Jose Decio Cotrim Junior e outros x Camil Alimentos S/A
ID: 275467127
Tribunal: TRT3
Órgão: 2ª Vara do Trabalho de Contagem
Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO
Nº Processo: 0010935-97.2023.5.03.0030
Data de Disponibilização:
21/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
HUMBERTO URBANO
OAB/MG XXXXXX
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RAISSA BRESSANIM TOKUNAGA
OAB/MG XXXXXX
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RICARDO CARDOSO DE LIMA MAYER
OAB/MG XXXXXX
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MOISES ESTEVAM
OAB/MG XXXXXX
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HELBERT LEOPOLDINO DE ALMEIDA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE CONTAGEM 0010935-97.2023.5.03.0030 : KENIA ASSUNCAO CRUZ DA SILVA : CAMIL ALIMENTOS S/A …
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE CONTAGEM 0010935-97.2023.5.03.0030 : KENIA ASSUNCAO CRUZ DA SILVA : CAMIL ALIMENTOS S/A INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 0b89048 proferida nos autos. SENTENÇA I. RELATÓRIO KENIA ASSUNCAO CRUZ DA SILVA ajuizou ação trabalhista em 14/07/2023, em face de CAMIL ALIMENTOS S/A, partes igualmente qualificadas, postulando as parcelas arroladas na inicial, juntando documentos e atribuindo à causa o valor de R$ 349.088,42. Petição inicial emendada no ID bd9cc88. Em audiência inicial (ID 6302875), recusada a conciliação, foi recebida a defesa escrita da reclamada, acompanhada de documentos. O juízo indeferiu o pedido de realização de perícia contábil, sob protestos da autora. Impugnação pela parte autora (ID 8fca2bf). Manifestação da reclamante nos ID 34b7d37, ID be50f1d e ID 20554db. Ao ID 74097b9, o Juízo deferiu o pedido da autora para a realização de perícia contábil. Laudo pericial contábil e esclarecimentos periciais no ID 40eaff7 e ID 2ce4a7e, respectivamente, com vista às partes. Na audiência de instrução, o juízo indeferiu o depoimento das partes e rejeitou a contradita suscitada pela reclamada em relação à testemunha indicada pela reclamante, pelas razões lá expostas, sob protestos das respectivas partes. Após, foram inquiridas duas testemunhas, uma pela reclamante e outra pela reclamada. Sem outras provas a produzir, encerrou-se a instrução processual, com razões finais orais remissivas e rejeitada a última tentativa conciliatória. É o relato do essencial. II. FUNDAMENTOS 1 - Lei 13.467/2017 Por força do art. 6º do Decreto-Lei 4.657/1942, tem-se que as alterações introduzidas pela Lei 13.467/2017 na Consolidação das Leis do Trabalho, sobre normas de direito material, somente devem regulamentar as relações de emprego a partir de sua vigência (11/11/2017), seja para reger contratos novos ou antigos. Isso porque não observar as alterações para contratos ativos antes vigência da lei seria dar efeito superveniente à norma revogada, o que não encontra amparo em nosso ordenamento jurídico, além de transgredir o disposto no art. 912 da CLT. Por outro lado, nos termos do art. 14 do CPC: “A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.” Portanto, à luz da legislação vigente, há de entender que as alterações processuais introduzidas pela Lei 13.467/2017 devem ser aplicadas de imediato e de forma automática na presente ação, pois ajuizada após a vigência da Lei 13.467/2017. 2 - LIMITAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS A quantificação dos pedidos na inicial, acaso acolhida, será apurada em regular liquidação de sentença, inexistindo prejuízo para a parte passiva. Não há que se falar em limitação ao valor atribuído aos pedidos. Nos termos do art. 840, § 1º, da CLT, os valores configuram estimativa para fins de definição do rito processual a ser seguido e não um limite para apuração das importâncias das parcelas objeto de condenação, em liquidação de sentença. Em linha com o entendimento do e. TRT3, os valores indicados na petição inicial configuram estimativa para fins de definição do rito processual a ser seguido e não um limite para apuração das importâncias das parcelas objeto de condenação, em liquidação de sentença (Tese Jurídica Prevalecente nº 16). Logo, em caso de condenação, os valores deverão ser apurados em liquidação de sentença. Rejeito a impugnação eriçada. 3 – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL Oportunamente arguida, pronuncio a prescrição quinquenal do direito da reclamante a créditos trabalhistas, cuja exigibilidade tenha ocorrido em data anterior a 14/07/2018 (05 anos retroativos à data do ajuizamento da ação - Súmula 308, I, TST), nos termos do artigo 7º, inciso XXIX, da CF/88, tendo em vista a propositura da ação em 14/07/2023. Desse modo, extingue-se o processo com resolução de mérito, a teor do art. 487, II, do Código Processual Civil, em relação aos pedidos abrangidos pela prescrição quinquenal, exceto quanto aos pedidos declaratórios. 4 – HORAS EXTRAS A reclamante alega que trabalhava de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h, com 1h de intervalo, conforme contrato. Contudo, afirma que também realizava deslocamentos para atender clientes no interior que não eram computados como jornada de trabalho, incluindo viagens duas vezes por mês para Igarapé, Juatuba e Brumadinho (totalizando 2h de deslocamento por dia) e oito vezes por mês para Betim (1h40min de deslocamento diário). Além disso, participava de evento anual em Atibaia/SP, de quinta a domingo, das 8h às 20h, com apenas 1h de intervalo, sem receber as devidas horas extras por esses períodos trabalhados além da jornada normal. A reclamada, por sua vez, refuta a pretensão, alegando que a autora não estava sujeita a controle de jornada, por exercer atividade externa incompatível com a fixação de horário. Como cediço, a regra no Direito do Trabalho é a submissão do empregado ao controle de jornada, conforme artigo 74, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho, até porque só assim se pode aferir o respeito aos direitos fundamentais assegurados pela Constituição da República aos trabalhadores, como a limitação da jornada prevista em seu artigo 7º, XIII, e o pagamento do adicional previsto no inciso XVI do mesmo dispositivo. Logo, a realização do controle de jornada não se insere no âmbito de opção ou comodidade do empregador. Ao contrário, está ele, ordinariamente, obrigado a realizá-lo, excluídas apenas as situações expressamente previstas em lei. Neste norte, o artigo 62, I, da CLT é claro ao prever que está excluído das regras atinentes à jornada apenas o empregado que exercer "atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho". Importante frisar que, à luz do referido dispositivo, o labor externo não é, por si só, incompatível com o controle de horários e com a pretensão de recebimento de horas extras. Na verdade, a legislação impôs uma outra condição para a exclusão do empregado da incidência das normas reguladoras da jornada, que é a incompatibilidade do controle da jornada cumprida pelo obreiro, o que justifica a não sujeição às limitações da jornada previstas na legislação, tornando impossível, consequentemente, a aferição de labor extraordinário. Tem-se, assim, que, para que seja caracterizada a excludente prevista no art. 62, I, da CLT, mostra-se necessária a presença concomitante de três elementos, ou seja: trabalho prestado fora das dependências da empregadora, inexistência de controle formal da jornada e, ainda, a impossibilidade de compatibilização com a fixação de horário de trabalho. E, em se tratando de exceção legal, de fato impeditivo do direito da autora, a teor do disposto no artigo 818, II da CLT e 373, II, do CPC, cabia à reclamada a comprovação de impossibilidade de controle da jornada desenvolvida, ônus do qual não se desvencilhou a contento. A testemunha apresentada pela reclamante, Sr. Albertino Gonçalves, confirmou que, apesar de não haver um registro formal de ponto, os vendedores estavam constantemente sob supervisão. Segundo o relato: "não registravam ponto na reclamada; que o trabalho do vendedor era interno e externo; que o vendedor tinha que comparecer todos os dias na unidade para uma reunião matinal, que ocorria de 07h20/07h30 até 08h/08h10, aproximadamente, todos os dias; que às sextas-feiras, o vendedor também tinha que comparecer à unidade, ao final da jornada para a reunião semanal, que iniciava às 17h40/18h e terminava às 19h30/20h30; que as reuniões eram obrigatórias; que o gerente e o aplicativo de vendas eram capazes de controlar a jornada de trabalho do vendedor; que não tinham liberdade para se ausentar durante o horário de trabalho, salvo quando havia algum médico e mediante comunicação ao gerente; que terminavam a jornada do dia, em média, às 18h30/19h". (ID 649d6f4 - f. 785/786). Ademais, a testemunha afirmou que "inicialmente, usavam o sistema Salesforce e no final o Geosales; que a cada cliente, o vendedor enviava a venda para análise da empresa e finalizavam no aplicativo cada cliente antes de ir para o próximo cliente; que no final do dia mandavam o consolidado para a empresa; que tanto o aplicativo quanto o consolidado registravam os horários das vendas e visitas, bem como do deslocamento". Portanto, o depoimento demonstra que, apesar de a reclamada não utilizar um sistema formal de ponto, havia mecanismos claros para acompanhar a jornada de trabalho e fiscalizar o cumprimento das atividades, como o uso de aplicativos (Salesforce e Geosales), reuniões obrigatórias e a necessidade de prestar contas ao final do dia. Portanto, resta claro que a empresa detinha plenas condições de fiscalizar o cumprimento da jornada da reclamante, afastando qualquer alegação de ausência de controle. A testemunha da reclamada, Sr. Rodrigo Meneguine, confirmou que "o pedido poderia ser lançado no aplicativo a qualquer momento, mas o gerente poderia ligar para a reclamante para saber onde ela estava", bem como que "acredita que no sistema o horário de lançamento da venda", o que demonstra a possibilidade de controle da jornada. (ID 649d6f4 - f. 786/787). Toda evidência aponta para o fato de que a reclamante, laborando nessas condições, estava sujeita à fiscalização da jornada, não havendo que se falar, portanto, em aplicação da exclusão da duração de trabalho prevista no art. 62, I, da CLT. Assim, é ônus da ré a juntada dos controles de jornada da autora (art. 74, §2º, da CLT). E, não tendo a reclamada trazido aos autos os controles de jornada daquele interregno, aplicável o entendimento contido na Súmula 338 do C. TST, prevalecendo, a princípio, a presunção de veracidade da jornada de trabalho informada na peça de ingresso. No entanto, considerando os termos da inicial e da defesa, a presunção relativa de veracidade da jornada declinada na peça de ingresso, atrelado ao princípio do livre convencimento motivado do Juiz e ao princípio da razoabilidade, e, sobretudo, a prova oral produzida, arbitra-se que a autora, ao longo do pacto laboral, trabalhava, em média, nos seguintes horários: a) de segunda a sexta-feira, das 08h às 18h30, com 01 hora de intervalo para alimentação e descanso; b) nas viagens para atender clientes no interior, deslocamento adicional: - 2 vezes por mês para Igarapé/MG, Juatuba/MG e Brumadinho/MG: 1 hora no deslocamento de ida e 1 hora na volta (total de 2 horas diárias); - 8 vezes por mês para Betim/MG: 50 minutos no deslocamento de ida e 50 minutos no deslocamento de volta (total de 1h40min diárias); c) Evento anual em Atibaia/SP: de quinta-feira a domingo, das 08h às 20h, com 01 hora de intervalo para alimentação e descanso. Quanto aos deslocamentos para atender clientes no interior, uma vez que a reclamante precisava obrigatoriamente estar no primeiro cliente às 8h da manhã, e terminava o último atendimento por volta das 18h, realizando os deslocamentos a partir de sua residência em Ibirité/MG, configura-se tempo à disposição do empregador de efetivo labor para consecução de suas atividades, nos termos do artigo 4º da CLT, pelo que deve ser remunerado como hora extra. Via de consequência, defere-se à autora o pagamento das horas extras, assim consideradas aquelas laboradas após a 8ª hora diária e 44ª hora semanal, não cumulativas, acrescidos do adicional convencional ou, na sua falta, de 50%. Ante a habitualidade e a natureza salarial da parcela ora deferida, deferem-se os reflexos em RSR e, separadamente, na forma da OJ 394 da SDI-1 do TST, em 13º salários, férias + 1/3, aviso prévio indenizado e FGTS + 40%. Defiro, ainda, o pagamento em dobro dos domingos trabalhados nos eventos anuais, por todo o pacto laboral, com reflexos em 13º salários, férias + 1/3, aviso prévio indenizado e FGTS + 40%. Ademais, saliento que, na hipótese dos autos, a reclamante recebia salário fixo e comissões (ID 6feec25). Sendo a reclamante comissionista misto, o pagamento de horas extras deve observar a Súmula 340 do C. TST. Desse modo, sobre o salário fixo recebido, as horas extras deferidas serão pagas acrescidas do adicional de horas extras, observando-se o divisor 220. Em relação à parte variável da remuneração, será devido apenas o adicional sobre as horas extras deferidas, observando-se o divisor correspondente ao número total de horas efetivamente laboradas (OJ 397 da SDI-1 do TST). Quanto aos reflexos das horas extras em RSR e, com estes, nas demais verbas contratuais e rescisórias, o Pleno do TST, em 20.3.23, no julgamento do IRR 0010169-57.2013.5.05.0024, reviu o entendimento então tratado na OJ 394 da SBDII do TST, no sentido de que a majoração do valor do repouso semanal remunerado decorrente da integração das horas extras habituais deve repercutir em outras verbas, como férias, 13º salário, aviso prévio e FGTS. Aplicou-se, contudo, a modulação dos efeitos de tal decisão para determinar que tal entendimento só deverá ser aplicado às horas extras trabalhadas a partir de 20/03/2023: "REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. INTEGRAÇÃO DAS HORAS EXTRAS. REPERCUSSÃO NO CÁLCULO DAS FÉRIAS, DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO, AVISO PRÉVIO E DEPÓSITOS DO FGTS. I. A majoração do valor do repouso semanal remunerado decorrente da integração das horas extras habituais deve repercutir no cálculo, efetuado pelo empregador, das demais parcelas que têm como base de cálculo o salário, não se cogitando de bis in idem por sua incidência no cálculo das férias, da gratificação natalina, do aviso prévio e do FGTS. II. O item I será aplicado às horas extras trabalhadas a partir de 20.03.2023." Assim, considerando a modulação aplicada pelo Tribunal Pleno do TST e deixo de determinar a integração dos reflexos das horas extras trabalhadas nos repousos semanais para cálculo das demais verbas. Deverão ser observados: a base de cálculo e o divisor, nos termos das Súmulas 264 e 340 do TST; frequência integral, exceto ausência comprovadas nos autos; o disposto na OJ 415 da SDI-1 do TST e demais súmulas e orientações jurisprudenciais aplicáveis. 5 - CORREÇÃO MONETÁRIA DAS COMISSÕES – OJ 181 DO TST A reclamante afirma que a empresa não corrigia monetariamente as comissões na forma da OJ 181 do C.TST, para apuração das férias, 13º salário e verbas rescisórias. A ré, por sua vez, aduz que cumpria as normas coletivas e legais, as quais afastam a aplicação da OJ 181 do C.TST. A OJ 181 do C.TST assim dispõe: 181. COMISSÕES. CORREÇÃO MONETÁRIA. CÁLCULO O valor das comissões deve ser corrigido monetariamente para em seguida obter-se a média para efeito de cálculo de férias, 13º salário e verbas rescisórias. Realizada a prova pericial contábil, o perito prestou os seguintes esclarecimentos (ID 40eaff7 – f. 719): “XXVI – Queira o ilustre perito oficial informar se para a base de cálculo utilizada no pagamento do 13º salário, das Férias + 1/3 e verbas rescisórias, a Reclamada seguiu o disposto na OJ 181 da SDI-1 do TST, ou seja, corrigiu monetariamente as comissões/remuneração variável pagas antes de apurar a média para fins de cálculo de Férias, 13º salário e verbas rescisórias; Resposta do perito: Não. XXVII – Qual o montante apurado após a correção das comissões/remuneração variável recebidas pela reclamante, bem como as diferenças existentes diante dos cálculos das férias + 1/3, 13º salário, aviso prévio, verbas pagas na rescisão, reflexos no FGTS + 40% e demais parcelas recebidas pela Autora? Resposta do perito: Para tal resposta é fundamental apresentação pela Ré de uma memória de cálculo. Tal memória permitiria a verificação de forma clara e objetiva dos valores das bases e o montante a título de remuneração variável. Com esses dados se conciliaria os valores expressos em recibo de pagamento e a verificação de eventuais diferenças.” Veja-se que o perito apurou que a reclamada não seguiu o disposto na OJ 181 da SDI-1 do TST, ou seja, não corrigiu monetariamente as comissões pagas antes de apurar a média para fins de cálculo de férias, 13º salário e verbas rescisórias. Portanto, defere-se o pedido "e" e “e.1”da petição inicial, para condenar a reclamada ao pagamento de diferenças de férias + 1/3, 13º salários, aviso prévio e FGTS + 40% (cujo depósito deve ser feito na conta vinculada - tese vinculante do TST no Tema 68 de IRR), em razão da integração da correção monetária das comissões pagas à remuneração para fins de cálculo de tais parcelas, nos termos da OJ 181 da SDI-1 do TST. Indefiro o pedido de diferenças de reflexos sobre RSR e horas extras, uma vez que a OJ 181 da SDI-1 do TST trata especificamente da correção monetária das férias, 13º salário e verbas rescisórias. Fica desde já autorizada a dedução dos reflexos pagos a maior pela reclamada, sobre os reflexos devidos a título de diferenças de comissões deferidas em tópico anterior. 6 - DIFERENÇAS DE COMISSÕES A reclamante alega que sua remuneração era composta por salário fixo mais comissões sobre vendas realizadas sob a rubrica "remuneração variável". Sustenta que a reclamada alterava unilateralmente os critérios para pagamento dessas comissões, não apresentava relatórios sobre o quantitativo de vendas e deixava de quitar os valores quando ocorriam "cortes de produtos" ou não entrega por culpa da própria empresa, causando-lhe prejuízo mensal de R$500,00. Requer o pagamento desse valor a título de diferenças de comissões, acrescido dos reflexos legais. Em sua defesa, a reclamada nega as alegações da autora, afirmando que a remuneração variável era paga de acordo com metas estabelecidas mensalmente, seguindo critérios claros e transparentes, sempre divulgados no início de cada mês aos empregados. Pois bem. Conforme documentação juntada aos autos, a autora recebia, além do salário fixo, parcelas variáveis sob as rubricas "Remuneração Variável" e "DSR s/Remun.Variável", demonstrando o caráter habitual e salarial dessa parcela (ID 6feec25). A testemunha da reclamante, Sr. Albertino Gonçalves de Souza Filho, confirmou que "não havia nenhuma diferença nas atividades realizadas pela reclamante, pelo depoente e pelos outros dois paradigmas"; (...); não havia diferença de produtividade entre os vendedores paradigmas e a reclamante e nem de qualidade dos serviços prestados", corroborando a alegação da autora quanto à injustificada diferenciação nos critérios de pagamento da remuneração variável. (ID 649d6f4) Por outro lado, a testemunha da reclamada, Sr. Rodrigo Meneguine, não serviu para o convencimento do Juízo acerca do tema, pois reconheceu em seu depoimento que "as informações que o depoente tem sobre a reclamante são das poucas vezes que a encontrou em reuniões; (...) nunca acompanhou a reclamante e nem o Sr. Albertino nas rotas", demonstrando seu limitado conhecimento sobre a rotina e condições de trabalho da autora. (ID 649d6f4) Designou-se perícia técnica contábil para elucidar a matéria, tendo o expert se manifestado de forma circunstanciada acerca das questões suscitadas (ID 40eaff7). O laudo pericial, de forma inequívoca, atestou a insuficiência de documentação apresentada pela reclamada. O perito expressamente apontou que: "a falta de documentos como memória de cálculo clara e objetiva prejudicou algumas respostas, pois esta serviria como base para conciliar com os valores expressos nos recibos de pagamentos da remuneração variável, o que permitiria identificar e calcular possíveis diferenças de valores em aberto para esse tipo de evento e verbais adicionais" (ID 40eaff7 - f. 723). Além disso, o expert confirmou que "as metas eram constantemente alteradas ao longo do contrato de trabalho, fazendo com que a remuneração variável não aumentasse de forma linear conforme o aumento nas vendas realizadas" (f. 716), corroborando as alegações da reclamante quanto à alteração unilateral dos critérios de pagamento. Em seus esclarecimentos, o perito foi categórico ao afirmar que as planilhas apresentadas pela reclamada eram "insuficientes como documentos para demonstrar as metas alcançadas, e os valores pagos a título de remuneração variável, sendo impraticável a conciliação das vendas por grupo de produtos realizados pela reclamante a fim de demonstrar as metas alcançadas para cada período e seus respectivos valores e assim conciliar com valores expressos nos recibos de pagamento" (f. 749). Intimada para apresentar os documentos necessários à elucidação da controvérsia (ID 4668056), a reclamada não o fez de forma satisfatória, já que os documentos juntados não se prestam a demonstrar a forma de apuração da parcela variável, não informando metas, percentuais atingidos e valores devidos de forma clara e cronológica. Face às conclusões periciais, impõe-se a aplicação da norma insculpida no artigo 400 do Código de Processo Civil, visto que a parte autora não pode ser prejudicada em sua pretensão pela incúria da demandada em apresentar a documentação pertinente. Portanto, considerando a conclusão pericial e a omissão da reclamada em apresentar documentos essenciais à apuração correta dos valores devidos, presumo verídica a alegação da autora quanto ao prejuízo sofrido em razão das alterações unilaterais dos critérios de pagamento das comissões. Assim, com fulcro nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e considerando os contracheques juntados aos autos, arbitro as diferenças de comissão no importe mensal de R$500,00 por todo o pacto laboral. Por conseguinte, julgo procedente o pedido de pagamento das diferenças de comissão no valor de R$500,00 mensais, por todo o pacto laboral, com a integração e recomposição da remuneração obreira, recompondo os vencimentos da autora para apuração das parcelas requeridas. Em razão da natureza salarial da parcela, defiro também os reflexos no RSR, e com estes, em férias + 1/3 constitucional de férias, 13º salário, aviso prévio e FGTS mais multa de 40%. 7 - ADICIONAL DO ARTIGO 8º DA LEI N. 3.207/57 A autora alega que, além das funções de vendedora, realizava atividades de inspeção e fiscalização. Pugna pelo adicional previsto no artigo 8º da Lei n. 3.207/57. Em defesa, a reclamada argumenta que a obreira exerceu somente as funções inerentes ao cargo de vendedor. Sobre o tema, a testemunha da autora, Sr. Albertino Gonçalves, revelou de forma clara e específica que: "o vendedor fazia rota, atendia clientes e fazia vendas de produtos, estoque de vendas, propaganda de produtos, verificação de validade, limpeza de produtos e gôndolas"; (...); "os vendedores realizavam todas as atividades acima informadas em todos os clientes." (ID 649d6f4) Por outro lado, a testemunha da reclamada, Sr. Rodrigo Meneguine, afirmou que "o executivo de vendas não faz limpeza de gôndolas e produtos; que se precisasse, o vendedor poderia abastecer a loja com os produtos, mas isso não era da função, não sabendo dizer se a reclamante fazia porque não a acompanhava na rota; que a empresa sempre cobrava do vendedor a validade dos produtos." (ID 649d6f4) Atribuo maior credibilidade ao depoimento do Sr. Albertino Gonçalves, tendo em conta que ele trabalhou para a reclamada de abril de 2015 a março de 2022, período que coincide quase integralmente com o contrato da reclamante (22/10/2015 a 02/03/2022), tendo trabalhado junto com a reclamante, inclusive afirmou que "já fez a rota da reclamante quando ela saiu de férias", bem como disse que que "todos eram da mesma equipe, participando de reuniões juntos", demonstrando conhecimento direto das atividades executadas pela autora. Em contrapartida, a testemunha da reclamada demonstrou conhecimento limitado das atividades da autora, admitindo expressamente que "não a acompanhava na rota" e que "as informações que o depoente tem sobre a reclamante são das poucas vezes que a encontrou em reuniões". Ademais, o próprio depoimento da testemunha da reclamada confirma que "a empresa sempre cobrava do vendedor a validade dos produtos", o que já caracteriza atividade de fiscalização, corroborando parcialmente o relato do Sr. Albertino. Ressalta-se que, conforme relatado pela reclamante na inicial e confirmado pelo Sr. Albertino, além de realizar as atividades de vendedora para a qual foi contratada, a obreira era também obrigada pela reclamada a inspecionar e fiscalizar os produtos da ré nos pontos de vendas, realizando verificação de validade, estoque de vendas, propaganda de produtos e limpeza de produtos e gôndolas. Portanto, tem-se que a autora, durante todo o pacto laboral, exerceu atividades de inspeção e fiscalização. Em razão do exposto, defere-se à autora o pagamento do adicional do artigo 8º da Lei n. 3.207/57 (1/10 da remuneração), durante todo o pacto laboral, com reflexos em repouso semanal remunerado, férias + 1/3, 13º salários, aviso prévio, e, a partir das verbas acima postuladas mais os reflexos, a incidência no FGTS mais multa de 40% sobre o FGTS, com a observância da Súmula 264/TST. 8 – EQUIPARAÇÃO SALARIAL A reclamante postula o pagamento de diferenças salariais, alegando que exerceu funções idênticas aos paradigmas Albertino Gonçalves de Souza Filho, Marco Antônio da Rocha e Rodrigo Meneguine, com a mesma qualidade técnica e produtividade. A reclamada nega haver qualquer identidade nas funções desempenhadas pela reclamante e pelos paradigmas. Nos termos do art. 461 da CLT (na redação vigente antes da Reforma Trabalhista), para que seja deferida a equiparação salarial é necessária a demonstração de identidade de função exercida para o mesmo empregador, no mesmo tempo (simultaneidade) e mesma localidade (mesmo Município ou Municípios distintos, mas integrantes da mesma região metropolitana - Súmula 6, inciso X, do C.TST), sem que exista diferença de produtividade entre os trabalhadores equiparandos, distinção de perfeição técnica ou mais de dois anos no exercício da função. Nos termos do art. 818 da CLT c/c 373, I e II, do CPC e Súmula 6/TST, a prova da identidade funcional compete à reclamante, por se tratar de fato constitutivo do seu direito. Ao empregador, compete a prova dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito, tais como diferença de produtividade, diferença de perfeição técnica, distinção entre as localidades, diferença de tempo na função superior a 2 anos, quadro de carreira homologado pelo Ministério do Trabalho, na forma da Súmula 6, inciso I, do C.TST e, a partir da Reforma Trabalhista, diferença de tempo de serviço para o mesmo empregador superior a quatro anos, prestação de serviços em estabelecimento empresarial distinto e quadro de carreira ou PCS (independentemente de homologação). Da análise das fichas de registro de empregados acostadas aos autos, verifico que a reclamante, Kênia Assunção Cruz da Silva (matrícula 18436-0), foi admitida em 22/10/2015 como Executivo de Vendas, com salário inicial de R$2.200,00. Ao final do contrato, em 02/03/2022, recebia salário de R$2.846,20 (conforme histórico salarial – ID 1d39e5f). O paradigma Albertino Gonçalves de Souza Filho (matrícula 17310-0) foi admitido em 13/04/2015 como Executivo de Vendas I, passando para Executivo de Grandes Contas em 01/11/2015. Recebia, em julho/2021, salário de R$5.944,92, conforme seu histórico salarial. (ID 95ffaf9) O paradigma Marco Antônio da Rocha (matrícula 20253-0) foi admitido em 03/10/2016 como Executivo de Grandes Contas, recebendo em julho/2021 salário de R$4.516,07. (ID 20ba394) O paradigma Rodrigo de Mesquita Meneguine (matrícula 18456-0) foi admitido em 27/10/2015 como Executivo de Vendas I, passando para Executivo de Grandes Contas em 01/11/2015. Recebia, em abril/2022, salário de R$6.656,52. (ID d14b365) Constato que os paradigmas foram contratados em datas próximas à contratação da reclamante, não havendo diferença superior a quatro anos no trabalho para o mesmo empregador. Quanto à identidade de funções, a testemunha da parte autora, Sr. Albertino Gonçalves de Souza Filho, afirmou categoricamente que: "o depoente trabalhou para a reclamada de abril de 2015 a março de 2022, na função de vendedor; que trabalhou junto com a reclamante, a qual era vendedora; que o depoente também trabalhou junto com os paradigmas Marco Antônio e Rodrigo Meneguine; que ambos eram vendedores também; que não havia nenhuma diferença nas atividades realizadas pela reclamante, pelo depoente e pelos outros dois paradigmas". Ainda, segundo a testemunha da autora: "não havia diferença de produtividade entre os vendedores paradigmas e a reclamante e nem de qualidade dos serviços prestados; que o depoente, a reclamante e os outros dois paradigmas estavam vinculados à Camil Contagem; que todos eram da mesma equipe, participando de reuniões juntos". A testemunha da reclamada, Sr. Rodrigo Meneguine, apresentou versão diferente ao afirmar que: "o depoente trabalha na reclamada desde 2015, como executivo de grandes contas; que a reclamante atendia os clientes do varejo e pequenos supermercados da região metropolitana e BH; que o executivo de grandes contas atende as grandes contas nacionais, como Assaí, Carrefour, Extra, All Mart e Sans Clube, tratando muito com a Camil de São Paulo, falando muito com o departamento financeiro e realizando programação de vendas; que pelo que sabe, a reclamante atendia clientes também, mas não falava com o pessoal de São Paulo, ficando mais com o pessoal da regional". Em contrapartida, como já citado acima, o próprio Sr. Rodrigo Meneguine reconheceu que não acompanhava a reclamante em seu dia a dia de trabalho, o que torna frágil seu depoimento quanto às atividades efetivamente realizadas pela reclamante. Entendo, portanto, que a testemunha da autora demonstrou ter conhecimento direto e detalhado sobre as atividades da reclamante. É significativo notar que, embora as fichas de registro indiquem nomenclaturas distintas de cargos (a reclamante como "Executivo de Vendas" e os paradigmas como "Executivo de Grandes Contas"), a testemunha da autora, que é um dos próprios paradigmas indicados, afirmou categoricamente a identidade de funções entre eles, sem diferença de produtividade ou qualidade técnica, elementos essenciais para a equiparação salarial. Da análise dos depoimentos aqui transcritos, e considerando a maior proximidade e conhecimento da testemunha da autora em relação às atividades por ela desempenhadas, convenço-me que havia identidade de funções quanto às atividades realizadas pela reclamante e os modelos indicados, sem comprovação, por parte da reclamada, de distinção de ordem qualitativa ou quantitativa na prestação de serviços, ou qualquer outro óbice, ou mesmo o tempo de serviço na função superior a dois anos, não se justifica a diferenciação nos salários perpetrada pela reclamada. As diferenças salariais são evidentes: enquanto a reclamante recebia salário fixo de R$2.846,20, a partir de 07/2021, os paradigmas recebiam valores substancialmente maiores: Albertino (R$5.944,92), Marco Antônio (R$4.516,07) e Rodrigo (R$5.819,73). Ressalte-se, ainda, que, conforme alegado pela reclamante, a reclamada não possui quadro de carreira registrado no Ministério do Trabalho e Emprego, fato não contestado pela ré. Via de consequência, julgo procedente o pedido de equiparação salarial com os paradigmas Albertino Gonçalves de Souza Filho, Marco Antônio da Rocha e Rodrigo Meneguine, e condeno a reclamada ao pagamento de diferenças salariais, decorrentes da equiparação ora reconhecida, apuradas mês a mês sobre o salário fixo mensal percebido pela autora, ao longo de todo o período, no importe mensal de R$1.800,00, conforme apontado na inicial, observado o maior salário-base fixo auferido pelos paradigmas acima apontados, excluídas as parcelas de cunho personalíssimo recebidas pelos modelos. Em se tratando de salário, devidos os reflexos sobre as horas extras, férias vencidas e proporcionais + 1/3 Constitucional de Férias, 13º salário, aviso prévio, e, a partir das verbas acima postuladas mais reflexos, a incidência no FGTS mais multa de 40% sobre o FGTS. Indevidos, contudo, os reflexos em RSR’s, tendo em vista que a equiparação salarial é calculada sobre o salário mensal, no qual já estão incluídos os RSR’s. Por fim, cumpre observar que as diferenças salariais ora deferidas serão incorporadas ao salário da autora para todos os efeitos legais, inclusive para o cálculo das demais parcelas postuladas nesta ação, quando cabível. 9 – INDENIZAÇÃO PELA LOCAÇÃO/DEPRECIAÇÃO DO VEÍCULO PRÓPRIO A reclamante afirma que foi obrigada a usar seu veículo particular (Chevrolet/Onix) para trabalhar. Embora a empresa pagasse pelo quilômetro rodado, cobrindo parte do combustível, não ressarcia outros custos como manutenção, depreciação, aluguel, IPVA e seguro. Alega que a reclamada prometeu cobrir todas as despesas do veículo, mas pagou apenas o "km rodado". Por isso, solicita indenização mensal de R$800,00 durante todo o contrato de trabalho pela locação e depreciação do veículo usado para fins profissionais. A reclamada refuta a pretensão, aduzindo que o pagamento do km rodado seria suficiente para cobrir todas as despesas relacionadas ao veículo. Examino. Com efeito, incumbe ao empregador arcar com as despesas do empreendimento, o que engloba os custos pela utilização de veículo particular do trabalhador, quando utilizado como ferramenta de trabalho ou se constituir condição para o exercício das atividades laborais, consoante princípio da alteridade que rege a relação de emprego (art. 2º da CLT), sendo certo que os custos do empreendimento não podem ser transferidos para o empregado. No caso dos autos, restou comprovado que a reclamante, por exigência da ré, utilizava veículo próprio para o exercício das suas funções em prol da empregadora, ficando evidenciada apenas a restituição dos valores gastos pela obreira com o combustível. No aspecto, a testemunha da reclamante, Sr. Albertino Gonçalves, declarou que "o depoente sempre via a reclamante com carro próprio; que o veículo era indispensável para a realização das atividades; que quando o depoente usou o seu carro particular, a reclamada não lhe pagou nenhuma ajuda de custo; que a reclamada pagava a verba denominada 'km rodado', que se referia ao pagamento do km; que o valor do último Km rodado pelo depoente foi R$0,70 ou R$0,72; que era obrigatório o uso de veículo próprio; que houve um período em que a reclamada alugou um carro para o depoente rodar, quando o seu carro estragou; que não havia vendedor que trabalhava sem carro próprio." (ID 649d6f4 - f. 786) Corroborando essa afirmação, a testemunha da reclamada, Sr. Rodrigo Meneguine, também confirmou que "a reclamante utilizava veículo próprio para trabalhar; que atualmente a reclamada já deu veículo para todos os funcionários, de locadora; que o depoente não conhece nenhum vendedor que já tenha trabalhado sem veículo; que quando o depoente trabalhava com veículo próprio recebia por Km rodado; que fazia o relatório e era reembolsado pela reclamada." (f. 787) Destaco que a afirmação da testemunha da reclamada de que "atualmente a reclamada já deu veículo para todos os funcionários, de locadora" comprova que a utilização do veículo era essencial para a realização das atividades, tanto que a própria empresa passou a fornecê-lo posteriormente, reconhecendo tacitamente sua obrigação. No tocante ao pedido de pagamento de indenização pela locação/depreciação do veículo utilizado nas atividades laborais, além de a obrigatoriedade do uso do veículo próprio ter sido comprovada pelos depoimentos das testemunhas de ambas as partes, observa-se que a empresa pagava apenas a verba denominada "km rodado", referente ao reembolso do combustível, sem qualquer pagamento adicional para cobrir os demais custos relacionados ao veículo, como manutenção, depreciação, IPVA e seguro. Em face disso, entendo que a reclamada deve reembolsar a autora pelas despesas realizadas em seu proveito, uma vez que o risco do empreendimento deve ser suportado pela empresa e não pela empregada. Sendo assim, defiro o pedido de pagamento, de natureza indenizatória, do valor de R$300,00, por mês, durante todo o período contratual imprescrito, decorrente da utilização do veículo da reclamante no desempenho das suas atividades em prol da ré (aluguel, manutenção, depreciação, IPVA e seguro). 10 - INTEGRAÇÃO DA REMUNERAÇÃO VARIÁVEL A reclamante sustenta que, durante todo o contrato de trabalho, recebeu salário fixo mais comissões pelas vendas, sendo estas pagas sob a rubrica de "remuneração variável". Alega que, apesar de sua natureza contraprestativa e habitualidade, tais valores não foram integrados à base de cálculo para pagamento de férias acrescidas de 1/3, 13º salário, FGTS e verbas rescisórias no TRCT. Requer, assim, a integração desses valores à sua remuneração e o pagamento dos reflexos decorrentes. Em sua defesa, a reclamada argumenta que os valores da remuneração variável calculada sobre “metas bem definidas" e sempre integraram a remuneração da autora para todos os efeitos legais, conforme demonstrativos de pagamento juntados aos autos. Analiso. Conforme documentação apresentada, verifica-se que os contracheques (ID 6feec25) demonstram que a remuneração variável era efetivamente integrada à remuneração da reclamante para fins de cálculo do FGTS, em cumprimento ao artigo 15 da Lei 8036/90. Constata-se também o pagamento, em rubrica própria, do Repouso Semanal Remunerado sobre os valores da remuneração variável. Com relação às férias, é possível verificar que eram pagas considerando não apenas o salário base, mas também os "adicionais", o que indica a inclusão da remuneração variável nesse cálculo (contracheque de férias – f. 257, por exemplo), o que também se verifica com relação à gratificação natalina, paga sob os títulos "13. salário normal" e "13. salário adic" (f. 260, por exemplo). O mesmo procedimento foi adotado para o pagamento das gratificações natalinas e das verbas rescisórias, como se constata no TRCT (ID 392450a), onde consta o pagamento de "férias proporcionais adicionais" em campo separado. É importante ressaltar que a documentação dos autos demonstra que, além do salário base, a única verba salarial que a reclamante recebia de forma habitual era a remuneração variável e o correspondente repouso, não havendo registro de pagamento de horas extras, adicional noturno ou outras verbas de natureza salarial. Portanto, é razoável concluir que os "adicionais" considerados pela reclamada para fins de cálculo de férias, 13º salário e verbas rescisórias eram justamente a remuneração variável e seu respectivo repouso. Nem mesmo a prova pericial apontou erros nos reflexos da remuneração variável. (ID 40eaff7). Nesse contexto, caberia à reclamante demonstrar que os valores pagos pela reclamada a título de reflexo da remuneração variável nas verbas pleiteadas foram insuficientes, apresentando cálculos específicos ou apontando diferenças concretas. Trata-se de ônus probatório que lhe competia, nos termos do art. 818, I, da CLT, do qual não se desincumbiu satisfatoriamente, limitando-se a alegações genéricas sem demonstração matemática das diferenças que entende devidas. Diante do exposto, não tendo a reclamante comprovado que a reclamada deixou de considerar a remuneração variável para fins de pagamento de férias, 13º salário e verbas rescisórias, ou que o fez de forma incorreta, julgo improcedente o pedido de integração da remuneração variável e de pagamento dos reflexos postulados. 11 - COMISSÕES DE FEVEREIRO DE 2022 A reclamante alega que não recebeu as comissões referentes ao mês de fevereiro de 2022, requerendo seu pagamento no valor de R$700,00, mais os respectivos reflexos. A reclamada contesta essa alegação, afirmando que a remuneração variável de fevereiro de 2022 foi devidamente quitada no TRCT complementar. Examino. Analisando o laudo pericial apresentado nos autos, verifica-se que o perito, de fato, identificou que houve o pagamento da remuneração variável referente a fevereiro de 2022, conforme consta do laudo à fl. 719/720 (ID 40eaff7), onde o expert afirma: "Conforme Termo de Rescisão de Contrato de Trabalho Complementar anexo Fls. 296 (a6ebad0) tal remuneração variável é representado pelo campo com a denominação: Gratificações com código da rubrica 52.00, valor de R$645,76 (seiscentos e quarenta e cinco reais e setenta seis centavos)". O perito também confirmou que, durante o contrato de trabalho, as comissões eram pagas sob a rubrica "Remuneração Variável" (código 042), conforme demonstrado nos recibos de pagamento anexados aos autos. Embora a nomenclatura utilizada no TRCT complementar tenha sido diversa ("Gratificações" ao invés de "Remuneração Variável"), não há nos autos qualquer evidência de que a reclamante recebesse qualquer tipo de gratificação além da remuneração variável. Ademais, o pagamento foi realizado após o desligamento da autora, sendo plenamente razoável concluir que se trata justamente das comissões pendentes referentes ao último mês trabalhado. A reclamante não apresentou impugnação específica quanto a esse valor, nem demonstrou que o montante pago era inferior ao efetivamente devido, ônus que lhe competia. Assim, julgo improcedente o pedido de pagamento das comissões referentes ao mês de fevereiro de 2022. 12 - JUSTIÇA GRATUITA Considerando a declaração de hipossuficiência financeira apresentada na inicial, a qual possui presunção de veracidade (art. 99, § 3º, do CPC), bem como os termos do art. 790, §3º, da CLT e à míngua de prova em sentido contrário nos autos, defiro os benefícios da Justiça Gratuita à parte reclamante, valendo assinalar que a reclamada não tem interesse jurídico em impugnar o requerimento autoral. 13 - HONORÁRIOS PERICIAIS Em face das disposições previstas no artigo 790-B da CLT, os honorários periciais relativos à perícia contábil, ora arbitrados em R$ 1.500,00, ficarão a cargo da reclamada, por sucumbente no objeto da perícia realizada. Os honorários periciais ora arbitrados deverão ser corrigidos a partir da data desta sentença, nos moldes da Orientação Jurisprudencial nº 198 da SDI-I do TST. 14 - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Ante o resultado da demanda, nos termos do art. 791-A da CLT, condeno a parte reclamada a pagar aos advogados da reclamante, honorários de sucumbência, no percentual de 10% (dez por cento) do efetivo proveito econômico da execução, assim compreendidos os créditos líquidos regularmente apurados em liquidação de sentença. E, tendo em vista a sucumbência parcial da parte autora, diante dos pedidos rejeitados, observados os critérios dos parágrafos 2º e 3º do artigo 791-A, da CLT, condeno a reclamante a pagar à advogada da reclamada, honorários de sucumbência no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído aos pedidos em que foi integralmente sucumbente. Contudo, diante da justiça gratuita concedida à parte reclamante e da decisão proferida pelo STF na ADI nº 5766, especialmente em sede dos Embargos de Declaração, no tocante ao disposto no art. 791-A, parágrafo 4º da CLT, não há que se falar em descontar dos créditos da parte reclamante os honorários advocatícios do patrono da reclamada, de modo que o valor dos honorários devidos pela parte autora ficam sob condição suspensiva de exigibilidade (art. 791-A, § 4º, da CLT). Neste norte, esclareço que, quanto à condenação da autora ao pagamento da verba honorária sucumbencial, como cediço, em 20/10/2021, o Pleno do STF proferiu o julgamento da ADI 5766 para "declarar inconstitucionais os arts. 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)". Conquanto, num primeiro momento, a interpretação do extrato decisório tenha sido no sentido de declaração de inconstitucionalidade integral do referido art. 791-A, §4º, da CLT, a questão foi devidamente esclarecida no julgamento dos Embargos de Declaração, proferido em 21/06/2022, oportunidade em que se confirmou o alcance da declaração de inconstitucionalidade de apenas trecho do aludido preceito legal, in verbis: "[...] Veja-se que, em relação aos arts. 790-B, caput e § 4o, e 791-A, § 4o, da CLT, parcela da Ação Direta em relação a qual a compreensão majoritária da CORTE foi pela PROCEDÊNCIA, há perfeita congruência com o pedido formulado pelo Procurador-Geral da República (doc. 1, pág. 71- 72), assim redigido: Requer que, ao final, seja julgado procedente o pedido, para declarar inconstitucionalidade das seguintes normas, todas introduzidas pela Lei 13.467, de 13 de julho de 2017: a) da expressão "ainda que beneficiária da justiça gratuita", do caput, e do § 4o do art. 790-B da CLT; b) da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa," do §4o do art. 791-A da CLT; c) da expressão "ainda que beneficiário da justiça gratuita," do § 2º do art. 844 da CLT. Assim, seria estranho ao objeto do julgamento tratar a constitucionalidade do texto restante do caput do art. 790-B e do § 4o do art. 791-A, da CLT. Mesmo os Ministros que votaram pela procedência total do pedido - Ministros EDSON FACHIN, RICARDO LEWANDOWSKI e ROSA WEBER - declararam a inconstitucionalidade desses dispositivos na mesma extensão que consta da conclusão do acórdão." Denota-se, portanto, que não foi declarada a inconstitucionalidade da condenação da parte beneficiária da justiça gratuita ao pagamento da verba honorária, mas apenas foi declarada a inconstitucionalidade da presunção de perda da condição de vulnerabilidade econômica em função, simplesmente, da apuração de créditos em favor do trabalhador oriundos deste ou de outro processo, devendo, pois, a parte contrária comprovar que não mais subsiste a condição de hipossuficiência econômica da parte trabalhadora, no prazo a que alude o §4º do art. 791-A da CLT. A decisão proferida pela Suprema Corte transitou em julgado aos 04/08/2022. Sendo assim, revendo entendimento anteriormente adotado, em situações de sucumbência total ou parcial da parte reclamante, em atenção à decisão proferida na ADI 5766, especialmente em sede dos Embargos de Declaração, adoto o entendimento que determina a suspensão da exigibilidade do pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais devidos pela parte autora, beneficiária da justiça gratuita, e não a sua isenção, observado o prazo de 2 (dois) anos, após o que será extinta a obrigação, nos termos do §4º do art. 791-A da CLT. A correção dos honorários acima arbitrados dar-se-á segundo índices dos créditos trabalhistas, sem incidência de juros de mora e a dedução dos descontos fiscais e previdenciários (OJ nº 348 da SBDI-I do TST e Tese Jurídica Prevalecente nº 04 deste Egrégio Tribunal). 15 – COMPENSAÇÃO E DEDUÇÃO Arguida oportunamente (Súmula 48/TST e art. 767, da CLT), defere-se o pedido de compensação/dedução de eventuais verbas quitadas a idêntico título e motivo, desde que comprovadas nos autos. 16 - JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA A Lei 14.905/2024, com vigência a partir de 31/08/2024, promoveu alterações nos artigos 389, parágrafo único, e 406, §1°, do Código Civil, tendo ratificado o IPCA como índice geral de correção monetária e alterado os critérios de aplicação de juros, que passam a corresponder à taxa SELIC com a dedução do IPCA, observada a taxa zero na hipótese de o resultado dessa dedução ser negativo. Dessa forma, em conformidade com as decisões proferidas pelo C. STF e pelo C. TST, bem como as alterações promovidas pela hodierna Lei 14.905/2024, determino a incidência de IPCA-E e de juros legais na fase pré-judicial (art. 39, caput, Lei 8.177/91). A partir do ajuizamento da ação, determino a atualização monetária pelo IPCA-E e os juros de mora correspondentes à taxa SELIC com a dedução do IPCA-E, observada a taxa zero na hipótese de o resultado dessa dedução ser negativo. 17 - DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS Os descontos previdenciários serão apurados nos termos da Lei nº 8.212/91, devendo processar-se o seu recolhimento no prazo legal, sob pena de execução, conforme Emenda Constitucional nº 20/98. Deverá também ser comprovado, nos autos, o recolhimento do IRRF acaso devido. Oportuno esclarecer que, nos exatos termos da Súmula 368, II, do TST, embora a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições social e fiscais relativas às verbas remuneratórias seja do empregador, o inadimplemento das verbas remuneratórias não exime a responsabilidade do empregado pelos pagamentos do imposto de renda devido e contribuição previdenciária relativa à sua cota-parte. III – DISPOSITIVO Por todo o exposto, na reclamação trabalhista ajuizada por KENIA ASSUNCAO CRUZ DA SILVA em face de CAMIL ALIMENTOS S/A, decido: I – REJEITAR as preliminares; II - PRONUNCIAR a prescrição do direito da reclamante a créditos anteriores a 14/07/2018, extinguindo-se o processo, com resolução de mérito, em relação aos pedidos abrangidos pela prescrição quinquenal (art. 487, II, do CPC c/c art. 769, da CLT), e III - JULGAR PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados para condenar a reclamada a pagar à reclamante, nos termos da fundamentação: - horas extras, assim consideradas aquelas laboradas após a 8ª hora diária e 44ª hora semanal, não cumulativas, acrescidos do adicional convencional ou, na sua falta, de 50%, com os reflexos em RSR e, separadamente, na forma da OJ 394 da SDI-1 do TST, em 13º salários, férias + 1/3, aviso prévio indenizado e FGTS + 40%; - domingos trabalhados nos eventos anuais, em dobro, por todo o pacto laboral, com reflexos em 13º salários, férias + 1/3, aviso prévio indenizado e FGTS + 40%; - diferenças de férias + 1/3, 13º salários, aviso prévio e FGTS + 40% (cujo depósito deve ser feito na conta vinculada - tese vinculante do TST no Tema 68 de IRR), em razão da integração da correção monetária das comissões pagas à remuneração para fins de cálculo de tais parcelas, nos termos da OJ 181 da SDI-1 do TST; - diferenças de comissão no valor de R$500,00 mensais, por todo o pacto laboral, com a integração e recomposição da remuneração obreira, recompondo os vencimentos da autora para apuração das parcelas requeridas, e reflexos no RSR, e com estes, em férias + 1/3 constitucional de férias, 13º salário, aviso prévio e FGTS mais multa de 40%; - adicional do artigo 8º da Lei n. 3.207/57 (1/10 da remuneração), durante todo o pacto laboral, com reflexos em repouso semanal remunerado, férias + 1/3, 13º salários, aviso prévio, e, a partir das verbas acima postuladas mais os reflexos, a incidência no FGTS mais multa de 40% sobre o FGTS, com a observância da Súmula 264/TST; - diferenças salariais, decorrentes da equiparação ora reconhecida, apuradas mês a mês sobre o salário fixo mensal percebido pela autora, ao longo de todo o período, no importe mensal de R$1.800,00, conforme apontado na inicial, observado o maior salário-base fixo auferido pelos paradigmas acima apontados, excluídas as parcelas de cunho personalíssimo recebidas pelos modelos, com os reflexos sobre as horas extras, férias vencidas e proporcionais + 1/3 Constitucional de Férias, 13º salário, aviso prévio, e, a partir das verbas acima postuladas mais reflexos, a incidência no FGTS mais multa de 40% sobre o FGTS; - R$300,00, por mês, durante todo o período contratual imprescrito, decorrente da utilização do veículo da reclamante no desempenho das suas atividades em prol da ré (aluguel, manutenção, depreciação, IPVA e seguro). As diferenças do FGTS + 40% deverão ser depositadas na conta vinculada da obreira. O pagamento de horas extras deve observar a Súmula 340 do C. TST. Desse modo, sobre o salário fixo recebido, as horas extras deferidas serão pagas acrescidas do adicional de horas extras, observando-se o divisor 220. Em relação à parte variável da remuneração, será devido apenas o adicional sobre as horas extras deferidas, observando-se o divisor correspondente ao número total de horas efetivamente laboradas (OJ 397 da SDI-1 do TST). Defiro os benefícios da Justiça Gratuita à reclamante. Honorários periciais relativos à perícia contábil, ora arbitrados em R$ 1.500,00, ficarão a cargo da reclamada, por sucumbente no objeto da perícia realizada. Honorários de sucumbência pela reclamada aos advogados da reclamante, no percentual de 10% (dez por cento) do efetivo proveito econômico da execução, assim compreendidos os créditos líquidos regularmente apurados em liquidação de sentença. Honorários de sucumbência pela reclamante à advogada da reclamada, contudo, diante da justiça gratuita concedida ao autor e da decisão proferida pelo STF na ADI nº 5766, não há que se falar em descontar dos créditos da reclamante os honorários advocatícios do patrono da reclamada, de modo que o valor dos honorários devidos pela parte autora ficam sob condição suspensiva de exigibilidade (art. 791-A, § 4º, da CLT). Juros e correção monetária, na forma da fundamentação. Os descontos previdenciários serão apurados nos termos da Lei nº 8.212/91, devendo processar-se o seu recolhimento no prazo legal sobre todas as parcelas de natureza salarial ora deferidas, exceto as de cunho indenizatório, sob pena de execução, conforme Emenda Constitucional nº 20/98. Natureza salarial das parcelas previstas no art. 28, caput, sendo indenizatórias exclusivamente as constantes do art. 28, §9º, da Lei 8.212/91. A fundamentação é parte integrante deste dispositivo. Custas, pela parte reclamada, no importe de R$1.600,00, calculadas sobre R$80.000,00, valor que se atribui à condenação. Ficam as partes advertidas das disposições contidas nos artigos 80, 81 e 1.026 e parágrafos, do CPC, ficando cientes de que os embargos de declaração não se prestam à manifestação de inconformismo com a sentença, cabendo a sua interposição apenas e tão somente nos estreitos limites previstos nos artigos 1.022 do CPC e 897-A da CLT. E será considerado ato protelatório a interposição de embargos prequestionadores, ante o amplo caráter devolutivo do Recurso Ordinário, nos termos do artigo 1.013 do CPC e da Súmula 393/TST. Intimem-se as partes. CONTAGEM/MG, 20 de maio de 2025. THAISA SANTANA SOUZA SCHNEIDER Juíza Titular de Vara do Trabalho
Intimado(s) / Citado(s)
- KENIA ASSUNCAO CRUZ DA SILVA
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