Processo nº 5000726-30.2024.4.03.6206
ID: 258131778
Tribunal: TRF3
Órgão: 1ª Vara Gabinete JEF de Coxim
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5000726-30.2024.4.03.6206
Data de Disponibilização:
17/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ROMULO GUERRA GAI
OAB/MS XXXXXX
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PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000726-30.2024.4.03.6206 / 1ª Vara Gabinete JEF de Coxim AUTOR: EDINA PAES DE OLIVEIRA Advogado do(a) AUTOR: ROMULO GUERRA GAI - MS11217 REU: INSTITUT…
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5000726-30.2024.4.03.6206 / 1ª Vara Gabinete JEF de Coxim AUTOR: EDINA PAES DE OLIVEIRA Advogado do(a) AUTOR: ROMULO GUERRA GAI - MS11217 REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS S E N T E N Ç A Trata-se de ação ajuizada por EDINA PAES DE OLIVEIRA, em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, visando à concessão do benefício de amparo social – BPC LOAS. Parecer do MPF anexado sob ID. 358061107. Dispensado o relatório, na forma do artigo 38, da Lei 9.099/95 c/c art. 1º, da Lei n.º 10.259/01. I – FUNDAMENTAÇÃO 1. Mérito Não havendo questões preliminares, passo ao exame do mérito da causa. O benefício assistencial foi instituído pela Constituição Federal em seu art. 203, inciso V, que tem a seguinte redação: Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: [...] V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. O benefício tem por finalidade assegurar condições materiais mínimas, mediante o pagamento de um salário, para que a pessoa idosa ou portadora de deficiência possa prover a própria subsistência, na hipótese de seus familiares não possuírem condições financeiras para fazê-lo. O requisito conectado à deficiência sofreu modificação legislativa, com o intuito de aclarar o real sentido e alcance da norma. De início, a previsão legal limitava-se a constatação da incapacidade para a vida independente do trabalho. Atualmente, o conceito de pessoa com deficiência é extraído do artigo 1 da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência celebrada em Nova York em 30 de março de 2007 e incorporada pelo Brasil com status de norma constitucional (art. 5º, § 3º, da CF/88), que dispõe o seguinte: “Artigo 1 [...] Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas” (destaques não originais). Essa mesma orientação consta do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 13.146/2015, sendo que o conceito de deficiência deixou de possuir um caráter eminentemente médico ou clínico, partindo para um caráter funcional, isto é, de interação entre as ou impedimentos de longo prazo decorrentes de limitações físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais de cada indivíduo com as diversas barreiras da vida cotidiana, para daí aferir se há obstrução da participação ativa na sociedade em igualdade de condições. Com relação ao requisito da necessidade, a Lei 8.742/93 considera “incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo” (art. 20, §3º). Todavia, como decidido pelo C. Supremo Tribunal Federal - em julgamento em que se analisou precisamente a constitucionalidade do art. 20, §3º da Lei 8.742/93: (...) verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro) (STF, Rcl 4374, Tribunal Pleno, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJe 03/09/2013). Por essa razão, a C. Suprema Corte optou pela “Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993”, situação jurídica que autoriza os magistrados de 1ª instância a aferir a necessidade do postulante do amparo assistencial por outros meios de prova além da mera verificação da renda familiar per capita. A contrário sensu, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), por unanimidade, firmou a tese de que a renda mensal per capta de ¼ do salário mínimo também não gera uma presunção absoluta de pobreza para quem pleiteia benefício assistencial. Durante a sessão plenária do dia 14 de abril de 2016, o Colegiado fixou que outros elementos podem afastar a presunção de miserabilidade, não se podendo perder de vista que a assistência social tem “papel supletivo”, devendo ser alcançada quando o amparo familiar não é suficiente para evitar que o indivíduo acabe sendo lançado em uma situação extrema de vulnerabilidade social e econômica (Processo nº 5000493-92.2014.4.04.7002). Descabe tornar o Estado como ‘garantidor universal’, em detrimento do dever primário da família, conforme bem enumera a legislação em vigor. Afinal, não cabe ao Estado substituir as pessoas em suas respectivas obrigações legais, mesmo porque os direitos sociais devem ser interpretados do ponto de vista da sociedade, não do indivíduo. Convém salientar que o objetivo do benefício assistencial é conceder renda a quem não tem o suficiente para a própria sobrevivência digna, e não complementar os proventos auferidos por uma família que vive com certas dificuldades. Neste sentido, inclusive, já decidiu o E. TRF 3.ª Região: “O benefício de prestação continuada não tem por fim a complementação da renda familiar ou proporcionar maior conforto ao beneficiário, mas sim, destina-se ao idoso ou deficiente em estado de penúria” (AC 876500. 9.ª Turma. Rel. Des. Fed. Marisa Santos. DJU, 04.09.2003). Assim, são requisitos constitucionais – cumulativos – para a obtenção do benefício, portanto: (i) a deficiência ou idade avançada; e (ii) a necessidade (hipossuficiência econômica). No caso em tela, tem-se que pelo menos um desses requisitos não restou satisfeito. No tocante ao primeiro requisito, a autora, nascida aos 06/04/1956 (ID 348522755), demonstrou ser idosa nos termos da lei. Com relação ao requisito da necessidade, de acordo com o laudo social (ID 354342888), a parte autora reside com seu esposo (Rubilino de Amorim) e vivem da renda aferida pelo salário desse, no valor de R$ 1.700,00 (um mil e setecentos reais). A Parte autora afirma ainda que possui 6 (seis) filhos, porém todos já constituíram família. Entretanto, foi elencado em contestação pelo INSS que o cônjuge da parte autora aufere renda superior ao salário-mínimo vigente, perfazendo o montante de 2.081,59 (dois mil e oitenta e um reais e cinquenta e nove centavos), sendo alegado a ausência de miserabilidade do núcleo familiar por ter havido a superação de ½ salário-mínimo de renda per capita familiar. Desse modo, denota-se que a renda familiar per capita é bastante superior a 1/2 do salário mínimo de que trata a Lei n. 8.742/93, valor é mais do que suficiente para arcar com as despesas básicas, declaradas pela família. Cumpre destacar que o benefício assistencial LOAS tem a finalidade de amparar situações excepcionais de miserabilidade, não possuindo a função de complementação de renda: CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIAL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. I - O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº 10.741/2003. II - A autora contava com 77 (setenta e sete) anos, quando ajuizou a presente ação, tendo por isso a condição de idosa. III - Os elementos de prova existentes nos autos apontam em sentido contrário à alegada miserabilidade da autora. IV - O estudo social feito em 21.10.2014, às fls. 109/114, informa que a autora reside com o marido, Sr. Satunino Nascimento dos Santos, de 85 anos, a filha, separada, Sra. Idalina Fortuna dos Santos Silva, os netos, filhos desta, Paulo Henrique Santos da Silva, de 19, na ocasião estava detido, Zaqueu dos Santos Silva, de 16, e Giovane Fortuna dos Santos, de 12, a filha, solteira, Elza Fortuna dos Santos, de 40, o filho, casado, Gilberto Fortuna dos Santos, de 45, a nora Adriana Aparecida Rossi dos Santos, de 39, e o neto, filho destes, Gustavo Rossi dos Santos, de 06, em casa própria, contendo oito cômodos, sendo quatro quartos, sala, cozinha e dois banheiros. Os móveis e eletrodomésticos que guarnecem a casa são antigos e parcialmente desgastados. As despesas são: alimentação R$ 2.000,00; água R$ 250,00; energia elétrica R$ 110,00; gás R$ 45,00; remédios R$ 200,00. A renda da família advém da aposentadoria do marido da autora, no valor de um salário mínimo mensal, do trabalho da filha Elza, como balconista, no valor de R$ 846,40 (oitocentos e quarenta e seis reais e quarenta centavos) mensais, do trabalho formal de Gilberto, trabalhador rural, no valor de R$ 1.270,00 (mil e duzentos e setenta reais) mensais, e do trabalho formal de Adriana, como vendedora, no valor de R$ 785,00 (setecentos e oitenta e cinco reais) mensais. IV - A autora não vive em situação de risco social ou vulnerabilidade social, não podendo o benefício assistencial ser utilizado para fins de complementação de renda. V - As despesas giravam em torno de R$ 2.605,00, consistindo em alimentação, água, energia elétrica, gás e remédios; ou seja, as despesas são inferiores às receitas, R$ 3.855,00. VI - Prevê o art. 229 da Constituição da República o dever de reciprocidade na prestação de assistência entre pais e filhos ao estatuir que "os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade". VII - A assistência social prestada pelo Estado deve ter cunho subsidiário, não podendo ser substituída pela assistência de familiares que tem reconhecidamente condições de prestá-la. VIII - Apelação improvida. (TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2223596 - 0006655-46.2017.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO OTAVIO PORT, julgado em 18/04/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/05/2018 – grifou-se). Assim, não se verifica o requisito referente à hipossuficiência econômica na data da perícia social. Entretanto, verifico ser plenamente possível a reafirmação da DER na hipótese dos autos, tendo em vista que o esposo da parte autora, Rubilino de Amorim, teve seu vínculo laboral encerrado em 22/02/2025 (ID 356510682, fls 8), o que resultou na perda de sua fonte de renda. Em decorrência disso, a renda familiar atualmente é zero. Nesse prisma, em 23/10/2019, o Tribunal da Cidadania julgou o Tema 995 – reafirmação da data do requerimento administrativo - nos autos do Recurso Especial nº 1.727.064/SP, relator, Ministro Mauro Campbell Marques. Restou decidido que é possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir. Portanto, com base nos princípios da primazia do acertamento da relação previdenciária, informalidade e celeridade que orientam os Juizados Especiais Federais, procedo à reafirmação da Data de Entrada do Requerimento (DER). Em consequência, fixo o termo inicial do benefício (DIB) na data em que a parte autora reuniu os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial, ou seja, 23/02/2025, quando o seu esposo deixou de possuir fonte de renda, satisfazendo, assim, o requisito econômico. Ademais, o INSS poderá revisar a situação socioeconômica da autora a cada dois anos, podendo cessar o benefício caso constatado o desaparecimento da hipossuficiência econômica, observados os critérios de aferição de renda postos nesta sentença (cfr. Lei 8.742/93, art. 21 e TRF3, ApCiv 0033780-23.2016.403.9999, Oitava Turma, Rel. Des. Federal TANIA MARANGONI, DJe 17/01/2017). A data de início do pagamento (DIP, após a qual os valores vencidos serão pagos administrativamente pelo INSS) será a data desta decisão, nos termos da antecipação dos efeitos da tutela abaixo concedida. No que se refere a restituição de valores, há de se dizer que a cessação do benefício da parte autora foi devida pela autarquia ré, visto que foi ultrapassada a renda familiar mensal de 1/2 de um salário mínimo exigida pela lei, com a computação da renda de Rubilino de Amorim, esposo da parte autora. Dito isto, é mister observar o que a restituição de valores recebidos indevidamente da autarquia previdenciária encontra amparo no artigo 115, da Lei 8.213/91: Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: I - contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social; II - pagamento de benefício além do devido; III - Imposto de Renda retido na fonte; IV - pensão de alimentos decretada em sentença judicial; V - mensalidades de associações e demais entidades de aposentados legalmente reconhecidas, desde que autorizadas por seus filiados. Parágrafo único. Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. No entanto, a jurisprudência pacífica do E. Superior Tribunal de Justiça havia se firmado no sentido de que as verbas de caráter alimentar (como as previdenciárias), recebidas de boa-fé, são irrepetíveis e vinha aplicando esse entendimento: PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I – (...). II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração. III - Recurso Especial não provido. (STJ - PRIMEIRA TURMA, RESP 201502110854, REGINA HELENA COSTA, DJE: 18/05/2016 – destaques nossos) PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ, é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido. (STJ - SEGUNDA TURMA, RESP 201502218439, HERMAN BENJAMIN, DJE: 02/02/2016 – destaques nossos) PREVIDENCIÁRIO. RESTITUIÇÃO DO VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. DESNECESSIDADE. VERBAS DE NATUREZA ALIMENTAR. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE. MENOR SOB GUARDA. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL. EXCLUSÃO DO ROL DE DEPENDENTES. ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELO ART. 16, § 2º DA LEI 8.213/91. 1. Nos casos de verbas alimentares, surge tensão entre o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa e o princípio da irrepetibilidade dos alimentos, fundado na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). Esse confronto tem sido resolvido, nesta Corte, pela preponderância da irrepetibilidade das verbas de natureza alimentar recebidas de boa-fé pelo segurado. (...) 4. Agravos regimentais improvidos. (STJ - SEGUNDA TURMA, AgRg no REsp 1352754/SE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, julgado em 05/02/2013, DJe 14/02/2013 – destaques nossos) PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA 83/STJ. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido da impossibilidade dos descontos, em razão do caráter alimentar dos proventos percebidos a título de benefício previdenciário, aplicando ao caso o Princípio da Irrepetibilidade dos alimentos. Precedentes. Súmula 83/STJ. 2. No julgamento do Recurso Especial 991.030/RS, de relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, a aludida questão foi pacificada no âmbito desta Corte de Justiça, tendo restado prevalente o entendimento no sentido de que, em razão do princípio da irrepetibilidade das prestações de caráter alimentar e da boa-fé da parte que recebeu a verba por força de decisão judicial, ainda que precária, o pedido de ressarcimento de valores pugnado pela autarquia não comporta provimento. 3. A decisão agravada, em questão que decidiu de acordo com a interpretação sistemática da legislação, especialmente nos termos do art. 115 da Lei n. 8.112/91, apenas interpretou as normas, ou seja, de forma sistemática, não se subsumindo o caso à hipótese de declaração de inconstitucionalidade sem que a questão tenha sido decidida pelo Plenário. Agravo regimental improvido. (STJ - SEGUNDA TURMA, AgRg no AREsp 250.894/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, julgado em 04/12/2012, DJe 13/12/2012 – destaques nossos) Para o STJ esse entendimento não decorria de declaração de inconstitucionalidade do art. 115, da Lei 8.213/91, mas de interpretação sistemática da legislação: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA 83/STJ. (...) 4. A decisão agravada, ao julgar a questão que decidiu de acordo com a interpretação sistemática da legislação, especialmente nos termos do art. 115 da Lei n. 8.112/91, apenas interpretou as normas, de forma sistemática, não se subsumindo o caso à hipótese de declaração de inconstitucionalidade sem que a questão tenha sido decidida pelo Plenário. Agravo regimental improvido. (STJ - SEGUNDA TURMA, AgRg no AREsp 241.163/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, julgado em 13/11/2012, DJe 20/11/2012) Assim, em atenção aos mandamentos da Corte Federal, constatado que se tratava de valores recebidos de boa-fé (no amplo sentido de ausência de dolo ou má-fé que visem fraudar a administração), não era cabível sua cobrança por parte da administração. Posteriormente, no julgamento do tema 979 o STJ fixou a seguinte tese em recurso representativo de controvérsia: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA. 1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991. 2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social. 3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido. 4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário. 5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento). 6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. 7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão. 8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado. 9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015. (STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021 - destaques nossos) Da leitura do inteiro teor desse julgado, depreende-se que a Corte diferenciou duas situações: a) a primeira de errônea interpretação e/ou má aplicação da lei pelo INSS, situação em que entendeu que não cabe devolução de valores recebidos de boa-fé, pois são situações que “não refletem qualquer condição para que o cidadão compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido”, “o elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o segurado recebeu o benefício de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido indevidamente”; b) a segunda de erro administrativo (material ou operacional), situação em que entendeu que “deve ser analisado caso a caso, de modo a averiguar se o beneficiário/segurado tinha condições de compreender a respeito do não pertencimento dos valores recebidos, de modo a se lhe exigir comportamento diverso, diante do seu dever de lealdade para coma Administração Previdenciária”, ou seja, deve “averiguar a presença da boa-fé do segurado/beneficiário, concernente na sua aptidão para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento”, sendo cabível a devolução de valores se o beneficiário tinha condições de saber do erro/equivoco do pagamento. Assim, para as situações de erro material ou operacional a verba é repetível, salvo se comprovada a boa-fé objetiva no sentido de não ser possível constatar/ter conhecimento que o pagamento era indevido (“situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário”). Pois bem, não restou provados nos autos do processo que a parte autora agiu de má-fé para com a administração previdenciária. É mister dizer que não se vislumbra qualquer indício de fraude ou ilicitude por parte da autora. A autarquia ré detinha condições de aferir as informações pertinentes a autora, por meio de seus sistemas informatizados, de modo que se observa que a percepção do benefício indevido ocorreu em virtude de erro operacional do próprio INSS. Portanto, não verifico má-fé da parte autora ou dolo no sentido de fraudar o INSS. Não é cabível, desta forma, a devolução de valores. 2. DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA Atento (i) à obviedade do direito da parte autora (evitando-se, por isso, discussão protelatória), observando-se, ainda, (ii) a natureza nitidamente alimentar, vejo indispensável deferir antecipação de tutela à parte autora, de modo a determinar que o INSS implante em seu favor aposentadoria no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias. II - DISPOSITIVO Diante do exposto, rejeito as preliminares arguidas e, no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, nos termos do art. 487, I do Código de Processo Civil, e: a) condeno o INSS a implantar em favor da autora EDINA PAES DE OLIVEIRA o benefício assistencial – LOAS, fixando como data de início do benefício (DIB) o dia 23/02/2025 e data de início do pagamento a data desta sentença; b) julgo PROCEDENTE o pedido para declarar a nulidade do débito cobrado pelo INSS no NB n° 709.221.722-0; c) concedo a antecipação dos efeitos da tutela, devendo o INSS restabelecer o benefício da parte autora em até 45 dias contados da ciência da presente decisão, independentemente do trânsito em julgado, cabendo-lhe comprovar nos autos o cumprimento da determinação; d) poderá o INSS revisar a situação socioeconômica da parte autora a cada dois anos, podendo cessar o benefício caso constatado o desaparecimento da hipossuficiência econômica, observados os critérios de aferição de renda postos nesta sentença; e) condeno o INSS a pagar à autora os atrasados desde 23/02/2025 – descontados os valores eventualmente pagos a título de antecipação dos efeitos da tutela e do benefício auxílio emergencial - devidamente atualizados desde o momento em que deveriam ter sido pagos e acrescidos de juros de mora desde a citação, na forma da Resolução 267/2013 do Conselho da Justiça Federal com a incidência do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), a partir de 09/12/2021, com a entrada em vigor da EC 113/2021.; Demais da intimação pessoal da Procuradoria Federal, comunique-se a presente decisão por ofício à Ceab/DJ da Superintendência Regional Norte/Centro-Oeste – SRNCO para fins de cumprimento. Sem custas e sem honorários advocatícios nesta instância judicial, a teor do art. 55 da Lei n. 9.099/95. Cópia desta sentença poderá servir como mandado/ofício. Publique-se, intimem-se e cumpra-se. Coxim, MS, data e assinatura, conforme certificação eletrônica.
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