Processo nº 0002781-02.2023.8.27.2737
ID: 315491943
Tribunal: TJTO
Órgão: 2ª Vara Criminal de Porto Nacional
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0002781-02.2023.8.27.2737
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VANESSA SILVA DE MOURA
OAB/TO XXXXXX
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ALINE RANIELLE SOUSA MARREIRO LIMA
OAB/TO XXXXXX
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VITOR GALDIOLI PAES
OAB/TO XXXXXX
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SOLANO DONATO CARNOT DAMACENA
OAB/TO XXXXXX
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Ação Penal - Procedimento Ordinário Nº 0002781-02.2023.8.27.2737/TO
RÉU
: GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
ADVOGADO(A)
: SOLANO DONATO CARNOT DAMACENA (OAB TO002433)
ADVOGADO(A)
: VITOR GALDIOLI PAES (OAB…
Ação Penal - Procedimento Ordinário Nº 0002781-02.2023.8.27.2737/TO
RÉU
: GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
ADVOGADO(A)
: SOLANO DONATO CARNOT DAMACENA (OAB TO002433)
ADVOGADO(A)
: VITOR GALDIOLI PAES (OAB TO006579)
ADVOGADO(A)
: ALINE RANIELLE SOUSA MARREIRO LIMA (OAB TO004458)
ADVOGADO(A)
: VANESSA SILVA DE MOURA (OAB TO010939)
SENTENÇA
I – Relatório.
O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
, imputando-lhe os crimes previstos nos artigos 1º, incisos III e V e IX do Decreto-Lei nº 201/687 e 299, “caput” e § único do Código Penal Brasileiro.
Consta da denúncia (evento nº 01):
“A presente denúncia deita raízes no procedimento de investigação criminal em epígrafe, que foi instaurado para averiguar, em todas as suas circunstâncias, possíveis crimes perpetrados pelo ex-prefeito de Oliveira de Fátima (TO)
Gesiel Orcelino dos Santos
no ano de 2015.
Trata-se, pois, do desdobramento lógico de investigações procedidas sob o prisma da improbidade administrativa nos autos do (incluso) inquérito civil público n. 060/2015 que tramitou nesta Promotoria de Justiça e culminou no ajuizamento da ação civil pública tombada nesta comarca sob o n. 0002206-04.2017.8.27.2737 e, também, na instauração do inquérito policial de n. 0010159-82.2017.827.0000 no âmbito do E. Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins e do Procedimento Investigatório Criminal n. 10/2018 na Procuradoria-Geral de Justiça do Estado do Tocantins que, posteriormente, foi convertido no e-Proc de n. 0016740-79.2018.827.0000 com o escopo de perquirir a licitude de 21 (vinte e um) obscuros procedimentos licitatórios realizados durante a gestão do alcaide.
Com efeito, a presente denúncia se cinge, especificamente, aos fatos versados no item ‘6’ da petição inicial que deflagrou a referida ação cível pública, os quais serão transcritos adiante para oportunizar a melhor compreensão deste Juízo quanto aos pedidos finais:
“6. DA ILEGALIDADE EM PAGAMENTOS E DAS TENTATIVAS DE ADULTERAÇÃO DE PROVAS EM RELAÇÃO A UMA LOCAÇÃO DE IMÓVEL RESIDENCIAL
Com o seguimento das apurações, outra pessoa esteve no Ministério Público trazendo notícias outras graves ilegalidades praticadas pelo prefeito Gesiel. Realmente, a empresária ELIANE FERREIRA CAMPOS, relatou que o prefeito acordou verbalmente um aluguel de um imóvel residencial para a prefeitura, que não pagou os aluguéis, e que, mais de 1 ano depois, agora em 2017, passou a insistiu para que a dona do imóvel assinasse um instrumento de contrato com conteúdo falso e data falsa, com referências ao imóvel ter sido destinado em 2015 a destacamento de polícia e cadeia pública, o que não é verdade, visando como isso criar documento antedatado e burlar auditoria do Tribunal de Contas que vem acontecendo atualmente na prefeitura.
Realmente, a fls. 259, constou o depoimento de ELIANE: “Que a declarante é proprietária de uma empresa denominada SERTÃO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO, CNPJ 17883229/0001-14 e inscrição estadual 294479538; Que o cnpj e a inscrição estadual da empresa da declarante foram utilizados pela empresa LEMOS CONSTRUÇÃO E CONSTRUTURA conforme consta de uma ação cível ajuizada; Que foram várias notas fiscais feitas com o cnpj da empresa de declarante em nome da Lemos, tendo a declarante descoberto tal fato em novembro 2015 e pedido lavratura do B.O. 53004E/2015; Que a declarante tem um imóvel, uma casa residencial, na av. Araguaia, qd. 28, lote 01; Que no dia 02 de março de 2015, ou seja antes da declarante saber do uso das notas fiscais, a declarante alugou sua casa residencial a pedido do prefeito Gesiel; Que foi o prefeito que entrou em contato com a declarante e combinou o aluguel da casa por R$ 500,00; Que a declarante entregou cópia de seus documentos pessoais e documentos da casa para a secretária do prefeito, sra. Leda, que é parente dele, para que Gesiel fizesse o contrato; Que para a declarante Gesiel falou que daria a casa para ser usada pelo policial morar com a esposa;
Que a declarante somente recebeu três transferências de R$ 475,00, conforme extrato que ora apresenta, mas tal valor era para pagamento de serviços de forração da própria casa, que seria abatido do aluguel; Que tal serviços foi feito por uma pessoa que Leda conseguiu; Que não recebeu o aluguel dos outros meses e nem água, energia; Que em julho de 2015 como não recebia os aluguéis falou pessoalmente com o prefeito e pediu as chaves; Que ele negou e falou para a declarante trocar a o cilindro da fechadura; Que a declarante assim fez; Que no final de 2016 mandaram no e-mail da declarante o contrato que ora entrega; Que a declarante nesse ato acessou seu e-mail eli.sertao@hotmail.com e encontrou o e-mail enviado no dia 09/10/2015 por Rosane Vanderley, que trabalha na prefeitura encaminhado o contrato; Que a declarante não assinou o contrato pois a data estava desde janeiro até dezembro de 2015, o que não verdade e muito menos a casa residencial da declarante foi usada para destacamento policial e cadeia pública e também nem a declarante recebeu R$ 5.866,66 de aluguel; Que agora em fevereiro de 2017 a pessoa de Flávia, que trabalha na prefeitura e é enteada de Gesiel, ligou para a declarante cobrando a assinatura do contrato; Que a declarante novamente falou que não ia assinar o contrato; Que inclusive Flávia mandou uma mensagem de texto, conforme a declarante apresenta agora no seu celular e autoriza foto; Que em razão dos funcionários do Tribunal de Contas estarem em Oliveira de Fátima e da mensagem de Flávia, a declarante resolveu fazer um requerimento de informações acerca de existência de licitações que tenham sido feitas em seu nome e também de cópia do contrato de locação; Que a declarante nunca participou de licitação na prefeitura de Oliveira no mandato de Gesiel; Que a declarante chegou a assinar uma proposta em uma licitação da Câmara de Vereadores, mas desistiu porque o prefeito sugeriu que a LEMOS ficaria com parte da licitação e a empresa de declarante com outra parte e que não tinha prazo para pagamento; Que se existir alguma licitação com proposta da empresa da declarante para a prefeitura as assinaturas da declarante não são verdadeiras, pois como dito não participou de licitações para na prefeitura; Que depois que fez o requerimento o prefeito Gesiel ligou para o telefone da declarante e falou que era para a declarante assinar o contrato de locação da casa; Que o prefeito falou que ele tinha pago a reforma, o que não é verdade, pois foi a declarante que pagou com o valor depositado; Que ele falou que se a declarante não assinasse ele ira entrar com ação no Ministério Público e a declarante ia “pagar bem caro”; Que o prefeito também mandou mensagem por WhatsApp querendo a assinatura da declarante no contrato, conforme a declarante nesse ato apresenta o aparelho e autoriza foto; Que o prefeito ligou várias vezes e também foi na casa da mãe da declarante que mora em Oliveira de Fátima; Que a mãe da declarante disse que o prefeito Gesiel falou que era para ela (mãe) convencer a declarante a assinar o contrato pois ia entrar na Justiça e as a declarante ia pagar muito caro; Que sua mãe ficou muito nevosa;” locação de um prédio urbano onde seria instalado e passaria a funcionar o Destacamento da Polícia Militar na cidade, ajustando a realização de reformas no imóvel às custas do erário como, de fato, foi procedido por profissionais contratados e remunerados com verbas públicas por determinação do denunciado, os Srs. Gilmar dos Santos Sobreira e Gilklériton Dias Sobreira.
Nesse percurso, o Município de Oliveira de Fátima (TO) deixou de pagar os alugueres ajustados com Elaine Campos, levando-a a retomar a posse do imóvel, mas, mesmo assim, o denunciado
Gesiel Orcelino dos Santos
determinou/autorizou a instauração de processo administrativo no âmbito da prefeitura de Oliveira de Fátima (TO), que foi instruído com cópias de um contrato escrito de locação do imóvel que, no entanto, não contava com a assinatura e o conhecimento da locadora e de notas fiscais que teriam sido por ela emitidas contra a municipalidade para justificar a transferência de recursos públicos, na monta de R$ 1.345,00 (mil e trezentos e quarenta e cinco reais), que, em tese, deveriam servir para remunerar Gilmar e Gilklériton.
Não bastasse isso, as diversas testemunhas interrogadas pelos investigadores foram uníssonas em afirmar que o imóvel nunca foi utilizado na finalidade ajustada entre Gesiel eElaine e se manteve fechado durante todo o tempo que permaneceu à disposição do ente público.
Já em 2017, técnicos do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins passaram a auditar diversos documentos do Município e Oliveira de Fátima (TO) e se depararam com o processo administrativo de dispensa de licitação de n. 049/2015 alhures mencionado. Diante da ausência de elementos comprobatórios da lisura das despesas nele documentadas (vide evento 38), os auditores cobraram por explicações do ex-prefeito que, imediatamente, passou a pressionar Elaine Campos para assinar o contrato escrito pós-datado e cujas avenças e datas não refletiam a realidade, fazendo-o, inclusive, por meio de ameaças diretas e/ou veladas a sua pessoa e sua genitora, como se infere da petição inicial da ação civil pública que instrui esta exordial.
Ora, a atitude do gestor que utiliza-se de um meio informal (WhatsApp) para buscar em 2017 uma assinatura de contrato de 2015, ideologicamente falsificado (com conteúdo e data inverídica), revela, às escâncaras prática de ato de improbidade e evidente risco da higidez da instrução processual, pois o gestor pessoalmente está a tentar maquinar documentos públicos para justificar despesas e burlar os órgãos de controle […].
A requerida Flávia também mandou outra mensagem de texto recentemente para a empresária exigindo a assinatura do dito contrato, conforme foto de fls. 272 (vide anexos) e também declarações da testemunha […]”.
Realmente, restou comprovado no caderno de provas que acompanha esta denúncia que, agindo na qualidade de prefeito do Município de Oliveira de Fátima (TO), no início do ano de 2015, o denunciado Gesiel Orcelino celebrou contrato verbal com Elaine Campos visando a
Neste caso, os auditores identificaram que Gesiel Orcelino promoveu dispensa de licitação sem apresentar justificativa suficiente sobre a emergencialidade que bastaria para autorizar a não deflagração de competição visando a locação de um imóvel e sobre o preço ajustado com a proprietária Elaine Campos. Verificaram, também, que o denunciado não providenciou o laudo de vistoria do imóvel e se omitiu no dever de garantir assinaturas devidas no contrato ou mesmo no documento que documentava a rescisão contratual, também encontrado no processo administrativo de dispensa de licitação sem assinaturas.
Ou seja, restou comprovado que Gesiel autorizou/procedeu a ‘montagem’ de um processo simplesmente para justificar pretéritas despesas com a reforma de um imóvel de terceiro, deixando de observar as comezinhas regras aplicáveis à contratação de serviços e realização de gastos públicos previstas nos artigos 24 e 25 da Lei de Licitações vigente na época e, também, no artigo 56 e seguintes da Lei n. 4.320/1964.
Por isso mesmo, o alcaide sofreu censura nos autos do Processo n. 5.537/2017 que tramitou no Tribunal de Contas do Estado do Tocantins, respaldada nas seguintes conclusões do conselheiro relator:
Neste contexto, não resta alternativa senão denunciar
Gesiel Orcelino dos Santos
a Vossa Excelência como incurso nas penas previstas no artigo 337-E do Código Penal (que hoje tipifica a figura delitiva antes encontrada no artigo 89 da Lei de Licitações e, por força do princípio da continuidade-normativa, deve ser aplicado ao caso em tela), posto que, de maneira livre e consciente, admitiu, possibilitou e deu causa à contratação direta e fora das hipóteses legais da locação de um imóvel particular e, também, de serviços de reforma do prédio tudo às custas do erário.”
No evento nº 06, foi recebida a denúncia em 08/08/2023.
No evento nº 13, foi certificado que o acusado
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
não foi encontrado no endereço disponível aos autos.
No evento nº 16, o Ministério Público requereu a citação por edital de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
e, não sendo possível, pela expedição de edital.
No evento nº 19, foi informado que não foi possível manter contato com o acusado via WhatsApp ou ligação telefônica.
No evento nº 23, foi expedido edital para citação de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
, cujo prazo transcorreu in albis, conforme certidão de evento nº 24.
No evento nº 27, o Ministério Público requereu a suspensão do processo e do prazo prescricional, com fundamento no artigo 366 do Código de Processo Penal, bem como pugnou pela decretação da prisão preventiva de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
, nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal, por conveniência da instrução criminal e para garantir a aplicação da lei penal, por entender que existem suficientes provas sobre os fatos criminosos a ele imputados na denúncia, e comprovado o desconhecimento de seu paradeiro, o que coloca em risco a efetividade do processo.
No evento nº 29, foi determinada a escrivania para proceder a pesquisa do endereço e contato telefônico de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
antes de deliberar sopre o pedido de prisão de evento nº 27, a fim de esgotar todos os meios existentes para tentativa de sua citação.
A pesquisa foi realizada, conforme eventos nº 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 45, 46, 47, 48 e 49.
No evento nº 50, o Ministério Público informou o atual endereço de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
.
O acusado
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
foi devidamente citado (evento nº 53) e apresentou Resposta à Acusação por intermédio de advogado (a) constituído (a), requerendo sua absolvição sumária, nos termos do artigo 397 do Código de Processo Penal, sustentando que não restou comprovada a vontade livre e consciente de se apropriar de bens ou rendas públicas, não comprovando o dolo específico em causar prejuízo ao erário, pois em pequenos municípios, como Oliveira de Fátima, é extremamente difícil encontrar um imóvel apropriado para atender as necessidades do município, criando-se inviabilidade de competição. Em relação ao crime de falsidade ideológica, aduz que o contrato de locação, objeto da denúncia, deve ser tratado como mero rascunho, haja vista que, ante a ausência das assinaturas das partes contratantes, não demonstrando, de forma inequívoca, que o denunciado tenha inserido de forma dolosa falsas informações.
No evento nº 70, as preliminares arguidas pela defesa de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
foram indeferidas, recebida a denúncia, com designação de audiência de instrução e julgamento.
Em audiência realizada no dia 18/11/2024, foram ouvidas as testemunhas arroladas pela acusação Gilmar dos Santos Sobreira, Gilklériton Dias Sobreira e Uander de Souza Amaral, concedido o prazo de 10 (dez) dis ao Ministério Público para apresentar novo endereço da testemunha Elaine, e redesignada a audiência (evento nº 111).
Em audiência realizada no dia 05/02/2025, foi ouvida a testemunha de acusação Elaine Ferreira Campos, inquirida a testemunha de defesa Francisco Idejair Viana de Macedo, e realizado o interrogatório do acusado (evento nº 128).
O Ministério Público, em suas alegações finais por memoriais (evento nº 131), requereu a procedência da presente Ação Penal, por entender que restaram comprovadas materialidade e autoria dos crimes imputados aos réus, pela documentação juntada no Inquérito Policial de autos nº 0002994-76.2021.827.2737, especialmente contrato de locação sem assinatura de Eliane Campos, cópia de termo de rescisão contratual sem assinatura das partes, cópias de extratos de transferência bancárias, declarações prestadas, cópia de Relatório do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins, comprovando que não houve a alocação da unidade no imóvel alugado por decisão pessoal do acusado Gesiel, o que comprova que o requisito de emergencialidade por ele alegado nunca existiu, entendendo que o conjunto probatório demonstra que, agindo de maneira livre e consciente, o ex prefeito agiu decisivamente para o desvio de verbas municipais, para falsificação de documentos e defraudação de processos administrativos.
A defesa de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
, em sede de alegações finais por memoriais (evento nº 135), requereu sua absolvição, na forma do artigo 386, III, V e VII do Código de Processo Penal, sustentando que a utilização do imóvel foi necessária uma reforma (forro e pintura), cujo processo perdurou por cerca de três meses e, próximo à finalização, a senhora Eliane desistiu do acordado, retomando o imóvel sem aviso prévio e trocando as fechaduras, sendo a ausência de assinatura do contrato plenamente justificável dada a recursa da proprietária em assinalo, e os depósitos no valor de R$ 1.425,00 reais foram efetuados, não havendo a prática dos delitos previstos nos artigos 1º, III, V e XI do Decreto-Lei nº 201/1967, por entender que a locação do imóvel se deu com a finalidade precípua de atender as necessidades da administração pública, conforme depoimentos prestados em Juízo, e que a situação se amolda na hipótese de dispensa/inexigibilidade de licitação.
No evento nº 133, foi juntada certidão de antecedentes criminais.
Os autos vieram conclusos para sentença.
Eis, no essencial, o relatório. Decido.
II- Inexistência de Preliminares
O presente feito fora regularmente processado, atendendo ao princípio constitucional do due process of law, sendo observadas ao denunciado as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, presente as condições de procedibilidade da ação penal e os pressupostos processuais de existência e de desenvolvimento dos atos processuais.
III – Fundamentação
Visam os presentes autos de ação penal pública incondicionada apurar a responsabilidade criminal do denunciado
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
, imputando-lhe os crimes previstos nos artigos 1º, incisos III e V e IX do Decreto-Lei nº 201/687 e 299, “caput” e § único do Código Penal Brasileiro.
O processo não ostenta vícios.
As provas encontram-se judicializadas, colhidas com a observância de todos os princípios norteadores do devido processo legal, e sob as luzes do princípio constitucional da ampla defesa. Presentes as condições imprescindíveis ao exercício do direito de ação, bem como os pressupostos processuais.
III.I. Da prescrição referente aos crimes de desviar/aplicar indevidamente rendas ou verbas públicas e ordenar ou efetuar despesas não autorizadas pela lei, ou realizá-las em desacordo com as normas financeiras pertinentes (artigo 1º, inciso III, V e IX do Decreto-Lei nº 201/67)
É cediço que uma das hipóteses de extinção de punibilidade é a prescrição, que corresponde à extinção do direito do Estado de punir uma conduta considerada penalmente ilícita, ante o decurso do prazo legalmente estabelecido, conforme previsto no artigo 107, inciso IV do Código Penal,
in litteris:
Art. 107 - Extingue-se a punibilidade:
(...)
IV - pela prescrição, decadência ou perempção;
Acerca da prescrição, dispõe o artigo 109, do Código Penal,
in verbis:
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
(...)
IV - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;
(...)
Extrai-se dos autos que, os fatos delituosos constantes da denúncia (evento nº 01) ocorreram nos meses iniciais de
2015
,
e que
a pena máxima em abstrato atribuída pelo crime do artigo 1º, incisos III. V e IX
do Decreto-Lei nº 201/67
é de 03 (três) anos de detenção
, verbis:
Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:
(...)
Ill - desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas;
(...)
V - ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-Ias em desacordo com as normas financeiras pertinentes;
(...)
IX - Conceder empréstimo, auxílios ou subvenções sem autorização da Câmara, ou em desacordo com a lei;
§1º Os crimes definidos nêste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos.
Entre o fato delituoso (INÍCIO DE 2015) e o recebimento da denúncia (08/08/2023),
passaram-se mais de 08 (oito) anos, não havendo dúvidas quanto a configuração da prescrição punitiva do crime atribuído à
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
.
Mesmo que tenha sido recebida a denúncia e realizada instrução processual,e que as partes não tenham arguida a questão prejudicial de mérito, a causa extintiva da punibilidade deve ser reconhecida de ofício por este Juízo, por ser questão de ordem pública.
III.II. Do crime de falsidade ideológica (artigo 299 do Código Penal)
Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.
(Vide Lei nº 7.209, de 1984)
O delito de falsidade ideológica tem como objeto jurídico a fé pública, especialmente a genuinidade ou veracidade do documento, sendo seu tipo objetivo a falsidade quanto ao conteúdo do documento.
O tipo objetiva proteger a segurança jurídica, na medida em que os documentos públicos, diante da presunção de legitimidade e veracidade da que gozam, são aptos para produzir efeitos desde o momento em que são lavrados (STJ, RHC 78502/53640).
É admitido somente na forma dolosa, uma vez que se perfaz como dolo específico, não havendo falsidade ideológica sem consciência da falsidade.
Em qualquer das modalidades do crime, é indispensável que a falsidade seja capaz de ludibriar, e tenha por objeto fato que tenha repercussão no universo jurídico, ou seja, é mister que a declaração falsa constitua elemento substancial do ato ou documento, pois uma simples mentira, mera irregularidade, simples preterição de formalidade etc, não constituirão (MAGALHÃES NORONHA, Direito Penal, 1995, v. IV, p. 163).
Cumpre elucidar que a falsificação do conteúdo deve ser juridicamente relevante e ter potencialidade para prejudicar direito; caso contrário, será um dado supérfluo, inócuo, indiferente (MIGUEL REALE JÚIOR, in RT 667/250).
III. II. a – Materialidade e autoria
A prova da materialidade e autoria do crime de falsidade ideológica não restou devidamente comprovada
, pelas provas produzidas no Inquérito Policial de autos nº 00121961420208272737 e na presente Ação Penal, uma vez que não há nos autos provas de que o acusado Gesiel, tenha, efetivamente, inserido declaração falsa em documento público conforme narrado na exordial acusatória, em que pese existir indícios de que o procedimento administrativo não foi o correto na situação telada.
Perlustremos os elementos probatórios: prova direta e indireta, indícios e circunstâncias. Em audiência instrutória, registrada em meio audiovisual, constatam-se, em síntese, o seguinte, verbis:
Gilmar dos Santos Sobreira,
testemunha arrolada pela acusação,
em Juízo,
relatou que nunca morou em Oliveira de Fátima, sempre morou em Fátima, e que conheceu Gesiel por nome, porque tem parentes em Fátima, uma irmã dele é comerciante, e conhecia por nome e, quando ele foi Prefeito, prestou serviço na prefeitura, de montagem de vidros e depois fez outro serviço para ele, de montagem de forro em uma carinha popular, e que esse serviço do forro, ele não pediu nota fiscal, disse que não precisava, não recorda a quantidade. Que montou vidros em um Colégio municipal, não se recorda o nome, e que forneceu e tirou nota fiscal, não se recorda o valor, faz tempo, mas cerca de oito a dez mil reais. Que não sabe de quem é a casa onde montou o forro, Gesiel o procurou, e não queria fazer o serviço, porque não deram muito certo no primeiro negócio, ele o procurou, falou que não poderia fazer, ele disse que ia pagar à vista, não ia ter prazo, perguntou se era para fazer para a Prefeitura, mas Gesiel falou que era para ele, disse onde era, o endereço, fez a medição e a montagem do forro, ele falou que ia pagar à vista, não pagou, ele cobrando, cerca de oito a dez dias, não se recorda, Gesiel falou que já tinha pagado, mas não estava na conta e ele falou para procurar, e viu que quem lhe pagou foi uma mulher, não se recorda o nome dela, e pagou na conta poupança, e não sabe se ela era a dona da casa. Que não se recorda de ter feito obras na residência de Eliane Ferreira Campos, fez o serviço nessa casa, mas não sabe de quem é, porque Gesiel lhe mostrou e lhe deu a chave, não sabe até hoje de quem é a casa. Que não chegou a fazer obra no destacamento da polícia e cadeia pública. Que a casa que fez o forro era próxima do Sertão Materiais de Construção, a loja não existe mais, mas é próximo, e são no mesmo lote, pelo que se recorda. Que não sabe quem era o dono ou a dona da loja, apenas que era conhecido por “Sertão”, não sabe o nome exato. Que, na época, Gesiel pediu urgência, porque estava “ajeitando” essa casa para um policial morar, que ia prestar serviço em Oliveira e ia morar nessa casa, que tinha pressa. Que foram esses dois serviços que prestou para Gesiel, da escola e da residência, no da escola forneceu nota fiscal, e o outro ele disse que não ia precisar. Que Fátima fica cinco quilômetros distante de Oliveira de Fátima. Que não sabe como funcionava o trâmite de contratações, não assinou nenhum contrato, quando fez o serviço do vidro, lhe pediram nota fiscal e entregou. Que não teve contrato para o serviço da instalação do forro, combinaram verbalmente, prestou o serviço, material e mão de obra, e teve esses oito a dez dias para ele lhe pagar, e ele sempre cobrando. Que não sabe o nome da pessoa que fez o pagamento, apenas que era uma mulher, não sabe se era a proprietária da casa, mas acha que a casa é no mesmo lote da loja.
Gilklériton Dias Sobreira,
testemunha arrolada pela acusação,
em Juízo,
informou que conhece Gesiel como cliente, porque já prestaram serviço, reide em Fátima, nunca morou em Oliveira de Fátima, já prestou serviço de um forro na casa dele um em uma escola municipal. Que fizeram vidros em algumas salas da escola e no outro do forro em uma casa popular, não se recorda de quem era a casa, era menor na época, apenas trabalhava ajudando seu pai. Que se recorda que demorou para seu pai receber em um dos casos. Que já passou várias vezes na frente da loja Sertão Materiais de Construção, quando existia, não sabe de quem é, ficava próxima a casa que instalaram o forro, e acha que é no mesmo lote, porque é de esquina.
Uander de Souza Amaral
, testemunha arrolada pela acusação,
em Juízo,
relatou que é Policial Militar, atualmente está lotado em Paraíso do Tocantins, e já trabalhou em Oliveira de Fátima por um período, cerca de um ano, apenas trabalhava no local, e pernoitava no destacamento, que era um prédio cedido do município e, quando trabalhou, o prefeito era Gesiel. Que o destacamento funcionava como se fosse um anexo da prefeitura municipal, um espaço “colado” na prefeitura, e foi uma solicitação que fez para Gesiel, porque, na época que trabalhou em Oliveira de Fátima, era um local insalubre e inseguro. Que não foi reformado, no decorrer do período, ele tentou fazer a locação de uma casa, estava tudo indo certo e, de repente, algo deu errado, não sabe o que foi, Gesiel disse que não tinha dado certo, e desistiram e, por falta de efetivo, foram realocados para outro município. Que a casa que Gesiel ia alugar era para ser o destacamento, ele teria alugado e estaria em reforma. Que chegou a conhecer a casa, escolheu um local e, posteriormente, acompanhou parte da reforma que estava fazendo, como forro e alguns ajustes. Que sabe que a proprietária é uma mulher, mas nunca viu. Que a casa era residencial que estava sendo adaptada, ficava no centro da cidade, e nunca tiveram a oportunidade de trabalhar nessa casa. Que tinha uma loja de material próxima da casa, mas não se recorda do nome.
Elaine Ferreira Campos,
testemunha arrolada pela acusação,
em Juízo,
informou que já morou em Oliveira de Fátima, conhece Gesiel, porque estudaram juntos. Que alugou um imóvel quando Gesiel era prefeito em 2015 e, no tempo, ele falou que era para o policial e para a família do policial, para morar, não para comércio. Que ficou para Gesiel fazer o contrato, na época, morava em Porto Nacional, entregou os documentos para a secretária dele, Leda, e ficou dele mandar o contrato para assinar e, passados dias e meses, isso não aconteceu. Que entregou a chave do imóvel para ele, ligava para ele, ele não atendia e, um certo dia, foi em Oliveira de Fátima, tentou ligar para ele várias vezes, e nunca teve ninguém morando na casa. Que alugou a casa no dia dois de março, e ficou dela forrar a casa, mas descontado do valor do aluguel, para poder morar. Que forrou a casa, ele não vinha pagando o aluguel, que era de quinhentos reais. Que a Leda procurou o rapaz do forro, ele fez o serviço e, quando terminou, ele ligou para ela efetuar o pagamento, mas, como Gesiel não tinha feito o pagamento, ligou para Leda, conversou com ela, e eles fizeram três depósitos em sua conta no valor de quatrocentos e setenta e cinco reais. Que o valor do aluguel era quinhentos reais, o valor do serviço do forro era um mil trezentos e quarenta e cinco reais, passou o valor para o rapaz que fez o forro, de nome Gilmar, e ficou o restante, porque Gesiel não efetuou o pagamento, ligava e ele não atendia e, certo dia, foi na casa, o capim estava muito grande, ele não estava cuidando, pediu para um colega fazer uma limpeza, achou a chave em um depósito do lado, a chave da cozinha da casa, abriu e, quando olhou, tinha bastante sujeira, estava limpando a casa e, quando saiu na área, Gesiel estava na rua, falou para ele que tinha ligado várias vezes e ele não tinha atendido, ele afirmou que ela não teria ligado, falou para ele olhar no telefone e foi verificado que realmente estavam suas ligações. Que conversou com ele, ele se alterou, falou que era ela que estava devendo para ele, e gerou uma discussão, ele falou que não ia lhe pagar. Que pediu a cave da casa, ele falou que não ia entregar, e que, se ela quisesse, ela trocasse o cilindro da porta, e assim fez. Que Gesiel saiu bastante “zangado”, falando que ela “ia resolver com a justiça, que era para resolver com o advogado dele”, e ficou tranquia. Que, logo após, ele voltou querendo que assinasse, entrasse em acordo para assinar o contrato, mas não deu certo. Que nunca teve contrato de locação, foi verbal, e sabe que o TCE apareceu na prefeitura, e ligaram para ela, falando que ela tinha que assinar esse contrato, a Flávia mandou no seu e-mail, que é enteada de Gesiel e era secretária. Que não sabe dizer no nome de quem iria ser a locação, se iria ser no nome da Prefeitura, não chegaram a conversar sorbre isso, mas, desde o início, foi dito que um policial iria morar lá, e o combinado era ela forrar e abater no aluguel. Que o imóvel ficou na posse de Gesiel do mês de março até julho, poucos meses, mas ele queria que ela assinasse o contrato de janeiro até dezembro, e não assinou, porque não era o combinado. Que ele não pagou o que ela entendia que ele estava devendo, apenas pagou esses três depósitos de quatrocentos e setenta e cinco reais. Que questionou Leda sobre não ser o valor combinado, e ela disse que tinha que resolver com Gesiel, e ele nunca mais a atendeu. Que deixou seus documentos com a Leda para fazer o contrato de aluguel, no contrato, o valor era de quinhentos reais. Que tinha uma loja de material de construção, chamada Sertão Material para construções, abriu em Oliveira de Fátima e, depois, transferiu para Porto Nacional. Que a Lemo Construção e Construtoras é de Fernando, amigo do Gesiel, e que fez um boletim de ocorrência contra essa empresa, porque, no final do ano, descobriu que estava usando seu CNPJ, que a Lemos funcionava em Oliveira de Fátima, não sabe dizer como conseguiram os dados dela, sua empresa e ela, por enquanto, não respondem em razão dessas notas. Que Rosania Vanderlei é funcionária da prefeitura, e enviou o contrato no e-mail, mas quem entrou em contato foi a Flávia, e que ela entendia que não estava ok. Que, depois desse contato para assinatura do contrato, procurou Gesiel, mas ele não a atendia, nem mesmo Leda, ligava na prefeitura, no celular pessoal, e não a atendiam. Que, nesse período que Gesiel foi prefeito, não participou de nenhuma licitação. Que Gesiel esteve em sua casa, lhe convidou para participar de licitação na Câmara, mas não participou, era para fornecimento de materiais de construção, a chamou para participar junto com a Lemos, ele ficava com uma parte, ela com outra, mas a prefeitura não tinha tempo para pagamento, e, como estava iniciando, não poderia aceitar uma proposta dessa, não poderia entregar material sem data de recebimento. Que teve um “episódio muito chato”, Gesiel esteve na casa de sua mãe, “falando para minha mãe que, se ela não me convencesse a assinar o contrato, que eu iria pagar muito caro, e minha mãe ficou bastante apavorada, me ligou desesperada, e eu ligava para ele, ele não me atendia, ficou uma situação ruim”. Que não teve outro contato de Gesiel com sa família, o Tribunal de Contas não entrou em contato com sua empresa para esclarecimento. Que o Ministério Público não a notificou para levar documentos, mas que esteve no Ministério Público. Que não deu recibo de quitação dos três depósitos de quatrocentos e setenta e cinco reais, porque foi do serviço do forro da casa. Que Gesiel a procurou pessoalmente para alugar essa casa, não sabe se tinham outros imóveis para alugar. Que, quando houve a locação do imóvel, residia em Porto Nacional, não estava diariamente em Oliveira de Fátima, tratou com Leda e Gesiel, que era secretária do município. Que, quando tratou com Gesiel da locação, o dia acordado era dois de março de 2015, Gesiel não estava efetuando o pagamento, não teve período para a locação, ele não falou nada, apenas falou que ia alugar para um policial e a família, ia fazer o contrato, levou a documentação e ficou esperando o contrato. Que foi feita a contratação de uma pessoa para fazer o forro, cujo valor do serviço seria descontado no aluguel. Que não sabe falar quanto tempo demorou para fazer o forro, porque, como já tinha entregado as chaves para ele, não teve mais contato com a casa, a Leda ficou responsável por isso. Que não teve contato com o Policial, ele não olhou a casa com ela, em Oliveira de Fátima não tem muitos imóveis para locar, a casa foi alugada pelo valor de mercado. Que Gesiel ofereceu os quinhentos reais para a locação da casa, não teve avaliação, ele só lhe fez essa proposta e, como tinha se mudado da casa e estava sem morador, alugou. Que não recebeu nem três meses de aluguel, apenas recebeu o valor de um mil quatrocentos e vinte e cinco reais. Que não sabe dizer se Leda afirmou que nesse valor teve algum desconto de tributo, não perguntou. Que, no dia que falou com Gesiel e pediu a chave, ele falou que estaria devendo para ele, não perguntou o porque, não sabe dizer se é porque ele pagou o aluguel e não utilizou, porque o combinado era que ela pagasse o forro, então, ele ainda estava devendo, e ela não estava devendo nada para ele. Que o aluguel foi de março a julho, o valor era quinhentos reais, ele pagou três parcelas de quatrocentos e setenta e cinco reais, que, somadas, são no valor de um mil quatrocentos e vinte e cinco reais, ele descontou 5% de cada parcela e, quando ele locou a casa, ele pegou os documentos e disse que ia fazer o contrato.
Francisco Idejair Viana de Macedo,
testemunha arrolada pela defesa, em Juízo, relatou que é contador, e, na época do mandato de Gesiel, foi secretário de gabinete e de administração, auxiliou na contadoria e, atualmente, é subsecretário da atual administração. Que, na última eleição, saiu do lado oposto ao Gesiel. Que reside em Fátima, e trabalha diariamente em Oliveira de Fátima. Que em Oliveira de Fátima não tem muitos imóveis para locação e, às vezes, aparece uma “casinha popular”, o pessoal muda, mas é esporadicamente. Que tem experiência em licitação. Que, de acordo com a legislação, a locação de imóveis urbanos pode ser feita pela licitação presencial, pregão, convite, como a lei manda, e demanda muito do valor a ser locado. Que se recorda da locação do imóvel de Eliane e que, durante a gestão de Gesiel, houve a procura desse sargento da PM, o responsável pelo destacamento, solicitando ponto de apoio ao gestor para os demais comandados durante a operação no município e municípios vizinhos, e Gesiel sempre deu esse apoio para a segurança pública, tinha parceria direcionada à segurança pública, e foi passado ao comandante para ele procurar uma residência para eles locarem, ele procurou no município e achou essa residência de Eliane e levou ao conhecimento do prefeito, o prefeito perguntou se comportava o que ele tinha interesse para fazer, o destacamento, ponto de apoio para a Policia Militar, e ele disse que a casa servia, e o prefeito pediu para ele tomar as providências, fazer a contratação da prestação de serviço e assim foi feito. Foi feita a procura de Eliane para fazer a locução e, durante essa procura, eles começaram a fazer uma reforma, que já havia uma pré contratação verbal entre as partes, e começou a fazer a reforma, pintura, fazer forro da casa que precisava, a pintura demorou um pouco para ser entrega, a proprietária, na época, morava no município e, logo depois, foi embora para Porto Nacional, ela é proprietária de material de construção, ela fechou essa loja, era ao lado da residência, foi embora para Porto Nacional, e ficaram em contato com ela durante todo esse período para regularizar o imóvel. Que foi feito um processo de requerimento, solicitando a prestação de conta da locação e, durante esse processo, foi montado um processo administrativo, foi elaborado um contro e foi demorando essa questão, e a mulher solicitou o pagamento do imóvel, e entraram em contato com ela pedindo que ela fosse até o município assinar o contrato de locação, ela demorou, não quis ir assinar o contrato, e falou que apenas assinaria mediante os pagamentos da locação, dos meses em atraso. Que Gesiel solicitou que ele entrasse em contato com ela, entrou em contato com a proprietária do imóvel, e ela falou que só assinava se fosse com esse pagamento, acha que foram repassadas três parcelas, dois ou três. Que foram feitos, porque ela falou que só assim assinaria o contrato, e houve uma dedução de ISSQN no valor de 3%, acha que a parcela era quinhentos reais e a dedução de quinze reais, ficando quatrocentos e oitenta e cinco reais, se recordando que foi de 5%, foi feito o pagamento, solicitou que ela fosse assinar, passou o contato para ela em pdf, e ela falou que não iria assinar, porque não tinha recebido o valor. Que explicou para ela que o valor global era até o final do ano, dos meses vindouros até o final do ano, e, por isso, o contrato era nesse valor, mas as parcelas eram de quinhentos reais mensais, e ela disse que não ia assinar, ficaram nesse impasse, mas ela recebeu esses três pagamentos. Que, durante esse descontentamento, ela foi e solicitou a chave para o sargento, não queria mais alugar, disse que não queria mais alugar, que estava danificando a casa dela. Que ela leu o valor, pelo que se recorda eram dez ou onze meses, daria cinco mil, ela disse que não tinha recebido e não iria assinar, mas era um parcelamento mensal, ia ser pago todo mês com dedução do ISSQN. Que foram duas gestões de Gesiel, na primeira foi chefe de gabinete e depois passou a ser secretário de administração, auxiliou na contabilidade deles e que, na época, o Tribunal de Contas esteve lá várias vezes durante a gestão, mas não tem lembrança de notificou alguma coisa nesse sentido da locação, porque acha que o valor era isento na licitação e ficou com dispensa.
Gesiel Orcelino dos Santos
, em seu interrogatório, afirmou que conversou com a Eliane para locar a casa dela para implantar o destacamento da Polícia Militar, porque, na época, estava em uma situação muito ruim, o comandante Uander que foi para trabalhar em Oliveira de Fátima pediu para locar uma casa para ele, ele mesmo escolheu a casa, era em um ponto estratégico e também era a única que estava tendo no momento. Que Eliane tinha fechado a loja de material de construção e mudou para Porto Nacional, e a casa que ela residia ficou parada, e ela tinha interesse em alugar. Que conversou com ela, encaminhou ela para o departamento da Prefeitura, ela procurou a Leda, encaminhou toda a documentação, conversou com Leda e Idejair, que eram da Administração, e ficou acertado que locariam a casa dela durante o ano, a conversa foi no mês de março, até dezembro, a conversa foi em março, no valor de quinhentos reais por mês, então acha que dez meses, daria o valor de cinco mil reais, não tem certeza dos valores. Que o comandante pediu para forrar a casa, ficou acertado para ela forrar, ela conversou com Leda, para indicar alguém, ela estava em Porto Nacional, Leda falou com Gilmar, ele fez o forro, a prefeitura pagou, fez parcela para ela e ela pagou o forro. Que ficou dela pintar a casa e, como ela tinha loja de material de construção, não ia precisar terceirizar o serviço, e sabe que depois ela chegou, a chave não foi devolvida para ela, ela tirou os miolos das portas, “tomou de conta da casa”, não lhe despachou, não despachou ninguém, falou que não ia mais alugar a casa, mudou a chave e ficou por isso mesmo. Que, quando ela fez isso, a casa estava em processo de reforma, não tinha passado três meses ainda. Que ela ficou de ir assinar o contrato, não veio, ela precisava do dinheiro, foi passado esse dinheiro para ela, e ela realmente não assinou os contratos. Que, quando o Tribunal de contas foi, mandou mensagem para ela assinar o contrato, mesmo ela já tento dado outro rumo para a casa, mas para assinar, e ela falou que destratou ela, mas falou que ela usou de má fé, fez um negócio, desfez sem dar satisfação. Que a casa não chegou a ser usada pelo destacamento policial, estavam em processo de reforma e, quando terminou, ela pegou a casa de volta sem justificativa. Que o destacamento não foi feito, depois veio a reforma do Estado que ia fazer uma cidade “tomar conta de três” e, como lá em Fátima já tinha um destacamento, ficou o comandante Uander transferido para Paraíso, Oliveira de Fátima passou a ser da Lagoa da Confusão, e ficou Fátima dando assistência para Santa Rita, Fátima, Rosalândia, e até hoje é esse esquema. Que, se houve má fé, não foi de sua parte, fizeram o contrato, ela deixou a documentação, e ela nunca podia ir assinar, procuravam ela. Que a casa já estava entregue, ela já tinha entregado a chave, a Leda, que era sua secretária de finanças, ligou para Gilmar, e ele colocou para Eliene pagar, ela ligou para Leda e pediu rês meses para poder pagar o forro, e foi pago de imediato, e ela fala que nunca recebeu, mas foi pago de imediato, e descontado 5% de ISSQN, uma coisa natural, descontada no valor. Que os três meses foram pagos para poder concluir o forro, acabar de pintar a casa e o destacamento mudar e, nesse intervalo, ela foi lá e tirou os “miolos” da porta, trocou, e depois vendeu essa casa para outro rapaz. Que, quando tem uma licitação no município, o certo é fazer convite a todas as empresas, e todas as empresas foram convidadas a participar, não somente a dela, porque, geralmente, as empresas grandes ficam sempre procurando no diário, e as empresas de cidade pequena não tem essa formalidade, e, geralmente, a prefeitura manda uma carta que vai ter a licitação, se tem interesse de participar, para dar transparêcia. Que não tem conhecimento de ter falado que ficaria com parte o valor, isso não aconteceu. Que Eliane alega que não atendiam telefone, mas, quando ela precisou do dinheiro, ela ligou para Leda, que passou as parcelas de imediato. Que foi retido dos aluguéis 5% de ISSQN.
No caso dos autos, não restou comprovado que o acusado Gesiel, na condição de Prefeito do Município de Oliveira de Fátima-TO, agindo de forma livre e consciente, inseriu declaração falsa em documentos públicos, fazendo constar informações inverídicas em documentos como contrato de locação, solicitação de locação, autorizações, empenhos, notas fiscais, constantes dos autos (evento nº 01, ANEXO1, fls 2, fls 7, fls 8, fls 28, fls 29, fls 30, fls 32, fls 33, fls 34, fls 36, fls 37; dos autos nº 00029947620218272737).
Segundo leciona Nelson Hungria:
“Fala-se em falsidade ideológica (ou intelectual), que é modalidade do falsum documental, quando à genuinidade formal do documento não corresponde a sua veracidade intrínseca. O documento é genuíno ou materialmente verdadeiro (isto é, emana realmente da pessoa que nele figura como seu autor ou signatário), mas o seu conteúdo intelectual não exprime a verdade. Enquanto a falsidade material afeta a autenticidade ou inalterabilidade do documento na sua forma extrínseca e conteúdo intrínseco, a falsidade ideológica afeta-o somente na sua ideação, no pensamento que as suas letras encerram.”
Ainda sobre o tema, Sylvio do Amaral elucida que:
Na falsificação ideológica não há rasura, emenda, acréscimo e/ou subtração de letra ou algarismo. Há, apenas, uma mentira reduzida a escrito através de documento que, sob o aspecto material, é de todo verdadeiro, realmente escrito por quem seu teor indica. No falso ideal, o agente forma um documento até então inexistente, para, através dele, fraudar a verdade. O documento assim elaborado pelo falsificador é extrinsecamente verdadeiro, pois quem o escreve é efetivamente quem aparece no texto como seu autor; o que há nele de inverídico é o conteúdo ideológico, pois seu texto é falso ou omisso em relação à realidade que devia consignar.
É cediço que o crime de falsidade ideológica requer, para que seja caracterizado, a clara presença do dolo específico e o especial fim de agir de lesar o particular ou o Estado, prejudicando direito, criando obrigação ou alterando a verdade sobre fato juridicamente relevante.
Ocorre que não é possível extrair dos autos dolo específico de Gesiel Orcelino de inserir declarações de conteúdo falso em documentos públicos, no intuito de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, uma vez que, pelo demonstrado nos autos, o negócio jurídico (locação do imóvel), de fato, foi iniciado, sendo acordado com a testemunha Eliane o pagamento de aluguéis pela locação de sua residência, em março do ano de 2015, com prazo findado para dezembro do mesmo ano.
Neste sentido, colaciono a jurisprudência pertinente:
APELAÇÃO CRIMINAL- FALSIDADE IDEOLÓGICA – ABSOLVIÇÃO PROFERIDA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA PELA ATIPICIDADE – CONDENAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – NÃO COMPROVAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO DE PREJUDICAR DIREITO OU ALTERAR A VERDADE SOBRE FATO JURIDICAMENTE RELEVANTE – PROVA JUDICIAL INSUFICIENTE – MEROS INDÍCIOS – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO “IN DUBIO PRO REO” – Para a configuração do delito previsto no artigo 299 do Código Penal é imprescindível do dolo específico de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante – Não se colhendo da prova produzida em contraditório judicial a necessária certeza quando ao dolo dos agentes em relação aos fatos narrados na denúncia, subsistindo apenas indícios, deve ser mantida a decisão absolutória proferida pelo juízo singular, com base no princípio do in dúbio pro reo. (TJMG, 2º Câmara Criminal, Relator: Des Glauco Fernandes)
AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA - PREFEITO MUNICIPAL - DENÚNCIA- FALSIDADE IDEOLÓGICA - DOLO ESPECÍFICO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO - ABSOLVIÇÃO. 1. O crime de falsidade ideológica exige o dolo específico, não se configurando o delito quando não evidenciado que o agente, ao firmar a declaração de conteúdo falso, agira com o intuito de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. 2. As provas produzidas não evidenciam que o denunciado tivesse ciência inequívoca do conteúdo inverídico do documento que assinara na condição de prefeito e tampouco que o tenha feito com o objetivo de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade de fato juridicamente relevante. 3. Ausente o dolo, elemento subjetivo do tipo, é forçoso reconhecer que o fato praticado não constitui infração penal, nos termos do art. 386, III do Código de Processo Penal. 4. Julgada improcedente a denúncia. (TJMG, AP XXXX20208130000, 3º Câmara Criminal, Relator: Des. Paulo de Tarso Tamburini Souza, julgado em 15/09/2023)
AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. FALSIDADE IDEOLÓGICA. AUSÊNCIA DE DOLO. ABSOLVIÇÃO. 1. A materialidade e a prática da conduta estão comprovadas pela assinatura do denunciado em que documentos que continham informações falsas. 2. As provas produzidas, no entanto, não evidenciam que o denunciado tivesse ciência inequívoca do conteúdo inverídico dos documentos que assinara na condição de prefeito e tampouco que o tenha feito com o objetivo de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade de fato juridicamente relevante. 3. Ausente o dolo, elemento subjetivo do tipo, é forçoso reconhecer que o fato praticado não constitui infração penal. 4. Absolvição por não constituir o fato infração penal, nos termos do art. 386, III, do CPP. (STF, AÇÃO PENAL AP 931 AL - ALAGOAS XXX-28.2015.100.000, Primeira Turma, Julgado em 06/06/2017)
No caso telado, apesar de existir indícios de que o gestor público se antecipou ao preencher as documentações mencionadas pelo Ministério Público, as provas carreadas ao longo dos autos não são suficientes para demonstrar, de forma inequívoca, a existência específico do intuito do réu Gesiel em ocasionar em inserir informações falsas em documentos da Prefeitura de Oliveira de Fátima.
O processo penal não autoriza conclusões condenatórias baseadas somente em suposições ou indícios, sendo que, no caso dos autos, tendo em vista que as provas produzidas não são suficientes para embasar uma condenação, torna-se imperativa a absolvição do acusado, em observância ao Princípio
“In Dubio Pro Reo”.
A condenação criminal, por recair sobre um dos mais valiosos bens do ser humano, o direito de liberdade, só pode ocorrer quando o juiz estiver diante de prova cabal e inequívoca de materialidade e autoria do fato, bem como dos requisitos que compõem o conceito analítico do crime. Não é esse, repita-se, o caso com relação ao crime de furto qualificado, pois a prova produzida durante a instrução não consubstancia juízo de certeza capaz de embasar um decreto condenatório.
Para
Sabatini
, nenhuma pena deve ser aplicada sem a mais completa certeza da falta, a pena disciplinar ou criminal atinge a dignidade, a honra e a estima da pessoa, ferindo-a gravemente no plano moral além de representar a perda de interesses materiais.
A condenação exige a certeza e não basta sequer, a alta probabilidade, que é apenas um juízo de incerteza de nossa mente em torno à existência de certa realidade.
Portanto, uma vez que o conjunto probatório é frágil ao ponto de não criar a necessária convicção de materialidade do crime atribuído ao acusado Fábio, sua absolvição é medida necessária.
Ressalto não haver qualquer elemento que demonstre inverdades nas diligências realizadas pelo acusado Gesiel, na função de gestor municipal de Oliveira de Fátima, sendo que as testemunhas arroladas pela acusação Gilmar, Elaine, Uander, e a testemunha de defesa Francisco Idejair confirmaram que a negociação para locação do imóvel, de fato, aconteceu, apenas não foi concluída, e que inclusive foram efetuados 03 (três) pagamentos no valor de R$ 475,00 (quatrocentos e setenta e cinco reais) (evento nº 01, ANEXO1, fls 31, 35 e 38 dos autos nº 0002994-76.2021.827.2737).
Nesse sentido, ante a ausência de provas seguras da materialidade e autoria do crime de falsidade ideológica (artigo 299 do Código Penal), tal como descrito na denúncia, não vislumbro elementos suficientes para ensejar a condenação do acusado
Gesiel Orcelino dos Santos
, sendo sua absolvição medida necessária.
IV- DISPOSITIVO
Diante do exposto,
julgo por sentença extinta a punibilidade de
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
referente ao crime do artigo 1º, III, IV e IX do Decreto Lei 201/197, ante a ocorrência da prescrição, nos termos do artigo 109, IV do Código Penal.
JULGO IMPROCEDENTE
a pretensão punitiva estatal, para
ABSOLVER
o réu
GESIEL ORCELINO DOS SANTOS
do crime do artigo 299 do Código Penal Brasileiro.
Intimem-se.
Após o trânsito em julgado e, em caso de não haver recurso pelas partes, arquivem-se os autos.
Expeça-se o necessário.
Cumpra-se, mediante cautelas de estilo.
Porto Nacional - TO, data e hora do sistema.
UMBELINA LOPES PEREIRA RODRIGUES
Juíza de Direito
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