Processo nº 1003115-51.2023.8.11.0025
ID: 292702392
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: AGRAVO REGIMENTAL CíVEL
Nº Processo: 1003115-51.2023.8.11.0025
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ADILSON BATISTA LIMA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 1003115-51.2023.8.11.0025 CLASSE: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) ASSUNTO: [DANO AMBIENTAL, FLORA] REL…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 1003115-51.2023.8.11.0025 CLASSE: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) ASSUNTO: [DANO AMBIENTAL, FLORA] RELATORA: EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS TURMA JULGADORA: [EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, EXMA. SRA. DESA. MARIA EROTIDES KNEIP, EXMO. SR. DES. MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO] PARTE(S): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), ADELICIA ALVES FREITAS - CPF: 482.132.411-34 (APELADO), ADILSON BATISTA LIMA - CPF: 487.991.571-87 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE JUINA - CNPJ: 15.359.201/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0003-06 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA, DESPROVEU O RECURSO NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA. E M E N T A AGRAVO INTERNO NO RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR DANO AMBIENTAL. DESMATAMENTO ILEGAL. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÕES. RECUPERAÇÃO AMBIENTAL E INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL. IMPOSIÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. DESCABIMENTO NO CASO CONCRETO. DANO AMBIENTAL IRRECUPERÁVEL NÃO DEMONSTRADO. PRECEDENTE DO STJ. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de Agravo Interno interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra decisão monocrática que negou provimento ao recurso de apelação, mantendo a sentença que afastou a condenação cumulativa da obrigação de recuperação ambiental e do pagamento de indenização pecuniária por dano ambiental. II. Questão em discussão A questão em discussão consiste em verificar se há necessidade de cumulação da obrigação de recomposição ambiental e da indenização pecuniária, à luz do princípio da reparação integral do dano ambiental e da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ). III. Razões de decidir A jurisprudência do STJ tem se consolidado no sentido de que apesar de possível a cumulação das medidas de obrigação de fazer e de indenização, a sua aplicação não decorre de lei, mas da análise casuística de cada caso e as suas peculiaridades, ocasião em que são consideradas as consequências da prática danosa, a fim de se verificar a efetiva necessidade de que haja cumulação. No caso concreto, não há comprovação de que os danos ambientais sejam irrecuperáveis, tornando desnecessária a condenação ao pagamento de indenização pecuniária. A imposição simultânea das sanções poderia configurar penalidade desproporcional, visto que a condenação já imposta assegura a restauração do meio ambiente por meio da recuperação in natura. IV. Dispositivo e tese Recurso desprovido. Tese de julgamento: "A cumulação de condenações em obrigação de recomposição ambiental e indenização pecuniária só é admissível quando demonstrada a irreversibilidade do dano ambiental." R E L A T Ó R I O EXMA SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS (RELATORA): Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Agravo Interno interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra decisão monocrática proferida por esta Relatora no ID n. 261424779, que negou provimento ao recurso de apelação por ele interposto nos autos da ação civil pública por dano ambiental ajuizada em face de Adelicia Alves Freitas. Em suas razões recursais (ID n. 262865282), sustenta o Agravante que, a condenação imposta à agravada deveria ser cumulativa, de modo a abranger tanto a obrigação de recuperação da área degradada quanto a indenização pecuniária pelos danos ambientais pretéritos. Alega que, a decisão monocrática incorreu em erro ao afastar a cumulação sob o fundamento de que o dano ambiental não era irreversível, violando o princípio da reparação integral do dano ambiental. Requer, assim, a reforma da decisão agravada para que seja reconhecida a possibilidade de cumulação das obrigações de recomposição ambiental e indenização pecuniária. A certidão de ID n. 272598358 atesta a tempestividade recursal. A Agravada apesar de devidamente intimada, deixou transcorrer in albis o prazo, sem a apresentação de contrarrazões, conforme certidão de ID n. 271011897. É o relatório. V O T O EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS (RELATORA): Egrégia Câmara: Conforme relatado, trata-se de Recurso de Agravo Interno interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra decisão monocrática proferida por esta Relatora no ID n. 261424779, que negou provimento ao recurso de apelação por ele interposto nos autos da ação civil pública por dano ambiental ajuizada em face de Adelicia Alves Freitas. A controvérsia dos autos gira em torno da possibilidade de cobrar simultaneamente a obrigação de recuperação ambiental e indenização pecuniária pelo dano ambiental material, considerando os princípios que norteiam o direito ambiental e a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em que pesem as alegações do Agravante, tenho que a pretensão posta não merece acolhida, uma vez que não se verifica qualquer ilegalidade na decisão que negou provimento ao recurso de apelação. Isso porque, a decisão agravada se fundamentou no entendimento de que a obrigação de recomposição ambiental tem primazia sobre a indenização pecuniária, devendo ser imposta sempre que possível; bem como que a indenização por dano material ambiental somente é devida quando há dano irreversível ou de difícil reparação, o que não foi demonstrado no caso concreto e; que a imposição simultânea da obrigação de fazer e da indenização pecuniária pode configurar sanção desproporcional, caso a recuperação ambiental seja plenamente viável. Como se sabe, a jurisprudência do STJ tem se consolidado no sentido de que apesar de possível a cumulação das medidas de obrigação de fazer e de indenização, a sua aplicação não decorre de lei, mas da análise casuística de cada caso e as suas peculiaridades, ocasião em que são consideradas as consequências da prática danosa, a fim de se verificar a efetiva necessidade de que haja cumulação. Veja-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL –AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL – DANO AMBIENTAL – DISPOSITIVOS APONTADOS COMO VIOLADOS – PREQUESTIONAMENTO – INDISPENSÁVEL – SÚMULA 282/STF – OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO – PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO – CUMULAÇÃO – POSSIBILIDADE – PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA AFASTADA PELO TRIBUNAL A QUO. ACÓRDÃO ANCORADO NO SUBSTRATO FÁTICO DOS AUTOS – REEXAME – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA 7/STJ – RECURSO INTERPOSTO TAMBÉM PELA ALÍNEA C DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL – NÃO ATENDIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. 1. (...). 2. Ao decidir pela possibilidade, porém ausência de obrigatoriedade, na cumulação de condenações em reparação do dano ambiental e em indenização pecuniária, a instância de origem alinhou-se ao entendimento firmado no âmbito deste Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, segundo o qual "Embora se admita, a princípio, a cumulação da obrigação reparatória do dano ambiental com a indenizatória, nos casos em que é possível a reparação completa, esta Corte Superior de Justiça tem o entendimento de que deve ser afastada a obrigação de natureza pecuniária" (AgInt no AREsp 640.586/SC, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 20/3/2019). 3. (...). (AgInt no REsp 1538112/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019). [Destaquei] No presente caso, a decisão monocrática observou corretamente os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, ao negar a cumulação das sanções. Porquanto, embora os autos demonstrem que o dano ambiental decorreu do desmatamentode 7,07 hectares de vegetação de Floresta Amazônica, o Agravante não trouxe aos autos nenhuma prova de que o dano ambiental seja irrecuperável, razão pela qual, se mostra acertada a sentença que deixou de aplicar a condenação ao pagamento de indenização por dano material ao meio ambiente. A imposição de sanções ambientais deve ser proporcional e adequada à extensão do dano causado, conforme o princípio da proporcionalidade. Assim, conforme ressaltado na decisão agravada, a cumulação das condenações poderia acarretar sanção excessiva e desproporcional, na medida em que a condenação já imposta garante a restauração do meio ambiente por meio da recuperação in natura. No mesmo sentido, é o entendimento adotado por este Sodalício: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL CARACTERIZADO – DEVER DE RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA – IMPOSIÇÃO DE INDENIZAÇÃO – DESCABIMENTO NO CASO CONCRETO – DANO AMBIENTAL IRRECUPERÁVEL NÃO DEMONSTRADO – PRECEDENTE DO STJ – SUCUMBÊNCIA – DECAIMENTO MÍNIMO DO PEDIDO E AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Tratando-se de dano ambiental, é possível a cumulação da obrigação de fazer com o pagamento de indenização pecuniária para fins de reparar os danos, desde que estes não sejam suscetíveis de recuperação. Para a condenação ao pagamento de indenização por dano ambiental, como imposição suplementar (a recomposição já imposta), é necessária à existência de comprovação de um prejuízo ambiental permanente, ou constante, na propriedade, como uma perda definitiva do solo, ou mesmo um prejuízo em relação ao ecossistema dos animais nativos, o que deve ser comprovado (CPC, art. 373, I). (TJ-MT - APL: 00017577920108110007 MT, Relator: GILBERTO LOPES BUSSIKI, Data de Julgamento: 10/6/2019, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Data de Publicação: 26/6/2019). [Destaquei] Dessa forma, não se verificando a existência de dano ambiental irreversível, afasta-se a necessidade de cumulação da sanção de indenização pecuniária pelos danos materiais ao meio ambiente. Logo, os argumentos deduzidos neste recurso não mostram motivos suficientes a ensejar mudança na decisão proferida. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo inalterada a decisão agravada. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (1º VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA EROTIDES KNEIP (2ª VOGAL): Aguardo o pedido de vista. SESSÃO DE 23 DE ABRIL DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (VISTA) EXMO. SR. DES. RODRIGO ROBERTO CURVO (1º VOGAL): Egrégia Câmara, Em sessão realizada em ambiente virtual, pedi vista para melhor análise do agravo interno interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, que visa à reforma de decisão monocrática proferida pela eminente Relatora, Desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos, que negou provimento ao recurso de apelação também interposto pelo ora agravante, mantendo a sentença de primeiro grau que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação civil pública nº 1003115-51.2023.8.11.0025, ajuizada em face de ADELÍCIA ALVES FREITAS. A sentença de origem condenou a requerida a: (i) recompor o meio ambiente degradado através de reflorestamento, mediante apresentação, no prazo de 90 (noventa) dias, de Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) junto ao órgão competente, sob pena de conversão da obrigação fixada em multa pecuniária; e (ii) indenizar por danos morais coletivos, no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser destinado ao Fundo Estadual de Reparação de Direitos Difusos e Coletivos. Contudo, julgou-se improcedente o pleito ministerial de condenação por danos materiais ambientais. A eminente Relatora, ao manter o indeferimento da indenização por danos materiais, fundamentou sua decisão na inexistência de prova quanto à irreversibilidade do dano ambiental, entendimento segundo o qual a obrigação de fazer — consubstanciada na recuperação in natura da área degradada — seria, por si só, suficiente para restaurar o equilíbrio ecológico lesado. A controvérsia, portanto, cinge-se à possibilidade jurídica da cumulação da obrigação de fazer, relativa à recuperação ambiental mediante PRAD, com a obrigação de indenizar por danos materiais ambientais, notadamente nas hipóteses em que subsistem efeitos lesivos, de natureza residual ou intercorrente, que não se mostram plenamente sanáveis por meio da recomposição direta do bem jurídico afetado. Com fundamento no art. 225 da Constituição Federal e no art. 3º da Lei 7.347/1985, a interpretação sistemática da norma deve conferir à conjunção “ou” um sentido aditivo, não excludente, possibilitando que as obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar sejam impostas cumulativamente, desde que voltadas a finalidades distintas da reparação do dano ambiental, garantindo a aplicação plena dos princípios da reparação integral e da responsabilidade ambiental. O Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido da admissibilidade da cumulação das obrigações mencionadas, conforme dispõe a Súmula nº 629: “Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar”. [g.n.] Em julgado recente, a Segunda Turma do STJ asseverou que “a reparação pecuniária não possui natureza subsidiária em relação à obrigação de fazer, mas são cumulativas, podendo o pagamento da indenização ser cobrado independentemente do cumprimento ou não na obrigação de fazer.” (STJ, AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.418.052/SP, Rel. Min. Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, j. 19.02.2025). Em igual sentido, esta c. Câmara também reconhece a cumulação de prestações em ações ambientais: “DIREITO AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÕES DE FAZER E INDENIZAR. DANO AMBIENTAL INTERCORRENTE. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame: 1. Recurso de apelação cível interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença que, nos autos de ação civil pública ambiental, condenou o réu à recuperação da área degradada e, de forma alternativa, ao pagamento de indenização pelo dano ambiental residual, caso não seja cumprida a obrigação de fazer, bem como ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. II. Questão em discussão: 2. A questão em discussão consiste em determinar a possibilidade de cumular as obrigações de fazer e de indenizar pelos danos ambientais, incluindo o reconhecimento do dano intercorrente e a fixação da respectiva indenização. III. Razões de decidir: 3. Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é possível a cumulação de obrigações de fazer e de não fazer com a de indenizar, em observância ao princípio da reparação integral e ao princípio do poluidor-pagador. O dano ambiental intercorrente, caracterizado pelo prejuízo ambiental ocorrido entre a lesão e a completa reparação da área, deve ser indenizado, ainda que se busque a restauração in natura do ambiente. [...] Tese de julgamento: ‘Aquele que desmata ilegalmente é responsável pela recuperação integral da área degradada e pela indenização dos danos ambientais intercorrentes, que ocorrem entre o momento da degradação e a sua completa restauração.’” (TJMT, N.U. 1001038-69.2023.8.11.0025, Rel. Des. Rodrigo Roberto Curvo, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 18.12.2024). [g.n.] Logo, a indenização não possui caráter subsidiário, tampouco está condicionada à inexecução da obrigação de fazer, tratando-se de prestações autônomas e compatíveis com o regime jurídico da responsabilidade ambiental, que exige a reparação integral do meio ambiente lesado, nos moldes do art. 225 da Constituição. O STJ ainda distingue três espécies de dano ambiental, conforme sua dimensão temporal: (i) o dano em si, reparável preferencialmente pela restauração do ambiente ao estado anterior; (ii) o dano residual (permanente, definitivo, perene), que se protrai no tempo mesmo após os esforços de recuperação in natura, em regra indenizável; e (iii) o dano intercorrente (interino, transitório, temporário, intermediário, provisório), que incide entre a ocorrência da lesão em si e a reparação integral, haja ou não dano residual. No caso dos autos, restou demonstrado que a agravada promoveu a destruição de 7,07 hectares de vegetação nativa da floresta amazônica, objeto de especial preservação, sem autorização ou licença da autoridade ambiental competente, conforme Auto de Infração nº 9073039-E (Id. 235016200, p. 12), na Gleba Nova União, Distrito de Filadélfia, no município de Juína (MT). A privação dos serviços ecossistêmicos, definidos pela Lei 14.119/2021 como os benefícios oferecidos pelos ecossistemas à coletividade e suscetíveis de valoração econômica, comprometeu o equilíbrio ambiental e permanece enquanto durar a degradação. Nessa perspectiva, a mera recuperação da área degradada, por meio da apresentação e execução do Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD), não se mostra suficiente para neutralizar os efeitos deletérios decorrentes da degradação ambiental prolongada, tampouco exime o agente causador da responsabilidade pelos danos de natureza irreversível. Ao afastar a pretensão indenizatória sob o fundamento de inexistência de "prova nos autos acerca da irrecuperabilidade do dano ambiental", a sentença contrariou frontalmente os princípios da reparação integral e da responsabilidade objetiva e plena do poluidor, pilares da tutela ambiental no ordenamento jurídico pátrio. Nesse sentido, o STJ decidiu: “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL. DANO. INDENIZAÇÃO. RESTAURAÇÃO IN NATURA. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. ÔNUS DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. IRRELEVÂNCIA. REPARAÇÃO INTEGRAL DO DANO AMBIENTAL. [...] 2. Configurado, de forma incontestável, o dano interino (intermediário, transitório, temporário ou intercorrente) e não afirmada a restauração integral in natura (presumindo-se danos perenes, remanescentes), descabe afastar a reparação indenizatória apenas pelos custos das obrigações de fazer, sem qualquer respaldo normativo. 3. Recursos especiais providos para fixar a obrigação de pagar em valor a ser apurado em liquidação por arbitramento.” (STJ, REsp 2.006.343/MS, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, j. 18.08.2022). [g.n.] Diante desse cenário, impõe-se o reconhecimento da obrigação de indenizar os danos ambientais, tanto na modalidade intercorrente quanto na residual. Tal combinação assegura, de forma concomitante, a restauração do bem jurídico lesado e a reparação pelo desequilíbrio ecológico já consolidado, promovendo, assim, a integral recomposição do dano ambiental, em consonância com os princípios da prevenção, reparação integral e responsabilidade objetiva consagrados no ordenamento jurídico brasileiro. A quantificação da indenização, por sua vez, deve ser fixada em fase própria de liquidação de sentença, mediante arbitramento, conforme dispõe o art. 509, inciso I, do Código de Processo Civil, assegurando-se, assim, o rigor técnico e a devida correspondência com a realidade fática dos autos. Tal entendimento, cumpre salientar, tem sido reiteradamente acolhido não apenas por esta c. Câmara (v.g., N.U. 1001665-73.2023.8.11.0025 e 1000419-79.2021.8.11.0100, ambos relatados pelo Des. Rodrigo Roberto Curvo, julgados em 12.02.2025), como também pelas Segunda e Terceira Câmaras de Direito Público deste e. Tribunal de Justiça (v.g., N.U. 1000730-59.2020.8.11.0018, Rel. Des. Mário Roberto Kono de Oliveira, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 10.12.2024; e N.U. 1000163-02.2023.8.11.0025, Relª. Desª. Maria Aparecida Ribeiro, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 11.12.2024). Para tanto, deverão ser considerados os seguintes elementos: (i) a dimensão e a natureza da área em que a agravada destruiu, correspondendo a 7,07 hectares de floresta amazônica, conforme consta do Auto de Infração nº 9073039-E (Id. 235016200, p. 12); (ii) o marco inicial do dano, que dependerá da constatação do início da atividade ambiental degradadora; e (iii) o marco final do dano, que dependerá da constatação da reparação da área degradada, seja pela restauração in natura, seja por compensação indenizatória do dano residual, caso a restauração não se revele viável. Por fim, afasto a aplicação do art. 85, § 11, do CPC, ante a natureza da presente demanda — ação civil pública. Diante do exposto, e considerando a fundamentação supra, com a devida vênia à eminente Relatora, DOU PROVIMENTO ao agravo interno interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO e, em consequência, ao recurso de apelação, para reformar parcialmente a sentença e condenar a apelada ao pagamento de indenização por dano material ambiental, nas modalidades intercorrente e residual, cumulativamente às demais obrigações fixadas na r. sentença. O valor da indenização deverá ser fixado em fase de liquidação de sentença, por arbitramento, nos termos do artigo 509, inciso I, do Código de Processo Civil, observando-se os critérios expressamente delineados no presente voto. A quantia apurada deverá ser revertida ao Fundo Estadual do Meio Ambiente (FEMAM), em conformidade com o disposto no artigo 13 da Lei 7.347/1985 e o artigo 9º, inciso IV, da Lei Complementar Estadual 38/1995, mantendo-se, no mais, os demais termos da r. sentença. É como voto. EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS (RELATORA): Peço para revistar os autos. SESSÃO DE 07 DE MAIO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (ADENDO) EXMA. SRA. DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS (RELATORA): Egrégia Câmara: Os autos retornam a esta Relatoria para revisitação, após a apresentação do voto-vista pelo eminente 1º Vogal, Desembargador Rodrigo Roberto Curvo, que abriu divergência, para dar provimento ao agravo interno e, por consequência, acolher o apelo interposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, reformando parcialmente a sentença de origem, para condenar a Apelada, ora Agravada, ao pagamento de indenização por dano material ambiental, nas modalidades intercorrente e residual, cumulativamente às demais obrigações fixadas na r. sentença, ressaltando que o valor da indenização deverá ser fixado em fase de liquidação de sentença, por arbitramento, nos termos do artigo 509, inciso I, do Código de Processo Civil, observando-se os critérios expressamente delineados no presente voto e a quantia apurada deverá ser revertida ao Fundo Estadual do Meio Ambiente (FEMAM), em conformidade com o disposto no artigo 13 da Lei 7.347/1985 e o artigo 9º, inciso IV, da Lei Complementar Estadual 38/1995, mantendo-se, no mais, os demais termos da r. sentença. Em sua fundamentação, o eminente Desembargador destacou a possibilidade jurídica da cumulação entre a obrigação de recompor o meio ambiente degradado e o dever de indenizar os danos ambientais decorrentes, sobretudo aqueles de natureza intercorrente ou irreversível, invocando para tanto os princípios constitucionais da proteção ambiental e da reparação integral, previstos no art. 225 da Constituição Federal. Sustentou, ainda, que, o art. 3º da Lei n. 7.347/1985, ao prever diversas formas de tutela judicial, deve ser interpretado sob a ótica sistemática e teleológica, permitindo a convivência harmônica e simultânea entre tais instrumentos, com vistas a conferir máxima efetividade à proteção ambiental. O voto vista também se apoiou na Súmula 629 do Superior Tribunal de Justiça, bem como em precedentes daquela Corte, que admitem expressamente a condenação cumulativa em ações civis públicas ambientais, como meio de garantir a observância plena dos princípios da prevenção, da reparação e da responsabilização objetiva por dano ambiental. Pois bem. Com a devida vênia ao eminente 1º Vogal, que, como de hábito, trouxe valiosa contribuição ao debate com seu voto vista, reafirmo meu voto, mantendo o entendimento firmado por esta Relatoria. Na decisão agravada, objeto do presente Agravo Interno, esta Relatora sustentou, com amparo em jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, que embora se reconheça a possibilidade de cumulação da obrigação de fazer com a indenização pecuniária nos casos de dano ambiental, tal cumulação não decorre automaticamente da lei, mas exige a análise casuística das peculiaridades de cada situação concreta. A decisão agravada alinhou-se ao entendimento firmado no AgInt no REsp 1538112/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019, ocasião em que se fixou o posicionamento de que se deve considerar as consequências do ato lesivo e a extensão dos danos para aferir a efetiva necessidade da condenação cumulativa. Veja-se: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL –AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL – DANO AMBIENTAL – DISPOSITIVOS APONTADOS COMO VIOLADOS – PREQUESTIONAMENTO – INDISPENSÁVEL – SÚMULA 282/STF – OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO – PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO – CUMULAÇÃO – POSSIBILIDADE – PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA AFASTADA PELO TRIBUNALAQUO. ACÓRDÃO ANCORADO NO SUBSTRATO FÁTICO DOS AUTOS – REEXAME – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA 7/STJ – RECURSO INTERPOSTO TAMBÉM PELA ALÍNEA C DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL – NÃO ATENDIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. 1. (...). 2. Ao decidir pela possibilidade, porém ausência de obrigatoriedade, na cumulação de condenações em reparação do dano ambiental e em indenização pecuniária, a instância de origem alinhou-se ao entendimento firmado no âmbito deste Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, segundo o qual "Embora se admita, a princípio, a cumulação da obrigação reparatória do dano ambiental com a indenizatória, nos casos em que é possível a reparação completa, esta Corte Superior de Justiça tem o entendimento de que deve ser afastada a obrigação de natureza pecuniária" (AgInt no AREsp 640.586/SC, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 20/3/2019). 3. (...). (AgInt no REsp 1538112/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019). [Destaquei] À luz dessa orientação, a análise do caso revelou que o dano ambiental identificado nos autos é passível de reparação específica, mediante a execução do Projeto de Recuperação de Área Degradada (PRADA), inexistindo demonstração de dano irreversível ou de dano intercorrente autônomo que justifique a imposição de indenização pecuniária adicional. Em que pesem os respeitáveis fundamentos apresentados pelo eminente 1º Vogal, entendo que, ainda que a teoria do dano ambiental intercorrente represente um relevante instrumento de proteção ambiental, a sua aplicação pressupõe prova cabal da ocorrência de prejuízos novos ou distintos daqueles abrangidos pela recomposição ambiental. Ademais, em que pese a disposição da Súmula 629/STJ no sentido de ser lícita a cumulação das ações de obrigação de fazer ou não fazer com a ação de cobrança de danos, em matéria de dano ambiental; é certo que o enunciado sumular, ao permitir a cumulação, não estabelece que esta se impõe de forma automática ou irrestrita em toda e qualquer situação de degradação ambiental, sendo imprescindível a análise específica da existência de parcela de dano efetivamente irrecuperável para legitimar a condenação cumulativa. Tal entendimento, aliás, vem sendo reiteradamente reafirmado pela jurisprudência pátria, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. DIREITO AMBIENTAL. DANO AMBIENTAL. CAPTURA E MANUTENÇÃO DE PÁSSAROS SILVESTRES. INDENIZAÇÃO. PARCELA IRRECUPERÁVEL. SÚMULA 629 DO STJ. Na forma da Súmula 629 do STJ, admite-se, em matéria de dano ambiental, a cumulação de pedido de obrigação de fazer ou de não fazer com pedido indenizatório, relacionado à parcela irrecuperável do meio ambiente. Ausente elemento de prova que permita aferir a existência da alegada parcela irrecuperável, tampouco quantificá-la, descabe a indenização. APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJ-RS - AC 5000796-51.2019.8.21.0139, Rel. Des. Francesco Conti, Quarta Câmara Cível, j. 24/3/2022, DJe 4/4/2022). Assim, para fins de aplicação da Súmula 629/STJ, é imprescindível a demonstração cabal e específica de que o dano ambiental possui uma parcela irrecuperável, condição que não restou comprovada nos autos. In casu, verifica do Auto de Infração n. 9073039E, de 12/11/2014 que o dano ambiental praticado decorre da destruição de 7,07 hectares de vegetação nativa tipo floresta amazônica, objeto de especial preservação, sem autorização ou licença de autoridade ambiental competente; contudo, o relatório técnico da Operação de Fiscalização conduzida pelo IBAMA, anexado aos autos do Inquérito Civil n. 52/2023 (SIMP n. 000247-039/2023), se limitou à caracterização da materialidade da infração administrativa ambiental, sem, contudo, desenvolver qualquer análise quanto à eventual irrecuperabilidade do dano ambiental praticado. Embora a fiscalização tenha utilizado ferramentas de geoprocessamento, imagens de satélite e levantamento de campo para individualizar o polígono desmatado e qualificar os responsáveis, inclusive culminando na lavratura do Auto de Infração n. 9073039-E e no correspondente Termo de Embargo, o documento não apresentou avaliação técnica acerca da extensão da degradação ecológica residual, tampouco apontou prejuízos permanentes aos serviços ecossistêmicos da área afetada. Destaco que, nos termos do próprio relatório, a sanção aplicada teve por base o art. 50 do Decreto Federal n. 6.514/2008, e a área embargada foi delimitada exclusivamente com vistas à suspensão da atividade ilícita, sem que tenha havido recomendação técnica de compensação ambiental, tampouco laudo conclusivo que atestasse a inviabilidade de recuperação por meio de PRAD. Portanto, em que pese a gravidade da conduta infracional verificada, não há demonstração de que os danos causados sejam irrecuperáveis, tampouco de que tenham resultado em prejuízos adicionais autônomos durante o lapso temporal entre o fato e a propositura da demanda. Ausente essa demonstração, a manutenção da condenação exclusivamente à obrigação de fazer se impõe como medida proporcional, adequada e alinhada à proteção ambiental efetiva, sem ensejar bis in idem ou violação ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa (art. 884 do CC/2002). Assim, considerando, que esta Relatora consignou de forma expressa que, apesar da possibilidade de cumulação, não se justifica, no caso concreto, a imposição de indenização adicional ante a ausência de comprovação de dano irreversível ou intercorrente, peço vênia ao eminente 1º Vogal para manter meu posicionamento e, consequentemente, NEGAR PROVIMENTO ao agravo interno. É como voto. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA EROTIDES KNEIP (2ª VOGAL): Acompanho o voto da Relatora. EXMA. SRA. DESA. MARIA EROTIDES KNEIP (PRESIDENTE): Em razão da divergência, o julgamento, prosseguirá com aplicação da técnica de ampliação do colegiado, prevista no art. 942 do CPC, nos termos do art. 23-A do RITJ/MT, em sessão futura. SESSÃO DE 04 DE JUNHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (3º VOGAL – CONVOCADO): Acompanho o voto da Relatora. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO (4ª VOGAL – CONVOCADA): Acompanho a divergência inaugurada pelo Des. Rodrigo Roberto Curvo. Data da sessão: Cuiabá- MT, 04/06/2025
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