Ministério Público Do Estado Do Paraná x João Vitor Tresk
ID: 262303620
Tribunal: TJPR
Órgão: Vara Criminal de Cândido de Abreu
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0000936-84.2024.8.16.0059
Data de Disponibilização:
29/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALEXANDRA DA SILVA AGUIAR
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE CÂNDIDO DE ABREU VARA CRIMINAL DE CÂNDIDO DE ABREU - PROJUDI Av Visconde Charles de Laguiche , Nº 795 - Fórum Sallustio Lamenha Lins de Souza - Centro …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE CÂNDIDO DE ABREU VARA CRIMINAL DE CÂNDIDO DE ABREU - PROJUDI Av Visconde Charles de Laguiche , Nº 795 - Fórum Sallustio Lamenha Lins de Souza - Centro - Cândido de Abreu/PR - CEP: 84.470-000 - Fone: 43) 3572-9780 - Celular: (43) 3572-9782 - E-mail: ca-ju-scr@tjpr.jus.br Autos nº. 0000936-84.2024.8.16.0059 Processo: 0000936-84.2024.8.16.0059 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Tráfico de Drogas e Condutas Afins Data da Infração: 20/10/2024 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): SOLIVAN DE LIMA Réu(s): JOÃO VITOR TRESK 1. Relatório Trata-se de ação penal ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Paraná contra João Vitor Tresk, já qualificado, atribuindo-lhe a prática, em tese, dos delitos de tráfico de drogas, lesão corporal, ameaça, desobediência, desacato e dano qualificado, na forma descrita pela denúncia de seq. 47.1: Fato 1 No dia 21 de outubro de 2024, por volta da 00h32min, no entorno da Praça José Malucelli França, próximo ao estabelecimento comercial “Lanchonete Tropical”, neste município e Comarca de Cândido de Abreu/PR, o denunciado JOÃO VITOR TRESK, agindo dolosamente, com consciência e vontade, trazia consigo, para fins de comercialização e sem autorização, 16 (dezesseis) porções de substância análoga à maconha, pesando 123 (cento e vinte e três) gramas, droga que causa dependência física e/ou psíquica, sendo de uso proscrito no território nacional pela Portaria nº 344/1998-ANVISA/MS (cf. termos de depoimentos/declarações - mídias audiovisuais de movs. 1.5-1.6, 1.7-1.8 e 1.9-1.10; auto de exibição e apreensão de mov. 1.14; auto de constatação provisória de droga de mov. 1.16; fotografia da droga apreendida de mov. 1.17; e Boletim de Ocorrência nº 2024/1313588 de mov. 1.18). Consigne-se que momentos antes da abordagem policial, o acusado ofereceu à venda a droga a terceiros, fato presenciado pela testemunha Solivan de Lima. Frise-se, ainda, que em poder do acusado foi apreendida a importância de R$32,00 (trinta e dois reais) em notas diversas. Fato 2 Nas mesmas circunstâncias de dia, horário e local supramencionados, neste município e Comarca de Cândido de Abreu/PR, o denunciado JOÃO VITOR TRESK, dolosamente, com consciência e vontade, ofendeu a integridade corporal de Solivan de Lima, utilizando-se, para tanto, de um pedaço de madeira grande, desferindo-lhe um golpe que provocou as lesões corporais de natureza leve descritas no laudo de exame de lesões corporais de mov. 42.16 (cf. termo de declaração/mídia audiovisual de movs. 1.9-1.10; Boletim de Ocorrência nº 2024/1313588 de mov. 1.18; e imagens de câmeras de segurança do estabelecimento “Lanchonete Tropical” de movs. 1.19, 39.3 e 42.17; e laudo de exame de lesões corporais de mov. 42.16, documentos dos quais se infere a necessária representação criminal). Fato 3 Ainda no mesmo contexto fático, neste município e Comarca de Cândido de Abreu/PR, o denunciado JOÃO VITOR TRESK, agindo dolosamente, com consciência e vontade, ameaçou causar mal injusto e grave à vítima Solivan de Lima, dizendo que “se fosse preso o mataria” e “que essa fita não ficaria assim, que seria cobrado” (cf. Boletim de Ocorrência nº 2024/1313588 de mov. 1.1; e termo de declaração/mídia audiovisual de movs. 1.9-1.10, documentos dos quais se infere a necessária representação criminal). Fato 4 Ato contínuo, nas mesmas circunstâncias de tempo e espaço, neste município e Comarca de Cândido de Abreu/PR, o denunciado JOÃO VITOR TRESK, agindo dolosamente, com consciência e vontade, desobedeceu à ordem legal de abordagem emanada pelos policiais militares Junio do Espírito Santo e Gabriel Rodrigues, servidores públicos, empreendendo fuga, tendo sido necessário o uso de força para contê-lo, além de técnicas de imobilização e uso do espargidor G PIM MAX, número de série 2105735 (cf. Boletim de Ocorrência nº 2024/1313588 de mov. 1.18; e termos de depoimentos/mídias audiovisuais de movs. 1.5-1.6 e 1.7-1.8). Fato 5 Prosseguindo nas mesmas condições de data, hora e local, neste município e Comarca de Cândido de Abreu/PR, o denunciado JOÃO VITOR TRESK, agindo dolosamente, com consciência e vontade, desacatou os policiais militares Junio do Espírito Santo e Gabriel Rodrigues, servidores públicos que se encontravam no exercício das suas funções, desprestigiando-os por meio de palavras, xingando-os de “merdas” e “bando de pau no cu” (cf. Boletim de Ocorrência nº 2024/1313588 de mov. 1.18; termos de depoimentos/mídias audiovisuais de movs. 1.5-1.6 e 1.7-1.8). Fato 6 Por fim, dando continuidade à ação delitiva, no contexto fático acima descrito, neste município e Comarca de Cândido de Abreu/PR, o denunciado JOÃO VITOR TRESK, agindo dolosamente, com consciência e vontade, deteriorou a viatura policial L1943 da Polícia Militar, pertencente ao Estado do Paraná, desferindo um chute que acarretou danos patrimoniais consistentes em amassado na lataria da porta traseira (cf. Boletim de Ocorrência nº 2024/1313588 de mov. 1.18; termos de depoimentos/mídias audiovisuais de movs. 1.5-1.6 e 1.7-1.8). Recebida a denúncia em 01/11/2024 (seq. 51.1). Citado pessoalmente (seq. 83.1), o réu apresentou resposta à acusação por meio de advogada nomeada, sem apresentar preliminares (seq. 89.1). Proferida decisão saneadora, foi designada audiência de instrução e julgamento (seq. 95.1). Juntada de laudo pericial (seq. 118.1). Realizada audiência de instrução e julgamento, foram colhidas as declarações da vítima, de três testemunhas e interrogado o réu (seqs. 126.1-6 e 127.1). Atualizados os antecedentes criminais do réu (seq. 128.1). Alegações finais pelo Ministério Público ao seq. 145.1, pugnando pela procedência da pretensão punitiva, nos termos da denúncia. A defesa, por sua vez, quanto ao tráfico de drogas, pugnou pela desclassificação para o delito de posse de drogas para consumo pessoal ou, subsidiariamente, o reconhecimento do tráfico privilegiado. Em relação aos demais fatos, alega fragilidade probatória, ausência de dolo específico e mínima lesividade das condutas. Em caso de condenação, requereu a fixação da pena no mínimo legal, com reconhecimento das atenuantes da menoridade relativa e confissão espontânea, além da compensação com eventual agravante de reincidência. Pleiteia também a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, o direito de recorrer em liberdade, a concessão da justiça gratuita e a fixação de honorários à defensora dativa (seq. 149.1). Vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido. 2. Fundamentação Estão presentes os pressupostos processuais e condições necessárias ao exercício da ação penal, tendo a vítima manifestado expresso interesse na representação do acusado quanto à infração penal de ameaça, na forma do art. 147, parágrafo único, do Código Penal (seq. 1.9-10). Faz-se possível, assim, o exame imediato da pretensão acusatória deduzida pelo órgão ministerial, razão pela qual se passa à revisão da prova oral. A vítima Solivan de Lima relatou (seq. 126.1) que foi agredido pelo réu com um pedaço de madeira e com uma lajota. Afirmou ter registro em vídeo do ocorrido. Relatou que levou uma madeirada no braço direito e, em seguida, o réu arremessou uma lajota. Disse não recordar o motivo da briga, mas que inicialmente se cumprimentaram e, em seguida, o acusado ficou alterado. Estava na Lanchonete Tropical quando foi agredido. Descreveu o réu como “loucão” no momento dos fatos. Sofreu lesão no braço, a qual já havia cicatrizado à época do depoimento. Não ficou impossibilitado de realizar atividades por conta da lesão, mas procurou atendimento médico. O acusado teria proferido ameaça de morte caso fosse preso. Sentiu medo na hora, embora não saiba se o réu seria realmente capaz de lhe fazer mal. Conhece o acusado apenas de vista. Nunca tiveram desentendimentos anteriores. Não deu tapa no rosto dele. A testemunha Hadrean Eduan Marim narrou (seq. 126.2) que estava na praça quando o réu chegou acompanhado de um rapaz moreno. Pouco depois, outro piá se aproximou e iniciou-se uma discussão entre eles. O réu saiu com o piá moreno, mas retornou logo em seguida com um pedaço de pau e uma lajota nas mãos. Ele avançou contra a vítima e a agrediu. Presenciou a agressão, mas não soube apontar o motivo da discussão. Não presenciou qualquer ameaça. Não conhecia os envolvidos. Naquele dia, havia poucas pessoas no local. A testemunha Gabriel Rodrigues, policial militar, narrou (seq. 126.3) que, na data dos fatos, a equipe foi acionada por meio do celular de plantão, com denúncia de briga na praça central. Segundo o solicitante, havia dois envolvidos. Ao chegarem, avistaram dois homens deixando o local e realizaram abordagem: tratavam-se de Amauri e do réu, ambos conhecidos da polícia por envolvimento com tráfico e furto. Em revista pessoal, nada foi encontrado com Amauri, mas no moletom do réu foram localizadas porções de maconha embaladas em papel transparente e fracionadas, além de dinheiro trocado. O réu tentou fugir, sendo contido pela equipe. Resistiu com empurrões, xingamentos — como “seus merdas” e “bando de pau no cu” — e desferiu chutes contra a tampa traseira da viatura, causando danos. Durante a ocorrência, a vítima Solivan aproximou-se e afirmou ter ouvido o réu oferecer drogas a terceiros, o que teria motivado a briga. O réu inicialmente obedeceu à abordagem, mas tentou escapar ao ser flagrado com a droga. Ele chegou a arrancar as roupas em via pública. A droga foi encontrada no bolso interno do moletom, próximo à esquina da praça. A equipe era composta por dois policiais, sendo que um fazia a abordagem e o outro dava suporte. Não soube dizer qual dos dois localizou a droga. O réu apresentava sinais de embriaguez e uso de entorpecentes, e já havia demonstrado comportamento agressivo em abordagens anteriores. O policial militar Junio do Espirito Santo narrou (seq. 126.4) que a equipe foi acionada via celular do plantão enquanto realizava patrulhamento. A denúncia informava sobre uma briga na Praça Brasil. Como estavam próximos, o deslocamento foi rápido. No local, visualizaram dois homens deixando a praça. Ambos demonstraram nervosismo e apressaram o passo ao verem a viatura. Populares apontaram um deles como responsável pela briga. Realizada a abordagem, foram identificados como o réu, João, e Amauri. Durante busca pessoal, encontraram porções de maconha fracionadas e embaladas no bolso do moletom do réu, além de dinheiro. Amauri não portava nada ilícito. Solivan se aproximou e contou que estava na praça com amigos quando ouviu o réu tentando vender drogas a outros homens, e que, em seguida, foi agredido por ele com um pedaço de pau e cerâmicas de um depósito próximo. Diante da situação, foi dada voz de prisão ao réu, que reagiu, tentando fugir. Foi contido com uso de força. Já detido, desferiu chutes contra a tampa do camburão, causando danos, e proferiu ameaças e ofensas aos policiais, utilizando expressões como “vermes”, “bando de pau no cu” e “merdas”. No destacamento, ele também ameaçou Solivan. Não soube informar o valor do dano causado à viatura. O réu trajava moletom no momento da abordagem. Não se recorda se foi ele ou seu parceiro quem localizou a droga. A busca ocorreu a cerca de 30 metros da praça. Amauri acompanhava o réu, mas acabou se evadindo. Houve aglomeração de populares durante a abordagem. Apenas Solivan mencionou o envolvimento do réu com entorpecentes. Apesar de ser conhecido no meio policial, o réu não apresentava sinais visíveis de embriaguez ou uso recente de drogas. Por fim, foi interrogado o réu, João Vitor Tresk (seq. 126.5). Declarou que, no dia dos fatos, estava alterado e se envolveu em uma briga com Solivan, motivada por ciúmes relacionados a uma garota. Ao chegar na praça, foi provocado por Solivan, que o xingou e ergueu a mão, sendo afastado por pessoas que acompanhavam o interrogado. Já a caminho de casa, foi informado de que Solivan estaria falando mal de sua avó, o que o levou a retornar ao local e agredi-lo com uma lajota e um pedaço de pau, após Solivan ter dito que sua avó não sabia criá-lo. Estava sob efeito de álcool e cocaína. Também havia ingerido bebida alcoólica. Admitiu ter feito ameaças ao ofendido. Havia comprado cerca de 50g de maconha para consumo próprio, e acredita que Solivan tenha presumido que estivesse traficando. Durante a abordagem, os policiais encontraram a porção de maconha no bolso de trás da calça. Tentou fugir após um dos policiais dizer que iriam lhe dar um "rolezinho", termo que se refere a ser levado até a beira do rio para ser agredido e afogado. Alegou que já havia passado por situação semelhante anteriormente. Os danos na viatura podem ter ocorrido quando tentou pedir ajuda, momento em que se segurou nela, negando ter desferido chutes. Foi conduzido à delegacia após seus amigos avisarem sua mãe. Confessou ter ofendido os policiais com termos como “pau no cu” e “pilantra”, mas isso ocorreu apenas na Polícia Civil, em razão da ameaça do “rolezinho”. A população também xingou os policiais na praça. Negou estar com 16 buchas de maconha, afirmando que portava uma única porção de 50 g, pela qual pagou R$ 250,00. O dinheiro que levava no bolso seria o troco da compra. Inicialmente não resistiu à abordagem, mas, após a menção ao "rolezinho", se desesperou, tentou fugir e acabou sendo imobilizado com uso de spray de pimenta. No destacamento, um policial o agrediu com um chute no rosto. O bolso do casaco era pequeno e não comportava nem mesmo um celular, que teria sido retirado do bolso de trás de sua calça. 2.1. Fato 1 – tráfico de drogas De acordo com o art. 33, caput da Lei n. 11.343/2006, o crime de tráfico de drogas consiste em “importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. No presente caso, atribui-se ao acusado a prática do verbo nuclear do tipo de “trazer consigo”, eis que foram encontrados entorpecentes no bolso de sua blusa, segundo a denúncia. A materialidade decorre do auto de prisão em flagrante (seq. 1.4), do boletim de ocorrência (seq. 1.18), das declarações prestadas pelos condutores e demais testemunhas (seqs. 1.6, 1.8, 1.10), do interrogatório extrajudicial do acusado (seq. 1.12), do auto de exibição e apreensão (seq. 1.14), do auto de constatação provisória de droga (seq. 1.16), da fotografia das drogas (seq. 1.17), das imagens de câmeras de segurança (seqs. 39.2-4), do laudo pericial (seq. 118.1) e das demais provas produzidas sob o crivo do contraditório. A autoria, igualmente, é certa e recai sobre o acusado. De acordo com o laudo pericial de seq. 118.1, o material apreendido apresentou identificação positiva para maconha, substância elencada na Portaria n. 344/1998 da Anvisa que regulamenta o termo “droga” contido na norma penal em branco. Ante as circunstâncias do caso concreto e ausência de quaisquer provas em sentido contrário, restou evidenciado que o ato de trazer consigo a substância entorpecente se deu sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. A destinação comercial da droga é extraída das próprias informações prestadas pelo acusado e dos depoimentos das testemunhas. Solivan de Lima, em inquérito, afirmou que o acusado estava mexendo com droga na praça (seq. 1.10). Consta que Solivan repassou tal informação aos policiais militares Gabriel Rodrigues e Junio do Espirito Santo, o que foi confirmado pelos agentes em juízo. O policial militar Gabriel Rodrigues relatou que a equipe foi acionada para atender ocorrência relativa a briga ocorrendo na Praça Brasil. No local, visualizaram dois indivíduos deixando a praça e os abordaram. Momentos antes, Solivan comunicou aos policiais que o réu estaria comercializando entorpecentes na praça. Durante busca pessoal realizada no réu, encontraram algumas porções de maconha acondicionadas no bolso do moletom do acusado. No mesmo sentido é a declaração do policial militar Junio do Espírito Santo. O policial corroborou a versão de seu colega, afirmando que se deslocaram até a Praça Brasil após serem informados de que lá estaria ocorrendo uma briga. Na praça, visualizaram dois homens, os quais, quando observaram a aproximação da viatura, demonstraram nervosismo. Discorre que a equipe foi abordada por Solivan, que disse ter ouvido o réu tentando vender drogas no local. Afirma que foram encontradas, em busca pessoal no réu, várias embalagens contendo maconha, armazenadas no bolso de seu moletom. O réu, no entanto, nega a propriedade da droga apreendida. Afirmou ser usuário e que, naquela data, havia adquirido 50 g de maconha, pelo valor de R$ 250,00. Alegou que, durante a abordagem, os policiais sugeriram “dar um rolezinho”, o que, segundo o acusado, consistiria em levá-lo para as margens do rio e torturá-lo. Suscita, deste modo, a possibilidade de os policiais militares terem forjado o flagrante. A negativa de autoria encontra-se isolada nos autos. Inexistem indícios mínimos de que os policiais militares tivessem, de algum modo, fraudado a apreensão e “plantado” a droga nos bolsos da blusa do denunciado. O réu afirmou, em seu interrogatório judicial, que diversas pessoas presenciaram a abordagem e ouviram os policiais sugerindo “dar um rolêzinho”, porém, a defesa não arrolou nenhuma dessas pessoas como testemunhas. A respeito dos depoimentos dos policiais militares, inexistem quaisquer razões para desconsiderá-los, mormente porque não há demonstração de nenhum motivo que teriam para incriminar falsamente o acusado, devendo sua declaração ser tratada com o mesmo peso das demais provas produzidas, especialmente porque sua versão é coesa e harmônica. A tese desclassificatória para o delito do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 também não merece prosperar, pois há nos autos provas suficientes para concluir que o denunciado trazia consigo drogas para finalidade comercial. A quantidade de droga apreendida (123 g), embora não seja excepcionalmente elevada, é considerável. Além disso, a substância estava fracionada em 16 buchas, envoltas em plástico transparente, conforme fotografia juntada no seq. 1.17, sendo pouco crível que fosse destinada a consumo próprio. A alegação de que é usuário não é suficiente, por si só, para afastar a traficância, na medida em que não é incomum que usuários de drogas comercializem entorpecentes para sustentar a própria dependência química. Também é irrelevante, para caracterização do crime de tráfico de drogas, a apreensão de petrechos comuns à tal atividade, como balança de precisão, caderno de anotações ou celulares com trocas de mensagens que indicam a comercialização de entorpecentes. Se as demais provas evidenciam o contexto de mercancia, resta caracterizado o delito, consoante entendimento jurisprudencial consolidado: DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. LEI Nº 11.343/2006, ART. 33, CAPUT. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS PARA ALTERAÇÃO DO CRIME IMPUTADO. DEPOIMENTOS POLICIAIS EVIDENCIANDO TRAFICÂNCIA. ALEGAÇÃO DE DEPENDÊNCIA QUÍMICA NÃO COMPROVADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO, COM AFASTAMENTO, DE OFÍCIO, DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS CAUSADOS PELA INFRAÇÃO.I. CASO EM EXAME 1.1. O réu foi condenado pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, sendo-lhe imposta a pena de 3 anos e 9 meses de reclusão, em regime aberto, e 375 dias-multa, substituída por duas penas restritivas de direitos. 1.2. O réu foi absolvido do delito previsto no art. 309 do Código de Trânsito Brasileiro, com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal. 1.3. Inconformado, interpôs recurso de apelação pleiteando a desclassificação do delito de tráfico para uso próprio, ao argumento de que seria usuário de drogas e apresenta quadro de dependência química. Defendeu, também, a ausência de provas robustas para a condenação. 1.4. A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2.1 A questão em discussão consiste em verificar se estão presentes elementos para desclassificar o crime de tráfico de drogas para uso pessoal, conforme alegado pelo apelante.III. RAZÕES DE DECIDIR 3.1 A prova material do tráfico de drogas está cabalmente demonstrada nos autos, inclusive pela apreensão de 10 porções de cocaína, e respaldada por laudos periciais e auto de prisão em flagrante. 3.2 Os depoimentos dos policiais envolvidos, colhidos sob o crivo do contraditório, confirmam a traficância. 3.3 A versão apresentada pelo réu, de que seria apenas usuário, não encontra suporte nas provas dos autos, tampouco em elementos objetivos que indiquem dependência química. Ademais, a quantidade e a forma de acondicionamento das drogas sugerem o tráfico e não o uso pessoal. 3.4 A prática do delito de tráfico independe da quantidade exata de substância, bastando o dolo de traficância evidenciado pelas circunstâncias do flagrante. 3.5. A reparação dos danos morais foi afastada, de ofício, devido à falta de especificação clara do valor pretendido na denúncia.IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1 Recurso conhecido e desprovido, com o afastamento, de ofício, do valor fixado a título de reparação de danos morais causados pela infração. 4.2 Tese de julgamento: “A configuração do crime de tráfico de drogas não exige a apreensão de petrechos ou a presença de compradores no momento do flagrante; basta que a intenção de mercancia ilícita seja evidenciada pelo contexto e demais elementos probatórios”.Dispositivos relevantes citados: Lei nº 11.343/2006, art. 33, caput; Código de Processo Penal, arts. 156, 202, 386, III e VII; Constituição Federal, art. 5º, LIV e LVII.Jurisprudência relevante citada: TJPR - 5ª C. Criminal, AC 1540784-4, Rel. Des. Luiz Osorio Moraes Panza; TJPR - 4ª C. Criminal, AC 0002531-83.2019.8.16.0095, Rel. Des. Domingos Thadeu Ribeiro da Fonseca. STJ – Quinta Turma – AgRg no AREsp nº 2.434.231/MG – Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik – Julg. 15/10/2024. (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0001206-41.2023.8.16.0125 - Palmital - Rel.: DESEMBARGADOR RENATO NAVES BARCELLOS - J. 25.01.2025) As circunstâncias mencionadas também afastam a aplicação da tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 635659, que originou o Tema 506 da Repercussão Geral. Foram apreendidas 123 g de maconha, o que supera consideravelmente o limite de 40 g fixado em tal precedente. Ainda que se considerasse como verdadeira a versão do réu, no sentido de que somente trazia consigo 50 g de entorpecentes, ainda restaria superado o limite. De fato, o critério quantitativo não é absoluto, sendo admitido que, mesmo em caso de apreensão de quantidade superior a 40 g, o juízo não está impedido “de concluir que a conduta é atípica, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário”, como preceitua o STF. Não é este o caso dos autos, no entanto. Como já fundamentado, as circunstâncias da apreensão indicam, de maneira suficiente, a condição de traficante. Repisa-se: foram apreendidas 16 buchas de maconha em posse do réu, acondicionadas em embalagem plástica transparente, após Solivan ter informado aos policiais militares que presenciou o réu tentando comercializar os entorpecentes em praça pública. Outrossim, foi encontrado dinheiro trocado em seus bolsos. O conjunto probatório produzido permite aferir, com segurança, a destinação comercial empreendida pelo réu em relação à substância entorpecente apreendida no bolso de sua blusa, pelo que não se mostra viável a desclassificação para o delito do art. 28 da Lei de Drogas, tampouco o reconhecimento de atipicidade da conduta. Suas declarações estão isoladas nos autos frente às demais provas colhidas. Ficam, pois, preenchidos os elementos do tipo em sua integralidade. Não se identifica, ademais, qualquer causa de exclusão da ilicitude da conduta, tampouco da culpabilidade: o acusado era imputável ao tempo dos fatos, detinha consciência, em potencial, da ilicitude de sua conduta e era capaz de orientar-se de acordo com as prescrições do ordenamento jurídico. Presentes todos os elementos para a configuração do crime de tráfico de drogas, passa-se à análise de eventual caracterização da sua modalidade privilegiada. A causa de diminuição trazida pelo art. 33, § 4º da Lei n. 11.343/2006 prevê que “as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa”. O objetivo da instituição da referida causa de diminuição de pena foi o de diferenciar o tratamento a ser conferido ao pequeno traficante e ao indivíduo já profundamente arraigado no meio criminoso. Semelhante equiparação, além de conferir o mesmo tratamento penal a sujeitos em situações sensivelmente distintas, acabaria por violar o princípio da proporcionalidade ao aplicar sanção excessiva ao agente cuja conduta ostenta reduzida reprovabilidade. Sabe-se que o ingresso no cárcere mediante aplicação de altas reprimendas tem, não raro, o efeito de intensificar a probabilidade de reincidência, bem como incentivar a adesão a organizações criminosas. No presente caso, porém, não há falar em aplicação da figura do tráfico privilegiado. O réu é reincidente, uma vez que foi proferida condenação criminal definitiva nos autos n. 0000654-80.2023.8.16.0059, pela prática de furto qualificado em 04/07/2023. A sentença transitou em julgado na data de 22/01/2024, como se infere da certidão de antecedentes de seq. 128.1. A respeito da inaplicabilidade da minorante em questão na hipótese de reincidência, o entendimento jurisprudencial é pacífico: DIREITO PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. DOSIMETRIA DA PENA. TRÁFICO PRIVILEGIADO. REINCIDÊNCIA. INAPLICABILIDADE DA MINORANTE. IMPROCEDÊNCIA.I. CASO EM EXAME1.1 Ação de Revisão Criminal proposta contra sentença penal condenatória que fixou pena privativa de liberdade em 05 anos e 08 meses de reclusão e 06 meses e 15 dias de detenção, em regime inicial fechado, pela prática dos crimes previstos no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, art. 306 da Lei nº 9.503/97 e art. 330 do Código Penal.1.2 Pedido revisional fundamentado na pretensão de aplicação do benefício do tráfico privilegiado (§4º, do art. 33, da Lei nº 11.343/06), ao argumento de que a condenação anterior seria por crime de receptação e não caracterizaria reincidência específica.1.3 Parecer ministerial pela improcedência da revisão criminal.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.1 A questão em discussão consiste em determinar se há erro na dosimetria da pena aplicada, especialmente no afastamento da minorante do tráfico privilegiado, em razão da reincidência não específica do requerente.III. RAZÕES DE DECIDIR3.1 A revisão criminal destina-se a corrigir eventuais ilegalidades ou injustiças manifestas em decisões condenatórias, conforme previsto nos arts. 621 e 626 do CPP.3.2 A reincidência, ainda que não específica, é fundamento idôneo e suficiente para afastar a minorante do §4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06, conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça.3.3 A dosimetria da pena observou os princípios da individualização da pena e da proporcionalidade, estando devidamente fundamentada nos autos.3.4 Não se verifica qualquer ilegalidade ou erro técnico nos fundamentos da sentença condenatória que afastou a aplicação do tráfico privilegiado, pois a reincidência do requerente foi constatada e devidamente considerada.3.5 Jurisprudência relevante confirma que a reincidência, ainda que não específica ou decorrente de crime de menor potencial ofensivo, impede a aplicação do redutor do tráfico privilegiado (AgRg no HC n. 920.002/RJ, rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 30/8/2024).IV. DISPOSITIVO E TESE4.1 Pedido revisional julgado improcedente.Tese de julgamento: "A reincidência, mesmo que não específica, é fundamento idôneo para afastar a aplicação do benefício do tráfico privilegiado previsto no §4º do art. 33 da Lei nº 11.343/06, conforme entendimento consolidado na jurisprudência pátria."Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal, art. 5º, LXXV. Código Penal, art. 59 e art. 68. Código de Processo Penal, arts. 621 e 626. Lei nº 11.343/06, art. 33, §4º.Jurisprudência relevante citada: STF - HC n. 224605/RJ, rel. Ministro Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 13/4/2023. REsp n. 2.053.584/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 17/12/2024, DJe de 6/1/2025. STJ - AgRg no HC n. 920.002/RJ, rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 30/8/2024. STJ - RvCr n. 974/RS, rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 28/9/2010. (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0109954-23.2024.8.16.0000 - Corbélia - Rel.: DESEMBARGADOR RENATO NAVES BARCELLOS - J. 31.03.2025) Desse modo, havendo condenação definitiva anterior contra o acusado, inadmissível a incidência da figura do tráfico privilegiado. Fica, pois, comprovada a responsabilidade penal do denunciado pela prática do delito de tráfico de drogas. 2.2. Fatos 2 e 3 – lesão corporal e ameaça A materialidade decorre do auto de prisão em flagrante (seq. 1.4), do boletim de ocorrência (seq. 1.18), das declarações prestadas pelos condutores e demais testemunhas (seqs. 1.6, 1.8, 1.10), do interrogatório extrajudicial do acusado (seq. 1.12), das imagens de câmeras de segurança (seqs. 39.2-4), do laudo de lesões corporais (seq. 42.16) e das demais provas produzidas sob o crivo do contraditório. A autoria, por sua vez, é certa e recai sobre a pessoa do acusado. Nas infrações penais que deixam vestígios, como é o caso da lesão corporal ora apurada, é indispensável a realização de exame de corpo de delito para constatação da materialidade do ato, conforme dispõe o art. 158, caput, do Código de Processo Penal (CPP). Compulsando os autos, verifica-se que foi realizado laudo de exame de lesões corporais da vítima (seq. 42.16), que constatou a existência de escoriação em seu braço direito. A concreta violação da integridade corporal da vítima foi registrada por profissional médico, circunstância que, aliada aos demais elementos de prova, conecta as lesões à ação do acusado, tornando certa a autoria do crime. O dolo, por sua vez, é extraído das circunstâncias do caso concreto. A despeito das alegações da defesa, no sentido de que o golpe desferido pelo réu teria atingido a parede, o vídeo de seq. 42.17, extraído do circuito de monitoramento da Lanchonete Tropical, demonstra de forma evidente que o réu se desloca em direção da vítima com um pedaço de madeira e de cerâmica em mãos, lançando este último contra o ofendido em um primeiro momento. Em seguida, golpeia a vítima com o pedaço de madeira, que, sem dúvidas, atinge seu braço esquerdo enquanto tenta se esquivar. As agressões físicas são confirmadas pela testemunha Hadrean Eduan Marim, que presenciou o ocorrido. Hadrean narrou que houve uma discussão verbal envolvendo o réu e outro rapaz e que, em seguida o acusado se retirou. Momentos depois, o acusado retornou com um pedaço de pau e uma lajota em mãos, utilizando tais objetos para agredir a vítima. O réu, inclusive, confessou a prática delitiva após ser reproduzido o vídeo durante seu interrogatório judicial, auxiliando na apuração da verdade dos fatos. Não há dúvida, portanto, das agressões físicas praticadas pelo réu contra o ofendido. Embora os motivos que ensejaram tal conduta não tenham sido suficientemente esclarecidos, eis que há certa divergência entre o relato do réu e da vítima, é incontroverso que o acusado agrediu fisicamente a vítima, causando-lhe lesões corporais. Os depoimentos do ofendido e da testemunha Hadrean, aliados às imagens de câmera de segurança e confissão do acusado, são incontestes e não há falar em absolvição por falta de provas. Feita a análise da prova, é de se destacar que “Lesão corporal consiste em todo e qualquer dano produzido por alguém, sem ‘animus necandi’, à integridade física ou à saúde de outrem. Ela abrange qualquer ofensa à normalidade funcional do organismo humano, tanto do ponto de vista anatômico quanto do fisiológico ou psíquico”. O conceito de ofensa à integridade corporal “compreende a alteração, anatômica ou funcional, interna ou externa, do corpo humano, como, por exemplo, equimoses, luxações, mutilações, fraturas etc”. (BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal - parte especial. São Paulo: Saraiva, 2019, e-book). Acerca da distinção entre lesões corporais e vias de fato, a contravenção penal se caracteriza pela ocorrência de um mal de natureza física, desacompanhado, entretanto, de uma lesão. Nesse contexto, nas lesões, o dolo é de ofender a integridade física ou a saúde. Já nas vias de fato pretende-se tão somente impingir uma agressão, sem vontade de lesionar. Dos atos de atirar pedaço de cerâmica contra a vítima e desferir golpe com pedaço de madeira em seu braço extrai-se a ocorrência de inequívoco dolo de lesionar. E as lesões efetivamente produzidas – relatadas no laudo de exame de lesões corporais e corroboradas pela prova oral produzida em contraditório e também na fase investigativa – ultrapassam o mero desconforto físico ou a dor momentânea, caracterizando, de forma efetiva, concreto ataque à integridade corporal da vítima, não havendo que se cogitar da caracterização da contravenção penal de vias de fato. A respeito da ameaça, a conclusão é idêntica. No contexto do desentendimento entre réu e vítima, aquele a ameaçou, dizendo que “se fosse preso o mataria” e que “essa fita não ficaria assim, que seria cobrado”. A defesa, entretanto, afirma que a vítima não demonstrou temor e que não procurou amparo da autoridade policial imediatamente após o fato. Sustenta, ainda, que a ameaça não foi confirmada por nenhuma testemunha. Em que pese a alegação de ausência de provas, tanto a vítima quanto o réu confirmaram a ameaça, inexistindo razões plausíveis para desconsiderar o que por eles foi dito em audiência. O réu, inclusive, confessou ter ameaçado a vítima nas duas ocasiões em que interrogado. As palavras proferidas pelo acusado mostraram-se aptas à violação da paz de espírito e à liberdade do ofendido, bem jurídico tutelado pela norma penal em questão, tanto que o ofendido afirmou, em seu depoimento judicial, que naquele momento temeu que o acusado fosse capaz de concretizar as ameaças. O fato de ter o denunciado aparentemente verbalizado tais palavras em meio a discussão acalorada e agressões físicas não é suficiente para o afastamento do dolo (cf. TJPR, 0000644-17.2021.8.16.0088, 1ª Câmara Criminal, Rel. Des. Paulo Edison de Macedo Pacheco, J. 26/11/2021). Ao se comportar da maneira acima descrita, assim, ficou evidente o dolo do agente no tocante à intimidação da vítima. Como consequência, não comporta acolhimento a tese da defesa de atipicidade da conduta por ausência de elemento volitivo do tipo. O delito se consumou com as palavras proferidas pelo denunciado e ciência por parte do ofendido, uma vez que o tipo apresenta natureza formal. Presentes todos os elementos do tipo penal, suficientemente comprovados no curso da instrução na forma já tratada, fica afastada a tese da defesa de absolvição por insuficiência de provas. Desse modo, estão presentes a tipicidade objetiva e subjetiva dos crimes previstos pelos arts. 129, caput, e 147, caput, do CP. Não se identifica, ademais, qualquer causa de exclusão da ilicitude da conduta, tampouco da culpabilidade: o réu era imputável ao tempo dos fatos, detinha consciência, em potencial, da ilicitude de sua conduta e era capaz de orientar-se de acordo com as prescrições do ordenamento jurídico. Face aos relatos de que o réu se encontrava embriagado no momento da prática delitiva, é consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de que “a embriaguez voluntária ou culposa do agente não exclui a culpabilidade, sendo ele responsável pelos seus atos mesmo que, ao tempo da ação ou da omissão, era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Aplica-se a teoria da actio libera in causa, ou seja, considera-se imputável quem se coloca em estado de inconsciência ou de incapacidade de autocontrole, de forma dolosa ou culposa, e, nessa situação, comete delito” (cf. STJ - AgInt no REsp 1548520/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 07/06/2016, DJe 22/06/2016). A responsabilidade penal pela prática dos delitos afigura-se, portanto, devidamente comprovada, comportando procedência a pretensão punitiva. 2.3. Fato 4 – desobediência A infração penal prevista pelo art. 330 do CP prevê como verbo nuclear do tipo a conduta de “desobedecer”, no sentido de desatender ou recusar cumprimento à ordem legal de funcionário público competente para emiti-la. Não há emprego de violência ou grave ameaça à pessoa do agente público ou de outra pessoa qualquer, sob pena de desclassificação para o crime de resistência. Tem como objeto material a ordem legal emanada do funcionário público, que precisa ser direta e individualizada ao seu destinatário. A expressão “ordem legal” revela a existência de um elemento normativo do tipo, devendo a legalidade da ordem ser analisada sob um dúplice aspecto, isto é, formal e material. O elemento subjetivo, por fim, é o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. A materialidade decorre do auto de prisão em flagrante (seq. 1.4), do boletim de ocorrência (seq. 1.18), das declarações prestadas pelos condutores e demais testemunhas (seqs. 1.6, 1.8, 1.10), do interrogatório extrajudicial do acusado (seq. 1.12) e das demais provas produzidas sob o crivo do contraditório. A autoria, igualmente, é certa e recai sobre o acusado. Ambos os policiais militares destacaram que, após serem comunicados que uma briga estaria ocorrendo nos arredores da Praça Brasil, se dirigiram até o local e lá visualizaram dois homens se evadindo. Ao abordá-los, o acusado tentou empreender fuga, razão pela qual os agentes de segurança pública utilizaram força física e técnicas de imobilização para contê-lo. João Vitor admitiu ter tentado se evadir e se desvencilhar dos policiais, no entanto, justificou tê-lo feito apenas porque estes sugeriram “dar um rolezinho”, cujo suposto significado já foi mencionado anteriormente. Entretanto, este fato não restou suficientemente comprovado nos autos e carece de verossimilhança, como este juízo já consignou na apuração do crime de tráfico de drogas. A defesa sustenta, por sua vez, que tal conduta estaria amparada pelo princípio da não autoincriminação, segundo o qual ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. O direito constitucional de não se autoincriminar assegura ao réu o direito ao silêncio e à ausência de colaboração ativa na produção de provas contra si, mas não constitui salvo-conduto para o descumprimento de ordens legais nem autoriza a prática de delitos, como a desobediência à atuação de autoridade pública. A ordem emanada pelos policiais, diante de fundada suspeita, integra o exercício regular da função pública, sendo a sua desobediência típica e penalmente relevante. A jurisprudência é consolidada no sentido de que a desobediência a ordem legal de parada/abordagem emitida por policiais militares em serviço configura crime previsto no art. 330 do Código Penal, não se confundindo com o exercício do direito de autodefesa. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já estabeleceu que “Os direitos ao silêncio e de não produzir prova contra si mesmo não são absolutos, razão pela qual não podem ser invocados para a prática de outros delitos” (HC n. 369.082/SC, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 27/6/2017, DJe de 1/8/2017.). Das provas produzidas durante a instrução, desta feita, extrai-se que o acusado desobedeceu à ordem emitida pelos policiais para que possibilitasse sua abordagem, destinada a averiguar se trazia consigo substâncias entorpecentes. Inviável o acolhimento da tese apresentada pela defesa, portanto. Incontroversa a tipicidade da conduta do denunciado, não se identifica qualquer causa de exclusão da ilicitude, tampouco da culpabilidade: a acusada era imputável ao tempo dos fatos, detinha consciência, em potencial, da ilicitude de sua conduta e era capaz de orientar-se de acordo com as prescrições do ordenamento jurídico. Reporto-me ao já mencionado no item anterior no que diz respeito à suposta embriaguez do acusado. A procedência da pretensão punitiva comporta acolhimento neste ponto. 2.4. Fato 5 - desacato Constitui crime de desacato ofender a dignidade ou o decoro de funcionário público, no desempenho de suas funções ou em razão dela. Trata-se de infração penal a violar a dignidade inerente ao desempenho de função pública. Para a caracterização do delito de desacato, imprescindível o dolo específico por parte do agente, definido como a intenção ultrajante, o propósito de depreciar ou vexar o funcionário público, no exercício de sua função. A materialidade decorre do auto de prisão em flagrante (seq. 1.4), do boletim de ocorrência (seq. 1.18), das declarações prestadas pelos condutores e demais testemunhas (seqs. 1.6, 1.8, 1.10), do interrogatório extrajudicial do acusado (seq. 1.12) e das demais provas produzidas sob o crivo do contraditório. A autoria, igualmente, é certa e recai sobre o acusado. Durante a instrução, ambos os policiais foram uníssonos ao afirmarem que, durante a abordagem, o réu os ofendeu, proferindo os dizeres “seus merdas” e “bando de pau no cu”. O réu, por sua vez, disse ter chamado os policiais de “pilantra” e “pau no cu”, mas já na Delegacia de Polícia Civil. A defesa aduz que as palavras supostamente proferidas decorrem de momento de tensão, após abordagem truculenta dos policiais militares. Acrescenta que o desacato resultou de estado emocional abalado, tendo em vista que, como alega, os policiais militares teriam agido de mediante uso excessivo de força durante a abordagem, inclusive utilizando spray de pimenta. Portanto, ao seu ver, não proferiu tais palavras com dolo específico de menosprezar a função pública exercida pelos policiais, mas sim como mero desabafo e revolta diante da situação. A jurisprudência efetivamente reconhece a ausência do elemento subjetivo descrito no tipo penal quando evidenciada que as declarações do agente não visam menosprezar a função pública dos servidores, no entanto, deve ser afastada a pretensão da defesa na hipótese. O uso de força física, de técnicas de imobilização e spray foi ensejado unicamente pela conduta do réu, que, ao ser abordado pelos policiais militares, tentou empreender fuga e se desvencilhar dos agentes. Logo, não se pode inferir que estava com os ânimos alterados em razão da alegada truculência dos policiais, tendo em vista que a postura ostensiva dos militares foi ocasionada justamente pela desobediência do acusado. É razoável concluir que, se o réu não tivesse agido de forma agressiva e tentado se evadir, a abordagem teria ocorrido sem maiores intercorrências. A esse respeito, cumpre anotar o seguinte precedente: Apelação Criminal. Resistência (art. 329, CP), desobediência (art. 330, CP) e desacato (art. 331, CP). Sentença parcialmente procedente. Condenação pelo delito de desacato. Pedido de redução da pena imposta, com maior consideração dos fatores atenuantes e da confissão espontânea. Não conhecimento. Falta de interesse na modificação ou reforma da decisão. Providências já adotadas pela Magistrada a quo. Pena fixada no mínimo legal. Reconhecimento da aludida atenuante, que, contudo, não autoriza a redução da pena corporal abaixo do mínimo. Súmula 231 do colendo Superior Tribunal de Justiça. Mérito. Pleito recursal absolutório por atipicidade da conduta. Alegada ausência de dolo, em razão das ofensas terem sido proferidas em contexto de descontrole emocional, acentuado pelo uso de substâncias entorpecentes. Tese insubsistente. Autoria e materialidade devidamente comprovadas. Depoimentos testemunhais de agentes públicos que, especialmente quando prestados em Juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, se revestem de inquestionável eficácia probante. Réu confesso. Dolo evidenciado. Palavras proferidas contra os policiais que demonstram a intenção de ofender e desprestigiar a função dos funcionários públicos. Ademais, embriaguez voluntária não isenta o agente de responsabilização penal (art. 28, II, CP). Descontrole emocional que também não afasta o elemento subjetivo do tipo. Rogo de aplicação do princípio da insignificância. Não acolhimento. Evidente ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora, no caso, tanto a honra do funcionário público desacatado como também o prestígio da administração pública. Entendimento da Súmula nº 599 do Superior Tribunal de Justiça. Sentença incólume. Recurso parcialmente conhecido e, nesta extensão, desprovido, com deferimento dos honorários advocatícios ao defensor nomeado. (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0041080-46.2021.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ MAURICIO PINTO DE ALMEIDA - J. 07.04.2025) A emoção, assim, não exclui a imputabilidade penal (art. 28, I, CP). De igual modo, nem a embriaguez voluntária (art. 28, II, CP) é capaz de afastá-la. E a alegada insignificância da conduta não merece prosperar, por força do Enunciado n. 599 da Súmula do STJ: O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública. Demonstrada a autoria e a materialidade da conduta do acusado, o elemento subjetivo é extraído das expressões por ele usadas, que indicam sua intenção de ofender os policiais em função do cargo por eles ocupado. Os depoimentos dos policiais têm relevância como os de qualquer outra testemunha, notadamente quando em consonância com as demais provas nos autos. As declarações prestadas pelos militares são seguras e coerentes, não restando evidenciada em seu discurso intenção de incriminar injustamente o réu. Não se trata de valorar os depoimentos apenas pela qualificação profissional de tais agentes, mas sim, de se reconhecer a congruência e coesão do que foi dito à autoridade policial e ao juízo. Repisa-se que a defesa não arrolou testemunhas para corroborar a sua versão do ocorrido. Por fim, o pedido de reconhecimento da consunção não deve ser acolhido. A conduta de desobedecer a ordem legal de funcionário público não é meio para a de desacatar funcionário público. Os delitos de desobediência e desacato efetivamente ocorreram em contexto fático idêntico, de certo modo. Entretanto, há vontades e dolos autônomos de, num primeiro momento, desobedecer a voz de abordagem dada pela equipe policial (consumando o delito desobediência) em via pública e, num segundo momento, desacatar funcionário público no exercício de sua função, ofendendo os policiais militares. Sobre a temática, em caso semelhante, assim já decidiu o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: Apelação crime. Desobediência (art. 330 do CP) e desacato (art. 331 do CP). Condenação. Pretensa absolvição por insuficiência probatória. Inviabilidade. Materialidade e autoria delitivas inquestionáveis. Depoimentos testemunhais de agentes públicos que, especialmente quando prestados em Juízo, sob a garantia do contraditório, se revestem de inquestionável eficácia probante. Alegação de perda da chance probatória que não comporta acolhimento. Elementos de prova que se mostram suficientes para respaldar a opção condenatória. Princípio do livre convencimento motivado Conjunto probatório carreado aos autos que trouxe elementos suficientes para se concluir que o recorrente praticou as condutas descritas na denúncia. Requerida a aplicação da consunção entre o crime de desobediência e de desacato. Impossibilidade. Crimes cometidos em momentos distintos, com desígnios autônomos, e que não são meio necessário ou fase normal de preparação ou execução um do outro. Readequação da dosimetria que se impõe. Afastamento da valoração negativa das circunstâncias do crime de desacato, por ausência de fundamentação idônea para tanto. No mais, observância dos parâmetros legais e limites da proporcionalidade adotados para a valoração das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP. Recurso parcialmente provido, para readequar a pena imposta, com a exclusão, de ofício, da fixação equivocada de penalidade de multa, alusiva ao crime de desacato, por maioria. Embora as ações tenham de certa forma ocorrido em um mesmo contexto fático, não é possível concluir que um crime constituiu meio necessário ou fase de preparação ou de execução para o outro. (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0000248-04.2024.8.16.0163 - Siqueira Campos - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ MAURICIO PINTO DE ALMEIDA - J. 07.04.2025) Incontroversa a tipicidade da conduta do réu, não se identifica qualquer causa de exclusão da ilicitude, tampouco da culpabilidade: o acusado era imputável ao tempo dos fatos, detinha consciência, em potencial, da ilicitude de sua conduta e era capaz de orientar-se de acordo com as prescrições do ordenamento jurídico. 2.5. Fato 6 – dano qualificado Nos termos do art. 163 do CP, o crime de dano consiste em destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia. Assim como o crime lesões corporais, por se tratar de infração penal que deixa vestígio é indispensável a realização de exame de corpo de delito para a constatação da materialidade. O auto de dano elaborado no dia 05/11/2024 constatou a presença de amassados na lateral traseira esquerda e na traseira da viatura da Polícia Militar (seq. 1.12). Os danos perfazem a quantia de R$ 200,00, consoante ofício n. 004/PPM, juntado ao seq. 135.1. Como o corpo de delito no presente caso consiste em mera constatação de situação de fato possível a qualquer homem médio, desnecessária que a sua elaboração seja realizada por perito ou pessoas com diploma de curso superior. A autoria, por sua vez, é certa e recai sobre a pessoa do acusado. Os policiais militares relataram que, no contexto da abordagem mencionada anteriormente, tentaram colocar o réu no camburão da viatura, contudo, ele desferiu chutes na tampa traseira do veículo, danificando-a. Já o acusado afirma que, após ser imobilizado e atingido com jato de spray em seu rosto, segurou-se na viatura. Acredita que, neste momento, acabou por causar os danos ao veículo. Há, ainda, a presença do elemento volitivo do tipo penal. Como dito, o acusado confessou a prática do crime, dizendo que danificou a viatura no contexto de estresse e alteração emocional. A alegação de que teria apenas se segurado no vidro consiste em versão isolada nos autos, sem qualquer indício que a comprove, cujo ônus incumbia à defesa. Na verdade, o conjunto probatório dos autos indica que o acusado estava em estado de ira quando foi abordado e contido pelos policiais militares, desferindo chutes contra a viatura. Mostra-se pouco crível que os amassados verificados na viatura tenham decorrido apenas do ato de segurá-la. A tese, ainda, de que o réu não tinha a intenção de danificar o veículo não merece prosperar. Ainda que sejam os veículos construídos mediante utilização de materiais de alta resistência, é esperado que golpes aplicados com força física considerável causem causar avarias, a exemplo de amassados (dolo eventual). Considerando, por fim, que o objeto do dano é patrimônio do Estado do Paraná, fica configurado o dano em sua modalidade qualificada, na forma do art. 163, parágrafo único, III do CP. Quanto à suposta mínima lesividade da conduta, rememoro que o princípio da insignificância é inaplicável em crimes contra a administração pública, em razão do Enunciado n. 599 da Súmula do STJ. Referido entendimento é acompanhado pelo TJPR, como se infere do seguinte julgado: Apelação crime. Dano qualificado (art. 163, parágrafo único, inciso III, do Código Penal) e posse irregular de arma de fogo (art. 12 da Lei nº 10.826/03). Absolvição imprópria. Recurso da defesa. Pedido absolutório ante a inimputabilidade do réu não conhecido. Falta de interesse recursal. Situação reconhecida na decisão singular. Rogo de reconhecimento do princípio da insignificância em relação ao crime de dano. Impossibilidade. Requisitos não presentes. Crime contra a administração pública. Alegada atipicidade material da conduta de posse de arma de fogo. Não-acolhimento. Delito de perigo abstrato. Ofensividade presumida. Reprovabilidade da conduta presente. Expressiva lesão ao bem jurídico tutelado. Sentença mantida. Honorários advocatícios. Arbitramento. Defensora nomeada. Recurso parcialmente conhecido, e, nesta porção, desprovido, deferindo-se os honorários advocatícios. (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0000936-51.2023.8.16.0049 - Astorga - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ MAURICIO PINTO DE ALMEIDA - J. 24.03.2025) Configurada a tipicidade, não se identifica, ademais, qualquer causa de exclusão da ilicitude da conduta, tampouco da culpabilidade: o acusado era imputável ao tempo dos fatos, detinha consciência, em potencial, da ilicitude de sua conduta e era capaz de orientar-se de acordo com as prescrições do ordenamento jurídico. A responsabilidade penal pela prática do crime de dano qualificado afigura-se, assim, devidamente comprovada. 3. Dispositivo Ante todo o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, julgo procedente a pretensão punitiva estatal, para o fim de condenar o acusado, João Vitor Tresk, nas penas dos crimes previstos pelo art. 129, caput, art. 147, caput, art. 330, art. 331, art. 163, parágrafo único, III, todos do Código Penal, e art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. Passo, assim, à dosimetria da pena, observando o critério preconizado pelo art. 68 do CP e o princípio constitucional da individualização da pena (art. 5°, XLV e XLVI da Constituição Federal - CF). 4. Dosimetria – tráfico de drogas 4.1.1. Primeira fase – circunstâncias judiciais a) Culpabilidade. O fato praticado pelo acusado não é dotado de reprovabilidade acentuada, capaz de autorizar a exasperação da pena-base. b) Antecedentes. O réu é reincidente (seq. 128.1) e referida condenação será valorada na fase seguinte da dosimetria. c) Conduta social. No caso presente, não há elementos suficientes nos autos para aferir a conduta social do agente. d) Personalidade. Finda a instrução processual penal, não foram colhidos elementos para valorar esta circunstância judicial. A despeito da pretensão ministerial, é incabível a utilização de ações penais em curso para valorar negativamente a personalidade do acusado, tendo em vista o teor da Súmula 444 do STJ. e) Motivos. No caso, os motivos são inerentes ao próprio tipo penal. f) Circunstâncias. O Ministério Público requer a valoração negativa desta circunstância, sob o fundamento que a comercialização de drogas pelo réu era feita em praça pública, local destinado a convivência de famílias, incluindo crianças. Todavia, trata-se de causa de aumento de pena específica contida no art. 40, III, da Lei n. 11.343/2006, pelo que postergo sua aplicação para a terceira fase da dosimetria. g) Consequências. As consequências vislumbradas no caso em comento são inerentes aos motivos pelos quais se pune a conduta criminosa em questão. h) Comportamento da vítima. Não há o que se falar sobre o comportamento da vítima, pois o crime ora em análise tutela a saúde pública. i) Natureza e quantidade da droga. Nos delitos previstos na Lei n. 11.343/2006, como é o caso, a natureza e a quantidade da droga foram erigidas à condição de circunstâncias autônomas e preponderantes na dosimetria da pena, conforme art. 42 da mesma Lei (cf. STJ, HC 102.993, Quinta Turma, Rela. Mina. Laurita Vaz, J. 16/06/2008 e STJ, AgRg no REsp 849.703, Sexta Turma, Rela. Mina. Jane Silva, J. 29/04/2008). No presente caso houve a apreensão de 123 g de maconha, o que não autoriza a exasperação da pena-base, tendo em vista que foi apreendido somente um tipo de entorpecente e em quantidade que não se mostra excepcionalmente vultuosa. Ante todo o exposto, ausente valoração negativa de quaisquer circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 5 anos de reclusão, mínimo legal. 4.1.2. Segunda fase – agravantes e atenuantes Há a incidência da atenuante de menoridade relativa, eis que o réu era menor de 21 anos na data do fato (art. 65, I, CP). Deixo de aplicar a atenuante da confissão, como requerido pela defesa, uma vez que o réu negou a propriedade da droga que foi apreendida consigo, afirmando ter sido “forjada” pelos policiais militares. Como mencionado na fundamentação desta sentença, o acusado registra condenação criminal definitiva oriunda dos autos de ação penal n. 0000654-80.2023.8.16.0059, sendo, portanto, reincidente (art. 61, I, CP). A atenuante da menoridade deve ser compensada com a agravante da reincidência, ainda que específica, salvo justificativa idônea, como no caso da multirreincidência, o que não é o caso dos autos (cf. STJ - AgRg no HC n. 489.409/SP , relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 14/5/2019, DJe de 23/5/2019 e TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0009174-82.2024.8.16.0030 - Foz do Iguaçu - Rel.: DESEMBARGADOR WELLINGTON EMANUEL COIMBRA DE MOURA - J. 25.01.2025). Operada a compensação, permanece a pena intermediária em 5 anos de reclusão. 4.1.3. Terceira fase – causas de aumento e diminuição Como já tratado no item 4.1.1, a traficância era realizada nas imediações de praça pública, espaço destinado a recreação e convívio comunitário, incidindo, portanto, a majorante do art. 40, III, da Lei de Drogas. Dadas as circunstâncias do caso concreto, que não extrapolam o ordinário para delitos de mesma espécie, entendo que a pena deve ser majorada em seu patamar mínimo de 1/6. Inexistentes causas de diminuição a serem sopesadas, aumento a pena em 1/6, fixando a pena definitiva em 5 anos e 10 meses de reclusão. 4.1.4. Multa Proporcionalmente à pena privativa de liberdade, fixo a pena de multa em 583 dias-multa. Atribuo, a cada dia-multa, o valor equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos (arts. 49, § 1º e 60, caput, ambos do CP, e art. 43, caput, da Lei de Drogas). 4.2. Dosimetria – lesão corporal 4.2.1. Primeira fase – circunstâncias judiciais Como medida de celeridade e economia processual, reporto-me aos fundamentos utilizados no item 4.1.1 da dosimetria. Não há prejuízo à defesa, visto que nenhuma circunstância judicial foi valorada negativamente. Ante todo o exposto, ausente valoração negativa de quaisquer circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 3 meses de detenção. 4.2.2. Segunda fase – agravantes e atenuantes Incide a atenuante da menoridade relativa. Do mesmo modo, aplica-se a atenuante de confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do CP), que visa beneficiar a parte acusada que coopera com a administração da justiça, fundando-se na lealdade processual. De acordo com recente julgado do C. STJ, o réu sempre terá direito à diminuição da pena quando houver admitido a autoria do crime, independentemente de a confissão ser usada pelo juiz como um dos fundamentos da condenação (STJ, REsp 1.972.098/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, J. 14/06/2022). Sendo voluntária, ainda que não espontânea, o reconhecimento da autoria do fato criminoso enseja a aplicação da benesse, mesmo que os demais elementos sejam, por si só, suficientes à condenação. No caso em análise, o acusado assumiu ter agredido fisicamente a vítima, causando-lhe lesões corporais. A respeito das agravantes, o acusado é reincidente. A atenuante da menoridade deve ser compensada com a agravante da reincidência, como fundamentado no item 4.1.2. Remanescendo a atenuante da confissão, não pode a pena, nesta fase da dosimetria, ser reduzida abaixo do mínimo legal, por força do Enunciado n. 231 da Súmula do STJ. Permanece, assim, a pena intermediária no mínimo legal, qual seja, 3 meses de detenção. 4.2.3. Terceira fase – causas de aumento e diminuição Não há, pelo que fixo a pena definitiva em 3 meses de detenção. 4.3. Dosimetria – ameaça A despeito de o preceito secundário da norma contida no art. 147 do CP apresentar a possibilidade de aplicação alternativa de pena privativa de liberdade ou de multa, a aplicação isolada da sanção pecuniária não se presta a cumprir as finalidades da pena, uma vez que o réu é reincidente e, no contexto da apuração desta ação penal, praticou vários crimes distintos. Diante disso, será aplicada a pena privativa de liberdade. 4.3.1. Primeira fase – circunstâncias judiciais Como medida de celeridade e economia processual, reporto-me aos fundamentos utilizados no item 4.1.1 da dosimetria. Ante todo o exposto, ausente valoração negativa de quaisquer circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 1 mês de detenção. 4.3.2. Segunda fase – agravantes e atenuantes Incidem as atenuantes da menoridade relativa e da confissão espontânea. Por outro lado, o denunciado é reincidente, o que enseja a compensação com a atenuante da menoridade relativa, como já procedido anteriormente. Remanescendo a atenuante da confissão, não pode a pena, nesta fase da dosimetria, ser reduzida abaixo do mínimo legal, por força do Enunciado n. 231 da Súmula do STJ. Permanece, assim, a pena intermediária em 1 mês de detenção, mínimo legal. 4.3.3. Terceira fase – causas de aumento e diminuição Não há, pelo que fixo a pena definitiva em 1 mês de detenção. 4.4. Dosimetria – desobediência 4.4.1. Primeira fase – circunstâncias judiciais Como medida de celeridade e economia processual, reporto-me aos fundamentos utilizados no item 4.1.1 da dosimetria. Ante todo o exposto, ausente valoração negativa de quaisquer circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 15 dias de detenção. 4.4.2. Segunda fase – agravantes e atenuantes Incidem as atenuantes da menoridade relativa e da confissão espontânea. Por outro lado, o denunciado é reincidente, o que enseja a compensação com a atenuante da menoridade relativa. Remanescendo a atenuante da confissão, deve ser observado o Enunciado n. 231 da Súmula do STJ. Permanece, assim, a pena intermediária em 15 dias de detenção, mínimo legal. 4.4.3. Terceira fase – causas de aumento e diminuição Não há, pelo que fixo a pena definitiva em 15 dias de detenção. 4.4.4. Multa Proporcionalmente à pena privativa de liberdade, estabelecida no mínimo legal, fixo a pena de multa em 10 dias-multa. Atribuo, a cada dia-multa, o valor equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos (arts. 49, § 1º e 60, caput, ambos do CP). 4.5. Dosimetria – desacato A despeito de o preceito secundário da norma contida no art. 331 do CP apresentar a possibilidade de aplicação alternativa de pena privativa de liberdade ou de multa, a aplicação isolada da sanção pecuniária não se presta a cumprir as finalidades da pena, uma vez que o réu é reincidente e, no contexto da apuração desta ação penal, praticou vários crimes distintos. Diante disso, será aplicada a pena privativa de liberdade. 4.5.1. Primeira fase – circunstâncias judiciais Como medida de celeridade e economia processual, reporto-me aos fundamentos utilizados no item 4.1.1 da dosimetria. Ante todo o exposto, ausente valoração negativa de quaisquer circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 6 meses de detenção. 4.5.2. Segunda fase – agravantes e atenuantes Incidem as atenuantes da menoridade relativa e da confissão espontânea. Por outro lado, o denunciado é reincidente, o que enseja a compensação com a atenuante da menoridade relativa. Remanescendo a atenuante da confissão, deve ser observado o Enunciado n. 231 da Súmula do STJ. Permanece, assim, a pena intermediária em 6 meses de detenção, mínimo legal. 4.5.3. Terceira fase – causas de aumento e diminuição Não há, pelo que fixo a pena definitiva em 6 meses de detenção. 4.6. Dosimetria – dano qualificado 4.6.1. Primeira fase – circunstâncias judiciais a) Culpabilidade. O fato praticado pelo acusado não é dotado de reprovabilidade acentuada, capaz de autorizar a exasperação da pena-base. b) Antecedentes. O réu é reincidente (seq. 128.1) e referida condenação será valorada na fase seguinte da dosimetria. c) Conduta social. No caso presente, não há elementos suficientes nos autos para aferir a conduta social do agente. d) Personalidade. Finda a instrução processual penal, não foram colhidos elementos para valorar esta circunstância judicial. A despeito da alegação ministerial, é incabível a utilização de ações penais em curso para valorar negativamente a personalidade do acusado, tendo em vista o teor da Súmula 444 do STJ. e) Motivos. No caso, os motivos são inerentes ao próprio tipo penal. f) Circunstâncias. Não extrapolam a normalidade do tipo penal. g) Consequências. Em que pese a alegação do Ministério Público, as consequências vislumbradas no caso em comento (dano e necessidade de reparo) são inerentes aos motivos pelos quais se pune a conduta criminosa em questão, não merecendo valoração negativa. h) Comportamento da vítima. Não há o que se falar sobre o comportamento da vítima, pois o crime ora em análise tutela o patrimônio público. Ante todo o exposto, ausente valoração negativa de quaisquer circunstâncias judiciais, fixo a pena-base em 6 meses de detenção. 4.6.2. Segunda fase – agravantes e atenuantes Incidem as atenuantes da menoridade relativa e da confissão espontânea. Quanto a esta última, não há óbice ao reconhecimento da atenuante da confissão, mesmo que em sua forma qualificada, visto que o acusado disse que os danos foram causados quando se segurou na viatura em decorrência da suposta ação truculenta dos policiais militares, (cf. STJ - AgRg no AREsp: 2101541 GO 2022/0099894-9, Relator.: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 20/03/2023, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/03/2023). Por outro lado, o denunciado é reincidente, o que enseja a compensação com a atenuante da menoridade relativa. Remanescendo a atenuante da confissão, deve ser observado o Enunciado n. 231 da Súmula do STJ. Permanece, assim, a pena intermediária em 6 meses de detenção, mínimo legal. 4.6.3. Terceira fase – causas de aumento e diminuição Não há, razão pela qual fixo a pena definitiva em 6 meses de detenção. 4.6.4. Multa Proporcionalmente à pena privativa de liberdade, estabelecida no mínimo legal, fixo a pena de multa em 10 dias-multa. Atribuo, a cada dia-multa, o valor equivalente a 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos (arts. 49, § 1º e 60, caput, ambos do CP). 5. Concurso material de crimes Dispõe o art. 69 do CP que “Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela”. No presente caso, há concurso material entre os delitos realizados pelo agente, já que mediante mais de uma ação praticou infrações penais distintas. Em que pese no momento da ameaça também estivesse portando a arma e as munições, o porte se estendeu por período superior de tempo, anterior e posterior à ameaça em si. Assim, fixo a pena definitiva em 5 anos e 10 meses de reclusão e 583 dias-multa e 1 ano, 4 meses e 15 dias de detenção e 20 dias-multa. 6. Detração e regime de cumprimento de pena Diante da quantidade de pena aplicada e da reincidência, fixo o regime fechado para o seu cumprimento, nos termos do art. 33, § 2º, “b”, em sentido contrário, do CP. Em que pese o réu tenha permanecido preso preventivamente durante o processo, deixo de realizar a detração prevista no art. 387, § 2º, do CPP, uma vez que o tempo a ser detraído não implicará em mudança do regime de cumprimento de pena, especialmente em razão da reincidência. O cálculo deverá ser feito, portanto, pelo juízo da Execução Penal. 7. Substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos e suspensão condicional da pena Diante da quantidade de pena aplicada, da natureza dos delitos e da reincidência do agente, incabível a substituição por restritiva de direitos, bem como a suspensão condicional. 8. Direito de recorrer em liberdade Para a decretação e manutenção da prisão preventiva é indispensável que haja prova de materialidade e indício de autoria (pressuposto), além de um dos fundamentos trazidos pelo art. 312, caput do CPP. É necessário, ainda, a subsunção do caso concreto em uma das hipóteses previstas pelo art. 313 do CPP. No caso dos autos, observa-se que não ocorreu qualquer alteração na situação fática que possa justificar a revogação da decisão de decretação da custódia cautelar, uma vez que ainda se fazem presentes os pressupostos e os requisitos que a autorizaram. Finda a instrução processual criminal, ficou comprovado que o acusado praticou os crimes de tráfico de drogas, lesão corporal, ameaça, desobediência, desacato e dano qualificado descritos na denúncia. Ademais, a soma das penas máximas em abstrato cominadas aos delitos imputados ao agente é superior a 4 anos. Ficam, assim, preenchidos os requisitos do art. 312, caput, parte final, e art. 313, I, ambos do CPP. O fundamento da medida, por fim, repousa na garantia da ordem pública. Como já mencionado no curso da fundamentação e da dosimetria, os crimes praticados pelo acusado apresentam acentuada gravidade em concreto. O réu se aproximou da vítima portando um pedaço de madeira nas mãos e desferiu um golpe, que atingiu o braço do ofendido e causou ferimento de natureza leve. Após tal fato, ao ser abordado pelos policiais militares, constatou-se que o réu portava quantidade de entorpecente incompatível com o uso pessoal, sem saber indicar a origem da substância. Foi-lhe dada voz de prisão, porém ele não obedeceu, inicialmente empreendendo fuga e, quando alcançado pelos policiais, tentando se desvencilhar a todo momento. Ao ser colocado no camburão, passou a ofender os policiais e chutou a traseira do veículo, chegando a amassá-lo. Da análise de seus antecedentes criminais, como já citado anteriormente, o acusado tem contra si condenação criminal definitiva pela prática de furto qualificado. São registradas várias outras anotações criminais, inclusive com sentenças condenatórias recentes (ainda não transitadas em julgado), sendo a maioria relativa a crimes patrimoniais. A título de exemplo, menciono as ações penais n. 0000402-77.2023.8.16.0059 e 0000260-39.2024.8.16.0059. Demonstrada, deste modo, propensão do agente à prática delitiva. De acordo com entendimento consolidado pelo C. STJ, a reincidência e as ações penais em curso justificam a segregação cautelar do agente, como forma de garantia da ordem pública (cf. STJ, AgRg no HC 727535/GO, Quinta Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, J. 10/05/2022). Por tais razões, conclui-se que a privação excepcional da liberdade ainda constitui a única medida capaz de se contrapor de modo eficaz à inclinação à reiteração delitiva apresentada pelo denunciado e à sua periculosidade. Nesse contexto, nenhuma das cautelares diversas da prisão, tal qual previstas pelo art. 319 do CPP, seriam aptas a tutelar a ordem pública. Ante o exposto, mantenho a prisão preventiva do réu, com fulcro no art. 312 c/c art. 313, I, todos do CPP e, por conseguinte, nego-lhe o direito a recorrer em liberdade. Traslade-se cópia desta sentença aos autos de n. 0000040-07.2025.8.16.0059, instaurado para acompanhamento da prisão preventiva do acusado. Com o trânsito em julgado desta sentença ou remessa dos autos ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná para julgamento de eventual recurso interposto, determino, desde já, o arquivamento do incidente após as baixas, anotações e diligências necessárias. 9. Indenização à vítima O Ministério Público pugnou pela fixação de valor mínimo para reparação dos danos morais causados pelas infrações, na forma do art. 387, IV, do CPP (seq. 47.1). A Terceira Seção do C. STJ, na apreciação do REsp n. 1.986.672/SC, alterou a compreensão anteriormente sedimentada, firmando o entendimento de que, em que pese a possibilidade de se dispensar a instrução específica acerca do dano — diante da presunção de dano moral in re ipsa, à luz das particularidades do caso concreto —, é imprescindível que constem na inicial acusatória: (1) o pedido expresso de indenização para reparação mínima dos danos causados pelo fato delituoso; e (2) a indicação clara do valor pretendido a esse título, sob pena de violação ao princípio do contraditório e ao próprio sistema acusatório. Nesse sentido, confira-se: PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME DE ESTELIONATO. FIXAÇÃO DE VALOR INDENIZATÓRIO MÍNIMO. INCLUSÃO DO NOME DA VÍTIMA EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. DANO MORAL IN RE IPSA. DESNECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA, NO CASO CONCRETO. EXIGÊNCIA, PORÉM, DE PEDIDO EXPRESSO E VALOR INDICADO NA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO, NA PEÇA ACUSATÓRIA, DA QUANTIA PRETENDIDA PARA A COMPENSAÇÃO DA VÍTIMA. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO, PARA EXCLUIR A FIXAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO MÍNIMO. 1. A liquidação parcial do dano (material ou moral) na sentença condenatória, referida pelo art. 387, IV, do CPP, exige o atendimento a três requisitos cumulativos: (I) o pedido expresso na inicial; (II) a indicação do montante pretendido; e (III) a realização de instrução específica a fim de viabilizar ao réu o exercício da ampla defesa e do contraditório. Precedentes desta Quinta Turma. 2. A Quinta Turma, no julgamento do AgRg no REsp 2.029.732/MS em 22/8/ 2023, todavia, adotou interpretação idêntica à da Sexta Turma, no sentido de que é necessário incluir o pedido referente ao valor mínimo para reparação do dano moral na exordial acusatória, com a dispensa de instrução probatória específica. Esse julgamento não tratou da obrigatoriedade, na denúncia, de indicar o valor a ser determinado pelo juiz criminal. Porém, a conclusão foi a de que a indicação do valor pretendido é dispensável, seguindo a jurisprudência consolidada da Sexta Turma. 3. O dano moral decorrente do crime de estelionato que resultou na inclusão do nome da vítima em cadastro de inadimplentes é presumido. Inteligência da Súmula 385/STJ. 4. Com efeito, a possibilidade de presunção do dano moral in re ipsa, à luz das específicas circunstâncias do caso concreto, dispensa a obrigatoriedade de instrução específica sobre o dano. No entanto, não afasta a exigência de formulação do pedido na denúncia, com indicação do montante pretendido. 5. A falta de uma indicação clara do valor mínimo necessário para a reparação do dano almejado viola o princípio do contraditório e o próprio sistema acusatório, por na prática exigir que o juiz defina ele próprio um valor, sem indicação das partes. Destarte, uma medida simples e eficaz consiste na inclusão do pedido na petição inicial acusatória, juntamente com a exigência de especificar o valor pretendido desde o momento da apresentação da denúncia ou queixa-crime. Essa abordagem reflete a tendência de aprimoramento do contraditório, tornando imperativa a sua inclusão no âmbito da denúncia. 6. Assim, a fixação de valor indenizatório mínimo por danos morais, nos termos do art. 387, IV, do CPP, exige que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, com a indicação do valor pretendido, nos termos do art. 3º do CPP c/c o art. 292, V, do CPC/2015. 7. Na peça acusatória (apresentada já na vigência do CPC/2015), apesar de haver o pedido expresso do valor mínimo para reparar o dano, não se encontra indicado o valor atribuído à reparação da vítima. Diante disso, considerando a violação do princípio da congruência, dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa e do sistema acusatório, deve-se excluir o valor mínimo de indenização por danos morais fixado. 8. O entendimento aqui firmado não se aplica aos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, que continuam regidos pela tese fixada no julgamento do tema repetitivo 983/STJ. 9. Recurso especial provido para excluir a fixação do valor indenizatório mínimo. (REsp n. 1.986.672/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Terceira Seção, J. 08/11/2023). O Ministério Público formulou pedido expresso de fixação de tal indenização mínima. A despeito de não ter sido produzida prova sobre o tema, o arbitramento de indenização por danos morais é medida que se impõe. Assim, para a fixação do quantum indenizatório, pondero a dolorosa experiência vivenciada pela vítima, bem como a condição socioeconômica do acusado. Como consequência, fixo o valor mínimo indenizatório por danos morais sofridos pelo ofendido Solivan de Lima em um salário mínimo, valor que deve ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir da presente sentença (Súmula 362 do STJ) e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês contados do evento danoso, isto é, a data dos fatos (Súmula 54 do STJ). Quanto aos danos materiais causados ao patrimônio do Estado do Paraná (seq. 77.1), condeno o réu ao pagamento de indenização por danos materiais, fixando como valor indenizatório a quantia de R$ 200,00, que deve ser corrigida monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês contados do evento danoso, isto é, a data dos fatos (Súmulas 43 e 54 do STJ). Frise-se que a regra trazida pelo CPP faz referência à fixação de um “valor mínimo”, sem prejuízo de que o montante seja eventualmente ampliado na esfera cível. 10. Custas e despesas processuais Ante a notícia de que o réu se encontra atualmente preso preventivamente e desempregado, bem como que antes de sua segregação trabalhava apenas realizando bicos de forma esporádica, e inexistindo indícios nos autos em sentido contrário, concedo-lhe as benesses da justiça gratuita, na forma dos arts. 98 e 99 do Código de Processo Civil. Anote-se e cumpra-se de acordo. 11. Honorários Diante da não instalação de unidade da Defensoria Pública nesta Comarca e tendo presente o dever do Estado de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (art. 5º, LXXIV, da CF), condeno o Estado do Paraná ao pagamento de honorários advocatícios à Dra. Alexandra da Silva Aguiar (OAB/PR 116.346), os quais fixo em R$ 2.000,00 (art. 22, § 1º, da Lei n. 8.906/1994 e item n. 1.2 da Resolução Conjunta n. 06/2024 da PGE/SEFA). A presente sentença servirá como certidão de honorários, para os fins do art. 24 do Estatuto da OAB, Lei Estadual n. 18.664/2015 e da mesma resolução acima citada, devendo a defensora proceder à inclusão de dados cadastrais para efetivação do requerimento (art. 12 da Lei n. 18.644/2013). 12. Progressão de regime e livramento condicional De modo a subsidiar a expedição da guia de recolhimento definitiva, caso seja expedida com base na presente sentença, deve-se considerar que se trata de agente reincidente em crime doloso (furto qualificado) e que praticou os delitos ora em análise depois da entrada em vigência da Lei n. 13.964/2019. Assim, em relação ao crime de tráfico de drogas, que é equiparado a hediondo (art. 2º, caput, da Lei n. 8.072/1990), devem ser adotados os seguintes parâmetros: (1) livramento condicional: adotar a fração de 2/3, nos termos do art. 44, parágrafo único, da Lei n. 11.343/2006; (2) progressão de regime: adotar o percentual de 40%, na forma do art. 112, V, da LEP. Em relação ao crime de lesão corporal, que é comum e praticado com violência contra a pessoa: (1) o livramento condicional é inaplicável, pois a pena é inferior a 2 anos; (2) progressão de regime: 20%, na forma do art. 112, II, da LEP. Crimes de ameaça, desobediência, desacato e dano qualificado, comuns e praticado sem violência contra a pessoa: (1) livramento condicional também é inaplicável, pois a pena é inferior a 2 anos; (2) progressão de regime: 20%, na forma do art. 112, II, da LEP. 13. Destinação dos bens Constam do auto de exibição e apreensão de seqs. 1.14 os seguintes itens: (1) um celular; (2) R$ 32,00 em cédulas diversas; (3) 16 buchas de maconha pesando 123 g. Conforme tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 647, “É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal”. Por tais razões, determino o perdimento dos bens apreendidos em favor da União. Em relação às drogas, já foram incineradas, conforme auto de seq. 94.4. Quanto ao celular do acusado, dado os gastos envolvidos com eventual alienação e baixo valor comercial, determino a sua doação (art. 1011 do Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR). Oficie-se à Casa Lar, Conselho da Comunidade e outras instituições de cunho social da Comarca para que manifestem eventual interesse no seu recebimento, observando-se as determinações constantes do art. 1006 do mesmo Código. Caso não haja interesse por nenhuma entidade, o objeto deverá ser destruído. Em relação aos valores apreendidos, por fim, deverão ser revertidos diretamente ao Senad (art. 63, § 1º, da Lei n. 11.343/2006 c/c art. 1009 do Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR). 14. Providências finais Independentemente de trânsito em julgado: a) intime-se o acusado, pessoalmente e por meio de sua defensora nomeada; b) intime-se a vítima acerca da parte dispositiva, fornecendo código de acesso ao processo (art. 809 do Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR); c) expeça-se guia de execução provisória, e remeta-se ao processo de execução penal. Após o trânsito em julgado: a) oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE/PR) para comunicar a condenação, nos termos do art. 15, III, da CF; b) expeça-se guia de execução definitiva. c) encaminhem-se os autos ao Distribuidor para anotação e comunique-se ao Instituto de Identificação do Estado do Paraná (art. 825, caput, c/c art. 824, VIII, c/c art. 838, I, todos do Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR); d) remetam-se os autos ao contador judicial para cálculo das custas e das penas de multa e, após, intime-se o réu para pagamento em 10 dias (art. 875 c/c art. 877, ambos do Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR); e) à Secretaria para que verifique se existe fiança e outros bens apreendidos cuja destinação não foi determinada nesta sentença e, sendo o caso, certifique a respeito e promova a conclusão dos autos após manifestação do órgão ministerial (art. 838, III do Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR). Publicada com a inclusão no sistema do processo eletrônico. Traslade-se cópia da presente sentença aos autos de execução penal n. 4000029-41.2024.8.16.0059 (SEEU). Dê-se ciência ao Ministério Público. Oportunamente, arquivem-se. Demais diligências necessárias. Cândido de Abreu, data da assinatura digital. Aroldo Henrique Pegoraro de Almeida Juiz de Direito
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