTUDO TÉCNICO MULTIDISCIPLINAR (com, por exemplo, os parâmetros de uso e ocupação do solo na região com a capacidade de abastecimento da água, as possíveis fontes de poluição e contaminação da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, etc), o qual deve ser iniciado no prazo de noventa dias, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de desobediência; c) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para elaborar um PLANO DE EMERGÊNCIA E CONTINGÊNCIA, com ações corretivas de curto, médio e longo prazos, sempre que se detectarem riscos à saúde (humana ou não), pelo consumo da água da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI, tais como pela concentração de toxinas acima dos limites permitidos ou pela contaminação de suas águas por outros fatores de poluição, sob pena de pagamento de multa diária de R$5.000,00 a ser imposta às pessoas físicas responsáveis (autoridades), em caso de inobservância; d) ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, à FLORAM, à CASAN, à UNIÃO, ao IBAMA, ao ICMBio e à ANA, cada qual no âmbito de suas atribuições, a obrigação de adotarem todas as providências necessárias para garantir que as atividades das comunidades tradicionais relacionadas com a ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI (tal como a pesca artesanal e a extração de mariscos) sejam realizadas sem riscos da presença de patógenos de grave repercussão à saúde, tais como as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, como, por exemplo, as medidas indicadas pelo IBAMA na Informação Técnica nº 178/2022-NUBIO-SC/DITEC-SC: d.1) Ampliação do número de sítios de monitoramento, incluindo-se pontos de análise de qualidade de água, da composição da comunidade fitoplanctônica e monitoramento de cianotoxinas no canal do Rio Sangradouro, na desembocadura do rio e em pontos estratégicos na praia do Matadeiro e Armação do Pântano do Sul, considerando as condições oceanográficas da zona de mistura na foz do rio; d.2) Monitoramento contínuo de bivalves marinhos, com amostragens periódicas na praia do Matadeiro e Armação, para avaliação do grau de acumulação de cianotoxinas nos tecidos destes organismos, com vistas à adoção de medidas sanitárias de suspensão de coleta e/ou cultivo quando os níveis destas toxinas se tornarem danosos à saúde humana; d.3) Estabelecimento de plano de análises ecotoxicológicas, para avaliação contínua dos efeitos de toxicidade de R. raciborskii em organismos chave para a alimentação da população tradicional local, incluindo moluscos, peixes, e outras espécies que sejam relevantes para a comunidade”. Em caso de recalcitrância, deverá ser imposta pena de multa diária de R$5.000,00 a cada uma das pessoas físicas responsáveis. (...) A União opõe-se à decisão a partir dos seguintes argumentos: (i) inexistência de responsabilidade sobre a água da Lagoa do Peri, pois não se trata de corpo hídrico federal, mas de unidade de conservação municipal; (ii) não há qualquer conduta comissiva ou omissiva imputada à União; (iii) a decisão proferida é genérica e não se alicerça em fundamentos fáticos e jurídicos concretos; (iv) a multa foi fixada em valor excessivo ( processo 5019929-08.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O IBAMA questiona a decisão recorrida a partir dos seguintes fundamentos: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos apresentados pelas entidades públicas, ignorando que se trata, a Lagoa do Peri, de corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) não há risco imediato de dano irreparável ou de difícil reparação; (iii) a decisão proferida ignorou que o IBAMA pode atuar somente de modo subsidiário, conforme o entendimento do STF; (iv) a competência primária em fiscalização ambiental na área em comento não compete ao IBAMA, mas à municipalidade ou ao Estado de Santa Catarina; (v) deveria ter sido observado o disposto no Tema 698/STF; (vi) a multa fixada é indevida e excessiva ( processo 5019643-30.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). A ANA - Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico alegou em seu recurso: (i) a decisão recorrida não tomou em consideração os fatos deduzidos pelos corréus, indicativos de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) a ANA seria parte passiva ilegítima porque os pedidos formulados não se relacionam com as suas atribuições; (iii) inexiste risco imediato de dano irreparável; (iv) as determinações impostas são inexequíveis e desnecessárias; (v) a multa fixada é descabida e foi fixada em montante excessivo ( processo 5019645-97.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). O ICMBIO , por sua vez, apresenta as seguintes razões recursais: (i) foram ignorados, pela decisão recorrida, os fatos apresentados pelas entidades públicas, comprobatórios de que a Lagoa do Peri é um corpo hídrico do Estado de Santa Catarina; (ii) o ICMBIO seria parte parte passiva ilegítima, pois os fatos apresentados não se inserem no âmbito de suas competências; (iii) não há risco de dano irreparável no local; (iv) as imposições da decisão recorrida são inexequíveis e descabidas; (v) a multa fixada é excessiva ( processo 5019644-15.2025.4.04.0000/TRF4, evento 1, INIC1 ). É o relatório. Decido. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF em face do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis , da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento , da União , do IBAMA , do ICMBIO e da ANA , com o seguinte objeto ( 1.1 ): A PROCURADORIA DA REPÚBLICA, por meio desta ação, busca garantir, entre outras medidas, que as atividades relacionadas com a coleta, o tratamento e a distribuição de água feita pela LAGOA DO PERI para consumo (humano ou não) não ofereça riscos à saúde, bem como que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii, resguardando, assim, os atributos físicos, bióticos e sociais dessa área geográfica ambientalmente sensível. Esta demanda visa, ainda, à responsabilização solidária do MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, da FLORAM, da CASAN, da UNIÃO, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA, por sua omissão ou atuação ineficiente/deficiente quanto ao dever de prestar o serviço público de saneamento urbano de modo eficiente e eficaz, bem como de garantir que os usos realizados pelas comunidades na região (tradicionais ou não) não sejam afetados negativamente por essas mesmas atividades, tais como, por exemplo, a prática tradicional de extração de mariscos pela comunidade de pescadores artesanais da ÁREA GEOGRÁFICA DA LAGOA DO PERI ser feita sem a presença de patógenos de grave repercussão à saúde, incluindo as saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii. Ainda que a legitimidade da parte pressuponha, como regra, uma análise anterior ao mérito, a partir de um exame alicerçado in status assertionis , ou seja, baseado nos argumentos apresentados na fase postulatória (TRF4, AG 5019715-51.2024.4.04.0000, 3ª Turma, Relator RODRIGO KOEHLER RIBEIRO, julgado em 26/11/2024), isso, por si só, não autoriza que qualquer pretensão, principalmente se não especificar o âmbito da responsabilidade que se busca apurar, possa ser deduzida judicialmente. Por isso se afirma que "a legitimidade passiva ad causam é definida pela narrativa dos fatos e fundamentos jurídicos constante na petição inicial (teoria da asserção) (...)" (TRF4, AG 5049639-15.2021.4.04.0000, 4ª Turma, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, julgado em 30/03/2022). Na situação dos autos, o MPF imputou a todos os corréus uma série de deveres decorrentes, em tese, da omissão, tanto na fiscalização ambiental como no exercício do respectivo poder de polícia, que culminou com a ocorrência de danos ambientais junto ao entorno da Lagoa do Peri, em Florianópolis. A situação posta nos autos, contudo, demanda apuração mais cuidadosa, pois a petição inicial do feito de origem limitou-se a apontar, de forma ampla, a legitimidade passiva da União, do ICMBIO, do IBAMA e da ANA a partir de premissas flagrantemente genéricas. A narrativa da peça inicial busca abarcar, a pretexto de salvaguardar o meio ambiente, uma multiplicidade de atuações administrativas que sequer foram objetivamente indicadas, admitindo, sem acurada explicação, a mescla de competências estaduais, municipais e federais. Trata-se de perspectiva que, em um primeiro momento, sugere a própria inépcia da petição inicial, pois, como consabido, "considera-se inepta a petição inicial quando o o pedido for indeterminado e da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão" (TRF4, AC 5038641-14.2024.4.04.7200, 2ª Turma, Relator para Acórdão EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA, julgado em 17/06/2025). Além disso, conforme já decidiu esta Corte (TRF4, AC 5022913-50.2012.4.04.7200, 4ª Turma, Relator para Acórdão LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 14/12/2016), "a causa de pedir - pressuposto processual necessário para o desenvolvimento válido e regular do processo (art. 295 do CPC/73) - é constituída pelos fundamentos do pedido do autor da ação - motivos que legitimam a sua pretensão. Examinando a causa de pedir, o juiz verifica se o pedido deduzido tem ou não fundamento para ser acolhido. Verificando-se que a petição inicial é clara e possui os fundamentos jurídicos e fáticos necessários à identificação do pedido e da causa de pedir, deve ser afastada a alegação de inépcia da petição inicial". Consequentemente, verificando-se que a causa de pedir é genérica e incerta, ou ampla a ponto de impedir a apuração objetiva das alegadas responsabilidades, cabível, em tese, o reconhecimento de inépcia da peça vestibular. Acerca das potenciais responsabilidades em face dos riscos ambientais verificados na Lagoa do Peri, aponta a petição inicial as seguintes hipóteses de legitimidade passiva ( 1.1 , p. 31 e seguintes): LEGITIMIDADE PASSIVA FUNDAMENTOS DA LEGITIMIDADE UNIÃO (p. 31) "A legitimação passiva da UNIÃO se fundamenta na competência administrativa da SECRETARIA DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU para, no âmbito patrimonial, zelar pela integridade dos imóveis pertencentes à UNIÃO, devendo, assim, fiscalizar e defender seu domínio (tais como terras e acrescidos de marinha) contra toda e qualquer ameaça ou efetiva intervenção ilegal, como turbações, ocupações e esbulhos, não se discutindo suas atribuições para agir quando se cuida de terras e acrescidos de marinha, ainda mais quando se cuida de espaços territoriais especialmente protegidos e ambientalmente sensíveis (APP de curso d’água e Zona Costeira)". ANA (p. 32) "A ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO é responsável por implementar a gestão dos recursos hídricos brasileiros e por regular o saneamento básico. É obrigação da ANA fiscalizar as condições de operação de reservatórios, o uso de recursos hídricos e o cumprimento das normas de saneamento básico, além de monitorar os sedimentos dos rios (Lei nº 9.984/2000, art. 4º e seus incisos)". IBAMA e ICMBIO (p. 33 e 37) "evidente a presença do interesse do IBAMA e do ICMBio em estabelecer parâmetros adequados de gestão ambiental (inclusive em prol da REBIO DO ARVOREDO e da APA DA BALEIA FRANCA) e, ainda, de adotar medidas efetivas para prevenção de contaminação". "o IBAMA e o ICMBio, no âmbito administrativo, possuem poder de polícia para fiscalizar atividades ilícitas contra o meio ambiente, mesmo em área cuja competência para licenciamento ambiental seja do Estado, seja do Município". "o IBAMA também é competente para o caso por haver FLORESTA PÚBLICA FEDERAL na localidade (vegetação do ecossistema de restinga)". "compete ao ICMBio e ao IBAMA o exercício do poder de polícia não apenas na área inserida dentro da UC, mas também em seu entorno, a fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas e, ainda, garantir a defesa dessas áreas protegidas". ICMBIO (p. 36) "O ICMBio, a seu turno, assim como o IBAMA, deveria ter garantido o respeito à integridade física da REBIO DO ARVOREDO (UC federal cuja Zona de Amortecimento é lindeira à LAGOA DO PERI) e da APA DA BALEIA FRANCA (UC federal cujos limites estão justapostos àquela localidade - Decreto federal s/nº, de 14.9.2000, arts. 1º, 3º, caput e incs. V, VI e X, 4º, 6º e 7º), ou, pelo menos, deveria ter exercitado suas atribuições fiscalizatórias, a teor do artigo 1º do Decreto de criação da APA DA BALEIA FRANCA". Apesar disso, o próprio MPF pontua ( 1.1 ): A despeito de a LAGOA DO PERI (reservatório e principal fonte para captação e abastecimento de água para a região sul e leste da Ilha de Florianópolis) ser um corpo hídrico de domínio estadual , suas águas percorrem o Rio Sangradouro, que sofre influência de marés e deságua no mar. (p. 32) Mas, em vez de adotarem alguma medida efetiva, o IBAMA e o ICMBio optam por direcionar ao MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS a atribuição para a recuperação das áreas afetadas . Ao final, NADA de efetivo é feito para proteger e recuperar o Meio Ambiente local. (p. 34) (Grifei) Depreende-se que a Lagoa do Peri, área que se busca preservar sob o aspecto ambiental, trata-se, segundo o MPF, de corpo hídrico que não é de domínio federal. O local foi protegido a partir da edição da Lei Municipal de Florianópolis nº 10.530/2019 que criou a Unidade de Conservação Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri (MONA DA LAGOA DO PERI), com expressa indicação de que o " MONA da Lagoa do Peri fica vinculado à Fundação Municipal do Meio Ambiente (FLORAM) , a quem caberá a gestão técnica, administrativa e operacional da Unidade de Conservação" (art. 3º - Grifei). Não remanescem dúvidas - inclusive por expressa vinculação legal, conforme dispõe a Lei nº 10.530/2019 - que a titularidade do MONA da Lagoa do Peri compete ao Município de Florianópolis, a partir da atuação da FLORAM. Trata-se de constatação que se verifica inclusive no endereço eletrônico da Prefeitura Municipal de Florianópolis, consultado nesta data, indicando que a Gestão do Programa no local compete à FLORAM e referindo, no Plano de Manejo do Monumento Natural Municipal da Lagoa do Peri , o histórico protetivo da Lagoa do Peri: Em 1976, percebendo a importância do manancial hídrico, o município de Florianópolis realizou o tombamento da Bacia Hidrográfica da Lagoa do Peri por meio do Decreto Municipal nº 1.408/1976 (Florianópolis, 1976), cujos limites foram utilizados para a criação da UC pela Lei Municipal nº 1.828/1981 (Florianópolis, 1981), denominada Parque Municipal da Lagoa do Peri, sendo a primeira UC municipal, com o principal objetivo de conservação do recurso hídrico. Com características peculiares, a UC foi regulamentada pelo Decreto Municipal nº 91/1982 (Florianópolis, 1982), que dispôs sobre o zoneamento da área, os usos definidos para as populações tradicionais e os usos públicos de lazer, de modo a compatibilizá-los com a proteção das paisagens, da flora, da fauna e dos ecossistemas. O dispositivo estabeleceu também regramentos para o uso e ocupação do solo, bem como para seu parcelamento e edificações, buscando compatibilizar esses usos com a manutenção da paisagem e seus processos ecológicos. Ao longo do processo de implantação da UC, então Parque Municipal da Lagoa do Peri, devido a vários fatores como suas dimensões e complexidade intrínseca, falta de implementação pelo poder público e as profundas transfor - mações ocorridas na cidade, houve êxitos e equívocos, tanto por parte da gestão pública, como por parte de proprietários, moradores e usuários. Somente em 2007 foi criado seu Conselho Gestor e, a partir de então, o debate se concentrou na necessidade de adequação ao SNUC, pois a categoria “Parque Natural” não permite a propriedade privada e os respectivos usos historicamente existentes e reconhecidos no interior da UC pelas comunidades tradicionais do Sertão do Ribeirão e Porto do Contrato. Desta maneira, surgiu a proposta de recategorização para Monumento Natural, fato que ganhou corpo com a criação da Comissão Especial para Adequa - ção das Unidades de Conservação (CEAUC), com a Portaria SMAD 3.167/2013 (Florianópolis, 2013), e com a retomada dos trabalhos do conselho gestor em 2015. Assim, após rigoroso estudo técnico e ampla participação social, em 2018 foi encaminhada a proposta de mudança de categoria e de alteração dos limites que culminou no Projeto de Lei nº 17.493/2018 e, posteriormente, na Lei Municipal nº 10.530/2019 (Florianópolis, 2019a). Verifica-se que o local foi historicamente submetido à competência municipal. Consequentemente, mitiga-se a ampliação do escopo protetivo como requereu o MPF, pois a alegação de que o Município ou a FLORAM não direcionam os devidos cuidados à região não justifica, por si só, sem provas robustas nesse sentido, a propositura da ação em face de outros entes que não contribuíram objetivamente para a ação ou para a omissão que, em tese, geraram os alegados danos ou riscos ambientais. Não remanescem dúvidas acerca da importância da atuação conjunta de todos os entes da Federação para a proteção ambiental, inclusive porque se trata de competência constitucional comum. Assim, como já decidiu o STJ, "diante de uma infração ambiental, os agentes de fiscalização ambiental federal, estadual ou municipal terão o dever de agir imediatamente, obstando a perpetuação da infração" (STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp 1.499.874/SC, Rel. Mauro Campbell Marques, julgamento: 19/11/2019, publicação: 22/11/2019). Isso não significa, entretanto, que, a pretexto de implementar uma atuação conjunta, possam ser suplantadas competências legais, pois mesmo a proteção ambiental - cujo interesse é de todos os entes federativos - encontra como limite a titularidade do bem afetado. O entendimento desta Corte correlaciona a responsabilidade civil pelo dano ambiental - e, consequentemente, também a legitimidade passiva do suposto responsável - (i) à titularidade do bem e (ii) à ação ou omissão que foram decisivas para a configuração do dano. Nesse sentido: AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AMBIENTAIS. TERRENO DE MARINHA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE. 1. A legitimidade passiva ad causam consiste na pertinência subjetiva da parte à relação de direito material objeto da lide e, como toda e qualquer condição da ação, é aferível com base na narrativa veiculada na petição inicial (teoria da asserção), bastando, para sua configuração, que os argumentos lá deduzidos permitam a inferência, em um exame puramente abstrato, de que o réu pode ser o sujeito responsável pela violação do direito subjetivo do autor. 2. O poder de polícia do órgão ambiental não impede ou não tolhe a intervenção judicial, seja quando a Administração Pública extrapola, seja quando se omite, total ou parcialmente, na aplicação de incumbências preceituadas, máxime as de licenciamento fiscalização e repressão de ilícitos (STJ, 2ª Turma, REsp 1.745.033/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 20/10/2020, DJe 17/12/2021). 3. Demonstrado que o dano ambiental ocorreu em área de preservação permanente e de propriedade da União , bem como que a ocupação irregular resultou de ações omissivas do ente federal, impõe-se sua responsabilização. (TRF4, AC 5006129-77.2021.4.04.7201, 4ª Turma, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, julgado em 02/10/2024) Grifei. [...] A legitimidade passiva da União decorre da infração ambiental ter ocorrido em terreno de marinha , bem do ente federal, ex vi do art. 20, VI e VII, da Constituição Federal e pela caracterização omissiva no dever de fiscalizar , independemente do local onde o dano tenha sido perpetrado , além de ter afetado o livre acesso à praia, bem integrante do domínio público da União, o que evidencia sobremaneira o interesse federal na sua salvaguarda, inclusive com fiscalização e punição de infrações administrativas de degradação. [...](TRF4, AC 5027902-28.2014.4.04.7201, 4ª Turma, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, julgado em 12/07/2023) Grifei. A situação posta em exame, como visto, apresenta particularidades que não podem ser meramente desconsideradas. A área que se sujeita aos alegados riscos ambientais é de titularidade do Município de Florianópolis, com regramento próprio e perspectiva protetiva específica. Não se trata, portanto, de local sujeito ao controle da União e, portanto, está igualmente afastado do policiamento administrativo de autarquias federais. Há, no caso dos autos, dificuldade inclusive em compreender os limites da proteção ambiental desejada pelo MPF, principalmente quando se verifica que os possíveis danos ou riscos são hipotéticos e potenciais, sem que se possa afirmar, a partir da narrativa da petição inicial ( 1.1 ), que efetivamente decorrem de uma ação ou de uma omissão da União, do IBAMA, do ICMBIO e mesmo da ANA. A premissa adotada pelo MPF pressupõe - "a despeito de a LAGOA DO PERI ser um um corpo hídrico de domínio estadual" ( 1.1 ) - que as suas águas podem sofrer influência "em parte da sua extensão" de marés e isso teria, em tese, o potencial de afetar áreas contíguas, essas sim sujeitas à proteção ambiental da União, do ICMBIO e do IBAMA: Assim, por exemplo, no caso da presença de saxitoxinas produzidas pelas cianobactérias Raphidiopsis raciborskii tem potencialidade de contaminar moluscos e outros organismos que tenham relevância ecológica, tais como aqueles que compõem a fauna ou a flora integrante da UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL DA RESERVA BIOLÓGICA MARINHA – REBIO DO ARVOREDO ou da ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL – APA DA BALEIA FRANCA ou que, mesmo não a integrando, sejam de algum modo ecologicamente relevantes para essas UCs. Trata-se, obviamente, de hipótese sem alicerce probatório robusto para que se possa avaliar, de forma objetiva, o risco a que as áreas sujeitas à proteção ambiental da União estão submetidas. Essa pressuposição persiste em toda a narrativa da petição inicial: No dia 14.5.2021, notícia jornalística relatou que pesquisadores do Laboratório de Ficologia da UFSC – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA constataram a presença de quantidades elevadas de uma toxina proveniente de cianobactérias na LAGOA DO PERI e a possibilidade de essa substância atingir o mar, por meio da Praia do Matadeiro. O Parecer Técnico nº 749/2021 conclui que o documento subscrito pelo Professor Leonardo Rubi Rörig não esclarece se cianobactérias da LAGOA DO PERI e suas toxinas foram transportadas até o mar , tampouco se podem afetar organismos aquáticos na natureza. Em 15.10.2021, a Assessoria Pericial do MPF elaborou o Laudo Técnico nº 1.197/2021-ANPMA/CNP, que conclui que as pesquisas científicas realizadas pelo LAFIC indicam, em tese, um potencial risco de consumo de cionobactéria tóxica proveniente da LAGOA DO PERI por moluscos bivalves existentes na Praia do Matadeiro . Porém, em que pese esse risco potencial, não há dados científicos robustos sobre a capacidade de sobrevivência de Raphidiopsis raciborskii em ambientes tipicamente marinhos. a FLORAM elaborou o Parecer Técnico nº 933/2021-DILIC, que consigna que há um risco potencial de contaminação de moluscos , que possuem a capacidade de bioacumular substâncias diversas, o que poderia levar a concentrações de ficotoxinas significativamente mais elevadas do que as encontradas nas águas. a despeito do risco de exposição de moluscos comestíveis na Praia do Matadeiro e circunvizinhanças às toxinas produzidas por cianobactérias que florescem na LAGOA DO PERI haver sido evidenciado experimentalmente, não há confirmação da acumulação das toxinas naqueles animais, mediante análises diretas em amostras de moluscos colhidos no ambiente, tampouco estudos que estabeleçam o alcance do aporte da biomassa tóxica oriunda da LAGOA DO PERI na região costeira adjacente. Essas citações, retiradas da petição inicial ( 1.1 ), demonstram que a alegada legitimidade passiva da União (e, por reflexo, do IBAMA, do ICMBIO e da ANA) decorre de uma suposição de que pode haver uma contaminação, supostamente já existente na Lagoa do Peri (até mesmo quanto a isso remanescem dúvidas consideráveis), na região costeira adjacente, sujeita, em tese, ao poder de polícia dos corréus, ora recorrentes. Sobreleva-se, a partir disso, a necessidade de adequada compreensão dos limites que possibilitam a atuação fiscalizatória da União em matéria ambiental, perspectiva que alcança, observadas as particularidades inerentes a cada órgão e entidade administrativa, não apenas a União mas também o IBAMA, o ICMBIO e, no caso dos autos, a própria ANA. Essa é a dicção do art. 17, § 3º, da Lei Complementar nº 140/2011: Art. 17. Compete ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização, conforme o caso, de um empreendimento ou atividade, lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo para a apuração de infrações à legislação ambiental cometidas pelo empreendimento ou atividade licenciada ou autorizada. § 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de infração ambiental lavrado por órgão que detenha a atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o caput. Sobre essa norma se manifestou o STF (ADI 4.757. Rel. Rosa Weber. Julgamento: 13/12/2022. Publicação: 17/03/2023), consignando que "referida legislação não trata sobre os deveres de tutela ambiental de forma genérica e ampla, como disciplina o art. 225, §1º, IV, tampouco regulamenta o agir legislativo, marcado pela repartição concorrente de competências, inclusive no tocante à normatização do licenciamento em si". Em razão disso, concluiu o STF que " o nível de ação do agir político-administrativo nos domínios das competências partilhadas, próprio do modelo do federalismo cooperativo, deve ser medido pelo princípio da subsidiariedade . Ou seja, na conformação dos arranjos cooperativos, a ação do ente social ou político maior no menor, justifica-se quando comprovada a incapacidade institucional desse e demonstrada a eficácia protetiva daquele" . A consequência é inequívoca: " Um dos princípios fundamentais do funcionamento do sistema legal de tutela do meio ambiente é o da atuação supletiva do órgão federal, seja em matéria de licenciamento seja em matéria de controle e fiscalização das atividades ou empreendimentos potencialmente poluidores ou degradantes do meio ambiente . No exercício da cooperação administrativa, portanto, cabe atuação suplementar – ainda que não conflitiva – da União com a dos órgãos estadual e municipal". Não basta, portanto, ampliar imotivadamente a atuação administrativa a fim de abarcar, a um só tempo, ações estaduais, municipais e federais. Como visto, a tutela ambiental, segundo o STF, alicerça-se na premissa de um federalismo cooperativo, o que implica, por sua vez, que a atuação de órgãos ou entidades federais - quando já há órgãos ou entidades estaduais ou municipais com competência ambiental regularmente instituídos - dá-se em caráter supletivo . A supletividade exige, a seu turno, comprovação suficiente de que os órgãos ou entidades estaduais e municipais não atuaram a partir das competências legalmente fixadas. Isso autorizaria, em tese, a ação supletiva da União e, por via reflexa, do IBAMA, do ICMBIO e, in casu , da ANA. Esa comprovação, entretanto, não resta evidenciada no caso dos autos, já que, como visto, a indicação dos corréus foi efetuada a partir de potenciais riscos que poderiam, em tese, afetar - e disso não há sequer indícios robustos - áreas que a União, por seus órgãos ou pelas respectivas entidades, deveria proteger. Deve ser ponderado, ainda, que o STF assentou a importância de respeito às diversidades locais, inclusive como critério interpretativo, como ilustra a ADI 5.996 (Rel. Alexandre de Moraes, julgamento: 15/04/2020, publicação: 30/04/2020): O princípio geral que norteia a repartição de competência entre os entes componentes do Estado Federal brasileiro, portanto, é o princípio da predominância do interesse, não apenas para as matérias cuja definição foi preestabelecida pelo texto constitucional, mas também em termos de interpretação em hipóteses que envolvem várias e diversas matérias, como na presente ação direta de inconstitucionalidade. (...) Essa opção inicial do legislador constituinte, ao centralizar nos poderes enumerados da União (CF, artigo 22) a maioria das matérias legislativas mais importantes, contudo, não afastou da Constituição de 1988 os princípios básicos de nossa tradição republicana federalista, que gravita em torno do princípio da autonomia, da participação política e da existência de competências legislativas próprias dos Estados/Distrito Federal e Municípios, indicando ao intérprete a necessidade de aplicá-los como vetores principais em cada hipótese concreta em que haja a necessidade de análise da predominância do interesse, para que se garanta a manutenção, fortalecimento e, principalmente, o equilíbrio federativo (GERALDO ATALIBA. República e constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985. p. 10), que se caracteriza pelo respeito às diversidades locais, como bem salientado por MICHAEL J. MALBIN, ao apontar que a intenção dos elaboradores da Carta Constitucional Americana foi justamente estimular e incentivar a diversidade, transcendendo as facções e trabalhando pelo bem comum (A ordem constitucional americana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987, p. 144), consagrando, ainda, a pluralidade de centros locais de poder, com autonomia de autogoverno e autoadministração, para que se reforçasse a ideia de preservação da autonomia na elaboração do federalismo, como salientado por ALEXIS DE TOCQUEVILLE, ao comentar a formação da nação americana (Democracia na América: leis e costumes. São Paulo: Martins Fontes, 1988. p. 37 e ss.), que serviu de modelo à nossa Primeira Constituição Republicana em 1891. Nos regimes federalistas, respeitadas as opções realizadas pelo legislador constituinte e previamente estabelecidas no próprio texto constitucional, quando surgem dúvidas sobre a distribuição de competências e, consequentemente, a necessidade de definição do ente federativo competente para legislar sobre determinado e específico assunto, que engloba uma ou várias matérias com previsão ou reflexos em diversos ramos do Direito, caberá ao interprete priorizar o fortalecimento das autonomias locais e o respeito às suas diversidades como pontos caracterizadores e asseguradores do convívio no Estado Federal , que garantam o imprescindível equilíbrio federativo (...) Grifei. A partir desses parâmetros, depreende-se a necessidade de valorização das autonomias locais - e de suas respectivas competências constitucionais e legais - para atuarem em proteção ao meio ambiente. Não há como simplesmente equiparar, nos moldes desejados pela petição inicial, as atribuições da União, do IBAMA, do ICMBIO, da ANA, do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento. Cada órgão/entidade possui atribuições específicas que, sob pena de enfraquecimento da própria proteção ambiental, devem ser minimamente observadas. Como critérios para a fixação de competência, em casos dessa natureza, sobreleva-se a importância de adequadamente sopesar (i) a supletividade da atuação dos órgãos federais, o que decorre do modelo de federalismo cooperativo e (ii) a priorização das autonomias locais. O cotejo de tais fatores (supletividade e priorização das autonomias locais) possibilita estabelecer um critério geral em matéria de responsabilidade ambiental: a indicação de órgãos e entidades federais como responsáveis por ações ou omissões de natureza ambiental, quando não se trata de bem de titularidade federal, revela-se cabível se houver a comprovação, ao menos indiciária, da incapacidade institucional dos órgãos ou entidades estaduais ou municipais, no âmbito de suas respectivas competências. Somente se restar evidenciada essa situação justificar-se-á a ação do ente social ou político maior no menor, conforme entendimento do STF. No caso dos autos, não há, sob qualquer aspecto, efetiva comprovação de que os órgãos ou entidades estaduais ou municipais estejam desempenhando de modo insatisfatório as suas atribuições legais. Não há como afirmar, dada a ausência de indicativos robustos nesse sentido, a incapacidade institucional, in casu , do Município de Florianópolis, da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento para a tutela ambiental na Lagoa do Peri. Evidenciada, assim, a ilegitimidade passiva da União , do IBAMA , do ICMBIO e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA . Trata-se de questão que, embora tenha sido apresentada pelas partes em suas razões recursais, constitui matéria de ordem pública, podendo, em razão disso, ser arguida e conhecida em qualquer grau de jurisdição, até mesmo de ofício ( v.g. TRF4, AC 5013560-05.2020.4.04.7200, 1ª Turma, Relator LUCIANE A. CORRÊA MÜNCH, julgado em 15/10/2024). Verifico, por outro lado, que a ação de origem foi proposta também em face, como já dito, do Município de Florianópolis , da FLORAM - Fundação do Meio Ambiente de Florianópolis e da CASAN - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento e, em relação a eles, seja em razão (i) da premissa do federalismo cooperativo, seja por força (ii) da priorização das autonomias locais, seja em virtude (iii) da titularidade do MONA da Lagoa do Peri, não há que se falar em ilegitimidade passiva. Assenta-se, assim, a competência da Justiça Estadual para o processo e julgamento da ação de origem, perspectiva que se dá, inclusive, a partir do que dispõem as Súmulas 150, 224 e 254, todas do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, declino da competência em favor da Justiça Estadual de Santa Catarina e determino a remessa dos autos para a Comarca de Florianópolis / SC. Intimem-se.

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Juliana Fonseca x Banco Daycoval S.A.

ID: 256303419

Tribunal: TJGO Órgão: 6ª Câmara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5019643-97.2025.8.09.0051

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

JULIANA FONSECA

Polo Passivo:

BANCO DAYCOVAL S.A.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Advogados:

GUILHERME OLIVEIRA BENTZEN E SILVA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

TANIA CRISTINA XISTO TIMOTEO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

GUILHERME CORREIA EVARISTO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ADONIAS PEREIRA BARROS JUNIOR

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE GOIÁS TRIBUNAL DE JUSTIÇA 6ª Câmara Cível Gabinete do Desembargador Fernando Ribeiro Montefusco Av. Assis Chateaubriand, 195 - St. Oeste, Goiânia - GO, 74130… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE GOIÁS TRIBUNAL DE JUSTIÇA 6ª Câmara Cível Gabinete do Desembargador Fernando Ribeiro Montefusco Av. Assis Chateaubriand, 195 - St. Oeste, Goiânia - GO, 74130-012 - 1ª andar, bloco B Telefone / Whatsapp: 62 3216-2015 - gab.frmontefusco@tjgo.jus.br AUTOS DE PROCESSO N.º 5019643-97.2025.8.09.0051 - APELAÇÃO CÍVEL COMARCA DE GOIÂNIA APELANTE: JULIANA FONSECA APELADO: BANCO DAYCOVAL S.A. RELATOR: DESEMBARGADOR FERNANDO RIBEIRO MONTEFUSCO Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. INCLUSÃO DE DADOS NO SCR SEM PRÉVIA NOTIFICAÇÃO. DANO MORAL. ANOTAÇÕES RESTRITIVAS PRÉ-EXISTENTES. APLICAÇÃO DA SÚMULA 385 DO STJ. SENTENÇA MANTIDA. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, determinando o cancelamento de anotação efetuada no Sistema de Informações de Crédito (SCR) pela instituição financeira, em razão da ausência de notificação prévia, mas afastando a condenação por danos morais diante da existência de anotações restritivas anteriores. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. As questões centrais consistem em: (i) verificar a existência de direito à indenização por danos morais diante da ausência de notificação prévia à inclusão de dados no SCR; (ii) analisar a aplicação da Súmula 385 do STJ, à luz de registros anteriores legítimos no nome da parte autora; (iii) avaliar se a ausência de notificação prévia é suficiente, por si só, para configurar dano moral indenizável, mesmo com anotações preexistentes. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. Reconhecida a irregularidade da anotação no SCR em razão da ausência de notificação prévia exigida pelo art. 43, §2º, do CDC e pelo art. 11 da Resolução nº 4.571/2017 do Banco Central. 4. Constatada a existência de diversas anotações anteriores e legítimas, registradas por outras instituições financeiras no nome da autora, relativas ao mesmo período da inscrição ora impugnada. 5. A jurisprudência do STJ, consolidada na Súmula 385, afasta o direito à indenização por danos morais nas hipóteses em que houver anotação preexistente legítima, ainda que a nova inscrição seja indevida, ressalvado o direito ao cancelamento. 6. A existência de registros anteriores legítimos é suficiente para obstar o pedido de indenização por dano moral, aplicando-se analogicamente a Súmula 385 do STJ ao caso de inscrições no SCR. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso conhecido e não provido. Tese(s) de julgamento: 1. “A inscrição no SCR/SISBACEN sem prévia comunicação configura ato ilícito.”; 2. “A existência de anotações prévias legítimas impede o reconhecimento do dano moral.”; 3. “O cancelamento da inscrição indevida no SCR/SISBACEN deve ser mantido quando não precedida de notificação.” Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 43, §2º; CPC, arts. 373, II, e 932, IV; Resolução BACEN nº 4.571/2017, art. 11. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 385; TJGO, Apelação Cível 5761341-13.2023.8.09.0051, Rel. Des. José Proto de Oliveira; TJGO, Apelação Cível 5075835-21.2023.8.09.0051, Rel. Des. Antônio Cézar Pereira Meneses; TJGO, Apelação Cível 5373156-91.2023.8.09.0174, Rel. Des. Reinaldo Alves Ferreira. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por JULIANA FONSECA contra sentença proferida pelo juízo da 30ª Vara Cível da Comarca de Goiânia, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais e Tutela de Urgência, ajuizada em desfavor do BANCO DAYCOVA.AL S.A. (apelado). Exsurge dos autos de origem que parte autora, Juliana Fonseca, pleiteia indenização por danos morais em face do Banco Daycoval S.A., alegando que teve seu nome inserido no Sistema de Informações de Crédito (SCR) do Banco Central do Brasil, sob a classificação "vencido/prejuízo" sem prévia notificação. Afirma que a negativação a impediu de obter crédito, causando-lhe transtornos financeiros e emocionais. Sustenta que a instituição financeira ré violou o art. 43, §2º, do Código de Defesa do Consumidor, que exige notificação prévia à inclusão em cadastros restritivos, e o art. 11 da Resolução n.º 4.571/17 do Banco Central, que impõe às instituições financeiras a obrigação de comunicar previamente o consumidor sobre a inclusão de informações no SCR. À vista disso, requer a concessão de tutela de urgência para a exclusão do apontamento desabonador do nome da autora junto ao SCR- SISBACEN no campo “vencido e prejuízo”; no mérito, a confirmação da tutela, bem como a condenação do banco ré em indenização por danos morais, no valor não inferior a R$ 35.000,00. Constestação apresentada em mov. 16. Em breve relato dos fatos, aduz que a autora formalizou um contrato de empréstimo consignado (nº 20-9890632/21) com o banco e que, devido a atrasos no repasse dos descontos por parte do órgão pagador, as parcelas ficaram temporariamente em aberto, configurando inadimplência. Preliminarmente, alega a falta de interesse de agir, ante a ausência de tentativa de resolução na via administrativa; e a formação do litisconsórcio passivo necessários, ou a ilegitimidade passiva. No mérito, argumenta que o SCR não se trata de um cadastro restritivo como SPC ou Serasa, mas sim de um sistema de informações sobre operações de crédito, tanto vencidas como a vencer. Refuta a alegação de que a autora não foi notificada, destacando que a cláusula 13 do contrato prevê a autorização para consultar e registrar as operações no SCR. Afirma ainda que a autora já possuía outras anotações de "Vencida" no SCR, relativas a outros bancos. Argui a litigância de má-fé e a demanda predatória; argumenta a ocorrência de ampliação às informações recebidas das instituições pelo Banco Central; defende que agiu no exercício regular do direito, e que a inclusão dos dados da autora no sistema se deu em cumprimento a normas legais e regulamentares do Banco Central, notadamente a Resolução n.º 4.751/2017; pontua que não falar em indenização por dano moral por não está presente a hipótese de responsabilidade civil; e além disso, assevera a aplicação da súmula 385 do STJ. Por fim, pugna pela extinção do processo sem resolução do mérito, ante a ausência de interesse processual; a formação do litisconsórcio passivo necessários, ou a ilegitimidade passiva; o reconhecimento da litigância predatória. No mérito, pleiteia a improcedêcia dos pedidos iniciais. Impugnação a Contestação (mov. 18). A autora reitera que não recebeu qualquer notificação a respeito da inserção de seu nome no SCR. Argumenta que a Resolução 2.724/2000, que dispõe sobre a prestação de informações para o sistema central de risco de crédito, atribui responsabilidade exclusiva às instituições financeiras pelas inclusões, atualizações ou exclusões dos dados no sistema, sem menção à corresponsabilidade do Banco Central. Alega que a inclusão de seu nome no SCR lhe causou danos irreversíveis, impossibilitando-a de obter empréstimos. Requer a procedência da demanda, reiterando os pedidos formulados na petição inicial. Sobreveio sentença (mov. 25). O juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: Nesta via, cinge-se a controvérsia em verificar se o nome da autora foi incluído no SCR pelo requerido, sem a devida notificação prévia, para jus à indenização por danos morais e ao cancelamento da restrição. (...) No caso em disceptação, nota-se que não há comprovação de que a requerente tenha autorizado o requerido a consultar ao SCR, ou sequer prova de que houve a comunicação prévia à parte autora do registro de suas operações junto ao SCR; enfim, não se comprovou a necessária e indispensável notificação do devedor antes da ultimação do malsinado registro negativo. Feita essa observação, de acordo com o artigo 43, § 2º, da Lei federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo devem ser previamente comunicados por escrito ao consumidor, possibilitando ao consumidor não só a ciência da inscrição, mas também a possibilidade de defesa ou renegociação da dívida. Nesse sentir, é indubitável que a inobservância da providência ditada caracteriza ato ilícito, porquanto elimina a oportunidade conferida pela lei ao consumidor de proceder ao pagamento do débito, antes que seja efetuado o registro negativo em seu nome. A respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento, sob a sistemática dos recurso representativos de controvérsia, do Recurso Especial nº 1.083.291/RS, assim decidiu: (...) Certo é que, inscreveu-se o nome do autor no Sistema de Informações do Banco Central (Sisbacen), conforme se vê evento 1, arquivo 2, contudo, é obrigação do banco demandado notificar previamente a correntista acerca da referida inscrição, o que não ocorreu no presente caso. Extrai-se dos autos que o banco demandado não se desincumbiu do ônus probatório de comprovar ter comunicado previamente o promovente acerca da anotação dos dados no SCR (art. 43, § 2º, do CDC, c/c o art. 11 da Resolução nº 4.571/2017 ), nos termos do disposto no art. 373, inciso II, do CPC, restando caracterizada a ilicitude da sua conduta. Logo, afigura-se ilegítima a inclusão do nome do postulante no SISBACEN/SCR sem a sua prévia comunicação, o que caracteriza dano moral in re ipsa, dispensando-se a prova material do abalo sofrido, impondo-se ao banco requerido, portanto, que tem responsabilidade exclusiva de fazer a inclusão e exclusão dos dados no sistema, o dever de reparar os danos morais causados à parte autora. (...) Ocorre que, em evento 1, arquivo 02, é possível verificar que a parte autora já possui outras restrições anotadas junto ao SCR, pelo que, a toda evidência, faz incidir no presente caso a causa excludente do direito de ser indenizado. Isso porque a Súmula 385 do STJ é clara ao prever que “da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”. (...) É o que basta. III – Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do art. 487, inciso I do CPC, e condeno a ré na obrigação de proceder ao cancelamento definitivo da anotação em nome do autor junto ao SCR, ante a ausência de notificação prévia. Diante da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas finais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do Código Processual Civil, na proporção de 50% para cada parte, suspensa a exigibilidade com relação ao autor por ser beneficiário da justiça gratuita. Irresignada, a autora intepôs recurso de Apelação Cível (mov. 28), buscando a reforma da sentença no ponto que indeferiu a indenização por danos morais. Em suas razões, alega que a sentença aplicou indevidamente a Súmula 385 do STJ, pois não ficou demonstrada a existência de outros registros restritivos anteriores com lastro legal e tampouco que foram precedidos de regular notificação. Sustenta que o SCR, apesar de não ser um cadastro público de proteção ao crédito, possui natureza restritiva, assemelhando-se aos cadastros tradicionais, e que a ausência de notificação prévia a impediu de exercer seu direito de defesa e buscar a regularização de sua situação, configurando dano moral in re ipsa. A autora argumenta ainda que a inclusão indevida de seu nome no SCR lhe causou sérios prejuízos, como a recusa de crédito para financiamentos essenciais à sua estabilidade financeira, além de angústia, frustração e constrangimento. Requer a reforma da sentença para que seja reconhecido o dano moral e condenada a instituição financeira ao pagamento de indenização no valor de R$ 35.000,00; bem como fixar os honorários advocatícios em 20% sobre o valor da causa, em desfavor do apelado. Contrarrazões ao recurso apresentada (mov. 30). Preliminarmente, alega a necessidade de não conhecimento do recurso por violação ao princípio da dialeticidade, visto que a autora limitou-se a repetir os argumentos da petição inicial, sem refutar os fundamentos da sentença. No mérito, o banco reitera os argumentos da contestação. Ao final, preliminarmente, pugna pelo não conhecimento do recurso de apelação; e no mérito, o não provimento do recurso. É o relatório. Passo à decisão. Em proêmio, deve-se consignar o cabimento do julgamento monocrático na insurgência recursal, uma vez que se encontra delineada uma das situações previstas no artigo 932 do Código de Processo Civil. Consoante relatado, trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por JULIANA FONSECA contra sentença proferida pelo juízo da 30ª Vara Cível da Comarca de Goiânia, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais e Tutela de Urgência, ajuizada em desfavor do BANCO DAYCOVA.AL S.A. (apelado). O juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: Nesta via, cinge-se a controvérsia em verificar se o nome da autora foi incluído no SCR pelo requerido, sem a devida notificação prévia, para jus à indenização por danos morais e ao cancelamento da restrição. (...) No caso em disceptação, nota-se que não há comprovação de que a requerente tenha autorizado o requerido a consultar ao SCR, ou sequer prova de que houve a comunicação prévia à parte autora do registro de suas operações junto ao SCR; enfim, não se comprovou a necessária e indispensável notificação do devedor antes da ultimação do malsinado registro negativo. Feita essa observação, de acordo com o artigo 43, § 2º, da Lei federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo devem ser previamente comunicados por escrito ao consumidor, possibilitando ao consumidor não só a ciência da inscrição, mas também a possibilidade de defesa ou renegociação da dívida. Nesse sentir, é indubitável que a inobservância da providência ditada caracteriza ato ilícito, porquanto elimina a oportunidade conferida pela lei ao consumidor de proceder ao pagamento do débito, antes que seja efetuado o registro negativo em seu nome. A respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento, sob a sistemática dos recurso representativos de controvérsia, do Recurso Especial nº 1.083.291/RS, assim decidiu: (...) Certo é que, inscreveu-se o nome do autor no Sistema de Informações do Banco Central (Sisbacen), conforme se vê evento 1, arquivo 2, contudo, é obrigação do banco demandado notificar previamente a correntista acerca da referida inscrição, o que não ocorreu no presente caso. Extrai-se dos autos que o banco demandado não se desincumbiu do ônus probatório de comprovar ter comunicado previamente o promovente acerca da anotação dos dados no SCR (art. 43, § 2º, do CDC, c/c o art. 11 da Resolução nº 4.571/2017 ), nos termos do disposto no art. 373, inciso II, do CPC, restando caracterizada a ilicitude da sua conduta. Logo, afigura-se ilegítima a inclusão do nome do postulante no SISBACEN/SCR sem a sua prévia comunicação, o que caracteriza dano moral in re ipsa, dispensando-se a prova material do abalo sofrido, impondo-se ao banco requerido, portanto, que tem responsabilidade exclusiva de fazer a inclusão e exclusão dos dados no sistema, o dever de reparar os danos morais causados à parte autora. (...) Ocorre que, em evento 1, arquivo 02, é possível verificar que a parte autora já possui outras restrições anotadas junto ao SCR, pelo que, a toda evidência, faz incidir no presente caso a causa excludente do direito de ser indenizado. Isso porque a Súmula 385 do STJ é clara ao prever que “da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento”. (...) É o que basta. III – Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, nos termos do art. 487, inciso I do CPC, e condeno a ré na obrigação de proceder ao cancelamento definitivo da anotação em nome do autor junto ao SCR, ante a ausência de notificação prévia. Diante da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas finais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º do Código Processual Civil, na proporção de 50% para cada parte, suspensa a exigibilidade com relação ao autor por ser beneficiário da justiça gratuita. Inconformada, a autora interpôs Apelação Cível. Em suma, alega que não houve notificação prévia à inclusão no SCR, violando o art. 43, §2º, do CDC; diante disso, sustenta que a sentença recorrida aplicou indevidamente a Súmula 385 do STJ, pois não se comprovou a existência de anotações pretéritas. Ao final, reivindica indenização de R$ 35.000,00 por danos morais e fixação dos honorários advocatícios para 20% sobre o valor da causa, em desfavor do apelado. Noutro lado, o apelado requer, em preliminar, o não conhecimento do recurso por ofensa à dialeticidade recursal; no mérito, pugna pelo não provimento. Pois bem. A insurgência recursal cinge-se acerca da sentença que indeferiu o pedido de indenização por danos morais com base na Súmula 385 do STJ, apesar de reconhecida a inclusão indevida de seu nome no SCR sem a devida notificação prévia. 1. Juízo de admissibilidade Presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos (legitimidade, interesse, cabimento e inexistência de fato impeditivo e extintivo) e extrínsecos (preparo, tempestividade e regularidade formal), bem como, ausentes outras questões preliminares ou de ofício a serem dirimidas, RECURSO CONHECIDO. 2. Preliminar - Ofensa à dialeticidade Nas contrarrazões ao recurso, o apelado arguiu à violação do princípio da dialeticidade recursal, sob funamento de que o apelante não apontou de modo específico as razões de fato e de direito do inconformismo com a sentença recorrida. Não obstante, cumpre ressaltar que o Recurso deve ter por objeto o conteúdo da decisão ou sentença que se pretende reformar ou cassar, mediante a invocação de fundamentos de fato e de direito que lhe sejam pertinentes, consoante expressa previsão do artigo 1.010 do Código de Processo Civil: Art. 1.010. A apelação, interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, conterá: I - os nomes e a qualificação das partes; II - a exposição do fato e do direito; III - as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade; IV - o pedido de nova decisão. Sendo assim, impõe ao recorrente apontar onde o juiz errou e por quais motivos se pode chegar a esta conclusão, não sendo suficientes alegações genéricas ou mera remissão aos termos da petição inicial, da contestação, ou qualquer outra peça de defesa, em atenção ao princípio da dialeticidade. Sobre o tema, leciona Fredie Didier Jr.: Para que o recurso seja conhecido, é necessário, também, que preencha determinados requisitos formais que a lei exige; que observe 'a forma segundo a qual o recurso deve revestir-se'. Assim, deve o recorrente, por exemplo, sob pena de inadmissibilidade de seu recurso: apresentar as suas razões, impugnando especificamente as razões da decisão recorrida. (in Curso de Direito Processual Civil, v. 3, 7 ed., Salvador: Edições Jus Podivm, 2009). No caso, é tênue a tese arguida pela apelante em detrimento dos fundamentos da decisão do magistrado, mas não se configura ofensa ao princípio da dialeticidade recursal, pois houve impugnação às razões de decidir expostas na decisão recorrida, as quais levaram à improcedência do pedido de condenação por danos morais. Logo, rejeito a preliminar arguida. 2. Do mérito - Da ausência de dano moral indenizável no caso concreto A parte apelante/autora sustenta que diante do ato ilícito do banco apelado que não a notificou previamente sobre a anotação do seu nome da no SCR/SISBACEN, causando-lhe prejuízos significativos, configura dano moral in re ipsa, o que justificaria a condenação ao pagamento de indenização no valor de R$ 35.000,00. Não obstante, esclarece-se que, embora seja exigida a notificação prévia do consumidor, a análise minuciosa do caso concreto revela circunstâncias específicas que afastam a configuração de dano moral indenizável. Primeiramente, observa-se nos autos a existência das anotações no SCR/SISBACEN pré-existentes em nome da autora, analisando-se o período de janeiro a setembro de 2024, sendo este último o mês em que se deu a inclusão da anotação pelo banco apelado. Conforme o extrato juntado pela autora (mov. 1, arq. 2), veja-se que há outras anotações pretéritas, tanto de parcelas vencidas, quanto àquelas incluidas em prejuízo, ou seja, levadas à anotação, são elas do respectivos bancos: NU FINANCEIRA S.A. - SOCIEDADE DE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO - mês de referrência 02/2024, 03/2024, 04/2024, 05/2024, 06/2024, 07/2024, 08/2024 e 09/2024 (mov. 1, arq. 2, pág. 29, 26, 22, 18, 14, 10 e 3); ITAÚ UNIBANCO S.A. - mês de referrência 05/2024, 06/2024, 07/2024, 08/2024 e 09/2024 (mov. 1, arq. 2, 17, 13, 9, 6 e 2). Tal circunstância atrai a aplicação da Súmula 385 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.” Dessa forma, a anotação pretérita é presumidamente legítima, do nome da parte autora/apelante em seu cadastro, o que afasta a condenação por danos morais, a teor da mencionada Súmula 385 do STJ. Sobre o tema, já exarou o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ALEGAÇÃO DE INDEVIDA NEGATIVAÇÃO EM CADASTRO RESTRITIVO DE CRÉDITO. ANOTAÇÕES PREEXISTENTES. SÚMULA 385 DO STJ. DANOS MORAIS NÃO COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Nos termos da Súmula 385/STJ não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento.2. Ainda que a inserção do nome do apelante no SCR/SISBACEN tenha ocorrido sem prévia comunicação, não há direito à reparação por danos morais, seja pela existência de outras inscrições, seja por não ter sido comprovado algum prejuízo passível de indenização. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5761341-13.2023.8.09.0051, Rel. Des(a). José Proto de Oliveira, 1ª Câmara Cível, julgado em 16/07/2024, DJe de 16/07/2024) (grifo meu) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANO EXTRAPATRIMONIAL. INCLUSÃO NO SISTEMA DE INFORMAÇÃO DO BANCO CENTRAL (SRC). AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR. DANO MORAL. ANOTAÇÃO PREEXISTENTE. SÚMULA 385, STJ. ÔNUS SUCUMBENCIAL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. I. A inscrição no Sistema de Informação de Crédito - SISBACEN (SCR) equipara-se à inscrição indevida em cadastros de proteção ao crédito, como SPC e Serasa, motivo pelo qual é suficiente para produzir efeitos negativos em nome do consumidor, podendo, aliás, inviabilizar a concessão de créditos. II. A existência de anotação legítima preexistente em cadastro de órgão de proteção ao crédito, obsta a concessão de indenização por dano moral decorrente de inclusão irregular (Súmula 385/STJ). III. (…) APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5075835-21.2023.8.09.0051, Rel. Des(a). ANTÔNIO CÉZAR PEREIRA MENESES, 11ª Câmara Cível, julgado em 24/06/2024, DJe de 24/06/2024) (grifo meu) [...] RAZÕES DE DECIDIR 3. O Sistema de Informações de Crédito (SCR) é um sistema de pontuação que reúne o histórico de pagamento do consumidor e auxilia na tomada de decisão quanto à concessão de crédito. 4. A inscrição no SISBACEN equipara-se à inscrição em cadastros de proteção ao crédito e pode gerar efeitos negativos, inclusive inviabilizando a concessão de crédito. 5. A jurisprudência, contudo, firmou o entendimento de que a inscrição em cadastro de proteção ao crédito só enseja danos morais quando única em nome do consumidor, conforme a Súmula 385 do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 5. O recurso é parcialmente provido. 1. A inscrição no SCR/SISBACEN sem prévia comunicação configura ato ilícito. 2. "A existência de anotações prévias em nome do consumidor impede o reconhecimento do dano moral." 3. "No entanto, o pedido de cancelamento da inscrição/negativação (obrigação de fazer) no SCR/SISBACEN deve ser acolhido." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 42; Resolução n.º 4.571/17 do Banco Central do Brasil, art. 11. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, Súmula 385. (TJGO, 5767639-27.2023.8.09.0146, REINALDO ALVES FERREIRA, 2ª Câmara Cível, Publicado em 05/02/2025) (grifo meu) [...] 1 - o Sistema de Informações de Créditos (SCR) é constituído por informações remetidas ao Banco Central do Brasil sobre operações de crédito, que tem por finalidade o monitoramento do crédito no sistema financeiro, a fiscalização das atividades bancárias, bem como propiciar o intercâmbio de informações entre instituições financeiras, acerca do montante da responsabilidade de seus clientes. 2 - Constatado, pelo Relatório de Informações Detalhadas do Sistema de Informações de Crédito - SCR apresentado pela própria autora, o registro de títulos vencidos de outras instituições bancárias, aplica-se analogicamente a Súmula n.º 385 do Superior Tribunal de Justiça, afastando a condenação em danos morais. 3. O recurso merece, contudo, acolhimento na parte que busca seja afastada a inscrição/negativação, a qual, sendo incontroverso, ocorreu sem a prévia indispensável notificação prévia. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJGO, 5373156-91.2023.8.09.0174, REINALDO ALVES FERREIRA, 2ª Câmara Cível, Publicado em 02/10/2024) (grifo meu) Portanto, ainda que a inserção do nome da parte apelante no SCR/SISBACEN tenha ocorrido sem prévia comunicação, não há direito à reparação por danos morais, seja pela existência de outras inscrições, seja por não ter sido comprovado algum prejuízo passível de indenização. 3. Dispositivo Ante o exposto, CONHEÇO do recurso de Apelação Cível e NEGO-LHE PROVIMENTO, nos termos do artigo 932, inciso IV, do Código de Processo Civil, a fim de manter a sentença recorrida por estes e seus próprios e jurídicos fundamentos. Nos termos do §11, do artigo 85, do Código de Processo Civil, fica majorada a verba honorária anteriormente arbitrada no primeiro grau de jurisdição para o percentual de 12% sobre o valor atribuído à causa, em desfavor da parte apelante/autora, mantendo-se a proporção da origem. É como decido. Goiânia, datado e assinado digitalmente (Resolução n.º 59/2016). Desembargador FERNANDO RIBEIRO MONTEFUSCO R E L A T O R 09B

Conteúdo completo bloqueado

Desbloquear

Encontrou 129 resultados. Faça login para ver detalhes completos e mais informações.

Fazer Login para Ver Detalhes