Processo nº 0005242-70.2019.8.11.0040
ID: 325969398
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0005242-70.2019.8.11.0040
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALESSANDRA GOMES DA SILVA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 0005242-70.2019.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 0005242-70.2019.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins, Tráfico Ilícito de Drogas praticado por Funcionário Público] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Turma Julgadora: [DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), ANA CLARA SOUZA FONTINELLES - CPF: 070.217.231-64 (APELANTE), ELVIRA KELLI DE ALMEIDA CRUZ - CPF: 600.325.702-44 (ADVOGADO), LUANA GONCALVES MOURA - CPF: 054.202.051-30 (APELANTE), ALESSANDRA GOMES DA SILVA - CPF: 951.610.581-53 (ADVOGADO), LUANA DE ABREU SOARES - CPF: 074.371.681-70 (APELANTE), DANILO MILITAO DE FREITAS - CPF: 030.555.091-88 (ADVOGADO), MARIA ALBERTINA DE SOUZA FONTINELLES (APELANTE), A SOCIEDADE (VÍTIMA), MARIA ALBERTINA DE SOUZA FONTINELLES - CPF: 040.115.751-27 (TERCEIRO INTERESSADO), ALESSANDRA GOMES DA SILVA - CPF: 951.610.581-53 (ADVOGADO), LUANA DE ABREU SOARES - CPF: 074.371.681-70 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA, PROVEU PARCIAL O RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DESEMBARGADOR JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, ACOMPANHADO PELO DOUTO VOGAL, DESEMBARGADOR RUI RAMOS RIBEIRO. FICOU VENCIDO O DOUTO REVISOR, DESEMBARGADOR PAULO SÉRGIO CARREIRA DE SOUZA. EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE TRÁFICO POR UMA DAS APELANTES. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DEPOIMENTOS POLICIAIS HARMÔNICOS COM PROVAS. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO PELO CRIME DE ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO EM RELAÇÃO AS DUAS APELANTES. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA DO ANIMUS ASSOCIATIVO. PRETENSÃO DE EXCLUSÃO DA CAUSA DE AUMENTO (ART. 40, VI) PARA AMBAS AS APELANTES. DECOTE EM RELAÇÃO A UMA DAS RÉS. ALMEJADO O RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO PARA AMBAS AS APELANTES. CONCESSÃO PARA UMA DAS APELANTES. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA EM RELAÇÃO A PRIMEIRA RECORRENTE. PROCEDENTE. PRETENDIDO O AFASTAMENTO DA VALORAÇÃO NEGATIVA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS EM RELAÇÃO A AMBAS AS RECORRENTES. MANUTENÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS NEGATIVAS. PEDIDO DE RECORRER EM LIBERDADE. INDEFERIDO. PLEITO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUÍTA. CIRCUNSTÂNCIA A SER AVALIADA PELO JUÍZO DAS EXECUÇÕES PENAIS. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. I. Caso em exame: Cuida-se de apelações criminais interpostas pelas recorrentes em face de sentença condenatória pelos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico. Pretendem as apelantes: (I) direito de recorrer em liberdade; (II) absolvição dos crimes imputados; (III) readequação das penas; (IV) exclusão da causa de aumento do art. 40, VI, da Lei de Drogas; (V) reconhecimento da atenuante da confissão espontânea; e (VI) concessão do tráfico privilegiado. II. Questão em discussão: 2. As questões discutidas consistem em: (I) verificar a suficiência probatória para condenação pelo crime de tráfico de drogas; (II) aferir a existência de animus associativo necessário à configuração da associação para o tráfico; (III) examinar a legalidade da valoração negativa das circunstâncias judiciais; (IV) avaliar a presença da causa de aumento do art. 40, VI, da Lei 11.343/06; (V) reconhecer a confissão espontânea como atenuante; (VI) analisar a possibilidade de aplicação do tráfico privilegiado; (VII) aferir a possibilidade de recorrer em liberdade. III. Razões de decidir: 3. A materialidade e a autoria do crime de tráfico de drogas restaram comprovadas por autos de prisão em flagrante, laudos toxicológicos, termos de exibição e apreensão e confissão da corré, primeira recorrente. 4. Os depoimentos policiais são harmônicos e corroboram a versão apresentada, evidenciando o dolo de guardar e ocultar os entorpecentes. 5. As provas não demonstram vínculo estável e permanente entre as rés, razão pela qual se impõe a absolvição quanto ao crime de associação para o tráfico, nos termos do art. 386, VII, do CPP. 6. A causa de aumento do art. 40, VI, da Lei 11.343/06, foi mantida em relação à primeira recorrente, que envolveu menores no delito, mas excluída em relação a segunda apelante, pela ausência de provas quanto à participação de adolescentes. 7. Reconhecida a atenuante da confissão espontânea da primeira recorrente, com repercussão na segunda fase da dosimetria da pena. 8. Concedido o tráfico privilegiado à segunda apelante, na fração mínima, em face da natureza e quantidade de drogas apreendidas com ela (mais de 11kg de maconha e 65 g de cocaína), diante de sua primariedade, não dedicação ao tráfico e ausência de vínculo com organização criminosa. 9. A valoração negativa das circunstâncias judiciais foi mantida para ambas, considerando-se a grande quantidade de entorpecente (18.780 kg de maconha, mais 11.230kg da mesma substância e 65 g de cocaína) e o modo de execução (divisão em vários tabletes, em duas malas/mochilas e em dois lugares distintos). 10. Em que pese a pena corpórea aplicada às apelantes seja inferior a 08 (oito) anos de reclusão foi fixado regime mais gravoso, devido à quantidade e natureza do entorpecente apreendido, conforme preceitua o Enunciado Orientativo nº. 47 do TJMT. 11. Indeferido o pedido de recorrer em liberdade, diante da manutenção da custódia durante a instrução e da subsistência dos fundamentos da prisão preventiva. IV. Dispositivo e tese: RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. Teses de julgamento: “1. A materialidade e autoria do tráfico de drogas restam demonstradas por prova testemunhal e documental, incluindo confissão da corré e depoimentos policiais harmônicos.” “2. A ausência de vínculo estável e permanente afasta a configuração do crime de associação para o tráfico.” “3. A confissão espontânea deve ser reconhecida como atenuante nos termos do art. 65, III, ‘d’, do CP.” “4. A exclusão da causa de aumento do art. 40, VI, da Lei 11.343/06 é possível quando ausente prova de participação de menores.” “5. O tráfico privilegiado é aplicável ao réu primário, de bons antecedentes, sem envolvimento com organização criminosa.” “6. A fixação do regime fechado é cabível quando justificada pela quantidade e natureza da droga.” “7. O indeferimento do pedido de recorrer em liberdade é legítimo quando subsistirem os fundamentos da prisão preventiva.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, inciso LVII. CP, arts. 33, 35, 59, 65, III, “d”, 69. CPP, arts. 386, VII; 593, I. Lei 11.343/06, arts. 33, §4º; 35; 40, VI. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, AgRg no HC 573.479/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 19/05/2020; STJ, AREsp 2587239/TO, Rel. Min. Daniela Teixeira, j. 26/11/2024; TJMT, N.U 0007014-70.2019.8.11.0007, Rel. Des. Juvenal Pereira da Silva, j. 12/05/2021; TJMT, N.U 1001081-88.2023.8.11.0030, Rel. Des. Gilberto Giraldelli, j. 19/12/2024. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Egrégia Câmara: Cuida-se de Recurso de Apelação Criminal interposto por Ana Clara Souza Fontinelles e Luana Gonçalves Moura, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara de Sorriso/MT, que condenou a primeira recorrente, à pena de 11 (onze) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, além de 1.580 dias-multa e, à segunda, à pena de 12(doze) anos e 10(dez) meses de reclusão, em regime inicial fechado e 1.700 dias-multa, pela prática dos delitos previstos nos arts. 33, caput e 35, caput, c/c art. 40, inciso VI, todos da Lei nº 11.343/06 (id. 259208693). A Defesa, em suas razões, postula o seguinte: “A concessão ao direito de recorrer em liberdade para as duas apelantes. No mérito, pretende: 1) absolvição do crime de tráfico de entorpecentes (Luana); 2) absolvição do crime de associação ao tráfico (ambas); 3) readequação da pena, afastando a valoração negativa das circunstâncias judiciais (ambas); 4) reconhecimento da confissão da ré Ana Clara; 5) exclusão da causa de aumento prevista no art. 40, VI, da Lei de Drogas (ambas); 6) reconhecimento do tráfico privilegiado (ambas); 7) concessão da justiça gratuita (ambas)”. O Ministério Público Estadual manifestou-se pelo desprovimento do recurso, pugnando pela manutenção da sentença invectivada. A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo provimento parcial do recurso interposto (id. 269197274). É o relatório. À douta revisão. VOTO O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107). Verifica-se da denúncia que: “...que, no dia 13 de junho de 2019, por volta das 20h10min, na Rua Xanxere, nº 190, Bairro Rota do Sol, em Sorriso/MT, a denunciada ANA CLARA SOUZA FONTINELLES, guardava, mantinha em depósito drogas, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no importe de 18,780 kg. (dezoito quilos, setecentos e oitenta gramas) de substância análoga à maconha, de acordo com o Termo de Exibição e Apreensão (fls. 10/11 do IP), Auto de Constatação Preliminar de Substância Entorpecente (fls. 52/53 do IP), fotografias (fls. 54/62) e Laudo Preliminar de Drogas (fls. 96/109 do IP). II. Narra ainda que, na data e hora acima descritos, Rua da Amizade, n° 117, Bairro Boa Esperança 2, em Sorriso/MT, a indigitada MARIA ALBERTINA DE SOUZA FONTINELLES, guardava, mantinha em depósito drogas, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no importe de 540 g. (quinhentos e quarenta gramas) de substância análoga à maconha, de acordo com o Termo de Exibição e Apreensão (fls. 10/11 do IP), Auto de constatação Preliminar de Substância Entorpecente (fls. 52/53 do IP), fotografias (fls. 54/62) e Laudo Preliminar de Drogas (fls. 96/109 do IP). III. Ademais extrai-se dos autos que, na mesma data e hora retroindicados, na Rua São Miguel, nº 124, Bairro São Domingos, em Sorriso/M, denunciada LUANA DE ABREU SOARES, guardava, mantinha em depósito drogas, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no importe de 146 g. (cento e quarenta e seis gramas) de substância análoga à maconha, de acordo com o Termo de Exibição e Apreensão (fls. 10/11 do IP), Auto de Constatação Preliminar de Substância Entorpecente (fls. 52/53 do IP), fotografias (fls. 54/62) e Laudo Preliminar de Drogas (fls. 96/109 do IP). IV. Observa-se também que, na mesma data e hora descriminada anteriormente, na Rua 15 de novembro, Quadra 45, Casa 02, Bairro Mario Raiter, em Sorriso/MT, a indigitada LUANA GONÇALVES DE MOURA, guardava, mantinha em depósito drogas, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no importe de 11,230 Kg (onze quilos, duzentos e trinta gramas) de substância análoga à maconha e 65 g. (sessenta e cinco gramas) de substância análoga à pasta base, de acordo com o Termo de Exibição e Apreensão (fls. 10/11 do IP), Auto de Constatação Preliminar de Substância Entorpecente (fls. 52/53 do IP), fotografias (fls. 54/62) e Laudo Preliminar de Drogas (fls. 96/109 do IP). V. Narra ainda que, nas condições de tempo e locais retromencionadas, as increpadas ANA CLARA SOUZA FONTINELLES, MARIA ALBERTINA DE SOUZA FONTINELLES, LUANA DE ABREU SOARES e LUANA GONÇALVES DE MOURA, associaram-se para o fim de praticar o crime de tráfico de drogas. VI. Extrai-se dos autos que, nas mesmas condições acima descritas, a increpada ANA CLARA SOUZA FONTINELLES, praticava o crime de tráfico de drogas envolvendo a adolescente R.F.S., consoante termo de declarações fl. 19 do IP Segundo restou apurado, a equipe de inteligência da Polícia Militar estava monitorando a facção criminosa denominada "Comando Vermelho" quando chegou a informação de que a denunciada ANA CLARA SOUZA FONTINELLES estaria com grande quantidade de drogas no local mencionado no item "I" proveniente do estado de Goiás. Em face destas informações, a guarnição deslocou-se ao endereço, onde avistaram a denunciada chegar com uma mala. Ato contínuo observaram a denunciada e menores realizando a separação e pesagem do ilícito, razão pela qual adentraram no local e deram voz de prisão à indigitada. Indagada pelos militares sobre a distribuição de drogas na cidade, a denunciada ANA CLARA SOUZA FONTINELLES informou que havia deixado parte das drogas na residência de suas comparsas, as increpadas MARIA ALBERTINA DE SOUZA FONTINELLES, LUANA DE ABREU SOARES e LUANA GONÇALVES DE MOURA. No deslinde fático, a guarnição dirigiu-se aos endereços descritos pela indigitada ANA CLARA (ordem dos itens II, III e IV), apreendeu as drogas que se encontravam nos locais supracitados e deu voz de prisão as denunciadas MARIA ALBERTINA DE SOUZA FONTINELLES, LUANA DE ABREU SOARES e LUANA GONÇALVES DE MOURA. Posteriormente, já na Delegacia de Polícia, a equipe de plantão recebeu informações de que na cela onde as indigitadas estavam havia um aparelho celular. Em revistas no local encontraram em poder de denunciada LUANA DE ABREU SOARES, em sua blusa moletom, 01 (uma) porção de substância análoga à pasta base e 01 (uma) porção de substância análoga à maconha; com a increpada LUANA GONÇALVES DE MOURA, em seu shorts, o valor de R$ 100,00 (cem reais). Termo de Exibição e Apreensão (fl. 14 do IP). Questionadas sobre o aparelho celular na cela, a indigitada ANA CLARA SOUZA FONTINELLES informou qual havia passado para seu advogado, diante a informação a equipe policial conseguiu realizar a apreensão do aparelho. Termo de Exibição e Apreensão (fl. 14 do IP). Ante o exposto, denuncio MARIA ALBERTINA DE SOUZA FONTINELLES, LUANA DE ABREU SOARES e LUANA GONÇALVES DE MOURA, como incurso no art. 33, caput e art. 35, caput, todos da Lei 11.343/06, em concurso material de crimes (art. 69, caput, do CP), e ANA CLARA SOUZA FONTINELLES como incurso no art. 33, caput, art. 35, caput, e art. 40, incisos V e VI, ambos da Lei 11.343/06, em concurso material (artigo 69, caput do CP)...”. (Denúncia – id. 259208675, pg. 01/05). Após regular processamento, o Juízo singular prolatou a sentença condenando as apelantes Ana Clara de Souza Fontinelles e Luana Gonçalves de Moura, pela prática dos delitos previstos nos art. 33, caput c/c art. 35, caput, c/c art. 40, inciso VI, todos da Lei 11.343/06. Absolveu a acusada Maria Albertina de Souza Fontinelles, dos delitos a ela imputados e desclassificou o delito atribuido à Luana de Abreu Soares (id. 259208693, pg. 01/17). Feita essas considerações, passo à análise das razões recursais. 1. QUANTO AO PEDIDO ABSOLVIÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES, EM RELAÇÃO À APELANTE LUANA GONÇALVES MOURA. Da detida análise das razões constantes do recurso, conclui-se que o inconformismo da apelante não merece acolhimento. Exsurge dos autos que a materialidade se encontra devidamente comprovada pelo auto de prisão em flagrante, pelo termo de exibição e apreensão, pelo boletim de ocorrência, pelos laudos preliminar e definitivo de drogas, que concluíram tratar-se de substâncias análogas à cocaína e maconha, pesando 65 gr e 30.696Kg, respectivamente. Quanto à autoria, verifica-se dos autos, que a apelante Luana, na fase policial, admitiu que guardou uma mala, contendo substância entorpecente em sua residência, contudo, alegou que não tinha conhecimento de seu conteúdo e a partir do momento que ficou sabendo, mesmo assim, levou-a para guardá-la na casa de sua prima Phamela. Vejamos: “...que na data de 10 de junho de 2019 a Ana Clara pediu para a interrogada guardar uma mala, dizendo que era roupa; que é uma mala azul; que na terça feira, dia 11 de junho de 2019, a Ana Clara ligou para a interrogada e disse que havia droga na mala e falou para a interrogada tirar a mala de sua casa; que a interrogada levou a mala para casa de sua prima Phamela; que na data de 12 de junho de 2019 a polícia militar foi em sua casa junto com a Ana Clara; que a interrogada informou que droga não estava em sua residência que tinha levado para a casa de sua prima Phamela; que foi encontrada na casa de sua prima; que a interrogada diz que não sabia que havia droga na mala até a Ana lhe contar; que a interrogada não tem envolvimento com a tráfico de drogas e nem é usuária de drogas;...”. (Fase Policial – Apelante Luana Gonçalves de Moura – id. 259208675, pg. 39). Em juízo, a apelante Luana manteve a negativa de autoria, admitindo que concordou com Ana Clara que deixasse a mala em sua residência, contudo, alegou que não tinha conhecimento de seu conteúdo. Vejamos: “...então abri a bolsa e realmente havia roupa em cima, mas embaixo havia droga (...) que esperei os policiais saírem, peguei a mochila e levei para a casa da minha prima, e pedi por favor que minha prima guarda-se aquilo pois quando Ana Clara ligasse eu mandaria ela ir buscar na casa da minha prima (...) acordei com Ana Clara, a polícia e investigadores falando “a Ana Clara já nos disse que entregou uma mochila para você, e queremos que entregue a mochila para a gente” que Ana Clara me olhou e perguntou “Luana onde você guardou?”, então falei que estava na casa da minha prima, que os policiais disseram “nos leva até a droga” e a Ana Clara disse “leva eles” que levei os policiais até a casa da minha prima e fui presa na minha casa e a droga no Bairro Mario Raiter, que a droga estava na casa da Pâmela, no momento entreguei a mochila ela sabia que tinha droga (...) que minha prima guardou, quando a polícia chegou falei que a droga não estava comigo, que estava na casa minha prima, pois havia pedido para ela guardar até a Ana buscar (Fase Judicial – Apelante Luana – relatório de mídias). Como se vê, a própria Luana Gonçalves, mesmo tentando minimizar sua conduta, reconhece ter guardado a mala após saber que continha uma grande quantidade de droga, e que transferiu para a casa da prima, Phamela. Por sua vez, a apelante Ana Clara, em ambas as fases procedimentais, confessou a prática delitiva e, inclusive, afirmou ter entregado, na segunda-feira, uma mala com parte da droga para Luana guardar, sendo que na terça-feira lhe revelou o que tinha em seu interior, ocasião em que pediu que ela guardasse em outro lugar, dizendo que depois lhe explicaria o que estava acontecendo, o que foi aceito por Luana Gonçalves Moura: “...que na terça feira a LUANA GONÇALVES, disse que não queria mala em sua casa, que a interrogada falou que havia droga na mala e pediu para a LUANA GONÇALVES guardar em outro lugar, e disse "guarda para mim que depois eu falo com você"; que a LUANA GONÇALVES deve ter trocado de mala, pois a mala não era azul; que afirma que não tinha droga na casa de sua mãe, MARIA ALBERTINA, mesmo no boletim dizendo que foi encontrado droga e dinheiro no local; que conhece a LUANA DE ABREU, mas não tem nada com ela; que não passou droga para a LUANA ABREU;...”. (Fase Policial – Apelante Ana Clara – id. 259208675, pgs. 44/45). “(…) que não falei para Luana Gonçalves que seria droga na bolsa, que a justificativa de deixar a mala na casa dela era por eu ter brigado com minha mãe, que minha mãe não sabia que eu havia viajado, que a mala não podia ficar comigo porque eu não queria deixar tudo em uma única casa, que convenci a menina de que a bolsa não poderia ficar comigo, sem ela saber que seria drogas, por ela ser amiga da minha mãe aleguei que ela podia me ajudar e guardar a bolsa de roupas na casa dela e ela aceitou, que em primeiro momento aleguei que a bolsa era de roupas e no outro dia liguei falando que era droga e que ela deveria mover a bolsa para a casa de uma prima, que liguei e expliquei para Luana Gonçalves, pois ela tinha me ligado e estava dando caixa postal, que liguei para Luana Gonçalves avisando que tinha deixado a bolsa e que ela não deveria mexer e se ela não quisesse” deixar na casa dela, falei para Luana que seria drogas, que falei para Luana Gonçalves se ela não quisesse deixar a droga na casa dela poderia retirar da casa dela, que eu não conhecia a Pâmela, que falei para Luana Gonçalves se ela não quisesse deixar na casa dela poderia tirar de lá, que o rapaz me ligou falando que me esperaria na rodoviária de Sorriso me esperando, mas quando cheguei e permaneci esperando, não apareceu ninguém para buscar, falaram que me ligariam, então esperei algumas horas na rodoviária, mas por medo de ficar com aquilo na rodoviária sai do local (…) que peguei a droga repartida, pois uma quantidade estava na bolsa e outra na mala, que deixei a mala na casa da Natália e a bolsa na casa da Luana Gonçalves (…) que perguntei a Luana Gonçalves se ela podia guardar a bolsa de roupas na casa dela e ela aceitou, que liguei para Luana Gonçalves falando que tinha a bolsa de roupas e que tinha a droga dentro, que falei para Luana se ela não quisesse deixar a bolsa na casa dela, que depois eu buscaria, falei que se ela não quisesse deixar na casa poderia arrumar a casa de alguém para deixa, porque fiquei com medo de ela mexer ou alguém entrar e mexer e dar problemas para nós duas (…)”. (Fase Judicial – Apelante Ana Clara – relatório de mídias). Em que pese a negativa de autoria apresentada pela acusada Luana Gonçalves Moura, ao contrário do relatado por ela, temos as declarações dos agentes policiais, que participaram da abordagem que atestaram que a própria Luana os levou até a residência de sua prima, onde havia deixado a mala com os entorpecentes, em cujo local foram apreendidos mais de 11 kg de maconha e 65g de pasta-base de cocaína. Neste sentido, vejamos as declarações do policial Militar Igor Farias Santana, na fase policial: “...Que, em continuidade a suspeita ANA, apontou que a conduzida LUANA GONÇALVES, estaria em posse da parte restante do entorpecentes, que a equipe deslocou juntamente com a suspeita ANA, até a Rua Alencar Bortolanza, na quadra 11, casa 26, Bairro Nova Aliança, onde a conduzida LUANA GONÇALVES, foi localizada em frente à residência e essa ao ser indagada sob o entorpecente que estaria em sua posse, disse a equipe que havia deixado na casa de sua tia PHAMELA BRISA ALVES DALASTRA, falando para sua tia que seria uma bolsa contendo roupas; Que, diante das informações, a equipe deslocou na Rua 15 de Novembro, quadra 45, casa 02, Bairro Mario Raiter, onde foi perguntado a tia da conduzida, sobre a bolsa com roupas, que sua sobrinha LUANA GONÇALVES havia deixado em sua casa, a testemunha PHAMELA, e esta franqueou a entrada e apontou para equipe que a bolsa estava em cima do guarda-roupas, e ao abrir a bolsa foram encontrados uma quantia aproximadamente de 11,230kg de substancia similar a maconha e 65 gramas de substancia similar a pasta base;...”. (Fase Policial – Testemunha Igor Farias Santana – id. 259208675). Na fase judicial Igor Farias Santana, reprisou, em linhas gerais, as declarações prestadas na fase policial. Vejamos: “...Então, o serviço de inteligência através de uma prisão que tinha acontecido no dia anterior, o serviço de inteligência nós continuamos a monitorar o restante do bando delas aí, né? E nesse dia eles levantou que a suspeita Ana tinha chegado numa kitnete no Rota do Sol com uma mala numa Biz. Então passou para a minha equipe, a gente foi lá verificar essa informação. No momento que a minha equipe aproximou, tinha um rapaz cuidando à frente da Kitinet que a hora que viu a minha equipe saiu correndo para dentro. Então a gente fez o acompanhamento a pé, conseguiu (...) a gente olhou pela janela, encontramos, tinha três meninas já embalando e preparando, meio que separando, pesando a droga, né? (...) Sim. Foi a hora que a gente chegou (Ela tava contando, tava tudo junto lá, misturado lá). Tinha era acho que mais uma outra menina também, uma branquinha, menor de idade. Tava tudo lá separando a droga e pesando; (...) Uma delas era até menor de idade. E uma dessas três também era Ana Clara. (...) A gente perguntou para ela, tem mais droga? (...) a situação para você já tá perdida, sua casa caiu entre assim, foi um linguajar nosso, né? Aí eu falei assim: "Colabora com nós pra gente desenrolar logo essa ocorrência". Aí ela falou assim: "Não tem, tem mais droga, tá com uma outra pessoa". Ela disse que não ia deixar justamente num lugar só para não, se chegasse a perder, não perder esse ponto...”. (Fase Judicial – Testemunha Igor Farias Santana – relatório de mídias). No mesmo diapasão foram as declarações extrajudiciais, do PM Murilo Marques Neres, que atestou que estavam monitorando integrantes do “Comando Vermelho” e a prática do delito de tráfico de drogas pelo grupo, ocasião em que se deu a prisão das apelantes Ana Clara e Luana Moura e apreensão da grande quantidade de drogas com elas: “...QUE, após o fato ocorrido conforme o BPPM h. 2019.174166, a Agência Local de Inteligência continuou a monitorar o restante da quadrilha, pertencente a facção criminosa denominada "Comando Vermelho", que na data de hoje, levantou informações de que a suspeita ANA,18 anos, estaria com uma grande quantidade de entorpecentes; Que, as informações apontavam que a suspeita trouxe o entorpecente do estado de Goiás, para o município de Sorriso; Que, diante das informações, o serviço de inteligência começou a monitorar a residência que fica situada na Rua Xanxerê, 190, onde visualizou a suspeita ANA, chegar em uma motocicleta Honda Biz 125 de cor prata, placa KAF-4593, com uma mala de viagem e entrando na referida residência; Que, também foi possível visualizar o suspeito LUIZ FELIPE, 19 anos, que estava na frente da residência, "cuidando" se haveria alguma pessoa observando a casa; Que, após o serviço de inteligência monitorar a casa, a equipe de força tática moto patrulhamento foi acionada, onde visualizou o conduzido LUIZ FELIPE, na frente da residência, quando avistou a chegada da equipe policial, saiu correndo para o interior da residência; Que, essa equipe fez o acompanhamento a pé e logrou êxito na detenção do suspeito LUIZ FELIPE; Que, a equipe visualizou pela janela da residência, a conduzida ANA, RAÍSSA FONTINELLES, 15 anos, e NATALIA RODRIGUES, 17 anos, fazendo a separação, a pesagem e a embalagem dos entorpecentes que estava na referida mala de viagem, totalizando aproximadamente 18,780kg de substancia similar a maconha; Que, foi indagado a suspeita ANA, se já havia feito a distribuição de entorpecentes na cidade, a Ela relatou para a equipe policial, que tinha deixado uma quantidade de substancia similar a maconha na casa de sua mãe MARIA ALBERTINA, 36 anos, para esta realizar o comercio e que tinha distribuído também para a conduzida LUANA DE ABREU, 18 anos; Que, a equipe policial de posse de tais informações, deslocaram-se no Bairro Boa Esperança 2, na Rua da Amizade, número 117, na casa da conduzida MARIA ALBERTINA, mãe da conduzida ANA, onde foi feita a busca na residência, e no quarto da conduzida MARIA ALBERTINA, foi encontrado no guarda roupas pelo soldado PM Neres 540 gramas de substancias similar a maconha e a quantia de R$ 880,00 reais; Que, a suspeita ANA relatou a equipe que na residência da suspeita LUANA DE ABREU, haveria parte do entorpecente. que a equipe deslocou-se para a Rua São Miguel, número 124, no Bairro São Domingos, onde o SR LAUDEMIR SOARES, que franqueou a entrada e acompanhou as buscas na residência, onde foi localizado no guarda roupas da suspeita, pelo soldado PM Santana, em uma bolsa feminina de cor preta, porções consideráveis (aproximadamente 146 gramas) de substancia similar a maconha, onde foi dado voz de prisão para a suspeita; Que, em continuidade a suspeita ANA, apontou que a conduzida LUANA GONÇALVES, estaria em posse da parte restante do entorpecentes, que a equipe deslocou juntamente com a suspeita ANA, até a Rua Alencar Bortolanza, na quadra 11, casa 26, Bairro Nova Aliança, onde a conduzida LUANA GONÇALVES, foi localizada em frente à residência e essa ao ser indagada sob o entorpecente que estaria em sua posse, disse a equipe que havia deixado na casa de sua tia PHAMELA BRISA ALVES DALASTRA, falando para sua tia que seria uma bolsa contendo roupas; Que, diante das informações, a equipe deslocou na Rua 15 de Novembro, quadra 45, casa 02, Bairro Mario Raiter, onde foi perguntado a tia da conduzida, sobre a bolsa com roupas, que sua sobrinha LUANA GONÇALVES havia deixado em sua casa, a testemunha PHAMELA, e esta franqueou a entrada e apontou para equipe que a bolsa estava em cima do guarda-roupas, e ao abrir a bolsa foram encontrados uma quantia aproximadamente de 11,230kg de substancia similar a maconha e 65 gramas de substancia similar a pasta base;...”. (Fase Policial – Testemunha Murilo Marques Neres – id. 259208675). Por sua vez, a testemunha Rafael Fernandes, na fase judicial, atestou o encontro da droga na mala. Vejamos: “...É, a inteligência tinha levantado essa informação, né? E a gente trabalhou na primeira abordagem, né? Encontrando, tinha um rapaz na frente da residência. A hora que a gente chegou, ele fez o adentramento. Nesse dia tava na função de 03 igual tá hoje. E a gente conseguiu visualizar pela janela, tinha umas, tinha duas, três, três mulheres sexo feminino, né? Que tava pesando e separando o entorpecente nesse momento. (...) Tinha, não recordo redondo, mas tinha 20 e poucos quilos na mala. ...”. (Fase Judicial – Testemunha Raphael Fernandes – relatório de mídias). Portanto, nesse contexto, ao contrário do sustentado pela Defesa, verifica-se que a alegação de Luana Moura no sentido de que desconhecia o conteúdo da mala entregue por Ana Clara, não procede. Nota-se que os depoimentos das testemunhas são uníssonos e não apresentam contradições, tendo elas esclarecido que a corré Ana Clara já estava sendo investigada anteriormente, tanto que foi realizado monitoramento em frente à sua residência. Restou demonstrado que a Equipe de Inteligência da Polícia Militar recebeu informações de que Ana Clara teria chegado na cidade de Sorriso com muita droga e contava com o auxílio de duas mulheres que tinham o mesmo nome - Luana. Diante disso, após campana nas proximidades, os policiais realizaram a abordagem de Ana Clara e da menor R.F.S quando elas chegavam na casa da adolescente N.R.S, local onde foi encontrada uma bolsa com grande quantidade de maconha. Como mencionado, na ocasião, a acusada Ana Clara assumiu a propriedade da droga e apontou a apelante Luana Moura como a pessoa que estaria com outra parte do entorpecente. Posteriormente, ao questionar Luana Moura, ela afirmou que deixou a mala com a droga na residência de sua prima de nome Phamela, levando os agentes públicos ao local, ocasião em que foram apreendidos mais de 11(onze) quilos de maconha e 65(sessenta e cinco) gramas de pasta-base de cocaína. Assim sendo, os relatos firmes e harmônicos dos policiais militares e civis e demais provas colhidas, aliados às circunstâncias em que se deu a prisão em flagrante, as investigações preliminares e a própria confissão da corré Ana Clara, não deixam margem de dúvida que Luana Moura guardou vários tabletes de maconha destinados ao comércio, a pedido da corré. Vale lembrar, como sedimentado pela jurisprudência, que o depoimento prestado por policial, em regra, possui plena eficácia probatória, sendo plenamente cabível sua utilização na formação do convencimento do julgador, sobretudo quando colhido sob o crivo do contraditório e em consonância com o restante das evidências obtidas durante a persecução criminal e, neste sentido, é o Enunciado Orientativo nº 8 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste Sodalício: “Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal.” Ademais, é importante ressaltar, que ainda que Luana Moura no momento em que recebeu a mala de Ana Clara, não tivesse conhecimento do seu conteúdo ilícito, mas, mesmo após tomar ciência que se tratava de grande quantidade de droga (mais de 11kg), ao invés de procurar as autoridades competentes para as providências cabíveis, resolveu guardá-la em uma outra residência, com o objetivo de salvaguardá-la pelo menos em parte. No mais, é cediço que o crime de tráfico de entorpecente é de ação múltipla e conteúdo variado, e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas. A propósito, vejamos jurisprudência aplicável em casos tais: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DO CRIME DE TRÁFICO COMPROVADAS. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. (...) RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. 1. O tipo penal previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 é de ação múltipla ou de conteúdo variado, visto que apresenta diversas maneiras de violação da mesma proibição, bastando, para a consumação do crime, a prática de uma das ações descritas, dentre elas a de adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. (...) 6. Recursos conhecidos e desprovidos. Sentença mantida. (TJDF; APR 07312.10-92.2019.8.07.0001; Ac. 129.2964; Segunda Turma Criminal; Rel. Des. Robson Barbosa de Azevedo; Julg. 15/10/2020; Publ. PJe 26/10/2020). Neste sentido é o Enunciado 7 do incidente de uniformização de jurisprudência 10.1532/2015 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas, dispõe: “O delito de tráfico de drogas previsto no art. 33 da lei 11.343/2006, é classificado como de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas”. Conclusivamente, a conduta da apelante Luana Moura (guardar e ter em depósito), se amolda ao disposto no art. 33, da Lei 11.343/06, não havendo se falar em absolvição por insuficiência probatória ou ausência de dolo. 2. NO TOCANTE AO PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO, EM RELAÇÃO A AMBAS AS APELANTES. A controvérsia cinge-se à possibilidade de reconhecimento da insuficiência probatória quanto ao elemento subjetivo do tipo – o animus associativo estável e permanente –, imprescindível à configuração do mencionado delito. Após detida análise dos autos, acolho a tese defensiva para absolver as rés Ana Clara e Luana Gonçalves do referido crime, pelos fundamentos que passo a expor. Conquanto as provas colhidas sejam suficientes para demonstrar a prática do tráfico de drogas (art. 33 da Lei de Drogas), não se pode afirmar, com a mesma segurança, que as rés se associaram de forma estável, permanente e com vínculo duradouro, elemento típico essencial ao delito de associação para o tráfico. Conforme reiteradamente decidido pelos tribunais superiores, a caracterização da infração penal em questão exige mais do que um simples concurso eventual de vontades. É necessária a demonstração clara de um pacto associativo, estável no tempo e com dedicação conjunta e duradoura à prática do tráfico, o que não restou comprovado no caso concreto. O próprio conjunto probatório demonstra que a acusada Ana Clara, ao trazer a droga para a cidade de Sorriso, buscou locais distintos para esconder o entorpecente, valendo-se pontualmente da colaboração de outras pessoas. No caso da corré Luana Gonçalves, os autos indicam que ela aceitou guardar uma mala a pedido de Ana Clara, sem que haja qualquer evidência de que soubesse, desde o início, da natureza ilícita do conteúdo ou que tivesse mantido com a corré um vínculo criminoso estável e duradouro. Não houve interceptações telefônicas, registros anteriores de associação ou qualquer elemento que denote organização entre ambas para o cometimento reiterado do tráfico, limitando-se os autos a demonstrar um episódio único de colaboração esporádica, o que, por si só, não autoriza a condenação pelo tipo penal do art. 35 da Lei de Drogas. A jurisprudência é pacífica ao exigir a presença de elementos concretos e autônomos para a condenação por associação, como se extrai, por exemplo, do julgado do Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ART. 35 DA LEI N . 11.343/2006. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONCRETA ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA NA ORIGEM. ABSOLVIÇÃO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 1. Para a configuração do delito de associação para o tráfico "é imprescindível o dolo de se associar com estabilidade e permanência, uma vez que a reunião ocasional de duas ou mais pessoas não é suficiente para a configuração do tipo do art. 35 da Lei 11 .343/2006". (AgRg no HC n. 573.479/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 19/5/2020, DJe 27/5/2020.) (...) .4. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no HC: 734103 RJ 2022/0099998-4, Relator.: Ministro Jesuíno Rissato Desembargador Convocado do TJDFT, Data de Julgamento: 13/03/2023, T6 - Sexta Turma, Data de Publicação: DJe 16/03/2023). Dessa forma, diante da ausência de provas seguras, autônomas e indiscutíveis sobre a existência de uma associação estável e permanente entre as rés, impõe-se a aplicação do princípio do in dubio pro reo, razão pela qual acolho a tese defensiva de absolvição de Ana Clara Souza Fontinelles e Luana Gonçalves Moura pelo delito previsto no art. 35 da Lei n. 11.343/06, com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. 3. QUANTO AO PEDIDO DE READEQUAÇÃO DA PENA, AFASTANDO A VALORAÇÃO NEGATIVA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS EM RELAÇÃO AS DUAS APELANTES. Ressai dos autos, que o juízo singular, valorou negativas duas circunstâncias judiciais, em relação a ambas as acusadas. Considerou negativa, “as circunstâncias do crime”, em virtude da ação criminosa ter se realizado através do concurso eventual de agentes e a forma e a metodologia de acondicionamento da droga (formato de tijolos e porções), prontas para o comércio, demonstrando o grau de profissionalismo da agente. Também valorou negativa a “culpabilidade”, em virtude de terem transportado grande quantidade de drogas (31kg) de maconha e cocaína, e que detém intenso potencial lesivo/ofensivo, fixando a pena-base em 07 (sete) anos de reclusão. Após detida análise da sentença proferida, entendo que não merece reparos a valoração negativa das circunstâncias judiciais efetuada pelo Juízo a quo. O magistrado de origem fundamentou de forma suficiente e legítima o juízo de reprovação em relação a elementos concretos dos autos, em especial a gravidade concreta dos fatos, a forma de execução e a quantidade de entorpecente apreendido com ambas as rés. No caso da ré Ana Clara, restou demonstrado que: Transportou e armazenou grande quantidade de droga dentro do Estado de Mato Grosso, mais precisamente entre os municípios de Cuiabá e Sorriso; Realizou divisão e distribuição da droga entre comparsas; Agiu com elevado grau de organização e capacidade de articulação. Tais elementos justificam a valoração negativa das circunstâncias do crime reprovabilidade da conduta. Em relação às ‘circunstâncias do crime’, revela-se plausível a negativação operada, eis que considerado o modus operandi na prática delitiva. Acresça-se, ainda, que o delito foi praticado em concurso de agentes, situação que merece maior reprovabilidade, justificando a exasperação da reprimenda. A propósito vejamos jurisprudências aplicáveis em casos tais: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS E DE RECEPTAÇÃO. DOSIMETRIA. PENA-BASE. FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME DE TRÁFICO. CONCURSO DE AGENTES. ARGUMENTOS CONCRETOS. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. DECISÃO MANTIDA. INSURGÊNCIA DESPROVIDA. 1. A ponderação das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não é uma operação aritmética, mas sim um exercício de discricionariedade vinculada, devendo o magistrado eleger a sanção que melhor servirá para a prevenção e repressão do fato-crime praticado, exatamente como realizado na espécie. 2. Na hipótese, o acórdão recorrido, em observância ao princípio da individualização da pena, utilizou argumentos idôneos para considerar desfavorável a vetorial relativa às circunstâncias do crime de tráfico, decidindo em harmonia com a jurisprudência desta Corte Superior. 3. As circunstâncias do crime se referem ao modus operandi empregado na prática do delito, e, no caso dos autos, os aspectos ressaltados pelo colegiado, ou seja, "ainda que o concurso de agentes não tenha sido fator determinante para a prática delitiva, este possibilita maior probabilidade no exaurimento do crime, merecendo, assim, maior reprovação no caso concreto", representam elementos que ultrapassam ao inerente do tipo penal em tela e merecem reflexos mais gravosos na fixação da pena. 4. Não houve bis in idem na elevação da pena-base pela consideração do concurso de agentes no crime de tráfico de drogas, notadamente porque o réu não foi processado pelo crime de associação para o tráfico, caso em que o concurso de pessoas constitui elementar do delito de associação. 5. (...) 6. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no AgRg no HC: 513940 MS 2019/0161356-9, Relator.: Ministro Jorge Mussi, Data de Julgamento: 11/02/2020, T5 - Quinta Turma, Data de Publicação: DJe 26/02/2020). “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. (...) DOSIMETRIA. PRIMEIRA FASE. VALORAÇÃO NEGATIVA DA CULPABILIDADE. CONCURSO DE AGENTES. DESLOCAMENTO PARA AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. (...) . SENTENÇA MANTIDA. 1. Comprovada a participação de dois agentes, ou mais, na empreitada criminosa, correta a valoração negativa das circunstâncias do crime pelo concurso de pessoas. Precedentes do STJ e deste TJDFT. 2. (...) 3. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-DF 07043761320238070001 1927728, Relator.: Josapha Francisco dos Santos, Data de Julgamento: 26/09/2024, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: 10/10/2024). “DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. CULPABILIDADE NEGATIVA. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AFASTAMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. ELEMENTOS CONCRETOS. REGIME MAIS GRAVOSO. CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. AGRAVO CONHECIDO E RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME1. Agravo interposto contra decisão que inadmitiu recurso especial, no qual o recorrente alega violação aos arts . 33, § 2º, b, e art. 59, ambos do Código Penal, bem como ao art. 33, § 4º, e ao art. 42, ambos da Lei nº 11 .343/2006. A controvérsia gira em torno da dosimetria da pena e do regime inicial de cumprimento, além da negativa de reconhecimento do tráfico privilegiado. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (I) se a exasperação da pena-base pela quantidade de droga apreendida observou os critérios de proporcionalidade e fundamentação; (ii) se a negativa de aplicação do tráfico privilegiado foi correta diante das circunstâncias fáticas e do envolvimento do réu com atividades criminosas; e (III) se o regime inicial fechado é adequado às circunstâncias do caso concreto. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A exasperação da pena-base em razão da quantidade de droga apreendida (1,794 Kg de maconha) é idônea e proporcional, conforme o art . 42 da Lei nº 11.343/2006 e entendimento consolidado nesta Corte, que considera a quantidade e a natureza da droga como elementos suficientes para justificar o aumento (AgRg no HC n. 941.965/MG). 4. (...) (...) AGRAVO CONHECIDO E RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (STJ - AREsp: 2587239 TO 2024/0081383-8, Relator.: Ministra Daniela Teixeira, Data de Julgamento: 26/11/2024, T5 - Quinta Turma, Data de Publicação: DJe 06/12/2024). No tocante à ré Luana Gonçalves Moura, também não procede a tese de readequação da pena-base. Ainda que a defesa insista na tese de ausência de dolo, é certo que: Luana recebeu e manteve sob sua guarda mais de 11 kg de maconha e 65g de pasta base de cocaína; Mesmo após saber do conteúdo ilícito, decidiu ocultá-lo na residência de sua prima, dificultando a ação estatal e demonstrando desprezo pelas normas legais; Sua atuação não se deu de forma meramente passiva, mas com consciente adesão à prática delitiva, conforme extrai-se de seu próprio interrogatório e dos depoimentos dos policiais envolvidos. Assim, também neste caso, a valoração negativa das circunstâncias judiciais atende aos requisitos legais e jurisprudenciais, não havendo que se falar em readequação da pena-base. 4. NO TOCANTE AO PLEITO DE RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO DA RÉ ANA CLARA Em relação a esta questão, assiste razão à Defesa, quanto ao crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei 11.343/06). Conforme reconhecido na própria sentença e reiterado nos autos, Ana Clara confessou o transporte da droga de Cuiabá para Sorriso; indicou onde parte do entorpecente havia sido armazenado; apontou comparsas e locais onde o restante da substância estava ocultado, cooperando com a atuação policial. Trata-se de confissão espontânea e eficaz, ainda que parcial, razão pela qual deve ser reconhecida como atenuante genérica nos termos do art. 65, inciso III, alínea “d”, do Código Penal. Conclusivamente, afasto a tese de readequação da pena-base, mantendo-se a valoração negativa das circunstâncias judiciais em relação a ambas as apelantes, e, por outro lado, reconheço da atenuante da confissão espontânea da ré Ana Clara, com os devidos reflexos na segunda fase da dosimetria da pena. 5. QUANTO AO PEDIDO DE EXCLUSÃO DA CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 40, VI, DA LEI DE DROGAS E O RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO (AMBAS). No tocante a esta questão, observo que a prova constante nos autos evidencia a participação de adolescentes apenas em relação à conduta da ré Ana Clara, não havendo elementos concretos que demonstrem o envolvimento de menores na conduta atribuída à corré Luana Gonçalves Moura. Nesse sentido, a instrução processual demonstrou que Ana Clara foi surpreendida com menor de idade, realizando o fracionamento e pesagem de drogas (Raissa Fontinelles, 15 anos e Natália Rodrigues, 17 anos), conforme relatado por Igor Farias Santana e Murilo Marques Neres e tanto em sede policial, como judicial. Vejamos jurisprudências, neste sentido: “PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. (...) AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A individualização da pena é uma atividade vinculada a parâmetros abstratamente cominados na lei, sendo, contudo, permitido ao julgador atuar discricionariamente na escolha da sanção penal aplicável ao caso concreto, após o exame percuciente dos elementos do delito, e em decisão motivada. 2. (...) 4. Devidamente fundamentada a participação de adolescentes no tráfico de drogas, não merece prosperar a pretensão de exclusão da causa de aumento prevista no art. 40, VI, da Lei de Drogas, pois o afastamento dessa conclusão demandaria o revolvimento fático-probatório, providência inviável em sede de recurso especial, conforme dispõe a Súmula 7/STJ. (...) 6. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no AREsp: 2433493 SP 2023/0287395-3, Relator.: Ministro Ribeiro Dantas, Data de Julgamento: 06/02/2024, T5 - s, Data de Publicação: DJe 15/02/2024). “DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. (...) CAUSA DE AUMENTO DO ART. 40, VI, DA LEI DE DROGAS APLICÁVEL. ORDEM DENEGADA. (...) 6. A causa de aumento prevista no art. 40, VI, da Lei 11.343/2006, referente à participação de menor, aplica-se ao caso, uma vez que o crime foi praticado na presença de um adolescente, sendo irrelevante a sua efetiva participação no delito. (...) ORDEM DENEGADA. (STJ - HC: 910549 RJ 2024/0156724-0, Relator.: Ministra Daniela Teixeira, Data de Julgamento: 22/10/2024, T5 - Quinta Turma, Data de Publicação: DJe 29/10/2024) Já em relação a Luana Gonçalves, não há prova suficiente de que tenha se valido de adolescentes na execução do crime, razão pela qual entendo pela exclusão da majorante do art. 40, VI da Lei 11.343/06 em relação a ela, mantendo a sua incidência somente em face da ré Ana Clara Souza Fontinelles, nos termos do entendimento esposado no parecer ministerial, conforme jurisprudência a seguir transcrita: “APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS (...) – 6) DECOTE DA CAUSA DE AUMENTO REFERENTE À PARTICIPAÇÃO DE MENOR NO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS – VIABILIDADE – AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO AO AUXÍLIO DA ADOLESCENTE NA MERCANCIA – CAUSA DE AUMENTO NÃO CONFIGURADA – (...) – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1) (...) 6) Não se aplica a causa de aumento do envolvimento de adolescente no comércio ilícito de droga (art. 40, VI, da Lei 11.343/06), quando o conjunto fático probatório não evidência de forma concreta a sua incidência. (...) (N.U 0007014-70.2019.8.11.0007, Câmaras Isoladas Criminais, Juvenal Pereira Da Silva, Vice-Presidência, Julgado em 12/05/2021, Publicado no DJE 19/05/2021). NO TOCANTE AO RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO (ART. 33, §4º, DA LEI Nº 11.343/06). Quanto à apelante Luana Gonçalves, verifico que ela preenche os requisitos legais para a sua concessão: é primária, não possui antecedentes criminais, não integra organização criminosa, e embora tenha tido ciência posterior da presença da droga, não se evidenciou dedicação habitual ao tráfico, tampouco envolvimento reiterado com a criminalidade. Dessa forma, reconheço a incidência da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º da Lei 11.343/06 em favor de Luana Gonçalves Moura, devendo a fração de redução ser fixada em 1/6, em razão da relevante quantidade de drogas apreendida (mais de 11 kg de maconha e 65g de pasta base de cocaína). Em relação à ré Ana Clara Souza Fontinelles, não há como aplicar o benefício, pois as provas colhidas evidenciam dedicação à atividade criminosa, inclusive com ligação à facção criminosa e atuação conjunta com adolescentes, conforme relatado por diversos policiais, o que inviabiliza a aplicação do tráfico privilegiado. Aliás, este é o entendimento de nosso Tribunal: “DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO POR TRÁFICO DE DROGAS E POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. (...) CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO AFASTADA PELO ENVOLVIMENTO HABITUAL EM ATIVIDADES CRIMINOSAS E LIGAÇÃO COM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA NA ÍNTEGRA. RECURSO DESPROVIDO. (...) 5. A pena-base do narcotráfico foi corretamente majorada em razão da quantidade e diversidade de drogas, com fundamento no art. 42 da Lei n. 11.343/2006, a demonstrar a gravidade concreta da conduta. 6. A causa de diminuição do “tráfico privilegiado” (art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/2006) é afastada pela demonstração de envolvimento habitual do réu com atividades criminosas e sua ligação com organização criminosa. IV. Dispositivos e teses 7. Apelação criminal desprovida. Teses de julgamento: “1. (...) 3. A subida quantidade e a variedade de drogas apreendidas justificam a exasperação da pena-base do narcotráfico, conforme previsão contida no art. 42 da Lei n. 11.343/2006. 4. Não se aplica a figura do tráfico privilegiado quando o réu apresenta envolvimento habitual em atividades criminosas e ligação com organização criminosa.” (...) (N.U 1001081-88.2023.8.11.0030, Câmaras Isoladas Criminais, Gilberto Giraldelli, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 19/12/2024, Publicado no DJE 19/12/2024). Feitas essas considerações passo à dosimetria da pena com as alterações já mencionadas. DOSIMETRIA DA PENA Ré ANA CLARA SOUZA FONTINELLES Delito de Tráfico de entorpecentes 1 - Primeira fase: Circunstâncias judiciais (artigo 59 do Código Penal), conforme já mencionado mantenho a pena-base fixada, um pouco acima de seu mínimo legal, ou seja, em 07 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias/multa, à base de 1/30 do salário mínimo (à época dos fatos corrigidos até a data do pagamento). 2 - Segunda fase - Circunstâncias legais (artigos 61, 62, 65 e 67 do Código Penal): presentes as circunstâncias atenuantes da menoridade relativa e da confissão espontânea, procedo a redução em 1/6, em seja, 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão e 116 (cento e dezesseis) dias/multa, resultando a pena nesta fase, em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 584 (quinhentos e oitenta e quatro) dias/multa. 3 - Terceira fase: Circunstâncias Especiais de Aumento e/ou Diminuição da Pena (art. 68, parágrafo único do Código Penal): Existe a causa especial de aumento prevista no art. 40, VI, da Lei 11.343/06, motivo pelo qual aumento a pena até aqui apurada, em 1/6, ou seja, 11 (onze) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 97 (noventa e sete) dias/multa, resultando a pena nesta fase, em 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 681 (seiscentos e oitenta e um) dias/multa. 4 - Expostos os fundamentos da dosimetria, fixo a pena final, para este delito, em 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e de 681 (seiscentos e oitenta e um dia) dias-multa, à base de 1/30 do salário mínimo (à época dos fatos corrigidos até a data do pagamento) o dia-multa, pena esta, que imponho à ré Ana Clara Souza Fontinelles, como medida de justa e suficiente retribuição, pelo crime por ela praticado. RÉ LUANA GONÇALVES MOURA Delito: Tráfico de entorpecentes 1 - Primeira fase: Circunstâncias judiciais (artigo 59 do Código Penal), conforme já mencionado mantenho a pena-base fixada, um pouco acima de seu mínimo legal, ou seja, em 07 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias/multa, à base de 1/30 do salário mínimo (à época dos fatos corrigidos até a data do pagamento). 2 - Segunda fase - Circunstâncias legais (artigos 61, 62, 65 e 67 do Código Penal): não existem. 3 - Terceira fase: Circunstâncias Especiais de Aumento e/ou Diminuição da Pena (art. 68, parágrafo único do Código Penal): Existe a causa especial de diminuição prevista no art. 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/06, motivo pelo qual diminuo a pena até aqui apurada, em 1/6, ou seja, 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão e 116 (cento e dezesseis) dias/multa, resultando a pena nesta fase, em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 584 (quinhentos e oitenta e quatro) dias/multa. 4 - Expostos os fundamentos da dosimetria, fixo a pena final, para este delito, em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 584 (quinhentos e oitenta e quatro) dias/multa, à base de 1/30 do salário mínimo (à época dos fatos corrigidos até a data do pagamento) o dia-multa, pena esta, que imponho à ré LUANA GONÇALVES MOURA, como medida de justa e suficiente retribuição, pelo crime por ela praticado. 5 – Em que pese a pena corpórea aplicada às apelantes Ana Clara e Luana Gonçalves seja inferior a 08 (oito) anos de reclusão é possível a fixação de regime mais gravoso para o cumprimento de pena, devido à quantidade e natureza do entorpecente apreendido, conforme preceitua o Enunciado Orientativo nº. 47 do TJMT, motivo pelo qual, fixo o regime fechado para início do cumprimento da pena. Referente ao pedido de recorrer em liberdade, verifica-se que por ocasião da prolação da sentença, o juízo a quo analisou o pedido de possibilidade das apelantes recorrerem em liberdade, contudo, negou-lhes tal direito, com fundamento na necessidade de prisão para fins de garantia da ordem pública, principalmente, para evitar a reiteração criminosa, bem como, porque responderam ao processo em reclusão e persistirem as razões da preventiva. Analisando os autos, verifica-se que além de serem condenadas em regime inicialmente fechado, permaneceram presas durante a instrução processual, inexistindo alteração das circunstâncias que ensejaram a decretação da prisão preventiva. Portanto, subsistindo os fundamentos que determinaram a prisão preventiva e tratando-se de agentes condenadas a cumprir pena no regime inicial fechado, as quais permaneceram custodiadas durante toda instrução criminal, descabido que recorram da sentença em liberdade. Aliás, acerca do tema, assim tem decidido o nosso Tribunal de Justiça: “RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – SENTENÇA CONDENATÓRIA – INCONFORMISMO DA DEFESA – PRELIMINAR: DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – IMPOSSIBILIDADE – FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA SOBRE A MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA – GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA – PENA IMPOSTA E REGIME FECHADO – (...) CONDENAÇÃO MANTIDA – APELO DESPROVIDO. (...) Se o paciente respondeu toda a ação penal preso preventivamente, havendo condenação em regime inicial fechado, “não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer solto (...) se persistentes os motivos para a manutenção da medida extrema” (STJ, HC nº 442.163/MA). (...) (N.U 1004788-52.2022.8.11.0013, Câmaras Isoladas Criminais, Marcos Regenold Fernandes, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 14/05/2024, Publicado no DJE 20/05/2024). A propósito, é esse o posicionamento adotado pela jurisprudência consolidada nessa eg. Corte de Justiça, materializada no Enunciado Orientativo n.º 50, da TCCR/TJMT, veja-se: “A motivação per relationem (aliunde) constitui fundamentação idônea para negar ao réu, preso durante toda a instrução processual, o direito de recorrer em liberdade.”. 6. NO TOCANTE AO PEDIDO DE ISENÇÃO DE CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS. Quanto a esta questão, é certo que eventual isenção deverá ser aferida pelo juízo da execução penal, conforme art. 804 do Código de Processo Penal, portanto, eventual concessão de isenção deve ser analisada pelo juízo da execução penal. Vejamos jurisprudência aplicável ao caso: “RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – (...) – 4. PEDIDO DE ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE CUSTAS E DESPESAS JUDICIAIS – DESCABIMENTO – CONSEQUÊNCIA LÓGICA DA CONDENAÇÃO – CIRCUNSTÂNCIA A SER AVALIADA PELO JUÍZO DAS EXECUÇÕES PENAIS – 5. (...) Processo Penal, não há como conceder ao sentenciado o benefício da assistência judiciária gratuita, com vistas à isenção de pagamento de custas processuais, porque essa benesse somente poderá ser concedida na fase de execução e pelo juízo competente, uma vez que este é o momento adequado para aferir a sua real situação financeira. 6. Recurso da defesa parcialmente provido e do Ministério Público desprovido. De ofício, reconhecida a prescrição dos crimes de estelionato tentado. (TJMT, N.U 0002206-96.2017.8.11.0005, Câmaras Isoladas Criminais, Luiz Ferreira da Silva, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 31/05/2023, Publicado no DJE 03/06/2023). Diante do exposto, em consonância com o parecer do Procurador-Geral de Justiça, DOU PARCIAL PROVIMENTO aos recursos, para excluir a causa de aumento do art. 40, VI, da Lei 11.343/06 em relação à ré Luana Gonçalves Moura, mantendo-a quanto à ré Ana Clara Souza Fontinelles, aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas exclusivamente à apelante Luana Gonçalves Moura, com redução da pena em 1/6. Resultando a pena da apelante ANA CLARA SOUZA FONTINELLES, em 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e de 681 (seiscentos e oitenta e um dia) dias-multa e LUANA GONÇALVES MOURA, em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 584 (quinhentos e oitenta e quatro) dias/multa, à base de 1/30 do salário mínimo (à época dos fatos corrigidos até a data do pagamento), a ser cumprida em regime fechado. É como voto. V O T O S V O G A I S VOTO REVISOR Como bem pontuou o eminente Relator, as apelantes pleiteiam a aplicação do “tráfico privilegiado”. O d. Relator acolheu a pretensão defensiva em relação a recorrente Luana Gonçalves Moura sob a seguinte fundamentação: “Quanto à apelante Luana Gonçalves, verifico que ela preenche os requisitos legais para a sua concessão: é primária, não possui antecedentes criminais, não integra organização criminosa, e embora tenha tido ciência posterior da presença da droga, não se evidenciou dedicação habitual ao tráfico, tampouco envolvimento reiterado com a criminalidade. Dessa forma, reconheço a incidência da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4º da Lei 11.343/06 em favor de Luana Gonçalves Moura, devendo a fração de redução ser fixada em 1/6, em razão da relevante quantidade de drogas apreendida (mais de 11 kg de maconha e 65g de pasta base de cocaína)”. Com a devida vênia, divirjo. Entendo que o acervo probatório respalda a manutenção do afastamento da causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4, da Lei n. 11.343/2006, pelos motivos que passo a expor. Conforme entendimento jurisprudencial, a expressiva quantidade de drogas apreendidas é incompatível com a minorante, como ilustra o seguinte precedente: “APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS PRIVILEGIADO - SENTENÇA CONDENATÓRIA – RECURSO MINISTERIAL - PEDIDO DE AFASTAMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO E AUMENTO DAS PENAS – ALTO VALOR COMERCIAL DA MACONHA - ENVOLVIMENTO COM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – TRAFICÂNCIA EVENTUAL NÃO REVELADA - INDUÇÃO LÓGICA DE INTERPRETAÇÃO DO FATO – ELEMENTOS CONCRETOS - CAUSA DE DIMINUIÇÃO AFASTADA – EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE – QUANTIDADE EXPRESSIVA [250KG DE MACONHA] - ELEVAÇÃO EM 2/3 – SITUAÇÃO SIMILAR DO STJ – PENA IMPOSTA E MAIORIA DAS CIRCUNSTÂNCIAS FAVORÁVEIS – SEMIABERTO MANTIDO - RECURSO MINISTERIAL PROVIDO PARCIALMENTE PARA AFASTAR O TRÁFICO PRIVILEGIADO E READEQUAR AS PENAS. A pessoa que 'guarda' expressiva quantidade de entorpecentes não pode ser equiparado aos agentes denominados 'mula', notadamente porque o animal [mula] não armazena entorpecentes, mas efetua transporte [de até 20% do seu peso corporal], também porque '[...] uma carga tão valiosa não seria confiada a quem não mantem estreito vínculo de colaboração e confiança com os efetivos proprietários da droga' (STJ, RHC 124406/RS) (...)” (TJMT, Apelação n. 1000996-29.2023.8.11.0022, Primeira Câmara Criminal, Rel. Des. Marcos Machado; data de julgamento: 17 de junho de 2024; data de publicação: 17 de junho de 2024). No caso, apreenderam-se cerca de 30kg (trinta quilogramas) de maconha, sendo 18,780kg (dezoito quilogramas e setecentos e oitenta gramas) com Ana Clara e 11,230kg (onze quilogramas e duzentos e trinta gramas) com Luana Gonçalves Moura, além de 65g (sessenta e cinco gramas) de pasta-base de cocaína – montante incompatível com a figura do pequeno traficante (“mula”). A minorante do artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/06 somente incide “quando estiver demonstrado nos autos que o réu é pequeno traficante, eventual ou de menor potencial” (STF, RHC 226.426/SP). Não é o caso: a expressiva quantidade de droga apreendida afasta o benefício, diante da relação de confiança entre as apelantes Ana e Luana. E digo isso, porque à figura do “pequeno traficante” não é confiada a guarda de 11 Kg (onze quilogramas) de maconha, droga de alto valor financeiro no “mercado negro”. Logo, a par desse raciocínio, não me convence o fato de apelante não se dedicar ao tráfico de drogas. Além disso, a recorrente Luana Gonçalves transferiu o entorpecente para a casa da prima a fim de dificultar a ação policial, conduta que revela profissionalismo e vínculo estável com a traficância, incompatíveis com o perfil do “traficante ocasional”. Reconheço, pois, a impossibilidade de aplicar a causa de diminuição de pena pleiteada pela apelante Luana Gonçalves. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025
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