Processo nº 0004603-50.2012.4.01.4101
ID: 310602588
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0004603-50.2012.4.01.4101
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Passivo:
Advogados:
PAULA JAQUELINE DE ASSIS MIRANDA
OAB/RO XXXXXX
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FABIO PEREIRA MESQUITA MUNIZ
OAB/RO XXXXXX
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AIRTON PEREIRA DE ARAUJO
OAB/RO XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004603-50.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004603-50.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: VALTER LUIZ ROSSO…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0004603-50.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004603-50.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) POLO ATIVO: VALTER LUIZ ROSSONI e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: AIRTON PEREIRA DE ARAUJO - RO243-A, FABIO PEREIRA MESQUITA MUNIZ - RO5904-A e PAULA JAQUELINE DE ASSIS MIRANDA - RO4245-A POLO PASSIVO:Ministério Público Federal (Procuradoria) RELATOR(A):CESAR CINTRA JATAHY FONSECA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004603-50.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004603-50.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Cuida-se de apelações criminais interpostas pelos acusados (1) Valter Luiz Rossoni, (2) Raymundo Mesquita Muniz e (3) Alexandre de Morais Guimarães, em face de sentença (ID 274127021), proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Ji-Paraná/RO, que julgou procedente a pretensão punitiva articulada na denúncia para condenar os apelantes nas penas do art. 1º, I, do DL 201/67 (apropriação ou desvio de rendas públicas em proveito próprio ou alheio). As penas dos sentenciados assim foram fixadas: - Raymundo Mesquita Muniz e Valter Luiz Rossoni: 05 (cinco) anos e 09 (nove) meses de reclusão e - Alexandre de Morais Guimarães: 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Foi fixado o regime semiaberto para o cumprimento inicial das penas dos acusados, nos termos do art. 33, § 2º, “b”, do CP. Foram aplicadas aos acusados, como efeito automático da condenação, as penas de inabilitação pelo prazo de 05 (cinco) anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, na forma do art. 1º, § 2º, do DL 201/67. Os réus foram condenados, ainda, ao pagamento das custas processuais. Por fim, foi concedido aos acusados o direito de recorrer da sentença em liberdade. 1) O acusado Valter Luiz Rossoni apela para alegar que não haveria nos autos provas de que ele seria proprietário ou participante do quadro societário das duas empresas vencedoras dos procedimentos licitatórios, tendo atuado como procurador para ambas, em razão de possuir muita experiência na realização de obras da natureza das licitadas. Aduz que as obras foram completamente realizadas, de acordo com o que fora contratado, em todas as suas especificações, conforme se verifica do depoimento, em Juízo, das testemunhas Raimundo Nonato Araújo Rodrigues e José Torres Dias. Da mesma forma, as testemunhas Oséias Carlos Vieira e Varley Gonçalves Ferreira comprovam a presença constante de engenheiros da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) durante a realização das obras, bem como suas concordâncias com as medições feitas com vistas ao pagamento dos serviços. Admite que apenas duas etapas das obras foram concluídas, não tendo sido executada a terceira etapa, em razão da falta de repasse dos valores pelo Governo Federal. Por esse motivo, o novo gestor do Município deixou de colocar o sistema em funcionamento, o qual se deteriorou (tubulação, equipamentos e prédios), pelo abandono e ação de vândalos. Relata que as medições se deram em 18/07/2002, 29/08/2002, 17/12/2002 e 10/02/2003, enquanto o Relatório de fls. 04/60 foi em firmado em 11/09/2007 e o Laudo de fls. 131/135, somente em 04/09/2008, mais de 04 (quatro) anos após o abandono das obras concluídas, sendo os administradores municipais que se sucederam os verdadeiros responsáveis pela deterioração, depredações e furtos ocorridos. Conclui pela ausência de provas de que as obras não foram concluídas de acordo com os projetos anexados aos contratos. Requer absolvição, com suporte no art. 386, VI, do CPP. Alternativamente, alega que a pena foi fixada de forma exacerbada. Assim, considerando sua condição de réu primário, bem como não existirem nos autos elementos que embasem a exacerbação da reprimenda, pugna por sua fixação no mínimo legal (IDs 274127023 e 274127027). 2) O acusado Alexandre de Morais Guimarães apela para alegar que as provas contidas nos autos são insuficientes para sustentar um decreto condenatório, pois seriam frágeis e intempestivas, por terem sido coletadas muito depois das paralisações das obras. Desse modo, para o apelante, não foram comprovadas a materialidade e a autoria delitivas. Ainda que as provas fossem verídicas, o apelante não era ordenador de despesas ou proprietário de empresa supostamente favorecida e, portanto, suas ações carecem de efeito danoso, o que configura crime impossível. Assevera jamais ter praticado qualquer tipo de desvio ou apropriação de bens, serviços ou recursos públicos, bem como ter ficado comprovado que as obras por ele fiscalizadas foram concluídas completamente, em todas as suas especificações, conforme se verifica do depoimento das testemunhas Raimundo Nonato Araújo Rodrigues, José Torres Dias, Oséias Carlos Vieira e Varley Gonçalves Ferreira. Segundo o apelante, duas etapas da obra foram concluídas (disponibilidade da rede de coleta e tratamento de esgoto doméstico), não tendo sido realizadas pela administração seguinte as demais, que seriam necessárias para efetivar as já existentes, resultando na perda de todo o trabalho, não podendo o acusado ser responsabilizado por isso. Requer a incidência do princípio in dubio pro reo. De todo modo, não assinou a medição para o pagamento de conclusão das obras referentes ao Convênio 1587/2001, tampouco o recebimento provisório ou definitivo. Pugna pela incidência do art. 15 do CP (desistência voluntária ou eficaz). Requer absolvição por crime impossível ou com suporte no art. 386, I (“estar provada a inexistência do fato”), II (“não haver prova da existência do fato’), III (atipicidade da conduta), V (“não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal “ e VII (insuficiência de provas), do CPP. Alternativamente, pugna pela desclassificação do crime previsto no inciso I para o tipo penal no inciso III, ambos do DL 201/67, considerando que, durante toda a instrução penal, não ficou comprovada a apropriação ou desvio de verbas públicas e, desse modo, no máximo, teria havido uso indevido de verbas públicas. Mantida a condenação, requer a diminuição da pena-base para 04 (quatro) anos, tendo em vista que o apelante não participou da medição final do Convênio 1587/2001, é primário, tem bons antecedentes, residência fixa e personalidade não voltada para o crime. Finalmente, pugna pelo benefício da assistência judiciária gratuita (ID 274127029). 3) O acusado Raymundo Mesquita Muniz apela para alegar que, nos termos dos arts. 5º, LVII, da CF e 156 do CPP, o ônus da prova cabe à acusação, sendo vedada, sob qualquer pretexto, sua inversão, bem com, em caso de dúvida, aplica-se o princípio in dubio pro reo. Na hipótese, aduz que a acusação não logrou provar as acusações, tendo em vista que a realidade dos fatos é oposta à narrada na denúncia e corroborada pela sentença, ante a ausência de dolo ou culpa na conduta do apelante, o qual, antes de ser prefeito, era professor, não engenheiro civil e, portanto, sem conhecimento acerca de planejamento e execução de obra. De todo modo, a fiscalização e o acompanhamento da execução das obras foram feitos por engenheiros da Funasa e da prefeitura, bem como por membros da comissão criada pelo Decreto 077/2001, composta por servidores de carreira e um vereador indicado pelo legislativo municipal. Assevera que eventuais glosas efetuadas pela Funasa, cujos engenheiros faziam visitas mensais aos trabalhos, ficavam a cargo do corréu Alexandre de Morais Guimarães, membro da supracitada comissão, conforme cláusulas contratuais. Os pagamentos, por sua vez, só ocorriam mediante relatório emitido pela comissão de acompanhamento e fiscalização, cujo responsável era um engenheiro civil, no sentido de que os serviços estavam de acordo com o projeto executivo e planilha orçamentária. Além disso, as obras foram executadas em sua totalidade. Contudo, não tiveram continuidade por parte da administração posterior. Alega já ter sido julgado na esfera cível quanto aos mesmos fatos tratados na presente ação penal na Ação de Ressarcimento ao Erário do Município nº 1001194-74.2006.8.22.0016, cuja decisão da 2ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça de Roraima se deu no sentido do reconhecimento da ausência de liame moral ou jurídico, para imputar ao apelante a responsabilidade pelo ressarcimento de eventuais prejuízos por danos materiais decorrentes da não execução do projeto. Aduz que, da leitura do relatório da auditoria citada na denúncia, não se verifica sequer menção a qualquer tipo de desvio ou apropriação de bens ou serviços públicos em benefício do apelante ou de terceiros. Tampouco há testemunhas ou corréus que comprovem ter o recorrente praticado o delito a ele atribuído. Requer absolvição com suporte no art. 386, VII, do CPP (insuficiência de provas). Mantida a condenação, alega que, no tocante à dosimetria da pena, as circunstâncias do art. 59 do CP foram julgadas desfavoráveis ao apelante com fundamentos ínsitos ao tipo penal. Não fora isso, o acusado é primário, tem boa conduta social e personalidade que não destoa da normalidade. Requer seja fixada a reprimenda no mínimo legal, qual seja, 02 (dois) anos de reclusão (IDs 274127025 e 274127032). Contrarrazões do MPF pela manutenção da sentença condenatória (ID 274127034). O MPF, nesta instância, opinou pelo desprovimento das apelações (ID 274127036). É o relatório. Sigam os autos ao exame do Revisor, que pedirá a designação de dia para o julgamento (art. 613, I, CPP). Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004603-50.2012.4.01.4101 PROCESSO REFERÊNCIA: 0004603-50.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY (RELATOR): Por vislumbrar presentes os requisitos de admissibilidade, conheço das apelações interpostas. Os apelantes foram denunciados pela prática, em tese, do delito tipificado no art. 1º, I, do DL 201/67, no contexto da denominada “Operação Pelo Cano”, que buscava investigar o desvio de recursos públicos na execução de obras de implantação do sistema de esgoto e tratamento sanitário, praticados pelo ex-gestor do Município de Costa Marques/RO, servidores públicos e empresas. De acordo com a inicial acusatória, entre outubro/2001 e agosto/2004, Raymundo Mesquita Muniz, Valter Luiz Rossoni e Alexandre de Morais Guimarães concorreram para o desvio da importância de R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta reais e sessenta e um centavos), repassados ao Município de Costa Marques/RO pela Fundação Nacional de Saúde – Funasa, por meio dos Convênios nºs1779/2000 e 1587/2001, com vistas à construção e ampliação do sistema de esgotamento sanitário do referido Município. Pelo Convênio nº 1779/2000, a Funasa repassou R$ 498.788,30 (quatrocentos e noventa e oito mil, setecentos e oitenta e oito reais e trinta centavos) para a construção do sistema de esgotos do Município. Já pelo Convênio nº 1587/2001, foram repassados R$ 301.000,00 (trezentos e um mil reais) para a ampliação do sistema de esgotos do Município. Para a execução dos supracitados convênios, foram contratadas, por meio de procedimento licitatório, respectivamente, as empresas “V.J. Construções e Comércio Ltda.” e “Celta Terraplanagem Ltda.”, nas quais figurava como procurador dos sócios o acusado Valter Luiz Rossoni, o qual, na verdade, era o titular de fato das referidas sociedades, registradas em nome de terceiros. Com o início das obras, o acusado Alexandre de Morais Guimarães, à época engenheiro do Município de Costa Marques/RO, era o responsável por atestar os serviços executados para viabilizar o pagamento. Todavia, a despeito de grande parte do serviço não ter sido executado, Alexandre de Morais Guimarães atestou a execução da obra e o acusado Raymundo Mesquita Muniz, na condição de Prefeito, autorizou o pagamento do valor dos convênios pelos supostos serviços prestados pelas empresas representadas por Valter Luiz Rossoni. Desse modo, em relação ao contrato firmado com a “VJ Construções e Comércio Ltda.” (Convênio nº 1779/2000), foram pagos por serviços não realizados R$ 266.281,89 (duzentos e sessenta e seis reais, duzentos e oitenta e um reais e oitenta e nove centavos). Quanto ao contrato firmado com a “Celta Construções e Terraplanagem” (Convênio nº 1587/2001), foram pagos por serviços não realizados R$ 126.904,10 (cento e vinte e seis mil, novecentos e quatro reais e dez centavos) (ID 274118551). A denúncia foi recebida em 10/07/2012 (ID 274127016). A sentença foi proferida em 27/11/2018 (ID 274127021 - pg. 34). Os apelantes foram condenados nas penas do art. 1º, I, do DL 201/67: Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: I - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio; (...) §1º Os crimes definidos neste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos (...). Da preliminar de bis in idem O acusado Raymundo Mesquita Muniz alega que respondeu à Ação de Ressarcimento ao Erário do Município nº 1001194-74.2006.8.22.0016, que versa sobre os mesmos fatos tratados na presente Ação Penal. Aduz que o pedido formulado na referida ação de ressarcimento foi julgado improcedente pela 2ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça de Roraima, sob o fundamento de que o acusado não contribuiu para o dano ao erário. Contudo, vigora no ordenamento jurídico brasileiro o sistema de independência das esferas cível e criminal, nos termos do art. 935 do CCB: Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal. Dessa forma não repercute na presente Ação Penal o julgamento improcedente da aventada Ação de Ressarcimento ao Erário. Não fora isso, de acordo com petição de ID 273904517 - pg. 104, a supracitada ação de ressarcimento se refere apenas ao Convênio nº 1587/2001. Afasto, portanto, a preliminar. Do mérito Da materialidade Os sentenciados foram condenados em razão do recebimento integral dos valores referentes aos Convênios nºs 1779/2000 e 1587/2001 firmados pelo Município de Costa Marques/RO com a Funasa, embora as obras por eles previstas não tivessem sido executadas na sua integralidade. O acusado Alexandre de Morais Guimarães alega não ter sido demonstrada a materialidade do delito, bem como que as provas contidas nos autos são frágeis e intempestivas, por terem sido coletadas muito depois da paralisação das obras. A materialidade do delito, todavia, está devidamente comprovada pelos seguintes documentos: - Notificação Técnica da Divisão/Serviço de Engenharia de Saúde Pública da Funasa, de 28/10/2003, solicitando a adoção de providências no sentido de solucionar pendências da obra detectadas em 31/07/2003, consistentes em: ausência de fiscalização técnica da prefeitura, execução da obra sem orientação técnica da empreiteira e obra paralisada por razões desconhecidas (ID 274118552 - pg. 25); - Tomada de Contas Especial pela Coordenadoria Regional da Funasa em Rondônia, de 26/03/2008, em desfavor do apelante Raymundo Mesquita Muniz, referente ao Convênio 1587/2001, cujo objeto era a ampliação do sistema de esgoto sanitário do Município de Costa Marques/RO (ID 274118556 - pg. 56); - Ofício da Funasa nº 099, de 12/11/2007, informando que a prestação de contas final do Convênio 1587/2001 não foi aprovada, considerando as irregularidades apontadas no Parecer nº 041/2007 (ID 274118556 - pg. 57); - Parecer Técnico nº 041/2007 da Funasa, de 12/11/2007 recomendando a não aprovação da prestação de contas final do supracitado convênio (ID 274118556 – pg. 58); - Laudo de Exame em Obra de Engenharia nº 0814/2008-SETEC/SR/DPF/RO, de 04/09/2008, o qual concluiu ter havido o cumprimento parcial dos objetos licitados, ficando as obras inacabadas e sem condições de uso, embora as pessoas jurídicas tenham recebido na totalidade os valores constantes dos contratos. Assim, foram pagos R$ 266.281,51 por serviços não executados à empresa “V.J. Construções e Comércio Ltda.” e R$ 126.904,10 à empresa “Celta Construções e Terraplanagem Ltda.”. Não havia sequer “Termo de Recebimento Definitivo da Obra” (ID 274118556 - pg. 89); - Informação nº 005/2009 da Polícia Federal, de 12/03/2009, após análise da documentação constante do IPL 268/2007 (ID 274118562 - pg. 74); - Termos de medição atestando a realização das etapas da obra (IDs 273904519 - pgs. 37, 48, 58 e 70 e 273904521 - pgs. 134, 146/147 e 163 e ID 274118553 – pgs. 4 e 12) e - Depoimento em Juízo da testemunha Hamilton Macedo Alves, agente da Polícia Federal, que atuou na Base da Polícia Federal em Costa Marques/RO, no ano de 2007, no qual detalhou o início da investigação, bem como ter encontrado o local da obra já depredado. Declarou que a prova técnica apontou que a obra não tinha sido executada completamente e sequer haveria condições de aproveitar o que fora feito, apesar de ter havido o empenho de todo o recurso público pela prefeitura (ID 273894095). Sobre a alegação de que as que as provas contidas nos autos são frágeis e intempestivas, por terem sido coletadas muito depois da paralisação das obras, verifico que a Funasa, em 31/07/2003, já detectara ausência de fiscalização da obra por parte da prefeitura e execução sem orientação técnica da empreiteira, tendo apresentado tais falhas às autoridades municipais, em 28/10/2003, portanto, ainda durante a administração do acusado Raymundo Mesquita Muniz (ID 274118552 - pg. 25). Não há noticia nos autos de que tais falhas tenham sido solucionadas, o que resultou na não aprovação da prestação de contas final (ID 274118556 – pg. 57) e instalação de Tomada de Contas Especial (ID 274118556 - pg. 56). Os apelantes Valter Luiz Rossoni, Alexandre de Morais Guimarães e Raymundo Mesquita Muniz aduzem que as obras foram inteiramente realizadas, de acordo com o que fora contratado, em todas as suas especificações, conforme documentos juntados aos autos e prova testemunhal. Todavia, o novo gestor do Município não deu continuidade ao trabalho, tendo deixado o sistema se deteriorar. Contudo, o Laudo Pericial nº 0814/2008 – SETEC/SR/DPF/RO concluiu que, embora as empresas tenham recebido a integralidade dos valores, houve pagamento apenas parcial dos objetos licitados, ficando a obra inacabada e sem condições de uso (ID 274118556 - pg. 89); Além disso, a Notificação Técnica da Divisão/Serviço de Engenharia de Saúde Pública da Funasa aponta que, já no ano de 2003, quando o apelante Raymundo Mesquita Muniz ainda era prefeito de Costa Marques/RO, as obras já apresentavam irregularidades (ID 274118552 - pg. 25). As contas do Convênio nº 1587/2001 sequer foram aprovadas, o que culminou na deflagração do processo de Tomada de Contas Especial pela Coordenadoria Regional da Fundação Nacional de Saúde – Funasa (ID 274118556 - pg. 56). Sobre a alegada prova testemunhal, o agente de Polícia Federal Hamilton Macedo Alves declarou em Juízo que, em 2007, em razão de denúncias de vários moradores de Costa Marques/RO sobre os desvios de recursos públicos destinados à construção de uma estação de tratamento de esgotos sanitários, participou de diligências no local, que já estava depredado, abandonado e sem condições de uso. Também examinou a documentação referente aos Convênios em questão e constatou que os recursos chegaram ao Município e foram usados. Declarou que a perícia esteve no local e constatou que a obra não fora integralmente feita (ID 273894095). Restam afastadas, assim, as teses defensivas, de modo que concluo que a materialidade delitiva foi devidamente demonstrada nos autos. Da autoria Acusado Valter Luiz Rossoni O acusado alega ausência de provas de que ele seria proprietário ou participante do quadro societário das duas empresas vencedoras dos procedimentos licitatórios, das quais era apenas procurador. O apelante também apresentou essa versão no seu interrogatório judicial, no qual declarou que era apenas procurador das sociedades “V.J. Construções e Comércio Ltda.” e “Celta Construções e Terraplanagem Ltda.”, recebendo apenas uma participação no lucro das empresas. Informou, ainda, que a empresa “Celta Construções e Terraplanagem Ltda.” era de sua sobrinha e de um amigo, ao passo que a “V.J. Construções e Comércio Ltda.” era de um amigo. Admitiu, contudo, que administrava o cotidiano dessas empresas, não vendo nisso contradição ou conflito de interesses (ID 273894104). Contudo, a versão de que não era o proprietário das empresas, apresentada em Juizo, contradiz com suas declarações em fase policial, no sentido de que constituiu a empresa “Celta Construções e Terraplanagem Ltda.”, tendo, na ocasião, convencido José Armando e sua esposa Antônia a figurarem como sócios, pois, na época estava impedido de contratar com órgãos públicos por força de uma decisão judicial. Por outro lado, quanto à empresa “V.J. Construções e Comércio Ltda.”, negou tê-la constituído (ID274118564 – pg.7). De todo modo, a prova testemunhal também foi no sentido de que o acusado era o proprietário de fato, pelo menos, da empresa “Celta Construções e Terraplanagem Ltda.” A testemunha Raimundo Nonato Araújo Rodrigues, servidor público municipal, membro da Comissão de Recebimento de Obra, declarou em fase policial que a empresa “Celta Construções e Terraplanagem Ltda.” pertencia ao acusado Valter Luiz Rossoni, apelidado de “Polaco”, a quem conhece como empreiteiro e que atuava em Costa Marques, São Francisco do Guaporé e outros municípios (ID 274127018 - pg. 199). Por sua vez, a testemunha Hamilton Macedo Alves, agente de Polícia Federal, declarou em Juízo ter participado de uma diligência na cidade de Rolim de Moura/RO, onde teve contado com José Armando de Almeida, cujo nome constava como sócio proprietário de pelo menos uma das empresas. Ali constatou que José Armando trabalhava em uma fazenda como vaqueiro e, ao ser indagado acerca da situação de constar como proprietário de empresa vencedora de um procedimento licitatório, cujo objeto era a construção de uma rede de tratamento de esgotos sanitários, declarou que apenas havia colocado o nome, mas não cuidava disso (ID 273894095). Tais evidências indicam que o apelante Valter Luiz Rossoni era o proprietário de fato e administrador das empresas em comento, tendo sido o responsável por todas as tratativas e recebimento dos valores durante o certame e a execução das obras. Acusado Alexandre de Morais Guimarães O acusado alega que não era ordenador de despesas ou proprietário de empresa supostamente favorecida e, portanto, suas ações carecem de efeito danoso, o que configura crime impossível. O crime impossível está previsto no art. 17 do CP, que determina não ser possível punir-se “a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.” O dispositivo não se aplica na hipótese, tendo em vista que o delito atribuído ao apelante se consumou. Além disso, o acusado, na condição de engenheiro da prefeitura, era o responsável pela fiscalização da obra e assinatura dos termos de medição, a demonstrar a eficácia do meio. O apelante nega ter assinado a medição para o pagamento de conclusão das obras referentes ao Convênio 1587/2001, tampouco o recebimento provisório ou definitivo. Pugna pela incidência do art. 15 do CP (desistência voluntária ou eficaz). O supracitado dispositivo prevê que o agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução do delito ou impede que seu resultado se produza, só responde pelos atos já praticados. Contudo, verifica-se do exame dos termos de medição que todos eles foram assinados pelo apelante e, na sua maioria, apenas por ele, embora se refiram à “comissão de obra referente à construção do sistema de esgotamento sanitário” e possuam campos para outras três assinaturas (IDs 273904519 - pgs. 37, 48, 58 e 70 e 273904521 - pgs. 134, 146/147 e 163 e ID 274118553 – pgs. 4 e 12). O acusado atestou, portanto, a execução de serviços não executados de forma integral, o que resultou no desvio de verbas públicas federais. Acusado Raymundo Mesquita Muniz O acusado que o órgão ministerial não logrou provar as acusações, ante à ausência de dolo ou culpa na conduta do apelante, pois, tanto os engenheiros da Funasa, quanto os da prefeitura, fiscalizavam e acompanhavam a execução da obra. Além disso, a obra era fiscalizada por uma comissão composta por servidores de carreira e um vereador indicado pelo legislativo local. Assevera que só autorizava os pagamentos mediante relatório de acompanhamento e fiscalização da referida comissão. Contudo, do exame dos termos de medição, verifica-se que eles, em sua maioria, foram assinados apenas pelo corréu Alexandre de Morais Guimarães, embora tenham o título “comissão de obra referente à construção do sistema de esgotamento sanitário” e possuam campos para 03 (três) outras assinaturas(IDs 273904519 - pgs. 37, 48, 58 e 70 e 273904521 - pgs. 134, 146/147 e 163 e ID 274118553 – pgs. 4 e 12). Além disso, ainda durante a execução da obra, em 28/10/2003, a Funasa promoveu cobrança de solução de pendências por meio de Notificação Técnica, na qual alerta o administrador municipal acerca das inconsistências na empreitada, dentre elas a ausência de fiscalização técnica da prefeitura (ID 274118552 - pg. 25); Merece registro que, segundo petição de 25/05/2006 em Medida Cautelar Inominada, a nova administração municipal informa que o Município de Costa Marques/RO, estava no Cadastro de Inadimplentes do Governo Federal (Siafi) e Cadastro de Créditos não Quitados do Setor Público, o que vedava a celebração de novos convênios, bem como, o empenho das despesas municipais, impedindo a cidade de receber valores indispensáveis à manutenção de sua infraestrutura (ID 273904517 - pg. 80). Desse modo, é forçoso concluir que o apelante Raymundo Mesquita Muniz tinha plena consciência das deficiências de fiscalização da obra e, malgrado as irregularidades acima descritas, notadamente as assinaturas nos termos de medição, na sua maioria, apenas pelo corréu Alexandre de Morais Guimarães, à revelia do restante da comissão de obra, autorizou os pagamentos de serviços. Não pairam dúvidas, portanto, quanto à intenção do acusado de causar dano ao erário (dolo específico). Da desclassificação do crime previsto no inciso I para o tipo penal do inciso II do DL 201/67 O acusado Alexandre de Morais Guimarães pugna pela desclassificação do crime previsto no inciso I para o tipo penal no inciso III, ambos do art. 1º do DL 201/67, considerando que, durante toda a instrução penal, não ficou comprovada a apropriação ou desvio de verbas públicas e, desse modo, no máximo, teria havido uso indevido de verbas públicas. Os referidos dispositivos assim estabelecem: Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: I - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio; (...) Ill - desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas; De sua leitura, verifica-se que o inciso I tipifica a conduta de desvio de finalidade da coisa pública em proveito próprio ou alheio. Por sua vez, o inciso III pune a conduta menos grave de aplicação indevida de rendas ou verbas públicas. No caso desse inciso, o desvio ou a aplicação das verbas públicas, ainda que de forma indevida, deu-se em benefício público. Sobre a questão, a orientação jurisprudencial da Segunda Seção deste Regional é no sentido e que “O tipo do inciso III é apenas subsidiário ao do inciso I, somente se caracterizando o primeiro quando o desvio de aplicação das rendas públicas não se reverta em favor do próprio agente público ou de terceiro, o que não é o caso dos autos. Impossibilidade de desclassificação para o tipo do inciso III do art. 1º do Decreto-Lei n. 201/67”. (APN 0020185-06.2014.4.01.0000, Desembargador Federal Ney Bello, TRF1 - Segunda Seção, e-DJF1 15/04/2016 Pag.) Na hipótese, as provas contidas nos autos demonstram ter havido pagamento de obras públicas não executadas integralmente pelas empresas contratadas para esse fim, de propriedade do corréu Valter Luiz Rossoni. Portanto, não houve aplicação dos valores dos Convênios nºs1779/2000 e 1587/2001 em finalidade diversa, mas sim o desvio de verbas públicas em proveito próprio ou alheio. A conduta dos réus se adequa, portanto, ao tipo penal descrito no art. 1º, inciso I, do DL 201/67. No mesmo sentido já decidiu esta Turma, em acórdão do qual fui Relator: PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE. (DL: 201/67: ART. 1º, I). MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. PROVAS SUFICIENTES. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDDE. PENA REDIMENSIONADA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. ART. 44 DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO NÃO OCORRÊNCIA. PRELIMINARES DE NULIDADE REJEITADAS. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. 1. As provas juntadas aos autos demonstram claramente o desvio dos recursos públicos oriundos da FUNASA, objeto de convênio firmado com o município de Barra do Rocha/BA, na gestão do então prefeito e do responsável pela execução da obra. (...) 6. Os elementos de prova constantes dos autos apontam que o réu Jorge Carlos Silva Santos, à época Prefeito do Município de barra do Rocha/BA, de forma livre e consciente, desviou recursos públicos oriundos da FUNASA em proveito da empresa Construnor - Construções do Nordeste Ltda., administrada pelo corréu Leovegildo Oliveira de Sousa. 7. O repasse integral efetuado pela FUNASA ao Município de Barra do Rocha também foi demonstrado, conforme se infere dos documentos juntados aos autos, especialmente, pelo Relatório de Tomada de Contas Especial da Fundação Nacional de Saúde, no qual consta que todos os recursos do Convênio 2378/200, no qual consta que somente 26,45% dos serviços foram executados. 8. Não prospera o pedido de desclassificação do crime, uma vez que a conduta dos réus adequou perfeitamente ao descrito no art. 1º, inciso I, do DL 201 - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio -, sendo certo que, a orientação jurisprudencial da Segunda Seção deste Regional é no sentido e que "o tipo do inciso III é apenas subsidiário ao do inciso I, somente se caracterizando o primeiro quando o desvio de aplicação das rendas públicas não se reverta em favor do próprio agente público ou de terceiro, o que não é o caso dos autos. Impossibilidade de desclassificação para o tipo do inciso III do art. 1º do Decreto-Lei n. 201/67", (00201850620144010000, Desembargador Federal Ney Bello, TRF1 Segunda Seção, eDJF1 15/04/2016). (...) 11. Apelações parcialmente providas (itens 9 e 10). (ACR 0000189-60.2012.4.01.3308, Desembargador Federal Cesar Jatahy, TRF1 - Quarta Turma, PJe 05/08/2024 Pag.) (Grifo nosso). Mantenho, portanto, a condenação dos acusados Valter Luiz Rossoni, Alexandre de Morais Guimarães e Raymundo Mesquita Muniz nas penas do art. 1º, I, do DL 201/67 (apropriação ou desvio de rendas públicas em proveito próprio ou alheio). Da dosimetria da pena O crime do art. 1º, I, do DL 201/67 comina pena de reclusão de 02 (dois) a 12 (doze) anos. Acusado Valter Luiz Rossoni O acusado Valter Luiz Rossoni requer a fixação da pena no mínimo legal, pois é réu primário e não existem nos autos elementos que embasem a exacerbação da reprimenda. Primeiramente, registre-se que o fato do acusado ser tecnicamente primário não lhe serve para afastar circunstâncias desfavoráveis ou minorar a pena-base passível de ser fixada acima do mínimo legal, desde que corretamente fundamentada. A pena-base do acusado foi fixada em 05 (cinco) anos e 09 (nove) meses de reclusão, ante a presença de 03 (três) circunstâncias do art. 59 do CP julgadas desfavoráveis, sob os seguintes fundamentos: - culpabilidade: “se apresenta agravada, pois se utilizou de pessoas interpostas para constituir a empresa e participar de licitação direcionada, recebendo valores decorrentes de serviços não integralmente executados que seriam destinados a obras que trariam maior bem-estar para a população do Município de Costa Marques.” (ID 274127021 – pg. 28); - circunstâncias: “mostram-se graves, porquanto, nos termos da fundamentação, o desvio de verbas públicas federais foi precedido por uma série de irregularidades nos certames licitatórios que culminaram com a contratação das empresas V.J. Construções e Comércio Ltda. e Celta Construções e Terraplanagem Ltda.” (ID 274127021 – pg. 29) e - consequências: “ são graves, considerando que o desvio da importância de R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta e cinco reais e sessenta e um centavos) de origem pública em proveito de particulares, quando deveriam ser investidos regularmente em obras para o bem-estar da população do Município de Costa Marques, tem efeitos extremamente danosos (ID 274127021 – pg. 29). Os fundamentos usados para o julgamento negativo das supracitadas circunstâncias não merecem reparos. A culpabilidade ultrapassa o normal para o tipo penal, pois o acusado, conforme ficou demonstrado nos autos, utilizou-se de “laranjas” para constituir as empresas, a fim de participar dos procedimentos licitatórios e execução das obras, bem como foi o beneficiário de valores que deveriam ser destinados a obra relevante para o Município. As circunstâncias do crime ultrapassam o esperado para o tipo penal, tendo em vista que, conforme consta do Laudo de Exame em Obra de Engenharia nº 0814/2008-SETEC/SR/DPF/RO (ID 274118556 - pg. 89), as irregularidades tiveram início ainda em fase de licitação, com o direcionamento da contratação das empresas envolvidas na presente Ação Penal, e perduraram até o recebimento da empreitada. As consequências também ultrapassam o normal para o tipo penal, considerando que, além do valor desviado ser muito alto para o padrão de um pequeno Município no interior de Rondônia, R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta reais e sessenta e um centavos), em valores da época, a não concretização da obra e o desvio de parte do montante a ela destinado impossibilitaram o funcionamento da rede de saneamento básico municipal, situação que afeta os direitos fundamentais da coletividade, notadamente à saúde e a um meio ambiente saudável. Contudo, quanto à fração de exasperação da pena, há julgados no STJ no sentido de que, salvo os casos excepcionais, o aumento da pena-base em face de circunstâncias do art. 59 do CP julgadas negativas deve se dar à razão de 1/6 (um sexto) sobre a pena mínima: (...) na falta de razão especial para afastar esse parâmetro prudencial, a exasperação da pena-base, pela existência de circunstâncias judiciais negativas, deve obedecer à fração de 1/6 sobre o mínimo legal, para cada circunstância judicial negativa. O aumento de pena superior a esse quantum, para cada vetorial desfavorecida, deve apresentar fundamentação adequada e específica, a qual indique as razões concretas pelas quais a conduta do agente extrapolaria a gravidade inerente ao teor da circunstância judicial. (HC - Habeas Corpus - 534844 2019.02.83399-0, Relator Reynaldo Soares Da Fonseca, STJ - Quinta Turma, DJE Data:19/12/2019 ..Dtpb:.) Não verifico, no caso dos autos, fundamentação idônea da sentença, tampouco indicação de situação de excepcionalidade apta a justificar a fixação da pena acima do parâmetro de 1/6 (um sexto) sobre o mínimo legal, para cada circunstância judicial do art. 59 do CP julgada negativa. Além disso, não constato razão concreta para exacerbar a pena-base acima do parâmetro jurisprudencial, pois, a conduta do réu não extrapola a gravidade já consubstanciada nos fundamentos usados pela sentença para o julgamento negativo das circunstâncias judiciais. Assim, em observância ao julgado acima, bem como, aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixo a pena-base do acusado em 03 (três) anos de reclusão, que torno definitiva ante a ausência de circunstâncias atenuantes ou agravantes, bem como causas de diminuição ou de aumento da pena. O regime inicial de cumprimento da pena é o aberto, nos termos do art. 33, § 2º, “c”, do CP. Com a dosimetria fixada no presente julgado, substituo a pena privativa de liberdade do acusado por 02 (duas) sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo Juízo da Execução, na forma do art. 66, V, "a", da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal - LEP). Acusado Alexandre de Morais Guimarães O acusado Alexandre de Morais Guimarães requer a diminuição da pena-base para 04 (quatro) anos, tendo em vista que o apelante não participou da medição final do Convênio 1587/2001, é primário, tem bons antecedentes, residência fixa e personalidade não voltada para o crime. Primeiramente, registre-se que o fato do acusado ser tecnicamente primário, ter bons antecedentes, residência fixa e personalidade não voltada para o crime não lhe serve para afastar circunstâncias desfavoráveis ou minorar a pena-base passível de ser fixada acima do mínimo legal, desde que corretamente fundamentada. Sobre a não participação da medição final do Convênio 1587/2001, foi demonstrado nos autos que o apelante assinou todos os termos de medição, a maioria deles sozinho, ainda que houvesse uma comissão de obras com essa finalidade (IDs 273904519 - pgs. 37, 48, 58 e 70 e 273904521 - pgs. 134, 146/147 e 163 e ID 274118553 – pgs. 4 e 12). A pena-base do acusado foi fixada em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, ante a presença de 02 (duas) circunstâncias do art. 59 do CP julgadas desfavoráveis, sob os seguintes fundamentos: - culpabilidade: “se apresenta agravada, pois, atestou a execução de serviços não completamente executados em obra pública de relevante valor social para a população do Município de Costa Marques, o que ocasionou o desvio e a apropriação dos recursos públicos federais” (ID 274127021 – pg. 31) e - consequências: “ são graves, considerando que o desvio da importância de R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta e cinco reais e sessenta e um centavos) de origem pública em proveito de particulares, quando deveriam ser investidos regularmente em obras para o bem-estar da população do Município de Costa Marques, tem efeitos extremamente danosos (ID 274127021 – pg. 32). Os fundamentos usados para o julgamento negativo das supracitadas circunstâncias não merecem reparos. A culpabilidade ultrapassa o normal para o tipo penal, pois o acusado foi conivente com o desvio de valores que deveriam ser destinados a obra relevante para o Município. As consequências, também ultrapassam o normal para o tipo penal, considerando que, além do valor desviado ser muito alto para o padrão de um pequeno Município no interior de Rondônia, R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta reais e sessenta e um centavos), em valores da época, a não concretização da obra e o desvio de parte do montante a ela destinado impossibilitaram o funcionamento da rede de saneamento básico municipal, situação que afeta os direitos fundamentais da coletividade, notadamente à saúde e a um meio ambiente saudável. Contudo, quanto à fração de exasperação da pena, não verifico, no caso dos autos, fundamentação idônea da sentença, tampouco indicação de situação de excepcionalidade apta a justificar a fixação da pena acima do parâmetro de 1/6 (um sexto) sobre o mínimo legal, para cada circunstância judicial do art. 59 do CP julgada negativa. Além disso, não constato razão concreta para exacerbar a pena-base acima do parâmetro jurisprudencial, pois a conduta do réu não extrapola a gravidade já consubstanciada nos fundamentos usados pela sentença para o julgamento negativo das circunstâncias judiciais. Assim, em observância ao julgado acima, bem como, aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixo a pena-base do acusado em 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, que torno definitiva ante a ausência de circunstâncias atenuantes ou agravantes, bem como causas de diminuição ou de aumento da pena. O regime inicial de cumprimento da pena é o aberto, nos termos do art. 33, § 2º, “c”, do CP. Com a dosimetria fixada no presente julgado, substituo a pena privativa de liberdade do acusado por 02 (duas) sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo Juízo da Execução, na forma do art. 66, V, "a", da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal - LEP). Acusado Raymundo Mesquita Muniz O acusado Raymundo Mesquita Muniz aduz que as circunstâncias do art. 59 do CP foram julgadas desfavoráveis ao apelante com fundamentos ínsitos ao tipo penal. Não fora isso, o acusado é primário, tem boa conduta social e personalidade que não destoa da normalidade. Requer seja fixada a reprimenda no mínimo legal, qual seja, 02 (dois) anos de reclusão. Primeiramente, registre-se que o fato do acusado ser tecnicamente primário, ter boa conduta social e personalidade que não destoa do normal, não lhe serve para afastar circunstâncias desfavoráveis ou minorar a pena-base passível de ser fixada acima do mínimo legal, desde que corretamente fundamentada. A pena-base do acusado foi fixada em 05 (cinco) anos e 09 (nove) meses de reclusão, ante a presença de 03 (três) circunstâncias do art. 59 do CP julgadas desfavoráveis, sob os seguintes fundamentos: - culpabilidade: “se apresenta agravada, pois, como Prefeito de Costa Marques à época dos fatos, tinha o dever precípuo de zelar pelo patrimônio público e o bem-estar da população do município, de modo que o crime prejudicou claramente a população local pela execução irregular e incompleta das obras objetos dos Convênios, que possuíam elevada relevância social para o Município” (ID 274127021 – pgs. 25/26); - circunstâncias: “mostram-se graves, porquanto, nos termos da fundamentação, o desvio de verbas públicas federais foi precedido por uma série de irregularidades nos certames licitatórios que culminaram com a contratação das empresas V.J. Construções e Comércio Ltda. e Celta Construções e Terraplanagem Ltda.” (ID 274127021 – pg. 26) e - consequências: “ são graves, considerando que o desvio da importância de R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta e cinco reais e sessenta e um centavos) de origem pública em proveito de particulares, quando deveriam ser investidos regularmente em obras para o bem-estar da população do Município de Costa Marques, tem efeitos extremamente danosos (ID 274127021 – pg. 26). Os fundamentos usados para o julgamento negativo das supracitadas circunstâncias não merecem reparos. A culpabilidade ultrapassa o normal para o tipo penal, pois, o acusado deixou de zelar pela execução de obra relevante para o Município. As circunstâncias do crime ultrapassam o esperado para o tipo penal, tendo em vista que, conforme consta do Laudo de Exame em Obra de Engenharia nº 0814/2008-SETEC/SR/DPF/RO (ID 274118556 - pg. 89), as irregularidades tiveram início ainda em fase de licitação, com o direcionamento da contratação das empresas envolvidas na presente Ação Penal, e perduraram até o recebimento da empreitada. Sobre as consequências, também ultrapassam o normal para o tipo penal, considerando que, além do valor desviado ser muito alto para o padrão de um pequeno Município no interior de Rondônia, R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta reais e sessenta e um centavos), em valores da época, a não concretização da obra e o desvio de parte do montante a ela destinado impossibilitaram o funcionamento da rede de saneamento básico municipal, situação que afeta os direitos fundamentais da coletividade, notadamente à saúde e a um meio ambiente saudável. Contudo, quanto à fração de exasperação da pena, não verifico, no caso dos autos, fundamentação idônea da sentença, tampouco indicação de situação de excepcionalidade apta a justificar a fixação da pena acima do parâmetro de 1/6 (um sexto) sobre o mínimo legal, para cada circunstância judicial do art. 59 do CP julgada negativa. Além disso, não constato razão concreta para exacerbar a pena-base acima do parâmetro jurisprudencial, pois, a conduta do réu não extrapola a gravidade já consubstanciada nos fundamentos usados pela sentença para o julgamento negativo das circunstâncias judiciais. Assim, em observância ao julgado acima, bem como aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixo a pena-base do acusado em 03 (três) anos de reclusão, que torno definitiva ante a ausência de circunstâncias atenuantes ou agravantes, bem como causas de diminuição ou de aumento da pena. O regime inicial de cumprimento da pena é o aberto, nos termos do art. 33, § 2º, “c”, do CP. Com a dosimetria fixada no presente julgado, substituo a pena privativa de liberdade do acusado por 02 (duas) sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo Juízo da Execução, na forma do art. 66, V, "a", da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal - LEP). Da justiça gratuita O acusado Alexandre de Morais Guimarães pugna pelo benefício da assistência judiciária gratuita. Diante da alegada situação de hipossuficiência do apelante, concedo-lhe o benefício da justiça gratuita, ressalvado o disposto no art. 804 do CPP, quanto à necessidade de condenação do vencido em custas, e suspendo a exigibilidade do pagamento, pelo prazo de 05 (cinco) anos, nos termos do art. 98, § 3º, da Lei 13.105, de 16/03/2015. Do dispositivo Ante o exposto, dou parcial provimento às apelações para: - reduzir as penas dos acusados Valter Luiz Rossoni e Raymundo Mesquita Muniz para 03 (três) anos de reclusão, no regime inicial aberto. Substituo as reprimendas privativas de liberdade dos réus por 02 (duas) sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo Juízo da Execução; e - reduzir a pena do acusado Alexandre de Morais Guimarães para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto. Substituo a reprimenda privativa de liberdade do réu por 02 (duas) sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo Juízo da Execução e concedido ao apelante o benefício da assistência judiciária gratuita. É o voto. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gab. 10 - DESEMBARGADOR FEDERAL CÉSAR JATAHY Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0004603-50.2012.4.01.4101/RO PROCESSO REFERÊNCIA: 0004603-50.2012.4.01.4101 CLASSE: APELAÇÃO CRIMINAL (417) APELANTES: VALTER LUIZ ROSSONI e outros REPRESENTANTES DOS APELANTES: AIRTON PEREIRA DE ARAUJO - RO243-A, FABIO PEREIRA MESQUITA MUNIZ - RO5904-A e PAULA JAQUELINE DE ASSIS MIRANDA - RO4245-A APELADO: Ministério Público Federal (Procuradoria) E M E N T A PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. OPERAÇÃO “PELO CANO”. MUNICÍPIO DE COSTA MARQUES/RO. APROPRIAR-SE DE RENDAS PÚBLICAS E DESVIÁ-LAS EM PROVEITO PRÓPRIO E DE TERCEIRO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS CÍVEL E CRIMINAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DESCLASSIFICAÇÃO AFASTADA. DOSIMETRIA DA PENA REFORMADA. JUSTIÇA GRATUITA. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. Apelantes condenados nas penas do art. 1º, I, do DL 201/67, em razão de, na condição de prefeito, engenheiro da prefeitura e proprietário de fato das empresas vencedoras dos procedimentos licitatórios, terem desviado recursos públicos repassados pela Fundação Nacional de Saúde – Funasa, com vistas à construção e ampliação do sistema de esgotamento sanitário do Município de Costa Marques/RO. 2. Vigora no ordenamento jurídico brasileiro o sistema de independência das esferas cível e criminal, nos termos do art. 935 do CCB. Dessa forma, não repercute na presente ação penal o aventado julgamento improcedente do pedido formulado nos autos de ação de ressarcimento ao erário ajuizada em desfavor do ex-prefeito Raymundo Mesquita Diniz, supostamente em razão dos mesmos fatos aqui tratados. 3. Foram demonstradas a materialidade e autoria por parte dos acusados no tocante à conduta de receber integralmente os valores referentes aos Convênios nºs1779/2000 e 1587/2001 firmados pelo Município de Costa Marques/RO com a Funasa, embora as obras por eles previstas não tivessem sido executadas na sua integralidade, o que resultou no desvio de R$ 393.185,61 (trezentos e noventa e três mil, cento e oitenta reais e sessenta e um centavos). 4. "O tipo do inciso III é apenas subsidiário ao do inciso I, somente se caracterizando o primeiro quando o desvio de aplicação das rendas públicas não se reverta em favor do próprio agente público ou de terceiro, o que não é o caso dos autos. Impossibilidade de desclassificação para o tipo do inciso III do art. 1º do Decreto-Lei n. 201/67". (APN 0020185-06.2014.4.01.0000, Desembargador Federal Ney Bello, TRF1 - Segunda Seção, e-DJF1 15/04/2016 Pag.). Precedente da Turma. Pedido de desclassificação da conduta do inciso I do art. 1º do DL 201/67 para a do inciso III rejeitado. 5. Os fundamentos usados para o julgamento negativo das circunstâncias do art. 59 do CP não merecem reparos. Todavia, há julgados no STJ no sentido de que, salvo os casos excepcionais, o aumento da pena-base em face de circunstâncias do art. 59 do CP julgadas negativas deve se dar à razão de 1/6 (um sexto) sobre a pena mínima. Precedentes do STJ. 7. Dosimetrias das penas reformadas para melhor refletir o grau de reprovabilidade das condutas dos réus. Redução das penas dos acusados Valter Luiz Rossoni e Raymundo Mesquita Muniz para 03 (três) anos de reclusão, no regime inicial aberto. Substituição das penas privativas de liberdade dos réus por 02 (duas) sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo Juízo da Execução. Ademais, redução da pena do acusado Alexandre de Morais Guimarães para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto. Substituição da reprimenda privativa de liberdade do réu por 02 (duas) sanções restritivas de direitos, a serem fixadas pelo Juízo da Execução. 8. Concessão, ao apelante Alexandre de Morais Guimarães, do benefício da justiça gratuita, ressalvado o disposto no art. 804 do CPP, quanto à necessidade de condenação do vencido em custas, e suspensão da exigibilidade do pagamento, pelo prazo de 05 (cinco) anos, nos termos do art. 98, § 3º, da Lei 13.105, de 16/03/2015. 9. Apelações dos acusados parcialmente providas (itens 7 e 8). ACÓRDÃO Decide a Turma, à unanimidade, dar parcial provimento às apelações, nos termos do voto do Relator. 4ª Turma do TRF/1ª Região - Brasília-DF, 24 de junho de 2025. Desembargador Federal CÉSAR JATAHY Relator IF/M
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