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Processo nº 1015614-74.2025.8.11.0000

ID: 333535430

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO REGIMENTAL CíVEL Nº Processo: 1015614-74.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CARLOS ALBERTO VON HEIMBURG

Acórdão

Advogados:

LEO NUNES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1015614-74.2025.8.11.0000 CLASSE: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) ASSUNTO: [MÚTUO] RELATOR: DES. SEBASTIAO DE ARRUD… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1015614-74.2025.8.11.0000 CLASSE: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) ASSUNTO: [MÚTUO] RELATOR: DES. SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [IGOR GIRALDI FARIA - CPF: 841.693.111-91 (ADVOGADO), ISOLDI CESTARI - CPF: 656.493.899-34 (AGRAVANTE), CARLOS ALBERTO VON HEIMBURG - CPF: 203.267.262-68 (AGRAVADO), LEO NUNES - CPF: 507.902.189-68 (ADVOGADO), JUNIOR CEZAR ANTON - CPF: 327.763.731-04 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. AGRAVO DE INSTRUMENTO MADURO PARA JULGAMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. NECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO EM AUTOS APARTADOS. FORMALIDADE ESSENCIAL. PREVISÃO LEGAL. GARANTIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o processamento do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica nos próprios autos da execução, determinando sua instauração em autos apartados, conforme previsto nos arts. 133 e seguintes do CPC/2015. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se o incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica pode ser processado nos autos principais da execução ou se é obrigatória sua instauração em autos apartados, conforme as normas processuais vigentes. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A legislação processual civil impõe a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica em autos apartados, salvo quando o pedido for formulado na petição inicial, conforme art. 134, § 2º, do CPC. 4. A formal instauração do incidente é medida que assegura o contraditório e a ampla defesa à pessoa física ou jurídica atingida, sendo condição essencial para a validade do redirecionamento da execução a terceiros. 5. A ausência de pedido na petição inicial torna imperativa a observância do procedimento incidental, não se tratando de mero rigorismo formal. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso de agravo de instrumento desprovido. Agravo interno prejudicado. Tese de julgamento: "É obrigatória a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica em autos apartados, salvo quando o pedido for formulado na petição inicial, nos termos do art. 134, § 2º, do CPC, como forma de assegurar o contraditório e a ampla defesa da parte atingida." Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 133 a 137 e 134, § 2º; CC, art. 50. Jurisprudência relevante citada: TJMT, AI 1008321-24.2023.8.11.0000, Rel. Des. Antônia Siqueira Gonçalves, j. 14.06.2023; TJMT, AI 1008999-10.2022.8.11.0000, Rel. Des. Sebastião de Moraes Filho, j. 20.07.2022. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA (RELATOR): Egrégia Câmara: Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO interposto por ISOLDI CESTARI, contra decisão interlocutória proferida (ID. 193308308 – autos de origem PJE Nº 0003601-03.2012.8.11.0037) pelo Juízo da 3ª Vara Cível de Primavera do Leste-MT, que determinou a instauração do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica em autos apartados, nos seguintes termos: “Requer a exequente o reconhecimento da desconsideração inversa da personalidade jurídica, com o objetivo de alcançar os bens da empresa Milhomax Comercial Ltda., na qual o executado figura como sócio administrador (id 182762493). No entanto, é cediço que a providência requer a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica em autos apartados, não sendo suficiente mero pedido incidental nos próprios autos do processo, conforme dispõe o art. 133 e seguintes do Código de Processo Civil. Assim, indefiro o pedido formulado pelo exequente, em razão da necessidade de instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica em autos apartados. Por outro lado, compulsando os autos, verifica-se que já foram realizadas diversas diligências na tentativa de compelir a parte executada a promover o pagamento do débito, mas nenhuma delas se mostrou êxitos. Nesse contexto, destaque-se que a repetição de pesquisas só merece deferimento na hipótese da indicação de motivos concretos que evidenciem alteração da situação econômica da parte executada para efeito de nova diligência, o que não é o caso dos autos. Inclusive, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. REITERAÇÃO DO PEDIDO DE DILIGÊNCIA VIA BACENJUD. AUSÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO ECONÔMICA DO DEVEDOR. MOTIVAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DO STJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O eg. Tribunal de Justiça indeferiu o pedido da agravante, sob o fundamento, entre outros, de que não "(...) se vislumbra a razoabilidade da realização de nova diligência pelo sistema BACENJUD, porquanto, tendo sido infrutífera a última pesquisa realizada no mencionado sistema - juntamente com todas as outras diligências realizadas com auxílio do Juízo -, não foi carreada ao instrumento qualquer demonstração acerca de eventual modificação na situação econômica da Executada". A pretensão de modificar tal entendimento, considerando as circunstâncias do caso concreto, demandaria o reexame de matéria fático-probatória, o que é inviável em sede de recurso especial, consoante preconiza a Súmula 7/STJ. 2. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a reiteração ao Juízo das diligências relacionadas à localização de bens do executado depende de motivação do exequente, devendo-se observar, também, o princípio da razoabilidade. 3. Estando o v. acórdão recorrido em consonância com a jurisprudência desta eg. Corte, o apelo nobre encontra óbice na Súmula 83/STJ. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.807.798/DF, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 27/8/2019, DJe de 11/9/2019.) Assim, uma vez realizadas diligências por meio dos sistemas com os quais a justiça possui convênios, por mais de uma vez e em diferentes períodos de tempo, entendo suprido o dever de cooperação do juízo, devendo, a partir de então, o credor/exequente apresentar bens passíveis de penhora ou justificar, de forma fundamentada e mediante apresentação de novos elementos, a necessidade de renovação da pesquisa. Assim sendo, considerando que já houve a efetiva cooperação judicial na tentativa de auxiliar a parte na localização de bens e valores do executado, sem que tenha havido efetividade para o processo, e levando-se em consideração que o exequente não demonstrou, de forma concreta, a existência de indícios de modificação na situação financeira do(s) executado(s), permitindo supor que novas diligências serão exitosas, não se vê razoabilidade na sua renovação. Desse modo, por retratar típico caso de execução frustrada, com fundamento no art. 921, inciso III, e § 1º, do CPC, SUSPENDO o processo pelo prazo de 1 (um) ano, decorrido o qual sem que tenha o exequente indicado bens penhoráveis, independentemente de nova conclusão, com fundamento no § 2º do mencionado artigo, certifique-se e remetam-se os autos ao arquivo pelo prazo de 03 (três) anos. Expirado este prazo, as partes deverão ser intimadas para, em 15 (quinze) dias, se manifestar sobre a prescrição, com posterior conclusão. Caso o exequente localize patrimônio, bastará apresentar o necessário requerimento, devidamente instruído com a documentação correspondente. No ponto, destaco, desde já, que novos pedidos de pesquisa de bens ou valores são incapazes de reavivar a presente execução se não houver a indicação expressa da alteração da situação financeira do executado, devendo a Secretaria Judicial certificar a inexistência e retornar ao arquivo, independente de nova determinação.” Em suas razões recursais, fundamenta o recurso nas seguintes teses fático-jurídicas, quais sejam: 1. Sustenta que a medida determinada pelo juízo a quo afronta entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, segundo o qual o incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode tramitar nos próprios autos da execução. 2. Alega que a decisão agravada viola os princípios da celeridade, economia e efetividade processual, uma vez que a instauração do incidente em autos apartados acarreta delongas indevidas à satisfação do crédito. Por esse motivo, requer o processamento do incidente nos próprios autos da execução. Diante disso, requer, no mérito, o conhecimento e o provimento do recurso, a fim de reformar a decisão agravada e determinar que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica tramite nos autos principais da execução. Devidamente intimado, o agravado não ofertou contrarrazões. (ID. 287506380). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA (RELATOR): Egrégia Câmara: Inicialmente, verifico a presença dos requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal. Conforme relatado, trata-se de Agravo De Instrumento com Pedido de Efeito Suspensivo interposto por Isoldi Cestari, contra decisão interlocutória proferida (ID. 193308308 – autos de origem PJE Nº 0003601-03.2012.8.11.0037) pelo Juízo da 3ª Vara Cível de Primavera do Leste-MT, que determinou a instauração do incidente de desconsideração inversa da personalidade jurídica em autos apartados. De início, ressalto que o agravo de instrumento, por se tratar de recurso secundum eventum litis, limita-se ao exame do acerto ou desacerto da decisão impugnada, cabendo ao Tribunal aferir, exclusivamente, se o ato judicial recorrido padece de ilegalidade ou abusividade, sendo vedada a análise de questões estranhas ao que foi decidido na origem. Saliento, que não se pode olvidar que em matéria de agravo de instrumento a análise é restrita ao acerto, ou desacerto, do ato recorrido, sob pena de caracterizar supressão de instância, isso sem descurar do caráter de cognição não exauriente que impera nesta fase processual. A decisão agravada indeferiu o pedido de instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, nos autos da ação executiva, com base na seguinte fundamentação: “[...] Vistos. Requer a exequente o reconhecimento da desconsideração inversa da personalidade jurídica, com o objetivo de alcançar os bens da empresa Milhomax Comercial Ltda., na qual o executado figura como sócio administrador (id 182762493). No entanto, é cediço que a providência requer a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica em autos apartados, não sendo suficiente mero pedido incidental nos próprios autos do processo, conforme dispõe o art. 133 e seguintes do Código de Processo Civil. Assim, indefiro o pedido formulado pelo exequente, em razão da necessidade de instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica em autos apartados.” (g.n.) 1. Mérito A insurgência da parte agravante cinge-se à alegação de que o processamento do incidente em autos próprios configuraria excesso de formalismo, atentando contra os princípios da celeridade e economia processual, uma vez que a matéria poderia, a seu ver, ser apreciada nos próprios autos principais. A decisão agravada, entretanto, a meu sentir, encontra-se em perfeita consonância com a normatividade processual vigente, razão pela qual passo à sua análise, pontuando os fundamentos jurídicos que, a meu ver, impõem a sua manutenção. Pois bem. O Código de Processo Civil de 2015, ao inovar o ordenamento jurídico com a positivação do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), o fez mediante detalhado regramento, estabelecendo etapas, pressupostos e formalidades processuais próprias. De modo expresso, o art. 134, §2º, do CPC dispõe: Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial. [...] § 2º Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica. A dicção legal é clara ao restringir a dispensa do incidente à única hipótese em que o pedido de desconsideração for formulado já na petição inicial. Fora dessa hipótese — como no presente caso, em que o pedido foi feito no curso do processo de execução —, a instauração formal do incidente é imperiosa, nos moldes dos §§1º e 2º do artigo mencionado, garantindo-se ao terceiro interessado o regular exercício do contraditório e da ampla defesa. A desconsideração da personalidade jurídica é medida excepcional, a exigir, nos termos do art. 50 do CC, a comprovação do “abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial.”. Sabe-se que para o reconhecimento da responsabilidade patrimonial de pessoa física ou jurídica que não integrou a relação processual, faz-se necessária a prévia instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, regulado nos artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil, com ampla dilação probatória e sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Isso porque, a adoção de entendimento em sentido diverso, implicaria admitir, de imediato, a inclusão no polo passivo de pessoa estranha à lide, sem oportunizar minuciosa instrução processual. Sobre o tema, oportuno trazer as lições de Humberto Theodoro Júnior: “Na hipótese de a desconsideração da personalidade jurídica ser requerida nos autos da execução ou durante o cumprimento de sentença, mesmo quando a formulação do pedido ser der na própria petição inicial ou no requerimento do cumprimento de sentença, será sempre obrigatória a observância do incidente regulado pelos arts. 134 a 136. É que o procedimento executivo, em sua forma pura, não tem sentença para resolver sobre a responsabilidade nova (a do sócio ou da pessoa jurídica não devedores originariamente) e, sem tal decisão, faltará título executivo para sustentar o redirecionamento da execução. Somente, portanto, por meio do procedimento incidental em tela é que, cumprido o contraditório, se chegará a um título capaz de justificar o redirecionamento. Cabe, pois, ao incidente a função de constituir o título legitimador da execução contra aqueles a que se imputa a responsabilidade patrimonial pela obrigação contraída em nome de outrem.” (In Curso de Direito Processual Civil Teoria Geral do Direito Processual Civil - Processo de Conhecimento Procedimento Comum, vol. I, 56ª ed., Forense, 2016, RJ, p. 400). Colhe-se, nesse sentido, recente julgado E. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (TJMT): AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – PLEITO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NÃO DEDUZIDO NA INICIAL EXECUTIVA – NECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO EM APARTADO – GARANTIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Consoante a inteligência do artigo 134, § 2º, do Código de Processo Civil, a desconsideração da personalidade jurídica prescinde da instauração do incidente próprio quando requerida na petição inicial, ou seja, quando integra o objeto da demanda, situação não verificada no presente caso. (TJ-MT - AI: 10083212420238110000, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 14/06/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 20/06/2023) (g.n.) AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL – DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE EM AUTOS APARTADOS – NECESSIDADE - OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 133, 134 E 795, § 4º, do CPC – DECISÃO MANTIDA - AGRAVO DESPROVIDO. Tratando-se de medida excepcional, a desconsideração da personalidade jurídica deve ser reconhecida apenas quando preenchidos os requisitos legais, viabilizando o redirecionamento da execução contra terceiros. É necessária a instauração de incidente em autos apartados para apreciar o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, conforme preceituam os artigos 133, 134 e 795, § 4º, do CPC, com o pagamento das respectivas custas e despesas processuais, como forma de maximização dos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal. Nesse passo, os indícios suscitados pelo recorrente de que pode ter havido o abuso de personalidade não justificam a dispensa da instauração em apartado do incidente, porquanto deve ser franqueado às pessoas físicas para quem se pretende redirecionar a execução a prerrogativa de produzir as contraprovas que reputem necessárias para comprovar a lisura no seu proceder, aí incluída prova testemunhal, documental e todas as que se mostrem relevantes para o desfecho da controvérsia.(TJ-MT 10089991020218110000 MT, Relator.: SEBASTIAO DE MORAES FILHO, Data de Julgamento: 20/07/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/07/2022) (g.n.) Dessa forma, é imperioso concluir que a pretensão do agravado, reclama a instauração de incidente próprio, nos moldes da legislação. Ademais, a medida excepcional não pode ser deferida com base no tempo de tramitação e dificuldade de impulsionar o feito. Isso porque, a desconsideração da personalidade jurídica, é instrumento de repressão de atos fraudulentos, segundo o STJ “se trata de medida excepcional, que somente pode ser decretada após a análise, no caso concreto, da existência de vícios que configurem abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial.” (STJ, Resp 846.331). Nesta toada, destaca-se que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica é um instituto concebido para combater eventual violação à lei ou contrato, fraude ou abuso perpetrado pelos sócios ou administradores, que para tanto valem-se da sociedade empresária. Tal posicionamento reafirma que não se trata de preciosismo formal, mas sim de mecanismo processual estruturado para garantir a segurança jurídica, equilíbrio procedimental e justiça no atingimento patrimonial de terceiros. Dessa maneira, atento às especificidades da situação fática e aos documentos anexados aos autos principais, não vislumbro a plausibilidade do direito invocado, a qual se mostra insuficiente para ensejar a reforma da decisão agravada. 2. Da prejudicialidade do Agravo Interno Conforme consta nos autos, foi interposto agravo interno pela parte Isoldi Cestari, insurgindo-se contra a decisão monocrática proferida por este Relator, que, à época, indeferiu o empréstimo do efeito suspensivo requerido no agravo de instrumento. Anoto que, no caso, a apreciação do agravo interno antes do agravo de instrumento caminha em desencontro aos princípios da efetividade e da razoável duração do processo, a interposição de agravo interno perde sua utilidade prática e jurídica quando a controvérsia objeto do recurso for apreciada pelo colegiado, mediante julgamento do próprio agravo de instrumento. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AGRAVO INTERNO. ARRENDAMENTO RURAL. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. ABANDONO PARCIAL DA ÁREA CULTIVÁVEL. TUTELA DE URGÊNCIA. DESPEJO LIMINAR PARCIALMENTE DEFERIDO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. I. CASO EM EXAME Agravo de Instrumento interposto contra decisão da 2ª Vara Cível da Comarca de Canarana/MT que, em ação de rescisão de contrato de arrendamento rural c/c despejo liminar c/c cobrança de aluguel, multa e perdas e danos, indeferiu o pedido de tutela de urgência para despejo liminar da área arrendada. Os agravantes alegam inadimplemento contratual e abandono da área, requerendo a reforma da decisão para concessão da tutela de urgência. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) verificar se estão presentes os requisitos legais para concessão da tutela de urgência visando ao despejo liminar por descumprimento contratual; (ii) definir se o pedido de penhora imediata dos bens móveis e plantações remanescentes pode ser deferido em sede recursal. III. RAZÕES DE DECIDIR A concessão da tutela de urgência exige a presença simultânea da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do art. 300 do CPC. Restou comprovada a existência de relação contratual vigente, bem como o descumprimento de cláusulas essenciais, como o abandono de mais de 88% da área agricultável, ausência de correção do solo, não emissão de CPR e uso indevido das instalações da propriedade. Laudo técnico, ata notarial e depoimentos testemunhais indicam negligência na condução da lavoura, com degradação da terra, uso do curral para criação de porcos, presença de animais soltos e sinais de abandono agronômico. O contrato prevê expressamente, em sua cláusula 10.1, alínea “g”, que o abandono parcial ou total da área cultivável constitui motivo para rescisão, nos termos do art. 32, incisos IV, V, VI e IX, do Decreto nº 59.566/66. Demonstrado o perigo de dano decorrente da degradação progressiva da área arrendada, inadimplemento contratual e risco de frustração da entrega futura de produto pactuado. A penhora dos bens móveis e das plantações foi indeferida por demandar dilação probatória, sendo matéria própria para a instrução da ação principal. O julgamento do agravo interno interposto pelo agravado restou prejudicado diante da perda superveniente de objeto, em razão da apreciação do mérito do agravo de instrumento. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: A constatação de descumprimento contratual grave no arrendamento rural, especialmente o abandono parcial da área e ausência de cumprimento de cláusulas essenciais, autoriza o despejo liminar com base no art. 300 do CPC e no art. 32 do Decreto nº 59.566/66. A concessão parcial de tutela de urgência justifica-se diante da verossimilhança das alegações, risco de dano irreparável à gleba e evidências de inadimplemento contratual continuado. A penhora de bens móveis e lavouras remanescentes demanda dilação probatória e deve ser analisada no curso da ação principal. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 300; Decreto-Lei nº 59.566/66, art. 32, incisos IV, V, VI e IX; CF/1988, art. 186. Jurisprudência relevante citada: TJMT, 1007232-34.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 29/09/2021, Publicado no DJE 04/10/2021. TJMT, 1019390-19.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 23/10/2024, Publicado no DJE 28/10/2024. (N.U 1004830-38.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 01/04/2025) (g.n.) Desse modo, em razão dos autos já estarem instruídos com elementos autorizadores do julgamento do mérito do agravo de instrumento, no qual, como se verificou alhures, foi objeto de deliberação pelo colegiado, declaro prejudicado o agravo interno interposto pela agravante Isoldi Cestari. CONCLUSÃO Com essas considerações, declaro prejudicado o Agravo Interno interposto por ISOLDI CESTARI e, ao mesmo tempo, conheço do recurso de Agravo de Instrumento interposto e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo inalterados os termos da decisão agravada. Por se tratar de recurso contra decisão interlocutória sem prévia fixação de honorários em primeira instância, deixo de condenar a parte agravante ao pagamento das verbas sucumbenciais. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO (1º VOGAL): Acompanho o voto proferido pelo Relator. Faço, porém, um adendo a essa questão. Estava decidindo de modo diverso, reconhecendo que a exigência do incidente de desconsideração da personalidade jurídica seria dispensável por excesso de formalismo. Todavia, analisando o voto de Vossa Excelência e relembrando como eu decidia em primeiro grau — já que, ao chegar aqui, essa era a jurisprudência predominante — acredito que há espaço para que evoluamos nesse entendimento. Trago à discussão o parágrafo segundo do artigo 1228 da Consolidação das Normas da Corregedoria-Geral da Justiça, que estabelece a necessidade de suspensão do processo e formação de incidentes em autos apartados, com recolhimento das custas devidas, quando há instauração de incidente. Ademais, o artigo 795, §4º, do CPC, determina que, para a desconsideração da personalidade jurídica, é obrigatória a observância do incidente previsto no próprio CPC. E o artigo 134 do CPC estabelece que, uma vez instaurado o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, é preciso comunicar o distribuidor para a devida anotação. Essa necessidade nos leva à conclusão de que, mesmo sem processos físicos, exige-se um procedimento autônomo, um incidente autônomo, exatamente como Vossa Excelência está propondo. Então, acompanho o voto proferido pelo douto Relator. Faço a ressalva apenas ao meu entendimento anterior, pois amanhã ou depois alguém pode argumentar que já decidi de outra forma. De fato, já o fiz, mas, a partir de agora, aderirei ao entendimento de Vossa Excelência. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (2º VOGAL): Acompanho o voto do Relator. Data da Sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1011943-43.2025.8.11.0000

ID: 324801554

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1011943-43.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

JOSE BRITO DE SOUZA JUNIOR

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JHONATTAN DIEGO VIDAL GRIEBEL ELY

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UEBER ROBERTO DE CARVALHO

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ANA PAULA DALMAS RODRIGUES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011943-43.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Honorá… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011943-43.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Honorários Advocatícios, Penhora / Depósito/ Avaliação, Inexequibilidade do Título / Inexigibilidade da Obrigação] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [JHONATTAN DIEGO VIDAL GRIEBEL ELY - CPF: 050.325.931-41 (ADVOGADO), JOSE BRITO DE SOUZA JUNIOR - CPF: 088.808.755-15 (AGRAVANTE), VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO - CPF: 420.083.361-15 (AGRAVADO), IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO - CPF: 044.720.101-86 (AGRAVADO), EDSON FERREIRA FREITAS - CPF: 096.000.368-10 (AGRAVADO), UEBER ROBERTO DE CARVALHO - CPF: 459.437.371-20 (ADVOGADO), EDSON FERREIRA FREITAS - CPF: 096.000.368-10 (ADVOGADO), IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO - CPF: 044.720.101-86 (ADVOGADO), VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO - CPF: 420.083.361-15 (ADVOGADO), AGROPECUARIA NOVO MILENIO LTDA - CNPJ: 04.165.520/0001-05 (TERCEIRO INTERESSADO), ELIAS MENDES LEAL FILHO - CPF: 354.096.061-91 (TERCEIRO INTERESSADO), ANA PAULA DALMAS RODRIGUES - CPF: 018.377.361-62 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO – PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL INDEFERIDO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – REJEIÇÃO DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – ALEGAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO POR VÍCIO TRANSRESCISÓRIO RECONHECIDO EM AÇÃO DIVERSA – AUSÊNCIA DE CONTAMINAÇÃO AUTOMÁTICA DO TÍTULO EXEQUENDO – NECESSIDADE DE AÇÃO DESCONSTITUTIVA PRÓPRIA – IMÓVEL RURAL – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA O RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE – ÔNUS DO DEVEDOR – ART. 833, VIII, DO CPC E ART. 5º, XXVI, DA CF – GRATUIDADE DE JUSTIÇA – RECOLHIMENTO VOLUNTÁRIO DAS CUSTAS – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Não há previsão legal para sustentação oral em recursos como o presente, por não se tratar de decisão que versa sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência (cf. art. 93, § 13, do RI-TJMT). A nulidade reconhecida em ação diversa, relativa a título executivo estranho ao cumprimento de sentença em curso, não torna automaticamente inexigível o título objeto da presente execução, sendo necessária a propositura de ação desconstitutiva própria, conforme dispõe o artigo 502 do CPC. A impenhorabilidade da pequena propriedade rural, prevista no artigo 833, VIII, do CPC e no artigo 5º, XXVI, da CF, exige a comprovação cumulativa de que o imóvel se enquadra como pequena propriedade nos termos da lei e é efetivamente explorado pela família para subsistência, ônus do qual o agravante não se desincumbiu. A ausência de prova robusta de hipossuficiência e o recolhimento voluntário das custas processuais, após intimação para comprovação do direito à gratuidade de justiça, afastam a alegação de insuficiência de recursos. Agravo de instrumento desprovido. Decisão mantida. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1011943-43.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: JOSÉ BRITO DE SOUZA JUNIOR AGRAVADOS: EDSON FERREIRA FREITAS, VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO e IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de tutela recursal, interposto por JOSÉ BRITO DE SOUZA JUNIOR, com o objetivo de reformar decisão interlocutória proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Mirassol D’Oeste, Dr. Juliano Hermont Hermes da Silva, que, nos autos do Cumprimento de Sentença nº. 0003494-27.2018.8.11.0011, ajuizado por EDSON FERREIRA FREITAS, VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO e IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO, rejeitou a exceção de pré-executividade oposta pelo ora agravante, indeferiu o pedido de gratuidade de justiça e não acolheu a alegação de nulidade do título executivo referente à cobrança de honorários sucumbenciais. Alega o recorrente que a decisão combatida incorreu em erro ao desconsiderar a existência de vício transrescisório reconhecido anteriormente por esta Corte no julgamento do Agravo de Instrumento número 0005092-20.2016.8.11.0000, no qual se reconheceu dolo processual e nulidade absoluta de atos processuais que culminaram na arrematação do imóvel rural do agravante. Ressalta que os honorários executados advêm de sucumbência em ação anulatória derivada de execução que, por sua vez, tem origem em sentença viciada, cuja nulidade já foi reconhecida. Sustenta que, sendo a cadeia processual atingida por vício transrescisório, o título executivo é inexigível, o que torna cabível a via da exceção de pré-executividade, nos termos do art. 803, I, do CPC. Defende, ainda, que tal matéria é de ordem pública, podendo ser arguida em qualquer tempo e grau de jurisdição. Afirma também que o indeferimento da gratuidade de justiça foi indevido, porquanto o agravante demonstrou sua hipossuficiência financeira, sendo beneficiário de BPC e sem rendimentos adicionais, sendo que a existência de imóvel rural penhorado não descaracterizaria a condição de pobreza, já que o bem é ilíquido, antigo e com várias averbações de penhora. Argumenta que a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência (art. 99, §2º, CPC) não foi infirmada. Postula, por fim, o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, com base no art. 5º, XXVI, da CF e art. 833, VIII, do CPC, sob o argumento de que o imóvel tem menos de quatro módulos fiscais e é explorado economicamente por sua família. Pede a concessão de efeito suspensivo, com fundamento no art. 1.019, I, do CPC, a fim de evitar o prosseguimento da execução sobre bem impenhorável, considerando o risco de leilão e expropriação iminente do único bem familiar, gerando dano irreparável. No mérito do recurso, pugna por seu conhecimento e provimento do agravo para: concessão da gratuidade de justiça; reconhecimento da inexigibilidade do título e nulidade dos atos processuais posteriores; declaração de impenhorabilidade do imóvel rural. Intimado a comprovar que fazia jus à gratuidade de justiça, o recorrente optou por recolher as custas de preparo, sobrevindo certidão de regularidade neste sentido no Id. 281480885. Na decisão monocrática Id. 282876855, datada de 05/05/2025, foi por mim indeferido o pedido de liminar recursal. Intimada, a parte recorrida IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO apresentou contraminuta recursal na peça Id. 289446855, aduzindo, em suma, a improcedência dos argumentos recursais e a correção da decisão recorrida. Decorridos os prazos para contrarrazões dos demais agravados. Pedido de sustentação oral formalizado pela parte embargante no Id. 297665850. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: De início, INDEFIRO o pedido de sustentação retro, uma vez que não há previsão legal para sustentação oral em recursos como o presente (cf. art. 93, § 13, do RI-TJMT). Conforme relatado, trata-se de agravo de instrumento interposto por José Brito de Souza Junior contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Mirassol D’Oeste, que, nos autos do cumprimento de sentença nº. 0003494-27.2018.8.11.0011, rejeitou a exceção de pré-executividade oposta, indeferiu o pedido de gratuidade de justiça e afastou a alegação de inexigibilidade do título executivo referente a honorários sucumbenciais. O agravante sustenta, em síntese, que a decisão combatida desconsiderou o reconhecimento de vício transrescisório declarado no julgamento do Agravo de Instrumento nº. 0005092-20.2016.8.11.0000, no qual se reconheceu o dolo processual e a nulidade absoluta de atos que culminaram na arrematação de seu imóvel rural. Alega que os honorários executados decorrem de ação fundada em título contaminado por tal vício, o que tornaria inexigível a obrigação, matéria de ordem pública que pode ser arguida a qualquer tempo. Defende, ainda, a concessão da gratuidade da justiça, por ser beneficiário de benefício assistencial e não possuir rendimentos adicionais, e o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel rural, por se tratar de pequena propriedade familiar explorada economicamente. Requer a concessão de efeito suspensivo para evitar a expropriação do bem. No mérito, pede o provimento do agravo de instrumento para: (i) conceder o benefício da gratuidade da justiça; (ii) reconhecer a inexigibilidade do título executivo judicial e a nulidade dos atos processuais posteriores; (iii) declarar a impenhorabilidade do imóvel rural penhorado, afastando a constrição judicial incidente sobre o bem. Intimado a comprovar o direito ao benefício da justiça gratuita, o agravante promoveu o recolhimento das custas recursais, conforme certidão de regularidade juntada aos autos. O pedido liminar de efeito suspensivo foi indeferido em decisão monocrática. A fim de ilustrar a controvérsia, oportuna a colação das sucessivas decisões objeto do recurso: “DECISÃO Processo: 0003494-27.2018.8.11.0011. EXEQUENTE: VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO, IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO, EDSON FERREIRA FREITAS EXECUTADO: JOSE BRITO DE SOUZA JUNIOR Vistos, etc. Trata-se de exceção de pré-executividade apresentada por José Brito de Souza Junior, no âmbito de cumprimento de sentença ajuizado pelos exequentes. O executado requer, preliminarmente, a concessão da gratuidade da justiça e a anulação da dívida de honorários advocatícios de sucumbência, sob a alegação de existência de vício transrescisório em processo conexo. I. Da Gratuidade de Justiça O executado fundamenta seu pedido de gratuidade no fato de ser beneficiário de um benefício assistencial equivalente a um salário-mínimo, alegando, ainda, que a propriedade de um único imóvel avaliado em R$ 4.200.000,00 não descaracterizaria sua hipossuficiência financeira. Todavia, conforme consignado pelos exequentes em sua impugnação, o elevado valor patrimonial do referido imóvel é incompatível com a condição de miserabilidade alegada. Ademais, nos termos do art. 99, § 2º, do Código de Processo Civil, a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência pode ser afastada quando existirem elementos que demonstrem a ausência dos requisitos necessários à concessão do benefício, como ocorre no presente caso. Além disso, ainda que a justiça gratuita fosse deferida em momento posterior à instauração da execução, é pacífico o entendimento de que seus efeitos seriam ex nunc, limitados ao momento da concessão em diante, não abrangendo débitos de honorários já constituídos. Diante disso, indefiro o pedido de concessão do benefício da gratuidade de justiça. II. Da Pretensão de Anulação da Dívida de Honorários O executado sustenta que o reconhecimento de vício transrescisório pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso, em ação conexa, repercutiria no cumprimento de sentença em curso, tornando inexigíveis os honorários advocatícios de sucumbência. Contudo, conforme apontado pelos exequentes, a nulidade reconhecida em outra demanda não se comunica automaticamente com esta execução, tendo em vista a autonomia das ações e a necessidade de provocação específica mediante ação própria para desconstituir o título exequendo. Ressalte-se que a exceção de pré-executividade é instrumento restrito a matérias de ordem pública que dispensem dilação probatória. Por essas razões, rejeito o pedido de anulação da dívida de honorários advocatícios, por ausência de cabimento e instrução adequada neste feito. III. Conclusão Ante o exposto, indefiro o pedido de justiça gratuita formulado pelo executado e rejeito o pedido de anulação da dívida de honorários. Determino o prosseguimento da execução, nos termos já fixados nos autos. Intimem-se. JULIANO HERMONT HERMES DA SILVA Juiz de Direito (...) DECISÃO Processo: 0003494-27.2018.8.11.0011. EXEQUENTE: VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO, IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO, EDSON FERREIRA FREITAS EXECUTADO: JOSE BRITO DE SOUZA JUNIOR Vistos etc. José Brito de Souza Junior opôs embargos de declaração em face da decisão que rejeitou sua exceção de pré-executividade, sustentando a existência de omissões e contradições na análise dos seguintes pontos: Impenhorabilidade da pequena propriedade rural – alegação de que o imóvel penhorado possui área inferior a quatro módulos fiscais e é utilizado para a subsistência familiar, sendo impenhorável nos termos do art. 833, VIII, do CPC e da jurisprudência do STF. Hipossuficiência financeira e gratuidade de justiça – sustentou que o indeferimento da justiça gratuita não considerou devidamente as provas apresentadas. Vício transrescisório – alegou que o reconhecimento da nulidade em ação conexa deveria repercutir neste cumprimento de sentença, tornando inexigível a dívida de honorários advocatícios. Vieram-me os autos conclusos. Eis o breve relatório. Passo a decidir. Cumpre esclarecer, inicialmente, que cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz; ou ainda, corrigir erro material. Assim, conclui-se que os embargos de declaração não visam a um novo julgamento da causa, mas tão-somente ao aperfeiçoamento do decisório já proferido. Nesse sentido, o êxito na interposição desse recurso fica condicionado à observância dos rigorosos lindes traçados no art. 1.022 do Código de Processo Civil – CPC. No caso dos autos, há omissão apenas em não ter analisado a tese de impenhorabilidade da pequena propriedade rural. Quanto ao pedido de gratuidade da justiça, a decisão embargada indeferiu corretamente o benefício, sob o fundamento de que o embargante não demonstrou insuficiência econômica. O embargante não juntou documentos essenciais, como extratos do INDEA e declaração do IRPF, que poderiam comprovar a ausência de capacidade econômica. Ademais, há indícios de que exerce atividade rural, o que poderia indicar rendimentos não declarados. Portanto, não há omissão a ser sanada quanto à gratuidade da justiça, devendo ser mantido o indeferimento do benefício. O embargante argumentou que o reconhecimento de vício transrescisório em ação diversa tornaria inexigível o cumprimento de sentença referente aos honorários advocatícios. No entanto, o vício foi reconhecido em ação executiva distinta. Assim, não há relação direta entre os processos, pois cada ação possui autonomia processual própria. Portanto, não há omissão na decisão embargada, pois o cumprimento de sentença permanece válido e os honorários continuam exigíveis, pois a sentença desse processo não se tornou inválida. O embargante alegou que o imóvel penhorado se enquadra como pequena propriedade rural e, por isso, seria impenhorável nos termos do art. 833, VIII, do CPC. Entretanto, conforme consta na procuração juntada aos autos, verifica-se que o executado reside na zona urbana de Cáceres-MT, especificamente na Rua Casalvasco, nº 287, Centro, Cáceres-MT. Ademais, o entendimento do Tribunal de Justiça de Mato Grosso firmou-se no sentido de que não se considera pequena propriedade rural protegida pela regra de impenhorabilidade se a área não for trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar, nos seguintes termos: "Não se considera pequena propriedade rural protegida pela regra de impenhorabilidade a área não trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar". (TJ-MT - AI: 10050146720208110000, Relator: João Ferreira Filho, Primeira Câmara de Direito Privado, julgado em 19/08/2020, publicado em 25/08/2020). No mesmo sentido: RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL - IMPENHORABILIDADE – MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA – REQUISITOS DA IMPENHORABILIDADE DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – DEMONSTRAÇÃO – RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE – DECISÃO REFORMADA – RECURSO PROVIDO. I - A questão acerca da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, prevista no artigo 833, inciso VIII, do CPC e artigo 5º, inciso XXVI, da CF, é matéria de ordem pública e, portanto, pode ser analisada em qualquer instância, até mesmo de ofício, não se operando a preclusão. II - São dois os requisitos da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, quais sejam, que a área seja considerada como pequena, nos termos da lei de regência, e que a propriedade seja trabalhada pela família, como no presente caso.(TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 10192862720248110000, Relator.: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 04/09/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/09/2024) Dessa forma, considerando que o executado não reside no imóvel rural penhorado e não comprovou sua exploração pela família, não há que se falar em impenhorabilidade do bem, devendo ser mantida a penhora sobre o imóvel. Ante o exposto, REJEITO INTEGRALMENTE os embargos de declaração opostos, mantendo a decisão tal como proferida. Intimem-se. Cumpra-se. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. JULIANO HERMONT HERMES DA SILVA Juiz de Direito” Pois bem. Presentes os pressupostos legais de admissibilidade recursal, conheço do agravo de instrumento interposto. No entanto, no mérito, o recurso não comporta provimento, como passo a fundamentar de forma detalhada. A controvérsia posta nos autos circunscreve-se ao exame da regularidade da decisão interlocutória proferida no cumprimento de sentença nº. 0003494-27.2018.8.11.0011, por meio da qual o juízo de origem rejeitou exceção de pré-executividade oposta por José Brito de Souza Junior, indeferiu o pedido de gratuidade da justiça e rejeitou a tese de inexigibilidade do título executivo judicial em razão de suposto vício transrescisório reconhecido em ação diversa. Sustenta o agravante que a decisão combatida violaria o ordenamento jurídico ao desconsiderar a repercussão do vício transrescisório sobre o título exequendo e ao indeferir o reconhecimento da impenhorabilidade de imóvel rural, além de lhe negar o benefício da gratuidade de justiça. No tocante ao alegado vício transrescisório, cumpre assentar que, de um lado, depreende-se que o título judicial objeto do cumprimento de sentença decorre da improcedência da ação de anulação de arrematação e penhora, cuja decisão transitou em julgado e fixou honorários advocatícios de sucumbência. De outro lado, verifica-se que a anulação reconhecida no agravo de instrumento nº. 0005092-20.2016.8.11.0000 de minha relatoria diz respeito à sentença expropriatória proferida em execução de obrigação de fazer e perdas e danos por esbulho possessório, sendo certo que os objetos das ações e os respectivos títulos são distintos e autônomos. Neste contexto, o artigo 502 do Código de Processo Civil dispõe que a decisão transitada em julgado faz coisa julgada entre as partes no que diz respeito ao dispositivo da sentença, não beneficiando nem prejudicando terceiros. Neste sentido, a nulidade de título executivo diverso não contamina, automaticamente, o título objeto de execução, sendo imprescindível a propositura de ação desconstitutiva própria, conforme corretamente assinalado pelo juízo a quo. De outra feita, relativamente à alegação de impenhorabilidade do imóvel rural, prevista no artigo 833, inciso VIII, do Código de Processo Civil, bem como no artigo 5º, inciso XXVI, da Constituição da República, a proteção legal abrange a pequena propriedade rural, desde que trabalhada pela família em regime de economia familiar voltado à sua subsistência. No tocante à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, o e. STF ao apreciar o Tema 961, sob o rito da repercussão geral, fixou a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (ARE n. 1038507, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, j. 21.12.2020 – negritei e grifei). O conceito de propriedade rural impenhorável está inserto no art. 5º, inc. XXVI, da CF, senão vejamos, verbis: “Art. 5º. [...] XXVI – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;” (negritei) De outro lado, o art. 833, inc. VIII, do CPC, assim dispõe, verbis: “Art. 833. São impenhoráveis: [...] VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;” (negritei). Nesse contexto, cediço que o STJ firmou entendimento no sentido de que a impenhorabilidade pode e deve ser reconhecida, entretanto, devem ser preenchidos alguns requisitos, de forma cumulativa, quais sejam, a) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; b) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família; e, c) que o débito decorra de sua atividade produtiva, senão vejamos, verbis: “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE IMÓVEL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. ÔNUS DA PROVA DO EXECUTADO DE QUE O BEM CONSTRITO É TRABALHADO PELA FAMÍLIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EXPLORAÇÃO FAMILIAR. DESNECESSIDADE DE O IMÓVEL PENHORADO SER O ÚNICO DE PROPRIEDADE DO EXECUTADO. JULGAMENTO: CPC/2015. [...] 3. Para reconhecer a impenhorabilidade nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. Até o momento, não há uma lei definindo o que seja pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Diante da lacuna legislativa, a jurisprudência tem tomado emprestado o conceito estabelecido na Lei 8.629/1993, a qual regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. Em seu artigo 4ª, II, alínea "a", atualizado pela Lei 13.465/2017, consta que se enquadra como pequena propriedade rural o imóvel rural "de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento". [...] 5. A ausência de comprovação de que o imóvel penhorado é explorado pela família afasta a incidência da proteção da impenhorabilidade. [...] 7. A orientação consolidada desta Corte é no sentido de que o oferecimento do bem em garantia não afasta a proteção da impenhorabilidade, haja vista que se trata de norma de ordem pública, inafastável pela vontade das partes 8. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico e a demonstração da similitude fática entre o acórdão recorrido e os acórdãos paradigmas. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.” (REsp n. 1.913.236/MT, 3ª Turma, Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 16.03.2021 – negritei e grifei) No caso em exame, não há nos autos elementos probatórios que sustentem o atendimento dos requisitos legais. De fato, depreende-se que o agravante não trouxe aos autos extratos do INDEA, notas fiscais de venda de produtos agrícolas, declaração do imposto de renda ou outros documentos capazes de comprovar a exploração do imóvel pela família para subsistência. Ademais, o imóvel foi avaliado em R$4.200.000,00 (quatro milhões e duzentos mil reais), valor que destoa do perfil típico de pequena propriedade rural de subsistência. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso é uniforme no sentido de que, para o reconhecimento da impenhorabilidade, exige-se a comprovação de que o imóvel, além de atender ao critério da área, seja efetivamente explorado pela família em regime de economia familiar, o que não foi demonstrado. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA – REJEITADA A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DA PROPRIEDADE DO EXECUTADO E DETERMINADA A PENHORA SOBRE O IMÓVEL – ALEGADO BEM DE FAMÍLIA – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS – ÔNUS DO DEVEDOR – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural depende da satisfação cumulativa dos seguintes requisitos: 1) área de até 4 (quatro) módulos fiscais; 2) ser trabalhada pelo próprio titular da terra; e 3) servir de sustento ao agricultor e a sua família. O Superior Tribunal de Justiça considera que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu.” (N.U 1016480-19.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 12/08/2024) (destaquei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – DECISÃO QUE REJEITOU O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL – NÃO DEMONSTRADAS CARACTERÍSTICAS DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Não se considera pequena propriedade rural (art. 5º, XXVI, CF/88 e art. 833, VIII, CPC) para fins de proteção pela regra de impenhorabilidade a área não trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar, ainda que de extensão territorial reduzida. Não verificadas as condições necessárias para a declaração de impenhorabilidade do imóvel, não comporta reforma a decisão que manteve a penhora.” (N.U 1014968-98.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/09/2024, Publicado no DJE 05/09/2024) (destaquei) Portanto, no que atine a alegada impenhorabilidade, impõe-se a manutenção da decisão recorrida, eis que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu. Por fim, no tocante ao pedido de gratuidade de justiça, estabelece o artigo 98 do Código de Processo Civil que a parte tem direito à gratuidade quando comprovar insuficiência de recursos para arcar com as custas e despesas processuais. O artigo 99, §2º, do mesmo diploma legal dispõe que a presunção de veracidade da alegação de insuficiência pode ser elidida por elementos constantes dos autos. No caso, embora o agravante seja beneficiário de prestação continuada no valor de um salário mínimo, o elevado valor do imóvel de sua propriedade e a ausência de prova documental robusta acerca da real condição financeira autorizam o indeferimento do benefício. E mais: intimado a comprovar o preenchimento dos requisitos para concessão da gratuidade no âmbito recursal, o agravante optou por promover o recolhimento das custas processuais devidas, o que reforça a ilação de que dispõe de recursos e não faz jus ao benefício pretendido. Esse comportamento processual revela a ausência de verdadeira incapacidade financeira e afasta o fundamento do pedido de gratuidade, em conformidade com os artigos 98 e 99 do CPC. Diante de todo o exposto, inexistindo demonstração de vício capaz de macular o título executivo judicial, não sendo comprovados os requisitos legais para reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural e restando desautorizado o deferimento da gratuidade da justiça, o recurso merece ser integralmente desprovido. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 1011943-43.2025.8.11.0000

ID: 324801555

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1011943-43.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

EDSON FERREIRA FREITAS IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO

Acórdão

Advogados:

EDSON FERREIRA FREITAS

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IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO

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VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011943-43.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Honorá… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011943-43.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Honorários Advocatícios, Penhora / Depósito/ Avaliação, Inexequibilidade do Título / Inexigibilidade da Obrigação] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [JHONATTAN DIEGO VIDAL GRIEBEL ELY - CPF: 050.325.931-41 (ADVOGADO), JOSE BRITO DE SOUZA JUNIOR - CPF: 088.808.755-15 (AGRAVANTE), VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO - CPF: 420.083.361-15 (AGRAVADO), IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO - CPF: 044.720.101-86 (AGRAVADO), EDSON FERREIRA FREITAS - CPF: 096.000.368-10 (AGRAVADO), UEBER ROBERTO DE CARVALHO - CPF: 459.437.371-20 (ADVOGADO), EDSON FERREIRA FREITAS - CPF: 096.000.368-10 (ADVOGADO), IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO - CPF: 044.720.101-86 (ADVOGADO), VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO - CPF: 420.083.361-15 (ADVOGADO), AGROPECUARIA NOVO MILENIO LTDA - CNPJ: 04.165.520/0001-05 (TERCEIRO INTERESSADO), ELIAS MENDES LEAL FILHO - CPF: 354.096.061-91 (TERCEIRO INTERESSADO), ANA PAULA DALMAS RODRIGUES - CPF: 018.377.361-62 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO – PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL INDEFERIDO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – REJEIÇÃO DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – ALEGAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO POR VÍCIO TRANSRESCISÓRIO RECONHECIDO EM AÇÃO DIVERSA – AUSÊNCIA DE CONTAMINAÇÃO AUTOMÁTICA DO TÍTULO EXEQUENDO – NECESSIDADE DE AÇÃO DESCONSTITUTIVA PRÓPRIA – IMÓVEL RURAL – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA O RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE – ÔNUS DO DEVEDOR – ART. 833, VIII, DO CPC E ART. 5º, XXVI, DA CF – GRATUIDADE DE JUSTIÇA – RECOLHIMENTO VOLUNTÁRIO DAS CUSTAS – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Não há previsão legal para sustentação oral em recursos como o presente, por não se tratar de decisão que versa sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência (cf. art. 93, § 13, do RI-TJMT). A nulidade reconhecida em ação diversa, relativa a título executivo estranho ao cumprimento de sentença em curso, não torna automaticamente inexigível o título objeto da presente execução, sendo necessária a propositura de ação desconstitutiva própria, conforme dispõe o artigo 502 do CPC. A impenhorabilidade da pequena propriedade rural, prevista no artigo 833, VIII, do CPC e no artigo 5º, XXVI, da CF, exige a comprovação cumulativa de que o imóvel se enquadra como pequena propriedade nos termos da lei e é efetivamente explorado pela família para subsistência, ônus do qual o agravante não se desincumbiu. A ausência de prova robusta de hipossuficiência e o recolhimento voluntário das custas processuais, após intimação para comprovação do direito à gratuidade de justiça, afastam a alegação de insuficiência de recursos. Agravo de instrumento desprovido. Decisão mantida. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1011943-43.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: JOSÉ BRITO DE SOUZA JUNIOR AGRAVADOS: EDSON FERREIRA FREITAS, VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO e IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de tutela recursal, interposto por JOSÉ BRITO DE SOUZA JUNIOR, com o objetivo de reformar decisão interlocutória proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Mirassol D’Oeste, Dr. Juliano Hermont Hermes da Silva, que, nos autos do Cumprimento de Sentença nº. 0003494-27.2018.8.11.0011, ajuizado por EDSON FERREIRA FREITAS, VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO e IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO, rejeitou a exceção de pré-executividade oposta pelo ora agravante, indeferiu o pedido de gratuidade de justiça e não acolheu a alegação de nulidade do título executivo referente à cobrança de honorários sucumbenciais. Alega o recorrente que a decisão combatida incorreu em erro ao desconsiderar a existência de vício transrescisório reconhecido anteriormente por esta Corte no julgamento do Agravo de Instrumento número 0005092-20.2016.8.11.0000, no qual se reconheceu dolo processual e nulidade absoluta de atos processuais que culminaram na arrematação do imóvel rural do agravante. Ressalta que os honorários executados advêm de sucumbência em ação anulatória derivada de execução que, por sua vez, tem origem em sentença viciada, cuja nulidade já foi reconhecida. Sustenta que, sendo a cadeia processual atingida por vício transrescisório, o título executivo é inexigível, o que torna cabível a via da exceção de pré-executividade, nos termos do art. 803, I, do CPC. Defende, ainda, que tal matéria é de ordem pública, podendo ser arguida em qualquer tempo e grau de jurisdição. Afirma também que o indeferimento da gratuidade de justiça foi indevido, porquanto o agravante demonstrou sua hipossuficiência financeira, sendo beneficiário de BPC e sem rendimentos adicionais, sendo que a existência de imóvel rural penhorado não descaracterizaria a condição de pobreza, já que o bem é ilíquido, antigo e com várias averbações de penhora. Argumenta que a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência (art. 99, §2º, CPC) não foi infirmada. Postula, por fim, o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, com base no art. 5º, XXVI, da CF e art. 833, VIII, do CPC, sob o argumento de que o imóvel tem menos de quatro módulos fiscais e é explorado economicamente por sua família. Pede a concessão de efeito suspensivo, com fundamento no art. 1.019, I, do CPC, a fim de evitar o prosseguimento da execução sobre bem impenhorável, considerando o risco de leilão e expropriação iminente do único bem familiar, gerando dano irreparável. No mérito do recurso, pugna por seu conhecimento e provimento do agravo para: concessão da gratuidade de justiça; reconhecimento da inexigibilidade do título e nulidade dos atos processuais posteriores; declaração de impenhorabilidade do imóvel rural. Intimado a comprovar que fazia jus à gratuidade de justiça, o recorrente optou por recolher as custas de preparo, sobrevindo certidão de regularidade neste sentido no Id. 281480885. Na decisão monocrática Id. 282876855, datada de 05/05/2025, foi por mim indeferido o pedido de liminar recursal. Intimada, a parte recorrida IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO apresentou contraminuta recursal na peça Id. 289446855, aduzindo, em suma, a improcedência dos argumentos recursais e a correção da decisão recorrida. Decorridos os prazos para contrarrazões dos demais agravados. Pedido de sustentação oral formalizado pela parte embargante no Id. 297665850. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: De início, INDEFIRO o pedido de sustentação retro, uma vez que não há previsão legal para sustentação oral em recursos como o presente (cf. art. 93, § 13, do RI-TJMT). Conforme relatado, trata-se de agravo de instrumento interposto por José Brito de Souza Junior contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Mirassol D’Oeste, que, nos autos do cumprimento de sentença nº. 0003494-27.2018.8.11.0011, rejeitou a exceção de pré-executividade oposta, indeferiu o pedido de gratuidade de justiça e afastou a alegação de inexigibilidade do título executivo referente a honorários sucumbenciais. O agravante sustenta, em síntese, que a decisão combatida desconsiderou o reconhecimento de vício transrescisório declarado no julgamento do Agravo de Instrumento nº. 0005092-20.2016.8.11.0000, no qual se reconheceu o dolo processual e a nulidade absoluta de atos que culminaram na arrematação de seu imóvel rural. Alega que os honorários executados decorrem de ação fundada em título contaminado por tal vício, o que tornaria inexigível a obrigação, matéria de ordem pública que pode ser arguida a qualquer tempo. Defende, ainda, a concessão da gratuidade da justiça, por ser beneficiário de benefício assistencial e não possuir rendimentos adicionais, e o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel rural, por se tratar de pequena propriedade familiar explorada economicamente. Requer a concessão de efeito suspensivo para evitar a expropriação do bem. No mérito, pede o provimento do agravo de instrumento para: (i) conceder o benefício da gratuidade da justiça; (ii) reconhecer a inexigibilidade do título executivo judicial e a nulidade dos atos processuais posteriores; (iii) declarar a impenhorabilidade do imóvel rural penhorado, afastando a constrição judicial incidente sobre o bem. Intimado a comprovar o direito ao benefício da justiça gratuita, o agravante promoveu o recolhimento das custas recursais, conforme certidão de regularidade juntada aos autos. O pedido liminar de efeito suspensivo foi indeferido em decisão monocrática. A fim de ilustrar a controvérsia, oportuna a colação das sucessivas decisões objeto do recurso: “DECISÃO Processo: 0003494-27.2018.8.11.0011. EXEQUENTE: VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO, IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO, EDSON FERREIRA FREITAS EXECUTADO: JOSE BRITO DE SOUZA JUNIOR Vistos, etc. Trata-se de exceção de pré-executividade apresentada por José Brito de Souza Junior, no âmbito de cumprimento de sentença ajuizado pelos exequentes. O executado requer, preliminarmente, a concessão da gratuidade da justiça e a anulação da dívida de honorários advocatícios de sucumbência, sob a alegação de existência de vício transrescisório em processo conexo. I. Da Gratuidade de Justiça O executado fundamenta seu pedido de gratuidade no fato de ser beneficiário de um benefício assistencial equivalente a um salário-mínimo, alegando, ainda, que a propriedade de um único imóvel avaliado em R$ 4.200.000,00 não descaracterizaria sua hipossuficiência financeira. Todavia, conforme consignado pelos exequentes em sua impugnação, o elevado valor patrimonial do referido imóvel é incompatível com a condição de miserabilidade alegada. Ademais, nos termos do art. 99, § 2º, do Código de Processo Civil, a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência pode ser afastada quando existirem elementos que demonstrem a ausência dos requisitos necessários à concessão do benefício, como ocorre no presente caso. Além disso, ainda que a justiça gratuita fosse deferida em momento posterior à instauração da execução, é pacífico o entendimento de que seus efeitos seriam ex nunc, limitados ao momento da concessão em diante, não abrangendo débitos de honorários já constituídos. Diante disso, indefiro o pedido de concessão do benefício da gratuidade de justiça. II. Da Pretensão de Anulação da Dívida de Honorários O executado sustenta que o reconhecimento de vício transrescisório pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso, em ação conexa, repercutiria no cumprimento de sentença em curso, tornando inexigíveis os honorários advocatícios de sucumbência. Contudo, conforme apontado pelos exequentes, a nulidade reconhecida em outra demanda não se comunica automaticamente com esta execução, tendo em vista a autonomia das ações e a necessidade de provocação específica mediante ação própria para desconstituir o título exequendo. Ressalte-se que a exceção de pré-executividade é instrumento restrito a matérias de ordem pública que dispensem dilação probatória. Por essas razões, rejeito o pedido de anulação da dívida de honorários advocatícios, por ausência de cabimento e instrução adequada neste feito. III. Conclusão Ante o exposto, indefiro o pedido de justiça gratuita formulado pelo executado e rejeito o pedido de anulação da dívida de honorários. Determino o prosseguimento da execução, nos termos já fixados nos autos. Intimem-se. JULIANO HERMONT HERMES DA SILVA Juiz de Direito (...) DECISÃO Processo: 0003494-27.2018.8.11.0011. EXEQUENTE: VALDINEI RODRIGUES SALGUEIRO, IGOR CHRISTIAN ADRIANO SALGUEIRO, EDSON FERREIRA FREITAS EXECUTADO: JOSE BRITO DE SOUZA JUNIOR Vistos etc. José Brito de Souza Junior opôs embargos de declaração em face da decisão que rejeitou sua exceção de pré-executividade, sustentando a existência de omissões e contradições na análise dos seguintes pontos: Impenhorabilidade da pequena propriedade rural – alegação de que o imóvel penhorado possui área inferior a quatro módulos fiscais e é utilizado para a subsistência familiar, sendo impenhorável nos termos do art. 833, VIII, do CPC e da jurisprudência do STF. Hipossuficiência financeira e gratuidade de justiça – sustentou que o indeferimento da justiça gratuita não considerou devidamente as provas apresentadas. Vício transrescisório – alegou que o reconhecimento da nulidade em ação conexa deveria repercutir neste cumprimento de sentença, tornando inexigível a dívida de honorários advocatícios. Vieram-me os autos conclusos. Eis o breve relatório. Passo a decidir. Cumpre esclarecer, inicialmente, que cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz; ou ainda, corrigir erro material. Assim, conclui-se que os embargos de declaração não visam a um novo julgamento da causa, mas tão-somente ao aperfeiçoamento do decisório já proferido. Nesse sentido, o êxito na interposição desse recurso fica condicionado à observância dos rigorosos lindes traçados no art. 1.022 do Código de Processo Civil – CPC. No caso dos autos, há omissão apenas em não ter analisado a tese de impenhorabilidade da pequena propriedade rural. Quanto ao pedido de gratuidade da justiça, a decisão embargada indeferiu corretamente o benefício, sob o fundamento de que o embargante não demonstrou insuficiência econômica. O embargante não juntou documentos essenciais, como extratos do INDEA e declaração do IRPF, que poderiam comprovar a ausência de capacidade econômica. Ademais, há indícios de que exerce atividade rural, o que poderia indicar rendimentos não declarados. Portanto, não há omissão a ser sanada quanto à gratuidade da justiça, devendo ser mantido o indeferimento do benefício. O embargante argumentou que o reconhecimento de vício transrescisório em ação diversa tornaria inexigível o cumprimento de sentença referente aos honorários advocatícios. No entanto, o vício foi reconhecido em ação executiva distinta. Assim, não há relação direta entre os processos, pois cada ação possui autonomia processual própria. Portanto, não há omissão na decisão embargada, pois o cumprimento de sentença permanece válido e os honorários continuam exigíveis, pois a sentença desse processo não se tornou inválida. O embargante alegou que o imóvel penhorado se enquadra como pequena propriedade rural e, por isso, seria impenhorável nos termos do art. 833, VIII, do CPC. Entretanto, conforme consta na procuração juntada aos autos, verifica-se que o executado reside na zona urbana de Cáceres-MT, especificamente na Rua Casalvasco, nº 287, Centro, Cáceres-MT. Ademais, o entendimento do Tribunal de Justiça de Mato Grosso firmou-se no sentido de que não se considera pequena propriedade rural protegida pela regra de impenhorabilidade se a área não for trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar, nos seguintes termos: "Não se considera pequena propriedade rural protegida pela regra de impenhorabilidade a área não trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar". (TJ-MT - AI: 10050146720208110000, Relator: João Ferreira Filho, Primeira Câmara de Direito Privado, julgado em 19/08/2020, publicado em 25/08/2020). No mesmo sentido: RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL - IMPENHORABILIDADE – MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA – REQUISITOS DA IMPENHORABILIDADE DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – DEMONSTRAÇÃO – RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE – DECISÃO REFORMADA – RECURSO PROVIDO. I - A questão acerca da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, prevista no artigo 833, inciso VIII, do CPC e artigo 5º, inciso XXVI, da CF, é matéria de ordem pública e, portanto, pode ser analisada em qualquer instância, até mesmo de ofício, não se operando a preclusão. II - São dois os requisitos da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, quais sejam, que a área seja considerada como pequena, nos termos da lei de regência, e que a propriedade seja trabalhada pela família, como no presente caso.(TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 10192862720248110000, Relator.: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 04/09/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/09/2024) Dessa forma, considerando que o executado não reside no imóvel rural penhorado e não comprovou sua exploração pela família, não há que se falar em impenhorabilidade do bem, devendo ser mantida a penhora sobre o imóvel. Ante o exposto, REJEITO INTEGRALMENTE os embargos de declaração opostos, mantendo a decisão tal como proferida. Intimem-se. Cumpra-se. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. JULIANO HERMONT HERMES DA SILVA Juiz de Direito” Pois bem. Presentes os pressupostos legais de admissibilidade recursal, conheço do agravo de instrumento interposto. No entanto, no mérito, o recurso não comporta provimento, como passo a fundamentar de forma detalhada. A controvérsia posta nos autos circunscreve-se ao exame da regularidade da decisão interlocutória proferida no cumprimento de sentença nº. 0003494-27.2018.8.11.0011, por meio da qual o juízo de origem rejeitou exceção de pré-executividade oposta por José Brito de Souza Junior, indeferiu o pedido de gratuidade da justiça e rejeitou a tese de inexigibilidade do título executivo judicial em razão de suposto vício transrescisório reconhecido em ação diversa. Sustenta o agravante que a decisão combatida violaria o ordenamento jurídico ao desconsiderar a repercussão do vício transrescisório sobre o título exequendo e ao indeferir o reconhecimento da impenhorabilidade de imóvel rural, além de lhe negar o benefício da gratuidade de justiça. No tocante ao alegado vício transrescisório, cumpre assentar que, de um lado, depreende-se que o título judicial objeto do cumprimento de sentença decorre da improcedência da ação de anulação de arrematação e penhora, cuja decisão transitou em julgado e fixou honorários advocatícios de sucumbência. De outro lado, verifica-se que a anulação reconhecida no agravo de instrumento nº. 0005092-20.2016.8.11.0000 de minha relatoria diz respeito à sentença expropriatória proferida em execução de obrigação de fazer e perdas e danos por esbulho possessório, sendo certo que os objetos das ações e os respectivos títulos são distintos e autônomos. Neste contexto, o artigo 502 do Código de Processo Civil dispõe que a decisão transitada em julgado faz coisa julgada entre as partes no que diz respeito ao dispositivo da sentença, não beneficiando nem prejudicando terceiros. Neste sentido, a nulidade de título executivo diverso não contamina, automaticamente, o título objeto de execução, sendo imprescindível a propositura de ação desconstitutiva própria, conforme corretamente assinalado pelo juízo a quo. De outra feita, relativamente à alegação de impenhorabilidade do imóvel rural, prevista no artigo 833, inciso VIII, do Código de Processo Civil, bem como no artigo 5º, inciso XXVI, da Constituição da República, a proteção legal abrange a pequena propriedade rural, desde que trabalhada pela família em regime de economia familiar voltado à sua subsistência. No tocante à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, o e. STF ao apreciar o Tema 961, sob o rito da repercussão geral, fixou a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (ARE n. 1038507, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, j. 21.12.2020 – negritei e grifei). O conceito de propriedade rural impenhorável está inserto no art. 5º, inc. XXVI, da CF, senão vejamos, verbis: “Art. 5º. [...] XXVI – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;” (negritei) De outro lado, o art. 833, inc. VIII, do CPC, assim dispõe, verbis: “Art. 833. São impenhoráveis: [...] VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;” (negritei). Nesse contexto, cediço que o STJ firmou entendimento no sentido de que a impenhorabilidade pode e deve ser reconhecida, entretanto, devem ser preenchidos alguns requisitos, de forma cumulativa, quais sejam, a) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; b) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família; e, c) que o débito decorra de sua atividade produtiva, senão vejamos, verbis: “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE IMÓVEL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. ÔNUS DA PROVA DO EXECUTADO DE QUE O BEM CONSTRITO É TRABALHADO PELA FAMÍLIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EXPLORAÇÃO FAMILIAR. DESNECESSIDADE DE O IMÓVEL PENHORADO SER O ÚNICO DE PROPRIEDADE DO EXECUTADO. JULGAMENTO: CPC/2015. [...] 3. Para reconhecer a impenhorabilidade nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. Até o momento, não há uma lei definindo o que seja pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Diante da lacuna legislativa, a jurisprudência tem tomado emprestado o conceito estabelecido na Lei 8.629/1993, a qual regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. Em seu artigo 4ª, II, alínea "a", atualizado pela Lei 13.465/2017, consta que se enquadra como pequena propriedade rural o imóvel rural "de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento". [...] 5. A ausência de comprovação de que o imóvel penhorado é explorado pela família afasta a incidência da proteção da impenhorabilidade. [...] 7. A orientação consolidada desta Corte é no sentido de que o oferecimento do bem em garantia não afasta a proteção da impenhorabilidade, haja vista que se trata de norma de ordem pública, inafastável pela vontade das partes 8. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico e a demonstração da similitude fática entre o acórdão recorrido e os acórdãos paradigmas. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.” (REsp n. 1.913.236/MT, 3ª Turma, Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 16.03.2021 – negritei e grifei) No caso em exame, não há nos autos elementos probatórios que sustentem o atendimento dos requisitos legais. De fato, depreende-se que o agravante não trouxe aos autos extratos do INDEA, notas fiscais de venda de produtos agrícolas, declaração do imposto de renda ou outros documentos capazes de comprovar a exploração do imóvel pela família para subsistência. Ademais, o imóvel foi avaliado em R$4.200.000,00 (quatro milhões e duzentos mil reais), valor que destoa do perfil típico de pequena propriedade rural de subsistência. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso é uniforme no sentido de que, para o reconhecimento da impenhorabilidade, exige-se a comprovação de que o imóvel, além de atender ao critério da área, seja efetivamente explorado pela família em regime de economia familiar, o que não foi demonstrado. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA – REJEITADA A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DA PROPRIEDADE DO EXECUTADO E DETERMINADA A PENHORA SOBRE O IMÓVEL – ALEGADO BEM DE FAMÍLIA – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS – ÔNUS DO DEVEDOR – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural depende da satisfação cumulativa dos seguintes requisitos: 1) área de até 4 (quatro) módulos fiscais; 2) ser trabalhada pelo próprio titular da terra; e 3) servir de sustento ao agricultor e a sua família. O Superior Tribunal de Justiça considera que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu.” (N.U 1016480-19.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 12/08/2024) (destaquei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – DECISÃO QUE REJEITOU O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL – NÃO DEMONSTRADAS CARACTERÍSTICAS DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Não se considera pequena propriedade rural (art. 5º, XXVI, CF/88 e art. 833, VIII, CPC) para fins de proteção pela regra de impenhorabilidade a área não trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar, ainda que de extensão territorial reduzida. Não verificadas as condições necessárias para a declaração de impenhorabilidade do imóvel, não comporta reforma a decisão que manteve a penhora.” (N.U 1014968-98.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/09/2024, Publicado no DJE 05/09/2024) (destaquei) Portanto, no que atine a alegada impenhorabilidade, impõe-se a manutenção da decisão recorrida, eis que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu. Por fim, no tocante ao pedido de gratuidade de justiça, estabelece o artigo 98 do Código de Processo Civil que a parte tem direito à gratuidade quando comprovar insuficiência de recursos para arcar com as custas e despesas processuais. O artigo 99, §2º, do mesmo diploma legal dispõe que a presunção de veracidade da alegação de insuficiência pode ser elidida por elementos constantes dos autos. No caso, embora o agravante seja beneficiário de prestação continuada no valor de um salário mínimo, o elevado valor do imóvel de sua propriedade e a ausência de prova documental robusta acerca da real condição financeira autorizam o indeferimento do benefício. E mais: intimado a comprovar o preenchimento dos requisitos para concessão da gratuidade no âmbito recursal, o agravante optou por promover o recolhimento das custas processuais devidas, o que reforça a ilação de que dispõe de recursos e não faz jus ao benefício pretendido. Esse comportamento processual revela a ausência de verdadeira incapacidade financeira e afasta o fundamento do pedido de gratuidade, em conformidade com os artigos 98 e 99 do CPC. Diante de todo o exposto, inexistindo demonstração de vício capaz de macular o título executivo judicial, não sendo comprovados os requisitos legais para reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural e restando desautorizado o deferimento da gratuidade da justiça, o recurso merece ser integralmente desprovido. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 1015545-42.2025.8.11.0000

ID: 324801565

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1015545-42.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RODRIGO MOURA DE VARGAS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015545-42.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Bem de Família, Cédula de Crédito Bancá… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015545-42.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Bem de Família, Cédula de Crédito Bancário, Expropriação de Bens] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [RODRIGO MOURA DE VARGAS - CPF: 817.475.940-91 (ADVOGADO), ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI - CPF: 462.522.580-91 (AGRAVANTE), COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO DO SUDOESTE MT/PA - SICREDI SUDOESTE MT/PA - CNPJ: 32.995.755/0001-60 (AGRAVADO), RIKELLE GOMES MAIA - CPF: 044.863.621-28 (ADVOGADO), FRANCISMAR SANCHES LOPES - CPF: 045.548.258-68 (ADVOGADO), LUCIANO DE SALES - CPF: 255.809.778-40 (ADVOGADO), ANTONIO FIDELIS DA SILVA ZAMO - CPF: 050.880.110-91 (TERCEIRO INTERESSADO), MARIA LUIZA PINZON ZAMO - CPF: 503.553.921-00 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL – PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE IMPENHORABILIDADE – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS – ÔNUS DO DEVEDOR – ALONGAMENTO DA DÍVIDA – PRETENSÃO EXTEMPORÂNEA – COISA JULGADA – EXCESSO DE EXECUÇÃO – INOCORRÊNCIA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Não há previsão legal para sustentação oral em recursos como o presente, nem mesmo no agravo de instrumento, por não se tratar de decisão que versa sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência (cf. art. 93, § 13, do RI-TJMT). Para o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, nos termos do art. 5º, XXVI, da CF e do art. 833, VIII, do CPC, exige-se a comprovação cumulativa de que a área se enquadra como pequena propriedade, que é trabalhada pela família e que o débito decorre da atividade produtiva. No caso, o executado não se desincumbiu do ônus de comprovar tais requisitos. A pretensão de alongamento da dívida revela-se manifestamente extemporânea e acobertada pela coisa julgada, diante da rejeição anterior dos embargos à execução. Não há excesso de execução quando o valor do débito se mostra compatível com a avaliação do imóvel indicada pelo próprio executado. Recurso conhecido e desprovido. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1015545-42.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI AGRAVADA: COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO DO SUDOESTE MT/PA - SICREDI SUDOESTE MT/PA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI, em que insurge-se contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Comodoro, Juiz de Direito Substituto Ricardo Garcia Maziero, o qual rejeitou os argumentos do executado, dentre os quais a tese de impenhorabilidade, e manteve o leilão aprazado. A parte recorrente aduz a incorreção da decisão, aos argumentos, em suma, de que há impenhorabilidade da propriedade rural do agravante, por se tratar, segundo afirma, de pequena propriedade explorada economicamente por sua família. Diz que a impenhorabilidade alegada fundamenta-se nos artigos 5º, inciso XXVI, da Constituição da República e 833, inciso VIII, do Código de Processo Civil, os quais consagram a impenhorabilidade da pequena propriedade rural trabalhada pela família, inclusive para débitos oriundos da própria atividade produtiva. Sustenta que embora a matrícula do imóvel registre área superior a 400 hectares, os documentos atualizados, como o Cadastro Ambiental Rural, demonstram que a área aproveitável é significativamente inferior, correspondendo a cerca de 3,6 módulos fiscais, portanto, abaixo do limite de quatro módulos fiscais estabelecido pela legislação agrária e pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Explana que a propriedade cumpre sua função social; e que “além de prover um meio de subsistência, o trabalho familiar na propriedade rural ajuda a preservar a cultura rural e promove o desenvolvimento sustentável” (sic). Anota que a área é explorada diretamente pelo agravante e seus familiares, com cultivo de grãos como soja e milho, constituindo a principal fonte de renda de subsistência; e que o juízo de origem desconsiderou as provas produzidas quanto à dimensão real da área produtiva, aos documentos ambientais atualizados e à caracterização da atividade como agricultura familiar, requisitos que, se observados, demonstrariam a incidência da proteção legal invocada. Assevera que é devida a prorrogação da dívida rural, sendo que tem direito subjetivo ao alongamento compulsório das parcelas, conforme estabelecem a Súmula 298 do Superior Tribunal de Justiça e os dispositivos do Manual de Crédito Rural. No mais, defende que foram protocolados pedidos administrativos de prorrogação, acompanhados de laudos técnicos que evidenciam frustração de safra e incapacidade de adimplemento por motivos alheios à sua vontade, tais como intempéries climáticas e desequilíbrios de mercado; e que a negativa do pedido pelo juízo de primeiro grau ignora tanto a legislação especial quanto a jurisprudência consolidada que confere ao produtor o direito à reestruturação da dívida em situações excepcionais. Pede, liminarmente, a concessão de efeito suspensivo ao recurso, “a fim de SUSPENDER a ordem judicial de imissão de posse do arrematante, com a manutenção do Sr. ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI na posse do imóvel, até o pronunciamento definitivo desse Egrégio Tribunal De Justiça, em razão da impenhorabilidade da pequena propriedade rural do agravante” (sic). No mérito, requer que o recurso seja provido “para reformar a decisão atacada e determinar a anulação de todos os atos judiciais até então praticados nos autos do referido processo, desconstituindo a penhora, a arrematação, a imissão de posse e os lançamentos registrais já ordenados na matrícula do imóvel” (sic). Comprovação de recolhimento das custas de preparo no Id. 286738862. A liminar recursal foi por mim indeferida em 29/05/2025, nos termos da decisão Id. 289856398. Contraminuta da parte recorrida no Id. 295040380, rebatendo os argumentos recursais e aduzindo, em suma, a correção da decisão recorrida. Pedido de sustentação oral da parte recorrida na peça Id. 296895899. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Primeiramente, saliento que descabe o pedido de sustentação oral, eis que não há previsão de tal possibilidade de tal espécie recursal. Ademais, observa-se que não há justificação concreta, clara e objetiva quanto ao preciso motivo ensejador do pedido de retirada do processo da pauta de julgamento virtual para fins de sustentação oral, não sendo o mero requerimento, por si só, causa idônea e suficiente o bastante para exercício da defesa de forma oral, valendo aqui sobrelevar que não haverá cerceamento de defesa algum porque as razões do recurso são bastante claras e serão apreciadas de forma exauriente conforme será exposto adiante. Neste sentido, aliás, o STJ assinala que “a oposição ao julgamento virtual deve ocorrer sempre de forma fundamentada”, sob pena de indeferimento (STJ, AgInt no REsp nº. 1.934.689/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 20.09.2021). A propósito: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO – OPOSIÇÃO AO JULGAMENTO VIRTUAL E PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL – NÃO CABIMENTO – NULIDADE NÃO VERIFICADA – AUSÊNCIA DE PREJUÍZO – ALEGAÇÃO DE OMISSÃO – INEXISTÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 1.022 DO CPC – EMBARGOS REJEITADOS. “A oposição ao julgamento virtual deve ocorrer sempre de forma fundamentada. Além disso, não cabe a realização de sustentação oral em julgamento de agravo interno, não versando o caso sobre as hipóteses previstas no art. 937, § 3º, do CPC, relacionadas a processos de competência originária.” (STJ, AgInt no REsp n. 1.934.689/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 20.09.2021). Se não há qualquer vício a ser sanado, o recurso deve ser rejeitado, pois a matéria foi apreciada na oportunidade do acórdão recorrido, permitindo à parte, se assim desejar, a interposição futura de recurso dirigido às Cortes Excepcionais de Justiça." (N.U 1016554-73.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/10/2024, Publicado no DJE 07/10/2024) (destaquei) “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE. AUSÊNCIA DE SUSTENTAÇÃO ORAL. NÃO VERIFICADA. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido que não há, no ordenamento jurídico vigente, o direito de exigir que o julgamento ocorra por meio de sessão presencial. Portanto, o fato de o julgamento ter sido realizado de forma virtual, mesmo com a oposição expressa e tempestiva da parte, não é, por si só, causa de nulidade ou cerceamento de defesa. Ademais, mesmo nas hipóteses em que cabe sustentação oral, se o seu exercício for garantido e viabilizado na modalidade de julgamento virtual, não haverá nenhum prejuízo ou nulidade, ainda que a parte se oponha a essa forma de julgamento, porquanto o direito de sustentar oralmente as suas razões não significa o de, necessariamente, o fazer de forma presencial (AgRg no HC n. 832.679/BA, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 15/4/2024, DJe de 18/4/2024). 2. Nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração destinam-se a esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão e corrigir erro material eventualmente existentes no julgado, o que não se verifica no caso dos autos. 3. O acórdão embargado, de maneira clara e fundamentada, consignou que a parte agravante não rebateu a Súmula 83/STJ (rescisão de contrato e compra e venda de imóvel); Súmula 83/STJ (termo inicial dos aluguéis); Súmula 5/STJ (termo inicial dos aluguéis); e Súmula 7/STJ (termo inicial dos aluguéis). 4. A pretensão de rediscutir matéria devidamente abordada e decidida no julgado embargado, consubstanciada na mera insatisfação com o resultado da demanda, é incabível na via eleita. Embargos de declaração rejeitados.” (EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.600.312/SC, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 11/11/2024, DJe de 14/11/2024) 1. "No que tange à alegada nulidade, ante a falta de sustentação oral, verifica-se que a parte recorrente não demonstrou o prejuízo concreto decorrente da suposta violação, não havendo que se falar, no caso, em presunção. Precedentes." (STJ — 3 Turma — Aglnt no AREsp 989.214/SP — Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE — j. 21/10/2019, DJe 28/10/2019) Destarte, INDEFIRO o pedido de sustentação oral vindicado na peça retro. Conforme relatado, trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Alderino de Amorim Capeletti, contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Comodoro, que rejeitou os argumentos de impenhorabilidade apresentados pelo executado e manteve o leilão do imóvel. O agravante alega, em síntese, que o imóvel penhorado é pequena propriedade rural explorada pela família, fazendo jus à proteção prevista no art. 5º, XXVI, da Constituição da República, e no art. 833, VIII, do CPC. Sustenta que, embora a matrícula indique área superior a 400 hectares, os documentos atualizados, como o Cadastro Ambiental Rural, apontam área aproveitável correspondente a cerca de 3,6 módulos fiscais, abaixo do limite legal de quatro módulos fiscais. Alega que o imóvel é explorado diretamente por ele e seus familiares com cultivo de soja e milho, sendo sua principal fonte de subsistência. Defende que o juízo de origem desconsiderou provas sobre a dimensão da área produtiva e a caracterização da propriedade como de agricultura familiar. Além disso, invoca o direito ao alongamento compulsório da dívida rural, nos termos da Súmula 298 do STJ e do Manual de Crédito Rural, ressaltando que apresentou pedidos administrativos de prorrogação acompanhados de laudos que atestam frustração de safra. Pede, no mérito, a reforma da decisão, com o reconhecimento da impenhorabilidade e a anulação dos atos expropriatórios. Eis o teor da decisão recorrida: “PETIÇÃO CÍVEL (241) 0001733-02.2008.8.11.0046 POLO ATIVO: COOPERATIVA DE CRÉDITO SICREDI SUDOESTE e outros (2) REPRESENTANTES POLO ATIVO: LUCIANO DE SALES - MT5911-B, FRANCISMAR SANCHES LOPES - MT1708-B, RIKELLE GOMES MAIA - MT29405/O e DANIEL VIEIRA GONCALVES - MT30304/O POLO PASSIVO: ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI e outros (2) REPRESENTANTES POLO PASSIVO: RODRIGO MOURA DE VARGAS - MT14912-A, JOAO ALCIR RODRIGUES DE VARGAS - MT5881-A, SERGIO HENRIQUE GUARESCHI - MT9724-A, ILDO ROQUE GUARESCHI - MT5417-A e CARLOS ALBERTO MARKUS SILVA - MT16435-O DECISÃO Vistos. Compulsando os autos, entendo que os pedidos de formulados no ID 190616571 não merece acolhimento. Em relação ao pedido de impenhorabilidade do imóvel é desprovido de fundamento, pois o imóvel a ser leiloa não se enquadra em uma pequena propriedade rural, pois a área supera mais de 400 hectares, assim como não há nenhum arremedo de prova de que os devedores residem e exerçam exploração familiar no imóvel rural e, mesmo que assim o fosse, apenas uma parte do imóvel, poderia se cogitar eventual impenhorabilidade, o que não é o caso dos autos. Prosseguindo com à analise dos pedidos, verifica-se que não ficou evidenciado excesso de garantia nos autos, pois se trata de um divida original de R$ 239.595,89 (duzentos e trinta e nove mil, quinhentos e noventa e cinto reais e oitenta e nove centavos), que deverá passar por atualização, que atualmente está vencida a mais de 16 anos. Por final, o pedido de alongamento da divida também é infundado, pois além de ser intempestivo, em razão de ter sido requerido na época do vencimento da divida e, não agora, quase duas décadas após, os motivos que poderiam deflagrar o referido alongamento já estão albergados pela coisa julgada. Ante o exposto, INDEFIRO os pedidos de formulados no ID 190616571 e mantenho o leilão. Comodoro, datado e assinado digitalmente. RICARDO GARCIA MAZIERO Juiz de Direito Substituto” Pois bem. Analisando a insurgência recursal em seara de mérito, infere-se que não deve prosperar. No tocante à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, o e. STF ao apreciar o Tema 961, sob o rito da repercussão geral, fixou a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (ARE nº. 1038507, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, j. 21.12.2020 – negritei e grifei). O conceito de propriedade rural impenhorável está inserto no art. 5º, inc. XXVI, da CF, senão vejamos, verbis: “Art. 5º. [...] XXVI – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;” (negritei) De outro lado, o art. 833, inc. VIII, do CPC, assim dispõe, verbis: “Art. 833. São impenhoráveis: [...] VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;” (negritei) Nesse contexto, cediço que o STJ firmou entendimento no sentido de que a impenhorabilidade pode e deve ser reconhecida, entretanto, devem ser preenchidos alguns requisitos, de forma cumulativa, quais sejam, a) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; b) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família; e, c) que o débito decorra de sua atividade produtiva, senão vejamos, verbis: “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE IMÓVEL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. ÔNUS DA PROVA DO EXECUTADO DE QUE O BEM CONSTRITO É TRABALHADO PELA FAMÍLIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EXPLORAÇÃO FAMILIAR. DESNECESSIDADE DE O IMÓVEL PENHORADO SER O ÚNICO DE PROPRIEDADE DO EXECUTADO. JULGAMENTO: CPC/2015. [...] 3. Para reconhecer a impenhorabilidade nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. Até o momento, não há uma lei definindo o que seja pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Diante da lacuna legislativa, a jurisprudência tem tomado emprestado o conceito estabelecido na Lei 8.629/1993, a qual regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. Em seu artigo 4ª, II, alínea "a", atualizado pela Lei 13.465/2017, consta que se enquadra como pequena propriedade rural o imóvel rural "de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento". [...] 5. A ausência de comprovação de que o imóvel penhorado é explorado pela família afasta a incidência da proteção da impenhorabilidade. [...] 7. A orientação consolidada desta Corte é no sentido de que o oferecimento do bem em garantia não afasta a proteção da impenhorabilidade, haja vista que se trata de norma de ordem pública, inafastável pela vontade das partes 8. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico e a demonstração da similitude fática entre o acórdão recorrido e os acórdãos paradigmas. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.” (REsp n. 1.913.236/MT, 3ª Turma, Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 16.03.2021 – negritei e grifei) “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAL E LEGAL. AUSÊNCIA DE INTERPOSIÇÃO SIMULTÂNEA DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA 126/STJ. CARACTERIZAÇÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7/STJ. GARANTIA HIPOTECÁRIA. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA E HIPOTECÁRIA. FINANCIAMENTO DA ATIVIDADE PRODUTIVA. IMPENHORABILIDADE. ARTS. 649, INCISO VIII, DO CPC DE 1973, E 5º, INCISO XXVI, DA CF/88. PROVIMENTO. 1. É inviável o recurso especial se a parte deixa de impugnar, pela via processual adequada, fundamento constitucional do acórdão recorrido (Súmula 126 do STJ). 2. Recurso especial cuja pretensão demanda reexame de matéria fática da lide, o que encontra óbice na Súmula 7 do STJ. 3. A pequena propriedade rural, trabalhada pela família, é impenhorável, ainda que dada pelos proprietários em garantia hipotecária para financiamento da atividade produtiva. Artigos 649, inciso VIII, do Código de Processo Civil anterior, e 5º, inciso XXVI, da Constituição Federal. 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt no AREsp n. 1.176.108/PR, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 18/9/2018, DJe de 25/9/2018) No caso, a despeito dos argumentos da parte executada agravante em sentido diverso, perfilho do teor da decisão recorrida. Com efeito, verifica-se que o requisito de que o imóvel penhorado é explorado pela família não resta seguramente demonstrado, não servindo para tal finalidade as declarações unilaterais apresentadas pelo executado na origem (Ids. 190618273 e 190618276), das quais não é possível depreender, com a segurança necessária, que o imóvel constrito é o único meio de subsistência da família. Neste sentido, friso que não foi juntada ao feito nenhuma nota fiscal corroborando a efetiva produção rural do executado e sua família no local. De fato, ao ler o teor da impugnação apresentada pela parte exequente no processo originário (Id. 190859273), há sérias dúvidas de que o imóvel constrito atende o referido requisito legal, mesmo porque “o executado, podendo fazê-lo, simplesmente deixou de apresentar documentos comprobatórios que a propriedade penhorada nos autos seja explorada em regime familiar, sendo que o executado poderia ter facilmente ter demonstrado por meio de notas fiscais, declaração de aptidão ao PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), comprovante de inscrição no Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF), fotografias ou quaisquer outros meios a indicar exploração agrícola ou pecuária produtiva”, além de que “o executado também poderia ter demostrado facilmente que o imóvel penhorado seja explorado em regime familiar através dos documentos que lhes são próprios, notadamente, certidão de declaração anual de rebanho, certidão de pequenos produtores da agricultura familiar, entre outros documentos” (sic). Além do mais, conforme delineado na impugnação da parte exequente recorrida, a propriedade em questão não seria o único meio de subsistência do executado e sua família, os quais explorariam diversas outras áreas, quais sejam: “1. FAZENDA DAS PALMEIRAS – Plantio De Milho (matrícula n. R-1/644 2. FAZENDA SÃO VALETIN – Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 6.147) 3. FAZENDA SÃO VALETIN – Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 9.834) 4. FAZENDA ZUCHI II – Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 12.065) 5. FAZENDA BOA SORTE - Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 1.499) 6. FAZENDA MEDIANEIRA II - Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 1297) 7. FAZENDA CHÁCARA WINGENBACH - Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 16.187) 8. FAZENDA DAS NEVES - Plantio De Soja em Grãos (Comodoro) 9. FAZENDA JUÍNA - Plantio De Soja em Grãos (Comodoro – 2.938.64,86 has)” (sic). A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso é uniforme no sentido de que, para o reconhecimento da impenhorabilidade, exige-se a comprovação de que o imóvel, além de atender ao critério da área, seja efetivamente explorado pela família em regime de economia familiar, o que não foi demonstrado. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA – REJEITADA A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DA PROPRIEDADE DO EXECUTADO E DETERMINADA A PENHORA SOBRE O IMÓVEL – ALEGADO BEM DE FAMÍLIA – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS – ÔNUS DO DEVEDOR – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural depende da satisfação cumulativa dos seguintes requisitos: 1) área de até 4 (quatro) módulos fiscais; 2) ser trabalhada pelo próprio titular da terra; e 3) servir de sustento ao agricultor e a sua família. O Superior Tribunal de Justiça considera que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu.” (N.U 1016480-19.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 12/08/2024) (destaquei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE – IMÓVEL CONSTRITO – ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE – NÃO COMPROVAÇÃO DO IMPLEMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS – SUSBTITUIÇÃO PENHORA – TÍTULOS APRESENTADOS INIDÔNEOS – AUSENTE COMPROVAÇÃO DA ATUAL TITULARIDADE E COTAÇÃO NO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS – ROL PREFERENCIAL DE CONSTRIÇÃO NÃO ABSOLUTO – EXECUÇÃO NO INTERESSE DO CREDOR – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A despeito da parte executada fundamentar a impenhorabilidade no inciso IV do art. 833 do CPC, a norma do referido inciso não se aplica ao caso, eis que se destina a bens móveis e não a bens imóveis. Não prospera o argumento de impenhorabilidade do inciso VIII do art. 833 do CPC (“a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família”) na medida em que a parte executada agravante não demonstra que satisfaz todos os requisitos necessários ao almejado reconhecimento da impenhorabilidade. No tocante à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, o e. STF ao apreciar o Tema 961, sob o rito da repercussão geral, fixou a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (ARE n. 1038507, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, j. 21.12.2020). O STJ firmou entendimento no sentido de que a impenhorabilidade pode e deve ser reconhecida, ainda que o imóvel tenha sido dado em garantia hipotecária, entretanto, devem ser preenchidos alguns requisitos, de forma cumulativa, quais sejam, a) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; b) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família; e, c) que o débito decorra de sua atividade produtiva. No caso, embora alegue, a parte recorrente agravante não traz prova nenhuma de que o imóvel constrito é explorado pela família, como meio de subsistência, o que afasta a alegada impenhorabilidade. Em relação os títulos apresentados pela parte executada agravante para substituição da penhora, em que pesem estejam lastreados em laudo pericial que confirma sua autenticidade, são de duvidosa idoneidade, não sendo possível aferir sua atual quantificação e legitimidade em favor da parte ofertante perante o BESC. Perfilho da bem colocada fundamentação da decisão recorrida no sentido de que, “considerando a recusa do exequente acerca da substituição da penhora, a execução deverá avançar sobre os bens indicados preferencialmente pela parte exequente, mormente ao considerar que pode ele recusar bens, conforme disposto no art. 848, IV, do CPC, e que a ordem estabelecida no art. 835 do CPC não tem caráter absoluto”, sendo que “em atenção ao princípio do interesse do credor, que norteia o processo de execução, deve ser privilegiada a penhora sobre o imóvel do executado, pois este confere maior liquidez e efetividade ao processo executivo”. Recurso desprovido. Decisão mantida.” (N.U 1004268-63.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/05/2024, Publicado no DJE 11/05/2024) (destaquei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – DECISÃO QUE REJEITOU O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL – NÃO DEMONSTRADAS CARACTERÍSTICAS DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Não se considera pequena propriedade rural (art. 5º, XXVI, CF/88 e art. 833, VIII, CPC) para fins de proteção pela regra de impenhorabilidade a área não trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar, ainda que de extensão territorial reduzida. Não verificadas as condições necessárias para a declaração de impenhorabilidade do imóvel, não comporta reforma a decisão que manteve a penhora.” (N.U 1014968-98.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/09/2024, Publicado no DJE 05/09/2024) (destaquei) Portanto, no que atine a alegada impenhorabilidade, impõe-se a manutenção da decisão recorrida, eis que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu. Além disso, diante da fundada dúvida do atendimento dos requisitos legais, não se faz presente a probabilidade do direito em relação à alegação de impenhorabilidade, a qual, a meu ver demandaria ação própria para dirimir a questão, e não mera alegação por incidente e comprovação via documentos. No que concerne à pretensão de alongamento da dívida, verifica-se que o pedido apresentado revela-se manifestamente extemporâneo. Com efeito, o executado, quando teve oportunidade processual própria, apresentou embargos à execução, os quais foram rejeitados por decisão já acobertada pelo manto da coisa julgada. Nessa oportunidade, não ventilou qualquer argumento atinente ao alegado direito ao alongamento ou prorrogação do débito, sendo certo que a tentativa de rediscussão da matéria, após lapso temporal considerável — superior a 16 anos desde o vencimento da obrigação —, não encontra amparo jurídico, além de afrontar os princípios da estabilidade e segurança jurídica que regem o processo executivo. No que toca ao alegado excesso de execução, igualmente não há falar em irregularidade, na medida em que a memória de cálculo colacionada aos autos (Id. 190859285) demonstra débito atualizado na ordem de R$2.549.313,99, montante que se apresenta proporcional à avaliação do imóvel, conforme indicou o próprio executado, ao estimar o bem em aproximadamente R$2.658.042,99. Assim, os valores apresentados mostram-se harmônicos e não evidenciam qualquer excesso a justificar acolhimento da insurgência. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 1015545-42.2025.8.11.0000

ID: 324801566

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1015545-42.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO DO SUDOESTE MT/PA - SICREDI SUDOESTE MT/PA

Acórdão

Advogados:

RIKELLE GOMES MAIA

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LUCIANO DE SALES

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FRANCISMAR SANCHES LOPES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015545-42.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Bem de Família, Cédula de Crédito Bancá… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015545-42.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Bem de Família, Cédula de Crédito Bancário, Expropriação de Bens] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [RODRIGO MOURA DE VARGAS - CPF: 817.475.940-91 (ADVOGADO), ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI - CPF: 462.522.580-91 (AGRAVANTE), COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO DO SUDOESTE MT/PA - SICREDI SUDOESTE MT/PA - CNPJ: 32.995.755/0001-60 (AGRAVADO), RIKELLE GOMES MAIA - CPF: 044.863.621-28 (ADVOGADO), FRANCISMAR SANCHES LOPES - CPF: 045.548.258-68 (ADVOGADO), LUCIANO DE SALES - CPF: 255.809.778-40 (ADVOGADO), ANTONIO FIDELIS DA SILVA ZAMO - CPF: 050.880.110-91 (TERCEIRO INTERESSADO), MARIA LUIZA PINZON ZAMO - CPF: 503.553.921-00 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL – PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE IMPENHORABILIDADE – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS – ÔNUS DO DEVEDOR – ALONGAMENTO DA DÍVIDA – PRETENSÃO EXTEMPORÂNEA – COISA JULGADA – EXCESSO DE EXECUÇÃO – INOCORRÊNCIA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Não há previsão legal para sustentação oral em recursos como o presente, nem mesmo no agravo de instrumento, por não se tratar de decisão que versa sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência (cf. art. 93, § 13, do RI-TJMT). Para o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural, nos termos do art. 5º, XXVI, da CF e do art. 833, VIII, do CPC, exige-se a comprovação cumulativa de que a área se enquadra como pequena propriedade, que é trabalhada pela família e que o débito decorre da atividade produtiva. No caso, o executado não se desincumbiu do ônus de comprovar tais requisitos. A pretensão de alongamento da dívida revela-se manifestamente extemporânea e acobertada pela coisa julgada, diante da rejeição anterior dos embargos à execução. Não há excesso de execução quando o valor do débito se mostra compatível com a avaliação do imóvel indicada pelo próprio executado. Recurso conhecido e desprovido. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1015545-42.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI AGRAVADA: COOPERATIVA DE CREDITO, POUPANCA E INVESTIMENTO DO SUDOESTE MT/PA - SICREDI SUDOESTE MT/PA RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI, em que insurge-se contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Comodoro, Juiz de Direito Substituto Ricardo Garcia Maziero, o qual rejeitou os argumentos do executado, dentre os quais a tese de impenhorabilidade, e manteve o leilão aprazado. A parte recorrente aduz a incorreção da decisão, aos argumentos, em suma, de que há impenhorabilidade da propriedade rural do agravante, por se tratar, segundo afirma, de pequena propriedade explorada economicamente por sua família. Diz que a impenhorabilidade alegada fundamenta-se nos artigos 5º, inciso XXVI, da Constituição da República e 833, inciso VIII, do Código de Processo Civil, os quais consagram a impenhorabilidade da pequena propriedade rural trabalhada pela família, inclusive para débitos oriundos da própria atividade produtiva. Sustenta que embora a matrícula do imóvel registre área superior a 400 hectares, os documentos atualizados, como o Cadastro Ambiental Rural, demonstram que a área aproveitável é significativamente inferior, correspondendo a cerca de 3,6 módulos fiscais, portanto, abaixo do limite de quatro módulos fiscais estabelecido pela legislação agrária e pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Explana que a propriedade cumpre sua função social; e que “além de prover um meio de subsistência, o trabalho familiar na propriedade rural ajuda a preservar a cultura rural e promove o desenvolvimento sustentável” (sic). Anota que a área é explorada diretamente pelo agravante e seus familiares, com cultivo de grãos como soja e milho, constituindo a principal fonte de renda de subsistência; e que o juízo de origem desconsiderou as provas produzidas quanto à dimensão real da área produtiva, aos documentos ambientais atualizados e à caracterização da atividade como agricultura familiar, requisitos que, se observados, demonstrariam a incidência da proteção legal invocada. Assevera que é devida a prorrogação da dívida rural, sendo que tem direito subjetivo ao alongamento compulsório das parcelas, conforme estabelecem a Súmula 298 do Superior Tribunal de Justiça e os dispositivos do Manual de Crédito Rural. No mais, defende que foram protocolados pedidos administrativos de prorrogação, acompanhados de laudos técnicos que evidenciam frustração de safra e incapacidade de adimplemento por motivos alheios à sua vontade, tais como intempéries climáticas e desequilíbrios de mercado; e que a negativa do pedido pelo juízo de primeiro grau ignora tanto a legislação especial quanto a jurisprudência consolidada que confere ao produtor o direito à reestruturação da dívida em situações excepcionais. Pede, liminarmente, a concessão de efeito suspensivo ao recurso, “a fim de SUSPENDER a ordem judicial de imissão de posse do arrematante, com a manutenção do Sr. ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI na posse do imóvel, até o pronunciamento definitivo desse Egrégio Tribunal De Justiça, em razão da impenhorabilidade da pequena propriedade rural do agravante” (sic). No mérito, requer que o recurso seja provido “para reformar a decisão atacada e determinar a anulação de todos os atos judiciais até então praticados nos autos do referido processo, desconstituindo a penhora, a arrematação, a imissão de posse e os lançamentos registrais já ordenados na matrícula do imóvel” (sic). Comprovação de recolhimento das custas de preparo no Id. 286738862. A liminar recursal foi por mim indeferida em 29/05/2025, nos termos da decisão Id. 289856398. Contraminuta da parte recorrida no Id. 295040380, rebatendo os argumentos recursais e aduzindo, em suma, a correção da decisão recorrida. Pedido de sustentação oral da parte recorrida na peça Id. 296895899. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Primeiramente, saliento que descabe o pedido de sustentação oral, eis que não há previsão de tal possibilidade de tal espécie recursal. Ademais, observa-se que não há justificação concreta, clara e objetiva quanto ao preciso motivo ensejador do pedido de retirada do processo da pauta de julgamento virtual para fins de sustentação oral, não sendo o mero requerimento, por si só, causa idônea e suficiente o bastante para exercício da defesa de forma oral, valendo aqui sobrelevar que não haverá cerceamento de defesa algum porque as razões do recurso são bastante claras e serão apreciadas de forma exauriente conforme será exposto adiante. Neste sentido, aliás, o STJ assinala que “a oposição ao julgamento virtual deve ocorrer sempre de forma fundamentada”, sob pena de indeferimento (STJ, AgInt no REsp nº. 1.934.689/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 20.09.2021). A propósito: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO – OPOSIÇÃO AO JULGAMENTO VIRTUAL E PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL – NÃO CABIMENTO – NULIDADE NÃO VERIFICADA – AUSÊNCIA DE PREJUÍZO – ALEGAÇÃO DE OMISSÃO – INEXISTÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 1.022 DO CPC – EMBARGOS REJEITADOS. “A oposição ao julgamento virtual deve ocorrer sempre de forma fundamentada. Além disso, não cabe a realização de sustentação oral em julgamento de agravo interno, não versando o caso sobre as hipóteses previstas no art. 937, § 3º, do CPC, relacionadas a processos de competência originária.” (STJ, AgInt no REsp n. 1.934.689/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 20.09.2021). Se não há qualquer vício a ser sanado, o recurso deve ser rejeitado, pois a matéria foi apreciada na oportunidade do acórdão recorrido, permitindo à parte, se assim desejar, a interposição futura de recurso dirigido às Cortes Excepcionais de Justiça." (N.U 1016554-73.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/10/2024, Publicado no DJE 07/10/2024) (destaquei) “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE. AUSÊNCIA DE SUSTENTAÇÃO ORAL. NÃO VERIFICADA. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido que não há, no ordenamento jurídico vigente, o direito de exigir que o julgamento ocorra por meio de sessão presencial. Portanto, o fato de o julgamento ter sido realizado de forma virtual, mesmo com a oposição expressa e tempestiva da parte, não é, por si só, causa de nulidade ou cerceamento de defesa. Ademais, mesmo nas hipóteses em que cabe sustentação oral, se o seu exercício for garantido e viabilizado na modalidade de julgamento virtual, não haverá nenhum prejuízo ou nulidade, ainda que a parte se oponha a essa forma de julgamento, porquanto o direito de sustentar oralmente as suas razões não significa o de, necessariamente, o fazer de forma presencial (AgRg no HC n. 832.679/BA, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 15/4/2024, DJe de 18/4/2024). 2. Nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração destinam-se a esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão e corrigir erro material eventualmente existentes no julgado, o que não se verifica no caso dos autos. 3. O acórdão embargado, de maneira clara e fundamentada, consignou que a parte agravante não rebateu a Súmula 83/STJ (rescisão de contrato e compra e venda de imóvel); Súmula 83/STJ (termo inicial dos aluguéis); Súmula 5/STJ (termo inicial dos aluguéis); e Súmula 7/STJ (termo inicial dos aluguéis). 4. A pretensão de rediscutir matéria devidamente abordada e decidida no julgado embargado, consubstanciada na mera insatisfação com o resultado da demanda, é incabível na via eleita. Embargos de declaração rejeitados.” (EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.600.312/SC, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 11/11/2024, DJe de 14/11/2024) 1. "No que tange à alegada nulidade, ante a falta de sustentação oral, verifica-se que a parte recorrente não demonstrou o prejuízo concreto decorrente da suposta violação, não havendo que se falar, no caso, em presunção. Precedentes." (STJ — 3 Turma — Aglnt no AREsp 989.214/SP — Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE — j. 21/10/2019, DJe 28/10/2019) Destarte, INDEFIRO o pedido de sustentação oral vindicado na peça retro. Conforme relatado, trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por Alderino de Amorim Capeletti, contra decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Comodoro, que rejeitou os argumentos de impenhorabilidade apresentados pelo executado e manteve o leilão do imóvel. O agravante alega, em síntese, que o imóvel penhorado é pequena propriedade rural explorada pela família, fazendo jus à proteção prevista no art. 5º, XXVI, da Constituição da República, e no art. 833, VIII, do CPC. Sustenta que, embora a matrícula indique área superior a 400 hectares, os documentos atualizados, como o Cadastro Ambiental Rural, apontam área aproveitável correspondente a cerca de 3,6 módulos fiscais, abaixo do limite legal de quatro módulos fiscais. Alega que o imóvel é explorado diretamente por ele e seus familiares com cultivo de soja e milho, sendo sua principal fonte de subsistência. Defende que o juízo de origem desconsiderou provas sobre a dimensão da área produtiva e a caracterização da propriedade como de agricultura familiar. Além disso, invoca o direito ao alongamento compulsório da dívida rural, nos termos da Súmula 298 do STJ e do Manual de Crédito Rural, ressaltando que apresentou pedidos administrativos de prorrogação acompanhados de laudos que atestam frustração de safra. Pede, no mérito, a reforma da decisão, com o reconhecimento da impenhorabilidade e a anulação dos atos expropriatórios. Eis o teor da decisão recorrida: “PETIÇÃO CÍVEL (241) 0001733-02.2008.8.11.0046 POLO ATIVO: COOPERATIVA DE CRÉDITO SICREDI SUDOESTE e outros (2) REPRESENTANTES POLO ATIVO: LUCIANO DE SALES - MT5911-B, FRANCISMAR SANCHES LOPES - MT1708-B, RIKELLE GOMES MAIA - MT29405/O e DANIEL VIEIRA GONCALVES - MT30304/O POLO PASSIVO: ALDERINO DE AMORIM CAPELETTI e outros (2) REPRESENTANTES POLO PASSIVO: RODRIGO MOURA DE VARGAS - MT14912-A, JOAO ALCIR RODRIGUES DE VARGAS - MT5881-A, SERGIO HENRIQUE GUARESCHI - MT9724-A, ILDO ROQUE GUARESCHI - MT5417-A e CARLOS ALBERTO MARKUS SILVA - MT16435-O DECISÃO Vistos. Compulsando os autos, entendo que os pedidos de formulados no ID 190616571 não merece acolhimento. Em relação ao pedido de impenhorabilidade do imóvel é desprovido de fundamento, pois o imóvel a ser leiloa não se enquadra em uma pequena propriedade rural, pois a área supera mais de 400 hectares, assim como não há nenhum arremedo de prova de que os devedores residem e exerçam exploração familiar no imóvel rural e, mesmo que assim o fosse, apenas uma parte do imóvel, poderia se cogitar eventual impenhorabilidade, o que não é o caso dos autos. Prosseguindo com à analise dos pedidos, verifica-se que não ficou evidenciado excesso de garantia nos autos, pois se trata de um divida original de R$ 239.595,89 (duzentos e trinta e nove mil, quinhentos e noventa e cinto reais e oitenta e nove centavos), que deverá passar por atualização, que atualmente está vencida a mais de 16 anos. Por final, o pedido de alongamento da divida também é infundado, pois além de ser intempestivo, em razão de ter sido requerido na época do vencimento da divida e, não agora, quase duas décadas após, os motivos que poderiam deflagrar o referido alongamento já estão albergados pela coisa julgada. Ante o exposto, INDEFIRO os pedidos de formulados no ID 190616571 e mantenho o leilão. Comodoro, datado e assinado digitalmente. RICARDO GARCIA MAZIERO Juiz de Direito Substituto” Pois bem. Analisando a insurgência recursal em seara de mérito, infere-se que não deve prosperar. No tocante à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, o e. STF ao apreciar o Tema 961, sob o rito da repercussão geral, fixou a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (ARE nº. 1038507, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, j. 21.12.2020 – negritei e grifei). O conceito de propriedade rural impenhorável está inserto no art. 5º, inc. XXVI, da CF, senão vejamos, verbis: “Art. 5º. [...] XXVI – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;” (negritei) De outro lado, o art. 833, inc. VIII, do CPC, assim dispõe, verbis: “Art. 833. São impenhoráveis: [...] VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;” (negritei) Nesse contexto, cediço que o STJ firmou entendimento no sentido de que a impenhorabilidade pode e deve ser reconhecida, entretanto, devem ser preenchidos alguns requisitos, de forma cumulativa, quais sejam, a) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; b) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família; e, c) que o débito decorra de sua atividade produtiva, senão vejamos, verbis: “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE IMÓVEL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. ÔNUS DA PROVA DO EXECUTADO DE QUE O BEM CONSTRITO É TRABALHADO PELA FAMÍLIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EXPLORAÇÃO FAMILIAR. DESNECESSIDADE DE O IMÓVEL PENHORADO SER O ÚNICO DE PROPRIEDADE DO EXECUTADO. JULGAMENTO: CPC/2015. [...] 3. Para reconhecer a impenhorabilidade nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (iii) que seja explorado pela família. Até o momento, não há uma lei definindo o que seja pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Diante da lacuna legislativa, a jurisprudência tem tomado emprestado o conceito estabelecido na Lei 8.629/1993, a qual regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. Em seu artigo 4ª, II, alínea "a", atualizado pela Lei 13.465/2017, consta que se enquadra como pequena propriedade rural o imóvel rural "de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento". [...] 5. A ausência de comprovação de que o imóvel penhorado é explorado pela família afasta a incidência da proteção da impenhorabilidade. [...] 7. A orientação consolidada desta Corte é no sentido de que o oferecimento do bem em garantia não afasta a proteção da impenhorabilidade, haja vista que se trata de norma de ordem pública, inafastável pela vontade das partes 8. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico e a demonstração da similitude fática entre o acórdão recorrido e os acórdãos paradigmas. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.” (REsp n. 1.913.236/MT, 3ª Turma, Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 16.03.2021 – negritei e grifei) “PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAL E LEGAL. AUSÊNCIA DE INTERPOSIÇÃO SIMULTÂNEA DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA 126/STJ. CARACTERIZAÇÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7/STJ. GARANTIA HIPOTECÁRIA. CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA E HIPOTECÁRIA. FINANCIAMENTO DA ATIVIDADE PRODUTIVA. IMPENHORABILIDADE. ARTS. 649, INCISO VIII, DO CPC DE 1973, E 5º, INCISO XXVI, DA CF/88. PROVIMENTO. 1. É inviável o recurso especial se a parte deixa de impugnar, pela via processual adequada, fundamento constitucional do acórdão recorrido (Súmula 126 do STJ). 2. Recurso especial cuja pretensão demanda reexame de matéria fática da lide, o que encontra óbice na Súmula 7 do STJ. 3. A pequena propriedade rural, trabalhada pela família, é impenhorável, ainda que dada pelos proprietários em garantia hipotecária para financiamento da atividade produtiva. Artigos 649, inciso VIII, do Código de Processo Civil anterior, e 5º, inciso XXVI, da Constituição Federal. 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt no AREsp n. 1.176.108/PR, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 18/9/2018, DJe de 25/9/2018) No caso, a despeito dos argumentos da parte executada agravante em sentido diverso, perfilho do teor da decisão recorrida. Com efeito, verifica-se que o requisito de que o imóvel penhorado é explorado pela família não resta seguramente demonstrado, não servindo para tal finalidade as declarações unilaterais apresentadas pelo executado na origem (Ids. 190618273 e 190618276), das quais não é possível depreender, com a segurança necessária, que o imóvel constrito é o único meio de subsistência da família. Neste sentido, friso que não foi juntada ao feito nenhuma nota fiscal corroborando a efetiva produção rural do executado e sua família no local. De fato, ao ler o teor da impugnação apresentada pela parte exequente no processo originário (Id. 190859273), há sérias dúvidas de que o imóvel constrito atende o referido requisito legal, mesmo porque “o executado, podendo fazê-lo, simplesmente deixou de apresentar documentos comprobatórios que a propriedade penhorada nos autos seja explorada em regime familiar, sendo que o executado poderia ter facilmente ter demonstrado por meio de notas fiscais, declaração de aptidão ao PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), comprovante de inscrição no Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF), fotografias ou quaisquer outros meios a indicar exploração agrícola ou pecuária produtiva”, além de que “o executado também poderia ter demostrado facilmente que o imóvel penhorado seja explorado em regime familiar através dos documentos que lhes são próprios, notadamente, certidão de declaração anual de rebanho, certidão de pequenos produtores da agricultura familiar, entre outros documentos” (sic). Além do mais, conforme delineado na impugnação da parte exequente recorrida, a propriedade em questão não seria o único meio de subsistência do executado e sua família, os quais explorariam diversas outras áreas, quais sejam: “1. FAZENDA DAS PALMEIRAS – Plantio De Milho (matrícula n. R-1/644 2. FAZENDA SÃO VALETIN – Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 6.147) 3. FAZENDA SÃO VALETIN – Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 9.834) 4. FAZENDA ZUCHI II – Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 12.065) 5. FAZENDA BOA SORTE - Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 1.499) 6. FAZENDA MEDIANEIRA II - Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 1297) 7. FAZENDA CHÁCARA WINGENBACH - Plantio De Soja em Grãos (matrícula n. 16.187) 8. FAZENDA DAS NEVES - Plantio De Soja em Grãos (Comodoro) 9. FAZENDA JUÍNA - Plantio De Soja em Grãos (Comodoro – 2.938.64,86 has)” (sic). A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso é uniforme no sentido de que, para o reconhecimento da impenhorabilidade, exige-se a comprovação de que o imóvel, além de atender ao critério da área, seja efetivamente explorado pela família em regime de economia familiar, o que não foi demonstrado. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – CÉDULA RURAL PIGNORATÍCIA – REJEITADA A ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DA PROPRIEDADE DO EXECUTADO E DETERMINADA A PENHORA SOBRE O IMÓVEL – ALEGADO BEM DE FAMÍLIA – PEQUENA PROPRIEDADE RURAL – NÃO COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS – ÔNUS DO DEVEDOR – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural depende da satisfação cumulativa dos seguintes requisitos: 1) área de até 4 (quatro) módulos fiscais; 2) ser trabalhada pelo próprio titular da terra; e 3) servir de sustento ao agricultor e a sua família. O Superior Tribunal de Justiça considera que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu.” (N.U 1016480-19.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 12/08/2024) (destaquei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE – IMÓVEL CONSTRITO – ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE – NÃO COMPROVAÇÃO DO IMPLEMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS – SUSBTITUIÇÃO PENHORA – TÍTULOS APRESENTADOS INIDÔNEOS – AUSENTE COMPROVAÇÃO DA ATUAL TITULARIDADE E COTAÇÃO NO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS – ROL PREFERENCIAL DE CONSTRIÇÃO NÃO ABSOLUTO – EXECUÇÃO NO INTERESSE DO CREDOR – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A despeito da parte executada fundamentar a impenhorabilidade no inciso IV do art. 833 do CPC, a norma do referido inciso não se aplica ao caso, eis que se destina a bens móveis e não a bens imóveis. Não prospera o argumento de impenhorabilidade do inciso VIII do art. 833 do CPC (“a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família”) na medida em que a parte executada agravante não demonstra que satisfaz todos os requisitos necessários ao almejado reconhecimento da impenhorabilidade. No tocante à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, o e. STF ao apreciar o Tema 961, sob o rito da repercussão geral, fixou a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (ARE n. 1038507, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, j. 21.12.2020). O STJ firmou entendimento no sentido de que a impenhorabilidade pode e deve ser reconhecida, ainda que o imóvel tenha sido dado em garantia hipotecária, entretanto, devem ser preenchidos alguns requisitos, de forma cumulativa, quais sejam, a) que a dimensão da área seja qualificada como pequena, nos termos da lei de regência; b) que a propriedade seja trabalhada pelo agricultor e sua família; e, c) que o débito decorra de sua atividade produtiva. No caso, embora alegue, a parte recorrente agravante não traz prova nenhuma de que o imóvel constrito é explorado pela família, como meio de subsistência, o que afasta a alegada impenhorabilidade. Em relação os títulos apresentados pela parte executada agravante para substituição da penhora, em que pesem estejam lastreados em laudo pericial que confirma sua autenticidade, são de duvidosa idoneidade, não sendo possível aferir sua atual quantificação e legitimidade em favor da parte ofertante perante o BESC. Perfilho da bem colocada fundamentação da decisão recorrida no sentido de que, “considerando a recusa do exequente acerca da substituição da penhora, a execução deverá avançar sobre os bens indicados preferencialmente pela parte exequente, mormente ao considerar que pode ele recusar bens, conforme disposto no art. 848, IV, do CPC, e que a ordem estabelecida no art. 835 do CPC não tem caráter absoluto”, sendo que “em atenção ao princípio do interesse do credor, que norteia o processo de execução, deve ser privilegiada a penhora sobre o imóvel do executado, pois este confere maior liquidez e efetividade ao processo executivo”. Recurso desprovido. Decisão mantida.” (N.U 1004268-63.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/05/2024, Publicado no DJE 11/05/2024) (destaquei) “AGRAVO DE INSTRUMENTO - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – DECISÃO QUE REJEITOU O PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL – NÃO DEMONSTRADAS CARACTERÍSTICAS DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Não se considera pequena propriedade rural (art. 5º, XXVI, CF/88 e art. 833, VIII, CPC) para fins de proteção pela regra de impenhorabilidade a área não trabalhada pela unidade familiar em caráter de agricultura de subsistência, nem habitada em caráter domiciliar, ainda que de extensão territorial reduzida. Não verificadas as condições necessárias para a declaração de impenhorabilidade do imóvel, não comporta reforma a decisão que manteve a penhora.” (N.U 1014968-98.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/09/2024, Publicado no DJE 05/09/2024) (destaquei) Portanto, no que atine a alegada impenhorabilidade, impõe-se a manutenção da decisão recorrida, eis que o ônus da prova é do executado de que o bem se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, bem como de que é trabalhado pela família, ônus do qual o devedor não se desincumbiu. Além disso, diante da fundada dúvida do atendimento dos requisitos legais, não se faz presente a probabilidade do direito em relação à alegação de impenhorabilidade, a qual, a meu ver demandaria ação própria para dirimir a questão, e não mera alegação por incidente e comprovação via documentos. No que concerne à pretensão de alongamento da dívida, verifica-se que o pedido apresentado revela-se manifestamente extemporâneo. Com efeito, o executado, quando teve oportunidade processual própria, apresentou embargos à execução, os quais foram rejeitados por decisão já acobertada pelo manto da coisa julgada. Nessa oportunidade, não ventilou qualquer argumento atinente ao alegado direito ao alongamento ou prorrogação do débito, sendo certo que a tentativa de rediscussão da matéria, após lapso temporal considerável — superior a 16 anos desde o vencimento da obrigação —, não encontra amparo jurídico, além de afrontar os princípios da estabilidade e segurança jurídica que regem o processo executivo. No que toca ao alegado excesso de execução, igualmente não há falar em irregularidade, na medida em que a memória de cálculo colacionada aos autos (Id. 190859285) demonstra débito atualizado na ordem de R$2.549.313,99, montante que se apresenta proporcional à avaliação do imóvel, conforme indicou o próprio executado, ao estimar o bem em aproximadamente R$2.658.042,99. Assim, os valores apresentados mostram-se harmônicos e não evidenciam qualquer excesso a justificar acolhimento da insurgência. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 0003986-40.2016.8.11.0059

ID: 256237484

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº Processo: 0003986-40.2016.8.11.0059

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 0003986-40.2016.8.11.0059 Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Assunto: [Homicídio Qualificado, Crimes do Sistema Naci… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 0003986-40.2016.8.11.0059 Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Assunto: [Homicídio Qualificado, Crimes do Sistema Nacional de Armas, Crime Tentado] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Turma Julgadora: [DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO - CPF: 024.979.551-58 (RECORRENTE), ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO - CPF: 024.979.551-58 (ADVOGADO), ARILDO COSTA MARIANO - CPF: 024.764.501-03 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU AS PRELIMINARES E, NO MÉRITO, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. DECISÃO DE PRONÚNCIA. LEGÍTIMA DEFESA NÃO COMPROVADA DE FORMA INEQUÍVOCA. QUALIFICADORAS MANTIDAS. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADOS. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso em Sentido Estrito interposto contra decisão que pronunciou o recorrente pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do CP, e art. 14 da Lei nº 10.826/03, submetendo-o a julgamento pelo Tribunal do Júri. 2. O recorrente sustenta, preliminarmente, a nulidade da pronúncia por ausência de laudo de exame de corpo de delito. No mérito, requer o afastamento das qualificadoras do homicídio, a desclassificação da conduta para lesão corporal, o reconhecimento da excludente de ilicitude da legítima defesa e a absolvição pelo crime de porte ilegal de arma de fogo, sob o argumento de inexistência de apreensão da arma. Subsidiariamente, pleiteia a aplicação do princípio da consunção entre os crimes. II. Questão em discussão 3. O recurso discute: (I) a ausência de materialidade do homicídio tentado diante da suposta inexistência do laudo de exame de corpo de delito; (II) a exclusão das qualificadoras do motivo fútil e do recurso que dificultou a defesa da vítima; (III) a desclassificação do delito de tentativa de homicídio para lesão corporal; (IV) o reconhecimento da excludente de legítima defesa; e (V) a absolvição pelo crime de porte ilegal de arma de fogo em razão da inexistência de apreensão da arma; (VI) a aplicação do princípio da consunção em relação ao crime de porte ilegal de arma de fogo. III. Razões de decidir 4. O exame de corpo de delito foi realizado e consta nos autos. No entanto, a ausência do exame de corpo de delito não inviabiliza a pronúncia, desde que a materialidade delitiva esteja suficientemente demonstrada por outros meios de prova, como, no presente caso, laudos médicos, depoimentos testemunhais e exame complementar indireto. 5. A pronúncia exige apenas prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, cabendo ao Tribunal do Júri a análise aprofundada das teses defensivas, incluindo a alegação de legítima defesa. 6. O reconhecimento da legítima defesa depende de prova cabal da injusta agressão atual ou iminente e da moderação na resposta, o que não restou demonstrado, pois há depoimentos que indicam que a vítima já estaria afastada da confusão quando foi atingida pelo disparo. Logo, não se mostra cristalina e sem controvérsias a alegada excludente, não havendo comprovação de agressão iminente perpetrada pela vítima. 7. A desclassificação para lesão corporal exige prova inequívoca da ausência de animus necandi, o que não ocorre na hipótese, considerando que os elementos probatórios retratam uma possível intenção do recorrente ou, no mínimo, o risco por ele assumido de produzir o resultado morte da vítima. 8. As qualificadoras do motivo fútil e do recurso que dificultou a defesa da vítima devem ser mantidas, porquanto, em tese, há elementos suficientes indicando que o crime decorreu de desavença motivada por ciúmes e que a vítima teria sido atingida de surpresa, sem possibilidade de reação. 9. O porte ilegal de arma de fogo pode ser demonstrado por outros meios de prova, como depoimentos e confissão do réu, sendo dispensável a apreensão do armamento. 10. O crime de porte ilegal de arma de fogo não se restringiu ao momento da tentativa de homicídio, porquanto, as provas indicam que o recorrente já portava a arma anteriormente, o que afasta a aplicação do princípio da consunção. IV. Dispositivo e tese 11. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A ausência de exame complementar de corpo de delito não impede o reconhecimento da materialidade do crime, desde que comprovada por outros meios. 2. A decisão de pronúncia deve ser mantida quando houver indícios suficientes de autoria e materialidade, cabendo ao Tribunal do Júri a análise aprofundada das teses defensivas. 3. A exclusão das qualificadoras na pronúncia somente é possível quando manifestamente improcedentes, o que não ocorre quando há elementos probatórios mínimos que indiquem sua incidência. 4. A legítima defesa deve ser comprovada de forma inequívoca, não bastando alegação isolada do réu para afastar sua submissão ao Tribunal do Júri. 5. O crime de porte ilegal de arma de fogo não é absorvido pelo homicídio tentado quando a posse da arma não se restringe ao momento da execução do delito. 6. A apreensão da arma de fogo não é imprescindível para a configuração do crime de porte ilegal de arma de fogo quando sua existência e utilização forem demonstradas por outros meios de prova.” Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 158 e 413; CP, arts. 25, 121, § 2º, II e IV, e 14, II; Lei nº 10.826/03, art. 14. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, HC 196.302/PB, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 21.05.2013, DJe 05.06.2013; STJ, AgRg no AREsp 1150203/PE, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 10.04.2018, DJe 20.04.2018; TJMT, RSE 0001964-24.2005.8.11.0017, Rel. Des. Orlando de Almeida Perri, Primeira Câmara Criminal, j. 05.12.2023, DJE 11.12.2023. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES (RELATOR). Egrégia Câmara: Trata-se de RECURSO EM SENTIDO ESTRITO interposto por ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO contra a decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Comarca de Porto Alegre do Norte/MT, no bojo da Ação Penal nº 0003986-40.2016.8.11.0059, que o pronunciou pela prática do crime previsto no artigo 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, e art. 14 da Lei n° 10.826/03, sujeitando-o a julgamento perante o Egrégio Tribunal do Júri. Em suas razões recursais, o requerente alega, preliminarmente, a ausência de materialidade do delito de homicídio, em razão da inexistência do laudo de exame de corpo de delito da vítima. No mérito, pugna pela reforma da decisão para afastamento das qualificadoras do homicídio (motivo fútil e recurso que dificultou a defesa da vítima), com a consequente desclassificação da conduta para homicídio simples. Sustenta, ainda, que não há comprovação da materialidade do crime de porte ilegal de arma de fogo, uma vez que não houve a apreensão da suposta arma utilizada nos fatos. Alternativamente, pleiteia a aplicação do princípio da concussão entre os crimes, sob a justificativa de que a posse da arma de fogo decorreu do temor do recorrente em relação à vítima e seus amigos, havendo nexo de dependência entre os delitos. Requer, ainda, o reconhecimento da excludente de ilicitude da legítima defesa e, subsidiariamente, pleiteia o reconhecimento da ausência de dolo na conduta, sustentando que a dinâmica dos fatos não indica a intenção de matar, pois o disparo único cessou as agressões sofridas pelo recorrente, afastando, assim, o animus necandi e possibilitando a desclassificação para lesão corporal. Em contrarrazões, o Ministério Público requereu o desprovimento do recurso, a fim de que seja mantida a sentença de pronúncia em todos os seus termos. Ao exercer o juízo de retratação, o magistrado singular manteve na íntegra o decisum objurgado, conforme se observa no Id. 226145682. A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso. É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO Egrégia Câmara: PRELIMINAR – AUSÊNCIA DE LAUDO DE EXAME DE CORPO DE DELITO O recorrente, preliminarmente, suscita a ausência de materialidade do delito de homicídio, em razão da inexistência do laudo de exame de corpo de delito da vítima. Argumenta, ainda, que a vítima não se disponibilizou a realizar um exame pericial complementar, deixando, portanto, de comprovar a materialidade do delito. Entretanto, tal insurgência não merece prosperar. Conforme dispõe o artigo 158 do Código de Processo Penal, quando a infração deixar vestígios, como no caso dos crimes dolosos contra a vida, a prova da materialidade delitiva, em regra, dá-se com o exame de corpo de delito. Todavia, o Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento no sentido de que “apesar de relevante para a comprovação dos crimes de resultado, a realização do exame de corpo de delito não é imprescindível para a comprovação da materialidade delitiva, não podendo sua não-realização impedir a persecução criminal em juízo” (HC 196.302/PB, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 21/05/2013, DJe 05/06/2013). Assim, é cediço que a ausência do exame de corpo de delito não tem o condão de inviabilizar a pronúncia do réu, desde que haja nos autos elementos probatórios idôneos que permitam a constatação da materialidade delitiva. No caso em tela, verifica-se que, ao contrário do que sustenta da defesa, a vítima foi submetida a exame de corpo de delito, que se encontra encartado no Id. 226145175 – Pág. 22/25. No mais, ainda que não houvesse o exame de corpo de delito, tenho que a materialidade do crime resta suficientemente demostrada por meio do boletim de ocorrência (Id. 226145175 – Pág. 8/9), do exame complementar indireto (Id. 226145176 – Pág. 5/11), do prontuário médico (Id. 226145176 – Pág. 38/40), do exame de tomografia computadorizada de pescoço (Id. 226145176 – Pág. 41/42) e pelas declarações prestadas durante toda a persecutio criminis. Dessa forma, entendo que a alegação de nulidade do processo por ausência de exame de corpo de delito não merece prosperar, motivo pelo qual a rejeito. MÉRITO Infere-se da peça acusatória que: “No dia 25 de maio de 2014, por volta das 21 horas, no interior do estabelecimento conhecido como “Distribuidora Coca-Cola” situado na Rua Porto Seguro, centro, cidade de Confresa/MT, comarca de Porto Alegre do Norte/MT, ARMANDO MARTINS DA SILVA tentou matar Arildo Costa Mariano mediante disparo de arma de fogo e movido por motivo fútil e valendo-se de recurso que dificultou a defesa da vítima, não conseguindo atingir seu intento por circunstâncias alheias a sua vontade, causando os ferimentos descritos a fls. 12/14 e complementado pela narrativa de fls. 59. Ainda, nas mesmas condições fáticas descritas no parágrafo anterior, ARMANDO MARTINS DA SILVA trazia consigo, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, uma arma de fogo calibre 38, não apreendida, mas empregada na conduta delitiva descrita no parágrafo anterior. Conforme consta dos autos, ARMANDO MARTINS DA SILVA estava no local dos fatos com Danilo Martins Lima e outros amigos, momento em que chegou ao local a vítima Arlindo Costa Mariano, acompanhada de Diego Rogers Gomes dos Santos e outras pessoas. Danilo e Diego já detinham inimizade anterior protagonizada pelo envolvimento de ambos com Wádila Bernardo, vulgo “neguinha”. Ao se cruzarem no lugar dos fatos, e em razão dos conflitos existentes, Diego e Danilo começaram a discutir, momento em que Danilo empurrou Diego e o atrito escalou para uma briga entre os dois. A vítima Arildo Costa Mariano, junto com a testemunha “Arroz” tentaram apaziguar os ânimos de Danilo e Diego, sem sucesso. Aproveitando-se que a confusão tomava toda a atenção de Arlindo, ARMANDO MARTINS DA SILVA, dirigiu-se ao seu veículo onde portava a arma calibre 38, momento em que mirou contra a vítima e disparou, ocasionando as lesões descritas no exame de corpo de delito.O tiro pegou Arlindo de surpresa porque apenas conseguiu visualizar ser o alvo segundos antes do disparo. Arlindo apenas não faleceu porque foi imediatamente socorrido pelos presentes, enquanto ARMANDO MARTINS DA SILVA partiu em disparada visando evitar sua responsabilização. A futilidade de sua conduta denota-se pela desproporção entre uma briga envolvendo seus conhecidos e a frieza com que tentou executar a vítima. Interrogado, ARMANDO MARTINS DA SILVA apresenta versão fantasiosa indicando que a vítima estaria armada, mas não apenas nenhuma arma foi apreendida com a vítima como as demais testemunhas não corroboram tais afirmações.” (Sic) Ao final da primeira fase do procedimento bifásico do Tribunal do Júri, o magistrado singular pronunciou o recorrente Armando Martins da Silva Neto pela prática dos crimes previstos no artigo 121, § 2º, II e IV, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, e art. 14, da Lei n° 10.826/03. Irresignado, o recorrente requereu a absolvição sumária, alegando que agiu acobertado pela excludente de ilicitude dalegítima defesa. Subsidiariamente, requer a desclassificação da conduta para o delito de lesão corporal. Requer, ainda, a aplicação do princípio da consunção o entre os crimes e, por fim, o afastamento das qualificadoras do motivo fútil e do recurso que dificultou a defesa da vítima, sob o argumento de ausência de elementos probatórios suficientes para fundamentá-las. Diante de tal exposição fáctica, passo à análise do mérito do presente recurso. É cediço que a pronúncia é uma decisão interlocutória e, portanto, não encerra a análise do mérito da causa. Trata-se de mero juízo de admissibilidade, através do qual, por meio de uma decisão monocrática, o magistrado reconhece a presença da prova da materialidade e indícios de autoria de um crime doloso contra a vida, submetendo, nessa hipótese, o recorrente a julgamento perante o Tribunal do Júri, juiz natural da causa. Isso porque a pronúncia não se apresenta como sentença definitiva, mas interlocutória, por meio da qual o magistrado, embora devendo fundamentar seu convencimento, apenas proclama a possibilidade do acusado ser julgado pelo Tribunal do Júri, prescindindo do juízo de certeza, vinculando-se a admissibilidade, tão somente, quanto à existência da materialidade do delito e indícios de autoria por parte do acusado, conforme dispõe o artigo 413, caput, do Código de Processo Penal. Desse modo, na eventualidade de existir qualquer dúvida acerca da autoria delitiva, existência ou não, da excludente de criminalidade, cabimento, ou não, da desclassificação, compete ao Júri Popular analisar tais questões, porquanto é o juízo natural e constitucional dos crimes contra a vida, sob pena de nulidade, por excesso. Como já asseverado, na fase da pronúncia, somente é cabível o acolhimento da tese da absolvição sumária com amparo na excludente de ilicitude da legítima defesa, ou a pronta desclassificação do delito, quando o conjunto probatório mostra a ocorrência de qualquer destas teses, de maneira inequívoca (N.U 1021001-12.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 30/03/2022, publicado no DJE 01/04/2022). Sabe-se que a legítima defesa consiste na ação de alguém que, utilizando-se moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem, nos termos do artigo 25 do Código Penal. No presente caso, não há elementos que comprovem de forma cabal que o recorrente agiu sob a excludente de ilicitude de legítima defesa, especialmente diante da ausência de indicativos que evidenciem ter ele agido para repelir uma injusta agressão, atual ou eminente, por parte da vítima. O acusado Armando Martins da Silva Neto declarou, em juízo, que, no dia dos fatos, estava no local do suposto crime consumindo bebida alcoólica. Em determinado momento, um grupo de pessoas chegou ao ambiente, o que lhe despertou medo, haja vista um entrevero ocorrido anteriormente entre os grupos — um ligado à vítima e outro ao interrogando. Diante do clima tenso que pairava sobre o local, decidiu sair, instante em que o grupo ligado à vítima iniciou uma rixa. Nesse contexto, Danilo, amigo do denunciado, foi perseguido pelo ofendido, o qual, segundo o interrogando, portava uma arma de fogo. Diante da situação, o réu, ao se apossar de uma arma de fogo que estava com um terceiro indivíduo, efetuou um disparo para o alto, com o intuito de cessar a briga. Contudo, devido à baixa luminosidade do local e ao seu estado de embriaguez, acabou por atingir o ofendido. Após os fatos, fugiu do local. A vítima Arildo Costa Mariano declarou, em juízo, que, no dia dos fatos, estava acompanhado de Diego e outros amigos, quando Diego percebeu que Danilo, amigo do acusado, estava com uma garota com quem ele se relacionava. Diego então foi tirar satisfação com Danilo, e a discussão se intensificou. Arildo tentou intervir para acalmar a situação, mas sem sucesso. Em certo momento, ao se afastar da confusão, viu o réu apontando uma arma de fogo em sua direção e, em seguida, foi atingido pelo disparo. Relatou, ainda, que, dias antes do ocorrido, teve uma discussão com o acusado devido a uma disputa envolvendo a mesma garota, que mantinha relacionamento tanto com Diego quanto com Danilo. Após esse desentendimento, passou a ser ameaçado pelo réu e seus amigos. Por fim, afirmou que, no momento dos fatos, não estava armado. A testemunha Junio Cesar Moreira Pietrobon declarou, em juízo, que, no dia dos fatos, estavam juntos consumindo bebidas alcoólicas desde o início da tarde na casa de um amigo. No decorrer do dia, Diego, um dos presentes, sugeriu que fossem até uma distribuidora, sem que soubessem previamente que o grupo de Armando estava lá. Ao chegarem, Diego insistiu em se aproximar de uma mulher com quem havia tido um relacionamento anteriormente para tirar satisfação, o que desencadeou uma briga generalizada. Diego agrediu Danilo, que estava na mesa com Armando, e Arildo também se envolveu na confusão, atacando Danilo. A briga se espalhou, com agressões mútuas entre os grupos. Em meio à confusão, Arildo tropeçou e se afastou do tumulto e, nesse momento, Armando, posicionado próximo a um veículo, efetuou um disparo de arma de fogo que atingiu Arildo, que caiu imediatamente. A testemunha Diego Roger Gomes dos Santos declarou, em juízo, que, no dia dos fatos, aproximou-se da mesa onde estavam Danilo, amigo do acusado, e o réu, com a intenção de conversar com sua ex-companheira, Wádila. Nesse momento, Danilo iniciou uma discussão com ele, que evoluiu para uma briga generalizada. Durante o tumulto, o acusado, que estava afastado, efetuou um disparo de arma de fogo contra a vítima. Diego afirmou ter visto o réu procurando a vítima enquanto mirava para atirar. Em juízo, a testemunha Danilo Martins Lima declarou que, antes dos fatos, teve uma confusão com Diego devido a um suposto relacionamento com a ex-companheira deste. Em razão do ocorrido, tanto ele quanto o acusado comunicaram o caso às autoridades policiais. No dia do crime, Danilo estava na companhia do réu quando o grupo de Diego, incluindo a vítima, chegou ao local. Diante da situação, ele e o acusado acionaram a Polícia Militar. Em seguida, de maneira inesperada, o grupo de Diego passou a agredi-lo fisicamente. Ao encontrar uma oportunidade, conseguiu fugir correndo e, nesse momento, ouviu um disparo de arma de fogo efetuado pelo acusado. A testemunha Uanderson Diavani Becker afirmou, na fase policial, que, no dia do crime, a vítima estava um pouco afastada da confusão quando o acusado, apoiando a arma de fogo sobre um veículo, efetuou um disparo contra o ofendido. A testemunha Daniel Pereira Cruz Junior relatou, em juízo, que, no dia dos fatos, a confusão envolvia apenas Diego (amigo da vítima) e Danilo (amigo do acusado), não sendo uma briga generalizada. Ao tentar separar os dois, ouviu o disparo efetuado pelo réu. Relatou ainda que, no momento do disparo, a vítima estava afastada da briga. Retratada a situação fática, destaco que, como já mencionado, a tese de legítima defesa nos termos do artigo 25 do Código Penal, exige prova inequívoca de que o agente tenha agido para repelir uma injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou de terceiro, utilizando-se dos meios necessários e de forma moderada. Todavia, no caso em análise, não se verificam elementos que autorizem, de forma inequívoca, o reconhecimento dessa excludente. Isso porque, conforme demonstram os depoimentos colhidos, não há provas cabais de que o acusado tenha agido para repelir injusta agressão atual ou iminente por parte da vítima. Ao contrário, os elementos constantes nos autos indicam que o réu, munido de arma de fogo, efetuou um disparo que atingiu a vítima quando esta já se encontrava afastada da briga, sem oferecer risco iminente ao recorrente ou a terceiros. Ademais, as próprias declarações do acusado evidenciam uma narrativa inconsistente e contraditória, na medida em que, em um primeiro momento, alega ter efetuado um disparo para o alto com o propósito de dispersar a briga, enquanto, posteriormente, afirma que, em razão da baixa luminosidade e de seu estado de embriaguez, acabou efetuando o disparo em direção da vítima. Essa contradição reforça a inexistência de qualquer elemento fático que demonstre, de forma inequívoca, a presença dos requisitos exigidos pelo artigo 25 do Código Penal para a caracterização da legítima defesa. Outro ponto que merece destaque é que a ação do recorrente não se limitou à mera tentativa de repelir uma injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou de terceiros. Ao contrário, ele se utilizou de uma arma de fogo, a qual sequer estava em sua posse inicialmente e efetuou um disparo contra a vítima. Tal circunstância demonstra uma atitude claramente ofensiva e desproporcional, incompatível com a tese defensiva. No mais, no tocante à alegação de que o acusado apenas tentou intervir para cessar a briga entre terceiros, não há nos autos qualquer elemento que sustente essa versão. As provas testemunhais colhidas indicam que a vítima já havia se afastado da confusão quando foi atingida pelo disparo, o que afasta a suposta necessidade de agir em defesa de outrem. Assim, não se verifica, de forma inequívoca, a presença de elementos que amparem o reconhecimento da legítima defesa, sendo inviável o acolhimento da tese de absolvição sumária nesta fase processual. Com efeito, como já salientado, as dúvidas acerca da presença ou não de excludentes de ilicitude devem ser apreciadas pelo Tribunal do Júri, sob pena de indevida supressão da competência constitucional do juízo natural. Nesse contexto, é relevante destacar que, na fase de pronúncia, não se exige um juízo de certeza sobre a culpabilidade do acusado, mas apenas a presença de indícios suficientes de autoria e materialidade, os quais, no caso em tela, estão devidamente demonstrados. Do exposto, conclui-se que não há prova inequívoca da existência de eventual excludente de ilicitude, situação essa que não permite o acolhimento da tese de legítima defesa, nesta fase processual, devendo a questão ser analisada e decidida pelo juízo natural. Nesse sentido, veja-se o entendimento jurisprudencial aplicável em casos tais: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – DECISÃO DE PRONÚNCIA – HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DO OFENDIDO – PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA – ALEGADA LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA – EXISTÊNCIA DE DÚVIDA RAZOÁVEL QUANTO À PRESENÇA DO ANIMUS NECANDI – PREQUESTIONAMENTO – PRECEITOS NORMATIVOS OBSERVADOS E INTEGRADOS À FUNDAMENTAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO, EM PARCIAL CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL Não estando nitidamente demonstrada, pelas provas coligidas ao longo da fase do judicium accusationis, a excludente de ilicitude da legítima defesa putativa, é de se manter intacta a decisão de pronúncia, conferindo ao Tribunal do Júri a soberania e a autonomia que lhe são ínsitas para resolver as matérias correlatas aos crimes dolosos contra a vida. (TJ-MT - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO: 0001964-24.2005.8.11.0017, Relator: ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Data de Julgamento: 05/12/2023, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 11/12/2023) No mais, em relação ao pedido de desclassificação do delito de tentativa de homicídio para o de lesão corporal, consigno que a doutrina e jurisprudência majoritárias disciplinam que o reconhecimento da desclassificação do delito de tentativa de homicídio para outro delito que não seja doloso contra a vida somente é possível quando restar cabalmente evidenciada a ausência de animus necandi na conduta do agente. Neste momento processual, em que não se exige um aprofundado exame das provas, não vislumbro que o animus necandi possa ser afastado de plano, considerando que os elementos probatórios já mencionados retratam a possível intenção do recorrente ou, no mínimo, o risco por ele assumido de produzir o resultado morte da vítima. Noutras palavras, nesta fase, não é possível auferir que o recorrente pretendia apenas lesionar o ofendido, devendo a palavra final sobre a questão ser dada pelo Tribunal do Júri, juízo natural e constitucional dos crimes contra a vida. Conclusivamente, a despeito dos argumentos defensivos, não há como concluir pela pronta ausência de animus necandi, porquanto, como já mencionado, há mais de uma versão sobre os fatos, sendo uma delas no sentido de que o acusado teria dolosamente tentado matar a vítima. Isso porque os depoimentos das testemunhas indicam que a vítima já havia se afastado da confusão quando o acusado, mirando em sua direção, efetuou o disparo. Portanto, deve ser mantida a decisão de pronúncia, pois compete ao Conselho de Sentença aferir se o agente agiu com animus necandi ou laedendi. Desta forma, em atenção ao disposto no artigo 413, caput, do Código de Processo Penal, cumpre submeter o recorrente a julgamento pelo Tribunal do Júri, pois, além de prova da materialidade, há indícios suficientes de autoria, cabendo aos jurados analisar as teses que porventura venham a ser sustentadas na sessão de julgamento. Ademais, com relação ao pedido de exclusão das qualificadoras do motivo fútil e do recurso que dificultou a defesa da vítima, descritas no § 2º, incisos II e IV, do art. 121 do Código Penal, a jurisprudência é clara no sentido de que só pode ser excluída da sentença de pronúncia, quando manifestamente improcedente e de todo descabida, sob pena de usurpação da competência constitucionalmente atribuída ao Tribunal do Júri. Quando houver a mínima possibilidade da ocorrência da qualificadora combatida, sua eventual exclusão só poderá ser feita pelo juízo natural. Veja-se o entendimento jurisprudencial do colendo Superior Tribunal de Justiça, aplicável ao caso em pauta: “AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JÚRI. PRONÚNCIA. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA. PROVIDÊNCIA PERMITIDA APENAS NOS CASOS DE SEREM MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTES. COMPETÊNCIA DO CONSELHO DE SENTENÇA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DE PROVAS. ÓBICE DA SÚMULA N. 7/STJ. RECURSO IMPROVIDO. (...) 2. Em respeito ao princípio do juiz natural, somente é cabível a exclusão das qualificadoras na decisão de pronúncia quando manifestamente descabidas, porquanto a decisão acerca da sua caracterização ou não deve ficar a cargo do Conselho de Sentença, conforme já decidido por esta Corte. (...). (STJ - AgRg no AREsp: 1150203 PE 2017/0211352-8, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 10/04/2018, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/04/2018)” No mesmo sentido, foi firmando o Enunciado Orientativo n.º 2, da Turma de Câmeras Criminais Reunidas deste Egrégio Tribunal de Justiça que dispõe: “somente se admite a exclusão das qualificadoras na pronúncia quando manifestamente improcedentes, sob pena de se suprimir a competência constitucional do Tribunal do Júri.”. Logo, somente é permitido o decote de qualificadoras quando essas se mostrarem totalmente improcedentes, no caso concreto. In casu, o conjunto probatório é suficiente para indicar a possibilidade de incidência da qualificadora do motivo fútil, porquanto é possível vislumbrar, em princípio, uma conotação de que a motivação para a suposta prática delitiva seria fútil, pois o crime foi perpetrado em virtude de uma briga motivada por ciúmes, por relacionamento de terceiros, justificando, assim, a manutenção da circunstância qualificadora para ser analisada pelo juízo natural quanto a sua procedência, ou não. Quanto à qualificadora de recurso que impossibilitou a defesa da vítima, observa-se que os elementos coligidos durante a instrução criminal, também, são suficientes para indicar a possibilidade de incidência da qualificadora, isso porque, de acordo com as circunstâncias apuradas, há fortes indícios de que a vítima foi atacada de surpresa, sem que pudesse esboçar qualquer reação defensiva, devendo, portanto, ser mantida a referida qualificadora. Dessa maneira, presentes indícios mínimos da incidência das referidas qualificadoras, impõe-se reconhecer a competência do Conselho de Sentença para apreciar a controvérsia Quanto ao pedido de absolvição sumária em relação ao crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, uma vez que não houve a apreensão da arma e, subsidiariamente, em observância ao princípio da consunção, alegando, em síntese, que a arma foi adquirida nas vésperas dos fatos, ou seja, no dia anterior, justamente para se defender porque temia por sua vida, temos que não procede. O crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido não exige, para sua configuração, a apreensão do armamento, podendo sua materialidade ser demonstrada por outros meios de prova admitidos no ordenamento jurídico. Nesse sentido, colaciono o entendimento jurisprudencial aplicável ao caso em questão: “A apreensão da arma de fogo de uso permitido é dispensável para fins de configuração do crime previsto no artigo 14 da Lei nº 10.826/2003, sempre que a efetiva utilização da arma ilegalmente portada restar demonstrada por outros meios de prova. Precedentes do STF.” (STJ - HC: 170543 CE 2010/0075834-1, Relator.: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Julgamento: 21/10/2014, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/11/2014) “A apreensão da arma de fogo é dispensável para a configuração do crime de porte ilegal de arma de fogo, previsto no art . 14 da Lei 10.826/2003, quando a efetiva utilização da arma ilegalmente portada restar demonstrada por outros meios de prova, como a prova testemunhal, filmagens da conduta delitiva e confissão dos réus. (TJ-DF 07001093920218070010 DF 0700109-39.2021.8 .07.0010, Relator.: CARLOS PIRES SOARES NETO, Data de Julgamento: 05/08/2021, 1ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 18/08/2021) No caso concreto, há um conjunto probatório sólido que comprova a posse do armamento pelo réu, uma vez que há relatos testemunhais indicando que o acusado portava a arma antes mesmo da data da tentativa de homicídio, além de o próprio acusado ter confessado que adquiriu a arma na véspera dos fatos. Dessa forma, a alegação de que a ausência de apreensão da arma comprometeria a comprovação da materialidade não se sustenta, pois há provas consistentes e suficientes para demonstrar tanto a autoria quanto a materialidade do delito. Ademais, a defesa, subsidiariamente, sustenta que o crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido deveria ser absorvido pelo delito de tentativa de homicídio, sob o argumento de que a posse do armamento teria ocorrido exclusivamente para fins de autodefesa. No entanto, para que seja possível aplicar o princípio da consunção, seria necessário comprovar que o porte da arma ocorreu exclusivamente como um meio necessário para a execução do delito subsequente, sem qualquer autonomia entre as condutas. No presente caso, não há qualquer elemento que indique essa vinculação direta, eis que, como já mencionado, os elementos constantes nos autos evidenciam que a arma foi adquirida na semana anterior ao crime, o que demonstra que o porte do armamento não se restringiu ao momento da tentativa de homicídio, mas sim ocorreu de maneira autônoma e anterior ao evento criminoso. Assim, se o acusado já portava o armamento antes mesmo da consumação do crime contra a vida, não se pode afirmar que o porte tenha sido exclusivamente um instrumento da ação homicida. No mais, conforme entendimento deste Egrégio Tribunal de Justiça, a aplicação do princípio da consunção demanda uma análise aprofundada do conjunto probatório para verificar se a arma de fogo foi adquirida exclusivamente para a prática do crime de homicídio, sendo essa competência reservada ao Conselho de Sentença, inclusive em relação aos crimes conexos, sob pena de afronta aos princípios constitucionais da soberania dos veredictos e da competência do Tribunal do Júri para apreciação dos crimes dolosos contra a vida e os que lhe são conexos. A propósito, cito a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça sobre o tema: “Conforme precedentes deste Egrégio Tribunal de Justiça, a análise sobre a consunção deve ser reservada ao Tribunal do Júri, diante da necessidade de exame aprofundado das provas e da autonomia das condutas delitivas.” (N.U 1025113-19.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 26/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) “Havendo dúvidas quanto ao nexo entre as condutas, ou seja, sendo necessário o exame aprofundado da prova para fins de aplicação do princípio da consunção, a análise da possível consunção entre os delitos de homicídio e porte ilegal de arma de fogo deverá ser reservada ao eg. Tribunal do Júri, a quem compete solucionar as questões casuísticas dos crimes dolosos contra vida e daqueles que lhes forem conexos” (TJMT, RSE nº 1011812-64.2022.8.11.0003). Recurso desprovido. (N.U 0002316-45.2016.8.11.0033, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 03/09/2024, Publicado no DJE 09/09/2024) Dessa forma, com fulcro no art. 78, inciso I, do Código de Processo Penal, cabe ao Tribunal do Júri julgar o crime doloso contra a vida e os crimes conexos, como o delito de posse irregular de arma de fogo. A presença de indícios de autonomia entre as condutas — posse prévia e manutenção da arma independentemente do ato homicida — reforça a necessidade de apreciação dos fatos pelo Tribunal do Júri, que é o juízo natural da causa. Assim, verifica-se que há suporte probatório apto a demonstrar, ao menos, a existência de indícios de autoria em relação ao delito em questão, suficientes, por ora, para ensejar a pronúncia, por ser crime conexo ao doloso contra a vida, cabendo aos jurados decidir soberanamente sobre o caso. Com essas considerações, em consonância com o parecer ministerial, CONHEÇO do recurso aviado pela Defesa do réu ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo incólume a sentença de pronúncia. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025

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Processo nº 1006575-53.2025.8.11.0000

ID: 299357682

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº Processo: 1006575-53.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

ADALBERTO NOGUEIRA DOS SANTOS LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ADALBERTO NOGUEIRA DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1006575-53.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Droga… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1006575-53.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins, Habeas Corpus - Cabimento] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA] Parte(s): [ADALBERTO NOGUEIRA DOS SANTOS - CPF: 302.731.248-03 (ADVOGADO), LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS - CPF: 071.331.991-73 (INTERESSADO), Juízo da 5º Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT (REU), JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP (IMPETRADO), ADALBERTO NOGUEIRA DOS SANTOS - CPF: 302.731.248-03 (IMPETRANTE), LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS - CPF: 071.331.991-73 (PACIENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A HABEAS CORPUS – PRISÃO PREVENTIVA – ART. 33 E 35 DA LEI Nº 11.343/2006 – PACIENTE CONDENADO A 11 (ONZE) ANOS E 06 (SEIS) MESES EM SENTENÇA PROFERIDA PELO JUÍZO ORIGINÁRIO, A SER DESCONTADA INICIALMENTE EM REGIME FECHADO – ALEGADA VIOLAÇÃO DO PRAZO NONAGESSIMAL DO ARTIGO 316, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – PRAZO NÃO PEREMPTÓRIO – PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – GRAVIDADE DA CONDUTA E MODUS OPERANDI UTILIZADO – CRIME DE TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO – CONTEXTO DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA – CONDENAÇÃO EM REGIME INICIAL FECHADO – PACIENTE QUE PERMANECEU PRESO DURANTE A INSTRUÇÃO – AUSÊNCIA DE DETRAÇÃO PENAL – NÃO VERIFICADA – AUTORIDADE COATORA QUE INFORMA QUE A PROVIDÊNCIA NÃO MODIFICARIA O REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA – ART. 387, § 2º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – AINDA QUE REALIZADA A DETRAÇÃO, A REPRIMENDA PERMANECERIA SUPERIOR A 08 (OITO) ANOS – PROGRESSÃO DO PACIENTE AO REGIME INTERMEDIÁRIO – INVIABILIDADE – MATÉRIA AFETA AO AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – UTILIZAÇÃO DO MANDAMUS COMO SUCEDÂNEO RECURSAL – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA SATISFAÇÃO INEQUÍVOCA DOS REQUISITOS PARA O PACIENTE SER INSERIDO NO REGIME MENOS GRAVOSO – IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DA PRETENSÃO – WRIT NÃO CONHECIDO NESTE PONTO – EXCESSO DE PRAZO NA SEGREGAÇÃO – ALMEJADA RESTITUIÇÃO DO STATUS LIBERTATIS – INVIABILIDADE – DESÍDIA NÃO COMPROVADA – PLURALIDADE DOS RÉUS – FEITO QUE AGUARDA APRESENTAÇÃO DE RAZÕES RECURSAIS DE UM DOS CORRÉUS – NEGATIVA DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – EFETIVA DEMONSTRAÇÃO DA PERSISTÊNCIA DOS MOTIVOS ENSEJADORES DA PRISÃO – AUSÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO FÁTICA – PERMANÊNCIA DA NECESSIDADE DA RESTRIÇÃO DO STATUS LIBERTATIS DO PACIENTE – CAUTELARES DIVERSAS INSUFICIENTES – INCOMPATIBILIDADE COM OS PRESSUPOSTOS DA PRISÃO PREVENTIVA – ART. 282, § 6º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – PREDICADOS PESSOAIS DESPICIENDOS – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO – ORDEM DENEGADA. A prolação de sentença condenatória em desfavor do paciente confirma o preenchimento, no caso, do requisito do “fumus comissi delicti” e do “periculum libertatis”, pelo que se revela perfeitamente adequada e proporcional, ante a gravidade da conduta, em tese, considerando que o crime foi praticado em contexto de associação criminosa, com elevada movimentação financeira oriunda do tráfico ilegal de drogas, além do fato de que este permaneceu preso durante toda a instrução processual. Em igual direção, tem-se que a mera constatação de que a mais recente avaliação da imprescindibilidade da manutenção da segregação cautelar do inculpado se deu quando da prolação de sentença condenatória em desfavor deste – há mais de 90 dias, portanto – não basta, isoladamente considerada, para ensejar a ilegalidade da constrição. Especificamente acerca do tema, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que o período de 90 dias, definido pela Lei nº. 13.964/2019 como prazo para reanálise da constrição cautelar, não é peremptório. No caso, tem-se que a ausência de nova análise até o presente momento decorreria, precisamente, de que o feito encontra-se aguardando a apresentação de razões de coacusada e contrarrazões para a remessa dos autos a essa Egrégia Corte de Justiça. De qualquer sorte, a situação prisional do paciente vem satisfatoriamente reanalisada no presente momento, confirmando-se a necessidade de manutenção de seu encarceramento. [...] Ademais, não se trata de prazo peremptório, de modo que eventual atraso na reanálise da necessidade da custódia não induz ao reconhecimento automático de ilegalidade da prisão que justifique a liberdade do réu. 6. Pedido de reconsideração recebido como agravo regimental, ao qual se nega provimento. (RCD no HC n. 918.829/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 25/10/2024.). O desconto da pena ante o período de prisão preventiva não foi suficiente para modificar o regime inicial de cumprimento da reprimenda. É incabível a utilização do habeas corpus como sucedâneo recursal ou com a finalidade de discutir eventual equívoco do cálculo de pena em execução penal, especialmente se não demonstrado manifesto abuso de poder ou teratologia da decisão impugnada. O habeas corpus exige prova pré-constituída, cabendo ao impetrante demonstrar a desnecessidade efetiva da prisão ocorrida, sendo, desta forma, indispensável que este instrua o seu pedido com os documentos hábeis a comprovar a veracidade dos fatos aduzidos, bem assim o suposto constrangimento ilegal. Demonstrada a necessidade da segregação cautelar, incabível a aplicação de medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal. Ainda que comprovado nos autos, os predicados pessoais favoráveis não autorizam, per si, a revogação da custódia, quando presentes os requisitos autorizadores da medida extrema. R E L A T Ó R I O Nos termos do artigo 5º, incisos LV, LVII e LXVIII da Constituição Federal e artigos 647, 648, incisos I e VI e 654, todos do Código de Processo Penal, foi o presente habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de Lucas Antônio Araújo Ribas, qualificado, que estaria a sofrer constrangimento ilegal, nos autos nº 1004627-24.2023.8.11.0040, oriundo de ato da autoridade judiciária da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, aqui apontada como coatora. Relata o impetrante que o paciente foi segregado em 31 de março de 2023, pela suposta prática dos crimes previstos nos artigos 33 e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006. Afirma que o beneficiário foi condenado em 28 de agosto de 2024, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicialmente fechado. Aduz que Lucas está a sofrer constrangimento ilegal, uma vez que, desde a prolação da sentença, não houve mais a realização da revisão da necessidade de manutenção da sua prisão preventiva, conforme dispõe o artigo 316, parágrafo único do Código de Processo Penal. Alega que o tempo de prisão preventiva cumprido pelo paciente não foi integralmente considerado para fim de detração penal. Sustenta que há excesso de prazo na segregação do beneficiário, violando o princípio da presunção de inocência, além de o recurso de apelação manejado pela defesa não ter sido encaminhado a este Tribunal. Narra que o paciente possui predicados pessoais favoráveis, bem ainda, que não estão presentes os requisitos autorizadores da medida extrema. Desse modo, postula a concessão da ordem, liminarmente inclusive, para reconhecer a ilegalidade da prisão, concedendo a liberdade provisória ao paciente ou a substituição da segregação por medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP) (Id. 272509395). Juntou documentos (Ids. 272509396 a 272509399). A liminar vindicada foi indeferida, sendo requisitadas informações à autoridade apontada como coatora (Id. 273914880). As informações foram prestadas (Id. 276920387). A Procuradoria Geral de Justiça, através do Procurador de Justiça Élio Américo, manifestou-se pela denegação da ordem (Id. 281824381), sintetizando seu entendimento com a seguinte ementa: “Habeas Corpus – Tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico [art. 33, caput e art. 35, caput, ambos da Lei Federal nº 11.343/2006] - prisão em flagrante convertida em preventiva – paciente condenado à reprimenda corpórea de 11 [onze] anos e 06 [seis] meses de reclusão, a ser descontada inicialmente em regime fechado - inconformismo – 1. Negativa do direito de apelar em liberdade - irresignação defensiva - sustentada ausência de motivação e inexistência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar - insubsistência - fundamentação suficiente - custódia necessária para a garantia da ordem pública - paciente que permaneceu segregado durante toda a instrução processual - ausência de modificação da situação fática - permanência da necessidade da restrição do status libertatis do réu - 2. Pleito de aplicação das medidas cautelares elencadas no art. 319 do CPP - inviabilidade – prisão necessária para a garantia da ordem pública – predicados pessoais favoráveis – irrelevância – 3. Sustentada violação ao princípio da presunção de inocência - improcedência - a necessidade de resguardar a segurança coletiva se sobrepõe à presunção de inocência e ao devido processo legal, que não são violados pela prisão preventiva – 4. Sustentada violação ao disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP – reclamada falta de revisão do cárcere preventivo a cada 90 [noventa] dias - insubsistência - prazo não peremptório - elastério para reanálise da segregação justificado – custódia reanalisada e mantida no dia 28.08.2024 – 5. Sustentado cúmulo prazal para a remessa dos autos a esse E. Tribunal de Justiça – almejada restituição do status libertatis – inviabilidade – desídia não comprovada – pluralidade dos réus – feito que aguarda apresentação de razões recursais de um dos corréus – 6. Requestada realização da detração penal - impossibilidade – insurgência que deve ser deduzida na via processual adequada – recurso de apelação já interposto pela defesa – constrangimento ilegal não visualizado - Pela denegação da ordem.” (Sic.) É o relatório. V O T O R E L A T O R Como visto, trata-se de habeas corpus impetrado com objetivo de conceder o retorno à liberdade de Lucas Antônio Araújo Ribas, que estaria a sofrer constrangimento ilegal, nos autos nº 1004627-24.2023.8.11.0040, oriundo de ato da autoridade judiciária da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, aqui apontada como coatora. Transcrevo as informações prestadas pela autoridade indigitada coatora: “[...] Cuida-se de Ação Penal, movida pelo Ministério Público em desfavor de 42 (quarenta e dois) acusados, dentre eles o paciente LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS, como incursos nas sanções do art. 33, caput, e art. 35, caput, da Lei Federal nº 11.343/2006, c/c art. 69, caput, do Código Penal. Ação penal que teve origem com o inquérito policial instaurado após a extração de dados telemáticos dos aparelhos celulares de Wemerson Douglas da Silva Tedeia e Lauanda dos Santos Mantelli, para apuração dos crimes de Tráfico de Drogas, Associação para o Tráfico e Lavagem de Dinheiro, no bojo do qual foi deflagrada a denominada operação “Recovery”. A prisão preventiva do paciente foi decretada na cautelar nº 1002042-96.2023.8.11.0040, em 28/03/2023 (Id. 122685114 – pág.45/74), já que integra o grupo criminoso O recebimento da denúncia se deu em 07 de junho de 2023, conforme decisão acostada ao id. 119535278. Ainda na mesma decisão, para maior celeridade processual, em razão da grande quantidade de denunciados, dos quais 20 se encontravam-se presos, alguns em outras Comarcas e/ou estados da federação, julgou adequado, pelo desmembramento do processo, separando os réus presos até a presente data e os soltos, permanecendo apenas os seguintes denunciados: Alexandre Martins de Oliveira, vulgo “Zé Pequeno” ou “Maquinista”; Wemerson Douglas da Silva Tedeia, vulgo “Lampião” ou “DG”; Lauanda dos Santos Mantelli; Guilherme Jales Pereira, vulgo “Zeka” e “Salvatore”; Henrique Jales Pereira, vulgo “Jales”; Nelson Silva de Holanda Neto, vulgo “O sábio”; Guilherme Augusto Carnezella Campos, vulgo “CJ” e “Cereja”; Daniel Medina Dornas, vulgo “Deu SJ” ou “Del”; Apoline Lins de Oliveira, vulgo “Poly”; Alcedir Júnior Souza Rodrigues, vulgo “gordinho”; Luiz Gustavo do Nascimento, vulgo “LG” ou “2L”; Moises Conceição da Silva, vulgo “Fielsinho” ou “LK”; Thiago Fonseca de Almeida Pinheiro, vulgo “TH” ou “Fiote”; Gustavo Alves Conrrado, vulgo “ST” e “CPX”; Iago Alves Conrrado, vulgo “jogador” e “GG”; Bruno Rodrigues de Farias, vulgo “Jogador Bruninho”; Carlos Eduardo Duarte de Freitas, vulgo “MDI” ou “Mensageiro”; Lucas Antônio Araújo Ribas, vulgo “LA” “Lukinha” ou “Matuê”; Matheus da Silva Oliveira, vulgo “C2” e Maxmylliano Cardoso Magalhães Ribeiro da Silva, vulgo “Mago” ou “Max. A audiência de instrução e julgamento foi realizada em três momentos, a primeira em 22 de abril de 2024, a segunda parte da audiência de instrução se deu em 23 de abril de 2024 e a terceira parte da audiência de instrução se deu em 30 de abril de 2024 (ID’s 153462015, 154661215 e 153387366). O Ministério Público requereu, em memoriais acostados às fls. 4918/4978 (id. 156366983), a procedência integral da denúncia. Em seguida, as Defesas apresentaram as respectivas alegações finais. Após regular andamento do feito, em 28.08.2024 (ID 167247252) foi proferida sentença procedente, a qual condenou os réus pelas condutas descritas na denúncia e o réu LUCAS ANTÔNIO ARAÚJO RIBAS, vulgo “LA” e/ou “LUKINHA” e/ou “MATUÊ”, denunciado como incurso nos artigos 33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, condenado a pena de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 1.683 (um mil, seiscentos e oitenta e três) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. Na ocasião da sentença, negou-se aos réus o direito de recorrerem em liberdade. Os réus recorreram da sentença, e o feito aguarda apenas a apresentação das razões pela ré APOLINE, pela Defensoria Pública, para posterior remessa ao Tribunal de Justiça. Em seguida, expediu-se a competente Guia de Execução Provisória do réu LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS sob o ID 181789522, encaminhando-se ao Juízo Competente, qual seja, a 3ª Vara Criminal da Comarca de Sinop. Logo, o Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Sinop é o competente para analisar eventuais requerimentos de liberdade. [...]” (Id. 276920387) No tocante à reavaliação da custódia a cada 90 (noventa) dias, trata-se de providência judicial sujeita às complexidades fáticas e jurídicas envolvidas (STJ, AgRg no HC 579.125/MA - Relator: Min. Nefi Cordeiro - 16.6.2020; STJ, HC 589.544/SC - Relatora: Min.ª Laurita Vaz - 25.6.2020; TJMT, HC 1013412-03.2020.8.11.0000 - Primeira Câmara Criminal - 29.6.2020), de modo que “não resulta na revogação automática da prisão preventiva” (HC n. 621.416/RS – Relator: Min. Sebastião Reis Júnior - 16.4.2021). Ainda, em que pese à argumentação defensiva, no sentido de que a ausência de revisão do ergástulo em 90 (noventa) dias acarretaria automaticamente a ilegalidade da custódia preventiva e ensejaria, consequentemente, seu relaxamento, sabe-se, todavia, ser pacífico o entendimento, no âmbito do c. Superior Tribunal de Justiça, de que “a falta de revisão da prisão preventiva a cada 90 dias não enseja automaticamente a revogação da custódia ou o reconhecimento de qualquer nulidade, mas somente a interpelação do juízo responsável para que faça a reavaliação legalmente determinada” (AgRg no HC n. 756.968/MT, Relator: Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 14/11/2022). Quanto à suposta ausência de realização da detração do período de prisão preventiva cumprido pelo paciente, trago à baila o teor da sentença, in verbis: “[...] Nos termos do artigo 387, § 2º, do CPP “o tempo de prisão provisória será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”. Eventual lapso temporal que o acusado tenha permanecido preso preventivamente não altera o regime aqui fixado. [...]” (Id. 272509396, p. 479) Da documentação acosta aos autos, não se observa sequer a data em que o paciente foi preso ou, se ainda está segregado, pois, foram juntadas no writ apenas a sentença e a denúncia. Todavia, considerando as datas informadas no mandamus, de 31/03/2023 como sendo a prisão do paciente e 28/08/2024, a data da sentença, a priori, considera-se quantum de 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 02 (dois) dias de segregação até a prolação da sentença e, tendo sido aplicada a pena de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses, remanesce a reprimenda de 10 (dez) anos e 28 (vinte e oito) dias, não havendo decurso de prazo apto a modificar o regime inicial de cumprimento, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “a” do Código Penal. Assim dispõe o Código de Processo Penal acerca da detração: “Art. 387. [...] § 2º O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade.” (negritou-se) Da leitura acima, observa-se que a detração deve ser realizada caso haja a modificação do regime a ser fixado na sentença, o que não se verifica no presente caso, neste momento. Quando da prolação da sentença, não houve a possibilidade de modificação do regime inicial de cumprimento de pena do paciente, uma vez que a sua reprimenda ainda seria superior a 08 (oito) anos. Trago à baila o teor da sentença, in verbis: “[...] Nos termos do artigo 387, § 2º, do CPP “o tempo de prisão provisória será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”. Eventual lapso temporal que o acusado tenha permanecido preso preventivamente não altera o regime aqui fixado. [...]” (Id. 272509396, p. 479) Sobre a alegada progressão de regime, a matéria é afeta à execução penal, pois, deve ser avaliado não apenas o critério objetivo, mas também a satisfação dos requisitos subjetivos. Isso porque esta ação mandamental foi impetrada patentemente como sucedâneo recursal. E, malgrado os argumentos vertidos na inicial, é imperativo reconhecer que a intenção precípua do impetrante é alcançar o resultado pretendido no recurso de agravo em execução de maneira mais rápida que a via ordinária. Aliás, acerca do tema, a Edição n. 36 – Habeas Corpus, da Jurisprudência em Teses do Superior Tribunal de Justiça, em seu item 1, dispõe da seguinte maneira: 1) O STJ não admite que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso próprio (apelação, agravo em execução, recurso especial),tampouco à revisão criminal, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade da paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus. Desse modo, a matéria suscitada, não deve ser conhecida pela via do habeas corpus, como substitutivo de recurso próprio, assim, mostrando-se possível tão somente a verificação sobre a existência de eventual constrangimento ilegal que autorize a concessão da ordem de ofício, o que não ocorre no presente caso. Ademais, impõe-se consignar que a concessão da progressão de regime, em regra, demanda exame aprofundado de todo conjunto de probatório, a fim de se verificar se o reeducando preenche os requisitos objetivos e subjetivos previstos em lei, medida que, a priori, não pode ser realizada dentro dos estreitos limites do habeas corpus que, como é cediço, não admite dilação probatória. Nesse sentido: [...] A via do Habeas Corpus não se presta a discutir eventual equívoco do cálculo de pena em execução penal, mormente quando não demonstrado, de plano, o preenchimento dos requisitos objetivos/subjetivos para a progressão de regime. [...](TJMT, N.U 1021232-73.2020.8.11.0000) (TJMT, N.U 1021738-49.2020.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 18/12/2020, Publicado noDJE 18/12/2020) Sobre a alegada falta de contemporaneidade da prisão do paciente, não se verifica no presente caso. Os requisitos da custódia prévia se mantém hígidos, haja vista que o paciente foi condenado pela imputação relativa aos delitos de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o mesmo fim, além de ter permanecido custodiado durante toda a fase processual, o que afasta a tese defensiva. Assim, estando a medida elencada nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal e não no lapso temporal, inexiste ofensa a ser sanada. In casu, a manutenção da segregação foi analisada na sentença, senão vejamos: “[...] Nego aos réus ALEXANDRE MARTINS DE OLIVEIRA, WEMERSON DOUGLAS DA SILVA TEDEIA, LAUANDA DOS SANTOS MANTELLI, HENRIQUE JALES PEREIRA, NELSON SILVA DE HOLANDA NETO, GUILHERME AUGUSTO CARNEZELLA CAMPOS, DANIEL MEDINA DORNAS, APOLINE LINS DE OLIVEIRA, ALCEDIR JÚNIOR SOUZA RODRIGUES, LUIZ GUSTAVO DO NASCIMENTO, MOISES CONCEIÇÃO DA SILVA, THIAGO FONSECA DE ALMEIDA PINHEIRO, GUSTAVO ALVES CONRRADO, IAGO ALVES CONRRADO, BRUNO RODRIGUES DE FARIAS, CARLOS EDUARDO DUARTE DE FREITAS, LUCAS ANTÔNIO ARAÚJO RIBAS, MATHEUS DA SILVA OLIVEIRA E MAXMYLLIANO CARDOSO MAGALHÃES RIBEIRO DA SILVA o direito de recorrerem em liberdade, considerando a fixação do regime fechado para cumprimento de pena; considerando que os réus permaneceram segregados durante toda a instrução processual e restaram todos condenados por tráfico de drogas e associação para o tráfico, e ainda outros por lavagem de capitais, bem como verificada a necessidade da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, nos termos do art. 312 do CPP. A ordem pública, no particular, compreende a preservação da sociedade contra eventual repetição do delito pelo agente, bem como quando o bem jurídico é afetado por conduta que ocasione impacto social, seja pela sua extensão ou outra circunstância. Embora seja certo que a gravidade do delito, por si só, não basta para a decretação da custódia, a forma de execução, a conduta dos acusados, antes e depois do ilícito, e outras circunstâncias podem abalar a ordem pública, impondo-se a medida para salvaguardá-la. Na hipótese, mostram-se patentes a gravidade em concreto do delito e a periculosidade social dos agentes, que possuem relevante papel na associação criminosa. Frise-se que foram constatadas diversas trocas de mensagens e arquivos telemáticos confirmando intensa movimentação financeira oriunda do tráfico, portanto, sem qualquer lastro lícito, prestação de contas, transações bancárias vultosas sem qualquer justificativa, dentre outros tantos ilícitos. Ainda, o grupo criminoso fazia uso de arma de fogo, com diversos dos seus membros adquirindo e compartilhando tais instrumentos bélicos. Se não bastasse, a elevada quantidade de drogas comercializada por todos os integrantes aponta o real dano que a liberdade dos réus promove à ordem pública, e não só, a própria variedade de entorpecentes, das mais variadas espécies também coloca em risco a sociedade com a eventual liberdade do grupo criminoso. Neste cenário fático, é possível inferir não somente que os requisitos para a decretação da prisão preventiva enunciados no artigo 312 do Código de Processo Penal encontram-se preenchidos no caso em voga, mas também que a manutenção da cautelar é a única forma de garantir, por ora, a incolumidade da ordem pública, o que afasta, por conseguinte, a possibilidade de substituição da prisão pelas medidas alternativas previstas no artigo 319 do mesmo diploma legal. Por fim, imperioso citar que não sobrevieram quaisquer mudanças no quadro fático da ação penal que pudesse autorizar a revogação da prisão preventiva, sequer a substituição desta por medidas cautelares diversas. [...]” (Id. 272509396, p. 506/508) Verifica-se que a autoridade apontada como coatora justifica a manutenção da segregação do paciente ante a presença de requisito previsto no artigo 312 do Código de Processo Penal, qual seja, a garantia da ordem pública. A prisão está alicerçada na gravidade concreta dos crimes praticados, evidenciada na periculosidade do paciente demostrada no modus operandi utilizado, ante a intensa movimentação financeira oriunda do tráfico de drogas, a elevada quantidade de entorpecente comercializada e sua variedade, além do uso de armas de fogo por integrantes deste grupo criminoso. A alegada ausência dos requisitos autorizadores da custódia já foi apreciada no Habeas Corpus nº 1005616-19.2024.8.11.0000, no qual, à unanimidade, a ordem foi denegada, restando assim ementado: “HABEAS CORPUS – PRISÃO PREVENTIVA – TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO [ART. 33, CAPUT, C/C ART. 35, CAPUT, AMBOS DA LEI Nº 11.343/2006] – NEGATIVA DE AUTORIA - ASPECTO DEFENSIVO QUE EXIGE ANÁLISE APROFUNDADA DO CONTEXTO FÁTICO PROBATÓRIO – INVIABILIDADE – PRETENSÃO TÍPICA DE AÇÃO DE CONHECIMENTO – NULIDADE PROCESSUAL EM RAZÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL – MATÉRIA NÃO SUBMETIDA A ANÁLISE DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU – APARENTE SUPRESSÃO DE INSTANCIA - ALEGADA AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 312, DO CPP PARA MANUTENÇÃO DA SEGREGAÇÃO – MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM FUNDAMENTOS ENSEJADORES DA CUSTÓDIA QUE PERMANECEM INALTERADOS – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO – ORDEM DENEGADA. Quanto ao reconhecimento de nulidade processual, por ofensa ao princípio do promotor natural, em razão da não ratificação da denúncia, não há evidencia nos autos que a tese suscitada na impetração foi levada ao conhecimento e análise da autoridade apontada como coatora, de modo que sua apreciação por esta Corte de Justiça, implicaria em supressão de instância, o que é inadmissível. No caso em tela, a prisão preventiva e sua manutenção restou alicerçada em circunstâncias concretas do caso, que permitem sua subsunção ao requisito da garantia da ordem pública constante no art. 312 do Código de Processo Penal. “4. A técnica de motivação per relationem revela-se legítima se a sentença condenatória faz remissão às circunstâncias ensejadoras da decretação de prisão preventiva no início do feito, tendo em vista que elas permanecem incólumes. 5. Ordem denegada. (HC 609.582/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 03/11/2020, DJe 16/11/2020)”” A necessidade da manutenção da custódia em razão da gravidade da conduta, em tese, praticada e as circunstâncias que envolvem os fatos, considerando que os crimes foram praticados em contexto de associação criminosa, o modus operandi utilizado, ante a intensa movimentação financeira oriunda do tráfico de drogas, a elevada quantidade de entorpecente comercializada e sua variedade, além do uso de armas de fogo por integrantes deste grupo criminoso. Além disso, o paciente foi condenado ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, o que confirma a necessidade da segregação, a fim de acautelar a ordem pública, pois, evidencia o risco de reiteração delitiva. Nesse sentido, cumpre dizer que a prolação de sentença condenatória em desfavor do paciente confirma o preenchimento, no caso, dos requisitos do “fumus comissi delicti” e do “periculum libertatis”, contrariamente ao alegado pela defesa técnica, pelo que se revela perfeitamente adequada e proporcional, ao menos por ora, a manutenção da prisão preventiva do inculpado. Em igual direção, tem-se que a mera constatação de que a mais recente avaliação da imprescindibilidade da manutenção da segregação cautelar do inculpado se deu quando da prolação de sentença condenatória em desfavor deste – há mais de 90 (noventa) dias, portanto – não basta, isoladamente considerada, para ensejara ilegalidade da constrição. Especificamente acercado tema, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que o período de 90 (noventa) dias, definido pela Lei nº 13.964/2019 como prazo para reanálise da constrição cautelar, não é peremptório. Neste sentido: [...] No caso, a prisão processual está devidamente fundamentada na garantia da ordem pública, a partir do modus operandi do delito e da periculosidade do agente (ante a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa), não havendo falar, portanto, em existência de evidente flagrante ilegalidade capaz de justificar a sua revogação. Destacado pelas instâncias ordinárias, com base em elementos extraídos dos autos, a gravidade concreta da conduta: o acusado, conforme conteúdo do inquérito policial, de relatórios e comunicações de serviço acostados aos autos, teria, em tese, envolvimento com organização criminosa estruturada, com divisão de tarefas e hierarquia entre os membros, com atuação interestadual, dedicada à prática do delito conhecido como "golpe do motoboy", o qual, através de meio fraudulento, causava prejuízo financeiro através da prática do crime de estelionato em vítimas portadoras de contas na Caixa Econômica Federal. Sublinhou-se, ainda, que mesmo após a prisão de um dos integrantes da organização criminosa, continuou a atuar pelo menos até o ano de 2023, tendo o ora paciente sido alvo de recentes investigações pela Polícia Civil, ocorridas em 29 de novembro de 2023. 3. A presença de condições pessoais favoráveis, como residência fixa e atividade lícita, não impede a decretação da prisão preventiva, quando devidamente fundamentada, assim como inaplicável medida cautelar alternativa quando as circunstâncias evidenciam que as providências menos gravosas seriam insuficientes para manutenção da ordem pública. 4. Consoante orientação jurisprudencial desta Corte, "A regra da contemporaneidade comporta mitigação quando, ainda que mantido período de aparente conformidade com o Direito, a natureza do delito indicar a alta possibilidade de recidiva ou "ante indícios de que ainda persistem atos de desdobramento da cadeia delitiva inicial (ou repetição de atos habituais)", como no caso de pertencimento a organização criminosa" (HC n. 496.533/DF, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 18/6/2019). 5. A tese relativa à revisão de ofício, da necessidade da prisão cautelar, a cada 90 dias, conforme previsão do art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal - CPP, não foi debatida pelo Tribunal de origem, de sorte que, não cabe a este Superior Tribunal de Justiça o seu julgamento sob pena de incorrer em indevida supressão de instância. Ademais, não se trata de prazo peremptório, de modo que eventual atraso na reanálise da necessidade da custódia não induz ao reconhecimento automático de ilegalidade da prisão que justifique a liberdade do réu. 6. Pedido de reconsideração recebido como agravo regimental, ao qual se nega provimento. (RCD no HC n. 918.829/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 25/10/2024.) (negritou-se) [...] O prazo de 90 dias é examinado pelo prisma jurisprudencialmente construído de valoração casuística, não dotado de peremptoriedade, o que se conjuga com as informações dos autos de que até 2/3/2021 os mandados de prisão ainda constavam como em aberto. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 625.305/MG, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª REGIÃO), Sexta Turma, julgado em 17/8/2021, DJe de 20/8/2021.) Ainda, em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, em 14 de outubro de 2020, sobre a tese da reavaliação da prisão, entendeu-se que: “A inobservância do prazo nonagesimal do art. 316 do CPP, não implica automaticamente revogação da prisão preventiva. Devendo o juízo competente ser instado a reavaliar a legalidade e atualidade de seus fundamentos.” Suspensão de Liminar n. 1.395/SP. Ou seja, eventual atraso na execução deste ato “não implica automático reconhecimento da ilegalidade da prisão, tampouco a imediata colocação do custodiado cautelar em liberdade”. No caso, tem-se que a ausência de nova análise até o presente momento decorreria, precisamente, da ausência da remessa dos autos oriundos da Comarca de Sinop/MT para essa Egrégia Corte de Justiça, eis que o feito está aguardando a apresentação de razões recursais de coacusada (Apoline Lins), bem como contrarrazões recursais. Insta ressaltar que o presente processo se trata de um caso complexo, na medida em que se apura a prática de delitos que envolvem vários acusados – 42 (quarenta e dois) réus, sendo que o processo já foi desmembrado para dar celeridade, com patronos diferentes, decorrente da Operação “Recovery”, onde supostamente praticam os crimes de Tráfico de Drogas, Associação para o Tráfico e Lavagem de Dinheiro, fatores que, naturalmente, demandam maior esforço por parte do Judiciário. De qualquer sorte, a situação prisional do paciente foi satisfatoriamente reanalisada no presente momento, confirmando-se a necessidade de manutenção de seu encarceramento. Diante da gravidade da conduta, em tese, perpetrada e as circunstâncias que envolveram os fatos, considerando que o crime foi praticado em contexto de associação delituosa, além do modus operandi desenvolvido no delito, além do fato de que este permaneceu preso durante toda a instrução processual, sem que houvesse alteração nos motivos que ensejaram a prisão, sendo condenado ao cumprimento de pena superior a 08 (oito) e a consequente condenação do paciente à pena superior a oito anos, a ser descontada inicialmente em regime fechado. Oportunamente, trago decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça: [...] A propósito, "A gravidade em concreto do crime e a periculosidade do agente, evidenciada pelo modus operandi, constituem fundamentação idônea para a decretação da custódia preventiva" (HC 212647 AgR, Relator Ministro ANDRÉ MENDONÇA, Segunda Turma, julgado em 05/12/2022, DJe 10/01/2023). 5. Além disso, o entendimento abraçado pelas instâncias ordinárias encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que, tendo o paciente permanecido preso durante todo o andamento da ação penal, não faria sentido, ausentes alterações nas circunstâncias fáticas, que, com a superveniência da condenação, lhe fosse deferida a liberdade. 6. Ora, "a existência de édito condenatório enfraquece a presunção de não culpabilidade, de modo que seria incoerente, não havendo alterações do quadro fático, conceder, nesse momento, a liberdade" (RHC n. 105.918/BA, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, julgado em 12/3/2019, DJe 25/3/2019). [...] (AgRg no HC n. 955.894/ES, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 11/12/2024, DJEN de 16/12/2024.) Quanto ao alegado excesso de prazo da prisão do beneficiário, impõe-se registrar que os prazos processuais não são peremptórios e deverão ser considerados com base no princípio da razoabilidade, mormente em casos como o que ora se discute, no qual há complexidade do feito, decorrente da quantidade de réus (quarenta e dois denunciados), vários fatos e tipos penais, além de diversos requerimentos de revogação das custódias em primeiro grau de jurisdição. E, consoante acima já observado, o decreto preventivo do paciente foi mantido na sentença, porquanto amparado em fundamentos legítimos para a manutenção da sua custódia. Fato é que, por ocasião da sentença, essas balizas se confirmaram, quanto à responsabilidade penal do paciente. Naturalmente, inalterada, no presente momento, a possibilidade não só da fratura da ordem pública, reforçada que é pelo advento da condenação mesmo que recorrível, faz nascer outro requisito que autoriza a segregação para garantia do cumprimento da pena imposta, pelo que decorre não existir ofensa ao direito de ir e vir que se diz afrontado pela autoridade judiciária acoimada de coatora. Além disso, importante observar que o beneficiário permaneceu preso preventivamente durante todo o processo, o que, na visão da jurisprudência dos Tribunais Superiores, afasta eventual alegação de ilegalidade por ausência de fundamentação, inexistindo ofensa ao disposto no artigo 387, § 1º do Código de Processo Penal, ou artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. E nesse tocante, merece maior relevo o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, ao consignar incompatibilidade da soltura do acusado com sentença condenatória, se permaneceu segregado durante toda a instrução processual, claro, desde que ainda permanentes os motivos que motivaram a sua custódia cautelar, como no caso, veja-se: [...] A orientação pacificada nesta Corte Superior é no sentido de que não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer solto quando permaneceu segregado durante a persecução criminal, se persistentes os motivos para a preventiva. [...] (STJ, RHC n. 80528/RJ, 5ª Turma,DJe 5.4.2017) [...] No caso, constatado que o recorrente respondeu preso a todo o processo, a exigência de fundamentação exaustiva e a possibilidade do recurso em liberdade devem ser avaliadas com excepcional prudência. (...). Noutras palavras, é incompatível com a realidade processual manter o acusado preso durante a instrução e, após a sua condenação, preservado o quadro fático-processual decorrente da custódia cautelar, assegurar-lhe a liberdade; afinal, assim como já assinalou o Supremo Tribunal Federal, trata-se de situação em que enfraquecida está a presunção de não culpabilidade, pois já emitido juízo de certeza acerca dos fatos, materialidade, autoria e culpabilidade, ainda que não definitivo. 4. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento [...] (RHC n. 42.206/SP, 5ª Turma, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 26.2.2014) [...] Tendo o recorrente permanecido preso durante toda a instrução processual, não deve ser permitido recorrer em liberdade, especialmente porque, inalteradas as circunstâncias que justificaram a custódia, não se mostra adequada a soltura dele depois da condenação em Juízo de primeiro grau. [...] (RHC 88.252/PI, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 17/10/2017, DJe 27/10/2017). [...] Não há sentido lógico permitir que o réu, preso preventivamente durante toda a instrução criminal, possa aguardar o julgamento da apelação em liberdade” (HC 89.089, Primeira Turma, Relator o Ministro Ayres Britto, DJe de 01.06.07). [...] (HC 120319, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 29/04/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-154 DIVULG 08-08-2014 PUBLIC 12-08-2014) Nesse sentido, fica evidenciado que o direito de recorrer em liberdade não é absoluto, podendo o magistrado determinar a manutenção da prisão preventiva ou mantê-la, quando persistirem os requisitos constantes dos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal, além de se mostrarem insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão. Os requisitos da custódia prévia se mantém hígidos, haja vista que o paciente foi condenado pela imputação relativa aos delitos de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o mesmo fim, além de ter permanecido custodiado durante toda a fase processual, o que afasta a tese defensiva. Ademais, utilizou-se da técnica de motivação per relationem, ao fazer referência ao fato de o paciente ter permanecido preso preventivamente durante toda a instrução processual. Tal forma de fundamentação é perfeitamente válida, conforme o Enunciado Criminal nº 50, deste Tribunal de Justiça: "A motivação per relationem (aliunde) constitui fundamentação idônea para negar ao réu, preso durante toda a instrução processual, o direito de recorrer em liberdade." A defesa alega, ainda, que a manutenção da prisão preventiva viola o princípio da presunção de inocência, previsto no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. Contudo, é cediço que o princípio da presunção de inocência não é absoluto, podendo ser mitigado em casos excepcionais, desde que devidamente fundamentados, quando necessária a decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. Como bem pontuado pelo douto Procurador de Justiça em seu parecer, "o que há é a conhecida prevalência do direito público sobre o direito individual, em que a necessidade de resguardar a segurança coletiva se sobrepõe à presunção de que o paciente é inocente e ao seu direito de ser processado antes de ser restringida a sua liberdade". Nesse sentido já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal: [...] O decreto de prisão preventiva que preenche os requisitos legais por meio de fundamentação idônea não viola a garantia da presunção de inocência. Precedentes. [...] (HC 134383, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 29-11-2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-264 DIVULG 12-12-2016 PUBLIC 13-12-2016) Assim, não há que se falar em violação ao princípio da presunção de inocência no caso concreto, uma vez que a prisão preventiva foi devidamente fundamentada na necessidade de garantia da ordem pública, diante da gravidade concreta dos delitos e da periculosidade social do paciente. No tocante à pretensa substituição da prisão por medidas cautelares diversas, a jurisprudência majoritária entende que, uma vez presentes os requisitos autorizadores da custódia, as medidas cautelares apresentam-se inadequadas. Por fim, presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva, inviável cogitar aplicabilidade de qualquer medida alternativa, prevista no artigo 319 do Código de Processo Penal, ao menos neste momento. Nesse sentido: [...] Verifica-se que ao contrário do que sustenta o impetrante, a custódia preventiva da paciente, encontra-se suficientemente fundamentada, em face das circunstâncias do caso que, apresenta materialidade e indícios de autoria, demonstrando a necessidade da medida para a garantia da ordem pública, Conveniência da Instrução e Investigação Criminal, diante seu suposto envolvimento com organização criminosa voltada ao tráfico de drogas. [...] (N.U 1026482-19.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 05/04/2023, Publicado no DJE 10/04/2023) [...] Descabe cogitar em ausência de requisitos autorizadores da prisão preventiva, quando o decreto constritivo se mostra devidamente fundamentado com esteio em elementos do caso concreto, os quais demonstram a gravidade em concreto da conduta e o risco de reiteração delitiva, além de demonstrar a insuficiência da aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. É possível embasar a custódia cautelar na necessidade de desarticular a organização criminosa e estancar as atividades criminosas que rotineiramente praticam, em consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. (N.U 1017146-88.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PEDRO SAKAMOTO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 27/09/2022, Publicado no DJE 28/09/2022) Quanto às condições pessoais, é uníssono o entendimento de que “... persistindo os requisitos autorizadores da segregação cautelar (art. 312 CPP), é despiciendo o paciente possuir condições pessoais favoráveis...” (HC 294.725/MS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, QUINTA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 17/06/2014). Destaca-se como oportuno, o Enunciado Orientativo nº 43 deste E. Tribunal: “43 – As condições pessoais favoráveis não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quando presente o periculum libertatis.” Desta feita, neste momento, mostra-se incabível a revogação da custódia ou a sua eventual substituição por cautelares menos onerosas. Assim, não se observa no presente mandamus a juntada de documentação necessária para a análise do alegado constrangimento ilegal. Há, na verdade, uma completa ausência documental que demonstre o suposto constrangimento ilegal mencionado pelo impetrante. Por oportuno, não se permite analisar o suposto constrangimento ilegal, haja vista não terem sido colacionadas ao presente mandamus as decisões necessárias para a devida apuração do alegado. O impetrante limita-se a alegar respectivos fatos, omitindo-se de trazer aos autos qualquer documento hábil a comprovar seus argumentos, juntando documentos sem qualquer conteúdo apto a analisar o pleito. Desta feita, não há como conceder nenhuma liminar “ex officio”, em um habeas corpus de ofício. Como é cediço, o Habeas Corpus exige prova pré-constituída, capaz de demonstrar a ilegalidade da prisão do paciente, cabendo ao impetrante demonstrar a desnecessidade efetiva da prisão ocorrida, sendo, desta forma, indispensável que este instrua o seu pedido com os documentos hábeis a comprovar a veracidade dos fatos aduzidos, bem assim o suposto constrangimento ilegal. Neste sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: [...] Em relação à gravidade concreta da conduta, a defesa não juntou à impetração cópia da denúncia, ou mesmo da decisão de pronúncia, de modo que apenas se pode extrair dos autos tratar-se de crimes de homicídios qualificados consumado e tentado, e organização criminosa. Ora, sem conhecimento efetivo do fato, inviável analisar a tese defensiva de que a fundamentação, ao apontar a gravidade concreta da conduta, foi inidônea. 5. O rito do habeas corpus pressupõe prova pré-constituída do direito alegado, devendo a parte demonstrar, de maneira inequívoca, por meio de documentos, a existência de constrangimento ilegal imposto ao paciente. [...] (HC 547.164/GO, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 20/02/2020, DJe 28/02/2020) (negritou-se) [...] Em sede de habeas corpus, a prova deve ser pré-constituída e incontroversa, cabendo ao impetrante apresentar documentos suficientes à análise de eventual ilegalidade flagrante no ato atacado. Na espécie, o processo não foi instruído com o inteiro teor dos embargos de declaração, peça processual necessária para exame da matéria. [...] Para se alcançar a constatação obtida pelo laudo pericial, necessário seria a este Superior Tribunal examinar o conteúdo das interceptações telefônicas, cotejando as datas dos diálogos com os períodos autorizados judicialmente. Tal medida escapa aos limites estreitos do habeas corpus, ação de índole constitucional, marcado por cognição sumária e rito célere, que tem como escopo resguardar a liberdade de locomoção contra ilegalidade ou abuso de poder, vedada, assim, dilação probatória para o deslinde da controvérsia. [...] (HC 469.871/GO, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 26/03/2019) (negritou-se) Mesmo entendimento possui este E. Tribunal de Justiça: [...] “A ação mandamental de habeas corpus exige a apresentação de prova pré-constituída, recaindo sobre o impetrante o ônus de instruir corretamente o mandamus a fim de que seja possível identificar o alegado constrangimento ilegal.” (AgRg no HC 470.123/DF). [...] (N.U 1011941-20.2018.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PEDRO SAKAMOTO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 28/11/2018, Publicado no DJE 10/12/2018) [...] O Habeas Corpus é ação de cognição sumária baseada em prova pré-constituída e que não comporta dilação probatória, à míngua de fase processual específica para tanto, razão por que, a eventual discussão acerca de ser o Paciente mero usuário de drogas, deve ser suscitada na esfera própria, sob o crivo do Contraditório e da Ampla defesa. (N.U 1000140-73.2019.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 06/02/2019, Publicado no DJE 10/02/2019) Por todo o exposto, em consonância com o parecer ministerial, denego a ordem de habeas corpus impetrada em favor de É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 1006575-53.2025.8.11.0000

ID: 299357707

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº Processo: 1006575-53.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1006575-53.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Droga… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1006575-53.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins, Habeas Corpus - Cabimento] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA] Parte(s): [ADALBERTO NOGUEIRA DOS SANTOS - CPF: 302.731.248-03 (ADVOGADO), LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS - CPF: 071.331.991-73 (INTERESSADO), Juízo da 5º Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT (REU), JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP (IMPETRADO), ADALBERTO NOGUEIRA DOS SANTOS - CPF: 302.731.248-03 (IMPETRANTE), LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS - CPF: 071.331.991-73 (PACIENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A HABEAS CORPUS – PRISÃO PREVENTIVA – ART. 33 E 35 DA LEI Nº 11.343/2006 – PACIENTE CONDENADO A 11 (ONZE) ANOS E 06 (SEIS) MESES EM SENTENÇA PROFERIDA PELO JUÍZO ORIGINÁRIO, A SER DESCONTADA INICIALMENTE EM REGIME FECHADO – ALEGADA VIOLAÇÃO DO PRAZO NONAGESSIMAL DO ARTIGO 316, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – PRAZO NÃO PEREMPTÓRIO – PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – GRAVIDADE DA CONDUTA E MODUS OPERANDI UTILIZADO – CRIME DE TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO – CONTEXTO DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA – CONDENAÇÃO EM REGIME INICIAL FECHADO – PACIENTE QUE PERMANECEU PRESO DURANTE A INSTRUÇÃO – AUSÊNCIA DE DETRAÇÃO PENAL – NÃO VERIFICADA – AUTORIDADE COATORA QUE INFORMA QUE A PROVIDÊNCIA NÃO MODIFICARIA O REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA – ART. 387, § 2º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – AINDA QUE REALIZADA A DETRAÇÃO, A REPRIMENDA PERMANECERIA SUPERIOR A 08 (OITO) ANOS – PROGRESSÃO DO PACIENTE AO REGIME INTERMEDIÁRIO – INVIABILIDADE – MATÉRIA AFETA AO AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL – UTILIZAÇÃO DO MANDAMUS COMO SUCEDÂNEO RECURSAL – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA SATISFAÇÃO INEQUÍVOCA DOS REQUISITOS PARA O PACIENTE SER INSERIDO NO REGIME MENOS GRAVOSO – IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DA PRETENSÃO – WRIT NÃO CONHECIDO NESTE PONTO – EXCESSO DE PRAZO NA SEGREGAÇÃO – ALMEJADA RESTITUIÇÃO DO STATUS LIBERTATIS – INVIABILIDADE – DESÍDIA NÃO COMPROVADA – PLURALIDADE DOS RÉUS – FEITO QUE AGUARDA APRESENTAÇÃO DE RAZÕES RECURSAIS DE UM DOS CORRÉUS – NEGATIVA DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – EFETIVA DEMONSTRAÇÃO DA PERSISTÊNCIA DOS MOTIVOS ENSEJADORES DA PRISÃO – AUSÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO FÁTICA – PERMANÊNCIA DA NECESSIDADE DA RESTRIÇÃO DO STATUS LIBERTATIS DO PACIENTE – CAUTELARES DIVERSAS INSUFICIENTES – INCOMPATIBILIDADE COM OS PRESSUPOSTOS DA PRISÃO PREVENTIVA – ART. 282, § 6º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – PREDICADOS PESSOAIS DESPICIENDOS – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO – ORDEM DENEGADA. A prolação de sentença condenatória em desfavor do paciente confirma o preenchimento, no caso, do requisito do “fumus comissi delicti” e do “periculum libertatis”, pelo que se revela perfeitamente adequada e proporcional, ante a gravidade da conduta, em tese, considerando que o crime foi praticado em contexto de associação criminosa, com elevada movimentação financeira oriunda do tráfico ilegal de drogas, além do fato de que este permaneceu preso durante toda a instrução processual. Em igual direção, tem-se que a mera constatação de que a mais recente avaliação da imprescindibilidade da manutenção da segregação cautelar do inculpado se deu quando da prolação de sentença condenatória em desfavor deste – há mais de 90 dias, portanto – não basta, isoladamente considerada, para ensejar a ilegalidade da constrição. Especificamente acerca do tema, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que o período de 90 dias, definido pela Lei nº. 13.964/2019 como prazo para reanálise da constrição cautelar, não é peremptório. No caso, tem-se que a ausência de nova análise até o presente momento decorreria, precisamente, de que o feito encontra-se aguardando a apresentação de razões de coacusada e contrarrazões para a remessa dos autos a essa Egrégia Corte de Justiça. De qualquer sorte, a situação prisional do paciente vem satisfatoriamente reanalisada no presente momento, confirmando-se a necessidade de manutenção de seu encarceramento. [...] Ademais, não se trata de prazo peremptório, de modo que eventual atraso na reanálise da necessidade da custódia não induz ao reconhecimento automático de ilegalidade da prisão que justifique a liberdade do réu. 6. Pedido de reconsideração recebido como agravo regimental, ao qual se nega provimento. (RCD no HC n. 918.829/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 25/10/2024.). O desconto da pena ante o período de prisão preventiva não foi suficiente para modificar o regime inicial de cumprimento da reprimenda. É incabível a utilização do habeas corpus como sucedâneo recursal ou com a finalidade de discutir eventual equívoco do cálculo de pena em execução penal, especialmente se não demonstrado manifesto abuso de poder ou teratologia da decisão impugnada. O habeas corpus exige prova pré-constituída, cabendo ao impetrante demonstrar a desnecessidade efetiva da prisão ocorrida, sendo, desta forma, indispensável que este instrua o seu pedido com os documentos hábeis a comprovar a veracidade dos fatos aduzidos, bem assim o suposto constrangimento ilegal. Demonstrada a necessidade da segregação cautelar, incabível a aplicação de medidas cautelares previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal. Ainda que comprovado nos autos, os predicados pessoais favoráveis não autorizam, per si, a revogação da custódia, quando presentes os requisitos autorizadores da medida extrema. R E L A T Ó R I O Nos termos do artigo 5º, incisos LV, LVII e LXVIII da Constituição Federal e artigos 647, 648, incisos I e VI e 654, todos do Código de Processo Penal, foi o presente habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de Lucas Antônio Araújo Ribas, qualificado, que estaria a sofrer constrangimento ilegal, nos autos nº 1004627-24.2023.8.11.0040, oriundo de ato da autoridade judiciária da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, aqui apontada como coatora. Relata o impetrante que o paciente foi segregado em 31 de março de 2023, pela suposta prática dos crimes previstos nos artigos 33 e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006. Afirma que o beneficiário foi condenado em 28 de agosto de 2024, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicialmente fechado. Aduz que Lucas está a sofrer constrangimento ilegal, uma vez que, desde a prolação da sentença, não houve mais a realização da revisão da necessidade de manutenção da sua prisão preventiva, conforme dispõe o artigo 316, parágrafo único do Código de Processo Penal. Alega que o tempo de prisão preventiva cumprido pelo paciente não foi integralmente considerado para fim de detração penal. Sustenta que há excesso de prazo na segregação do beneficiário, violando o princípio da presunção de inocência, além de o recurso de apelação manejado pela defesa não ter sido encaminhado a este Tribunal. Narra que o paciente possui predicados pessoais favoráveis, bem ainda, que não estão presentes os requisitos autorizadores da medida extrema. Desse modo, postula a concessão da ordem, liminarmente inclusive, para reconhecer a ilegalidade da prisão, concedendo a liberdade provisória ao paciente ou a substituição da segregação por medidas cautelares alternativas (art. 319, CPP) (Id. 272509395). Juntou documentos (Ids. 272509396 a 272509399). A liminar vindicada foi indeferida, sendo requisitadas informações à autoridade apontada como coatora (Id. 273914880). As informações foram prestadas (Id. 276920387). A Procuradoria Geral de Justiça, através do Procurador de Justiça Élio Américo, manifestou-se pela denegação da ordem (Id. 281824381), sintetizando seu entendimento com a seguinte ementa: “Habeas Corpus – Tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico [art. 33, caput e art. 35, caput, ambos da Lei Federal nº 11.343/2006] - prisão em flagrante convertida em preventiva – paciente condenado à reprimenda corpórea de 11 [onze] anos e 06 [seis] meses de reclusão, a ser descontada inicialmente em regime fechado - inconformismo – 1. Negativa do direito de apelar em liberdade - irresignação defensiva - sustentada ausência de motivação e inexistência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar - insubsistência - fundamentação suficiente - custódia necessária para a garantia da ordem pública - paciente que permaneceu segregado durante toda a instrução processual - ausência de modificação da situação fática - permanência da necessidade da restrição do status libertatis do réu - 2. Pleito de aplicação das medidas cautelares elencadas no art. 319 do CPP - inviabilidade – prisão necessária para a garantia da ordem pública – predicados pessoais favoráveis – irrelevância – 3. Sustentada violação ao princípio da presunção de inocência - improcedência - a necessidade de resguardar a segurança coletiva se sobrepõe à presunção de inocência e ao devido processo legal, que não são violados pela prisão preventiva – 4. Sustentada violação ao disposto no art. 316, parágrafo único, do CPP – reclamada falta de revisão do cárcere preventivo a cada 90 [noventa] dias - insubsistência - prazo não peremptório - elastério para reanálise da segregação justificado – custódia reanalisada e mantida no dia 28.08.2024 – 5. Sustentado cúmulo prazal para a remessa dos autos a esse E. Tribunal de Justiça – almejada restituição do status libertatis – inviabilidade – desídia não comprovada – pluralidade dos réus – feito que aguarda apresentação de razões recursais de um dos corréus – 6. Requestada realização da detração penal - impossibilidade – insurgência que deve ser deduzida na via processual adequada – recurso de apelação já interposto pela defesa – constrangimento ilegal não visualizado - Pela denegação da ordem.” (Sic.) É o relatório. V O T O R E L A T O R Como visto, trata-se de habeas corpus impetrado com objetivo de conceder o retorno à liberdade de Lucas Antônio Araújo Ribas, que estaria a sofrer constrangimento ilegal, nos autos nº 1004627-24.2023.8.11.0040, oriundo de ato da autoridade judiciária da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, aqui apontada como coatora. Transcrevo as informações prestadas pela autoridade indigitada coatora: “[...] Cuida-se de Ação Penal, movida pelo Ministério Público em desfavor de 42 (quarenta e dois) acusados, dentre eles o paciente LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS, como incursos nas sanções do art. 33, caput, e art. 35, caput, da Lei Federal nº 11.343/2006, c/c art. 69, caput, do Código Penal. Ação penal que teve origem com o inquérito policial instaurado após a extração de dados telemáticos dos aparelhos celulares de Wemerson Douglas da Silva Tedeia e Lauanda dos Santos Mantelli, para apuração dos crimes de Tráfico de Drogas, Associação para o Tráfico e Lavagem de Dinheiro, no bojo do qual foi deflagrada a denominada operação “Recovery”. A prisão preventiva do paciente foi decretada na cautelar nº 1002042-96.2023.8.11.0040, em 28/03/2023 (Id. 122685114 – pág.45/74), já que integra o grupo criminoso O recebimento da denúncia se deu em 07 de junho de 2023, conforme decisão acostada ao id. 119535278. Ainda na mesma decisão, para maior celeridade processual, em razão da grande quantidade de denunciados, dos quais 20 se encontravam-se presos, alguns em outras Comarcas e/ou estados da federação, julgou adequado, pelo desmembramento do processo, separando os réus presos até a presente data e os soltos, permanecendo apenas os seguintes denunciados: Alexandre Martins de Oliveira, vulgo “Zé Pequeno” ou “Maquinista”; Wemerson Douglas da Silva Tedeia, vulgo “Lampião” ou “DG”; Lauanda dos Santos Mantelli; Guilherme Jales Pereira, vulgo “Zeka” e “Salvatore”; Henrique Jales Pereira, vulgo “Jales”; Nelson Silva de Holanda Neto, vulgo “O sábio”; Guilherme Augusto Carnezella Campos, vulgo “CJ” e “Cereja”; Daniel Medina Dornas, vulgo “Deu SJ” ou “Del”; Apoline Lins de Oliveira, vulgo “Poly”; Alcedir Júnior Souza Rodrigues, vulgo “gordinho”; Luiz Gustavo do Nascimento, vulgo “LG” ou “2L”; Moises Conceição da Silva, vulgo “Fielsinho” ou “LK”; Thiago Fonseca de Almeida Pinheiro, vulgo “TH” ou “Fiote”; Gustavo Alves Conrrado, vulgo “ST” e “CPX”; Iago Alves Conrrado, vulgo “jogador” e “GG”; Bruno Rodrigues de Farias, vulgo “Jogador Bruninho”; Carlos Eduardo Duarte de Freitas, vulgo “MDI” ou “Mensageiro”; Lucas Antônio Araújo Ribas, vulgo “LA” “Lukinha” ou “Matuê”; Matheus da Silva Oliveira, vulgo “C2” e Maxmylliano Cardoso Magalhães Ribeiro da Silva, vulgo “Mago” ou “Max. A audiência de instrução e julgamento foi realizada em três momentos, a primeira em 22 de abril de 2024, a segunda parte da audiência de instrução se deu em 23 de abril de 2024 e a terceira parte da audiência de instrução se deu em 30 de abril de 2024 (ID’s 153462015, 154661215 e 153387366). O Ministério Público requereu, em memoriais acostados às fls. 4918/4978 (id. 156366983), a procedência integral da denúncia. Em seguida, as Defesas apresentaram as respectivas alegações finais. Após regular andamento do feito, em 28.08.2024 (ID 167247252) foi proferida sentença procedente, a qual condenou os réus pelas condutas descritas na denúncia e o réu LUCAS ANTÔNIO ARAÚJO RIBAS, vulgo “LA” e/ou “LUKINHA” e/ou “MATUÊ”, denunciado como incurso nos artigos 33, caput, e 35, ambos da Lei nº 11.343/2006, condenado a pena de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 1.683 (um mil, seiscentos e oitenta e três) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. Na ocasião da sentença, negou-se aos réus o direito de recorrerem em liberdade. Os réus recorreram da sentença, e o feito aguarda apenas a apresentação das razões pela ré APOLINE, pela Defensoria Pública, para posterior remessa ao Tribunal de Justiça. Em seguida, expediu-se a competente Guia de Execução Provisória do réu LUCAS ANTONIO ARAUJO RIBAS sob o ID 181789522, encaminhando-se ao Juízo Competente, qual seja, a 3ª Vara Criminal da Comarca de Sinop. Logo, o Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Sinop é o competente para analisar eventuais requerimentos de liberdade. [...]” (Id. 276920387) No tocante à reavaliação da custódia a cada 90 (noventa) dias, trata-se de providência judicial sujeita às complexidades fáticas e jurídicas envolvidas (STJ, AgRg no HC 579.125/MA - Relator: Min. Nefi Cordeiro - 16.6.2020; STJ, HC 589.544/SC - Relatora: Min.ª Laurita Vaz - 25.6.2020; TJMT, HC 1013412-03.2020.8.11.0000 - Primeira Câmara Criminal - 29.6.2020), de modo que “não resulta na revogação automática da prisão preventiva” (HC n. 621.416/RS – Relator: Min. Sebastião Reis Júnior - 16.4.2021). Ainda, em que pese à argumentação defensiva, no sentido de que a ausência de revisão do ergástulo em 90 (noventa) dias acarretaria automaticamente a ilegalidade da custódia preventiva e ensejaria, consequentemente, seu relaxamento, sabe-se, todavia, ser pacífico o entendimento, no âmbito do c. Superior Tribunal de Justiça, de que “a falta de revisão da prisão preventiva a cada 90 dias não enseja automaticamente a revogação da custódia ou o reconhecimento de qualquer nulidade, mas somente a interpelação do juízo responsável para que faça a reavaliação legalmente determinada” (AgRg no HC n. 756.968/MT, Relator: Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 14/11/2022). Quanto à suposta ausência de realização da detração do período de prisão preventiva cumprido pelo paciente, trago à baila o teor da sentença, in verbis: “[...] Nos termos do artigo 387, § 2º, do CPP “o tempo de prisão provisória será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”. Eventual lapso temporal que o acusado tenha permanecido preso preventivamente não altera o regime aqui fixado. [...]” (Id. 272509396, p. 479) Da documentação acosta aos autos, não se observa sequer a data em que o paciente foi preso ou, se ainda está segregado, pois, foram juntadas no writ apenas a sentença e a denúncia. Todavia, considerando as datas informadas no mandamus, de 31/03/2023 como sendo a prisão do paciente e 28/08/2024, a data da sentença, a priori, considera-se quantum de 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 02 (dois) dias de segregação até a prolação da sentença e, tendo sido aplicada a pena de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses, remanesce a reprimenda de 10 (dez) anos e 28 (vinte e oito) dias, não havendo decurso de prazo apto a modificar o regime inicial de cumprimento, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “a” do Código Penal. Assim dispõe o Código de Processo Penal acerca da detração: “Art. 387. [...] § 2º O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade.” (negritou-se) Da leitura acima, observa-se que a detração deve ser realizada caso haja a modificação do regime a ser fixado na sentença, o que não se verifica no presente caso, neste momento. Quando da prolação da sentença, não houve a possibilidade de modificação do regime inicial de cumprimento de pena do paciente, uma vez que a sua reprimenda ainda seria superior a 08 (oito) anos. Trago à baila o teor da sentença, in verbis: “[...] Nos termos do artigo 387, § 2º, do CPP “o tempo de prisão provisória será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”. Eventual lapso temporal que o acusado tenha permanecido preso preventivamente não altera o regime aqui fixado. [...]” (Id. 272509396, p. 479) Sobre a alegada progressão de regime, a matéria é afeta à execução penal, pois, deve ser avaliado não apenas o critério objetivo, mas também a satisfação dos requisitos subjetivos. Isso porque esta ação mandamental foi impetrada patentemente como sucedâneo recursal. E, malgrado os argumentos vertidos na inicial, é imperativo reconhecer que a intenção precípua do impetrante é alcançar o resultado pretendido no recurso de agravo em execução de maneira mais rápida que a via ordinária. Aliás, acerca do tema, a Edição n. 36 – Habeas Corpus, da Jurisprudência em Teses do Superior Tribunal de Justiça, em seu item 1, dispõe da seguinte maneira: 1) O STJ não admite que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso próprio (apelação, agravo em execução, recurso especial),tampouco à revisão criminal, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade da paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus. Desse modo, a matéria suscitada, não deve ser conhecida pela via do habeas corpus, como substitutivo de recurso próprio, assim, mostrando-se possível tão somente a verificação sobre a existência de eventual constrangimento ilegal que autorize a concessão da ordem de ofício, o que não ocorre no presente caso. Ademais, impõe-se consignar que a concessão da progressão de regime, em regra, demanda exame aprofundado de todo conjunto de probatório, a fim de se verificar se o reeducando preenche os requisitos objetivos e subjetivos previstos em lei, medida que, a priori, não pode ser realizada dentro dos estreitos limites do habeas corpus que, como é cediço, não admite dilação probatória. Nesse sentido: [...] A via do Habeas Corpus não se presta a discutir eventual equívoco do cálculo de pena em execução penal, mormente quando não demonstrado, de plano, o preenchimento dos requisitos objetivos/subjetivos para a progressão de regime. [...](TJMT, N.U 1021232-73.2020.8.11.0000) (TJMT, N.U 1021738-49.2020.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 18/12/2020, Publicado noDJE 18/12/2020) Sobre a alegada falta de contemporaneidade da prisão do paciente, não se verifica no presente caso. Os requisitos da custódia prévia se mantém hígidos, haja vista que o paciente foi condenado pela imputação relativa aos delitos de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o mesmo fim, além de ter permanecido custodiado durante toda a fase processual, o que afasta a tese defensiva. Assim, estando a medida elencada nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal e não no lapso temporal, inexiste ofensa a ser sanada. In casu, a manutenção da segregação foi analisada na sentença, senão vejamos: “[...] Nego aos réus ALEXANDRE MARTINS DE OLIVEIRA, WEMERSON DOUGLAS DA SILVA TEDEIA, LAUANDA DOS SANTOS MANTELLI, HENRIQUE JALES PEREIRA, NELSON SILVA DE HOLANDA NETO, GUILHERME AUGUSTO CARNEZELLA CAMPOS, DANIEL MEDINA DORNAS, APOLINE LINS DE OLIVEIRA, ALCEDIR JÚNIOR SOUZA RODRIGUES, LUIZ GUSTAVO DO NASCIMENTO, MOISES CONCEIÇÃO DA SILVA, THIAGO FONSECA DE ALMEIDA PINHEIRO, GUSTAVO ALVES CONRRADO, IAGO ALVES CONRRADO, BRUNO RODRIGUES DE FARIAS, CARLOS EDUARDO DUARTE DE FREITAS, LUCAS ANTÔNIO ARAÚJO RIBAS, MATHEUS DA SILVA OLIVEIRA E MAXMYLLIANO CARDOSO MAGALHÃES RIBEIRO DA SILVA o direito de recorrerem em liberdade, considerando a fixação do regime fechado para cumprimento de pena; considerando que os réus permaneceram segregados durante toda a instrução processual e restaram todos condenados por tráfico de drogas e associação para o tráfico, e ainda outros por lavagem de capitais, bem como verificada a necessidade da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, nos termos do art. 312 do CPP. A ordem pública, no particular, compreende a preservação da sociedade contra eventual repetição do delito pelo agente, bem como quando o bem jurídico é afetado por conduta que ocasione impacto social, seja pela sua extensão ou outra circunstância. Embora seja certo que a gravidade do delito, por si só, não basta para a decretação da custódia, a forma de execução, a conduta dos acusados, antes e depois do ilícito, e outras circunstâncias podem abalar a ordem pública, impondo-se a medida para salvaguardá-la. Na hipótese, mostram-se patentes a gravidade em concreto do delito e a periculosidade social dos agentes, que possuem relevante papel na associação criminosa. Frise-se que foram constatadas diversas trocas de mensagens e arquivos telemáticos confirmando intensa movimentação financeira oriunda do tráfico, portanto, sem qualquer lastro lícito, prestação de contas, transações bancárias vultosas sem qualquer justificativa, dentre outros tantos ilícitos. Ainda, o grupo criminoso fazia uso de arma de fogo, com diversos dos seus membros adquirindo e compartilhando tais instrumentos bélicos. Se não bastasse, a elevada quantidade de drogas comercializada por todos os integrantes aponta o real dano que a liberdade dos réus promove à ordem pública, e não só, a própria variedade de entorpecentes, das mais variadas espécies também coloca em risco a sociedade com a eventual liberdade do grupo criminoso. Neste cenário fático, é possível inferir não somente que os requisitos para a decretação da prisão preventiva enunciados no artigo 312 do Código de Processo Penal encontram-se preenchidos no caso em voga, mas também que a manutenção da cautelar é a única forma de garantir, por ora, a incolumidade da ordem pública, o que afasta, por conseguinte, a possibilidade de substituição da prisão pelas medidas alternativas previstas no artigo 319 do mesmo diploma legal. Por fim, imperioso citar que não sobrevieram quaisquer mudanças no quadro fático da ação penal que pudesse autorizar a revogação da prisão preventiva, sequer a substituição desta por medidas cautelares diversas. [...]” (Id. 272509396, p. 506/508) Verifica-se que a autoridade apontada como coatora justifica a manutenção da segregação do paciente ante a presença de requisito previsto no artigo 312 do Código de Processo Penal, qual seja, a garantia da ordem pública. A prisão está alicerçada na gravidade concreta dos crimes praticados, evidenciada na periculosidade do paciente demostrada no modus operandi utilizado, ante a intensa movimentação financeira oriunda do tráfico de drogas, a elevada quantidade de entorpecente comercializada e sua variedade, além do uso de armas de fogo por integrantes deste grupo criminoso. A alegada ausência dos requisitos autorizadores da custódia já foi apreciada no Habeas Corpus nº 1005616-19.2024.8.11.0000, no qual, à unanimidade, a ordem foi denegada, restando assim ementado: “HABEAS CORPUS – PRISÃO PREVENTIVA – TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO AO TRÁFICO [ART. 33, CAPUT, C/C ART. 35, CAPUT, AMBOS DA LEI Nº 11.343/2006] – NEGATIVA DE AUTORIA - ASPECTO DEFENSIVO QUE EXIGE ANÁLISE APROFUNDADA DO CONTEXTO FÁTICO PROBATÓRIO – INVIABILIDADE – PRETENSÃO TÍPICA DE AÇÃO DE CONHECIMENTO – NULIDADE PROCESSUAL EM RAZÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL – MATÉRIA NÃO SUBMETIDA A ANÁLISE DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU – APARENTE SUPRESSÃO DE INSTANCIA - ALEGADA AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 312, DO CPP PARA MANUTENÇÃO DA SEGREGAÇÃO – MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM FUNDAMENTOS ENSEJADORES DA CUSTÓDIA QUE PERMANECEM INALTERADOS – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO – ORDEM DENEGADA. Quanto ao reconhecimento de nulidade processual, por ofensa ao princípio do promotor natural, em razão da não ratificação da denúncia, não há evidencia nos autos que a tese suscitada na impetração foi levada ao conhecimento e análise da autoridade apontada como coatora, de modo que sua apreciação por esta Corte de Justiça, implicaria em supressão de instância, o que é inadmissível. No caso em tela, a prisão preventiva e sua manutenção restou alicerçada em circunstâncias concretas do caso, que permitem sua subsunção ao requisito da garantia da ordem pública constante no art. 312 do Código de Processo Penal. “4. A técnica de motivação per relationem revela-se legítima se a sentença condenatória faz remissão às circunstâncias ensejadoras da decretação de prisão preventiva no início do feito, tendo em vista que elas permanecem incólumes. 5. Ordem denegada. (HC 609.582/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 03/11/2020, DJe 16/11/2020)”” A necessidade da manutenção da custódia em razão da gravidade da conduta, em tese, praticada e as circunstâncias que envolvem os fatos, considerando que os crimes foram praticados em contexto de associação criminosa, o modus operandi utilizado, ante a intensa movimentação financeira oriunda do tráfico de drogas, a elevada quantidade de entorpecente comercializada e sua variedade, além do uso de armas de fogo por integrantes deste grupo criminoso. Além disso, o paciente foi condenado ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos e 06 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, o que confirma a necessidade da segregação, a fim de acautelar a ordem pública, pois, evidencia o risco de reiteração delitiva. Nesse sentido, cumpre dizer que a prolação de sentença condenatória em desfavor do paciente confirma o preenchimento, no caso, dos requisitos do “fumus comissi delicti” e do “periculum libertatis”, contrariamente ao alegado pela defesa técnica, pelo que se revela perfeitamente adequada e proporcional, ao menos por ora, a manutenção da prisão preventiva do inculpado. Em igual direção, tem-se que a mera constatação de que a mais recente avaliação da imprescindibilidade da manutenção da segregação cautelar do inculpado se deu quando da prolação de sentença condenatória em desfavor deste – há mais de 90 (noventa) dias, portanto – não basta, isoladamente considerada, para ensejara ilegalidade da constrição. Especificamente acercado tema, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que o período de 90 (noventa) dias, definido pela Lei nº 13.964/2019 como prazo para reanálise da constrição cautelar, não é peremptório. Neste sentido: [...] No caso, a prisão processual está devidamente fundamentada na garantia da ordem pública, a partir do modus operandi do delito e da periculosidade do agente (ante a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa), não havendo falar, portanto, em existência de evidente flagrante ilegalidade capaz de justificar a sua revogação. Destacado pelas instâncias ordinárias, com base em elementos extraídos dos autos, a gravidade concreta da conduta: o acusado, conforme conteúdo do inquérito policial, de relatórios e comunicações de serviço acostados aos autos, teria, em tese, envolvimento com organização criminosa estruturada, com divisão de tarefas e hierarquia entre os membros, com atuação interestadual, dedicada à prática do delito conhecido como "golpe do motoboy", o qual, através de meio fraudulento, causava prejuízo financeiro através da prática do crime de estelionato em vítimas portadoras de contas na Caixa Econômica Federal. Sublinhou-se, ainda, que mesmo após a prisão de um dos integrantes da organização criminosa, continuou a atuar pelo menos até o ano de 2023, tendo o ora paciente sido alvo de recentes investigações pela Polícia Civil, ocorridas em 29 de novembro de 2023. 3. A presença de condições pessoais favoráveis, como residência fixa e atividade lícita, não impede a decretação da prisão preventiva, quando devidamente fundamentada, assim como inaplicável medida cautelar alternativa quando as circunstâncias evidenciam que as providências menos gravosas seriam insuficientes para manutenção da ordem pública. 4. Consoante orientação jurisprudencial desta Corte, "A regra da contemporaneidade comporta mitigação quando, ainda que mantido período de aparente conformidade com o Direito, a natureza do delito indicar a alta possibilidade de recidiva ou "ante indícios de que ainda persistem atos de desdobramento da cadeia delitiva inicial (ou repetição de atos habituais)", como no caso de pertencimento a organização criminosa" (HC n. 496.533/DF, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 18/6/2019). 5. A tese relativa à revisão de ofício, da necessidade da prisão cautelar, a cada 90 dias, conforme previsão do art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal - CPP, não foi debatida pelo Tribunal de origem, de sorte que, não cabe a este Superior Tribunal de Justiça o seu julgamento sob pena de incorrer em indevida supressão de instância. Ademais, não se trata de prazo peremptório, de modo que eventual atraso na reanálise da necessidade da custódia não induz ao reconhecimento automático de ilegalidade da prisão que justifique a liberdade do réu. 6. Pedido de reconsideração recebido como agravo regimental, ao qual se nega provimento. (RCD no HC n. 918.829/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 23/10/2024, DJe de 25/10/2024.) (negritou-se) [...] O prazo de 90 dias é examinado pelo prisma jurisprudencialmente construído de valoração casuística, não dotado de peremptoriedade, o que se conjuga com as informações dos autos de que até 2/3/2021 os mandados de prisão ainda constavam como em aberto. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 625.305/MG, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª REGIÃO), Sexta Turma, julgado em 17/8/2021, DJe de 20/8/2021.) Ainda, em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, em 14 de outubro de 2020, sobre a tese da reavaliação da prisão, entendeu-se que: “A inobservância do prazo nonagesimal do art. 316 do CPP, não implica automaticamente revogação da prisão preventiva. Devendo o juízo competente ser instado a reavaliar a legalidade e atualidade de seus fundamentos.” Suspensão de Liminar n. 1.395/SP. Ou seja, eventual atraso na execução deste ato “não implica automático reconhecimento da ilegalidade da prisão, tampouco a imediata colocação do custodiado cautelar em liberdade”. No caso, tem-se que a ausência de nova análise até o presente momento decorreria, precisamente, da ausência da remessa dos autos oriundos da Comarca de Sinop/MT para essa Egrégia Corte de Justiça, eis que o feito está aguardando a apresentação de razões recursais de coacusada (Apoline Lins), bem como contrarrazões recursais. Insta ressaltar que o presente processo se trata de um caso complexo, na medida em que se apura a prática de delitos que envolvem vários acusados – 42 (quarenta e dois) réus, sendo que o processo já foi desmembrado para dar celeridade, com patronos diferentes, decorrente da Operação “Recovery”, onde supostamente praticam os crimes de Tráfico de Drogas, Associação para o Tráfico e Lavagem de Dinheiro, fatores que, naturalmente, demandam maior esforço por parte do Judiciário. De qualquer sorte, a situação prisional do paciente foi satisfatoriamente reanalisada no presente momento, confirmando-se a necessidade de manutenção de seu encarceramento. Diante da gravidade da conduta, em tese, perpetrada e as circunstâncias que envolveram os fatos, considerando que o crime foi praticado em contexto de associação delituosa, além do modus operandi desenvolvido no delito, além do fato de que este permaneceu preso durante toda a instrução processual, sem que houvesse alteração nos motivos que ensejaram a prisão, sendo condenado ao cumprimento de pena superior a 08 (oito) e a consequente condenação do paciente à pena superior a oito anos, a ser descontada inicialmente em regime fechado. Oportunamente, trago decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça: [...] A propósito, "A gravidade em concreto do crime e a periculosidade do agente, evidenciada pelo modus operandi, constituem fundamentação idônea para a decretação da custódia preventiva" (HC 212647 AgR, Relator Ministro ANDRÉ MENDONÇA, Segunda Turma, julgado em 05/12/2022, DJe 10/01/2023). 5. Além disso, o entendimento abraçado pelas instâncias ordinárias encontra-se em harmonia com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que, tendo o paciente permanecido preso durante todo o andamento da ação penal, não faria sentido, ausentes alterações nas circunstâncias fáticas, que, com a superveniência da condenação, lhe fosse deferida a liberdade. 6. Ora, "a existência de édito condenatório enfraquece a presunção de não culpabilidade, de modo que seria incoerente, não havendo alterações do quadro fático, conceder, nesse momento, a liberdade" (RHC n. 105.918/BA, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, julgado em 12/3/2019, DJe 25/3/2019). [...] (AgRg no HC n. 955.894/ES, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 11/12/2024, DJEN de 16/12/2024.) Quanto ao alegado excesso de prazo da prisão do beneficiário, impõe-se registrar que os prazos processuais não são peremptórios e deverão ser considerados com base no princípio da razoabilidade, mormente em casos como o que ora se discute, no qual há complexidade do feito, decorrente da quantidade de réus (quarenta e dois denunciados), vários fatos e tipos penais, além de diversos requerimentos de revogação das custódias em primeiro grau de jurisdição. E, consoante acima já observado, o decreto preventivo do paciente foi mantido na sentença, porquanto amparado em fundamentos legítimos para a manutenção da sua custódia. Fato é que, por ocasião da sentença, essas balizas se confirmaram, quanto à responsabilidade penal do paciente. Naturalmente, inalterada, no presente momento, a possibilidade não só da fratura da ordem pública, reforçada que é pelo advento da condenação mesmo que recorrível, faz nascer outro requisito que autoriza a segregação para garantia do cumprimento da pena imposta, pelo que decorre não existir ofensa ao direito de ir e vir que se diz afrontado pela autoridade judiciária acoimada de coatora. Além disso, importante observar que o beneficiário permaneceu preso preventivamente durante todo o processo, o que, na visão da jurisprudência dos Tribunais Superiores, afasta eventual alegação de ilegalidade por ausência de fundamentação, inexistindo ofensa ao disposto no artigo 387, § 1º do Código de Processo Penal, ou artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. E nesse tocante, merece maior relevo o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, ao consignar incompatibilidade da soltura do acusado com sentença condenatória, se permaneceu segregado durante toda a instrução processual, claro, desde que ainda permanentes os motivos que motivaram a sua custódia cautelar, como no caso, veja-se: [...] A orientação pacificada nesta Corte Superior é no sentido de que não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer solto quando permaneceu segregado durante a persecução criminal, se persistentes os motivos para a preventiva. [...] (STJ, RHC n. 80528/RJ, 5ª Turma,DJe 5.4.2017) [...] No caso, constatado que o recorrente respondeu preso a todo o processo, a exigência de fundamentação exaustiva e a possibilidade do recurso em liberdade devem ser avaliadas com excepcional prudência. (...). Noutras palavras, é incompatível com a realidade processual manter o acusado preso durante a instrução e, após a sua condenação, preservado o quadro fático-processual decorrente da custódia cautelar, assegurar-lhe a liberdade; afinal, assim como já assinalou o Supremo Tribunal Federal, trata-se de situação em que enfraquecida está a presunção de não culpabilidade, pois já emitido juízo de certeza acerca dos fatos, materialidade, autoria e culpabilidade, ainda que não definitivo. 4. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento [...] (RHC n. 42.206/SP, 5ª Turma, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 26.2.2014) [...] Tendo o recorrente permanecido preso durante toda a instrução processual, não deve ser permitido recorrer em liberdade, especialmente porque, inalteradas as circunstâncias que justificaram a custódia, não se mostra adequada a soltura dele depois da condenação em Juízo de primeiro grau. [...] (RHC 88.252/PI, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 17/10/2017, DJe 27/10/2017). [...] Não há sentido lógico permitir que o réu, preso preventivamente durante toda a instrução criminal, possa aguardar o julgamento da apelação em liberdade” (HC 89.089, Primeira Turma, Relator o Ministro Ayres Britto, DJe de 01.06.07). [...] (HC 120319, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 29/04/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-154 DIVULG 08-08-2014 PUBLIC 12-08-2014) Nesse sentido, fica evidenciado que o direito de recorrer em liberdade não é absoluto, podendo o magistrado determinar a manutenção da prisão preventiva ou mantê-la, quando persistirem os requisitos constantes dos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal, além de se mostrarem insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão. Os requisitos da custódia prévia se mantém hígidos, haja vista que o paciente foi condenado pela imputação relativa aos delitos de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o mesmo fim, além de ter permanecido custodiado durante toda a fase processual, o que afasta a tese defensiva. Ademais, utilizou-se da técnica de motivação per relationem, ao fazer referência ao fato de o paciente ter permanecido preso preventivamente durante toda a instrução processual. Tal forma de fundamentação é perfeitamente válida, conforme o Enunciado Criminal nº 50, deste Tribunal de Justiça: "A motivação per relationem (aliunde) constitui fundamentação idônea para negar ao réu, preso durante toda a instrução processual, o direito de recorrer em liberdade." A defesa alega, ainda, que a manutenção da prisão preventiva viola o princípio da presunção de inocência, previsto no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. Contudo, é cediço que o princípio da presunção de inocência não é absoluto, podendo ser mitigado em casos excepcionais, desde que devidamente fundamentados, quando necessária a decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal. Como bem pontuado pelo douto Procurador de Justiça em seu parecer, "o que há é a conhecida prevalência do direito público sobre o direito individual, em que a necessidade de resguardar a segurança coletiva se sobrepõe à presunção de que o paciente é inocente e ao seu direito de ser processado antes de ser restringida a sua liberdade". Nesse sentido já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal: [...] O decreto de prisão preventiva que preenche os requisitos legais por meio de fundamentação idônea não viola a garantia da presunção de inocência. Precedentes. [...] (HC 134383, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 29-11-2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-264 DIVULG 12-12-2016 PUBLIC 13-12-2016) Assim, não há que se falar em violação ao princípio da presunção de inocência no caso concreto, uma vez que a prisão preventiva foi devidamente fundamentada na necessidade de garantia da ordem pública, diante da gravidade concreta dos delitos e da periculosidade social do paciente. No tocante à pretensa substituição da prisão por medidas cautelares diversas, a jurisprudência majoritária entende que, uma vez presentes os requisitos autorizadores da custódia, as medidas cautelares apresentam-se inadequadas. Por fim, presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva, inviável cogitar aplicabilidade de qualquer medida alternativa, prevista no artigo 319 do Código de Processo Penal, ao menos neste momento. Nesse sentido: [...] Verifica-se que ao contrário do que sustenta o impetrante, a custódia preventiva da paciente, encontra-se suficientemente fundamentada, em face das circunstâncias do caso que, apresenta materialidade e indícios de autoria, demonstrando a necessidade da medida para a garantia da ordem pública, Conveniência da Instrução e Investigação Criminal, diante seu suposto envolvimento com organização criminosa voltada ao tráfico de drogas. [...] (N.U 1026482-19.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 05/04/2023, Publicado no DJE 10/04/2023) [...] Descabe cogitar em ausência de requisitos autorizadores da prisão preventiva, quando o decreto constritivo se mostra devidamente fundamentado com esteio em elementos do caso concreto, os quais demonstram a gravidade em concreto da conduta e o risco de reiteração delitiva, além de demonstrar a insuficiência da aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. É possível embasar a custódia cautelar na necessidade de desarticular a organização criminosa e estancar as atividades criminosas que rotineiramente praticam, em consonância com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. (N.U 1017146-88.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PEDRO SAKAMOTO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 27/09/2022, Publicado no DJE 28/09/2022) Quanto às condições pessoais, é uníssono o entendimento de que “... persistindo os requisitos autorizadores da segregação cautelar (art. 312 CPP), é despiciendo o paciente possuir condições pessoais favoráveis...” (HC 294.725/MS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, QUINTA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 17/06/2014). Destaca-se como oportuno, o Enunciado Orientativo nº 43 deste E. Tribunal: “43 – As condições pessoais favoráveis não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quando presente o periculum libertatis.” Desta feita, neste momento, mostra-se incabível a revogação da custódia ou a sua eventual substituição por cautelares menos onerosas. Assim, não se observa no presente mandamus a juntada de documentação necessária para a análise do alegado constrangimento ilegal. Há, na verdade, uma completa ausência documental que demonstre o suposto constrangimento ilegal mencionado pelo impetrante. Por oportuno, não se permite analisar o suposto constrangimento ilegal, haja vista não terem sido colacionadas ao presente mandamus as decisões necessárias para a devida apuração do alegado. O impetrante limita-se a alegar respectivos fatos, omitindo-se de trazer aos autos qualquer documento hábil a comprovar seus argumentos, juntando documentos sem qualquer conteúdo apto a analisar o pleito. Desta feita, não há como conceder nenhuma liminar “ex officio”, em um habeas corpus de ofício. Como é cediço, o Habeas Corpus exige prova pré-constituída, capaz de demonstrar a ilegalidade da prisão do paciente, cabendo ao impetrante demonstrar a desnecessidade efetiva da prisão ocorrida, sendo, desta forma, indispensável que este instrua o seu pedido com os documentos hábeis a comprovar a veracidade dos fatos aduzidos, bem assim o suposto constrangimento ilegal. Neste sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: [...] Em relação à gravidade concreta da conduta, a defesa não juntou à impetração cópia da denúncia, ou mesmo da decisão de pronúncia, de modo que apenas se pode extrair dos autos tratar-se de crimes de homicídios qualificados consumado e tentado, e organização criminosa. Ora, sem conhecimento efetivo do fato, inviável analisar a tese defensiva de que a fundamentação, ao apontar a gravidade concreta da conduta, foi inidônea. 5. O rito do habeas corpus pressupõe prova pré-constituída do direito alegado, devendo a parte demonstrar, de maneira inequívoca, por meio de documentos, a existência de constrangimento ilegal imposto ao paciente. [...] (HC 547.164/GO, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 20/02/2020, DJe 28/02/2020) (negritou-se) [...] Em sede de habeas corpus, a prova deve ser pré-constituída e incontroversa, cabendo ao impetrante apresentar documentos suficientes à análise de eventual ilegalidade flagrante no ato atacado. Na espécie, o processo não foi instruído com o inteiro teor dos embargos de declaração, peça processual necessária para exame da matéria. [...] Para se alcançar a constatação obtida pelo laudo pericial, necessário seria a este Superior Tribunal examinar o conteúdo das interceptações telefônicas, cotejando as datas dos diálogos com os períodos autorizados judicialmente. Tal medida escapa aos limites estreitos do habeas corpus, ação de índole constitucional, marcado por cognição sumária e rito célere, que tem como escopo resguardar a liberdade de locomoção contra ilegalidade ou abuso de poder, vedada, assim, dilação probatória para o deslinde da controvérsia. [...] (HC 469.871/GO, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 21/03/2019, DJe 26/03/2019) (negritou-se) Mesmo entendimento possui este E. Tribunal de Justiça: [...] “A ação mandamental de habeas corpus exige a apresentação de prova pré-constituída, recaindo sobre o impetrante o ônus de instruir corretamente o mandamus a fim de que seja possível identificar o alegado constrangimento ilegal.” (AgRg no HC 470.123/DF). [...] (N.U 1011941-20.2018.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PEDRO SAKAMOTO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 28/11/2018, Publicado no DJE 10/12/2018) [...] O Habeas Corpus é ação de cognição sumária baseada em prova pré-constituída e que não comporta dilação probatória, à míngua de fase processual específica para tanto, razão por que, a eventual discussão acerca de ser o Paciente mero usuário de drogas, deve ser suscitada na esfera própria, sob o crivo do Contraditório e da Ampla defesa. (N.U 1000140-73.2019.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 06/02/2019, Publicado no DJE 10/02/2019) Por todo o exposto, em consonância com o parecer ministerial, denego a ordem de habeas corpus impetrada em favor de É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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