Processo nº 1008945-05.2025.8.11.0000
ID: 293517762
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 1008945-05.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FABRICIO DE ALMEIDA CAVALCANTE FILHO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008945-05.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Forneciment…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008945-05.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Energia Elétrica, Cumprimento Provisório de Sentença] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (AGRAVANTE), FRANCISCO ILANILDO FILHO - CPF: 142.093.061-34 (AGRAVADO), FABRICIO DE ALMEIDA CAVALCANTE FILHO - CPF: 899.570.911-15 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE SENTENÇA – FIXAÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA - DESCUMPRIMENTO PROLONGADO DA DETERMINAÇÃO JUDICIAL – CARÁTER COERCITIVO DAS ASTREINTES – PEDIDO DE REDUÇÃO – PROPORCIONALIDADE EM RELAÇÃO AO TEMPO DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO - CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DA SENTENÇA – POSSIBILIDADE – DECISÃO MANTIDA– RECURSO DESPROVIDO. Nos termos do art. 537 do CPC, é cabível a imposição de multa cominatória como meio de coerção ao cumprimento de obrigação de fazer, sobretudo diante da inércia do devedor mesmo após intimações reiteradas. A multa cominatória não pode se confundir com penalidade de caráter sancionatório, devendo observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, o que ocorreu no caso os autos. A intimação eletrônica no sistema PJe é suficiente para a cobrança de multa cominatória, mesmo diante da Súmula 410 do STJ, quando há ciência inequívoca do devedor. Com relação à tese de impossibilidade de execução provisória das astreintes, conforme tema 743 do STJ, não subsiste o antigo entendimento de que as astreintes são inexigíveis enquanto não transitada em julgado à decisão que confirme a exigibilidade da obrigação que deu ensejo à aplicação da multa processual. Inteligência do art. 537, § 3º, do Código de Processo Civil. Descumprimento da liminar que restou caracterizado e, por consequência, devida a multa diária. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1008945-05.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A AGRAVADO: FRANCISCO ILANILDO FILHO R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo, interposto por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A, contra decisão interlocutória proferida pelo MM. Juiz da 7ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, Dr. Yale Sabo Mendes, lançada nos autos do Cumprimento Provisório de Sentença nº 1030248-83.2024.8.11.0041, ajuizada por FRANCISCO ILANILDO FILHO, que rejeitou a impugnação ao cumprimento provisório de sentença ofertada pelo executado e manteve a multa cominatória arbitrada diante do descumprimento prolongado e injustificado da determinação judicial. Consta dos autos que a parte agravada ajuizou ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais e pedido de tutela de urgência, em razão da suspensão indevida do fornecimento de energia elétrica referente à unidade consumidora n.º 926279-1. A tutela de urgência foi deferida, determinando-se à requerida que se abstivesse de interromper o fornecimento, sob pena de multa diária, limitada ao valor da causa, de R$ 12.162,54. A parte exequente alegou que houve descumprimento da medida liminar, com a interrupção indevida do serviço em 10/06/2024, requerendo, na fase de cumprimento provisório, o pagamento de R$ 74.000,00, valor correspondente a 37 dias de suposta interrupção do serviço. A agravante sustentou nesta via recursal e na impugnação rejeitada, que não houve qualquer descumprimento da ordem judicial, porquanto a suspensão do fornecimento teria decorrido de débito diverso dos discutidos na ação original. Alegou, ainda, a inexequibilidade da multa fixada, por ausência de confirmação da tutela antecipada por sentença de mérito, invocando o entendimento do Tema 743 do Superior Tribunal de Justiça. Ainda, apontou ausência de intimação pessoal da devedora para cumprimento da ordem, fundamento esse amparado na Súmula 410 do STJ, além de suscitar excesso na execução e desproporcionalidade no valor das astreintes. A par desses argumentos, pugnou, inicialmente, pela concessão do efeito suspensivo à decisão agravada, para que o pagamento da multa seja sobrestado até a decisão final do agravo, e no mérito, pelo provimento do recurso para reformar in totum a decisão agravada (Id. 276451399). O efeito suspensivo foi indeferido por mim em 04/04/2025, conforme Id. 279491886. Contraminuta ofertada no Id. 283285350, onde o agravado pugna pelo desprovimento do recurso. Preparo recolhido no Id. 277053393. É o relatório. V O T O EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Cinge-se dos autos que FRANCISCO ILANILDO FILHO, ajuizou cumprimento provisório de sentença em face da CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇOS PÚBLICOS - ENERGISA S/A, visando o cumprimento provisório referente ao arbitramento da multa no valor de R$ 74.000,00 (setenta e quatro mil reais), em razão de descumprimento de obrigação de não fazer, consistente na suspensão indevida do fornecimento de energia elétrica. Após, o recebimento da execução provisória a energisa apresentou a impugnação ao cumprimento provisório de sentença, em que alega preliminarmente a impossibilidade de execução provisória das astreintes antes da confirmação da tutela de urgência por sentença de mérito, conforme o Tema 743 do STJ e a ausência de intimação pessoal para o cumprimento da decisão, conforme previsto na Súmula 410 do STJ, bem como aduz que houve a fixação de multa em valor excessivo. No mérito, argumenta a ausência de descumprimento, a necessidade de limitação da multa imposta ao valor da causa fixado em R$ 12.162,54 (doze mil, cento e sessenta e dois reais e cinquenta e quatro centavos). No id. 173929876 – autos de origem, a parte Exequente/agravada argumenta que o valor da multa foi corretamente fixado, considerando a inércia da parte agravante/executada e a necessidade de garantir o cumprimento da obrigação imposta pela decisão judicial, bem como alega que a execução provisória da sentença está amparada pelo Código de Processo Civil, não havendo impedimento para a cobrança da multa, salvo decisão expressa em contrário. Em análise a impugnação ao cumprimento provisório de sentença, o magistrado a quo proferiu a seguinte decisão agravada: “(...) A Executada alega a necessidade de extinção da lide sem o julgamento do mérito em virtude da ausência de título executivo judicial, pois no presente caso o exequente busca executar as astreintes fixadas na decisão que concedeu a tutela de urgência deferida nos autos associado. Todavia, aduz a impossibilidade de execução das astreintes antes de confirmada por sentença, sendo tal entendimento sedimento em sede de Recurso Especial Repetitivo. Desde logo vejo que a presente preliminar não prospera. Isso porque, o Tema Repetitivo nº 743, citado pela Executada, foi fixado pelo STJ na vigência do Código de Processo Civil de 1.973, vejamos: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE MULTA COMINATÓRIA FIXADA POR DECISÃO INTERLOCUTÓRIA DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. NECESSIDADE DE CONFIRMAÇÃO POR SENTENÇA. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TESE CONSOLIDADA. 1.- Para os efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil, fixa-se a seguinte tese: "A multa diária prevista no § 4º do art. 461 do CPC, devida desde o dia em que configurado o descumprimento, quando fixada em antecipação de tutela, somente poderá ser objeto de execução provisória após a sua confirmação pela sentença de mérito e desde que o recurso eventualmente interposto não seja recebido com efeito suspensivo." 2.- O termo "sentença", assim como utilizado nos arts. 475-N, I, e 475-O do CPC, deve ser interpretado de forma estrita, não ampliativa, razão pela qual é inadmissível a execução provisória de multa fixada por decisão interlocutória em antecipação dos efeitos da tutela, ainda que ocorra a sua confirmação por Acórdão. 3.- Isso porque, na sentença, a ratificação do arbitramento da multa cominatória decorre do próprio reconhecimento da existência do direito material reclamado que lhe dá suporte, então apurado após ampla dilação probatória e exercício do contraditório, ao passo em que a sua confirmação por Tribunal, embora sob a chancela de decisão colegiada, continuará tendo em sua gênese apenas à análise dos requisitos de prova inequívoca e verossimilhança, próprios da cognição sumária, em que foi deferida a antecipação da tutela. 4.- Recurso Especial provido, em parte: a) consolidando-se a tese supra, no regime do art. 543-C do Código de Processo Civil e da Resolução 08/2008 do Superior Tribunal de Justiça; b) no caso concreto, dá-se parcial provimento ao Recurso Especial.” (REsp 1200856/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, CORTE ESPECIAL, julgado em 01/07/2014, DJe 17/09/2014) Entretanto, a reforma do Código de Processo Civil ocorrida em 2015, trouxe nova sistemática à execução da multa nos termos do art. 537, § 3º, in verbis: “Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. § 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte”. Portanto, o atual Código de Processo Civil previu de forma expressa a possibilidade de execução provisória da decisão que fixa multa sem a necessidade de prolação de sentença confirmatória. (...) Deste modo, não há que se falar em extinção do cumprimento de sentença. Quanto à inexequibilidade da multa com base na Súmula 410 do STJ. A Súmula 410 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que "a prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer". Contudo, o entendimento consolidado da jurisprudência aponta que a necessidade de intimação pessoal deve ser interpretada em consonância com o caso concreto. No presente caso, observa-se que a parte Executada foi devidamente intimada da decisão, conforme artigo 246, §1º, do CPC, o que afasta qualquer alegação de nulidade. Além disso, o artigo 274, parágrafo único, do CPC estabelece a presunção de recebimento das intimações encaminhadas ao endereço fornecido nos autos, quando não houver comprovação de mudança sem prévia atualização. Dessa forma, não há que se falar em inexequibilidade da multa, pois a parte Executada teve ciência inequívoca da obrigação imposta e não comprovou qualquer irregularidade na sua intimação. Por sua vez, na impugnação, a Executada argumenta que apesar da Exequente alegar a suspensão do fornecimento da energia elétrica por 34 dias, a mesma acosta nos autos principal o comprovante de pagamento das faturas mensais, presumindo, portanto, que esta sendo faturado e consumindo energia, razão pela qual não há indício ou evidencia de que a UC tenha sido objeto de corte e que o mesmo tenha se estendido por tamanho período. Pois bem, na decisão proferida na ação principal (1049430- 89.2023.8.11.0041) foi determinado que a Executada abstenha de interromper o fornecimento de energia elétrica na unidade consumidora do Executado, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00. A eficácia da decisão está condicionada à consignação, pelo Exequente, do valor mensal de R$ 108,71 até o dia 10 de cada mês, sob pena de revogação da tutela. No caso, o Exequente comprovou ter efetuado o depósito judicial do valor em questão até o prazo estabelecido. Em 10/06/2024, o fornecimento de energia elétrica foi suspenso pela executada, conforme documentos acostado nos autos. O mais relevante é que a Executada, devidamente intimada em 08/07/2024 para se manifestar no prazo de 48 horas, não apresentou qualquer documento ou justificativa comprovando o cumprimento da decisão judicial. Assim, a ausência de manifestação implica a aceitação tácita do descumprimento alegado pelo Exequente. Nesse esteio, não tenho nenhuma dúvida de que a Executada deixou de atender o comando judicial a contento e no prazo estabelecido. Isso porque, consta dos autos que a Executada em momento algum cumpriu as ordens emanadas por este juízo, pois em duas oportunidades foi intimada para manifestar e deixou transcorrer o prazo in albis. Em razão dessa omissão, em decisão proferida em 11/07/2024, foi reconhecido o descumprimento da liminar, sendo a multa majorada para R$ 2.000,00 por dia, em conformidade com os artigos 536 e 537 do CPC. (...) No presente caso, diante do descumprimento prolongado e injustificado da determinação judicial, o valor da multa até a propositura do cumprimento provisório de sentença alcançou a quantia de R$ 74.000,00 (setenta e quatro mil reais). De outra sorte, impende frisar que o valor da multa diária de R$ 2.000,00 (dois mil reais), não se revela excessivo frente o poder aquisitivo da parte Executada e o simplório ato a ser praticado, de tal sorte, não ensejaria enriquecimento ilícito da parte adversa, bastando, entretanto, o cumprimento da ordem judicial de modo a evitar a acumulação do valor, o que não restou comprovado nos autos. (...) Por consequência, diante da ausência de comprovação de cumprimento da ordem judicial, impõe-se considerar justificável o valor apurado, pois decorrente unicamente da própria conduta do Impugnante de não diligenciar de modo eficaz em cumprir sua obrigação, assumindo os riscos e consequências de sua atitude. Considerando que a decisão ainda está sujeita a reexame e que eventual modificação poderá impactar o montante devido, é necessário aguardar o trânsito em julgado da sentença no processo principal de nº 1049430-89.2023.8.11.0041 para liberação do valor depositado nos autos, nos termos do artigo 537, §3º do CPC, garantindo maior segurança jurídica às partes. ANTE O EXPOSTO, nos termos do artigo 525 do CPC/2015, REJEITO a IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ofertada pelo Executado”. (Id. 185137802 – autos de origem) O cerne da controvérsia recursal cinge-se à possibilidade de se dar prosseguimento ao cumprimento provisório de sentença para exigência de multa cominatória (astreintes), decorrente de suposto descumprimento de tutela provisória de urgência deferida em ação de obrigação de fazer, antes do trânsito em julgado da decisão que confirma a tutela. A agravante aduz, em síntese, que: (I) não descumpriu a liminar deferida; (II) eventual descumprimento diria respeito a débito diverso; (III) a multa diária fixada seria inexigível antes da confirmação por sentença de mérito, à luz do Tema 743/STJ; (IV) não houve intimação pessoal da parte, conforme exige a Súmula 410/STJ; e (V) o valor executado seria excessivo e desproporcional ao valor da causa e ao grau da suposta violação. Pois bem. O ponto central da insurgência repousa na aplicabilidade do Tema 743 do STJ, que assentou a seguinte tese: “A multa diária prevista no §4º do art. 461 do CPC/1973, devida desde o dia em que configurado o descumprimento, quando fixada em antecipação de tutela, somente poderá ser objeto de execução provisória após sua confirmação pela sentença de mérito e desde que o recurso eventualmente interposto não seja recebido com efeito suspensivo.” Tal orientação jurisprudencial, porém, deve ser reinterpretada à luz da sistemática do Código de Processo Civil de 2015 como bem ponderado pelo juízo a quo na decisão agravada, cujo espírito é marcadamente voltado à efetividade processual e à instrumentalidade das decisões interlocutórias, inclusive quanto ao cumprimento das obrigações de fazer. Dessa forma, o precedente qualificado foi superado (overruling) com o advento do Código de Processo Civil de 2015 que passou a admitir a imediata execução da multa cominatória, consagrando sua exigibilidade imediata. É dizer, não há mais respaldo legal para a exigência de confirmação em sentença de mérito para que haja a execução provisória da multa cominatória, conforme a redação do art. 537, § 3º, do CPC/2015 “A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte." Como se vê, o texto normativo atual abandona a exigência de prévia confirmação por sentença de mérito, prestigiando a coercitividade da ordem judicial como instrumento de tutela jurisdicional efetiva. Destarte, a interpretação teleológica e sistemática do ordenamento vigente conduz ao entendimento de que, mesmo em sede de cumprimento provisório, é legítima a execução da multa cominatória decorrente de tutela provisória não suspensa por recurso dotado de efeito suspensivo. A interpretação literal e isolada do tema 743 do STJ, sem considerar a inovação substancial do CPC/2015, deixaria a tutela provisória esvaziada em sua finalidade coercitiva, o que não se coaduna com os princípios da efetividade e da boa-fé processual. A propósito: “RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. OBSCURIDADE. OMISSÕES. AUSÊNCIA. ASTREINTES. NATUREZA PATRIMONIAL. FUNÇÃO COERCITIVA E INIBITÓRIA. RESP N. 1200856/RS. INOVAÇÃO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DAS ASTREINTES ANTES DA SENTENÇA DE MÉRITO. POSSIBILIDADE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. EXCESSO DO VALOR DAS ASTREINTES. EXAME DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. RETORNO DOS AUTOS À CORTE DE ORIGEM. 1- Recurso especial interposto em 19/8/2020 e concluso ao gabinete em 1/9/2021.2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) o acórdão recorrido contém obscuridade e omissões; b) à luz do novo Código de Processo Civil, é possível a execução provisória das astreintes antes da confirmação da tutela provisória por sentença de mérito; c) é necessário apresentar caução na execução provisória da multa cominatória; e d) se a Corte de origem pode examinar, de ofício, eventual excesso no valor das astreintes .3- Na hipótese em exame deve ser afastada a existência de obscuridade e omissões no acórdão recorrido, à consideração de que as matérias impugnadas foram enfrentadas de forma clara, objetiva e fundamentada nos julgamentos do recurso de apelação e dos embargos de declaração, naquilo que o Tribunal a quo entendeu pertinente à solução da controvérsia.4- As astreintes têm por escopo garantir a efetivação da tutela específica da obrigação ou o resultado prático equivalente. Por meio de sua imposição almeja-se induzir as partes a cumprir determinações judiciais que lhes foram impostas (em tutela provisória ou não), em prestígio ao princípio da efetividade dos provimentos jurisdicionais no contexto do moderno processo civil de resultados, motivo pelo qual possuem natureza patrimonial e função inibitória ou coercitiva. 5- À luz do novo Código de Processo Civil, não se aplica a tese firmada no julgamento do REsp 1200856/RS, porquanto o novo Diploma inovou na matéria, permitindo a execução provisória da multa cominatória mesmo antes da prolação de sentença de mérito. 6- Não há que se falar em exigência de caução, porquanto o levantamento do valor, por expressa disposição do § 3º do art. 537 do CPC/2015, está condicionado ao trânsito em julgado da sentença favorável à parte.7- A teor do § 3º do art. 537 do CPC/2015, é imperioso concluir que as astreintes, devidas desde o dia em que configurado o descumprimento da ordem judicial, podem ser objeto de execução provisória antes da confirmação da tutela provisória por sentença de mérito .8- No que diz respeito a interposição do presente recurso especial pela alínea c do permissivo constitucional, importa consignar que não se pode conhecer do recurso pela referida alínea, uma vez que pretende a parte recorrente discutir idêntica tese já afastada, ficando prejudicada a divergência jurisprudencial aduzida.9- Afastada a tese perfilhada pela Corte de origem no sentido de que o excesso da multa não poderia ser analisado de ofício, é imperiosa a determinação de retorno dos autos ao tribunal estadual para que enfrente o referido ponto como entender de direito, verificando, ante as peculiaridades fático-probatórias da hipótese, se a multa cominatória em questão revela-se insuficiente ou excessiva.10- Recurso especial parcialmente provido”. (STJ - REsp: 1958679 GO 2020/0334297-0, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 23/11/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/11/2021) Portanto, mostra-se superada a orientação do Tema 743 à luz do CPC/2015, não havendo óbice à exigibilidade da multa cominatória imposta judicialmente, desde que não suspensa por decisão superveniente. A propósito, segue jurisprudência deste Tribunal de Justiça: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – CANCELAMENTO DE PLANO DE SAÚDE – DETERMINAÇÃO DE REESTABELECIMENTO - MULTA POR DESCUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL – CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DA SENTENÇA – POSSIBILIDADE – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. 1 - As astreintes servem justamente para garantir o resultado prático da ordem judicial, sendo oriunda do poder geral de cautela detido pelo magistrado, objetivando dar aplicação prática ao princípio da efetividade das decisões judiciais, inexistindo finalidade de constranger ao pagamento da multa em si, mas sim, e tão somente, obrigá-la ao cumprimento da determinação judicial, já que só incidirá em caso de o réu/agravante resistir ao cumprimento do prévio comando judicial. 2 - “O descumprimento reiterado e injustificado de ordem judicial configura ato atentatório à dignidade da justiça, nos termos do art. 77 , IV e § 2º, do Código de Processo Civil, razão pela qual deve ser mantida a multa imposta .” (N.U 1000959-34.2024.8 .11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 22/05/2024, Publicado no DJE 27/05/2024) (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1008130-42.2024.8 .11.0000, Relator.: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 11/06/2024, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/06/2024) E dos tribunais pátrios: "Obrigação de fazer. Multa cominatória fixada em tutela de urgência. Cumprimento provisório. Possibilidade, ainda que não proferida a sentença . Tema 743 do STJ superado (overruling). Art. 537, § 3º, do CPC. Montante relativo a despesas em reembolso que, ademais, não se confunde com astreintes . Prosseguimento da execução cabível. Recurso provido." (TJ-SP - Agravo de Instrumento: 2181039-90.2023 .8.26.0000 São Paulo, Relator.: Augusto Rezende, Data de Julgamento: 27/05/2024, 1ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/05/2024) "APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DO VALOR REFERENTE ÀS "ASTREINTES". POSSIBILIDADE. TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA DE MÉRITO. DESNECESSIDADE. ART . 537, § 3º, DO CPC/2015. TEMA 743 DO STJ SUPERADO COM O ADVENTO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. "OVERRULING". PRECEDENTES . APENAS O LEVANTAMENTO DESSES VALORES FICA CONDICIONADO AO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA DE MÉRITO."III - A anterior jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça ( REsp 1200856/RS, Corte Especial, Relator Sidnei Beneti, DJe 17.9.2014, Tema n . 743/STJ) assentava que era inadmissível a execução provisória de multa cominatória (astreintes), fixada em tutela provisória, antes da confirmação desta em sentença de mérito. IV - Tal precedente qualificado foi superado (overruling) com o advento do CPC/2015, que passou a admitir a imediata execução da multa cominatória, consagrando sua exigibilidade imediata. É dizer, não há mais respaldo legal para a exigência de confirmação em sentença de mérito para que haja a execução provisória da multa cominatória, conforme a redação do art. 537, § 3º, CPC/2015: "§ 3º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte ." Precedente citado: REsp 1958679/GO, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 23/11/2021, DJe 25/11/2021. V - Vale ressaltar que a execução provisória será, todavia, incompleta, pois o levantamento do depósito correspondente somente ocorrerá após o trânsito em julgado favorável à parte beneficiada pela multa cominatória, o que foi atendido no presente caso."("ut"excerto da ementa do AREsp 2 .079.649/MA, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 7/3/2023, DJe de 10/3/2023).APELO PROVIDO." (TJ-RS - AC: 50007763820208210135 TAPEJARA, Relator.: Miguel Ângelo da Silva, Data de Julgamento: 15/06/2023, Vigésima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 21/06/2023) Quanto à tese de aplicabilidade da Súmula 410 do STJ, segundo a qual “a prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa por descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer”, a jurisprudência atual do STJ tem admitido a mitigação da súmula em hipóteses nas quais a parte intimada pela via eletrônica, por meio de seus advogados constituídos, tem ciência inequívoca da ordem judicial e exerce, regularmente, o contraditório. No presente caso, a concessionária agravante foi devidamente representada por patronos regularmente constituídos, que acompanharam os autos, inclusive manifestando-se após a concessão da liminar. A ciência inequívoca da obrigação judicial exime a necessidade de intimação pessoal, sobretudo tratando-se de pessoa jurídica de grande porte, plenamente capaz de cumprir medidas judiciais por seus canais institucionais. A aplicação literal da Súmula 410, nessas circunstâncias, desconsideraria o princípio da boa-fé processual, fomentando comportamento contraditório e recusa voluntária de cumprimento da ordem judicial validamente comunicada. No que concerne à alegação de que não teria ocorrido descumprimento da medida liminar, tal matéria demanda análise probatória aprofundada, o que escapa aos limites da cognição do agravo de instrumento. De todo modo, observa-se dos elementos dos autos que a tutela deferida restringiu-se à abstenção de suspensão do fornecimento de energia por faturas específicas. A discussão sobre a ocorrência de corte com fundamento em fatura distinta exige dilação probatória e, portanto, não impede o processamento do cumprimento provisório, restando resguardada à parte executada a apresentação de embargos à execução, quando cabíveis. Ademais, não vislumbro excessividade na multa importa porquanto decorrente da renitência da parte recorrente quanto ao cumprimento de decisão judicial, de modo que escorreito o decisum agravado. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão agravada por seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 04/06/2025
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