Processo nº 1001348-91.2020.4.01.3000
ID: 309757806
Tribunal: TRF1
Órgão: 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SJAC
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 1001348-91.2020.4.01.3000
Data de Disponibilização:
27/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RITA DE CASSIA ROCHA DE OLIVEIRA
OAB/AC XXXXXX
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PAULO VICTOR DA SILVA MARINHO
OAB/AC XXXXXX
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KAIO MARCELLUS DE OLIVEIRA PEREIRA
OAB/AC XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Acre 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SJAC SENTENÇA TIPO "D" PROCESSO: 1001348-91.2020.4.01.3000 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (2…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Acre 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SJAC SENTENÇA TIPO "D" PROCESSO: 1001348-91.2020.4.01.3000 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO: NIVALDO MEDEIROS FILHO REPRESENTANTES POLO PASSIVO: KAIO MARCELLUS DE OLIVEIRA PEREIRA - AC4408, PAULO VICTOR DA SILVA MARINHO - AC6170 e RITA DE CASSIA ROCHA DE OLIVEIRA - AC6242 SENTENÇA I Trata-se de denúncia (ID n. 1175762279) oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF) em desfavor de NIVALDO MEDEIROS FILHO, perante o Juízo da 4ª Vara desta Seção Judiciária (Juizado Especial Federal), imputando-lhe a prática do crime tipificado no artigo 213 do Código Penal (CP). Segundo a acusação, no dia 26 de setembro 2016, por volta das 19h, nas dependências da Receita Federal do Brasil no Acre, o denunciado, Auditor Fiscal da Receita Federal, utilizando-se de força física, constrangeu Carolina Queiroz Araújo a praticar ato libidinoso, consistente em beijo forçado e toque lascivo da genitália em ereção no corpo da vítima. A investigação foi iniciada a partir da representação de p. 5/9 (ID n. 184695849), formulada pela servidora Carolina Queiroz de Araújo, Assistente Técnico Administrativo da Receita Federal no Acre, na qual noticiou que teria sido abusada sexualmente, no interior das dependências da própria Receita Federal do Brasil no Acre, por seu superior hierárquico, o Auditor Fiscal do mesmo órgão, NIVALDO MEDEIROS FILHO. Segundo Carolina, na data dos fatos, NIVALDO dirigiu-se à sua sala, onde estava sozinha, e lá ficou conversando sobre diversos assuntos inconvenientes ao ambiente de trabalho, como pornografia, filmes eróticos, dentre outros. Quando resolveu ir embora, NIVALDO a acompanhou e, no elevador, este passou a ser invasivo fisicamente, alisando seus cabelos e tentando beijar a sua boca, o que, segundo ela, ocorreu umas 3 ou 4 vezes. Acrescentou que NIVALDO a abraçou e chegou a encostar seu órgão sexual ereto no corpo dela, momento em que esta seguiu se desvencilhando dele e pedindo para ele parar. Segundo a vítima, nesse momento, NIVALDO pronunciava as seguintes palavras: "eu só quero sentir", "deixe eu sentir". Quando o elevador chegou no térreo, Carolina rapidamente tentou sair, ocasião em que NIVALDO, por duas vezes, puxou-a pelos braços para dentro do elevador usando de força física. Relatou que quando conseguiu se livrar de NIVALDO, saiu em direção à portaria, ocasião em que ambos assinaram o livro de registro na presença do segurança Valcírio Gomes Grangeiro Filho (p. 3, ID n. 184695851) e seguiram juntos andando para fora do prédio. Por fim, informou que NIVALDO a acompanhou até o carro, quando, insistindo no abuso, tomou sua mão e tentou mordê-la. Nesse momento, a servidora Edilma Neiva Pires da Silva Rodrigues (p. 28, ID n. 184695849) passou conduzindo seu carro para ir embora, ocasião em que NIVALDO a cumprimentou. Ao chegar em casa, Carolina deparou-se com uma mensagem de NIVALDO, via WhatsApp, desejando-lhe bons sonhos, conforme prints acostados nas p. 10/13 (ID n. 184695849). Conforme sustenta na inicial o MPF, as alegações de Carolina estão em consonância com o conjunto probatório presente nos autos, conforme se observa nos prints acostados nas p. 10/13 (ID n. 184695849), comprovando que NIVALDO, às 20h29min, logo após o fato, manda mensagem desejando "bons sonhos" à Carolina, e, após esta reprimi-lo, ele pede perdão por "qualquer falha" de sua parte; no registro de frequência acostado na p. 14 (ID n. 184695849); no depoimento da testemunha Edilma Neiva Pires da Silva Rodrigues (p. 28, ID n. 184695849), que afirma que, por volta de 20h, viu a vítima já dentro de seu carro acompanhada de NIVALDO, que estava de pé em frente à janela do veículo. Some-se a isso as declarações da testemunha Raíssa Neves de Carvalho Pinto (p. 4, ID n. 184695851), Auditora Fiscal da SACAT, ao afirmar que NIVALDO já apresentou condutas similares com ela em outras oportunidades, a exemplo de alisar seus cabelos e pescoço, bem como beijar suas mãos. Outrossim, Valcírio Gomes Granjeiro Filho, vigilante do prédio, informou que já ouviu comentários de outros vigilantes de que o denunciado "ficava brincando e chegando por trás das meninas", e que era "gaiato" em cima das meninas (p. 3, ID n. 184695851). Decisão de ID n. 1291662251 do Juízo da 4ª Vara Federal, declinando da competência para uma das Varas Federais da Seção Judiciária do Acre Decisão de ID n. 1380204282, deste Juízo Federal, datada de 10 de novembro de 2022, recebendo a denúncia e determinando a citação do acusado para apresentar resposta à acusação. Devidamente citado (certidão de ID n. 1407974268 e 1407983757), o réu, por advogados constituídos nos autos (procuração de ID n. 1406086785) apresentou a reposta à acusação de ID n. 1421386764, na qual sustentou, preliminarmente, ausência de justa causa para ação penal, porquanto o MPF, após mais de 3 (três) anos de investigação por parte da Polícia Federal, promoveu o arquivamento do inquérito policial, em razão da ausência de lastro probatório mínimo para justificar a propositura da ação penal relativa ao crime de assédio sexual (artigo 216-A do Código Penal). Além disso, asseverou que a Receita Federal abriu processo administrativo disciplinar para investigá-lo e concluiu que não havia indícios mínimos de autoria e materialidade, sendo que a tramitação da presente ação penal decorreu apenas em virtude da manifestação do Juiz Federal José Geraldo Amaral Fonseca Júnior, que não homologou o pedido de arquivamento e oficiou o Procurador do MPF para mudar o entendimento do verdadeiro autor da ação penal. Subsidiariamente, caso não fosse acolhido o pedido de rejeição da ação penal, por carência de justa causa, sustentou que seria o caso de declinar da competência para o Juizado Especial Federal Criminal, pois os fatos descritos pelo MPF na denúncia não se enquadrariam no tipo descrito no artigo 213 do CP (estupro), mas sim ao descrito no artigo 61 da Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei n. 3.688/1941), vigente à época dos fatos. Ao final, requereu fosse oficiado à Polícia Federal para apresentar cópia integral do Inquérito Policial n. 356/2016 e apresentou rol de testemunhas para serem ouvidas em Juízo. Decisão de ID n. 1877832158, rejeitando a alegação de ausência de justa causa para a ação penal, afirmando que o pedido subsidiário de desclassificação da conduta necessitava da instrução processual, indeferindo o pedido de ofício à Polícia Federal, não absolvendo o réu e designando data para audiência de instrução e julgamento. Cientificado do Ofício do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) n. 8/2024 (ID n. 2015561695) e do Acórdão de ID n. 2017919682, originários da Quarta Turma do TRF1, que, no Habeas Corpus n. 1000694-44.2024.4.01.0000, desclassificou a conduta originariamente tipificada na denúncia para o tipo previsto no artigo 215-A do CP (Importunação sexual), este Juízo, no despacho de ID n. 2015839177, cancelou a audiência previamente designada, determinou a intimação do MPF para oferecer ANPP ao réu, em razão da nova capitulação, e fixou prazo para as partes entrarem em acordo e o submeterem à homologação judicial. Não manifestado interesse pelo réu no ANPP a ele proposto pelo MPF (ID n. 2062573155), foi designada nova data para audiência de instrução e julgamento, nos termos da decisão de ID n. 2128484831, redesignada outras duas vezes (despacho de ID n. 2129347617 e decisão de ID n. 2135118548). Em audiência realizada no dia 14 de agosto de 2024, foram ouvidas a vítima (Carolina Queiroz Araújo), as testemunhas arroladas pela acusação (Valcírio Gomes Grangeiro Filho, Raíssa Neves de Carvalho Pinto e Edilma Neiva Pires da Silva Rodrigues), as testemunhas arroladas pela defesa (Francisco Carlos de Oliveira Cruz, Márcio Canizo Ferreira, Jaqueline da Silva Rodrigues e Márcia Antônia Brandão Félix de Sousa), e o réu foi interrogado. Não houve requerimento de diligências complementares (artigo 402 do CPP) e, ao final, foi deferido prazo para as partes apresentarem alegações finais de forma escrita, tudo conforme ata de ID n. 2142860821 e arquivos de vídeo de ID n. 2142861196, 2142861315, 2142861769, 2142861927, 2142862023, 2142862116, 2142862199, 2142862262, 2142862441 e 2142862608. O MPF apresentou as alegações finais de ID n. 2143892536, nas quais requereu a condenação do réu na pena do crime tipificado no artigo 215-A do CP, sustentando, em síntese, que as testemunhas de acusação relataram comportamentos inadequados e invasivos por parte do réu em outros episódios, que a palavra da vítima, quando coerente com o conjunto probatório, como no presente caso, possui indubitável valor probante nos crimes de natureza sexual e que a tese defensiva de que a acusação da vítima teria como objetivo a obtenção de remoção funcional não se sustenta, porquanto o pedido de remoção ocorreu anos após os fatos. O réu NIVALDO MEDEIROS FILHO, por sua vez, apresentou as alegações finais de ID n. 2144960698, nas quais requereu sua absolvição, nos termos do artigo 386, inciso III, do CPP, por inexistência de fato típico, sustentando que a conduta não existiu. Subsidiariamente, requereu sua absolvição, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do CPP, por insuficiência de prova, sustentando ser aplicável ao caso o princípio in dubio pro reo. Aduziu que as testemunhas arroladas pela suposta vítima, que foram ouvidas em sede policial, não confirmaram sua versão. Pelo contrário, as testemunhas disseram que os servidores nunca tiveram problemas no órgão e que nunca viram nenhuma atitude de assédio de sua parte, tratando-se, portanto, de uma interpretação fantasiosa da acusação e contrária às provas dos autos. Defendeu que ninguém sofre atentado sexual e depois permanece conversando amigavelmente com seu agressor e que se tivesse ocorrido constrangimento com ameaça ou violência e a prática de ato libidinoso na forma de atentado sexual, o depoimento de Valcírio Gomes Grangeiro Filho, responsável pela segurança, teria sido diferente, já que esse narrou que ele (o réu) e Carolina saíram do elevador normalmente. Asseverou que no dia que tinha encaminhado a mensagem no WhatsApp de Carolina com os dizeres “bons sonhos” foi em resposta mensagem dela de que não estava se sentindo bem, porque estava “dopada”. Apontou que a investigação policial durou mais de três anos e foi arquivada inicialmente por ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade e que a acusação foi motivada por interesse da vítima, Carolina Queiroz de Araújo, em conseguir remoção para outro estado (Pernambuco), fato que só foi concretizado após o suposto assédio. Destacou contradições e omissões da vítima, como o fato de ela não ter comunicado o ocorrido imediatamente ao vigia nem a colegas próximos, além de sua declaração de que só percebeu a possibilidade de pedir remoção anos depois. Ressaltou também que todas as testemunhas de defesa, bem como algumas arroladas pela acusação, negaram ter presenciado qualquer comportamento inadequado dele no ambiente de trabalho, notadamente a testemunha Edilma que declarou não ter presenciado nenhuma situação de contato físico entre NIVALDO e Carolina. Neste ponto, afirmou que as testemunhas Edilma, Valcírio, Francisco Carlos, Jaqueline, Márcio e Márcia ressaltaram que ele sempre apresentou conduta adequada e respeitosa com todos, que nunca presenciaram essas investidas, tampouco quanto ao suposto fato de assédio a Carolina, não havendo prova nos autos do inquérito e nem da ação penal que isso aconteceu, apenas o depoimento da vítima. A defesa ainda questionou a imparcialidade da testemunha Raíssa, por ser amiga íntima da vítima, tendo requerido, neste ponto, que o depoimento dela seja valorado com informante. Além disso, enfatizou que a palavra da vítima, por si só, não pode sustentar a condenação diante da ausência de provas materiais ou testemunhais que corroborem sua versão, como ocorre na espécie, pois não há prova de que tenha encostado seu órgão genital em Carolina, devendo ser absolvido. Sustenta, por fim e subsidiariamente, que o princípio do in dubio pro reo deve ser aplicado ao caso, devendo, da mesma forma, ocorrer sua absolvição. II Consta na denúncia que, no dia 26 de setembro 2016, por volta das 19h, nas dependências da Receita Federal do Brasil no Acre, o réu NIVALDO MEDEIROS FILHO, Auditor Fiscal da Receita Federal, utilizando-se de força física, constrangeu Carolina Queiroz Araújo a praticar ato libidinoso, consistente em beijo forçado e toque lascivo da genitália em ereção no corpo da vítima, tendo praticado, assim e após decisão do TRF1, o crime tipificado no artigo 215-A do Código Penal, descrito nos seguintes termos: Importunação sexual (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018) Art. 215-A. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro: (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018) Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o ato não constitui crime mais grave. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018). A materialidade do crime está comprovada pela representação criminal da vítima (documento de ID n. 184695849 – Pág. 5/9), pelo seu termo de declarações de ID n. 184695849 – Pág. 25 e pelos prints de ID n. 184695849 – Pág. 10/13. A autoria indubitavelmente recai sobre a pessoa do réu. Mas antes de analisar as provas carreadas aos autos, cotejando-as com os fatos descritos na denúncia, necessário abordar e decidir alguns pontos que podem influenciar no julgamento da causa. As razões que levaram ao arquivamento do Processo Administrativo Disciplinar n. 10166.728895/2016-87, mencionado pelo réu na resposta à acusação de ID n. 1421386764, não vinculam este Juízo Criminal. Nesse sentido são os recentes julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ): DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME DE GESTÃO TEMERÁRIA. ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DOLO. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS ADMINISTRATIVA E PENAL. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. EMBARGOS REJEITADOS. I. Caso em exame 1. Embargos de declaração opostos por Ary Celio de Oliveira contra acórdão da Quinta Turma que desproveu agravo regimental interposto contra decisão monocrática que negou provimento a recurso especial. A defesa sustenta omissão no acórdão embargado quanto à inexistência de dolo na conduta do embargante, à ausência de liame entre sua atuação e o resultado danoso e à contradição na utilização do mesmo conjunto probatório da decisão administrativa do Banco Central do Brasil. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se houve omissão no acórdão quanto à fundamentação do dolo na condenação do embargante, considerando a conclusão do Banco Central pela ausência de dolo. 3. A questão também envolve a análise da independência entre as instâncias administrativa e penal, e se a instância penal pode divergir da conclusão administrativa sem novas provas. III. Razões de decidir 4. Os embargos de declaração são cabíveis apenas para sanar obscuridade, contradição, omissão ou ambiguidade, nos termos do art. 619 do CPP, não se prestando à rediscussão do mérito do julgado. 5. O acórdão embargado já enfrentou expressamente a tese da defesa, destacando que a condenação penal fundamentou-se em elementos probatórios próprios, sendo a independência entre as instâncias administrativa e penal pacificamente reconhecida na jurisprudência. 6. O dolo na conduta do embargante foi demonstrado nos autos pela natureza das irregularidades encontradas e pela ausência de medidas adequadas de controle e mitigação de riscos, sendo irrelevante a conclusão administrativa do Banco Central, que afastou o dolo para fins disciplinares. 7. A inversão do julgado demandaria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, providência inviável nesta instância especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 8. A discordância da parte embargante com a decisão não configura omissão ou contradição no julgado, revelando mero inconformismo com a solução adotada. IV. Dispositivo e tese 9. Embargos de declaração rejeitados. Tese de julgamento: "1. A independência entre as instâncias administrativa e penal permite que a instância penal conclua de forma diversa da administrativa, desde que fundamentada em provas colhidas nos autos. 2. Os embargos de declaração não se prestam para revisão do julgado em caso de mero inconformismo da parte.". Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 619; Lei nº 7.492/1986, art. 4º, parágrafo único; CP, art. 18, I; CPP, art. 155. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AgRg no RHC 124440 SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 23.02.2021. (EDcl no AgRg no REsp n. 2.137.244/ES, relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 1/4/2025, DJEN de 9/4/2025) ... ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA Nº 284/STF. ALEGAÇÃO DE VÍCIO PROCESSUAL DESACOMPANHADA DE DEMONSTRAÇÃO CONCRETA DE PREJUÍZO. PRESERVAÇÃO. "PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF". INDEPENDÊNCIA ENTRE AS ESFERAS CIVIL E ADMINISTRATIVA. PRECEDENTES DO STJ. 1. O recurso especial, de natureza extraordinária, não é conhecido quando não demonstrados os pressupostos constitucionais. 2. A apuração de falta disciplinar realizada em processo administrativo disciplinar não se confunde com a ação de improbidade administrativa, esta sabidamente processada perante o Poder Judiciário, a quem cabe a imposição das sanções previstas nos incisos do art. 12 da Lei n.º 8.429/92. 3. Há reconhecida independência das instâncias civil, penal e administrativa, que é afastada quando a esfera penal taxativamente afirmar que não houve o fato, e/ou, acaso existente, houver demonstrações inequívocas de que o agente não foi o seu causador, hipóteses inexistentes no caso em apreço. 4. O conhecimento dos temas relativos à impossibilidade de produção probatória e de inexistência de ilícitos administrativos esbarra no óbice da Súmula nº 7/STJ ? ?a pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial? ?, uma vez que não se discute o resultado jurídico da aplicação de normas federais (quaestio iuris), senão da revisão das premissas subjacentes (quaestio facti). 5. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp n. 1.996.225/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 4/9/2024) Do mesmo modo, a instância judicial criminal não se orienta e nem se vincula às conclusões da Autoridade Policial e/ou do Ministério Público. Tanto é que, como dito na decisão de ID n. 1877832158, “o Juiz Federal do Juizado Especial competente, na decisão de ID n. 373202362, discordou da manifestação ministerial”, que, a princípio, tinha pedido o arquivamento dos autos, em razão da imputação feita pela autoridade policial (artigo 216-A do Código Penal), “'e, com base nos elementos de prova colhidos no inquérito, concluiu que os fatos poderiam configurar, em tese, até mesmo o crime de estupro, remetendo os autos à 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF que decidiu pela não homologação do arquivamento, deixando consignado que “há indícios consideráveis da prática de crimes sexuais, mostrando-se necessário continuar e aprofundar as investigações sobre os fatos noticiados.'” No que tange ao pedido de que o depoimento da testemunha Raíssa Neves de Carvalho Pinto seja valorado como de informante, entendo assistir razão à defesa, pois demonstrada a relação de amizade entre ela e a vítima além do trabalho. No entanto, a qualidade de informante de Raíssa não torna o teor do seu depoimento absolutamente desprovido de valor, sobretudo se estiver, como de fato está, em consonância com outros meios de prova. Em crimes sexuais revela-se de todo compreensível/evidente que a vítima limite o conhecimento dos fatos a pessoas de sua confiança, seu circulo mais íntimo, como ocorreu, por exemplo, com Raíssa, para evitar desnecessária exposição. Por outro lado, como dito, também, na decisão de ID n. 1877832158 a palavra da vítima tem destacado valor probatório em crimes contra a liberdade sexual, notadamente como o ora em julgamento, no qual não há vestígios materiais. Nesse sentido, recentíssima decisão do STJ: DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. AGRAVO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo regimental interposto contra decisão monocrática que não conheceu do habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, em que se pleiteava o trancamento de ação penal por ausência de justa causa. 2. O acórdão impugnado destacou que a análise das alegações iniciais demandam valoração do conjunto probatório, incompatível com a via do habeas corpus, e que o paciente sequer foi citado para manifestação na ação penal, quando caberá a apresentação de defesa e análise das provas. II. Questão em discussão 3. A questão em discussão consiste em saber se há flagrante ilegalidade que justifique o trancamento da ação penal por meio de habeas corpus, em razão da alegada ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade do delito. III. Razões de decidir 4. O trancamento da ação penal por habeas corpus é medida excepcional, cabível apenas quando há inequívoca comprovação da atipicidade da conduta, causa de extinção da punibilidade ou ausência de indícios de autoria ou materialidade. 5. A jurisprudência é pacífica no sentido de que, em delitos contra a liberdade sexual, a palavra da vítima possui valor probante diferenciado, especialmente quando não há vestígios materiais. 6. No caso, a decisão de não trancar a ação penal foi fundamentada na presença de indícios mínimos para o prosseguimento da ação, sendo inviável o reexame do conjunto fático-probatório em sede de habeas corpus. IV. Dispositivo e tese 7. Agravo regimental desprovido. Tese de julgamento: "1. O trancamento da ação penal por habeas corpus é medida excepcional, cabível apenas quando há inequívoca comprovação da atipicidade da conduta, causa de extinção da punibilidade ou ausência de indícios de autoria ou materialidade. 2. Em delitos contra a liberdade sexual, a palavra da vítima possui valor probante diferenciado, especialmente quando não há vestígios materiais. 3. É inviável o reexame do conjunto fático-probatório em sede de habeas corpus." Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 41. Jurisprudência relevante citada: STJ, RHC 133.974/SP, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 06.10.2020; STJ, AgRg no AREsp 1784535/AM, Rel. Min. Olindo Menezes, Sexta Turma, julgado em 15.06.2021; STJ, AgRg no REsp 1864590/RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 25.05.2021. (AgRg no HC n. 956.254/MG, relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 12/2/2025, DJEN de 26/2/2025) [Destaquei] Pois bem. O MPF, na inicial acusatória, afirma que, no dia 26 de setembro 2016, por volta das 19h, nas dependências da Receita Federal do Brasil no Acre, o réu, utilizando-se de força física, constrangeu Carolina Queiroz Araújo a praticar ato libidinoso, consistente em beijo forçado e toque lascivo da genitália em ereção no corpo da vítima. Ouvida em sede policial (termo de declarações de ID n. 184695849 – Pág. 25), a vítima Carolina confirmou tudo que consta na representação criminal de ID n. 184695849 – Pág. 5/9, da qual se extrai que o réu, em um elevador em que estavam apenas os dois e após várias tentativas de beijar a boca da vítima, abraçou Carolina e chegou a encostar seu órgão sexual ereto no corpo dela. Consta também na representação que, quando o elevador chegou ao térreo, a vítima tentou sair do elevador duas vezes, mas o réu a puxava pelos braços para dentro do elevador. Além de confirmar tudo que havia mencionado na representação criminal, no referido depoimento em sede policial a vítima afirmou que os fatos ocorreram no edifício da Receita Federal, localizado no Edifício do Ministério da Fazenda, na Rua Marechal Deodoro, n. 340, e que não existiam câmeras no referido local. Ouvida por este Juízo (arquivos de vídeo de ID n. 2142861196 e 2142861315), a vítima foi firme e coerente com o que já havia relato em sede extrajudicial. Carolina declarou que os fatos narrados em sua representação perante a Corregedoria da Receita Federal e informados à Polícia Federal ocorreram da seguinte forma: afirmou que permaneceu sozinha em sua sala de trabalho até por volta das 18h30, quando o réu entrou, conversou brevemente e, em seguida, ambos decidiram encerrar o expediente e se dirigiram ao elevador. Ao entrar no elevador, o réu começou a alisar seu cabelo, o que a deixou desconfortável por considerar uma atitude atípica. Em seguida, o réu tentou beijá-la, o que a fez se assustar e repelir a investida. Disse que o réu, então, a puxou novamente pelo braço, tentou beijá-la novamente, falando as seguintes palavras: "Deixa eu sentir, eu quero sentir". E aí, aproximou o corpo dele ao dela, ocasião em que sentiu que o réu estava com o órgão sexual ereto, insistindo em tentar beijá-la. Isso aconteceu do 4º andar até o térreo. Declarou que conseguiu se desvencilhar ao chegar no térreo, mas o réu voltou a puxá-la pelo braço, tentando fazê-la retornar ao elevador. Novamente, ela conseguiu se esquivar e saiu rapidamente. Disse, ainda, que, ao sair do prédio, ambos passaram pelo vigia noturno, a quem ela deu boa noite. Afirmou estar muito nervosa, confusa e com uma mistura de emoções. Contou que o réu tentou beijar sua mão ao se despedir, e que, ao chegar em casa, após refletir, enviou uma mensagem via WhatsApp ao réu, dizendo, segundo seu relato aproximado: “Não gostei do que aconteceu, espero que não se repita, foi muito grave. Prefiro que nunca mais aconteça e, em troca, não conto para ninguém, nem para sua esposa e vamos tentar esquecer o que aconteceu aqui.” Indagada pelo MPF, a vítima afirmou que exercia o cargo de Assistente Técnico Administrativo, sendo subordinada diretamente ao réu, que era Auditor Fiscal e chefe da SAORT. Informou que tinha a impressão de que o réu demonstrava interesse por ela, mas que não saberia dizer se isso era só com ela ou um comportamento geral dele com outras mulheres. Sobre o comportamento anterior do réu, disse lembrar que ele levava café da manhã apenas para ela, mas não recordava de convites para jantar ou de comentários sobre seu corpo. Confirmou que, no dia dos fatos, o réu teria iniciado uma conversa sobre temas inapropriados como filmes eróticos e pornografia, sentando-se perto da estação de trabalho dela no final do expediente e fazendo perguntas sobre o tema. Questionada sobre uma mensagem enviada pelo réu com os dizeres "bons sonhos" e uma rosa, afirmou lembrar, interpretando a mensagem como um indicativo de que o réu teria entendido o ocorrido como um flerte consensual. Ao ser questionada pela defesa sobre eventual uso de medicamentos no dia dos fatos, ela negou ter tomado qualquer medicamento ou enviado mensagem ao réu mencionando isso. A respeito de testemunhas presenciais, relatou que, ao sair do elevador, viu o vigia noturno, mas não relatou nada a ele por estar extremamente constrangida, nervosa, sem saber como agir. Posteriormente, encontrou a servidora Edilma, mas também não comentou nada com ela sobre o ocorrido. Só falou para os amigos, pessoas íntimas, porque não se sentiu à vontade para verbalizar isso a ninguém que não tivesse intimidade. Perguntada sobre um pedido de remoção funcional, confirmou que havia solicitado, mas foi negado pelo Delegado à época. Negou ter relacionado o episódio com o réu à possibilidade de facilitar sua remoção, afirmando que o pedido foi motivado por questões de saúde mental e ocorreu dois anos depois. Por fim, ao ser indagada se o réu a havia beijado ou apenas tentado beijá-la, declarou que ele tentou beijá-la, mas que ela virou o rosto, repelindo o ato. Reiterou que ele a puxou novamente, encostou o corpo nele, com o órgão sexual ereto, e repetiu a frase “Deixa eu sentir, eu quero sentir”, mas que ela não permitiu o beijo. O réu nega a autoria. Na polícia (termo de ID n. 184695851 – Pág. 8/9), afirmou: “QUE no dia dos fatos no dia dos fatos (26/09/2016) a servidora CAROLINA QUEIROZ DE ARAÚJO mandou mensagem ao declarante por meio do aplicativo whatsapp dizendo que estava "meio dopada" e que chegaria atrasada e pediu ao declarante autorização para fazer compensação de horário no período noturno. QUE o declarante nem sequer considerou o pedido pois foi feito de maneira informal, fora dos meios adequados. QUE ao final do dia de trabalho o declarante foi até sala de CAROLINA QUEIROZ DE ARAÚJO e conversou com ela algo que não se recorda especificamente mas acredita que deve ter sido algo relacionado ao trabalho. QUE após essa breve conversa o declarante retornou para sua sala para pegar os objetos pessoais e já se dirigiu imediatamente ao elevador onde acabou encontrando novamente com CAROLINA. QUE ambos desceram juntos no elevador do 4º andar ao térreo. QUE não houve nem sequer uma conversa entre os dois dentro do elevador. QUE depois ambos saíram do elevador e assinaram o controle de saída e depois ambos entraram em seus veículos e saíram das dependências do prédio. QUE o declarante cronometrou e verificou que o elevador leva 13 segundos para descer do 4º andar para o térreo. QUE a porta do elevador fica praticamente de frente para o local onde fica o vigilante. QUE se tivesse ocorrido algo de anormal dentro do elevador o vigilante teria percebido de imediato já que o declarante assinou o controle de saída do prédio junto com CAROLINA QUEIROZ DE ARAÚJO. QUE o declarante para corroborar sua versão apresenta a esta Autoridade Policial uma cópia da página do livro de registro de ocorrências do dia dos fatos e que consta que não foram registradas alterações ou ocorrências. QUE não é verdade que o declarante assediava CAROLINA QUEIROZ DE ARAÚJO no local de trabalho. QUE isso foi inventado por ela. QUE indagado por esta Autoridade Policial qual seria o motivo de CAROLINA ter feito tão sérias acusações, o declarante respondeu que não sabe afirmar mas acredita que CAROLINA poderia querer sair do setor do qual o declarante era chefe pois constantemente chegava atrasada e sabia que o declarante iria cobrar pontualidade. QUE outra possibilidade seria em razão da servidora CAROLINA estar tentando remoção, pois é notória que a citada servidora já possui 02 processos de tentativa de remoção. QUE outra possibilidade seria em razão dos medicamentos que a referida servidora informou que estava tomando. Interrogado por este Juízo (arquivo de vídeo de ID n. 2142862608), afirmou, ao ser questionado pelo MPF, que mantinha um bom relacionamento com a vítima, inicialmente restrito a cumprimentos de "bom dia", quando ela trabalhava no térreo da Receita Federal. Disse que, após ela ser transferida para o setor dele, passou a ter contato mais frequente para treinamento nas atividades do serviço. Explicou que todas as atividades na Receita Federal eram feitas com senha própria e no computador da servidora, razão pela qual precisava estar fisicamente próximo para explicar as tarefas, mas afirmou que sempre se posicionava do lado oposto da mesa. Alegou que a vítima fez uma “narrativa construída” e afirmou que jamais teve qualquer outro tipo de relacionamento com ela além do profissional. Ressaltou que era casado há 30 anos, com a mesma esposa, sem vida noturna, amante ou comportamento inadequado. Disse que sempre se dedicou ao trabalho e que frequentemente ficava fora do horário de serviço devido às demandas. Relatou que já havia respondido a inquérito administrativo e policial, sem que se tenham encontrado provas contra ele. Sobre o dia dos fatos, disse que a vítima lhe enviou uma mensagem no WhatsApp pela manhã, informando que não havia dormido bem, que havia tomado medicamento e que estava dopada, justificando que gostaria de compensar o período à noite. Informou que, ao receber a mensagem, mostrou-a a um colega de trabalho e que não tomou qualquer providência quanto ao pedido da vítima. Disse que ficou em sua sala durante todo o turno da tarde até o horário de saída. Ressaltou que, conforme a folha de ponto da segurança, seu nome era o único constante entre os servidores que saíam tarde, e que apenas chefes de setor tinham autorização para permanência após o horário. Disse que, ao final do expediente, ao perceber a porta da sala da vítima aberta, apenas perguntou o que ela fazia e logo se retirou. Relatou que, no momento da saída, encontrou a vítima já esperando na frente do elevador. Afirmou que do 4º andar até o térreo são 13 segundos e o elevador quando abre dá de frente com o guarda e ele estava lá. Afirmou, também, que desceram juntos, que não houve qualquer contato físico. Perguntado sobre o que ocorreu dentro do elevador, afirmou que “não aconteceu nada”. Questionado sobre o envio da mensagem com a figura de uma rosa e os dizeres "bons sonhos" às 20h29 daquele mesmo dia, afirmou que a enviou por gentileza, considerando que a vítima havia dito pela manhã que não estava bem. Acrescentou que, após o envio, a vítima respondeu repreendendo-o, e ele, então, pediu desculpas e interrompeu qualquer contato posterior. Sobre o conteúdo da mensagem de resposta, declarou que a expressão "qualquer falha de minha parte" referia-se ao envio da mensagem com a rosa e os bons sonhos. Acrescentou que ambas (Carolina e Raíssa) utilizaram como argumento para seus pedidos de remoção o processo administrativo relativo à denúncia, mencionando ainda que ambas foram removidas para Recife. Reiterou que considera as acusações fantasiosas e que se sente vítima de toda a situação. Declarou que a vítima, por ser advogada, teria habilidade para construir a narrativa que apresentou no processo. Transcritos os depoimentos do réu e da vítima, passo a analisar as teses defensivas. O réu afirmou que a porta do elevador fica praticamente de frente para o local onde ficava o vigilante e que se tivesse ocorrido algo de anormal dentro do elevador o vigilante teria percebido de imediato já que o declarante assinou o controle de saída do prédio junto com a vítima. Já a vítima, a respeito de testemunhas presenciais afirmou que, ao sair do elevador, viu o vigia noturno, mas não relatou nada a ele por estar extremamente constrangida, nervosa, sem saber como agir. Ouvido em sede policial (termo de ID n. 184695860 – Pág. 3), o vigilante Valcírio Gomes Grangeiro Filho declarou que na data dos fatos estava em seu posto de trabalho, que fica no estacionamento da Receita Federal, e que de onde estava não dava para ver o elevador, pois tem uma porta antes e tinha carros estacionados entre o seu posto de trabalho e o elevador e que não viu nada do que teria ocorrido dentro do elevador naquele dia. Em Juízo (arquivo de vídeo de ID n. 2142861769), informou que, à época dos fatos (2016), exercia a função de vigilante na Receita Federal em Rio Branco/AC, atuando nas proximidades da portaria da área de servidores. Esclareceu que, do local em que ficava, não tinha visão para o elevador de onde os funcionários saíam. Confirmou que, no dia 26/09/2016, viu a vítima e o réu saindo juntos da área próxima ao elevador em direção ao estacionamento. O depoimento em questão, se não corrobora a palavra da vítima, também não permite acolher a tese defensiva de que o relato do vigilante teria sido diferente, caso tivesse ocorrido algo de cunho sexual entre o réu e a vítima. Valcírio nas duas vezes em que foi ouvido relatou que não tinha visão da saída do elevador e, por maior razão, ele não poderia testemunhar os fatos que ocorreram dentro do elevador, já suficientes para perfectibilizar o crime imputado ao réu. Por outro lado, o fato de a vítima e o réu terem, na visão do vigilante, saído do elevador normalmente não afasta, obviamente, a versão apresentada pela vítima do que ocorreu dentro do elevador e assim que este chegou no térreo. A testemunha Raíssa Neves de Carvalho Pinto, por sua vez, afirmou em sede policial (termo de ID n. 184695851 – Pág. 4), que: a) não testemunhou os fatos sob investigação; b) ficou sabendo dos fatos pois a própria CAROLINA procurou a declarante para relatar o ocorrido; c) não conhece ninguém que teria presenciado os fatos; d) não existem câmeras no referido edifício; e) NIVALDO já apresentou com a própria declarante comportamentos inoportunos e invasivos como beijar a mão e alisar o cabelo e pescoço e; f) em diversas ocasiões já teve que dizer claramente a NIVALDO que não autorizava esses comportamentos e nem outro tipo de cumprimento que fosse mais invasivo. Em Juízo (arquivo de vídeo de ID n. 2142861927), a mesma testemunha, inicialmente esclareceu que, ao contrário da impugnação feita pela defesa, não era melhor amiga da vítima, sendo que o contato entre ambas era estritamente profissional na época dos fatos. Disse que tinha contato profissional frequente com o réu, pois os setores em que trabalhavam tinham atividades correlatas. Relatou que, fora do ambiente profissional, havia um grupo de amigos formado por auditores e familiares, incluindo o réu e sua esposa, com quem realizavam encontros sociais. Perguntada sobre eventual comportamento inadequado de Nivaldo em relação a ela, respondeu afirmativamente, descrevendo episódios em que o réu fazia elogios com conotação ambígua, olhares considerados invasivos e tentativas de contato físico indesejado. Mencionou, especificamente, situações em que o réu beijava sua mão de forma insistente, mesmo após ela expressar claramente que não gostava desse comportamento. Mesmo com reservas, em razão da sua relação de amizade com a vítima, o depoimento de Raíssa vai ao encontro do que afirmado pela vítima em relação à importunação sexual que sofreu por parte do réu. Apesar de negar ser a melhor amiga da vítima, a informante afirmou que ficou sabendo do ocorrido pela própria Carolina, indicando que os fatos, realmente, ocorreram. Outro elemento de prova que corrobora a versão apresentada pela vítima é o teor das mensagens trocadas com o réu no WhatsApp e que constam no ID n. 184695849 – Pág. 10/11. Nelas fica evidente que, no dia dos fatos, a vítima pediu ao réu que o ocorrido não se repetisse mais, que ela não estaria interessada no réu e que ele estaria confundindo as coisas. A resposta do réu – “Tou não, tudo legal, esquece qualquer falha de minha parte, te desejo uma boa noite” – também corrobora a versão da vítima, demonstrando que houve, sim, a importunação sexual por ela relatada. As demais testemunhas, em que pese servirem para abonar a conduta que o réu sempre teve com elas, servindo, assim, para valorar a conduta social e personalidade, não influenciam no julgamento do mérito do caso. Como as provas demonstram, não houve testemunhas oculares do ato, de forma que a condenação do réu se baseia, destacadamente, na palavra da vítima, corroborada por outros elementos de prova, como acima exposto, e a rejeição dos álibis apresentados pela defesa. Com efeito, a alegação de que os dizeres “bons sonhos” foi em razão de a vítima estar dopada discrepa do acervo probatório produzido durante a instrução. A justificativa que o réu forneceu para enviar tal mensagem decorreria de uma preocupação com uma indisposição relatava pela vítima durante a manhã. Contudo, a própria dinâmica dos eventos denota que eles tiveram contato presencial ao longo do dia, o que foi, inclusive, testemunhado pelo vigilante noturno, contexto no qual essa preocupação já poderia ter sido externada, tornando não crível este álibi do réu. A alegação de que a acusação da vítima foi motivada por interesse em eventual remoção para o Estado de Pernambuco, da mesma forma, não se comprovou. Cabia à defesa trazer prova de que os elementos de convicção para a decisão administrativa tiveram correlação com os fatos ora sob julgamento. Ainda, sob critério objetivo, a remoção ocorreu depois de aproximadamente 2 (dois) anos dos fatos, e isso não é controverso. No mais, mesmo se demonstrada a correlação entre o comportamento do réu e o pedido de remoção, tal não parece relevante para a presente apuração. Se estes fatos interferiram para o resultado favorável, não quer dizer que não tenham ocorrido, não sendo crível que a vítima iria criar situação deveras constrangedora como a presente, expondo sua intimidade para a Corregedoria da Receita Federal, Polícia Federal, etc, por vislumbrar esse provável benefício administrativo, até porque a solução administrativa, dentre outras, poderia ser mudá-la do local de trabalho, retirando o réu de sua chefia imediata. O que exsurge dos fatos e das provas produzidas nos autos é que CAROLINA foi coerente e firme em suas declarações, na polícia e em juízo, sobre a importunação sexual de que foi vítima, e há corroboração da sua palavra pelos prints de conversas de WhatsApp trocadas com o réu e pelo relato da informante Raíssa. Ao revés, as teses sustentadas pela defesa, especificamente sobre os fatos em julgamento, não encontram substratos mínimos de corroboração para, no mínimo, controverter a acusação e, assim, poder ser aplicado ao caso o in dubio pro reo. III Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na denúncia para CONDENAR o réu NIVALDO MEDEIROS FILHO na pena do crime previsto no artigo 215-A do Código Penal. Passo à dosimetria da pena, considerando o disposto no artigo 59, caput, do Código Penal, na forma abaixo delineada. a) Culpabilidade: é acentuada, porquanto o réu era superior hierárquico da vítima, mas para evitar bis in idem, essa circunstância não será valorada negativamente em razão da causa de aumento prevista no artigo 226, inciso II, do Código Penal, aplicável ao caso. b) Antecedentes: o réu não possui maus antecedentes; c) Conduta social: não há informação contrária ao réu; d) Personalidade: não há informação contrária o réu; e) Motivos do crime: são inerentes ao tipo penal; f) Consequências do crime: normais para a espécie; g) Circunstância do crime: também comuns para o tipo penal. Por esses motivos, fixo a pena-base em 1 (um) ano de reclusão. Não há atenuantes, agravantes e causas de diminuição a serem reconhecidas e aplicadas. Por sua vez, é aplicável ao caso a causa de aumento prevista no artigo 226, inciso II, do Código Penal, porquanto comprovado que o autor era o superior hierárquico da vítima, aumento a pena em metade, tornando-a concreta e definitiva em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. A pena privativa de liberdade deverá ser cumprida no regime inicial aberto (CP, art. 33, § 2º, alínea ‘c’). Presentes os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito (art. 44, § 2º, CP), a serem definidas pelo Juízo da execução. Custas pelo réu. Com fundamento no artigo 201, § 2º, do CPP, comunique-se à vítima sobre a prolação desta sentença de mérito. Após o trânsito em julgado: a) oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral para fins do art. 15, III, da Constituição e; b) expeçam-se as guias necessárias à execução e encaminhe-se o respectivo auto do SEEU ao Juízo Estadual competente para a execução da pena imposta ao réu. Com o trânsito em julgado e comprovação do cumprimento desta sentença, ao arquivo, anotando-se. Intimem-se e cumpra-se.
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