Processo nº 1005160-48.2024.8.11.0007
ID: 318627155
Tribunal: TJMT
Órgão: JUIZADOS ESPECIAIS DE ALTA FLORESTA
Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública
Nº Processo: 1005160-48.2024.8.11.0007
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
KARLA PATRICIA PEIXOTO DA SILVA
OAB/MT XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE ALTA FLORESTA JUIZADOS ESPECIAIS Número do Processo: 1005160-48.2024.8.11.0007 REQUERENTE: YURI DE SOUZA DE QUEIROZ REQUERIDO: F C DE OLIVEIRA MOMENT…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE ALTA FLORESTA JUIZADOS ESPECIAIS Número do Processo: 1005160-48.2024.8.11.0007 REQUERENTE: YURI DE SOUZA DE QUEIROZ REQUERIDO: F C DE OLIVEIRA MOMENTE COMERCIO, DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO - DETRAN MT, ESTADO DE MATO GROSSO Vistos, etc. Dispensado o relatório em virtude do permissivo do artigo 38 da Lei 9.099/1195. Considerando que o conjunto probatório constante nos autos é suficiente para a formação do convencimento deste Juízo, não se vislumbra a necessidade de designação de audiência de instrução, razão pela qual passo ao julgamento antecipado do mérito, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. 1. Preliminares No âmbito dos juizados especiais não há falar em preliminar de gratuidade de justiça, isso porque inexistem custas processuais e honorárias advocatícias, salvo litigância de má-fé, conforme arts. 54 e 55 da Lei nº. 9.099/95, portanto deixo de apreciar o pedido de gratuidade da justiça lançado na inicial. Todos os requeridos em suas respectivas manifestações defensivas arguiram inicialmente a preliminar de ilegitimidade passiva, postulando por decorrência lógica a extinção da presente ação se reconhecida suas respectivas ilegitimidades. Todavia, em que pese o esforço argumentativo despendido, entende-se que a rejeição das alegações de ilegitimidade passiva é medida que se impõe diante do contexto que envolve o caso em análise e a clara e evidente necessidade de formação do litisconsórcio passivo necessário, nos termos do artigo 114 do Código de Processo Civil, tendo em vista que eventual eficácia desta sentença dependeria da participação de todos os integrantes apontados no polo passivo desta ação. Com relação as arguições formuladas pelo Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN – MT) e o Estado de Mato Grosso, há que se observar que cerne da demanda orbita em torno do pedido de transferência de propriedade de veículo automotor e de cancelamento ou reconhecimento de inexistência de débitos tributários como IPVA e licenciamento além de infrações de trânsito, o que exige a participação obrigatória destes entes enquanto responsáveis pela administração e gestão de tais registros e créditos. Neste sentido, a Terceira Turma Recursal de Mato Grosso, em recentíssimo julgado firmou entendimento quanto a necessidade de formação do litisconsórcio passivo necessário incluindo o Departamento Estadual de Trânsito e o Estado de Mato Grosso diante da natureza dos pedidos e eventuais desdobramentos administrativos que venham a ser necessários, vejamos: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSFERÊNCIA DE VEÍCULO. DÉBITOS DE NATUREZA TRIBUTÁRIA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE FORMAÇÃO NO ÂMBITO DOS JUIZADOS. FAZENDA PÚBLICA. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA EM RAZÃO DA PESSOA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSOS PREJUDICADOS. I. CASO EM EXAME 1. Recursos inominados interpostos por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por Débora da Silva Araújo em ação que visava obrigar Adenildo Alves Rodrigues a promover a transferência de propriedade de motocicleta e quitar débitos tributários incidentes sobre o veículo, julgando improcedente o pedido de indenização por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) verificar se a ausência de inclusão do DETRAN/MT e do Estado de Mato Grosso no polo passivo da ação compromete a validade do processo; (ii) analisar a possibilidade de imposição de obrigações relacionadas a registros públicos e débitos tributários sem a presença dos entes públicos responsáveis; (iii) definir se é possível a formação de litisconsórcio com a Fazenda Pública no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O pedido de transferência de propriedade de veículo automotor e de cancelamento ou reconhecimento de inexistência de débitos tributários, como IPVA e licenciamento, exige a participação obrigatória do DETRAN/MT e do Estado de Mato Grosso, responsáveis pela administração desses registros e créditos. 4. Configura-se, assim, hipótese de litisconsórcio passivo necessário, nos termos do art. 114 do CPC, cuja ausência torna nula a sentença por violação ao contraditório e à ampla defesa, o que impõe a extinção do feito sem julgamento do mérito, conforme art. 485, VI, do CPC. 5. A Fazenda Pública, por expressa vedação legal (art. 8º da Lei 9.099/95), não pode figurar como parte nos Juizados Especiais Cíveis, o que inviabiliza a regular formação do polo passivo e atrai a incompetência absoluta em razão da pessoa. 6. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a ausência de citação de litisconsorte necessário implica nulidade insanável (REsp 1.588.850/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina). 7. Diante disso, o feito deve ser extinto sem resolução de mérito, de ofício, sendo prejudicado o exame dos recursos interpostos por ambas as partes. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Pedido extinto sem resolução do mérito, de ofício. Recursos prejudicados. Tese de julgamento: “1. A ausência de citação de ente público com interesse jurídico direto na lide acarreta a nulidade da sentença, por configurar litisconsórcio passivo necessário não formado. 2. A Fazenda Pública não pode integrar o polo passivo de ações que tramitam nos Juizados Especiais Cíveis, nos termos do art. 8º da Lei 9.099/95. 3. Verificada a imprescindibilidade de ente público na relação processual, impõe-se a extinção do feito por incompetência absoluta em razão da pessoa, sem resolução de mérito”. Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 114, 115, parágrafo único, e 485, VI; Lei 9.099/95, arts. 8º, 51, II, e 55. (N.U 1002578-11.2022.8.11.0051, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 26/06/2025, publicado no DJE 26/06/2025) Assim, verifica-se a necessidade da prestação jurisdicional e a adequação do provimento pleiteado e a demandante não formula pedido vedado pelo ordenamento jurídico, ou seja, a providência pedida através da ação está, abstratamente, prevista no sistema jurídico. De igual forma, a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo ESTADO não merece acolhimento, pois é cediço que a exigência de legitimidade para a causa impõe, por evidente, a existência de um vínculo entre os sujeitos processuais e a situação jurídica objeto da lide. Em outras palavras, a legitimidade “ad causam” consiste na pertinência subjetiva da demanda, devendo ser aferida conforme a narrativa contida na inicial. Com fundamento na teoria da asserção, adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, a análise da legitimidade das partes deve ser feita de forma abstrata, a partir dos elementos contidos na petição inicial. Logo, considerando a narrativa autoral e a imputação fática direcionada ao Estado (anulação dos débitos tributários) tem-se a sua legítima para responder à lide. Por outro lado, com relação a ilegitimidade da primeira requerida (Ronaldão Multimarcas), tem-se que a mesma não merece guarida diante do fato desta ser a principal destinatária de eventual obrigação de realizar a transferência do veículo objeto desta lide, uma vez que a motocicleta em questão foi comercializada com a primeira requerida e posteriormente revendida a terceiro, razão pela qual a mesma é parte legítima para figurar no polo passivo, ressaltando-se que a requerida em questão não produziu qualquer prova no sentido de demonstrar sua ilegitimidade ou ausência de relação com a negociação debatida, não logrando êxito em se desvencilhar de seu ônus probatório contido no artigo 373, II, do CPC. Com relação a preliminar de ausência de interesse de agir, entendo que a mesma também não merece prosperar, tendo em vista a evidente comprovação trazida pelo requerente de que buscou solucionar o impasse junto a primeira requerida e ao terceiro que adquiriu o veículo, sendo reconhecido pela jurisprudência deste próprio sodalício que a ausência de comunicação da venda pelo adquirente seria precisamente a causa do interesse de agir em situações desta natureza, vejamos: DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. RECURSO CÍVEL INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. TRANSFERÊNCIA DE VEÍCULO. COMPROVAÇÃO DA VENDA. IDENTIFICAÇÃO DO ADQUIRENTE. AUSÊNCIA DE TRANSFERÊNCIA FORMAL. LEGITIMIDADE DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DE MATO GROSSO E DO ESTADO DE MATO GROSSO. RESPONSABILIDADE DO ATUAL PROPRIETÁRIO PELOS DÉBITOS. AFASTADA, DE OFÍCIO, A CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso cível inominado interposto por órgão de trânsito e por ente público estadual contra sentença proferida em ação declaratória de inexistência de débito, na qual se reconheceu a inexistência de responsabilidade do autor pelos débitos incidentes sobre o veículo a partir da venda, com determinação de transferência de responsabilidade ao adquirente identificado e constante do polo passivo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se há interesse de agir do autor, considerando a ausência de transferência formal do veículo; e (ii) definir se é legítima a imposição de obrigação ao Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso e ao Estado de Mato Grosso quanto à transferência dos débitos fiscais e administrativos em razão da alienação do bem. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A ausência de comunicação da venda pelo adquirente é precisamente a causa do interesse processual do autor. 4. O Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso detém legitimidade para atuar no polo passivo, sendo responsável pelos registros administrativos do veículo, incluindo multas, seguro obrigatório e licenciamento. 5. O Estado de Mato Grosso é legitimado à causa quanto aos débitos relativos ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), como ente arrecadador do tributo. 6. A alienação do veículo foi comprovada nos autos, sendo pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, comprovada a tradição do bem, é possível afastar a responsabilidade do antigo proprietário, ainda que ausente a comunicação formal ao órgão de trânsito. 7. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, inclusive por meio da Súmula 585, afasta a responsabilidade solidária do ex-proprietário pelo IPVA lançado após a alienação. 8. No que tange aos encargos sucumbenciais fixados na sentença, deve-se afastar sua aplicação, em razão do deslocamento da competência para os Juizados Especiais, nos termos dos artigos 54 e 55 da Lei n.º 9.099/1995 e do artigo 27 da Lei n.º 12.153/2009. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso conhecido e desprovido. De ofício, afastada a condenação em custas e honorários sucumbenciais fixada em primeiro grau. Tese de julgamento: “1. A comprovação da alienação do veículo afasta a responsabilidade do antigo proprietário pelos débitos lançados após a tradição, independentemente de comunicação formal ao órgão de trânsito. 2. O Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso é legítimo para figurar no polo passivo de ação que discute registros administrativos de veículo e, o Estado de Mato Grosso, quanto aos débitos de IPVA. 3. Não são devidos honorários sucumbenciais em processos oriundos de competência deslocada para os Juizados Especiais.” Dispositivos relevantes citados: Código de Trânsito Brasileiro, artigos 123, § 1º, e 134; Código Civil, artigo 1.267; Constituição Federal, artigo 5º, inciso XXXV; Lei nº 9.099/1995, artigos 54 e 55; Lei nº 12.153/2009, artigo 27. Jurisprudência relevante citada: Superior Tribunal de Justiça, AgInt no AREsp 1128309/PE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 03.05.2018; Superior Tribunal de Justiça, Súmula 585; TJMT, Recurso Inominado n.º 1000724-40.2019.8.11.0001, Rel. Juiz Valdeci Moraes Siqueira, julgado em 23.02.2021. (N.U 1000954-86.2024.8.11.0040, TURMA RECURSAL CÍVEL, EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Primeira Turma Recursal, Julgado em 29/05/2025, publicado no DJE 29/05/2025) Assim, REJEITO todas as preliminares arguidas pelos promovidos. Sem outras preliminares, passo a análise do mérito. 2. Mérito Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA NEGATIVA DE PROPRIEDADE E ANULATÓRIA DE DÉBITOS ajuizada por YURI DE SOUZA DE QUEIROZ em desfavor de F C DE OLIVEIRA MOMENTE COMÉRCIO, DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO (DETRAN – MT), e do ESTADO DE MATO GROSSO, todos devidamente qualificados nos autos do processo em epígrafe. A parte autora argumenta ter alienado o veículo HONDA/CG, Ano de Fabricação/Modelo 2011/2011, Cor Preta, Placa OAR9274, Renavam 00363252282 a primeira ré no dia 24/10/2023, tendo esta, enquanto concessionária, revendido o veículo ao terceiro Robson de Abreu Ribeiro, entretanto nenhuma das duas partes procedeu a transferência administrativa conforme ajustado, e em decorrência de tal omissão diversos débitos têm sido gerados em nome do requerente. Aduz que várias foram as tentativas de contato com o primeiro réu para a realização da transferência, todas malsucedidas, pelo que esses fatos têm gerado transtornos especialmente a geração de débitos em seu nome. Com a inicial apresentou documentos e em razão dos fatos, postula a obrigação de fazer para transferência do veículo e a anulação dos débitos, subsidiariamente pugna pela renúncia a propriedade do veículo, com a determinação de baixas cadastrais e débitos tributários em aberto. O Estado e Detran apresentaram contestação conjunta id. 160436220, pelo que arguiram a sua ilegitimidade, no mérito a ausência de comunicação da venda e responsabilidade solidária do vendedor e adquirente em relação a transferência e débitos. Realizada audiência de conciliação, a mesma restou infrutífera, tendo a primeira requerida apresentado contestação posteriormente id. 186798005, postulando o reconhecimento de sua ilegitimidade passiva aduzindo que tão somente teria intermediado a negociação entre o requerente e o terceiro que foi o real adquirente da motocicleta, postulando ao final a improcedência total dos pedidos da exordial além da extinção do feito sem resolução do mérito. Ato contínuo o requerente impugnou as contestações das requeridas id’s. 164570188 e 191902907, rebatendo os argumentos defensivos das partes e ratificando a procedência dos pedidos lançados na exordial. Dito isso, após promover a análise das manifestações apresentadas pelas partes, bem como, atento a todo o acervo documental colacionado aos autos entendo que RAZÃO PARCIAL assiste a parte autora. No que tange a constituição da obrigação de fazer a fim de que a primeira requerido seja compelida a realizar a obrigação de fazer não há dúvidas sobre a procedência do pedido, isso porque os fatos articulados na inicial estão revestidos de farta comprovação no que diz respeito a alienação do veículo, conforme se vê no registro de intenção de venda anexado aos autos sob o id. 159078338, além do relatório de financiamento anexado sob o id. 159078337 que demonstra que a motocicleta teria sido dada como parte da entrada para aquisição de outro veículo junto a primeira requerida. É certo afirmar que o veículo automotor, espécie de bem móvel, transfere-se pela tradição nos termos do art. 1.226, do Código Civil. Assim, a transferência da propriedade, na compra e venda de veículo, opera-se pela tradição, constituindo o registro no DETRAN mera cautela perficiente ao ato translativo, como regularidade administrativa, publicitária e autorizativa para circular. No caso em questão, todavia, entendo que há responsabilidade solidária de ambas partes (comprador e vendedor), isso porque o Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 123, § 1º, dispõe que incumbe ao proprietário do veículo, logo vendedor, no prazo de 30 (trinta) dias, a responsabilidade de adotar as providências necessárias a expedição de novo CRV (Certificado de Registro de Veículo). Entretanto a obrigatoriedade imposta ao proprietário do veículo não inibe a responsabilidade civil do comprador, que igualmente deve regularizar a transferência do veículo sob pena de também sujeitar-se a infração do art. 233 do CTB. Nessa linha, o art. 134 do CTB dispõe que: Art. 134. No caso de transferência de propriedade, expirado o prazo previsto no § 1º do art. 123 deste Código sem que o novo proprietário tenha tomado as providências necessárias à efetivação da expedição do novo Certificado de Registro de Veículo, o antigo proprietário deverá encaminhar ao órgão executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, no prazo de 60 (sessenta) dias, cópia autenticada do comprovante de transferência de propriedade, devidamente assinado e datado, sob pena de ter que se responsabilizar solidariamente pelas penalidades impostas e suas reincidências até a data da comunicação. Parágrafo único. O comprovante de transferência de propriedade de que trata o caput deste artigo poderá ser substituído por documento eletrônico com assinatura eletrônica válida, na forma regulamentada pelo Contran. Veja-se que embora haja uma omissão da requerida (em realizar e regularizar a transferência do veículo), a lei confere ao vendedor e comprador (parte autora e parte ré) o dever de realizar a comunicação ao órgão de trânsito sob pena de ter que se responsabilizar solidariamente pelas penalidades impostas e suas reincidências até a data da comunicação. No caso em questão, embora o autor tenha apresentado o documento id. 159078338, verifica-se que a pg. 1 comprova a intenção de venda datada de 24.10.2023, não havendo notícias do protocolo de eventual comunicado de venda perante o DETRAN. Aliado a isso, o extrato do veículo demonstra que há registro apenas da intenção de venda, cuja inclusão é datada de 24.10.2023, isso evidencia NÃO ter o autor realizado o protocolo da comunicação de venda perante o órgão de trânsito. Ato continuo, não se desconhece a redação da súmula 585 do STJ no sentido de que “A responsabilidade solidária do ex-proprietário, prevista no art. 134 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB, não abrange o IPVA incidente sobre o veículo automotor, no que se refere ao período posterior à sua alienação." Contudo, essa súmula deve ser analisada em conjunto com o tema repetitivo, e, portanto, vinculante (art. 926, 927, III do CPC) nº 1118 REsp n. 1.881.788/SP do STJ cuja tese está assentada: "Somente mediante lei estadual/distrital específica poderá ser atribuída ao alienante responsabilidade solidária pelo pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA do veículo alienado, na hipótese de ausência de comunicação da venda do bem ao órgão de trânsito competente." O Decreto nº 1.977 de 23 de novembro de 2000, instituído pelo Estado de Mato Grosso, com alterações feitas pela Lei nº 9.193/2009 de 10 de agosto de 2009, expressa nos seus artigos 13, §1º-A e art. 13-A que: Art. 13- É pessoalmente responsável pelo pagamento do imposto o adquirente ou o remitente do veículo, em relação à fato gerador anterior ao tempo de sua aquisição. § 1º O tributo pode ser exigido do contribuinte ou do responsável, indistintamente, ficando este último sub-rogado nos direitos e obrigações do contribuinte, estendendo-se sua responsabilidade à punibilidade por infração tributária. § 1º-A Observado o disposto no artigo 13-A, a responsabilidade será, também, aplicada a fatos geradores ocorridos após a alienação do veículo, quando não houver a transferência da respectiva titularidade junto ao Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN/MT. § 2° Nos casos em que houver a regular comunicação de venda veicular junto ao DETRAN/MT e uma vez efetuado o lançamento da comunicação de venda no sistema estadual de veículos, a Secretaria de Estado de Fazenda poderá responsabilizar o adquirente pelo pagamento do imposto devido, independentemente da efetiva ocorrência da transferência de propriedade no documento do veículo. § 3º Fica o DETRAN/MT responsável pela regularidade das informações lançadas no sistema estadual de veículos, nos casos descritos no parágrafo anterior. Art. 13-A Nos termos do § 1º-A do artigo 13, os débitos fiscais pertinentes ao IPVA, relativos a veículos vendidos poderão ser exigidos do adquirente que deixar de promover a transferência de titularidade do bem junto ao Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN/MT. Em outras palavras, o Código de Trânsito Brasileiro dispõe sobre a responsabilidade solidária (art. 134 do CTB) do antigo proprietário no caso da não realização ou comunicação de transferência da propriedade do veículo, contudo, a legislação especial instituída pelo Estado de Mato Grosso no Decreto nº 1.977/2000, com alterações pela Lei nº 9.193/2009, estipula que o adquirente do veículo é responsável pelo pagamento do imposto, inclusive IPVA, em relação ao fato gerador anterior ao tempo de sua aquisição quando também deixar de promover a transferência de titularidade do bem junto ao Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN/MT. Noutro norte, também não se pode olvidar acerca da responsabilidade da parte autora em providenciar a transferência do veículo no prazo estipulado em lei ou realizar a comunicação de venda junto ao órgão do DETRAN, pelo que infringiu o disposto no art. 123, §1º e 134 do CTB, de sorte que é co-responsável pelos débitos do veículo objeto da lide. Desta forma, diante da patente inércia de ambas as partes em comunicar o órgão de trânsito a respeito da compra e venda do veículo, os impostos, multas, licenciamentos e IPVA’s, ainda que gerados após a venda/tradição do veículo objeto da lide, são de responsabilidade de ambas as partes, de forma solidária. Exatamente nesse sentido, é o entendimento da Turma Recursal Mato-grossense: EMENTA: RECURSO INOMINADO – AÇÃO NEGATIVA DE PROPRIEDADE – ALIENAÇÃO DE VEÍCULO - AUSÊNCIA DE TRANSFERÊNCIA JUNTO AO DETRAN - ÔNUS DO NOVO PROPRIETÁRIO - ARTIGO 123, § 1.º, DO CTB - AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO DA VENDA PELO VENDEDOR JUNTO AO ÓRGÃO ADMINISTRATIVO LOGO APÓS A TRADIÇÃO - ARTIGO 134 DO CTB - ÔNUS DO VENDEDOR - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ATÉ O MOMENTO DA EFETIVA COMUNICAÇÃO DA VENDA – DANOS MORAIS CONFIGURADOS – REDUÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. O Superior Tribunal de Justiça alterou o posicionamento a respeito da mitigação da regra contida no artigo 134 do Código de Trânsito Brasileiro, passando a adotar o entendimento, em interpretação literal do dispositivo, de que o vendedor que não comunicou a venda é responsável solidário pelo pagamento das multas, até a data da efetiva comunicação. De igual modo, no julgamento do REsp n. 1.881.788/SP, submetido ao regime de repetitivos, fixou a tese de que “somente mediante lei estadual/distrital específica poderá ser atribuída ao alienante responsabilidade solidária pelo pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA do veículo alienado, na hipótese de ausência de comunicação da venda do bem ao órgão de trânsito competente.” Considerando a existência de legislação estadual prevendo a solidariedade do antigo proprietário quanto ao pagamento do tributo, no caso da ausência de comunicação da venda junto ao órgão administrativo, impositiva a aplicação da referida tese jurídica de observância obrigatória, nos termos do artigo 927, III, do Código de Processo Civil. (N.U 1013771-53.2022.8.11.0041, TURMA RECURSAL CÍVEL, EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Primeira Turma Recursal, Julgado em 15/04/2024, publicado no DJE 22/04/2024) “RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DA INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. AUSÊNCIA DE TRANSFERÊNCIA JUNTO AO DETRAN. ÔNUS DO NOVO PROPRIETÁRIO. ARTIGO 123, § 1.º, DO CTB. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO DA VENDA PELO VENDEDOR JUNTO AO ÓRGÃO ADMINISTRATIVO LOGO APÓS A TRADIÇÃO. ARTIGO 134 DO CTB. ÔNUS DO VENDEDOR. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ATÉ O MOMENTO DA EFETIVA COMUNICAÇÃO DA VENDA. PRECEDENTES DO C. STJ. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Trata-se de ação declaratória da inexistência de débito c/c obrigação de fazer proposta por PALMENO JOSÉ SANTANA NETO, na qual alega que desde dezembro/2011 não é mais o proprietário da motocicleta marca/modelo: Honda CG 150 Titan ES, Placa: NJP4090, alienada ao demandado Sr. Rafael de Jesus Santos, que não providenciou a transferência do bem. Em razão disso, postula sejam os entes públicos compelidos a procederem com a transferência de propriedade e débitos incidentes sobre o veículo após a alienação. 2. O C. STJ alterou o posicionamento a respeito da mitigação da regra contida no art. 134 do CTB, passando a adotar o entendimento, em interpretação literal do dispositivo, de que o vendedor que não comunicou a venda é responsável solidário pelo pagamento das multas, até a data da efetiva comunicação. 3. De igual modo, no julgamento do REsp n. 1.881.788/SP, submetido ao regime de repetitivos, fixou a tese de que “[s]omente mediante lei estadual/distrital específica poderá ser atribuída ao alienante responsabilidade solidária pelo pagamento do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA do veículo alienado, na hipótese de ausência de comunicação da venda do bem ao órgão de trânsito competente.” Considerando a existência de legislação estadual prevendo a solidariedade do antigo proprietário quanto ao pagamento do tributo, no caso da ausência de comunicação da venda junto ao órgão administrativo, impositiva a aplicação da referida tese jurídica, que, inclusive, é de observância obrigatória, nos termos do art. 927, III, do CPC. 4. No caso, restou incontroversa a ausência da comunicação da venda pelo demandante, contemporaneamente à alienação. Desse modo, no caso concreto, a efetiva comunicação somente ocorreu após o ajuizamento da presente ação, mais especificamente após a citação dos entes demandados. 5. Portanto, em alinhamento ao atual posicionamento do C. STJ sobre o tema, impositivo reconhecer que o demandante possui responsabilidade solidária por todos os encargos incidentes sobre o bem até a data da citação. E, após, a propriedade e todos os demais encargos devem ser direcionados ao demandado Rafael de Jesus Santos. 6. Sentença parcialmente reformada. 7. Recursos conhecidos e parcialmente providos. (TJ-MT - RI: 10080821120208110037, Relator: LAMISSE RODER FEGURI ALVES CORREA, Data de Julgamento: 12/06/2023, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 19/06/2023).” Assim, verifica-se que tanto a parte autora quanto a ré são responsáveis pelo pagamento, pelo que não há falar em anulação dos débitos tributários. De outro lado, compelir a promovida a realizar a transferência é medida que se impõe, pois foram empregados os meios extrajudiciais cabíveis para a solução do caso. Assim, não houve prova de situação excepcional que impedisse a parte autora de comunicar a venda do veículo, a fim de mitigar a aplicação do art. 134 do CTB, uma vez que é obrigação do vendedor comunicar ao DETRAN a venda, razão pela qual não incide o dano moral pretendido pela autora. Dessa forma, rejeito o pleito do autor de anulação dos débitos tributários registrados em seu nome, no entanto, no que tange ao pedido de condenação da primeira requerida na obrigação de efetuar a transferência da motocicleta para seu nome junto ao órgão de trânsito, verifico que merece procedência. Conforme se pode observar dos autos, ainda que a parte autora não tenha comunicado ao DETRAN acerca da transferência do veículo, percebe-se do extrato que instruiu a petição inicial que o veículo ainda continua registrado em seu nome, revelando o verdadeiro descaso da requerida em regularizar a situação, de modo que deve ser condenada a proceder com a transferência do veículo. Doutro norte, à reparação a título de danos morais, entendo que não merece guarida, pois os fatos narrados caracterizam tão somente dissabores comuns e rotineiros da vida em sociedade, que não são capazes de amparar qualquer pleito de cunho indenizatório. Há que se ressaltar que o Juiz, quando da avaliação do dano moral, deve medir o grau de sequela produzido, a humilhação, a vergonha, as situações vexatórias, a posição social do ofendido, o cargo por ele exercido e a repercussão negativa em suas atividades, para que, posteriormente, saiba dosar com justiça a condenação do ofensor. O dano moral passível de indenização é aquele consistente na lesão de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da personalidade, tais como: vida, integridade corporal, no seu aspecto subjetivo, liberdade, honra, decoro, intimidade, sentimentos afetivos e a própria imagem. Desta feita, tenho que não houve lesão a nenhum dos bem jurídicos acima mencionados, bem como resta evidenciado que o requerente não comprovou a existência do nexo de causalidade entre a conduta da parte requerida e os prejuízos que o requerente alega ter sofrido. No mesmo sentido converge a jurisprudência das Turmas Recursais de Mato Grosso, vejamos: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO INOMINADO. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO. INFRAÇÕES ATRIBUÍDAS À ANTIGA PROPRIETÁRIA. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO DE VENDA AO DETRAN. DANO MORAL INEXISTENTE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso Inominado interposto contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, diante do reconhecimento da perda superveniente de objeto quanto à transferência de pontuação por decisão em ação paralela, e da ausência de elementos que justificassem a reparação civil. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a recorrente faz jus à indenização por danos morais em razão da imputação de infrações cometidas após a venda de veículo, mas antes da transferência; (ii) estabelecer se houve perda do objeto da obrigação de fazer, ante decisão judicial proferida em processo diverso. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A responsabilidade pela regularização da transferência de propriedade de veículo recai também sobre o alienante, que deve comunicar a venda ao órgão competente, conforme art. 134 do CTB; a ausência dessa comunicação impede a exclusão automática de responsabilidades por infrações posteriores. 4. A autora não apresentou o comprovante de comunicação de venda ao DETRAN, tampouco o recibo de transferência assinado, não se desincumbindo do ônus da prova que lhe competia, nos termos do artigo 373, I, do CPC. 5. Não ficou demonstrado que as infrações lançadas comprometeram a obtenção da CNH definitiva da autora ou que lhe causaram constrangimento, vexame ou obstáculo jurídico, inexistindo dano moral indenizável. 6. O pedido de obrigação de fazer restou prejudicado, diante de decisão proferida em ação paralela (processo nº 1010282-26.2025.8.11.0001), que determinou a retirada dos pontos da CNH da autora, caracterizando perda superveniente do objeto. 7. É incabível condenação de honorários advocatícios em favor da parte recorrida, conforme artigo 55 da Lei nº 9.099/1995. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A ausência de comunicação de venda ao órgão de trânsito impede o afastamento da responsabilidade do antigo proprietário por infrações cometidas antes da efetiva transferência do veículo. 2. A imputação indevida de pontos na CNH, sem prova de prejuízo efetivo à obtenção da habilitação ou situação vexatória, não configura dano moral indenizável. 3. A existência de decisão judicial em processo diverso que resolve o objeto da obrigação de fazer acarreta perda superveniente do interesse processual. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, artigo 5º, X; CTB, artigo 134; CPC, artigo 373, I; Lei nº 9.099/1995, artigos 46, 55. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1012443-46.2022.8.11.0055, Segunda Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Póvoas, julgado em 02/10/2024; TJMT, N.U 1003698-89.2022.8.11.0051, Primeira Turma Recursal, Rel. Gonçalo Antunes de Barros Neto, julgado em 01/07/2024. (N.U 1001958-47.2025.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Primeira Turma Recursal, Julgado em 22/05/2025, publicado no DJE 22/05/2025) Por todo o exposto, a improcedência do pedido de indenização por danos morais formulado pela parte autora é medida que se impõe. 3. Dispositivo Face ao exposto, REJEITO AS PRELIMINARES e, no mérito, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos autorais, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para: a) CONDENAR a primeira ré a obrigação de fazer para realizar a transferência da titularidade do veículo modelo HONDA/CG, Ano de Fabricação/Modelo 2011/2011, Cor Preta, Placa OAR9274, Renavam 00363252282, Chassi nº 9C2KC1670BR641059, no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena expedição de oficio ao Detran para promover a alteração de titularidade de ofício, devendo arcar com as despesas para a realização da transferência. Caso a requerida não promova a transferência do veículo no prazo assinalado, desde logo determino que seja oficiado ao DETRAN/MT para cumprir a sentença, sendo desnecessária a inspeção veicular para tanto em caso de não localização do veículo. Consigne-se que os encargos referentes à transferência do veículo são de responsabilidade da requerida e a responsabilidade quanto a eventuais tributos e infrações de trânsito até a oficialização da comunicação de venda aqui determinada (data da citação válida – 04.10.2024 id. 171891381) é solidária entre as partes autor/ré, pelo que caberá ao primeiro promovido os demais encargos tributários e administrativos relativos ao período posterior à citação. b) JULGO IMPROCEDENTES os demais pedidos. Sem custas processuais e honorários advocatícios, conforme inteligência dos artigos 54 e 55 da Lei 9.099/95. Intimem-se. Consoante disposto no artigo 40, da Lei 9.099/95 submeto este projeto de sentença à apreciação da Juíza de Direito. Lucas Teófilo Patrício Neto Juiz Leigo Vistos. Com fundamento no artigo 40 da Lei n.º 9.099/95, HOMOLOGO a sentença proferida pelo juiz leigo, nos seus precisos termos, para que produza seus jurídicos e legais efeitos. Cumpra-se. Alta Floresta/MT, (data lançada no sistema). MILENA RAMOS DE LIMA E S. PARO Juíza de Direito
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear