Almir Araujo Junior e outros x Almir Araujo Junior e outros
ID: 298528638
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1031769-17.2023.8.11.0003
Data de Disponibilização:
13/06/2025
Advogados:
HIGHOR DJAMILER MENDES SANTOS
OAB/MT XXXXXX
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JOSE LOPES SIQUEIRA JUNIOR
OAB/MT XXXXXX
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GEAN GUILHERME DA COSTA GASPARETO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1031769-17.2023.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1031769-17.2023.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins, Crime contra a administração ambiental] Relator: Des(a). JONES GATTASS DIAS Turma Julgadora: [DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), ALMIR ARAUJO JUNIOR - CPF: 043.001.161-05 (APELANTE), JOSE LOPES SIQUEIRA JUNIOR - CPF: 053.750.091-02 (ADVOGADO), CASSIANO RODRIGUES DE OLIVEIRA - CPF: 029.525.361-47 (APELANTE), JOHN LENNON DE SOUZA FERNANDES - CPF: 035.527.841-36 (APELANTE), MARCOS VINICIO DE ALMEIDA SANTOS - CPF: 040.620.391-17 (APELANTE), HIGHOR DJAMILER MENDES SANTOS - CPF: 023.883.841-25 (ADVOGADO), THIAGO SOUZA FERREIRA - CPF: 030.669.381-07 (APELANTE), GEAN GUILHERME DA COSTA GASPARETO - CPF: 013.397.001-90 (ADVOGADO), WEIBER KELVER DA SILVA FELISBERTO - CPF: 047.914.721-36 (APELANTE), LAURO EVANER CORREA - CPF: 861.607.291-87 (TERCEIRO INTERESSADO), CLAUDIO RAFACHO SANTOS - CPF: 687.748.266-20 (TERCEIRO INTERESSADO), ROGERIO ALVES DE SOUZA - CPF: 882.951.761-53 (TERCEIRO INTERESSADO), SAÚDE PÚBLICA (VÍTIMA), ROSA AMELIA DA SILVA - CPF: 931.481.271-53 (ASSISTENTE), WALISSON FELIPE DOS SANTOS ELIAS - CPF: 056.902.091-39 (ASSISTENTE), JESSICA RENATA SANTOS ELIAS - CPF: 057.065.461-00 (ASSISTENTE), GRACIELA RODRIGUES DA SILVA - CPF: 568.198.201-78 (ASSISTENTE), MARILUCE RODRIGUES DE OLIVEIRA (ASSISTENTE), ONORIO GONCALVES DA SILVA JUNIOR - CPF: 882.357.001-82 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), JOHN LENNON DE SOUZA FERNANDES - CPF: 035.527.841-36 (TERCEIRO INTERESSADO), THIAGO SOUZA FERREIRA - CPF: 030.669.381-07 (TERCEIRO INTERESSADO), ALMIR ARAUJO JUNIOR - CPF: 043.001.161-05 (APELADO), CASSIANO RODRIGUES DE OLIVEIRA - CPF: 029.525.361-47 (APELADO), GEAN GUILHERME DA COSTA GASPARETO - CPF: 013.397.001-90 (ADVOGADO), HIGHOR DJAMILER MENDES SANTOS - CPF: 023.883.841-25 (ADVOGADO), JOHN LENNON DE SOUZA FERNANDES - CPF: 035.527.841-36 (APELADO), JOSE LOPES SIQUEIRA JUNIOR - CPF: 053.750.091-02 (ADVOGADO), MARCOS VINICIO DE ALMEIDA SANTOS - CPF: 040.620.391-17 (APELADO), THIAGO SOUZA FERREIRA - CPF: 030.669.381-07 (APELADO), WEIBER KELVER DA SILVA FELISBERTO - CPF: 047.914.721-36 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU AS PRELIMINARES E, NO MÉRITO, DESPROVEU OS RECURSOS. E M E N T A Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Tráficos de drogas. Associação ao tráfico. Dosimetria de pena. Nulidades processuais. Preliminares afastadas. Autoria e materialidade comprovadas. Prova testemunha policial idônea. Recursos defensivos desprovidos. Recurso ministerial improvido. I. Caso em exame 1. Apelações interpostas pelas defesas de cinco réus condenados por tráfico de drogas e pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, em face de sentença da 5ª Vara Criminal de Rondonópolis/MT, que julgou parcialmente procedente a denúncia oferecida com base nos arts. 33 e 35 da Lei 11.343/06, absolvendo os réus da imputação por associação para o tráfico. II. Questão em discussão 2. As questões suscitadas consistem em: (i) reconhecimento de nulidades processuais (elementos informativos ocultos, ação controlada sem autorização judicial, reconhecimento fotográfico irregular e cerceamento de defesa por não participação em audiência); (ii) reavaliação da autoria e materialidade quanto ao tráfico de drogas; (iii) incidência da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06; (iv) provimento de recurso ministerial para condenação de todos os réus por associação para o tráfico e, no caso de John Lennon, também por tráfico. III. Razões de decidir 3. As nulidades foram devidamente afastadas diante da inexistência de prejuízo concreto e da suficiência das garantias do contraditório. 4. Restou comprovada a prática do tráfico pelos réus, mediante apreensão de entorpecentes, provas técnicas e testemunhais que evidenciam a atuação consciente na comercialização de drogas. 5. Inviável o reconhecimento do tráfico privilegiado diante da demonstração de dedicação às atividades criminosas, revelada por provas materiais, confissões e depoimentos harmônicos. 6. Insubsistentes os elementos para condenação por associação para o tráfico, por ausência de provas sobre vínculo estável e permanente entre os acusados. 7. Correta dosimetria das penas, proporcional à natureza e quantidade das drogas apreendidas, bem como ao grau de envolvimento de cada réu. IV. Dispositivo. 8. Recursos de apelação criminal desprovidos. Sentença mantida. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LIV e LV; CPP, arts. 185, 226, 563; CP, art. 61, I e art. 91, II, “b”; Lei 11.343/06, arts. 33 e 35; Lei 9.807/99; Res. CNJ n. 484/2022. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC 598.886/SC; RHC 206.846/SP; AgRg no AREsp 2.637.920/SP; TJMT, Enunciado n. 07 das Câmaras Criminais Reunidas; Enunciado n. 39. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de Apelação Criminal interpostos pelas defesas de Almir Araújo Junior, Cassiano Rodrigues de Oliveira, Marcos Vinicio de Almeida Santos, Thiago Souza Ferreira, Weiber Kelver da Silva Felisberto, bem como pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, em face da sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis, nos autos da ação penal n. 1031769-17.2023.8.11.0003. Almir Araújo Junior foi condenado pela prática do crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput), à pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, em regime inicial semiaberto. Cassiano Rodrigues de Oliveira foi condenado pela prática do crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput), à pena de 07 (sete) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, em regime inicial semiaberto. Marcos Vinício de Almeida Santos foi condenado pela prática do crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput), à pena de 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, em regime inicial semiaberto. Weiber Kelver da Silva Felisberto foi condenado pela prática do crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput), à pena de 08 (oito) anos e 02 (dois) meses de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, em regime inicial fechado. Thiago Souza Ferreira foi condenado à pena de 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, como incurso no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, em regime inicial semiaberto, e absolvido quanto ao crime ambiental do art. 56 da Lei 9.605/98 Nas razões recursais, a defesa de Almir Araújo Júnior postulou o reconhecimento da causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, sustentando que o réu seria primário, de bons antecedentes, e que não se dedicaria a atividades criminosas nem integraria organização criminosa. Argumentou que, embora confessada a prática delitiva, não haveria elementos concretos nos autos que indicassem dedicação habitual ao tráfico, salientando que as conversas interceptadas entre o réu e o corréu Weiber não configurariam, por si só, prova de envolvimento contínuo com a traficância, mas sim uma ação pontual. Alegou, ainda, que o juízo de primeiro grau incorreu em contradição ao negar o benefício com base nas mensagens de aplicativo, uma vez que reconheceu a ausência de elementos que caracterizassem associação para o tráfico, o que, por consequência, enfraqueceria a tese de dedicação criminosa habitual. Requereu, assim, a reforma da sentença para que fosse aplicada a causa de diminuição de pena do tráfico privilegiado (Id. 237419172). A defesa de Cassiano Rodrigues de Oliveira sustentou, nas razões recursais, a tese de erro de tipo, ao argumento de que desconhecia completamente a existência de substância entorpecente na mala transportada em seu veículo, que teria sido carregada pelo corréu Almir, de quem apenas recebeu solicitação para corrida de aplicativo, mediante pagamento de R$ 40,00. Requereu a absolvição com fundamento no art. 386, VI, do Código de Processo Penal, por ausência de dolo na conduta. Aduziu a inexistência de provas seguras quanto à autoria delitiva, afirmando que as testemunhas se basearam em meras suposições ou informações não documentadas nos autos. Ressaltou que o recorrente negou a prática do crime desde o início e que seu nome surgiu apenas a partir de informações dos corréus, desprovidas de lastro probatório suficiente. Alternativamente, pleiteou a readequação da pena-base, alegando ausência de proporcionalidade na exasperação fundada unicamente na quantidade e natureza da droga. Por fim, postulou a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, sustentando que o recorrente é primário, possui bons antecedentes, não integra organização criminosa nem se dedica habitualmente ao tráfico de drogas, de modo que não se justifica o afastamento do tráfico privilegiado com base em conjecturas ou meras interceptações telefônicas entre outros corréus (Id. 230400128). Marcos Vinício de Almeida Santos alegou, preliminarmente, a nulidade da sentença em razão da não realização do interrogatório do réu, sustentando cerceamento de defesa, uma vez que, embora o processo tenha admitido audiências por videoconferência, foi indeferida sua participação sob o fundamento de que estaria foragido. Argumentou que a ausência não implica renúncia tácita ao direito de autodefesa e que tal decisão violaria os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, sendo incompatível com a jurisprudência do STF. No mérito, pugnou pela absolvição ao fundamento de que a condenação se baseou exclusivamente na apreensão de drogas, sem a devida comprovação de que o entorpecente se destinava à mercancia, não havendo flagrante da prática de tráfico, tampouco testemunhas ou elementos que confirmassem a destinação para comercialização. Ressaltou que a confissão em sede inquisitorial, desacompanhada de outros elementos probatórios, não seria suficiente para embasar o decreto condenatório. Requereu, assim, o reconhecimento da nulidade da sentença ou, alternativamente, a absolvição por insuficiência de provas, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (Id. 230400125). Nas razões recursais, a Defensoria Pública, em nome do acusado Weiber Kelver da Silva Felisberto, alegou, preliminarmente, diversas nulidades processuais, dentre elas a realização de ação controlada sem autorização judicial, a utilização de elementos informativos ocultos e não submetidos ao contraditório, e a atipicidade procedimental no reconhecimento fotográfico em sede policial, em desacordo com o art. 226 do CPP e com a Resolução n. 484/2022 do CNJ. Sustentou, ainda, nulidade da audiência de instrução e julgamento por indeferimento da participação do réu por videoconferência, o que caracterizaria cerceamento de defesa. No mérito, pleiteou a absolvição do acusado por ausência de provas seguras e idôneas que comprovem a autoria delitiva, destacando a fragilidade do conjunto probatório, a ausência de identificação inequívoca do réu como interlocutor em interceptações telefônicas, e as contradições nos reconhecimentos realizados pelos corréus. Defendeu a inexistência de provas autônomas e independentes que possam justificar a condenação. Subsidiariamente, caso mantida a condenação, requereu a readequação da pena imposta (Id. 230400102). Nas razões recursais, a defesa de Thiago Souza Ferreira requereu, inicialmente, a absolvição por ausência de provas quanto à prática do crime de tráfico de drogas, sustentando que a substância entorpecente encontrada em seu estabelecimento comercial foi localizada durante cumprimento de mandado de busca e apreensão voltado à apuração de crime de homicídio, em contexto diverso, e que não há elementos que demonstrem o envolvimento do réu com a mercancia. Alegou que a droga apreendida foi assumida como de propriedade do corréu Marcos Vinícius, o qual declarou ter atuado no tráfico sem o conhecimento do recorrente. Destacou, ainda, que o apelante possui ocupação lícita e não possui antecedentes criminais. Subsidiariamente, postulou o reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, argumentando que a decisão de primeiro grau afrontou o princípio da individualização da pena ao aplicar idêntico fundamento para afastar o privilégio em relação a todos os réus. Por fim, requereu a restituição do aparelho celular apreendido, por ausência de prova de que tenha sido utilizado na atividade criminosa (Id. 236718672). Em sede decontrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo desprovimento dos recursos interpostos pelos acusados Almir Araújo Júnior, Cassiano Rodrigues de Oliveira, Marcos Vinício de Almeida Santos, Weiber Kelver da Silva Felisberto e Thiago Souza Ferreira, sustentando que a sentença condenatória se encontra devidamente fundamentada nas provas colhidas durante a instrução processual. Ressaltou que não há nulidades a serem reconhecidas, tampouco elementos que justifiquem a absolvição ou a aplicação da causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, defendendo a manutenção integral do édito condenatório (Ids. 230400107, 230400136 e 238093658). O Parquet, em suas razões recursais, requereu a reforma da sentença para condenar os réus Almir Araújo Júnior, Cassiano Rodrigues de Oliveira, Marcos Vinício de Almeida Santos, Weiber Kelver da Silva Felisberto, John Lennon de Souza Fernandes e Thiago Souza Ferreira pelo crime de associação para o tráfico (Lei 11.343/06, art. 35, caput), do qual foram absolvidos em primeira instância. No mesmo recurso, postulou também a condenação de John Lennon pelo delito de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput), sustentando que há robusto conjunto probatório que comprova o vínculo estável e permanente entre os acusados, com divisão de tarefas, e o envolvimento direto e reiterado de todos na prática delitiva, mediante monitoramentos, apreensões, análises de aparelhos celulares e depoimentos prestados sob o crivo do contraditório, demonstrando organização estruturada para o comércio de entorpecentes (Id. 230400106). Em sede decontrarrazões ao recurso ministerial, os apelados Thiago Souza Ferreira, Almir Araújo Júnior, Marcos Vinício de Almeida Santos, Cassiano Rodrigues de Oliveira, John Lennon de Souza Fernandes e Weiber Kelver da Silva Felisberto requereram a manutenção da sentença absolutória quanto ao crime de associação para o tráfico, sustentando a ausência de prova segura da existência de vínculo associativo estável e permanente entre os acusados. Apontaram que os elementos colhidos na instrução são insuficientes para demonstrar o animus associativo exigido pelo tipo penal do art. 35 da Lei 11.343/06. Destacaram a inconsistência dos depoimentos policiais, ausência de flagrante anterior ao dia da prisão e inexistência de diligências efetivas que comprovassem a estrutura ou permanência de uma organização voltada à traficância. Em relação ao acusado John Lennon, a defesa destacou a inexistência de qualquer apreensão de droga, petrechos ou interceptações que o ligassem ao tráfico de drogas, reforçando que a suposta vinculação decorreu de suposições não corroboradas por prova técnica ou testemunhal isenta (Ids. 230400121, 230400122, 230400126, 230400127). A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso ministerial e pelo desprovimento dos recursos defensivos. Em sua manifestação, destacou que as provas constantes nos autos – como interceptações telefônicas, depoimentos policiais, relatórios de investigação e apreensões – confirmam não apenas a prática do tráfico de drogas por parte dos acusados, mas também a existência de vínculo estável e permanente entre eles, caracterizando a associação para o tráfico. Por fim, requereu a reforma da sentença de primeiro grau para que os réus Almir Araújo Júnior, Cassiano Rodrigues de Oliveira, Marcos Vinício de Almeida Santos, Thiago Souza Ferreira, Weiber Kelver da Silva Felisberto e John Lennon de Souza Fernandes também sejam condenados pelo crime previsto no art. 35 da Lei 11.343/06 (Id. 247852193). É a síntese do necessário. À Douta Revisão. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS Egrégia Câmara: De início, reconheço que os recursos em apreço são tempestivos, pois foram interpostos por quem tinha legitimidade para fazê-lo, e a medida utilizada afigura-se adequada e necessária para se atingir o fim almejado, pelo que conheço dos apelos manejados pelas Defesas e pelo Ministério Público, uma vez presentes os seus requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade. Trata-se de recursos de Apelação Criminal interpostos pelas defesas de Almir Araújo Junior, Cassiano Rodrigues de Oliveira, Marcos Vinicio de Almeida Santos, Thiago Souza Ferreira, Weiber Kelver da Silva Felisberto, bem como pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso. O Ministério Público do Estado de Mato Grosso ofereceu denúncia em desfavor de Almir Araujo Junior, Cassiano Rodrigues de Oliveira, Weiber Kelver da Silva Felisberto, John Lennon de Souza Fernandes, Thiago Souza Ferreira e Marcos Vinício de Almeida Santos, pela prática dos crimes previstos nos arts. 33, caput, e 35, caput, da Lei nº 11.343/06, combinados com o art. 69 do Código Penal, sendo que John Lennon também foi denunciado com a agravante do art. 61, I, do CP, e Thiago Souza Ferreira, adicionalmente, pelos delitos dos arts. 33 da Lei nº 11.343/06 e 56 da Lei nº 9.605/98, também em concurso material. Consta dos autos que os denunciados, durante o ano de 2023, no município de Rondonópolis/MT, associaram-se de maneira estável e com divisão de tarefas para a prática do tráfico de drogas, transportando, armazenando, guardando e vendendo substâncias entorpecentes. A estrutura da organização criminosa foi evidenciada pelas provas obtidas em monitoramentos, interceptações e apreensões, inclusive com diálogos constantes entre os acusados, por meio de aplicativos de mensagens, especialmente o WhatsApp, nos quais tratavam da comercialização e entrega das drogas, demonstrando forte articulação e vínculo com a facção criminosa Comando Vermelho. Dentre os fatos apurados, destaca-se que Almir Araujo Junior e Cassiano Rodrigues de Oliveira realizavam a entrega de drogas a diversos pontos de venda da cidade, sendo flagrada, no dia 09/08/2023, a entrega de 22 tabletes de maconha, totalizando 13,42 kg, transportados em um veículo Hyundai/HB20, de propriedade de Cassiano. A droga pertencia a Weiber Kelver da Silva Felisberto, vulgo “Kevin”, e era distribuída por Almir e Cassiano a outros integrantes da rede, inclusive a John Lennon de Souza Fernandes, que revendia os entorpecentes a partir de seu comércio localizado no Bairro Santa Clara. Apurou-se, ainda, que Thiago Souza Ferreira e Marcos Vinício de Almeida Santos, respectivamente proprietário e funcionário da conveniência denominada “Ponto Grau”, também integravam a rede criminosa, sendo o local utilizado como ponto de venda de cocaína. No estabelecimento, foram apreendidas porções da droga, balança de precisão, galão de combustível armazenado de forma irregular, motocicleta de alto valor e quantias em dinheiro, configurando, inclusive, crime ambiental. Marcos confessou que vendia as porções por R$ 50,00 cada. As investigações também demonstraram que Almir e Cassiano abasteciam o local com drogas fornecidas por Weiber. Durante as diligências, os policiais flagraram os acusados destruindo ou tentando destruir seus aparelhos celulares, em obediência a ordens do Comando Vermelho, com o intuito de ocultar provas. Foi requisitada perícia técnica dos dispositivos apreendidos, os quais continham evidências relevantes de conversas entre os envolvidos, combinando entregas, valores e locais. Regularmente processado o feito, os apelantes foram condenados e absolvidos dos seguintes delitos – Id. 230400028: APELANTE CONDENAÇÃO ABSOLVIÇÃO PENA Almir Araújo Júnior Art. 33, caput, da Lei 11.343/06 Art. 35, caput, da Lei 11.343/06 5 anos e 10 meses de reclusão e 500 dias-multa Cassiano Rodrigues de Oliveira Art. 33, caput, da Lei 11.343/06 Art. 35, caput, da Lei 11.343/06 7 anos de reclusão e 500 dias-multa Marcos Vinício de Almeida Santos Art. 33, caput, da Lei 11.343/06 Art. 35, caput, da Lei 11.343/06 5 anos de reclusão e 500 dias-multa Weiber Kelver da S. Felisberto Art. 33, caput, da Lei 11.343/06 Art. 35, caput, da Lei 11.343/06 8 anos e 2 meses de reclusão e 500 dias-multa Thiago Souza Ferreira Art. 33, caput, da Lei 11.343/06 Art. 56 da Lei 9.605/98 5 anos de reclusão e 500 dias-multa John Lennon de Souza Fernandes Art. 33 e art. 35, ambos da Lei 11.343/06 Contextualizados os fatos, passa-se à análise das pretensões. VOTO PRELIMINAR - ELEMENTOS INFORMATIVOS OCULTOS E AÇÃO CONTROLADA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS Egrégia Câmara: A defesa do apelante Weiber Kelver da Silva Felisberto arguiu preliminar de nulidade por elementos informativos ocultos e realização de ação controlada sem autorização judicial, sustentando que a investigação teve início com base em delações de informantes não identificados, sem verificação de procedência das informações, e que houve omissão dolosa em prender os corréus, caracterizando ação controlada não autorizada judicialmente, em violação ao art. 53, II, da Lei 11.343/06 e às Leis 9.807/99 e Decreto estadual 1.266/2022 (Id. 230400102). Sem razão a defesa. Primeiramente, quanto aos elementos informativos ocultos, a preservação da identidade de informantes e colaboradores encontra sólido amparo constitucional e legal. De fato, a preservação da identidade de informantes possui respaldo constitucional (art. 5º, XIV, da CF) e legal (Lei 9.807/99 e Decreto estadual 1.266/2022), mas tal proteção não pode ser usada para encobrir a ausência de documentação mínima dos elementos que desencadearam a persecução penal. O devido processo legal exige que o contraditório seja substancial, o que pressupõe que o acusado tenha acesso ao conteúdo, ainda que não à identidade, das informações utilizadas para sua incriminação. O Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento de que a validade da investigação não se condiciona à revelação da identidade dos informantes, desde que as informações sejam posteriormente confirmadas por outros meios de prova produzidos sob o crivo do contraditório: Resguardar a identidade do informante em nada prejudica a defesa do réu, pois todas as testemunhas arroladas nos autos da ação penal estão devidamente nominadas e qualificadas na Denúncia, não havendo nenhuma testemunha sigilosa, tampouco existem documentos ocultos, de modo que é perfeitamente possível exercer o contraditório e a ampla defesa na presente ação". (STJ - RHC: 145329 PR 2021/0100131-0, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 24/08/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/08/2021) Aplica-se a medida de preservação da identidade, da imagem e dos dados pessoais de testemunhas quando justificada pela gravidade e circunstâncias do caso (Lei n. 9.807 /1999, art. 7º, IV)". (AgRg no HC 618.939/CE, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUINTA TURMA, julgado em 03/11/2020, DJe 18/11/2020) No presente caso, embora as investigações tenham se iniciado com informações de colaboradores não identificados, todos os elementos foram posteriormente confirmados através da robusta instrução probatória. O policial civil Lauro Evaner Corrêa declarou em juízo que Weiber, conhecido como Kelvin, era apontado como o responsável pelo fornecimento de drogas, especialmente para Almir Araújo Júnior. A policial Leila Giane Mensch corroborou essas informações, confirmando que Weiber ocupava posição de liderança na organização, sendo responsável por articular a aquisição, armazenamento e redistribuição de entorpecentes. O agente Rogério Alves de Souza apontou que a investigação de 45 dias identificou Weiber como principal articulador da rede de tráfico, estando acima de Almir na hierarquia criminosa. Quanto à ausência de verificação de procedência das informações, embora seja recomendável tal procedimento, sua não realização não invalida a investigação quando os dados são posteriormente confirmados por outros meios. A investigação criminal não segue um roteiro inflexível, podendo partir de informações iniciais que são depois verificadas e confirmadas através de diligências complementares, como efetivamente ocorreu nos autos. No tocante à alegada ação controlada sem autorização judicial, após minuciosa análise dos depoimentos das testemunhas Lauro Evaner Correa, Rogério Alves de Souza e Leila Giane Mensch, verifica-se que, embora tenha havido acompanhamento e monitoramento das atividades suspeitas por um período prolongado, tal conduta não se enquadra na definição técnico-jurídica de ação controlada prevista no art. 53, II, da Lei 11.343/06. A ação controlada pressupõe a não atuação policial imediata, permitindo que o crime se consuma ou se prolongue para obtenção de maiores informações sobre a organização criminosa. No caso concreto, o que se verifica é atividade investigativa regular de acompanhamento e coleta de informações, com atuação policial no momento considerado mais oportuno pelos investigadores. Os depoimentos policiais são esclarecedores sobre a natureza da atividade investigativa desenvolvida. Conforme relatado por Lauro Evaner Corrêa, Leila Giane Mensch e Rogério Alves de Souza, houve acompanhamento sistemático das atividades do grupo por 45 dias, com identificação clara dos papéis exercidos por cada membro da organização. As testemunhas foram categóricas ao apontar Weiber como líder da organização, responsável pelo fornecimento e articulação da rede de distribuição. Tal estratégia investigativa para obter o maior número possível de elementos sobre a organização criminosa antes da deflagração da operação insere-se no poder discricionário da autoridade policial para definir o momento mais adequado de intervenção, não caracterizando a omissão dolosa típica da ação controlada. Ademais, todos os elementos que subsidiaram o início das investigações encontram-se devidamente documentados nos autos através dos depoimentos das autoridades policiais responsáveis, que prestaram esclarecimentos sobre a origem das informações e os procedimentos adotados. O contraditório foi plenamente assegurado, tendo a defesa questionado as testemunhas sobre todos os aspectos da investigação. Afasto a preliminar arguida. É como o voto. VOTO PRELIMINAR - NULIDADE DO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO POR ATIPICIDADE PROCEDIMENTAL EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS Egrégia Câmara: A defesa de Weiber Kelver da Silva Felisberto suscitou preliminar de nulidade do reconhecimento fotográfico por inobservância das formalidades do art. 226 do CPP e da Resolução CNJ 484/2022, alegando ausência de alinhamento adequado entre as fotografias, falta de registro audiovisual e sugestionamento dos reconhecedores (Id. 230400102). A preliminar deve ser rejeitada. A análise do catálogo fotográfico utilizado revela clara disparidade entre as características físicas das pessoas apresentadas, com apenas o apelante possuindo tatuagem visível, elemento mencionado pelos reconhecedores como característica distintiva. Também não foi realizado registro audiovisual do procedimento, conforme exige o art. 5º, §1º, da Resolução CNJ 484/2022, nem foi questionado aos reconhecedores o grau de convencimento sobre a identificação. Todavia, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, embora tenha evoluído no sentido de exigir maior rigor na observância das formalidades do reconhecimento pessoal após o julgamento do HC 598.886/SC, não estabeleceu nulidade absoluta para todos os casos de inobservância procedimental. A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no RHC 206.846/SP, fixou importante distinção ao estabelecer que eventual condenação pode ser mantida mesmo com reconhecimento viciado, desde que fundamentada em provas independentes e não contaminadas. O mesmo entendimento tem sido mantido pelo Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ROUBO. RECONHECIMENTO DE PESSOAS. INOBSERVÂNCIA DO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART. 226 DO CPP. PROVA INVÁLIDA COMO FUNDAMENTO PARA A CONDENAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A Sexta Turma desta Corte Superior de Justiça, por ocasião do julgamento do HC n. 598.886/SC (Rel. Ministro Rogerio Schietti), realizado em 27/10/2020, conferiu nova interpretação ao art. 226 do CPP, a fim de superar o entendimento, até então vigente, de que o referido artigo constituiria "mera recomendação" e, como tal, não ensejaria nulidade da prova eventual descumprimento dos requisitos formais ali previstos. 2. Em julgamento concluído no dia 23/2/2022, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal deu provimento ao RHC n. 206.846/SP (Rel. Ministro Gilmar Mendes), para absolver um indivíduo preso em São Paulo depois de ser reconhecido por fotografia, tendo em vista a nulidade do reconhecimento fotográfico e a ausência de provas para a condenação. Reportando-se ao decidido no julgamento do referido HC n. 598.886/SC, no STJ, foram fixadas pelo STF três teses: 2.1) O reconhecimento de pessoas, presencial ou por fotografia, deve observar o procedimento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal, cujas formalidades constituem garantia mínima para quem se encontra na condição de suspeito da prática de um crime e para uma verificação dos fatos mais justa e precisa; 2.2) A inobservância do procedimento descrito na referida norma processual torna inválido o reconhecimento da pessoa suspeita, de modo que tal elemento não poderá fundamentar eventual condenação ou decretação de prisão cautelar, mesmo se refeito e confirmado o reconhecimento em Juízo. Se declarada a irregularidade do ato, eventual condenação já proferida poderá ser mantida, se fundamentada em provas independentes e não contaminadas; 2.3) A realização do ato de reconhecimento pessoal carece de justificação em elementos que indiquem, ainda que em juízo de verossimilhança, a autoria do fato investigado, de modo a se vedarem medidas investigativas genéricas e arbitrárias, que potencializam erros na verificação dos fatos. 3. Posteriormente, em sessão ocorrida no dia 15/3/2022, a Sexta Turma desta Corte, por ocasião do julgamento do HC n. 712.781/RJ (Rel. Ministro Rogerio Schietti), avançou em relação à compreensão anteriormente externada no HC n. 598.886/SC e decidiu, à unanimidade, que, mesmo se realizado em conformidade com o modelo legal (art. 226 do CPP), o reconhecimento pessoal, embora seja válido, não tem força probante absoluta, de sorte que não pode induzir, por si só, à certeza da autoria delitiva, em razão de sua fragilidade epistêmica; se, porém, realizado em desacordo com o rito previsto no art. 226 do CPP, o ato é inválido e não pode ser usado nem mesmo de forma suplementar. 4. No caso, a condenação do paciente amparou-se em reconhecimento realizado sem observância do art. 226 do CPP, uma vez que o auto de reconhecimento é completamente genérico, mais se assemelhando a um formulário padronizado, e não indica a descrição prévia concreta das características dos suspeitos, tampouco os dublês que supostamente compuseram o alinhamento e suas respectivas características. 5. Não obstante o ato de reconhecimento irregular haja sido repetido pessoalmente em juízo, a repetição do ato não convalida os vícios pretéritos. Isso porque não há dúvidas de que o reconhecimento inicial, que foi realizado em desconformidade com o disposto no art. 226 do CPP, afeta todos os subsequentes, haja vista que, conforme se assentou no julgamento do HC n. 712.781/RJ, o reconhecimento de pessoas é considerado como uma prova cognitivamente irrepetível. 6. Entretanto, não há como se concluir que a condenação haja sido lastreada, única e exclusivamente, nos reconhecimentos realizados pelas vítimas. A leitura da sentença e do acórdão indica que outros elementos foram considerados. Por essa razão, é necessário que sejam extirpados dos autos os reconhecimentos feitos em desacordo com o comando legal e determinado o retorno do feito ao Juízo singular para que profira nova sentença, sem que os leve em consideração, nem mesmo de forma suplementar. 7. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC n. 801.450/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 9/4/2025, DJEN de 15/4/2025.) O reconhecimento fotográfico, embora viciado, não constitui o único nem o principal elemento probatório da autoria. Os depoimentos colhidos durante a instrução são categóricos e convergentes. O policial civil Lauro Evaner Corrêa confirmou que Weiber era o responsável pelo fornecimento de drogas para Almir Araújo Júnior, que atuava na distribuição. A policial Leila Giane Mensch ratificou que Weiber ocupava posição de liderança, articulando a aquisição e redistribuição de entorpecentes, destacando que as mensagens extraídas dos celulares confirmam que a droga foi fornecida por ele. O agente Rogério Alves de Souza identificou Weiber como principal articulador após investigação de 45 dias, responsável pela aquisição da droga repassada para distribuição local. Soma-se a isso a robusta prova técnica produzida pelos analistas. Adriano Ferreira de Souza revelou diálogos entre Almir, Weiber e Cassiano, mostrando que Almir foi orientado por Weiber a armazenar os 22 tabletes de maconha e repassá-los ao comprador "Trucão". Diego Pereira da Silva confirmou que os dados extraídos evidenciavam tratativas entre Weiber e Almir, com orientações claras sobre o manuseio da droga. Hallex Pereira Neves reforçou que Weiber era o responsável por determinar a entrega e possivelmente a comercialização da carga, com base no conteúdo do celular de Almir. A prova testemunhal colhida sob contraditório, somada à prova técnica produzida pelos analistas, confirma com razoável segurança a atuação do apelante Weiber no fornecimento e articulação da droga. No entanto, a fragilidade do reconhecimento reforça a necessidade de que os demais elementos probatórios sejam avaliados com maior exigência quanto à sua autonomia e idoneidade. Quanto à alegação de que Cassiano Rodrigues De Oliveira negou conhecer o apelante durante seu depoimento em juízo, tal circunstância não invalida o reconhecimento anteriormente realizado, mas apenas demonstra a natural evolução da versão apresentada pelo corréu. É comum que corréus modifiquem suas versões entre a fase investigativa e a instrução processual, seja por receio de represálias, seja por estratégia defensiva. O importante é que o reconhecimento foi devidamente documentado na fase investigativa e posteriormente corroborado por outros elementos probatórios. A defesa técnica teve ampla oportunidade de questionar as testemunhas sobre todos os aspectos do reconhecimento, demonstrar as inconsistências procedimentais e exercer plenamente o contraditório. A aplicação da teoria do prejuízo, consagrada no art. 563 do CPP, exige demonstração de efetivo gravame à defesa para declaração de nulidade. No caso concreto, considerando a existência de provas autônomas e suficientes, não se verifica prejuízo concreto que justifique a anulação do feito. Rejeito a preliminar arguida. É como o voto. VOTO PRELIMINAR - NULIDADE DA DECISÃO QUE INDEFERIU PARTICIPAÇÃO NA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS Egrégia Câmara: As defesas de Marcos Vinicio de Almeida Santos e Weiber Kelver da Silva Felisberto arguiram preliminar de nulidade da decisão que condicionou a participação dos apelantes foragidos na audiência de instrução e julgamento ao cumprimento do mandado de prisão, alegando cerceamento de defesa e violação ao contraditório e ampla defesa (Ids. 230400125 e 230400102). Não é cabível o acolhimento da preliminar. O art. 185 do CPP estabelece as hipóteses de realização do interrogatório por videoconferência, prevendo tal possibilidade quando o réu se encontrar preso em comarca diversa daquela onde tramita o processo, por razões de segurança pública ou para facilitar a produção da prova. A interpretação literal do dispositivo não assegura direito irrestrito à participação virtual para réu foragido que se furta deliberadamente ao cumprimento de mandado de prisão regularmente expedido. O precedente do Supremo Tribunal Federal invocado pela defesa (HC 227.671 MC-Ref/RN) merece análise cuidadosa. Embora a Segunda Turma tenha, por unanimidade, referendado liminar assegurando o direito de participação do réu foragido em audiência de instrução, tal decisão foi proferida em sede cautelar, não constituindo ainda tese definitiva da Corte Constitucional. A atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça afirma que a participação virtual de réus foragidos em audiência de instrução e julgamento não é um direito garantido: DIREITO PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. INTERROGATÓRIO POR VIDEOCONFERÊNCIA. RÉU FORAGIDO. INDEFERIMENTO. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. (...) O entendimento consolidado do STJ e do STF é de que o interrogatório por videoconferência não é cabível para réus com mandado de prisão não cumprido, uma vez que tal procedimento poderia comprometer o dever de boa-fé objetiva nas relações processuais. A jurisprudência da Corte exige comprovação de prejuízo concreto para declaração de nulidade processual, o que não foi demonstrado pela defesa. A fundamentação da prisão preventiva do paciente encontra-se alinhada com os requisitos do art. 312 do CPP, sendo considerada idônea, por não se basear exclusivamente na gravidade abstrata do delito. O pedido apresentado no habeas corpus é uma reiteração de argumentos já analisados em recurso anterior, o que inviabiliza nova apreciação do tema. IV. DISPOSITIVO Habeas corpus não conhecido. (EDcl no AgRg no HC n. 921.931/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 11/2/2025, DJEN de 17/2/2025.) A participação virtual de réus foragidos em audiência de instrução e julgamento não é um direito garantido, conforme precedentes do STJ. A decretação de nulidade processual depende da demonstração de efetivo prejuízo, o que não foi comprovado pela defesa. (AgRg no HC n. 912.802/MG, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 4/11/2024, DJe de 6/11/2024.) Ademais, cada caso deve ser analisado conforme suas peculiaridades específicas, não sendo possível aplicação automática e indiscriminada do precedente. A questão envolve delicado equilíbrio entre o direito de defesa do acusado e a necessidade de preservar a autoridade da Justiça e desestimular a fuga de réus. A concessão irrestrita de participação virtual em audiências para todos os réus foragidos poderia representar incentivo à subtração à ação da Justiça, comprometendo a efetividade do sistema penal. O juízo de primeiro grau ponderou adequadamente tais aspectos ao condicionar a participação ao cumprimento do mandado de prisão, como consta na decisão proferida no Id. 230400268: Inicialmente, cabe ressaltar que a condução do processo penal deve ser pautada pelos princípios que garantem a efetividade da prestação jurisdicional, a ampla defesa e o contraditório, sem prejuízo da observância das normas legais e da segurança jurídica. Diante desse contexto, é necessário analisar criteriosamente as razões apresentadas pelos réus e ponderar a legitimidade de suas alegações. No presente caso, observa-se que os denunciados encontram-se foragidos, situação que, por si só, implica evidente descumprimento das determinações judiciais que ordenaram suas prisões. A utilização da videoconferência como meio de participação na audiência de instrução, nesse contexto, configuraria uma afronta às normas legais e uma desconsideração da necessidade de cumprimento das medidas restritivas impostas. É relevante ressaltar que a implementação da videoconferência nos processos judiciais, dentre as várias possibilidades e vantagens que trouxe, constitui instrumento destinado a facilitar a participação de partes e testemunhas nas audiências. No entanto, conceder aos réus foragidos a possibilidade de se valerem desse recurso para serem interrogados sem se submeterem ao cumprimento das ordens de prisão comprometeria a autoridade das decisões judiciais, demais dos princípios administrativos da legalidade (nesse caso porque é evidente caso de revelia a não comunicação do endereço atual pelo réu, conforme art. 367, CPP) e também da moralidade, sendo certo, de outro lado, que isso jamais seria possível no caso de audiência presencial. O direito de participação dos réus na audiência de instrução e julgamento é inquestionável, constituindo uma oportunidade ímpar para o exercício do contraditório e apresentação da autodefesa. Contudo, in casu, esse direito não será exercido por deliberada decisão dos próprios acusados, que optam por permanecer foragidos, desrespeitando as ordens judiciais emanadas. Caso queiram participar, basta se apresentar para o cumprimento dos mandados pendentes. O interrogatório, como meio de defesa, e os princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal demandam que se dê oportunidade ao acusado de exercer seu direito de ser ouvido em Juízo, apresentando sua versão sobre os fatos. Todavia, ao escolherem a fuga, apesar de devidamente cientes do trâmite desta ação penal e das imputações que lhe são atribuídas, os requerentes renunciam a esse direito, cabendo às defesas técnicas devidamente constituídas representá-los no que couber. Cabe destacar que o direito de presença nos atos processuais não é absoluto e irrenunciável, de modo que o não comparecimento dos acusados em audiência não enseja, invariavelmente, a declaração de nulidade do ato. Nesse caso específico, aliás, à luz dos fundamentos acima consignados, não vejo qualquer nulidade a ser reconhecida. Não houve qualquer prejuízo ao direito de defesa dos apelantes. As defesas atuaram em todos os atos processuais, apresentando defesa preliminar fundamentada e tecnicamente adequada, participando ativamente da instrução probatória com questionamentos pertinentes às testemunhas, exercendo plenamente o contraditório e oferecendo alegações finais abrangentes e bem estruturadas. Todos os argumentos defensivos foram devidamente apresentados e apreciados, não se verificando qualquer mácula ao devido processo legal. O interrogatório do réu, embora importante meio de defesa, constitui faculdade processual e não obrigação, conforme entendimento consolidado na jurisprudência. Sua ausência, quando há representação técnica adequada e eficaz, não compromete a validade do processo nem prejudica o exercício do direito de defesa. O apelante teve todas as oportunidades processuais para apresentar sua versão dos fatos através de seu defensor constituído e impugnar adequadamente as provas produzidas pela acusação. Afasto, assim, a preliminar. É como o voto. VOTO MÉRITO EXMO. SR. DES. JONES GATTASS DIAS Egrégia Câmara: Superada as preliminares arguidas, passo ao exame do mérito dos recursos interpostos. I – Quanto ao recurso interposto pelo Ministério Público. a) Condenação de John Lennon de Souza Fernandes pelo crime de tráfico de drogas. O Ministério Público sustenta que há provas robustas de que John Lennon de Souza Fernandes praticava tráfico de drogas em sua conveniência Euclides, baseando-se principalmente nos depoimentos dos investigadores Lauro Evaner Corrêa, Leila Giane Mensch e Rogério Alves De Souza, que afirmaram ter presenciado entregas de drogas no local, bem como nas fotografias que mostrariam Almir e Cassiano entregando entorpecentes na conveniência. O pedido não comporta acolhimento. As fotografias constantes dos autos foram tiradas de local distante, com baixa qualidade e pouca nitidez, não sendo possível visualizar sequer a placa do automóvel, tampouco as pessoas que estariam no local ou a comprovação efetiva do fornecimento de entorpecentes. A magistrada de primeiro grau observou que não restou provado que os réus Weiber, Cassiano e Almir tenham efetivamente fornecido entorpecente ao denunciado John Lennon, não havendo provas concretas nesse sentido – Id. 230400028: Não obstante a denúncia atribua a JHON LENON DE SOUZA FERNANDES a conduta de ser um dos responsáveis por revender a droga que era comercializada por WEIBER e distribuída por ALMIR e CASSIANO, verifica-se que a única conduta comprovada nos autos em seu desfavor foi o fato de ter promovido a destruição de seu aparelho telefônico por ocasião da abordagem policial, o que constitui fato atípico e não pode conduzir à conclusão de que estaria praticando o tráfico de drogas, sem embargo de tal ação constituir conduta suspeita. Destaco, por oportuno, que a constatação de que os réus tentaram quebrar os aparelhos celulares, isoladamente, quando desacompanhada de outros elementos, é insuficiente para concluir que se tratavam de integrantes da organização criminosa Comando Vermelho, o que deve ser corroborado por outros elementos. Observa-se, portanto, que o conjunto probatório produzido in casu autoriza a condenação dos acusados ALMIR ARAUJO JUNIOR, CASSIANO RODRIGUES DE OLIVEIRA, MARCOS VINÍCIO DE ALMEIDA SANTOS, WEIBER KELVER DA SILVA FELISBERTO e THIAGO SOUZA FERREIRA, nos termos pretendidos pelo Ministério Público, à luz de tudo quanto foi acima mencionado. No tocante ao acusado JHON LENON DE SOUZA FERNANDES, ainda que existam indícios sobre a autoria delitiva, tais circunstâncias, por si sós, não autorizam o decreto condenatório, sendo imperioso aplicar-se ao caso o princípio do in dubio pro reo, em que a dúvida acerca do envolvimento do acusado no crime investigado resulta no afastamento da conduta delitiva a ele atribuída. Durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão na conveniência Euclides, não foram encontradas drogas, petrechos para tráfico ou qualquer elemento material que comprovasse a mercancia no local. A única conduta comprovada foi a destruição do aparelho telefônico por ocasião da abordagem policial, que, embora suspeita e típica de integrantes de organizações criminosas, constitui fato atípico quando isolado, não sendo suficiente para configurar o crime de tráfico de drogas. O investigador Adriano Ferreira de Souza, responsável pela análise dos dados extraídos dos aparelhos celulares, foi categórico ao afirmar que não localizou nenhum conteúdo relacionado ao acusado John Lennon, nem contato salvo com esse nome no aparelho analisado. Da mesma forma, o analista Diego Pereira da Silva confirmou que, no conteúdo acessado dos celulares, não foram localizadas menções aos nomes de John Lennon, tampouco referências à conveniência "Euclides". O conjunto probatório não ultrapassa, portanto, o patamar de meros indícios, sendo insuficiente para sustentar um decreto condenatório. O princípio constitucional da presunção de inocência e a regra do in dubio pro reo, consagrada no art. 386, VII, do CPP, impõem a manutenção da absolvição quando não existir prova suficiente para a condenação. b) Quanto à condenação por associação para o tráfico de drogas. O segundo ponto da irresignação ministerial refere-se à condenação de todos os réus pelo crime de associação para o tráfico de drogas. A pretensão recursal não é cabível. O crime de associação para o tráfico de drogas exige para sua configuração a presença de dois ou mais agentes, a finalidade específica de traficar e, ainda, a estabilidade e permanência do vínculo associativo. É necessário que seja demonstrado o animus associativo, ou seja, a vontade de se associar com estabilidade e permanência para a prática do tráfico de drogas. Nesse sentido, ensina a doutrina: Nos expressos termos do art. 35, haverá o crime de associação para o tráfico, quer a união seja para a prática de um, quer para a de vários crimes. É preciso salientar, todavia, que o tipo penal pressupõe uma “associação” para o tráfico, de modo que, embora o art. 35 não exija a finalidade de reiteração criminosa, faz-se necessário um prévio ajuste entre as partes, um verdadeiro pacto associativo, de modo que a reunião meramente ocasional não caracteriza o delito. Na prática, para fazer valer tal distinção, leva-se em conta o grau de organização, a gravidade da conduta e, evidentemente, a intenção de reiteração criminosa. (GONÇALVES, Victor Eduardo Rios; BALTAZAR, José Paulo. Legislação Penal Especial. 8. ed. - São Paulo: SaraivaJur, 2022. pág. 262) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no mesmo sentido: Para a configuração do delito de associação para o tráfico, exige-se a demonstração da estabilidade e permanência no vínculo entre os agentes, não bastando a realização ocasional de atos relacionados ao tráfico de drogas. Esse entendimento é pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ). (REsp n. 2.052.196/MG, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 17/12/2024, DJEN de 6/1/2025.) Para a caracterização do crime de associação para o tráfico, é imprescindível o dolo de se associar com estabilidade e permanência, não bastando a mera coautoria delitiva. A principal deficiência probatória reside na demonstração da estabilidade, permanência e hierarquia da suposta associação. O Relatório de Análise nº 090/2023, acostado no Id. 230399726, embora detalhado tecnicamente, abrange apenas as conversas dos dias 8 e 9 de agosto de 2023, ou seja, um período extremamente limitado de apenas dois dias. O investigador Diego Pereira da Silva esclareceu que as conversas de dias anteriores foram deletadas e que apenas os diálogos dos dias 8 e 9 foram contextualizados, sendo estes os que levaram à prisão. Esta limitação temporal é fatal para a caracterização da associação, pois impede a demonstração da estabilidade e permanência exigidas pelo tipo penal. Não se pode inferir a existência de uma organização criminosa estável com base apenas em conversas de dois dias, especialmente quando estas se referem a uma operação específica que resultou na prisão dos envolvidos. Quanto à suposta hierarquia organizacional entre Weiber, Almir e Cassiano, os elementos probatórios são insuficientes para demonstrar uma estrutura de comando consolidada. Embora o Ministério Público sustente que Weiber exercia papel de liderança, Almir de armazenamento e Cassiano de transporte, esta divisão de funções não ultrapassa a distribuição de tarefas típica de coautoria em crime específico. As conversas interceptadas revelam negociações pontuais para a comercialização de uma carga determinada de entorpecentes, não evidenciando subordinação hierárquica ou comando estruturado e permanente para caracterização do vínculo associativo para o comércio de substância entorpecente. Almir, em seu interrogatório, esclareceu que conheceu Weiber em um grupo de WhatsApp vinculado a uma tabacaria e que aceitou guardar a droga em razão de dificuldades financeiras, indicando relacionamento ocasional e motivação específica, não subordinação hierárquica permanente. A linguagem utilizada nas conversas, embora possa sugerir coordenação, não demonstra relação de comando e obediência típica de estrutura organizacional criminosa, mas sim negociação entre coautores em operação específica. Cassiano, por sua vez, sustenta ter sido contratado como motorista de aplicativo para uma corrida específica, desconhecendo a natureza da carga. Embora sua versão seja questionável diante do valor pago e das circunstâncias do fato, isso não autoriza o salto lógico para concluir pela existência de associação hierarquizada. Sua eventual participação consciente no transporte da droga caracteriza, quando muito, coautoria no tráfico específico, não subordinação a estrutura de comando permanente. A ausência de hierarquia fica ainda mais evidente quando se considera que não há prova de que Weiber desse ordens sistemáticas aos demais, que Almir prestasse contas regulares de suas atividades, ou que Cassiano atuasse como subordinado permanente. As conversas revelam tratativas comerciais pontuais, não relação de comando estruturada. Não há demonstração de códigos de conduta, regras internas, sanções disciplinares ou outros elementos típicos de organização hierarquizada. A sentença recorrida foi acertada ao observar que não foi produzida prova no sentido de demonstrar há quanto tempo estava sendo promovida a mercancia de entorpecentes e que não há qualquer elemento concreto que comprove que os réus tenham praticado a mercancia de entorpecentes em data anterior à prisão. A magistrada destacou – Id. 230400028: Contudo, verifica-se que os diálogos travados entre os réus são recentes, tendo ocorrido pouco antes da prisão, e se referiam especificamente à negociação da expressiva quantidade de entorpecente que foi apreendida pelos policiais. O fato de a operação envolver 32 tabletes, dos quais 5 teriam sido destinados a Juína-MT, não comprova necessariamente hierarquia associativa preexistente, podendo indicar apenas a magnitude da operação específica objeto da prisão. A referência a experimentos e negociações pode estar relacionada à tentativa de comercialização daquela carga específica, não a múltiplas operações sob comando hierárquico estruturado. No que se refere ao grupo formado por Thiago e Marcos, a situação é ainda mais frágil em termos de hierarquia e estabilidade. Marcos confessou ter comercializado cocaína por dois meses, mas esta confissão isolada não demonstra subordinação hierárquica a Thiago ou estrutura organizacional definida. Thiago nega conhecimento das atividades ilícitas do funcionário, e não há prova cabal de que exercesse comando sobre as atividades de tráfico ou que houvesse estrutura hierarquizada entre ambos. Ademais, não há demonstração de que os dois grupos (Weiber/Almir/Cassiano e Thiago/Marcos) mantivessem qualquer vínculo associativo ou hierárquico entre si. As drogas eram de natureza distinta, as investigações ocorreram de forma independente, e não há prova de comando unificado, estrutura organizacional comum ou hierarquia que abrangesse todos os acusados. Os depoimentos policiais, embora mencionem monitoramentos de aproximadamente dois meses, referem-se ao período de investigação, não necessariamente à duração da suposta associação para o tráfico de drogas ou à existência de hierarquia entre os investigados. Como bem observado na sentença, “os próprios policiais admitiram que, por ocasião dos monitoramentos realizados em datas anteriores à prisão, não tinham certeza de que os réus estavam fazendo a distribuição de drogas” – Id. 230400028. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme ao exigir prova robusta da associação com todos os seus elementos: AGRAVO REGIMENTAL MINISTERIAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO CONCRETA DA ESTABILIDADE E DA PERMANÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Na hipótese, a pretensão do agravante não demanda o reexame aprofundado de provas, mas tão somente a revaloração jurídica dos fatos já expressamente delineados pelas instâncias ordinárias. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que "Para a configuração do delito de associação para o tráfico de drogas, é necessário o dolo de se associar com estabilidade e permanência, sendo que a reunião de duas ou mais pessoas sem o animus associativo não se subsume ao tipo do art. 35 da Lei n. 11.343/2006. Trata-se, portanto, de delito de concurso necessário" (HC n. 434.972/RJ, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 26/6/2018, DJe de 1º/8/2018). 3. Caso em que os fundamentos utilizados para reformar a sentença não foram suficientes para a condenação pelo delito de associação criminosa. Conforme concluiu a sentença, "embora os investigadores de polícia e os policiais militares ouvidos em Juízo tenham relatado a prática da traficância em situações pontuais entre alguns réus, não conseguiram apontar com precisão o ânimo associativo", também não se extraindo tal constatação do relatório de interceptação telefônica. De igual modo, em momento algum, o Tribunal de origem fez referência a algum fato concreto que demonstrasse o vínculo associativo estável e permanente porventura existente entre os envolvidos. 4. Constatada a mera associação eventual entre os acusados para a prática do tráfico de drogas, deve ser restabelecida a sentença absolutória em favor da ora agravada, com efeitos extensivos aos corréus, nos termos do art. 580 do CPP. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.637.920/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 4/2/2025, DJEN de 13/2/2025.) A jurisprudência deste e. Tribunal de Justiça possui o mesmo entendimento: O crime de associação para o tráfico de drogas, previsto no art. 35 da Lei n. 11.343/2006, exige, para a sua caracterização, a associação estável e permanente de dois ou mais agentes, agrupados com a finalidade de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 do referido diploma legal, de modo que não havendo, nestes autos, provas do animus associativo, de caráter estável e duradouro, procede o pleito absolutório dos apelantes quanto ao referido delito. (N.U 0001776-56.2017.8.11.0002, Luiz Ferreira da Silva, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 23/10/2024, Publicado no DJE 27/10/2024) O conjunto probatório não demonstra a estabilidade, permanência e hierarquia exigidas pelo tipo penal, limitando-se a evidenciar coautoria em crimes específicos de tráfico. O Relatório de Análise nº 090/2023, embora tecnicamente elaborado, abrange período insuficiente para caracterizar a associação criminosa, revelando apenas negociações relacionadas a operação específica, sem demonstrar subordinação hierárquica ou comando estruturado. A ausência de prova sobre a duração da suposta associação, aliada às limitações temporais das interceptações e à falta de demonstração de hierarquia organizacional, impede o reconhecimento do delito previsto no art. 35 da Lei 11.343/06. II – Quanto ao recurso interposto por Cassiano Rodrigues de Oliveira. a) Erro de tipo. A defesa postula a absolvição do apelante Cassiano Rodrigues de Oliveira do crime de tráfico de drogas, argumentando a ocorrência de erro de tipo provocado por terceiro. Sustenta que o apelante desconhecia por completo a existência dos ilícitos que estavam acondicionados dentro da mala carregada pelo corréu Almir, alegando que apenas prestava serviços como motorista de aplicativo e foi ludibriado pelo corréu. O pleito não merece acolhimento. O erro de tipo, previsto no art. 20 do Código Penal, caracteriza-se como a falsa representação ou ignorância da realidade fática, o que afasta o dolo da conduta do agente. Para sua configuração, é necessário que o agente, por desconhecimento ou falsa percepção dos elementos constitutivos do tipo penal, pratique a conduta sem a consciência necessária para a tipificação dolosa. No crime de tráfico de drogas, o dolo consiste na vontade livre e consciente de praticar qualquer das condutas descritas no art. 33 da Lei 11.343/06, com conhecimento de que se trata de substância entorpecente. A análise detalhada das provas demonstra que o apelante Cassiano possuía plena ciência da natureza ilícita do material transportado, não havendo falar em erro de tipo. O policial civil Lauro Evaner Corrêa relatou que Cassiano era apontado nas investigações como colaborador direto de Almir na distribuição de drogas. Durante o monitoramento, foi possível observar Cassiano utilizando veículos registrados em nome de terceiros em ações suspeitas de entrega de entorpecentes. No dia da prisão, quando abordado, tentou quebrar seu celular, conduta típica de integrantes de facções criminosas. A investigadora Leila Giane Mensch narrou que, no dia 7 de agosto, Cassiano e Almir foram vistos parando em dois estabelecimentos comerciais conhecidos como pontos de tráfico. Em 9 de agosto, observou Cassiano chegar à residência de Almir, que então carregou uma mala pesada no HB20 conduzido por Cassiano. Destacou as versões contraditórias: Almir afirmou que Cassiano sabia da carga e receberia R$ 100,00 pela entrega, enquanto Cassiano alegou que receberia apenas R$ 40,00 e desconhecia o conteúdo. A investigadora também mencionou que ambos já haviam sido conduzidos juntos pela polícia em 2014 por porte de arma, contradizendo a versão de que não mantinham relação próxima. O agente Rogério Alves de Souza confirmou que Cassiano tentou destruir seu celular no momento da prisão, conduta compatível com o modus operandi de membros de facções criminosas. Ressaltou que no dia anterior ambos já haviam sido vistos juntos em locais suspeitos de comercialização de drogas. O analista Adriano Ferreira de Souza esclareceu que as mensagens recuperadas do celular de Almir indicavam claramente uma associação entre Almir, Weiber e Cassiano. Cassiano era citado como o "Uber de confiança" encarregado do transporte dos tabletes de maconha. A análise indicou contato recorrente com Almir, sendo listado na agenda telefônica com vários números. O tom das conversas sugeria que Cassiano tinha plena ciência da natureza ilícita do transporte. O próprio corréu Almir Araújo Júnior declarou que Cassiano inicialmente alegou não saber do conteúdo, mas durante a corrida questionou sobre o cheiro da mala, sendo então confirmado que se tratava de maconha. As circunstâncias evidenciadas demonstram que não houve erro de tipo, mas sim plena consciência do apelante quanto à natureza ilícita da conduta praticada. Os elementos probatórios revelam: a) Relacionamento anterior entre Cassiano e Almir desde 2014, com histórico de conduções policiais conjuntas; b) Monitoramento policial que flagrou ambos em estabelecimentos conhecidos como pontos de tráfico; c) Tentativa de destruição do celular no momento da abordagem, conduta típica para ocultar provas; d) Referência a Cassiano como "Uber de confiança" nas comunicações entre os traficantes; e) Contradições entre as versões apresentadas pelos envolvidos; f) Conhecimento do conteúdo durante o transporte, conforme admitido pelo próprio Almir. A alegação de desconhecimento não encontra amparo no conjunto probatório, que demonstra inequivocamente o dolo do agente na prática do crime de tráfico de drogas. b) Absolvição por insuficiência probatória. A defesa de Cassiano sustenta que as provas dos autos são insuficientes para sustentar a condenação de Cassiano, argumentando que se baseiam apenas em depoimentos policiais e elementos informativos não documentados, sem comprovação concreta da participação do apelante no crime de tráfico. A materialidade delitiva está devidamente comprovada pelo auto de prisão em flagrante (Id. 230398692), boletim de ocorrência (Id. 230398694), laudo pericial que atestou a natureza entorpecente da substância apreendida (Id. 230399670), bem como pela prova oral produzida durante a instrução processual. A autoria é evidenciada pela prova testemunhal harmônica e coerente, que demonstra a participação consciente do apelante no transporte da droga, não havendo falar em ausência de provas suficientes para a condenação. É sabido que o depoimento de agentes policiais constitui meio de prova idôneo, especialmente quando apresentado em harmonia com as demais provas dos autos e colhido sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Em especial nos crimes de tráfico de droga, o testemunho dos agentes integrantes das forças de segurança pública que atuam diretamente ao combate ao tráfico possui especial relevância, sobretudo em virtude do caráter clandestino das infrações. O conjunto probatório demonstra de forma robusta a participação consciente do apelante no crime de tráfico de drogas. O policial civil Lauro Evaner Corrêa detalhou que Cassiano era conhecido pelo apelido "Keka" e era apontado nas investigações como colaborador direto de Almir na distribuição de drogas. Explicou que durante o monitoramento foi possível observar Cassiano utilizando veículos registrados em nome de terceiros, mas de seu uso habitual, em ações suspeitas de entrega de entorpecentes. A investigadora Leila Giane Mensch descreveu minuciosamente o acompanhamento das atividades suspeitas. Narrou que no dia 7 de agosto Cassiano e Almir foram vistos parando em dois estabelecimentos comerciais conhecidos como pontos de tráfico. Relatou que em 09 de agosto observou Cassiano chegar à residência de Almir, que então carregou uma mala pesada no veículo HB20. Destacou que em 2021 foram encontrados objetos comumente associados ao tráfico na residência de Cassiano durante cumprimento de mandado de busca. O analista de inteligência Adriano Ferreira de Souza explicou que foi responsável pela análise técnica dos dados extraídos do celular de Almir. Detalhou que as mensagens recuperadas indicavam claramente uma associação entre Almir, Weiber e Cassiano, sendo este último citado como o "Uber de confiança" encarregado do transporte dos tabletes de maconha. Esclareceu que Cassiano possuía contato recorrente com Almir, sendo listado na agenda telefônica com vários números. O analista Diego Pereira da Silva confirmou que Cassiano foi citado nas conversas extraídas do celular de Almir, sendo indicado como o condutor da entrega de drogas. Ressaltou que embora Cassiano não participasse diretamente dos diálogos analisados, foi mencionado por Almir como alguém confiável para realizar a entrega, o que indica conhecimento prévio da ilicitude da operação. O relatório acostado no Id. 230399726 demonstra que Cassiano Rodrigues de Oliveira, também conhecido pelo vulgo “Keka”, seria o responsável por transportar, em seu veículo, o investigado Almir Araújo Júnior (vulgo “Júnior”) até o local onde seria realizada a entrega de 22 tabletes de substância análoga à maconha, totalizando aproximadamente 13,87 kg. A entrega estava previamente combinada com um terceiro indivíduo, identificado como “Trucão Kelvin”. Segundo consta, Cassiano participou ativamente da logística do transporte da droga, e, conforme diálogo interceptado entre os investigados, Cassiano possuía ciência do conteúdo ilícito que estava sendo conduzido, o que reforça sua vinculação direta com a ação criminosa descrita nos autos da investigação policial. Ao contrário do alegado pela defesa, as provas não se limitam a meros depoimentos policiais isolados, mas constituem um robusto conjunto probatório que inclui: a) Análise técnica de dados telefônicos que demonstra a prática delitiva entre os envolvidos; b) Monitoramento policial que registrou atividades suspeitas em locais conhecidos pelo tráfico; c) Apreensão de grande quantidade de droga (13,42 kg de maconha) durante o transporte; d) Tentativa de destruição de provas (celular) no momento da abordagem. O tráfico de drogas se manifesta de diversas formas e com diferentes graus de sofisticação, sendo que pequenos traficantes muitas vezes não utilizam esses aparatos, valendo-se de instrumentos caseiros para a medição das porções ou operando em estágios específicos da cadeia de distribuição. Conforme estabelecido pelo enunciado orientativo de nº 07 da Tuma de Câmaras Criminais Reunidas deste E. Tribunal de Justiça: “o delito de tráfico de drogas, previsto no art. 33 da Lei n. 11.343/2006, é classificado como de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas”. O tipo penal do art. 33 da Lei de Drogas é misto alternativo, criminalizando diversas condutas, entre as quais o simples ato de “ter em depósito” ou “guardar” substância entorpecente para fins de tráfico. Diante do conjunto probatório apresentado, não vislumbro possibilidade de aplicação do princípio do in dubio pro reo, devendo a condenação pelo crime de tráfico de drogas ser mantida. c) Exasperação da pena-base. A defesa de Cassiano Rodrigues de Oliveira postula a readequação da pena-base, argumentando que a exasperação em 02 (dois) anos por única circunstância judicial negativa (quantidade e natureza do entorpecente) é desproporcional, devendo ser aplicada a fração de 1/6 (um sexto). O pleito não merece acolhimento. Nos crimes de tráfico de drogas, é possível ao juízo analisar, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e quantidade da substância entorpecente, conforme estabelecido no art. 42 da Lei 11.343/06. A negativação do vetor é perfeitamente admissível, porquanto é sabido que tanto a natureza quanto a quantidade da droga apreendida constituem fundamentos idôneos para fixar a pena-base acima do mínimo legal. Na espécie, a apreensão de 13,42 kg de maconha representa quantidade expressiva que justifica a majoração da pena-base. A substância estava organizada em tabletes, evidenciando destinação comercial e estrutura organizada para o tráfico. Considerando a expressiva quantidade de entorpecente apreendida e a natureza altamente deletéria da substância, o aumento aplicado pelo juízo singular mostra-se proporcional e adequado às circunstâncias do caso concreto. No que tange ao quantum de aumento aplicado pela magistrada singular, este Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de que: Inexiste critério estritamente aritmético aplicável para fixação da pena-base, de modo que cada circunstância judicial pode ser valorada e quantificada de maneira distinta, por meio de juízo de discricionariedade, observando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (Enunciado n° 39 TJMT). O Superior Tribunal de Justiça é posicionado no sentido de que: DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. NÃO CONHECIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO. DOSIMETRIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I. Caso em exame. 1. Agravo regimental interposto contra decisão monocrática que não conheceu do habeas corpus, no qual foi alegada ilegalidade na manutenção da condenação por tráfico de drogas e pleiteada desclassificação para uso pessoal. 2. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a condenação por tráfico de drogas, destacando elementos que suportam a condenação, como a quantidade e a forma de acondicionamento das drogas, além de depoimentos que indicam a destinação mercantil do entorpecente. II. Questão em discussão. 3. A questão em discussão consiste em saber se é possível a desclassificação do crime de tráfico de drogas para uso próprio, considerando a quantidade de droga apreendida e os depoimentos que indicam o envolvimento do paciente com o tráfico. 4. Outra questão é verificar se há flagrante ilegalidade também na dosimetria da pena que justifique a concessão do habeas corpus de ofício. III. Razões de decidir. 5. A desclassificação do crime de tráfico para uso próprio não procede, pois a quantidade de droga apreendida e os depoimentos indicam a destinação mercantil do entorpecente. 6. A dosimetria da pena foi corretamente aplicada, com exasperação da pena-base em 1/6 pelos maus antecedentes e agravante da reincidência na segunda etapa, sem incidência do redutor do tráfico privilegiado devido à reincidência do paciente. 7. O habeas corpus não é conhecido, pois não se presta à apreciação de alegações que demandam revolvimento do conjunto fático-probatório, salvo em casos de flagrante ilegalidade, o que não se verifica no presente caso. IV. Dispositivo e tese. 8. Agravo regimental desprovido. Tese de julgamento: "1. A desclassificação do crime de tráfico para uso próprio é inviável quando a quantidade de droga e os depoimentos indicam destinação mercantil. 2. O habeas corpus não se presta à revisão de provas, salvo em casos de flagrante ilegalidade. 3. A dosimetria da pena pode considerar maus antecedentes e reincidência em fases distintas sem configurar bis in idem." (AgRg no HC n. 951.194/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 26/3/2025, DJEN de 8/4/2025.) Na espécie, considerando a expressiva quantidade de droga apreendida, não vislumbro desproporcionalidade na fixação da pena-base, plenamente adequada à gravidade concreta do delito e às circunstâncias pessoais do agente. Portanto, não há que se falar em redimensionamento da pena-base. d) Restituição do veículo apreendido. O apelante Cassiano requer o afastamento do perdimento do veículo, alegando que o bem é de propriedade de sua avó. Não é cabível o pedido. No tocante ao perdimento dos bens, a sentença fundamentou adequadamente a decretação da perda, com base no art. 91, inciso II, alínea "b", do Código Penal e art. 63 da Lei 11.343/2006, tendo em vista a utilização direta do veículo na prática do crime de tráfico de drogas. Sendo comprovada a propriedade do veículo por terceiro de boa-fé e não havendo demonstração de que era utilizado habitualmente para a prática do tráfico de drogas, impõe-se a restituição do bem, nos termos do art. 120 do Código de Processo Penal. Cabe ressaltar que a restituição do bem deverá ser requerida diretamente pela legítima proprietária, Graciela Rodrigues da Silva, mediante pedido específico ao juízo de origem, com a devida comprovação de propriedade e cumprimento das formalidades legais previstas no art. 120 do CPP. III – Quanto ao recurso interposto por Weiber Kelver da Silva Felisberto. a) Em relação ao pedido de absolvição. A defesa postula a absolvição do apelante Weiber, ao argumento de que as provas dos autos são insuficientes para sustentar a condenação. Sustenta que todos os elementos de provas estão consubstanciados em informações não documentadas nos autos, aliados à ausência de cabal identificação do apelante como sendo um dos interlocutores constantes do relatório de análise n. 090/2023 NI/DERF/ROO. Argumenta que a investigação não realizou diligências no sentido de identificar o proprietário da linha telefônica a partir do ICCID (SIM CARD) e que os corréus negaram conhecer o apelante em juízo. O pleito não procede. Em delitos de tráfico de drogas, o depoimento de agentes policiais é considerado meio de prova idôneo, especialmente quando apresentado em harmonia com as demais provas dos autos e colhido sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Em especial nos crimes de tráfico de droga, o testemunho dos agentes integrantes das forças de segurança pública, que atuam diretamente ao combate ao tráfico, tem se mostrado de enorme relevância, sobretudo em virtude do caráter clandestino das infrações, que exige o desenvolvimento de contato direto com usuários, moradores e testemunhas, para a identificação dos responsáveis pela prática criminosa. Na espécie, não há dúvidas quanto à participação do apelante Weiber Kelver da Silva Felisberto no esquema de tráfico de drogas, conforme demonstrado pelo robusto conjunto probatório colhido ao longo da instrução. A materialidade delitiva está comprovada pelo boletim de ocorrência, auto de apreensão dos entorpecentes (22 tabletes de maconha), laudo pericial definitivo e prova oral colhida em ambas as fases processuais. A autoria também é evidenciada pela prova oral produzida ao longo da instrução probatória, em especial pelos depoimentos das testemunhas policiais que atuaram na investigação. O investigador Lauro Evaner Corrêa esclareceu que o apelante Weiber, conhecido como "Kevin", era o proprietário da droga apreendida, constituída por 22 tabletes de maconha trazida de fora da cidade, inclusive de Juína. Detalhou que o apelante era responsável por negociar e articular a venda dos entorpecentes, utilizando Almir como armazenador e Cassiano como transportador. Confirmou que as conversas via WhatsApp entre os acusados corroboravam essa função coordenadora de Weiber no tráfico, conforme relatório acostado no Id. 230399726. No mesmo sentido, a investigadora Leila Giane Mensch relatou que Weiber, junto com Almir, abastecia pontos de venda de drogas em Rondonópolis e Juína, sendo o primeiro o responsável pela aquisição e articulação da distribuição. Narrou que Almir reconheceu Weiber por fotografia como fornecedor e que Cassiano também o identificou. Explicou que a droga seria dividida entre os mercados locais e Juína. O investigador Rogério Alves de Souza confirmou que Weiber exercia função hierarquicamente superior na organização e que os 22 tabletes de maconha seriam entregues a mando dele. Detalhou a existência de tratativas diretas entre Almir, Weiber e Cassiano sobre a entrega da droga. Além disso, o analista Adriano Ferreira de Souza, responsável pela análise de dados extraídos do celular de Almir, confirmou que os registros revelaram instruções diretas de Weiber a Almir sobre armazenamento e entrega de entorpecentes, bem como a designação de Cassiano como "Uber de confiança". De igual modo, Diego Pereira da Silva, também analista de inteligência, confirmou que as conversas analisadas mostravam diálogos entre Weiber e Almir sobre a entrega dos entorpecentes e mencionavam Cassiano como responsável pelo transporte, com pagamento combinado antecipadamente. O investigador Hallex Pereira Neves reiterou que Almir agia sob orientação direta de Weiber, sendo este o responsável por adquirir e distribuir a droga. Esclareceu que os dados extraídos indicavam dificuldades na venda local, cogitando-se envio para Juína. Nesse panorama, ao contrário do alegado pela defesa, a prova é robusta para ensejar e manter a condenação prolatada, notadamente porque os depoimentos dos agentes policiais foram detalhados, coesos, harmônicos e acompanhados da análise de dados extraídos dos aparelhos celulares e do reconhecimento por parte dos corréus. Importante destacar que as declarações de agentes policiais merecem credibilidade, principalmente quando corroborados pelos demais elementos de provas nos autos e ausentes indícios de que houvesse motivos pessoais para a incriminação injustificada dos investigados. Nesse mesmo sentido, ressalta-se julgado do Superior Tribunal de Justiça: A palavra dos policiais - quando em harmonia com as demais provas dos autos - tem a mesma força probante de qualquer outro testemunho e é apta a embasar a condenação." (AgRg no AREsp n. 2.460.755/PR, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 27/11/2024). O fato de se tratar de agente do sistema de segurança, em nada desmerece a prova judicializada, até porque não há qualquer indicação concreta de que os policiais ouvidos tivessem interesse em prejudicar o apelante, imputando-lhe falsamente a prática de crimes. Ademais, os depoimentos convergem ao demonstrar que Weiber exercia papel central e diretivo no esquema criminoso, sendo o elo responsável pela compra, controle e direcionamento da droga, enquanto os demais desempenhavam funções subordinadas de armazenamento e transporte. Como bem ressaltada pela magistrada ao proferir a sentença: A medida de quebra de sigilo de dados telefônicos deferida por este Juízo apurou que, no dia 08/08/2023, no diálogo entre o denunciado WEIBER, vulgo “KELVIN”, que na oportunidade operava o terminal telefônico (11) 94225-3483, perfil “Kelvin Novo” WhatsApp, com ALMIR ARAÚJO, vulgo “JÚNIOR”, referidos denunciados estabelecem tratativas para a venda de 22 (vinte e dois) tabletes de Maconha, quando também comentam sobre as dificuldades para encontrar um comprador para a referida droga. Além disso, contatou-se que, no dia 09/08/2023, WEIBER e ALMIR conversaram sobre a negociação de entorpecente na posse deste último, com a pessoa identificada por “TRUCAO KELVIN”, terminal +5566996116963, que demonstrou interesse em ficar com a droga, avençando que ALMIR ficaria incumbido de fazer a sua entrega, próximo à Praça do Bairro Mathias Neves, e, para tanto, estabeleceu contato com o denunciado CASSIANO, vulgo “KEKA”, que, de sua vez, utilizaria o seu veículo para levá-los ao local da entrega do entorpecente. Convém destacar que, por ocasião da conversa com o comprador do entorpecente, ALMIR envia mensagem a “TRUCAO KELVIN” para informá-lo que está apenas aguardando o Uber para ir ao seu encontro, ocasião em que “TRUCAO KELVIN” questiona se seria seguro fazer o transporte da droga por UBER, pois temia qualquer intercorrência; porém, ALMIR o tranquiliza, dizendo “este uber é de boa”, referindo-se ao denunciado CASSIANO, vulgo “KEKA”. Em que pese o acusado WEIBER esteja foragido, não há dúvidas de que ele é efetivamente um dos autores do crime, notadamente em virtude do conteúdo das mensagens obtidas por meio da quebra de sigilo de dados deferida por este Juízo, que comprovam que ele era um dos interlocutores da negociação e proprietário da droga, aliado aos termos de reconhecimento fotográfico anexados nos IDs 130119041 e 130119045. Não restou provado, por outro lado, que os réus WEIBER, CASSIANO e ALMIR tenham efetivamente fornecido entorpecente aos denunciados JHON LENNON, THIAGO SOUZA e MARCOS VINÍCIO (Relatório policial n. 2023.13.70731, ID 130119204), não tendo havido provas concretas nesse sentido. Quanto à alegação de que não foi realizada a identificação do proprietário da linha telefônica, tal circunstância não afasta a autoria delitiva, uma vez que a participação do apelante foi confirmada por múltiplos elementos probatórios, incluindo o reconhecimento pelos corréus e a análise dos dados extraídos dos aparelhos celulares. A pretensão absolutória fundada na ausência de provas não prospera, dado que restou devidamente caracterizado o crime de tráfico de drogas. b) Em relação à dosimetria da pena. Weiber Kelver da Silva Felisberto postula a redução da pena-base para o mínimo legal, argumentando ausência de proporcionalidade e fundamentação concreta quando da valoração das circunstâncias judiciais, especialmente quanto à natureza e quantidade do entorpecente. Sem razão o pedido defensivo. Na primeira fase, o juízo negativou o vetor da quantidade e natureza dos entorpecentes, fixando a pena-base em 07 (sete) anos de reclusão, o que corresponde a 02 (dois) anos acima do mínimo legal. Em que pese os argumentos defensivos, a negativação do vetor é perfeitamente admissível, porquanto é sabido que tanto a natureza quanto a quantidade da droga apreendida constituem fundamentos idôneos para fixar a pena-base acima do mínimo legal. Considerando a expressiva quantidade de entorpecente apreendida (22 tabletes de maconha) e a natureza altamente deletéria da substância, o aumento aplicado pelo juízo singular mostra-se proporcional e adequado às circunstâncias do caso concreto. No que tange ao quantum de aumento aplicado pela magistrada singular, este Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de que inexiste critério estritamente aritmético aplicável para fixação da pena-base, de modo que cada circunstância judicial pode ser valorada e quantificada de maneira distinta, por meio de juízo de discricionariedade, observando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (Enunciado n° 39 TJMT). O Superior Tribunal de Justiça posiciona-se no sentido de que a dosimetria da pena pode considerar quantidade e natureza da droga para exasperação da pena-base quando devidamente fundamentada, não havendo fração específica obrigatória. Na espécie, considerando a expressiva quantidade de droga apreendida e o papel central exercido pelo apelante na organização criminosa, não vislumbro desproporcionalidade na fixação da pena-base, plenamente adequada à gravidade concreta do delito e às circunstâncias pessoais do agente. Na segunda fase, presente apenas a agravante da reincidência, tendo em vista que o réu registra uma condenação criminal anterior proferida na ação penal n. 1027620-46.2021.8.11.0003 (encartada no PEP 2001473-09.2022.8.11.0042), reconheço a circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso I, do Código Penal. O juízo singular aplicou corretamente o aumento de 1/6 (um sexto) em razão da reincidência, devendo a sentença ser mantida em sua integra. IV – Quanto ao recurso interposto por Marcos Vinício de Almeida Santos. A defesa postula a absolvição do apelante do delito de tráfico de drogas, argumentando que as provas dos autos são insuficientes para sustentar a condenação. Sustenta que a investigação foi precária, limitando-se ao cumprimento de mandado de busca e apreensão que não tinha por finalidade a investigação de tráfico, e que não há elementos que comprovem efetivamente a destinação mercantil da substância apreendida. O pleito não merece acolhimento. Na espécie, a materialidade delitiva está demonstrada pelo auto de prisão em flagrante, boletim de ocorrência, auto de apreensão e prova oral colhida ao longo da instrução processual, que confirmaram a apreensão de substâncias entorpecentes no estabelecimento comercial onde o apelante trabalhava. Quanto à autoria delitiva, as provas dos autos são claras e contundentes. A testemunha Iurg Vitor Toledo Lima Rosa, investigador de polícia, relatou que durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão no estabelecimento conhecido como "Zero Grau", foram localizadas substâncias entorpecentes (principalmente cocaína), dinheiro em espécie no valor de R$ 11.555,00, balança de precisão, um canivete com resquícios de droga, isqueiros, materiais de embalagem e diversas caixas de cigarros contrabandeados. Explicou que a droga estava em local de fácil acesso, em uma bancada na área dos fundos do imóvel, ao lado de equipamentos de moto e ferramentas. Confirmou que Marcos, funcionário do estabelecimento, admitiu o tráfico e que o espaço era de uso comum com Thiago. De igual modo, a testemunha Lauro Evaner Corrêa, policial civil, narrou que no cumprimento do mandado de busca foram apreendidas substâncias entorpecentes, grande quantidade de cigarros de origem paraguaia e quantia em dinheiro em espécie, próxima de R$ 12.000,00. Detalhou que o funcionário Marcos Vinícius teria assumido a propriedade da droga, bem como o envolvimento com a mercancia dos produtos ilícitos. Destacou que os entorpecentes estavam em local de fácil acesso dentro do estabelecimento, não havendo indícios de ocultação deliberada. A testemunha Hernany Oliveira Campos, policial civil, confirmou que durante a execução do mandado foram apreendidas substâncias entorpecentes identificadas como pasta base de cocaína, grande quantidade de cigarros de origem paraguaia e quantia em dinheiro em espécie, próxima de R$ 12.000,00. Relatou que o funcionário Marcos Vinícius teria assumido a propriedade da droga, bem como o envolvimento com a mercância dos produtos ilícitos. Observe-se que as declarações são harmônicas e convergentes, demonstrando que o apelante não apenas tinha conhecimento da presença dos entorpecentes no estabelecimento, como também assumiu sua propriedade e responsabilidade pela comercialização. A despeito da alegação defensiva de que não houve presenciamento de atos de comercialização, é certo que para a caracterização do delito de tráfico de drogas é prescindível prova flagrancial do comércio ilícito, bastando que a pessoa seja surpreendida praticando quaisquer das ações descritas no tipo penal, em contexto que evidencie a traficância, porquanto se trata de tipo penal misto alternativo, cuja consumação se dá com o cometimento de quaisquer das condutas nele especificadas. Ademais, as circunstâncias da apreensão demonstram inequivocamente a destinação mercantil da substância. A presença de balança de precisão, materiais de embalagem, dinheiro em espécie de origem não justificada, além da própria confissão do apelante aos policiais, são elementos suficientes para caracterizar o tráfico de drogas. O fato de o mandado de busca ter sido originalmente expedido para investigação de homicídio não descaracteriza a validade da apreensão, uma vez que os agentes se depararam com situação de flagrante delito, sendo lícita a apreensão dos entorpecentes encontrados. Nesse panorama, ao contrário do alegado pela defesa, a prova é robusta para ensejar e, consequentemente, manter a condenação prolatada, notadamente porque os depoimentos dos agentes policiais foram detalhados, coesos, harmônicos e corroborados pela confissão extrajudicial do próprio apelante. Na etapa policial, embora tenha tentado eximir Thiago da prática criminosa, o acusado Marcos admitiu que promovia a mercancia de entorpecentes, tendo afirmado que comercializou droga na conveniência Ponto Grau nos meses que antecederam à sua prisão, para "levantar dinheiro rápido". Afirmou que comercializava somente cocaína e que vendia cada porção por R$ 50,00 (cinquenta reais), conforme termo de interrogatório acostado no ID 130118888. Como consignado pelo Juízo a quo Id. 230400028: Considerando o tráfico de drogas era promovido na conveniência Ponto Grau, da qual Thiago é proprietário, aliado à forma de acondicionamento dos entorpecentes, que se encontravam em local aparente no momento da abordagem policial, não se revela verossímil a alegação de que Thiago não tinha conhecimento de que a traficância era praticada naquele local. Por outro lado, restou evidenciado que Thiago administrava o estabelecimento comercial e, ainda, lucrava com a venda das substâncias entorpecentes. De outro norte, verifica-se que a apreensão dos entorpecentes na posse de THIAGO e MARCOS se deu em outro contexto investigativo, quase duas semanas após as prisões de ALMIR e CASSIANO. Além disso, a substância apreendida na posse de THIAGO e MARCOS (cocaína) era de natureza distinta daquela apreendida na posse dos corréus ALMIR e CASSIANO (maconha). Não obstante a ausência de conexão entre as condutas de mercancia de entorpecentes aqui apuradas (o que será analisado no tópico seguinte, por ocasião da análise do crime de associação para o tráfico de drogas), restou evidenciado que THIAGO e MARCOS promoveram o tráfico de drogas de cocaína, conjuntamente, no estabelecimento Ponto Grau, enquanto WEIBER, ALMIR e CASSIANO promoveram a mercancia dos tabletes de maconha, conjuntamente, em outra data e em contexto distinto. Comprovado que o apelante mantinha em depósito os entorpecentes apreendidos, para fins de entrega a consumo de terceiros, não se mostra possível a absolvição pleiteada. V – Quanto ao recurso interposto por Thiago Souza Ferreira. a) Ausência de autoria e materialidade. A defesa postula a absolvição do apelante Thiago pelo crime de tráfico de drogas, argumentando que não há provas suficientes de sua participação consciente na atividade ilícita. Sustenta que o funcionário Marcos Vinícius assumiu a propriedade da droga e que realizava a venda sem o conhecimento do apelante. O pleito não merece acolhimento. A materialidade delitiva está comprovada pelos elementos constantes dos autos, incluindo o auto de apreensão das substâncias entorpecentes e demais materiais relacionados ao tráfico. A autoria também restou devidamente demonstrada pelas provas oral e documental produzidas durante a instrução. O investigador de polícia Iurg Vitor Toledo Lima Rosa relatou que a diligência foi motivada inicialmente pela apuração de um homicídio, mas durante o cumprimento do mandado foram localizadas substâncias entorpecentes (principalmente cocaína), dinheiro em espécie no valor de R$ 11.555,00, balança de precisão, um canivete com resquícios de droga, isqueiros, materiais de embalagem e diversas caixas de cigarros contrabandeados. Explicou que a droga estava em local de fácil acesso, em uma bancada na área dos fundos do imóvel, ao lado de equipamentos de moto e ferramentas, sendo que o espaço era de uso comum entre Tiago, Marcos e a esposa deste. O policial civil Hernany Oliveira Campos confirmou que durante a execução do mandado foram apreendidas substâncias entorpecentes identificadas como pasta base de cocaína, grande quantidade de cigarros de origem paraguaia (contrabando) e quantia em dinheiro próxima de R$ 12.000,00. Narrou que os valores estavam armazenados em caixas, entre ferramentas, no cômodo da distribuidora, próximo ao depósito. Destacou que os entorpecentes estavam em local de fácil acesso dentro do estabelecimento, não havendo indícios de ocultação deliberada. Embora o apelante tenha negado conhecimento da atividade ilícita e seu funcionário Marcos Vinícius tenha assumido a propriedade da droga, as circunstâncias do caso evidenciam que o apelante tinha ciência ou ao menos deveria ter conhecimento da traficância praticada em seu estabelecimento. A droga não estava oculta e encontrava-se em área de uso comum, sendo inviável que o proprietário do local não tivesse conhecimento de sua presença, considerando a quantidade apreendida e os materiais relacionados ao tráfico. Ademais, o fato de o apelante exercer atividade comercial lícita no local não afasta sua responsabilidade penal pela prática do tráfico concomitante. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que o exercício de atividade lícita não elide a responsabilização por crimes praticados no mesmo local, especialmente quando há elementos concretos que demonstram o conhecimento do agente. As circunstâncias revelam que o estabelecimento comercial era utilizado como ponto de venda de entorpecentes, conforme indicado pelos depoimentos policiais que apontaram o local como conhecido por tal atividade. A presença de balança de precisão, materiais de embalagem e a forma de acondicionamento da droga corroboram a destinação mercantil das substâncias. A pretensão absolutória não prospera, dado que restou devidamente caracterizada a prática do crime de tráfico de drogas. b) Restituição dos Aparelhos Celulares. A defesa de Thiago requer a restituição do aparelho celular apreendido, argumentando que não foi demonstrado seu uso em atividades de tráfico de entorpecentes. O pleito não merece acolhimento. A magistrada singular, de forma acertada, reconheceu que em relação aos bens móveis apreendidos na "Conveniência Ponto Grau", incluindo os aparelhos celulares, “não há certeza de que tenham relação com a mercancia de entorpecentes apurada neste feito, notadamente porque aquele empreendimento também promovia transações lícitas, o que gera dúvidas quanto à sua origem e deve ser interpretado em benefício da parte sentenciada” – Id. 230400028. Contudo, considerando que a medida de busca e apreensão também ensejou a apreensão de cigarros contrabandeados, cujo processamento tramita perante a Justiça Federal, a magistrada determinou de forma prudente a expedição de ofício à 1ª Vara Federal Cível e Criminal de Rondonópolis-MT, solicitando informações sobre eventual vinculação dos bens àqueles autos e se já foi dada alguma destinação. A decisão estabeleceu que, sendo constatado que os bens se encontram vinculados exclusivamente a esta ação penal, o juízo autorizou desde já a restituição, a ser cumprida somente após o trânsito em julgado da sentença. Tal decisão revela-se tecnicamente adequada e em consonância com a necessidade de evitar determinações conflitantes entre a Justiça Estadual e Federal. A restituição condicionada ao esclarecimento da situação perante a Justiça Federal demonstra a devida cautela judicial, preservando os direitos do apelante sem interferir em eventual processo conexo. Neste sentir, deve ser mantida a decisão de primeiro grau quanto à restituição condicionada dos aparelhos celulares. VI – Quanto à aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, §4º da Lei 11.343/2006. As defesas dos apelantes Almir Araújo Júnior, Cassiano Rodrigues de Oliveira e Thiago Souza Ferreira postulam a aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, sob o argumento de que preenchem todos os requisitos legais exigidos para a concessão da benesse. Alegam que são primários, possuem bons antecedentes, não se dedicam às atividades criminosas e não integram organização criminosa. O pleito não merece acolhimento. Com efeito, a aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06 exige que o agente seja primário, tenha bons antecedentes, não se dedique à atividade criminosa e não integre organização criminosa, devendo tais condições serem cumpridas cumulativamente para fins de concessão do benefício. Ao negar a benesse do tráfico privilegiado, o juízo sentenciante fundamentou sua decisão destacando – Id. 230400028: Na terceira fase, inexistem causas especiais de aumento de pena a serem aplicadas neste caso. Por outro lado, não obstante não haja prova suficiente da associação estável e permanente para o tráfico, este Juízo entende que há demonstração farta de que os acusados ora condenados estavam se dedicando às atividades criminosas, notadamente a traficância, conforme conversas interceptadas e depoimentos policiais, a ensejar a inaplicabilidade do privilégio legal quanto ao tráfico de entorpecentes in casu. Tal fundamentação encontra respaldo no conjunto probatório dos autos, que demonstra de forma inequívoca a dedicação dos apelantes às atividades criminosas relacionadas ao tráfico de drogas. Em relação ao apelante Almir Araújo Júnior, as provas revelam sua participação ativa no tráfico de entorpecentes. A testemunha Lauro Evaner Corrêa, policial civil, relatou que os trabalhos investigativos identificaram Almir (vulgo Júnior) como um dos responsáveis pela comercialização de entorpecentes na região, atuando em conjunto com Weiber (vulgo Kevin). Detalhou que, nos dias que antecederam a prisão, foi possível flagrar o apelante em ações suspeitas de entrega de substâncias entorpecentes, utilizando veículos em nome de terceiros. Especificamente no dia 7 de agosto, observou que Almir e Cassiano pararam em dois estabelecimentos comerciais, sendo que Almir desceu do veículo portando sacolas e entrou nas conveniências, comportamento compatível com a entrega de drogas conforme as investigações em andamento. A testemunha Leila Giane Mensch, investigadora da Polícia Civil, confirmou que a investigação teve como foco inicial Almir, apontado como um dos suspeitos de fornecer drogas em larga escala para pontos de venda em Rondonópolis e para outras cidades, inclusive Juína. Relatou que Almir armazenava a droga em sua residência, que lhe era fornecida por Weiber, demonstrando estrutura organizada de armazenamento e distribuição. O próprio apelante Almir, em seu interrogatório, confessou ter recebido de Weiber um pedido para guardar uma carga de entorpecentes consistente em 22 tabletes de maconha, aceitando a proposta mediante promessa de pagamento de R$ 150,00. Confirmou ainda ter enviado fotos da maconha para agilizar a entrega da substância, demonstrando familiaridade com os procedimentos do tráfico. A análise técnica realizada pela Polícia Civil, conforme relatório nº 090/2023 – Id. 230399726, revelou conversas interceptadas que confirmam a atividade delitiva. O relatório do celular apreendido com Almir descreve em detalhes do envolvimento ao tráfico de drogas. Almir Araújo Júnior, identificado como operador de um celular Samsung, é apontado como figura central na organização do transporte e venda de entorpecentes, tendo coordenado tratativas para distribuição de maconha junto a outros indivíduos, incluindo Weiber Kelver da Silva Felisberto (Kelvin) e um interlocutor identificado como "Trucao Kelvin". Os diálogos analisados revelam negociações sobre quantidade, qualidade e logística da droga, além da tentativa de venda dos entorpecentes em diferentes localidades, com detalhamento inclusive do peso (13,870 kg em 22 tabletes). Cassiano Rodrigues de Oliveira, vulgo "Keka", é mencionado como responsável por transportar Almir até o local de entrega da droga, com indícios de que tinha conhecimento do conteúdo ilícito transportado. A testemunha Diego Pereira da Silva, analista de inteligência, confirmou que os diálogos revelaram tratativas entre Almir e Weiber, com Almir sendo incumbido da guarda e separação de entorpecentes e posterior entrega a terceiros. As mensagens também indicavam dificuldade na comercialização da substância em Rondonópolis, sendo cogitada sua remessa para outras cidades, o que evidencia a amplitude da operação criminosa. Em relação ao apelante Cassiano Rodrigues de Oliveira, embora tenha alegado desconhecimento sobre o transporte de drogas, as provas demonstram sua participação consciente na empreitada criminosa. A testemunha Leila Giane Mensch esclareceu que Cassiano e Almir já haviam sido conduzidos juntos pela polícia em 2014 por porte de arma, indicando relacionamento anterior entre ambos, em contradição às declarações de que se conheciam há pouco tempo. Mencionou também que, em 2021, foi cumprido mandado de busca na residência de Cassiano, ocasião em que foram encontrados apetrechos comumente utilizados para o tráfico. A análise técnica dos aparelhos celulares revelou que Cassiano era referido nas conversas como "Uber de confiança", expressão que, segundo o investigador Adriano Ferreira de Souza, demonstra que ele tinha conhecimento do que transportava, sendo tranquilizador o tom adotado por Almir ao se referir a ele perante o destinatário da droga. Durante a prisão em flagrante, Cassiano tentou quebrar seu aparelho celular, conduta que, conforme relatado pela testemunha Rogério Alves de Souza, é comum entre integrantes de organizações criminosas com o objetivo de ocultar provas. Em relação ao apelante Thiago Souza Ferreira, as provas demonstram sua inserção na rede criminosa através da conveniência "Ponto Grau", utilizada como ponto de venda de entorpecentes. A testemunha Iurg Vitor Toledo Lima Rosa, investigador de polícia, confirmou que durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão no estabelecimento foram localizadas substâncias entorpecentes (principalmente cocaína), dinheiro em espécie no valor de R$ 11.555,00, balança de precisão, um canivete com resquícios de droga, materiais de embalagem e diversas caixas de cigarros contrabandeados. A droga estava em local de fácil acesso, em uma bancada na área dos fundos do imóvel, demonstrando que o local era efetivamente utilizado para a mercancia de entorpecentes. A testemunha confirmou ainda que tanto Marcos quanto Thiago têm vínculos com o Comando Vermelho, sendo este último proprietário de um local frequentado por membros da facção, onde se comercializavam itens típicos de domínio da organização criminosa, como cigarros contrabandeados e drogas. O policial Hernany Oliveira Campos relatou que, conforme reiteradas investigações, apenas comerciantes associados à organização Comando Vermelho estariam autorizados a comercializar cigarros contrabandeados, confirmando a inserção de Thiago na estrutura da facção criminosa. A alegação de desconhecimento das atividades do funcionário é inverossímil, considerando que a droga estava em área comum do estabelecimento, de fácil acesso, juntamente com grande quantia em dinheiro e apetrechos típicos do tráfico. Nesse contexto, contrariamente ao alegado pelas defesas, há robusto conjunto probatório demonstrando que os apelantes se dedicavam às atividades criminosas. O fato de a magistrada ter reconhecido a ausência de prova suficiente para a condenação pelo crime de associação para o tráfico não significa que inexistam elementos concretos indicativos da dedicação à atividade criminosa, requisito autônomo para o afastamento da minorante do tráfico privilegiado. Nesse contexto, há demonstração concreta de que os três apelantes se dedicavam às atividades criminosas de forma organizada e com divisão de tarefas. Almir atuava no armazenamento e distribuição, Cassiano no transporte e Thiago disponibilizava ponto de venda através de sua conveniência. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a dedicação às atividades criminosas pode ser demonstrada pelas circunstâncias do caso concreto, mesmo quando não configurada a associação para o tráfico: A aplicação da redutora foi negada com base na quantidade e na variedade das drogas, bem como em assertivas genéricas e abstratas acerca da suposta dedicação ao tráfico, o que, segundo entendimento desta Corte, configura evidente constrangimento ilegal. A conclusão de que haveria dedicação a atividades criminosas ou integração em organização criminosa deve ser lastreada em elementos concretos e não em meras suposições. (STJ, AgRg no HC: 695425 PR, Relator: Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 16/11/2021). No mesmo sentido, é o entendimento deste e. Tribunal de Justiça: O benefício do tráfico privilegiado não se aplica ao caso, pois há prova concreta da dedicação do recorrente à atividade criminosa, evidenciada pelo volume de drogas apreendido, movimentação de usuários no local e diálogos captados em dispositivos eletrônicos. (N.U 1000291-54.2024.8.11.0003, Juvenal Pereira da Silva, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025) Na forma do art. 155 do CPP, para a condenação criminal, é imprescindível a presença de provas produzidas sob o contraditório e a ampla defesa. Assim, existindo elementos de convicção apontando uma mera coautoria e, por outro lado, ausentes provas judicialmente validadas que comprovem a existência de um vínculo estável e permanente entre os apelantes, torna-se imperativa a absolvição do crime previsto no art. 35 da Lei Antidrogas. Aplicação do brocardo jurídico in dubio pro reo (Art. 386, VII, CPP). É inviável a aplicação da minorante prevista no §4º, art. 33, da Lei n. 11.343/06, quando as circunstâncias do caso concreto indicam que os apelantes vinham se dedicando, habitualmente, à atividade criminosa do tráfico de entorpecentes. Na hipótese, a apreensão de variedade de entorpecentes e de petrechos comumente utilizados para o comércio ilegal de droga, aliados aos relatórios de investigações informando que os recorrentes, há tempos, estavam envolvidos com grupo de traficantes, impedem o reconhecimento da figura privilegiada. (N.U 1002401-05.2023.8.11.0086, Rondon Bassil Dower Filho, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 04/09/2024, Publicado no DJE 12/09/2024) Assim, inviável a incidência da benesse do tráfico privilegiado, mantendo-se as penas aplicadas pelo juízo sentenciante. Ante o exposto, nego provimento aos recursos interpostos, mantendo na íntegra a sentença proferida pelo Juízo a quo. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025
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