Processo nº 1001250-65.2024.8.11.0022
ID: 260737713
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ÚNICA DE PEDRA PRETA
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 1001250-65.2024.8.11.0022
Data de Disponibilização:
25/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RENAN ARAUJO GOUVEIA MARTINS
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE PEDRA PRETA Processo: 1001250-65.2024.8.11.0022. AUTORIDADE: POLICIA FEDERAL NO ESTADO DE MATO GROSSO AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MA…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE PEDRA PRETA Processo: 1001250-65.2024.8.11.0022. AUTORIDADE: POLICIA FEDERAL NO ESTADO DE MATO GROSSO AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS Vistos etc. SENTENÇA I) - RELATÓRIO O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, por intermédio de seu Ilustre Representante legal, em exercício neste juízo, no uso de suas atribuições legais, com base no incluso auto de Inquérito Policial, ofereceu denúncia contra CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS, já qualificado nos autos, dando-o como incursos nas sanções previstas no artigo 33, “caput”, c/c o artigo 40, inciso V, ambos da Lei n.º 11.343/2006, pela prática dos fatos delituosos devidamente descritos na acusatória em Id. 181445290. O réu foi preso em flagrante delito no dia 21 de novembro de 2024, sendo homologado a sua prisão em flagrante e convertida em prisão preventiva no mesmo dia (Id. 179642601 - Pág. 47). Em decisão de Id. 181783192 foi determinado a citação do acusado, para apresentar respostas à acusação. Regularmente notificado (Id. 182479088), o réu apresentou a resposta acusação em de Id. 183955485, por intermédio de advogado constituído. Em decisão proferida em Id. 184272853, por não concorrer a nenhuma hipótese prevista no artigo 397 do Código de Processo Penal, recebeu a denúncia ofertada pelo representante do Ministério Público, ocasião em que se designou audiência de instrução e julgamento. No decorrer da instrução criminal (Id. 187489444), procedeu-se com a inquirição da oitiva das testemunhas arroladas pelas partes, em seguida passou com o interrogatório do réu. Em alegações finais, sob a forma de memoriais (Id. 188197514), a representante do Ministério Público, após analisar o conjunto probatório, entendeu estar devidamente comprovada a materialidade delitiva, a autoria e responsabilidade penal do réu, pugnando pela total procedente da denúncia para CONDENAR o acusado CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS como incurso no art. 33, caput c/c art. 40, inciso V (entre Estado da Federação), ambos da Lei nº. 11.343/2006, aplicando-lhe a pena necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime. Por sua vez, a defesa do acusado, em sede de alegações finais, também sob a forma de memoriais (Id. 190856752), pugnou pela aplicação da causa especial de diminuição do § 4º do art. 33, alegando que o acusado é primário, de bons antecedentes, agiu por necessidade financeira, não integra organização criminosa e teve participação de menor importância, requerendo pena no mínimo legal, regime inicial mais brando, substituição da pena por restritivas de direitos e direito de apelar em liberdade. Vieram-me os autos conclusos para sentença. Eis o sucinto relatório. II) - FUNDAMENTAÇÃO. Trata-se de ação penal oferecida pelo representante do Ministério Público contra CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS, já qualificado nos autos, dando-o como incursos nas sanções previstas no artigo 33, “caput”, c/c o artigo 40, inciso V, ambos da Lei n.º 11.343/2006. Após, atenda análise aos autos, entendo que a presente ação penal deve ser julgada parcialmente procedente, pelos fundamentos que passo a expor. DA CONDENAÇÃO PELO CRIME DE TRÁFICO DE DROGA A materialidade delitiva está circunstanciada no boletim de ocorrência (Id. 179642601 - Pág. 14/19 e 179642601 - Pág. 28/29), do termo de apreensão (Id. 179642601 - Pág. 20/21) e dos laudos de constatação da natureza da droga (Id. 179642601 - Pág. 23/25 e 179642601 - Pág. 69/74). Quanto à autoria, do mesmo modo restou comprovada, conforme auto de prisão em flagrante (Id. 179642601 - Pág. 1), pelos depoimentos dos policiais federais na fase inquisitória (Id. 179642601 - Pág. 9/10) e pelos fartos elementos probatórios colhidos na instrução criminal, ante os depoimentos das testemunhas e a confissão judicial do réu, não havendo qualquer dúvida da autoria do réu no crime em comento. As testemunhas ALVINO DE SOUZA SILVA FILHO e ANTÔNIO VIEIRA DE ABREU FILHO, Policiais Rodoviários Federais, em seus depoimentos na Delegacia de Polícia Federal (Id. 179642601 - Pág. 9/10), igualmente declararam: “(...) QUE esteja de serviço em decorrência da Operação Protetor das Fronteiras e Divisas, em continuidade à força tarefa do Gefron, no combate aos crimes transfronteiriços entre Brasil e Bolívia, no Estado de Mato Grosso; QUE após troca de informações com a equipe do COD/PMGO recebeu informações de que um veículo caminhão Modelo Mercedes benz, de placa FFI1E50, estaria saindo do estado de Mato grosso com um carregamento de entorpecentes; QUE foi montada uma força tarefa com o Gefron, o Bope de mato grosso e COD/Goiás na tentativa de interceptar o referido veículo; QUE foi realizada uma barreira policial próximo ao distrito de Garça Branca, município de Pedra Preta/MT, onde foi realizado a busca veicular, e localizado em compartimento oculto um total 409 (quatrocentos e nove) peças (tabletes) de substância análoga pasta Base de cocaína, pesando aproximadamente 422,550 kg; QUE diante dos fatos a ocorrência foi registrada na Polícia Federal de Rondonópolis, onde foram encaminhados o veículo, o conduzido e o entorpecente.” Neste juízo a testemunha ANTÔNIO VIEIRA DE ABREU FILHO narrou que participou de uma operação policial após receberem a informação de que um veículo trafegava pela rodovia transportando drogas. Relatou que, embora não soubessem a localização exata, sabiam que o veículo seguia sentido sul do estado e, por isso, montaram uma barreira na altura de Pedra Preta, conseguindo abordar o caminhão mais adiante, na Vila Garça Branca. Informou que, durante a abordagem, foi encontrado material ilícito na lateral do caminhão, e que havia um forte odor vindo do interior do veículo, que embora vazio, exalava um cheiro muito forte, característico de entorpecente. Afirmou que o condutor, Cleidson Jaime dos Santos Martins, não relatou para o depoente qual seria o destino da droga nem o valor que receberia pelo transporte. Ressaltou que a operação contou com a presença do subtenente Alvino, que era o policial mais antigo da equipe e assumiu a liderança da abordagem. Afirmou que presenciou os mesmos fatos que Alvino e que ambos estavam presentes durante todo o procedimento. Quando questionado sobre a conduta do réu, disse que este se manteve tranquilo durante a abordagem e que ele mesmo abriu a parte traseira do caminhão com suas próprias chaves, não sendo necessário qualquer arrombamento. Relatou ainda que o réu não fez muitas declarações e foi conduzido algemado, permanecendo calado durante o tempo em que esteve sob custódia. A testemunha ALVINO DE SOUZA SILVA FILHO não foi ouvida em juízo. A testemunha de defesa DIVANEI JOÃO DA SILVA, em Juízo declarou que conheceu o réu Cleidson Jaime dos Santos Martins aproximadamente dois ou três anos atrás, quando ele trabalhava como operador de escavadeira hidráulica, vindo a prestar esse serviço para o depoente. Relatou que, após esse período, soube que Cleidson passou a trabalhar como caminhoneiro e, mais tarde, tentou contratá-lo novamente, mas Cleidson informou que havia deixado esse ramo e estava trabalhando como motorista. Questionado sobre o caráter de Cleidson, afirmou que, durante o tempo em que trabalhou para o depoente, o réu se mostrou muito honesto, correto e competente no exercício de seu trabalho. Indagado se Cleidson havia praticado algum crime, respondeu que não, ressaltando que, em sua região, uma cidade pequena, qualquer acontecimento desse tipo seria amplamente conhecido, mas não tem conhecimento de nenhum envolvimento criminal de Cleidson. Quando questionado sobre a possível vinculação do réu a alguma organização criminosa ou facção, o depoente negou ter ouvido qualquer informação a esse respeito. Ao ser indagado sobre o fato de Cleidson ter sido preso neste processo, afirmou não ter conhecimento sobre os detalhes. A testemunha de defesa JOSÉ DE AQUINO MANÇO, em Juízo declarou que conhece o réu Cleidson Jaime dos Santos Martins por serem amigos e por já terem trabalhado juntos anteriormente, quando Cleidson residia na mesma cidade que ele. Afirmou que, na região em que vivem, Cleidson sempre foi visto como uma boa pessoa, alguém de boa convivência e acolhedor. Informou que Cleidson tem família, incluindo esposa e filhos. Questionado sobre eventual envolvimento do réu com crimes, José disse desconhecer qualquer antecedente criminal de Cleidson, assim como nunca soube de participação dele em organização criminosa ou facção. Ao ser indagado se tinha conhecimento sobre o fato que originou o processo em curso, especialmente o carregamento de drogas que resultou na prisão do réu, respondeu que não sabe de nada a respeito. Por fim, esclareceu que reside em Conceição das Alagoas, enquanto Cleidson mora em Frutal. Por sua vez, na fase inquisitória (Id. 179642601 - Pág. 11), o acusado CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS fez o uso do direito ao silêncio. Em juízo o réu confessou que sabia que a droga estava armazenada no caminhão, porém não sabia a quantidade. Declarou que exercer a profissão de motorista e residi na cidade de Frutal, Minas Gerais, trabalhava com fretes, conduzindo caminhão com câmara fria, usualmente transportando verduras entre estados, especialmente para a região de Cuiabá e Cáceres, no Mato Grosso. Relatou que, na viagem em questão, havia transportado repolho e descarregado parte da carga em Cuiabá e parte em Cáceres, recebendo R$ 7.000,00 pelo serviço, sem o desconto de despesas. Disse que, após essa entrega, ainda em Cáceres, enquanto aguardava nova carga, foi abordado por um indivíduo desconhecido que lhe propôs transportar uma carga ilícita, oferta que ele aceitou devido a dificuldades financeiras e necessidade de prover cuidados à mãe doente. Segundo Cleidson, o indivíduo levou seu caminhão e o devolveu no dia seguinte com a droga já acondicionada, não tendo ele presenciado onde ou como a substância foi inserida no veículo. O réu admitiu que sabia estar transportando droga, mas alegou desconhecer a quantidade e o local exato em que a substância estava escondida. Confirmou que receberia R$ 5.000,00 pelo transporte, a serem pagos no local da entrega. Afirmou que a entrega seria feita em uma cidade do Mato Grosso, após a Serra da Petrovina, mas não soube identificar o nome da cidade, pois essa pessoa havia lhe dito que era para deixar o caminhão na beira da rodovia na primeira cidade após a serra. Afirmou que foi abordado por policiais antes de chegar ao destino e que, durante a abordagem, não tentou fugir. Negou ter participado de outros transportes de produtos ilícitos anteriormente, bem como qualquer envolvimento com facções criminosas ou organizações do tráfico. Disse ainda que não conhecia o homem que lhe propôs o serviço e que nunca havia trabalhado com ele antes. Por fim, confirmou que ainda não havia recebido o valor prometido pelo transporte no momento da abordagem policial, pois iria receber o valor no local da entrega. Pois bem. Desta feita, diante das provas produzidas em Juízo, sob crivo do contraditório e da ampla defesa, são suficientes para comprovar de maneira certa, segura e harmônica a responsabilidade criminal do acusado Cleidson Jaime, restando evidente pelos depoimentos das testemunhas, somado a confissão parcial do réu declarando que pegou a droga na cidade de Cáceres/MT para transportá-la até Alto Garças-MT, e que receberia a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por esse serviço. A materialidade do delito está inequivocamente comprovada pelos Laudos Preliminar de Constatação nº 4880027/2024 que atesta que o material examinado – 409 tabletes com peso bruto total de 422,55 kg – deu resultado positivo para cocaína na forma de pasta base, substância entorpecente proscrita no Brasil, conforme lista da ANVISA. A confirmação pericial da substância se deu posteriormente por meio do Laudo de Perícia Criminal Federal nº 1164/2024, elaborado pela perita criminal Giovanna Correa Bampa, vinculada ao SETEC/SR/PF/MT. Utilizando metodologias rigorosas, como espectroscopia FT/IR e o teste de Scott, o laudo confirmou a natureza entorpecente da droga, com a presença de cocaína em sua forma de base livre. Quanto à autoria, o réu foi preso em flagrante em 21 de novembro de 2024, por volta das 15h46min, na BR-364, próximo à Vila Garça Branca/MT, conduzindo o caminhão Mercedes Benz, placa FFI1E50. A abordagem foi realizada pelos Policiais Rodoviários Federias que, após troca de informações das forças de segurança do GEFRON, BOPE e COD/GOIÁS, montaram operação para interceptar o veículo. Durante a revista, a droga foi localizada escondida em compartimento oculto no compartimento de refrigeração do caminhão. Os policiais militares ALVINO DE SOUZA SILVA FILHO e ANTÔNIO VIEIRA DE ABREU FILHO, responsáveis pela abordagem, relataram em sede inquisitiva que o caminhão apresentava sinais de alteração estrutural no interior do baú, onde foi possível visualizar compartimentos ocultos, característica recorrente no transporte de drogas por grandes organizações criminosas. A modificação do veículo, portanto, indica clara premeditação e logística específica para o transporte ilícito. No interrogatório judicial, o réu confessou que pegou a droga em Cáceres/MT, que deixaria a carga na cidade após a Serra da Petrovina, e que receberia R$ 5.000,00 pela empreitada. Declarou ainda que o caminhão foi modificado por terceiro não identificado e que não sabia a quantidade exata da droga. O conjunto probatório, portanto, corrobora a versão do Ministério Público no sentido de que o réu não apenas tinha ciência da substância transportada, como também integrava a cadeia logística do tráfico de entorpecentes, agindo de forma premeditada e com pleno domínio da situação. DA INAPLICABILIDADE DA CAUSA DE AUMENTO DO ART. 40, INCISO V, DA LEI DE DROGAS Com relação à causa de aumento de pena previsto no inciso V do artigo 40 da Lei n. 11.343/06, entendo que não restou comprovada, pelos fundamentos em que passo a expor. A denúncia imputou ao réu CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS a prática do crime de tráfico de drogas com a causa de aumento prevista no art. 40, inciso V, da Lei nº 11.343/2006, sob o fundamento de que a droga apreendida seria transportada do Estado do Mato Grosso para o Estado de Goiás. A majorante prevista no art. 40, V, da Lei nº 11.343/2006, exige prova segura de que a droga seria destinada a outro estado da federação. No entanto, após criteriosa análise do conjunto probatório, verifica-se a inexistência de demonstração inequívoca da intenção do réu de realizar tráfico interestadual, requisito essencial para a incidência da referida majorante, conforme estabelece a Súmula 587 do Superior Tribunal de Justiça: “Para a incidência da majorante prevista no artigo 40, V, da Lei 11.343/06, é desnecessária a efetiva transposição de fronteiras entre estados da federação, sendo suficiente a demonstração inequívoca da intenção de realizar o tráfico interestadual.” Assim, o elemento central para a aplicação da majorante não é a consumação do transporte da droga para outro estado, mas sim a prova cabal da intenção direcionada a tal finalidade. Contudo, a única referência ao suposto destino interestadual da droga encontra-se em despacho da autoridade policial de ID 179642601 - Pág. 2/8, o qual afirma que a cocaína teria como destino o estado de Goiás. Entretanto, tal informação não encontra corroboração em qualquer outro elemento de prova ou outra prova, pois não há mensagens telefônicas mencionando a localidade de entrega, nem registro de itinerário com GPS, tampouco depoimentos que confirmem a intenção do réu em transportar os entorpecentes a outro estado da federação. No seu interrogatório o réu afirmou que deixaria a droga “na cidade após a Serra da Petrovina”, ou seja, Município de Alto Garças/MT, localidade situada ainda dentro do território mato-grossense, não mencionando o nome de qualquer cidade goiana ou a travessia de fronteira estadual. Os depoimentos dos PRF, tanto na fase inquisitiva como na instrução, em momento algum, mencionou que o destino da droga seria fora do estado ou um ponto de entrega em Goiás. A jurisprudência do TJMT têm reiteradamente decidido que, na ausência de elementos probatórios firmes e seguros sobre o destino interestadual da droga, a majorante do art. 40, V, não pode ser aplicada, sob pena de se incorrer em presunção indevida, incompatível com o princípio da presunção de inocência e com as garantias do devido processo legal. Nesse sentido: “APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – RECURSO MINISTERIAL – PRETENDIDA APLICAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO DO TRÁFICO INTERESTADUAL – IMPOSSIBILIDADE – INTERESTADUALIDADE NÃO COMPROVADA – RECURSO DEFENSIVO – APLICAÇÃO DA MINORANTE DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – INVIABILIDADE – RÉU QUE NÃO PREENCHE OS REQUISITOS DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI DE DROGAS – RECURSOS DESPROVIDOS. Inexistindo comprovação de que a substância entorpecente seria transportada para outra unidade da federação, deve ser mantido o decote da causa especial de aumento de pena prevista no inciso V do art. 40 da Lei 11.313/2006. Impossível a concessão do benefício do tráfico privilegiado, quando demonstrado nos autos que o agente se dedica a atividades criminosas, logo, não preenche cumulativamente os requisitos legais exigidos, previstos no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343 /06.” (TJMT - 1030159-48.2022.8.11.0003, Relator(a): JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Data de Julgamento: 05/02/2024, Data de Publicação: 12/02/2024) Não sendo possível inferir a intenção do réu de realizar o tráfico entre estados com base em presunções genéricas ou suposições fundadas exclusivamente em conjecturas da autoridade policial, impõe-se o afastamento da referida majorante. Portanto, diante da ausência de elementos objetivos e inequívocos que demonstrem a intenção do réu de transpor os entorpecentes entre estados da federação, não há que se falar em incidência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso V, da Lei 11.343/2006, devendo o pedido do Ministério Público nesse ponto ser julgado improcedente. DO AFASTAMENTO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, §4º, DA LEI 11.343/2006 A defesa pugna pela aplicação da causa de diminuição prevista no §4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, alegando que o réu CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS seria primário, possuidor de bons antecedentes, que não se dedicava a atividades criminosas nem integrava organização criminosa, sendo sua participação no tráfico um episódio isolado e motivado por necessidade financeira. Contudo, uma análise rigorosa e contextual dos autos revela que não estão preenchidos os requisitos cumulativos exigidos pelo dispositivo legal, especialmente no tocante à ausência de dedicação a atividades criminosas e à inexistência de vínculo com organização criminosa, condições indispensáveis para a concessão do redutor. Inicialmente, embora conste que o réu seja tecnicamente primário, a quantidade expressiva de entorpecente apreendida — 422,55 kg de cocaína em pasta base —, associada ao modo sofisticado de ocultação em compartimento estruturado no caminhão, evidencia profissionalismo e vinculação à atividade ilícita, não compatíveis com a figura do pequeno traficante ocasional. A logística envolvida, o tipo de modificação no veículo, a presença de interlocutores organizados e o valor da droga revelam a inserção do acusado em uma cadeia estruturada de tráfico de entorpecentes, mesmo que não esteja formalmente comprovada sua filiação a grupo criminoso específico. A quantidade e natureza da droga, bem como o modus operandi da conduta delituosa, são elementos concretos aptos a justificar o afastamento da minorante, ainda que o réu seja tecnicamente primário. A jurisprudência consolidada do TJMT, em julgado análise ao caso dos autos, reconhece que a combinação entre quantidade elevada de droga, compartimento oculto no veículo e ausência de comprovação de vínculo ocasional com o tráfico autoriza o afastamento da causa de diminuição, conforme tese firmada no enunciado orientativo nº 30 Senão vejamos: “DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERESTADUAL DE DROGAS. ART. 33, CAPUT, C/C ART. 40, V, DA LEI N.º 11.343/2006. TRANSPORTE DE ENTORPECENTES EM COMPARTIMENTO OCULTO. NEGATIVA DE APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação criminal interposta pelo réu contra sentença da Primeira Vara Criminal da Comarca de Água Boa/MT, que o condenou pela prática do crime de tráfico interestadual de drogas (art. 33, caput, c/c art. 40, V, da Lei n.º 11.343/2006), à pena de 8 anos, 5 meses e 15 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 845 dias-multa no mínimo legal. O recorrente pleiteia a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, §4.º, da Lei de Drogas, sob o argumento de atuação como “mula” e preenchimento dos requisitos legais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em verificar se o recorrente faz jus à aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, §4.º, da Lei n.º 11.343/2006 (tráfico privilegiado), considerando os requisitos legais para concessão do benefício. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A aplicação do tráfico privilegiado (art. 33, §4º, da Lei n.º 11.343/2006) exige o cumprimento cumulativo de quatro requisitos: (i) ser primário; (ii) possuir bons antecedentes; (iii) não se dedicar a atividades criminosas; e (iv) não integrar organização criminosa. 4. Embora o réu seja tecnicamente primário e possua bons antecedentes, os elementos dos autos indicam sua dedicação a atividades criminosas, evidenciada pela apreensão de grande quantidade de entorpecentes (aproximadamente 297 kg de cocaína e 38 kg de maconha) e pela sofisticação do modus operandi, com transporte interestadual em compartimento oculto (“fundo falso”) no veículo. 5. A logística envolvida, o elevado valor econômico da droga e a existência de mandados de prisão anteriores pelo crime de tráfico de drogas reforçam a conclusão de que o réu não se trata de traficante eventual, mas sim de indivíduo inserido em esquema estruturado de narcotráfico. 6. Precedentes do STJ e o Enunciado Orientativo n.º 30 do TJMT corroboram que a quantidade de drogas e o modo de acondicionamento são elementos aptos a afastar o benefício do tráfico privilegiado. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A concessão da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, §4.º, da Lei n.º 11.343/2006 depende do preenchimento cumulativo de todos os requisitos legais, especialmente a ausência de dedicação a atividades criminosas. 2. A quantidade expressiva de entorpecentes, o profissionalismo da prática delitiva e a sofisticação do modus operandi são circunstâncias suficientes para afastar o tráfico privilegiado”. Dispositivos relevantes citados: Lei n.º 11.343/2006, art. 33, caput, §4º, e art. 40, V; Código Penal, art. 29, §1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC n. 774.070/MS, rel. Min. Daniela Teixeira, Quinta Turma, j. 16/10/2024; STJ, AgRg no AREsp n. 1.611.320/SP, rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, j. 26/05/2020; TJMT, Enunciado Orientativo n.º 30, Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 100269/2017.” (N.U 1002163-50.2024.8.11.0021, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025) Portanto, diante da robustez do conjunto probatório que aponta para o envolvimento ativo do réu em prática criminosa de tráfico de drogas em larga escala, impõe-se o afastamento da causa especial de diminuição da pena prevista no §4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, não havendo como vislumbrar o réu como pequeno traficante ocasional. III) - DISPOSITIVO. Isto posto, e por tudo que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão formulada na denúncia, para o fim de condenar o réu CLEIDSON JAIME DOS SANTOS MARTINS, já qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções prevista no artigo 33, “caput”, da Lei 11.343/2006. Passo a dosar a pena do réu. a) - Circunstâncias judiciais O delito de tráfico de entorpecentes, na modalidade qualificada, possui pena de reclusão de 05 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de multa de 500 a 1.500 dias-multa. Consoante dispõe o artigo 42 da Lei n.º 11.343/2006, à natureza e a quantidade da droga, o laudo definitivo constatou a presença de 409 (quatrocentos e nove) tabletes com massa bruta total de 422,55 kg de cocaína, sendo uma quantidade expressiva, demonstra o dolo intenso do condenado e justifica a exasperação da pena acima do mínimo legal. Quanto à culpabilidade verifica-se normalidade reprovabilidade da conduta. Quanto aos antecedentes, verifica-se não há nos autos informações de que o réu possui sentença penal condenatória com o trânsito em julgado. Quanto à conduta social não verifico a presença de nenhuma circunstância que indique ser o réu uma pessoa que provoque instabilidade social, além do delito perpetrado. Quanto à personalidade do agente também não existem registros indicativos de desvio de personalidade, não há nenhuma afinação especial do delito praticado com a personalidade do agente. Acerca dos motivos da prática do delito, veja-se que o acusado não se mostrou movido por motivos relevantes, além do comum, que seria a pratica do delito para a obtenção de vantagem financeira fácil. Quanto às circunstâncias são sempre nocivas à sociedade, contudo, normal ao tipo. Quanto às consequências são normais ao tipo penal. E, acerca do comportamento da vítima, tratando-se de crime contra a sociedade, nada pode ser dito abstratamente. Estabelece-se então, como medida razoável e necessária para a reprovação e prevenção do crime, a pena-base em 06 (seis) anos e 03 (três) meses de reclusão. b) - Circunstâncias legais Não verifico a presença de circunstâncias de agravante da pena. Verifica-se que é caso de reconhecer a atenuante da confissão, prevista no artigo 65, inciso III, alínea “d” do Código Penal, pois a ré confessou, espontaneamente, em Juízo a autoria delitiva do crime, motivo pelo qual, atenuo a pena em 1/6 (um sexto). Assim, passo a dosar a pena do réu em 05 (cinco) anos e 02 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. c) - Causas de aumento ou diminuição de pena. Não verifico causa de aumento ou causa de diminuição da pena, conforme fundamentos expostos acima. Da multa Quanto à pena de multa, a julgar pelas bases lançadas na fundamentação supra do art. 59 do Código Penal Brasileiro e, considerando a causa atenuante da pena, fixo a pena de multa em 420 (quatrocentos e vinte) dias-multa, e, considerando a capacidade econômica da ré, fixo o valor do dia multa em um trigésimo do salário-mínimo vigente à época dos fatos. Da detração penal. O artigo 387, dispõe o seguinte: “Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (....); § 2o O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012)” Verifica-se que o réu foi preso em flagrante delito no dia 21 de novembro de 2024, cumprindo desta forma, até esta data 05 (cinco) meses, devendo este tempo de prisão ser computado na pena definitiva. Deste feita, tendo em vista que a pena definitiva é de 05 (cinco) anos e 02 (dois) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e, considerando o tempo cumprido de prisão preventiva, o réu é primário e levando em consideração a natureza e a quantidade da droga apreendida e exasperação da pena base, com fundamento no artigo 33, §2º, alínea “b”, e §3º, do Código Penal, estabeleço a ré o REGIME SEMIABERTO para o cumprimento da pena privativa de liberdade. A ré não faz jus à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e a suspensão condicional da pena, eis que não preenche os requisitos do artigo 44 e 77, ambos do Código Penal, pois a pena é superior a 04 (quatro) anos, consoante acima exposto. DO APELO EM LIBERDADE Considerando o “quantum” da pena e o regime semiaberto imposto ao réu, não podendo esta permanecer no regime mais gravoso do que o fixado na sentença, consoante o entendimento dos Tribunais Superiores, CONCEDO-LHE O DIREITO DO RÉU DE APELAR EM LIBERDADE. IV) - DISPOSIÇÕES FINAIS. EXPEÇA-SE O ALVARÁ DE SOLTURA DO RÉU. Condeno o réu ao pagamento das custas e das despesas processuais. Oportunamente, após o trânsito em julgado desta sentença, tomem-se as seguintes providências: a) expeça-se guia de execução definitiva do condenado. Observe-se a detração penal, nos termos do artigo 42 Código Penal. b) Em cumprimento ao disposto no art. 72, §2º, do Código Eleitoral, oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral deste Estado, comunicando-o sobre esta decisão; c) oficie-se ao órgão estadual de cadastro de dados sobre antecedentes, inclusive ao INFOSEG, fornecendo as informações sobre este decisório. Determino a destruição da droga apreendida, (art. 32, §§ 1º e 2º da Lei 11.343/06). Ademais, no tocante ao veículo apreendido, descrito no termo de exibição e apreensão em ID. 179642601 - Pág. 20, apreendido no momento do flagrante do réu, restando comprovado nos autos que foi utilizado pelo réu para transportar os entorpecentes, DECRETO O PERDIMENTO DO BEM em favor da União, nos termos do artigo 63 da Lei n.º 11.343/06. Determino a intimação pessoal do réu preso da sentença, nos termos do artigo 392, do CPP, devendo ser cumprido na ocasião do cumprimento do alvará de soltura. Ciência ao Ministério Público e a Defesa, nos termos do artigo 392, do CPP. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo o necessário. Às providências. Pedra Preta-MT, data da assinatura eletrônica. Márcio Rogério Martins Juiz de Direito
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