Processo nº 1004794-21.2024.8.11.0003
ID: 259441451
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1004794-21.2024.8.11.0003
Data de Disponibilização:
23/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JULIANA CRISTINA MARTINELLI RAIMUNDI
OAB/SC XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004794-21.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Rescisão do contrato e devo…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004794-21.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [MARINALVA PEREIRA DA SILVA - CPF: 951.424.361-72 (APELANTE), GEORGE HIDASI FILHO - CPF: 021.887.111-22 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELADO), JULIANA CRISTINA MARTINELLI RAIMUNDI - CPF: 023.580.389-89 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta por beneficiária do INSS contra sentença que julgou improcedente a ação declaratória de inexistência de débito, cumulada com pedido de indenização por danos morais e repetição de indébito, fundada na alegação de contratação irregular de cartão de crédito consignado, cujos descontos incidiram sobre benefício previdenciário. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se houve contratação válida e transparente do cartão de crédito consignado, ou se configurado vício de consentimento capaz de justificar a conversão da modalidade contratual em empréstimo pessoal consignado; (ii) saber se há direito à indenização por dano moral em decorrência da contratação e descontos contestados. III. Razões de decidir 3. O contrato apresentado pela instituição financeira apresenta inconsistências quanto à data da contratação e da averbação junto ao INSS, ausência de faturas e falta de clareza na distinção entre cartão de crédito e empréstimo consignado, o que compromete a validade do consentimento. 4. Reconhecida a falha na prestação de informação, bem como a onerosidade excessiva da operação, é cabível a conversão da modalidade contratual para empréstimo pessoal consignado, com incidência de juros médios de mercado e possibilidade de restituição simples dos valores descontados indevidamente, se apurados em sede de liquidação. 5. Não se demonstrando repercussão ofensiva à dignidade ou a direitos da personalidade da autora, descabe o reconhecimento de dano moral indenizável. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso parcialmente provido. Sentença reformada. Tese de julgamento: "1. É devida a conversão do contrato de cartão de crédito consignado em contrato de empréstimo pessoal consignado quando comprovada a ausência de informação clara e adequada quanto à natureza da contratação e seus encargos financeiros. 2. A restituição dos valores descontados indevidamente deve observar a forma simples, condicionada à apuração em liquidação de sentença. 3. A ausência de repercussão direta à esfera da dignidade do consumidor afasta o direito à indenização por dano moral." Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III, e 39, V; CC, art. 406; CPC, arts. 85, § 2º e 86. Jurisprudência relevante citada: TJMT, RAC 1021708-68.2021.8.11.0003, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 24/01/2024; TJMT, RAC 1020817-11.2021.8.11.0015, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 20/03/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por MARINALVA PEREIRA DA SILVA contra a sentença proferida pelo Dr. Luiz Antonio Sari, Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis, que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais e Repetição de Indébito n. 1004794-21.2024.8.11.0003, ajuizada em face do BANCO BMG S/A, julgou improcedente a pretensão deduzida na inicial, ao fundamento de que houve contratação válida de cartão de crédito consignado, não demonstrado vício de consentimento ou descontos indevidos no benefício previdenciário da autora, e, por conseguinte, indeferiu os pedidos de nulidade contratual, devolução de valores e indenização por danos morais (ID. 276180439). Em suas razões recursais, a Apelante alega, em síntese, que não houve a devida comprovação da contratação do cartão de crédito consignado, apontando divergência entre as datas da averbação e do contrato juntado, ausência de comprovante de TED e de compras no cartão, o que evidenciaria vício de consentimento e falta de transparência, requerendo a nulidade do contrato n. 15725658, restituição dos valores descontados e indenização por danos morais, ou, subsidiariamente, a conversão para empréstimo consignado comum (ID. 276180850). O Apelado apresentou contrarrazões no ID. 276180853, defendendo que houve efetiva contratação de cartão de crédito consignado, com plena ciência e anuência da Apelante, inclusive com saques realizados e gravação de videochamada confirmando a transação, não havendo prova de vício de consentimento, sendo indevido o pedido de nulidade ou conversão do contrato em empréstimo consignado, pugnando pela manutenção integral da sentença recorrida. Desnecessário o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, uma vez que ausente interesse público ou social que justifique a intervenção ministerial. Recurso tempestivo e isento de preparo (ID. 276399370). É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Conforme relatado, a apelante MARINALVA PEREIRA DA SILVA pretende a reforma da sentença para que seja reconhecida a nulidade do contrato de cartão de crédito consignado, com a condenação do Banco Apelado à restituição dos valores descontados de seu benefício previdenciário e ao pagamento de indenização por danos morais, sob o argumento de que não houve contratação válida e transparente, sendo a contratação viciada por erro substancial quanto à natureza do negócio jurídico celebrado. A instrução probatória ocorreu de maneira regular, e, ao final, o d. Magistrado a quo julgou improcedente a pretensão, conforme excerto da sentença: “(...) Não há necessidade de dilação probatória no caso em tela, uma vez que a prova documental carreada ao ventre dos autos é suficiente para dar suporte a um seguro desate à lide, por isso, passo ao julgamento antecipado e o faço com amparo no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Segundo o princípio constitucional da garantia de acesso à Justiça, o esgotamento da via administrativa não é requisito para o ajuizamento de demanda judicial, sendo descabido a exigência da demonstração da pretensão resistida, razão pela qual, rejeito a preliminar. Como cediço, o negócio jurídico é válido quando presentes os requisitos enunciados no artigo 104 do Código Civil, quais sejam, agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei. No entanto, é possível a anulação do negócio jurídico, desde que ocorra alguma das hipóteses elencadas no artigo 171 do mesmo diploma legal. Entre as referidas hipóteses está o erro (art. 171 II, CC), caracterizado como um vício no ato de vontade do emissor da declaração constante do negócio jurídico: o erro ocorre quando a declaração de vontade não expressa a real vontade do emitente. Quanto a possibilidade de anulação dos negócios jurídicos em razão de erro substancial, assim dispõem os arts.138 e 139 do Código Civil: (...) Sobre o tema, leciona Sílvio Rodrigues: "O erro. Pressupostos para que torne anulável o ato jurídico - Erro é a idéia falsa da realizada, capaz de conduzir o declarante a manifestar sua vontade de maneira diversa da que manifestaria se porventura melhor a conhecesse. Se o ato jurídico é ato de vontade, e a vontade se apresenta viciada por um engano que a adultera, permite a lei que, dados certos pressuposto, se invalide o negócio. Todavia, não é qualquer espécie de erro que a lei admite como causa de anulabilidade. É mister - e estes são os pressupostos requeridos pela lei - que o erro seja substancial, que seja escusável e que seja conhecido ou suscetível de ser conhecido pelo outro contratante'. (Direito Civil, v. 1, p. 187, 2007). No caso posto à liça, entendo que não se pode falar que a parte autora tenha sido induzida a cometer erro substancial na contratação em questão e/ou qualquer outro vício, pois os termos da pactuação são claros, sendo capazes de proporcionar ao cliente perfeita formação da sua vontade e o entendimento dos efeitos da sua declaração. Analisando detidamente os autos, nota-se que, ao contrário do alegado pela parte autora, houve adesão ao contrato de Cartão de Crédito Consignado em que há autorização expressa da realização de desconto mediante consignação em folha de pagamento, bem como para a que a fonte pagadora reserve margem consignável dos seus vencimentos até o limite legal para o pagamento parcial ou integral das faturas, consoante Proposta de Adesão – Cartão de Crédito Consignado e autorização para desconto em folha de pagamento. Destarte, não há que se falar em erro substancial, escusável e real capaz de macular a vontade do contratante, capaz de macular o negócio. Lado outro, cumpre observar que a parte autora insurge-se quanto à Reserva de Margem Consignável do seu benefício previdenciário, ou seja, sequer trata-se de desconto efetivado, mas tão somente de reserva do valor para eventual desconto futuro. Dessa forma, comprovada a contratação de cartão de crédito e não havendo prova alguma de que a anotação no benefício previdenciário do autor foi indevida, é forçoso reconhecer a inexistência de elementos capazes a autorizar a retirada do registro de reserva de margem consignável do benefício previdenciário da autora, a condenação da ré no pagamento de indenização por danos morais e tampouco a restituição de qualquer quantia, até porque não há absolutamente nenhuma prova nos autos de que foi descontado qualquer valor do benefício do autor, mas apenas reservado da margem consignável, situação que justifica a improcedência total dos pedidos iniciais. (...) (TJ-MG - AC: 10000204803639001 MG, Relator: Habib Felippe Jabour (JD Convocado), Data de Julgamento: 09/09/2020, Data de Publicação: 14/09/2020) Termo de adesão de crédito consignado emitido pelo Banco Bmg S/A e autorização para desconto em folha de pagamento, assinado pelo autor, bem como termo de consentimento esclarecido do cartão de crédito consignado. (...) (TJ-MT 1003393-19.2017.8.11.0007, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/04/2022, Publicado no DJE 14/04/2022) É certo que a parte autora procurou maculá-los com argumentos que não encontram eco nos elementos centrados no processo, aliás, é bom frisar que tem sido uma constante em processos desse naipe assertivas desse matiz, ou seja, “nunca solicitou, nunca firmou qualquer contrato, desconhece a contratação”. Nesse sentido é a jurisprudência: (...) (TJMG - APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0278.18.001613-3/001 REL. DES. PEDRO ALEIXO, julgado em 30 de outubro de 2019). (...) (TJ-SP - AC: 10275702920198260114 SP 1027570-29.2019.8.26.0114, Relator: Itamar Gaino, Data de Julgamento: 24/06/2020). (...) (TJ-PR - AGV: 00111344020198160130 Paranavaí 0011134-40.2019.8.16.0130 (Acórdão), Relator: Fernanda de Quadros Jorgensen Geronasso, Data de Julgamento: 01/03/2021, Data de Publicação: 02/03/2021) (...) (TJ-SC - AC: 03131621720188240033 Itajaí 0313162-17.2018.8.24.0033, Relator: Newton Varella Júnior, Data de Julgamento: 27/08/2019). É de bom alvitre deixar consignado que no caso dos autos, não existe prova da existência de defeito (vício de vontade) no negócio jurídico a ensejar a anulação do contrato, objeto do litígio. Tenho, assim, que não há nos autos provas de vício de consentimento a macular o contrato – cartão de crédito - descrito e caracterizado nos autos. (...) (TJ-GO – Apelação Cível 00068733520198090002 ACREÚNA, Relator: Des(a). CARLOS ROBERTO FAVARO, Data de Julgamento: 22/02/2021, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 22/02/2021) (...) (TJ-MT - RI: 10001574120188110034 MT, Relator: LUCIA PERUFFO, Data de Julgamento: 02/07/2019, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 04/07/2019). De maneira que, a assertiva levada a efeito pelo autor não vem devidamente comprovada, pelo contrário, prova por demais frágil, pois, o afirmado de que desconhece a contratação, não encontra como já consignado, ressonância nos elementos de provas colacionados no processo. Eis a jurisprudência de nosso egrégio Tribunal de Justiça: (...) (TJ-MT N.U 1031891-81.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 09/03/2022, Publicado no DJE 11/03/2022) (...) (TJ-MT N.U 1012596-92.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/02/2022, Publicado no DJE 25/02/2022). Revela não se tratar de mero contrato de empréstimo consignado nem deixa dúvidas quanto à natureza do empréstimo consignado via utilização de cartão de crédito, tendo em vista as cláusulas prevendo expressamente como seria o desconto e para qual finalidade. Essas cláusulas estão redigidas de forma clara, com letras de fácil leitura e compreensão. O contrato não é extenso, valendo-se de concisão e dados precisos, suficientes para informar à contratante sobre o objeto do negócio jurídico. Como se vê, não há dúvida de que se trata de empréstimo destinado à formação de margem consignável para o pagamento de fatura de cartão de crédito, inclusive com a descrição das taxas de juros contratadas. Em momento algum o contrato fala de empréstimo consignado. Se a parte autora tinha a intenção de obter empréstimo consignado deveria ter se valido de outra espécie contratual, ou mesmo recorrido a outra instituição financeira. Ora, o princípio do pacta sunt servanda, base da teoria contratual, é de força obrigatória. Isso significa que o contrato obriga as partes no limite da lei. No caso, não há nenhum elemento que permita concluir pela afronta legal a justificar a declaração de ilegalidade almejada pelo autor. Pelo contrário. O que se verifica é o arrependimento de um dos contratantes diante de espécie contratual que não atende aos seus anseios. Estar descontente com o bem jurídico contratado não autoriza a declaração de ilegalidade e tampouco de condenação ao pagamento de indenização por danos morais, mas sim eventual rescisão, com as penalidades cabíveis. Nota-se que também há prova da disponibilização do crédito, na conta corrente da parte autora. De igual modo, cumpre ressaltar que é irrelevante a discussão sobre a utilização ou não do cartão de crédito, pois a concessão do empréstimo está atrelada ao limite do cartão e à possibilidade do pagamento correspondente mediante desconto em folha. Portanto, não há obrigatoriedade de uso. Assim, o desbloqueio ou mesmo a utilização do cartão não são condições de validade do contrato. O cartão de crédito é disponibilizado ao cliente em razão da forma como se deu a contratação, isto é, permitindo a utilização de margem consignável para pagamento de fatura ou de saque em espécie. De maneira que, tendo o réu feito prova de fato desconstitutivo do direito do autor, em especial da existência do contrato e de sua legalidade, deve prevalecer a existência e exigibilidade do débito. Logo, descabe falar em conversão em contrato de empréstimo consignado. Assim, diante da falta absoluta de elementos que possam respaldar a súplica posta na peça vestibular, só há um caminho a ser trilhado, qual seja, a improcedência do pedido de anulação de contrato. Dano moral. Para que exista o dever de indenizar, necessária a presença dos elementos ensejadores da responsabilidade civil, quais sejam, o dano, o ato ilícito, e o nexo de causalidade entre o primeiro e segundo, os quais devem ressair de forma cristalina. Vislumbra-se, pois, que, para se falar em indenização deve-se observar três aspectos que são: a ilicitude do ato praticado já que os atos regulares de direito não ensejam reparação; o dano, ou seja, a efetiva lesão suportada pela vítima e o nexo causal, sendo este a relação entre os dois primeiros, o ato praticado e a lesão experimentada, sendo que a inexistência de quaisquer destes pressupostos impossibilita a reparação do dano ante a ausência do fato-consequência. Vejamos o que a doutrina preconiza: "Deve, pois o agente recompor o patrimônio (moral ou econômico) do lesado, ressarcindo-lhe os prejuízos acarretados, à custa do seu próprio, desde que presente a subjetividade no ilícito". (Indenização nas Obrigações por Atos Ilícitos, J. Franklin Alves Felipe, Ed. Del Rey, p. 13, 1995) E ainda: "Consiste a responsabilidade civil na obrigação que tem uma pessoa - devedora - de reparar os danos causados a outra - credora - dentro das forças de seu patrimônio, em decorrência de um ato ilícito ou de uma infração contratual. Visa ela, pois, a recompor o patrimônio do lesado ou compensá-lo pelos danos sofridos, desde que comprovado o nexo causal entre o ato praticado e o prejuízo da vítima". Em se observando o caso versado neste processo, tenho que não ficou evidenciada a tríade necessária a caracterizar a tipicidade da reparação. Há que se ressaltar uma vez mais que o autor não carreou aos autos um mínimo de prova a respaldar a pretensão exposta na peça de ingresso, muito embora tenha demonstrado interesse, diga-se: alegou e nada provou. Assim, não vislumbro que os fatos tenham atingido a esfera da personalidade da autora. Como sabido, esse tem origem na violação de direito de personalidade do ofendido. Nesse sentido é o magistério de Sérgio Cavalieri, porquanto o renomado autor define o dano moral como: “A lesão a bem integrante da personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a integridade psicológica, causando dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima. (Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 2ª edição. Editora Malheiros. página 74) Chancelando a mencionada definição de dano moral, Caio Mario da Silva Pereira nos ensina que: O fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar-se a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos. ("Responsabilidade civil", 9. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2.001, p. 54) Nesse trilho, confira-se trecho de judicioso artigo elaborado por Paulo Luiz Neto Lôbo, no qual este demonstra a estreita relação existente entre os direitos de personalidade e a indenização por danos morais: “A interação entre danos morais e direitos da personalidade é tão estreita que se deve indagar da possibilidade da existência daqueles fora do âmbito destes. Ambos sofreram a resistência de grande parte da doutrina em considerá-los objetos autônomos do direito. Ambos obtiveram reconhecimento expresso na Constituição brasileira de 1988, que os tratou em conjunto, principalmente no inciso X do artigo 5, que assim dispõe: (...) Os direitos da personalidade, nas vicissitudes por que passaram, sempre esbarraram na dificuldade de se encontrar um mecanismo viável de tutela jurídica, quando da ocorrência da lesão. Ante os fundamentos patrimonialistas que determinaram a concepção do direito subjetivo, nos dois últimos séculos, os direitos de personalidade restaram alheios à dogmática civilística. A recepção dos danos morais foi o elo que faltava, pois constituem a sanção adequada ao descumprimento do dever absoluto de abstenção". O mencionado jurista ainda nos lembra que para existência de dano moral basta a lesão de direito da personalidade, não havendo necessidade de comprovação de prejuízo e tampouco de fatores psicológicos dificilmente verificáveis no caso concreto: Do mesmo modo, os danos morais se ressentiam de parâmetros materiais seguros, para sua aplicação, propiciando a crítica mais dura que sempre receberam de serem deixados ao arbítrio judicial e à verificação de um fator psicológico de aferição problemática: a dor moral. (...) De modo mais amplo, os direitos de personalidade oferecem um conjunto de situações definidas pelo sistema jurídico, inatas à pessoa, cuja lesão faz incidir diretamente a pretensão aos danos morais, de modo objetivo e controlável, sem qualquer necessidade de recurso à existência da dor ou do prejuízo. A responsabilidade opera-se pelo simples fato da violação (damnu in re ipsa); assim, verificada a lesão a direito da personalidade, surge a necessidade de reparação do dano moral, não sendo necessária a prova do prejuízo, bastando o nexo de causalidade. (...) (LÔBO, Paulo Luiz Netto. Danos morais e direitos da personalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 119, 31 out. 2003. Com muita autoridade a respeito do tema ensina Maria Celina Bondin de Moraes que: Assim, no momento atual, doutrina e jurisprudência dominantes têm como adquirido que o dano moral é aquele que, independentemente de prejuízo material, fere direitos personalíssimos, isto é, todo e qualquer atributo que individualiza cada pessoa, tal como a liberdade, a honra, a atividade profissional, a reputação, as manifestações culturais e intelectuais, entre outros. O dano é ainda considerado moral quando os efeitos da ação, embora não repercutam na órbita de seu patrimônio material, originam angústia, dor, sofrimento, tristeza ou humilhação à vítima, trazendo-lhe sensações e emoções negativas. Neste último caso, diz-se necessário, outrossim, que o constrangimento, a tristeza, a humilhação, sejam intensos a ponto de poderem facilmente distinguir-se dos aborrecimentos e dissabores do dia-a-dia, situações comuns a que todos se sujeitam, como aspectos normais da vida cotidiana. (Maria Celina Bondin de Moraes. Danos à Pessoa Humana: uma leitura civil- constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro. Ed. Renovar,2009 p. 157 e 158) A seu turno, o dano moral mereceu especial reflexão do autor Anderson Shreiber, que demonstrou justa preocupação com o risco de uma indiscriminada proliferação do que ele intitula de "demandas frívolas" à respeito do dano moral, pois: “O temor de que o imenso oceano de novos interesses extrapatrimoniais deságue em ações frívolas voltadas à obtenção de indenização pelos acontecimentos mais banais da vida social deriva, em grande parte, do fato de que a abertura ao ressarcimento do dano moral deu-se por meio de uma extensão da função historicamente patrimonialista da responsabilidade civil, sem que se procedesse, ao mesmo tempo, a qualquer modificação substancial na estrutura do instituto. Assim, mesmo às lesões a interesses não patrimoniais o ordenamento jurídico continua oferecendo, como única resposta, o seu remédio tradicional, de conteúdo estritamente patrimonial, qual seja, a deflagração do dever de indenizar. Bem vistas as coisas, a tão combatida inversão axiológica - por meio da qual a dignidade humana e os interesses existenciais passam a ser invocados visando à obtenção de ganhos pecuniários-, tem como causa imediata não o desenvolvimento social de ideologias reparatórias ou um processo coletivo de vitimização, mas a inércia da própria comunidade jurídica, que insiste em oferecer às vítimas destes danos, como só solução, o pagamento de uma soma em dinheiro, estimulando necessariamente sentimentos mercenários. (Anderson Shreiber - Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação á diluição dos danos. 3ª edição. São Paulo. Ed. Atlas,2011 p.193) O risco de uma indiscriminada proliferação de demandas frívolas deriva, como se afirmou de uma significativa alteração funcional da responsabilidade civil, que passa a abranger a reparação das lesões a interesses extrapatrimoniais, sem uma efetiva alteração da estrutura do instituto. E isto não parece evidente apenas no que tange ao remédio usualmente pecuniário reservando ao autor da demanda acolhida, mas também do tratamento probatório que se tem dispensado ao dano extrapatrimonial. Na impossibilidade de empregarem o mesmo mecanismo matemático utilizado na aferição do dano patrimonial - a chamada teoria da diferença, que contrapõe o valor do patrimônio da vítima anteriormente e após o dano -, doutrina e jurisprudência têm, por parte, declarado que o dano moral é in re ipsa, ou seja, 'deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum.' (obra cit., p. 201 e 202) Todavia, não se pode considerar todo e qualquer melindre como sendo susceptível de gerar ofensa jurídica a ensejar a sua reparação judicial. Nessa linha de raciocínio, não se pode impor a satisfação pecuniária em todo dissabor, sob pena de se premiar extravagâncias e exageros. A propósito, confira-se a preciosa lição do professor Sérgio Cavalieri: “Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústias e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos”. Por sua vez, Rui Stoco ("Tratado de responsabilidade civil: responsabilidade civil e sua interpretação doutrinária e jurisprudencial", 5. ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2.001, p. 1395) adverte: “O Brasil corre o risco de o instituto da responsabilidade civil por dano moral, tal como ocorre aliunde, banalizar-se e desmoralizar-se, por força dos desvios de enfoque, do desregramento específico e do abandono aos princípios e preceitos de superdireito, estabelecidos na nossa Lei de Introdução ao Código Civil”. De forma que, o pedido de condenação da instituição financeira em danos morais, não tem pertinência. Da compensação. No mesmo diapasão, o pedido de restituição da importância descontada, em dobro, uma vez que no caso em desate, o que se percebe, é que não restou comprovado nos autos que a cobrança foi indevida. (...) (TJSP, 702247420118260002 SP 0070224-74.2011.8.26.0002, 13ª Câmara de Direito Privado, Relator: Francisco Giaquinto, Data de Julgamento: 15/08/2012, Data de Publicação: 17/08/2012). Frisa-se que a condenação em dobro só tem lugar quando efetivamente comprovado o pagamento indevido. Ademais, incabível a condenação do réu à repetição em dobro do indébito, porque sua incidência pressupõe indevida cobrança por má fé do credor, o que não se vislumbra na hipótese. No caso em desate, o autor não efetuou o pagamento da referida quantia cobrada indevidamente e não há qualquer indício que a cobrança indevida tenha decorrido de má fé da instituição financeira, não podendo, portanto, pretender recebê-la, muito menos de maneira dobrada, sob pena de enriquecimento sem causa, vedado pelo nosso ordenamento jurídico, conforme o artigo 884 do Código Civil. Ao derradeiro, aduz que os encargos financeiros são abusivos, fato que não tem como vingar, pois o documento de crédito acostado no processo – cédula de crédito bancário – permite a capitalização mensal dos juros; e, no que tange os juros moratórios, muito embora possível a limitação dos juros remuneratórios dos contratos de mútuo com consignação em folha de pagamento, necessária a comprovação de que os encargos tenham ultrapassado as instruções normativas, o que não ocorreu. Face ao exposto e princípios de direito aplicáveis à espécie JULGO IMPROCEDENTE a presente 'Ação Declaratória de Nulidade de Empréstimo Consignado c/c Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais" promovida por MARINALVA PEREIRA DA SILVA, em desfavor de BANCO BMG S/A, com qualificação nos autos, condenando a autora no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento), sobre o valor dado à causa, devidamente atualizado, observando-se o disposto no § 3º, do artigo 98 do Código de Processo Civil. (...)” (ID. 276180439) (g.n.) Como visto, a controvérsia se restringe à discussão em torno da validade da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), modalidade que a Apelante afirma desconhecer, alegando ter sido induzida a erro ao acreditar que estava contratando um empréstimo consignado tradicional. Pois bem. Inicialmente, cumpre ressaltar que a relação entre as partes é de consumo, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor, conforme orientação da Súmula 297 do STJ. Nesse contexto, é imperioso observar que o CDC estabelece como direito básico do consumidor a informação adequada e clara sobre os produtos e serviços (art. 6º, III), bem como veda ao fornecedor, entre outras práticas abusivas, exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva (art. 39, V). No caso destes autos, a Instituição Financeira apelada sustenta que a Consumidora possuía pleno conhecimento de que se tratava da modalidade de empréstimo consignado mediante cartão de crédito, cuja confirmação estaria comprovada por meio de videochamada com a Apelante. Todavia, do cotejo dos autos é possível constatar inconsistências na documentação apresentada pelo BANCO BMG que fragilizam sua tese de regularidade na contratação. Primeiramente, verifico que o pacto celebrado entre as partes está intitulado como “TERMO DE ADESÃO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO EMITIDO PELO BANCO BMG S.A E AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO” (ID. 276180425), o que, por si só, gera confusão, ao se ter em vista a impossibilidade de saber de forma clara se se trata de um crédito consignado OU do contrato de cartão de crédito na modalidade RMC (Reserva de Margem Consignável). Ademais, como bem apontado pela Apelante, há divergência temporal entre a data constante no contrato apresentado pelo Banco e a data da averbação junto ao INSS indicada no extrato juntado à inicial. Enquanto o extrato do INSS indica averbação em 13/03/2020, o contrato apresenta data diversa (22/11/2019, ID. 276180425, p. 3), gerando dúvida sobre a legitimidade do documento. Não bastasse isso, também não foram apresentadas todas as faturas referentes ao período em que ocorreram os descontos no benefício previdenciário da Autora, o que dificulta a verificação do uso efetivo do cartão e da proporcionalidade entre os valores descontados e o crédito disponibilizado. Tais circunstâncias, analisadas sob a ótica da hipossuficiência do consumidor, geram dúvida razoável sobre a regularidade da contratação nos moldes defendidos pelo Banco apelado. Vale destacar que o BANCO BMG apresentou gravação de videochamada em que a Apelante confirma a contratação de um saque complementar através do cartão. No entanto, esse fato, por si só, não sana os vícios da contratação original nem comprova que a Apelante tinha pleno conhecimento da natureza do contrato e de suas implicações financeiras no momento da celebração. Em outras palavras, a ocorrência de saques posteriores, especialmente aquele realizado em 2023 e confirmado por videochamada, não é capaz de sanar eventual vício na formação inicial do contrato ocorrido em 2019/2020, uma vez que o montante complementar de R$ 482,02 se refere a operação distinta, não se prestando como prova inequívoca da compreensão original da autora quanto à natureza do contrato. Desse modo, se torna evidente que o intuito de disponibilizar esse tipo de contratação é burlar a margem de consignação legalmente admitida, além da cobrança de juros muito superiores ao praticado nos empréstimos consignados, causando a onerosidade excessiva ao consumidor e tornando a dívida impagável. Resta claro, no caso em comento, que houve flagrante afronta aos princípios da informação e transparência, notadamente em razão de não informar ao cliente acerca do valor efetivo da operação, da quantidade de parcelas a pagar e principalmente a taxa de juros praticada no contrato questionado na inicial. Nesse passo, conforme o disposto no art. 39, V, do CDC, é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva. Em casos análogos vem decidindo este Sodalício: “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) - DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - VÍCIO DE CONSENTIMENTO - CONVERSÃO DA MODALIDADE CONTRATUAL PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS - RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES DOS VALORES DESCONTADOS EM EXCESSO CASO HAJA COMPROVAÇÃO - DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Configura falha na prestação do serviço a conduta da instituição financeira que induz o cliente a erro ao celebrar contrato de cartão de crédito consignado, quando o consumidor acredita tratar-se de empréstimo pessoal. É caso de conversão da contratação para empréstimo consignado, observada a taxa média de mercado dos juros remuneratórios para operações dessa natureza, condição que enseja a restituição, na forma simples, de valores descontados em excesso, caso haja comprovação. Se não demonstrados os requisitos da reparação civil, não é cabível a indenização a título de dano moral.” (TJMT. RAC 1021708-68.2021.8.11.0003. 4ª Câmara de Direito Privado. Rel: Des. Guiomar Teodoro Borges. J. 24/01/2024. DJe 30/01/2024) (g.n.) “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO EM BENEFICIO PREVIDENCIÁRIO - ONEROSIDADE EXCESSIVA - AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA INFORMAÇÃO E TRANSPARÊNCIA - CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO - COMPENSAÇÃO DE VALORES DEPOSITADOS NA CONTA BANCÁRIA DA PARTE AUTORA - REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES - DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Conforme o disposto no art. 39, inciso V, do CDC, é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva. In casu, o banco induziu o consumidor a erro, tendo em vista que este celebrou contrato de cartão de crédito consignado acreditando tratar-se de empréstimo pessoal, em flagrante afronta aos princípios da informação e transparência, notadamente em razão de não informar a cliente acerca do valor efetivo da operação, da quantidade de parcelas a pagar e da taxa de juros praticada. Embora a declaração de inexistência do débito não encontre amparo, mormente pelo fato de que o valor foi disponibilizado ao consumidor, a operação realizada entre as partes deve ser convertida para a modalidade de crédito pessoal consignado em folha, com a incidência de juros remuneratórios de acordo com a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central à época da contratação. Reconhecido o vício na contratação, resta evidente o dever da instituição financeira em restituir os valores descontados em excesso, contudo, de forma simples e não em dobro, ante a falta de comprovação da má-fé. O simples questionamento da validade do negócio jurídico não configura, por si só, a prática de ato ilícito pelo banco.” (TJMT. RAC: 1020817-11.2021.8.11.0015. Órgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Privado. Rel: Des. Carlos Alberto Alves da Rocha. j. 20/03/2024. DJe 24/03/2024) (g.n.) Reconhecido o vício na contratação, resta evidente o dever de a Instituição Financeira restituir os valores descontados em excesso, na forma simples, caso haja comprovação, após a devida apuração em sede de liquidação de sentença, conforme requerido pela parte Autora. Se houver saldo remanescente a ser devolvido, após a devida apuração, por versar a hipótese sobre responsabilidade contratual, o importe deverá ser atualizado, com juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação (art. 406/CC), e a correção monetária, a ser calculada com base no INPC, a contar do efetivo prejuízo, observada as alterações ao Código Civil com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024. Quanto ao pedido de indenização por danos morais pleiteado na exordial, melhor sorte não socorre à Apelante, uma vez que, no caso concreto, não se notam presentes os pressupostos caracterizadores de prejuízo moral indenizável. Isso porque o direito à indenização por dano moral exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade ou a dignidade da pessoa humana, abrangendo interesses que, embora desprovidos de conteúdo patrimonial, são dotados de extrema relevância na ordem jurídica pátria. Evidente que a simples cobrança indevida por insuficiência de informações, sem qualquer repercussão na esfera personalíssima ou na dignidade da pretensa vítima, não caracteriza dano moral indenizável. Analisando casos semelhantes, este Tribunal assim teve a oportunidade de decidir: “APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL E RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - UTILIZAÇÃO DE SALDO DO CARTÃO DE CRÉDITO (RMC) - VÍCIO DE CONSENTIMENTO - CONVERSÃO DA MODALIDADE CONTRATUAL PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS - RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES DOS VALORES DESCONTADOS EM EXCESSO, CASO HAJA COMPROVAÇÃO - DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Configura falha na prestação do serviço a conduta da instituição financeira que induz o cliente a erro ao celebrar contrato de cartão de crédito consignado, quando o consumidor acredita tratar-se de empréstimo pessoal. É caso de conversão da contratação para empréstimo consignado, observada a taxa média de mercado dos juros remuneratórios para operações da mesma natureza, condição que enseja a restituição, na forma simples, de valores descontados em excesso, caso haja comprovação. Se não demonstrados os requisitos da reparação civil, não é cabível a indenização a título de dano moral.” (TJMT. N.U 1047030-39.2022.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis e Direito Privado, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 04/10/2023, DJe 10/10/2023) (g.n.) “APELAÇÕES - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - DECISÃO EXTRA PETITA - ALEGAÇÃO INFUNDADA - PRELIMINAR REJEITADA - EMPRÉSTIMO PESSOAL OFERECIDO PELO BANCO - COBRANÇA COMO CARTÃO DE CRÉDITO - PRÁTICA ABUSIVA - ADEQUAÇÃO DOS JUROS DEVIDA - DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO - FORMA SIMPLES - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - FIXAÇÃO SOBRE O VALOR ATUALIZADO DA CAUSA - (ART. 85, §2º, DO CPC) - RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. O julgado é extra petita quando analisa matéria diversa da postulada, sendo estranha, inclusive, a causa de pedir. Se o valor do empréstimo é disponibilizado ao consumidor via TED, mas cobrado como cartão de crédito, fica caracterizada a prática comercial abusiva, sendo devida a conversão da modalidade contratual e a adequação da taxa de juros. A cobrança injustificada não configura, por si só, o dano moral. As parcelas imotivadamente descontadas devem ser restituídas na forma simples quando não constatada a intenção dolosa. A verba honorária deve ser estabelecida entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o montante da condenação, do proveito econômico ou do valor atualizado da causa. E tem de recompensar com dignidade e equilíbrio o desempenho do advogado, mas sem lhe gerar enriquecimento ilícito”. (TJMT. N.U 1002596-66.2021.8.11.0051, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 23/08/2023, DJe 24/08/2023) (g.n.) Diante do exposto, conheço do recurso interposto por MARINALVA PEREIRA DA SILVA, porém, lhe DOU PARCIAL PROVIMENTO, para o fim de reformar a sentença e, por conseguinte, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial, e com isso: a) declarar a conversão da modalidade dos saques realizados no contrato de cartão de crédito objeto da ação, em contrato de empréstimo pessoal consignado para servidor público, com a incidência de juros remuneratórios de acordo com a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central para a época de cada “saque”; b) em caso de apuração da existência de crédito em favor da parte autora, após o recálculo, condenar o BANCO BMG S/A à devolução, na forma simples, do valor pago a maior, acrescidos e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação (art. 406 do CC), e correção monetária pelo INPC, a partir do efetivo prejuízo, devendo os cálculos observar a data em que a Lei n. 14.905/2024 passa a produzir efeitos, após o que o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverão observar os índices dos arts. 389, parágrafo único, 406 e §§ do CC, a ser apurado em sede de liquidação do julgado; c) sem condenação por danos morais. Em razão do parcial provimento do recurso, considerando a sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento das custas judiciais e despesas processuais, fixando honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos dos arts. 85, §2º, 86, do CPC, com as ressalvas do art. 98, §3º, do mesmo códex. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025
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