Aline Kyara Soares Lins e outros x Aline Kyara Soares Lins e outros
ID: 278142384
Tribunal: TRT13
Órgão: Gabinete da Vice Presidência
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000364-48.2024.5.13.0032
Data de Disponibilização:
26/05/2025
Advogados:
JOSE HILTON SILVEIRA DE LUCENA
OAB/PB XXXXXX
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RENATA LINS AZI
OAB/BA XXXXXX
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TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: WOLNEY DE MACEDO CORDEIRO ROT 0000364-48.2024.5.13.0032 RECORRENTE: ALINE KYARA SOARES LINS E OUTROS (3) RECORRIDO:…
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relator: WOLNEY DE MACEDO CORDEIRO ROT 0000364-48.2024.5.13.0032 RECORRENTE: ALINE KYARA SOARES LINS E OUTROS (3) RECORRIDO: MSC CRUISES S.A. E OUTROS (3) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID a97fd80 proferida nos autos. ROT 0000364-48.2024.5.13.0032 - 2ª Turma Recorrente: Advogado(s): 1. ALINE KYARA SOARES LINS JOSE HILTON SILVEIRA DE LUCENA (PB8223) Recorrente: Advogado(s): 2. MSC CRUISES S.A. RENATA LINS AZI (BA19074) Recorrente: Advogado(s): 3. MSC MALTA SEAFARERS COMPANY LIMITED RENATA LINS AZI (BA19074) Recorrente: Advogado(s): 4. MSC CRUZEIROS DO BRASIL LTDA. RENATA LINS AZI (BA19074) Recorrido: Advogado(s): MSC CRUISES S.A. RENATA LINS AZI (BA19074) Recorrido: Advogado(s): MSC CRUZEIROS DO BRASIL LTDA. RENATA LINS AZI (BA19074) Recorrido: Advogado(s): MSC MALTA SEAFARERS COMPANY LIMITED RENATA LINS AZI (BA19074) Recorrido: Advogado(s): ALINE KYARA SOARES LINS JOSE HILTON SILVEIRA DE LUCENA (PB8223) RECURSO DE: ALINE KYARA SOARES LINS PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 08/05/2025 - Id 25f1636; recurso apresentado em 20/05/2025 - Id ade33d1). Representação processual regular (Id c9d8b38). Preparo dispensado (Id c56eda2). PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS TRANSCENDÊNCIA Nos termos do artigo 896-A, § 6º, da Consolidação das Leis do Trabalho, cabe ao Tribunal Superior do Trabalho analisar se a causa oferece transcendência em relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica. 1.1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO (8826) / ATOS PROCESSUAIS (8893) / NULIDADE (8919) / NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Alegação(ões): - violação do(s) inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal. - violação da(o) artigos 489 e 1022 do Código de Processo Civil de 2015; artigo 832 da Consolidação das Leis do Trabalho. A recorrente suscita a nulidade do acórdão de embargos de declaração por negativa de prestação jurisdicional. Alega que o acórdão foi omisso quanto aos seguintes tópicos: Omissão quanto ao fato de que “todas as rubricas contidas nas cláusulas do contrato de trabalho correspondem a parcelas fixas componentes de um salário já pré-determinado, não havendo qualquer relação, por exemplo, com verbas com natureza de horas extras, porquanto estas se exprimem em parâmetros naturalmente variáveis”; Omissão quanto ao fato de que “os valores descritos nos contratos firmados com a parte Reclamante referem-se a salário contratado, não remunerando isoladamente qualquer das verbas descritas nos documentos –como é o caso das parcelas "Minimum Fixed Overtime", "Leave Compens" e "Sat/Sun Holidays" - eis que pré-contratados, por valores fixos, prática vedada no ordenamento jurídico brasileiro, nos termos da Súmula 91/TST”. Manifestação a respeito dos seguintes termos do contrato de trabalho: [...] Manifestação a respeito dos recibos de pagamento, que reforçam a conclusão de complessividade dos valores descritos no contrato de trabalho. O Órgão julgador, no acórdão de embargos de declaração, assinalou (ID f3887cc): "2.2.1 OMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE DE DEDUÇÃO DE HORAS EXTRAS Sobre o tema em exame, o acórdão erigiu tese explícita, no sentido de que era possível a dedução das horas extras, até porque não se tratava de salário complessivo (fls. 2263/2265), in verbis: O Juízo a quo determinou que o cálculo das verbas deferidas observasse o salário base consignado em contracheque, no importe de US$ 538.00 (fls. 2005). Tal procedimento está correto, pois, consoante o documento às fls. 287/288 e 297/304, é incontroverso que a reclamante sempre recebeu o salário base ("Basic Wage", US$ 538.00), bem como horas extras ("Minimum Fixed Overtime", US$344.00), compensação de férias ("Leave Compens.", US$ 81.00) e domingos e feriados laborados ("Sat/Sun Holidays", US$ 283.00). Saliente-se que não se trata de salário complessivo, mas, sim, de especificação de rubricas efetivamente pagas à trabalhadora na folha de pagamento. Sobre o tema, adoto, como razões de decidir, a fundamentação de julgado desta Turma, facilmente acessível no portal de jurisprudência, referente às mesmas rés do presente feito, demonstrando que não se trata de salário complessivo, nem de pré-contratação de horas extras referida na Súmula nº 199 do TST, conforme acórdão relatado pelo Desembargador Ubiratan Moreira Delgado: (...) a legislação brasileira veda ao salário complessivo, caracterizado pelo pagamento único de diversas verbas, sem nenhuma discriminação. Ocorre que, no presente caso, da análise dos holerites, observa-se que havia a discriminação dos valores relativos às horas extras, o que afasta a caracterização de salário complessivo. Saliente-se, por oportuno, que a teoria do salário complessivo, repudiada pelo ordenamento jurídico, não pode ensejar o enriquecimento sem causa do empregado, especialmente quando discriminadas as verbas devidas no contrato escrito e especificadas nos contracheques. Ademais, embora até já tenha pensado de forma diferente, uma análise mais detida da situação de fato me faz afastar a hipótese de pré-contratação vedada de horas extras. De fato, apesar de a jurisprudência não admitir a prévia contratação de horas extras na atividade bancária (súmula 199 do TST), a fim de evitar a burla à jornada especial prevista no art. 224 da CLT, a hipótese aqui tratada é bem diversa. Primeiro, porque não havia um número fechado de horas extras previamente contratadas (embora exista referência a um número mínimo). Segundo, porque a própria natureza da atividade de cruzeiros marítimos tem peculiaridades que a diferem muito do funcionamento de um banco. Pelo fato de o tripulante não poder simplesmente sair do navio (e do contrato) na hora que bem entender, é natural que já embarque tendo uma noção prévia do que o espera, inclusive em relação a jornada extraordinária e o respectivo pagamento. Desse modo, o montante salarial pactuado como contraprestação pelo serviço despendido, corresponde efetivamente ao salário-base de US$ 538,00 (quinhentos e trinta e oito dólares americanos), o qual remunera a jornada ordinária de 8 horas diárias e 44 semanais. (TRT 13ª Região - 2ª Turma - Recurso Ordinário Trabalhista nº 0000298-20.2023.5.13.0027, Redator(a): Desembargador(a) Ubiratan Moreira Delgado, Julgamento: 24/01/2024, Publicação: DJe 26/01/2024) Na mesma linha de raciocínio, citam-se as decisões deste Colegiado no processo nº 0000398-43.2021.5.13.0027, também de relatoria do Desembargador Ubiratan Moreira Delgado, e no processo nº 0000749-88.2021.5.13.0003, de relatoria do Desembargador Edvaldo de Andrade. Destarte, determina-se a dedução dos valores pagos mensalmente a título de horas extras ("Minimum Fixed Overtime", US$344.00), férias ("Leave Compens.", US$ 81.00) e domingos e feriados laborados ("Sat/Sun Holidays", US$ 283.00), observando-se, entretanto, que, em caso de pagamento a maior, fica vedado o abatimento em meses seguintes. Nesse particular, a peça de embargos revela, notoriamente, a mera insatisfação da parte embargante para com a análise procedida. Ocorre que tal questionamento não é possível pela via eleita. De modo que os embargos não merecem acolhimento. No mais, consideram-se prequestionadas as matérias ventiladas nos correspondentes embargos de declaração opostos por ambas as partes." A negativa de prestação jurisdicional se configura com a ausência de posicionamento expresso, no julgado, acerca de questão suscitada pelos litigantes e que seja essencial e indispensável à solução da controvérsia. Na hipótese dos autos, constata-se que as matérias relevantes para o deslinde da questão foram examinadas e a prestação jurisdicional foi entregue de forma amplamente fundamentada, uma vez que a Turma apreciou, de modo satisfatório, os fundamentos fáticos e jurídicos que embasaram a sua decisão, analisando as questões suscitadas pelas partes, bem como as provas aptas a fundamentar o seu convencimento, o que afasta a hipótese de afronta dos arts. 93, IX, da CF, 832 da CLT e 489 e 1022 do CPC. Nesse contexto, as alegações da recorrente são meras manifestações de inconformismo meritório. 2.1 DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO (12936) / VERBAS REMUNERATÓRIAS, INDENIZATÓRIAS E BENEFÍCIOS (13831) / SALÁRIO/DIFERENÇA SALARIAL (13858) / SALÁRIO COMPLESSIVO Alegação(ões): - contrariedade à(ao): Súmula nº 91; Súmula nº 264; Súmula nº 340; item I da Súmula nº 199 do Tribunal Superior do Trabalho. - violação da(o) §1º do artigo 457 da Consolidação das Leis do Trabalho. - divergência jurisprudencial. Alega a recorrente que "as Reclamadas praticavam a pré contratação de valores que englobavam várias parcelas, de modo que a Autora não poderia saber a quais verbas, exatamente, se destinavam. Isso porque, não há como individualizar qualquer das verbas recebidas, pois de simples análise dos documentos referidos, verifica-se que os valores descritos nos contratos são exatamente os mesmos, ou seja, na realidade referem-se à salário contratado, não remunerando isoladamente qualquer das verbas descritas nos documentos, eis que pré contratados, por valores fixos, prática vedada no ordenamento brasileiro." Requer a Reclamante pelo conhecimento do presente recurso de revista, por violação ao artigo 457, caput e §1º, da CLT, assim como pela contrariedade às Súmulas 91, e 340 do TST, e pelo seu provimento para que seja reconhecida a real remuneração da Reclamante, conforme os recibos de pagamentos juntados aos autos, que servirá de base para o cálculo das demais parcelas salariais, principalmente das horas extras, verbas rescisórias e multa do artigo 477 da CLT. Consequentemente, requer-se sejam as Reclamadas condenadas efetuarem o pagamento das diferenças salariais devidas em razão da correta fixação da remuneração obreira – nos exatos termos delineados na exordial e renovadas no recurso ordinário" A Turma julgadora, quanto ao tema, destacou (ID 76daa5a): "1.2.4 SALÁRIO E DEDUÇÕES DE PARCELAS JÁ PAGAS A IDÊNTICO TÍTULO O Juízo a quo determinou que o cálculo das verbas deferidas observasse o salário base consignado em contracheque, no importe de US$ 538.00 (fls. 2005). Tal procedimento está correto, pois, consoante o documento às fls. 287/288 e 297/304, é incontroverso que a reclamante sempre recebeu o salário base ("Basic Wage", US$ 538.00), bem como horas extras ("Minimum Fixed Overtime", US$344.00), compensação de férias ("Leave Compens.", US$ 81.00) e domingos e feriados laborados ("Sat/Sun Holidays", US$ 283.00). Saliente-se que não se trata de salário complessivo, mas, sim, de especificação de rubricas efetivamente pagas à trabalhadora na folha de pagamento. Sobre o tema, adoto, como razões de decidir, a fundamentação de julgado desta Turma, facilmente acessível no portal de jurisprudência, referente às mesmas rés do presente feito, demonstrando que não se trata de salário complessivo, nem de pré-contratação de horas extras referida na Súmula nº 199 do TST, conforme acórdão relatado pelo Desembargador Ubiratan Moreira Delgado: (...) a legislação brasileira veda ao salário complessivo, caracterizado pelo pagamento único de diversas verbas, sem nenhuma discriminação. Ocorre que, no presente caso, da análise dos holerites, observa-se que havia a discriminação dos valores relativos às horas extras, o que afasta a caracterização de salário complessivo. Saliente-se, por oportuno, que a teoria do salário complessivo, repudiada pelo ordenamento jurídico, não pode ensejar o enriquecimento sem causa do empregado, especialmente quando discriminadas as verbas devidas no contrato escrito e especificadas nos contracheques. Ademais, embora até já tenha pensado de forma diferente, uma análise mais detida da situação de fato me faz afastar a hipótese de pré contratação vedada de horas extras. De fato, apesar de a jurisprudência não admitir a prévia contratação de horas extras na atividade bancária (súmula 199 do TST), a fim de evitar a burla à jornada especial prevista no art. 224 da CLT, a hipótese aqui tratada é bem diversa. Primeiro, porque não havia um número fechado de horas extras previamente contratadas (embora exista referência a um número mínimo). Segundo, porque a própria natureza da atividade de cruzeiros marítimos tem peculiaridades que a diferem muito do funcionamento de um banco. Pelo fato de o tripulante não poder simplesmente sair do navio (e do contrato) na hora que bem entender, é natural que já embarque tendo uma noção prévia do que o espera, inclusive em relação a jornada extraordinária e o respectivo pagamento. Desse modo, o montante salarial pactuado como contraprestação pelo serviço despendido, corresponde efetivamente ao salário-base de US$ 538,00 (quinhentos e trinta e oito dólares americanos), o qual remunera a jornada ordinária de 8 horas diárias e 44 semanais. (TRT 13ª Região - 2ª Turma - Recurso Ordinário Trabalhista nº 0000298-20.2023.5.13.0027, Redator(a): Desembargador(a) Ubiratan Moreira Delgado, Julgamento: 24/01/2024, Publicação: DJe 26/01/2024) Na mesma linha de raciocínio, citam-se as decisões deste Colegiado no processo nº 0000398-43.2021.5.13.0027, também de relatoria do Desembargador Ubiratan Moreira Delgado, e no processo nº 0000749-88.2021.5.13.0003, de relatoria do Desembargador Edvaldo de Andrade. Destarte, determina-se a dedução dos valores pagos mensalmente a título de horas extras ("Minimum Fixed Overtime", US$344.00), férias ("Leave Compens.", US$ 81.00) e domingos e feriados laborados ("Sat/Sun Holidays", US$ 283.00), observando-se, entretanto, que, em caso de pagamento a maior, fica vedado o abatimento em meses seguintes. 1.2.5 DESCONTOS SALARIAIS À luz do art. 462, § 1º, da CLT, o empregador somente pode efetuar descontos no salário do empregado, por danos que este cause à empresa, se houver acordo nesse sentido ou se o dano decorrer de dolo do trabalhador. Entretanto, no caso dos autos, as reclamadas não comprovaram a anuência da trabalhadora para com os descontos em questão ("fund deduction" e "union welfare center"), tampouco demonstraram que se trataria de ressarcimento por dano doloso. Acrescente-se que, conforme já exposto nos itens anteriores deste voto, as normas coletivas da ITF não são aplicáveis ao contrato de trabalho em apreço. Nessa perspectiva, mantém-se o decisório, que corretamente determinou a restituição dos descontos indevidos." Como se vê, restou consignado no acórdão que havia a discriminação, nos documentos colaiconados aos autos, dos valores relativos ao pagamento "salário base ("Basic Wage", US$ 538.00), bem como horas extras ("Minimum Fixed Overtime", US$344.00), compensação de férias ("Leave Compens.", US$ 81.00) e domingos e feriados laborados ("Sat/Sun Holidays", US$ 283.00)", afastando a caracterização de salário complessivo. Restou esclarecido, ainda, na decisão recorrida, que não havia um número fechado de horas extras previamente contratadas, mas, sim, referência a um número mínimo a ser pago, sem prejuízo de pagamento de outras horas excedentes. Nesse contexto, qualquer conclusão em sentido diverso encontra óbice na Súmula nº 126 do C. TST, segundo a qual não se admite o processamento do recurso de revista quando a apreciação da matéria nele veiculada exigir o revolvimento de fatos e provas, sobre os quais as decisões das instâncias ordinárias detêm soberania, inviabilizando o seguimento do recurso por quaisquer alegações, inclusive por dissenso jurisprudencial. Nego seguimento. CONCLUSÃO a) DENEGO seguimento ao recurso de revista. Publique-se. b) Não havendo a interposição de agravo de instrumento, certifique-se o trânsito em julgado e, ato contínuo, independentemente de nova conclusão, encaminhem-se os autos à Vara de origem. c) Interposto agravo de instrumento, independentemente de nova conclusão, notifique-se a parte agravada para, querendo, apresentar contrarrazões ao recurso de revista e contraminuta ao agravo de instrumento, no prazo de 08 dias. d) Decorrido o lapso temporal do contraditório, remetam-se os autos ao Tribunal Superior do Trabalho. RECURSO DE: MSC CRUISES S.A. (E OUTROS) PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Recurso tempestivo (decisão publicada em 08/05/2025 - Id 591b394,3531c94,97d068f; recurso apresentado em 20/05/2025 - Id 9297bc6). Representação processual regular (Id afbfa04,a9c6965). Preparo satisfeito. Depósito do RO nos IDs 344326e,6c7ced0. Custas nos Ids e99ec9a, 354d6a. Depósito do RR no ID dbb7d25. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS TRANSCENDÊNCIA Nos termos do artigo 896-A, § 6º, da Consolidação das Leis do Trabalho, cabe ao Tribunal Superior do Trabalho analisar se a causa oferece transcendência em relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica. 1.1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO (8826) / ATOS PROCESSUAIS (8893) / NULIDADE (8919) / NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Alegação(ões): - violação do(s) inciso XXXV do artigo 5º; inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal. - violação da(o) artigo 832 da Consolidação das Leis do Trabalho; artigos 489, 1013 e 1022 do Código de Processo Civil de 2015. As recorrentes alegam que houve negativa de prestação jurisdicional, pois o Órgão julgador teria se esquivado de apreciar pontos cruciais para o bom deslinde do feito, mesmo após a oposição de embargos declaratórios. Aduzem que o acórdão foi omisso quanto aos seguintes tópicos: 1) Ausência de jurisdição da autoridade judiciária brasileira; 2) Inaplicabilidade da legislação brasileira ao contrato internacional de trabalho marítimo; 3) Do TAC firmado com o Ministério Público do Trabalho; e 4) Dos acordos coletivos internacionais firmados com sindicato. A Turma Julgadora assim decidiu: "1.2.1 COMPETÊNCIA JURISDICIONAL E LEGISLAÇÃO APLICÁVEL No caso em apreço, restou comprovado que a autora fora recrutada, selecionada, treinada e contratada em solo brasileiro como tripulante de navio cruzeiro internacional, consoante depoimento do preposto ("que há obrigatoriedade da realização de exames médicos para todos os tripulantes antes do embarque, e a reclamante apresentou os exames médicos, os quais posteriormente são ressarcidos pela empresa" - fls. 1985), da testemunha ouvida em juízo ("que o curso e a realização de exames só são feitas após aprovação para trabalhar; (...) que então após exames médicos e certificação, recebem um contrato via email, o qual é assinado e enviado de volta; que o referido contrato já vem assinado pela empresa, e então manda de volta com "a nossa assinatura";") e documentos anexados aos autos, notadamente e-mails trocados entre o autor e a empresa Rosa dos Ventos (fls. 73), contrato de tripulação, entre outros instrumentos contratuais acessórios (285/329). Desse modo, as provas documentais e oral acima referidas ratificam a tese obreira de que a contratação ocorreu em solo brasileiro, ainda mais considerando que o art. 9º, da LINDB, dispõe que as obrigações serão regidas pela lei do país em que se constituírem, bem como o art. 435 do CC dita que é considerado celebrado o contrato no lugar em que fora proposto. Ao tratar sobre a eficácia espacial das normas trabalhistas, estuda-se o direito internacional do trabalho, ou seja, a norma que será aplicada ao empregado contratado no Brasil, para prestar serviços no exterior. Por oportuno, reporto-me ao acórdão de minha relatoria, prolatado nos autos da ação trabalhista nº 0130108-10.2015.5.13.0001, em que consta transcrição de parecer da lavra do Ministro aposentado do TST, Pedro Paulo Teixeira Manus, assim redigido: O Direito Internacional Privado nunca busca solucionar uma lide, mas apenas indicar qual a norma adequada para aplicar-se a um caso concreto. Ou seja, trata-se de mera indicação de qual direito, dentre aqueles que tenham conexão com a lide sub judice, deverá ser aplicado na solução de um determinado caso. Para buscar qual a norma adequada, o DIP se utiliza dos chamados "elementos de conexão". Estes servem para buscar qual a razão ou elemento que conecta uma situação jurídica a mais de um ordenamento jurídico, ou seja, analisa-se se o motivo que gera dúvida no que tange à lei aplicável é forte o suficiente para "deslocar" a relação jurídica para a égide de um outro sistema normativo, no caso, estrangeiro. É importante destacar que os elementos de conexão diferenciam-se conforme as normas de Direito Internacional Privado de cada Estado. Assim, cada Estado fixa em seu ordenamento interno quais seriam as razões que fariam com que uma norma internacional pudesse ser adotada, em "prejuízo" da norma de direito interno. (...) Para se chegar à lei que será aplicada ao caso concreto, deve-se, então, saber qual elemento de conexão irá prevalecer. (...) (...) Alguns países, geralmente pequenos, obtêm no chamado "Registro Aberto", fonte considerável de suas receitas. Alguns desses países chegam a não possuir contato algum com o mar. No entanto, o fato de uma embarcação estar registrada nesses países não impede que se aplique legislação mais benéfica aos trabalhadores. Desse modo, a Lei nº 7.064/1982 elegeu como elemento de conexão ou de atração aplicável, em razão do princípio do centro da gravidade da relação jurídica, o local da constituição do contrato ou da contratação. Portanto, há de se preconizar a possibilidade de submeter os contratos laborais dos tripulantes brasileiros à égide da legislação pátria, e não ao regramento dos contratos internacionais, considerando sempre a aplicação da norma mais benéfica. Há de prevalecer a norma internacional quando mais favorável ao empregado, entretanto, essa não é a hipótese em tela. De acordo com o art. 3º, da Lei nº 7.064/1982, aplica-se, independentemente da legislação do local da prestação de serviços, a lei brasileira quando mais favorável no conjunto de normas em relação a cada matéria. Assim sendo, com base no princípio da norma mais favorável (art. 7º, caput, da CF), o Juiz do Trabalho, como forma de decidir o conflito, aplicará a legislação do país que for mais benéfica ao trabalhador. Portanto, serão garantidos aos empregados contratados no Brasil para prestarem serviços no exterior os direitos da legislação trabalhista brasileira, desde que mais favorável. Desse modo, na forma do art. 3º, II, da Lei nº 7.064/1982, o conflito de direito internacional privado, concernente à aplicação da norma trabalhista, resolve-se pelo princípio da norma mais favorável, consideradas em conjunto, as disposições regulativas de cada matéria ou instituto, consagrando-se a teoria do conglobamento mitigado ou por institutos, ainda que a prestação de serviços ocorra no exterior, nessa trilha o TST cancelou a Súmula nº 207. Hodiernamente, a referida lei é estendida a todos os empregados (brasileiros e estrangeiros) contratados no Brasil para prestar serviços no exterior. Com essa alteração da lei, abrangendo todos os empregados, a Súmula nº 207 do TST foi cancelada, pois atualmente há lei específica que trata sobre todos os empregados contratados no Brasil para prestarem serviços no exterior. Hoje vigora, portanto, o princípio da norma mais favorável. Se a lei estrangeira for mais favorável, será ela aplicada, o que não restou caracterizado nos autos. Cabe frisar que deverá ser respeitada a Teoria do Conglobamento Mitigado ou Conglobamento por Institutos, pois o intérprete aplicará, no conjunto, cada um dos institutos jurídicos mais benéficos previstos na legislação. Acerca do tema, citam-se as lições de Maurício Godinho Delgado, in verbis: Em 2009, pela Lei n. 11.962 (Diário Oficial de 06.07.09) felizmente, eliminou-se a censurada diferenciação, ao se estenderem as regras da Lei n. 7.064/1982 a todos os trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviços no exterior (novo art. 1B da Lei n. 7.064, conforme redação conferida pela Lei n. 11.962/09). A extensão, como se percebe, atinge não somente os dispositivos regentes da transferência e retorno para o Brasil, mas também o próprio universo normativo regulador do contrato durante o período de permanência do obreiro no exterior. Nessa medida, o critério da territorialidade deixa de se aplicar às transferências de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no estrangeiro: tais contratos passam a se submeter à legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto na Lei n. 7.064/82, quando mais favorável do que a legislação territorial estrangeira, observado o conjunto de normas em relação a cada matéria (art. 3º, II, Lei n. 7.064). (DELGADO, Maurício Godinho. p. 241) À luz dos princípios da persuasão racional e da primazia da realidade constata-se que a reclamante comprovou ter sido recrutada, selecionada, treinada e contratada no Brasil para ativar-se a bordo de navios cruzeiros, tanto em navegação de cabotagem, como em águas internacionais, sendo aplicável a legislação brasileira, com esteio nos arts. 1º, caput; 2º, inciso III e 3º, inciso II, todos da Lei nº 7.064/1982, considerando que o referido diploma legal preconiza os princípios do centro de gravidade da relação jurídica, que tem como elemento de conexão ou de atração o local de constituição do contrato, e da norma mais favorável. Extrai-se dos artigos supracitados que, independentemente do princípio da territorialidade (lex loci executionis), deve-se observar a legislação brasileira quando se revelar mais favorável do que a norma do país da prestação de serviços. O contexto fático e probatório demonstrou que a obreira fora recrutada, selecionada, treinada e contratada no Brasil para ativar-se a bordo de navios cruzeiros, tanto em águas nacionais, como internacionais, por grupo econômico sediado no Brasil (MSC), e comprovado que a legislação pátria se revela mais benéfica, não restam dúvidas de que o ordenamento jurídico brasileiro regula o pacto laboral ora discutido, sobrepondo-se aos instrumentos normativos internacionais e títulos executivos extrajudiciais, a exemplo do TAC acostado aos autos, porque estes são mais prejudiciais na regulação do pacto laboral em análise. Outrossim, o art. 9º da LINDB dispõe que as obrigações serão regidas pela lei do país em que se constituírem, bem como o art. 435, do CC dita que é considerado celebrado o contrato no lugar em que fora proposto. Além do que a lei do pavilhão ou da bandeira, em seu caráter absoluto, está ontologicamente ligada a embarcações militares oficiais, com o escopo de resguardar a soberania da nação, e não a "bandeiras mercantes de conveniência", em que a bandeira do navio é distinta da nacionalidade do empregador, como é a hipótese de navios privados estrangeiros, que somente representarão prolongamento do território do país cuja bandeira ostentem, se navegarem em alto-mar, não sendo extensão do território do país de sua bandeira quando navegam em águas territoriais brasileiras. Destarte, a matéria em lide deve ser resolvida à luz da Lei nº 7.064/1982, cujo teor dispõe sobre a situação de trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviços no exterior, como é o caso da reclamante, contratada no Brasil para prestar serviços em navio cruzeiro em águas brasileiras e internacionais. Nesse panorama, imperioso concluir que, contratada a autora no Brasil, a relação de trabalho mantida entre as partes deve ser regida pela legislação brasileira, em homenagem aos princípios da norma mais favorável à empregada e do centro de gravidade da relação jurídica. Por outro lado, a Tese da Repercussão Geral nº 210 não modifica o panorama delineado, visto que tal decisão não tratou de matéria trabalhista. Sobre o tema, cito julgado do C. TST: I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA PARTE RECLAMADA. RECURSO DE REVISTA . LEI 13.015/2014. EMPREGADO CONTRATADO PARA PRESTAR SERVIÇO EM NAVIO DE CRUZEIRO INTERNACIONAL. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. Inicialmente registra-se que a Tese de Repercussão Geral 210 do STF trata de extravio de bagagem de passageiro , e não de direito do trabalho. Assim, não há falar em contrariedade à referida tese de repercussão geral. Na hipótese, depreende-se do acórdão recorrido que a reclamante, brasileira, foi contratada no Brasil para trabalhar como camareira em navio em temporada mista, para percorrer águas nacionais e internacionais. Assim, inafastável a aplicação da jurisdição nacional, consoante artigo 651, § 2º, da CLT. Acresça-se que, com o cancelamento da Súmula nº 207 do TST (Res. 181/2012, DEJT de 19, 20 e 23/4/2012), consolidou-se neste Tribunal o entendimento de que a Lei 7.064/1982 assegura ao empregado brasileiro que labora no exterior a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho sempre que ficar evidenciado ser essa mais favorável que a legislação territorial, nos termos do artigo 3º, inciso II, da Lei nº 7.064/82. Precedentes. Incidência do disposto na Súmula 333 do TST e no art. 896,§ 7º , da CLT . Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...) (RRAg-143-32.2017.5.09.0029, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 06/08/2021) Na mesma trilha é a jurisprudência deste Regional: RECURSO ADESIVO DAS RECLAMADAS. MARÍTIMO. TRABALHO EM CRUZEIRO. COMPETÊNCIA. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. Tratando-se de vínculo de emprego com execução em águas nacionais e internacionais e havendo tanto a contratação e quanto o início do labor ocorrido em águas brasileiras, considera-se competente a justiça brasileira para análise da questão, bem como aplicável ao caso a legislação nacional, por observância ao disposto no art. 3º, II, da Lei nº 7.064/1982, da qual se extrai o princípio do centro de gravidade da relação jurídica, considerando aplicável a norma mais favorável ao empregado e não a Lei do Pavilhão. Recurso a que se nega provimento. (...) (TRT 13ª Região - 2ª Turma - Recurso Ordinário Trabalhista nº 0000327-19.2017.5.13.0015, Redator(a): Desembargador(a) Edvaldo De Andrade, Julgamento: 02/09/2020, Publicação: DJe 03/09/2020) MARÍTIMO. CONTRATO DE EMPREGO CELEBRADO NO BRASIL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS A BORDO DE NAVIO DESTINADO A CRUZEIROS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. Tendo o reclamante sido selecionado e contratado em território nacional, para exercer o labor nos navios pertencentes ao grupo econômico em águas nacionais e internacionais, é aplicável a legislação brasileira, na forma do artigo 3º, inciso II, da Lei n. 7.064/1982, em respeito ao princípio da norma mais favorável e ao centro de gravidade, e não em obediência à Lei do Pavilhão. Recurso parcialmente provido, apenas para que seja determinada a dedução das horas extras comprovadamente pagas. (TRT 13ª Região - 2ª Turma - Recurso Ordinário Trabalhista nº 0000467-74.2018.5.13.0029, Redator(a): Desembargador(a) Francisco De Assis Carvalho E Silva, Julgamento: 16/10/2019, Publicação: DJe 22/10/2019) Doutra banda, a ratificação da Convenção nº 186 da OIT - que trata do trabalho marítimo, internalizada por meio do Decreto nº 10.671/2021, publicado em 12.04.2021, obrigando a República Federativa do Brasil, no plano jurídico internacional, a contar de 07.05.2021 - é irrelevante. Isso porque, o preâmbulo da mencionada norma internacional realça que, nos termos do artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, "de modo algum a adoção de qualquer Convenção ou Recomendação pela Conferência ou a ratificação de qualquer Convenção por qualquer Membro poderá afetar lei, decisão, costume ou acordo que assegure condições mais favoráveis aos trabalhadores do que as condições previstas pela Convenção ou Recomendação". Sobre o tema - ainda que em obter dictum, em decisão prolatada antes da internalização da Convenção nº 186 da OIT -, assim já se manifestou o C. TST: (...) COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL. LABOR EM NAVIO DE CRUZEIRO INTERNACIONAL. TRABALHO EM ÁGUAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. (...) 1 - Há transcendência jurídica quando se constata em exame preliminar a divergência entre Turmas do TST sobre a matéria. 2 - Inaplicável ao caso dos autos a tese firmada pelo STF em repercussão geral (Tema 210: "Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor" ), uma vez que se discutiu questão sobre indenização por danos morais por extravio de bagagens em voos internacionais, matéria distinta da examinada no presente caso. 3 - A jurisprudência majoritária do TST, quanto à hipótese de trabalhador brasileiro contratado para desenvolver suas atividades em navios estrangeiros em percursos em águas nacionais e internacionais, é de que nos termos do art. 3º, II, da Lei nº 7.064/82, aos trabalhadores nacionais contratados no País ou transferidos do País para trabalhar no exterior, aplica-se a legislação brasileira de proteção ao trabalho naquilo que não for incompatível com o diploma normativo especial, quando for mais favorável do que a legislação territorial estrangeira - sendo competente a Justiça do Trabalho para processar e julgar o feito. 4 - O Pleno do TST cancelou a Súmula nº 207 porque a tese de que "A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação" não espelhava a evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial sobre a matéria. E após o cancelamento da Súmula nº 207 do TST, a jurisprudência majoritária se encaminhou para a conclusão de que somente em princípio, à luz do Código de Bustamante, também conhecido como "Lei do Pavilhão" (Convenção de Direito Internacional Privado em vigor no Brasil desde a promulgação do Decreto nº 18.871/29), aplica-se às relações de trabalho desenvolvidas em alto mar a legislação do país de inscrição da embarcação. Isso porque, em decorrência da Teoria do Centro de Gravidade, ( most significant relationship ), as normas de Direito Internacional Privado deixam de ser aplicadas quando, observadas as circunstâncias do caso, verificar-se que a relação de trabalho apresenta uma ligação substancialmente mais forte com outro ordenamento jurídico. Trata-se da denominada "válvula de escape", segundo a qual impende ao juiz, para fins de aplicação da legislação brasileira, a análise de elementos tais como o local das etapas do recrutamento e da contratação e a ocorrência ou não de labor também em águas nacionais. 5 - Nos termos do art. 3º da Lei n° 7.064/1982, a antinomia aparente de normas de direito privado voltadas à aplicação do direito trabalhista deve ser resolvida pelo princípio da norma mais favorável, considerando o conjunto de princípios, regras e disposições que dizem respeito a cada matéria (teoria do conglobamento mitigado). 6 - Não se ignora a importância das normas de Direito Internacional oriundas da ONU e da OIT sobre os trabalhadores marítimos (a exemplo da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto n° 4.361/2002, e da Convenção n° 186 da OIT sobre Direito Marítimo - MLC, não ratificada pelo Brasil). Contudo, deve-se aplicar a legislação brasileira em observância a Teoria do Centro de Gravidade e ao princípio da norma mais favorável, que norteiam a solução jurídica quanto há concorrência entre normas no Direito Internacional Privado, na área trabalhista. Doutrina. 7 - Cumpre registrar que o próprio texto da Convenção n° 186 da OIT sobre Direito Marítimo - MLC, não ratificada pelo Brasil, esclarece que sua edição levou em conta "o parágrafo 8º do Artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, que determina que, de modo algum a adoção de qualquer Convenção ou Recomendação pela Conferência ou a ratificação de qualquer Convenção por qualquer Membro poderá afetar lei, decisão, costume ou acordo que assegure condições mais favoráveis aos trabalhadores do que as condições previstas pela Convenção ou Recomendação" . 8 - Não afronta o princípio da isonomia a aplicação da legislação brasileira mais favorável aos trabalhadores brasileiros e a aplicação de outra legislação aos trabalhadores estrangeiros no mesmo navio. Nesse caso há diferenciação entre trabalhadores baseada em critérios objetivos (regência legislativa distinta), e não discriminação fundada em critérios subjetivos oriundos de condições e/ou características pessoais dos trabalhadores. 9 - No caso, o TRT reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ao presente feito ao registrar que "mesmo a pré-contratação (aliada a outros fatores) em território nacional viabilizaria a aplicação das regras trabalhistas ao contrato de trabalho, conforme linha jurisprudencial nesse sentido, tal como o julgado do C. TST supratranscrito. Além disso, as rés reconhecem em defesa que a embarcação passava tanto por águas brasileiras, como internacionais, o que traduz forte indício de que, durante todo o período, a autora prestou serviços em favor das reclamadas. Assim, porque a contratação se efetivou no Brasil, e, durante parte do pacto, as rotas efetuadas foram em território brasileiro, tem-se que a legislação aplicável é a CLT, sendo competente a Justiça do trabalho para o exame e julgamento dos pedidos. 10 - Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR-445-63.2015.5.09.0245, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 24/03/2023) (grifei) Na mesma linha de raciocínio é o magistério de Valério Mazzuoli: As lois de police são exemplificadas na doutrina jusprivatistas internacional exatamente com as leis trabalhistas, especialmente em razão de não se compreender como uma norma estrangeira possa melhor proteger um empregado contratado no Brasil, bem assim levando em conta que a nossa consolidação laboral é (em muitos casos, e especialmente neste) mais benéfica a tais empregados aqui contratados (MAZZUOLLI, 2019). Se compararmos as normas internacionais com as normas constitucionais e infraconstitucionais brasileiras relativas à proteção dos trabalhadores que exercem atividades em empresas estrangeiras de cruzeiro, nota-se nitidamente que as normas brasileiras - Constituição Federal e CLT - são mais favoráveis às regras internacionais potencialmente aplicáveis. (...) Relação da Convenção nº 186 da OIT com as normas brasileiras de proteção ao trabalhador No plano internacional, é a Convenção nº 186 da OIT (2006) - chamada de Maritime Labor Convention ou Convenção sobre Trabalho Marítimo - a responsável por regular o trabalho marítimo e estabelecer os princípios a ele aplicáveis. A Convenção nº 186 é norma de hard law e, uma vez em vigor no Estado, tem aplicabilidade direta no plano interno, devendo ser observada pelo Poder Judiciário local. O Brasil depositou, junto ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, em 7 de maio de 2020, o instrumento de ratificação da Convenção sobre Trabalho Marítimo, tendo o seu texto sido promulgado internamente pelo Decreto nº 10.671, de 9 de abril de 2021. A Convenção entrou em vigou para a República Federativa do Brasil, no plano jurídico externo, em 7 de maio de 2021, nos termos de seu art. VIII, parágrafo 3º, segundo o qual "esta Convenção entrará em vigor 12 meses a contar da data em que houver sido registrada a ratificação por pelo menos 30 Membros, que em conjunto possuam no mínimo 33% da arqueação bruta da frota mundial"(BRASIL, 2021). A Convenção em tela pretende ser a grande carta laboral internacional do trabalho marítimo, pelo estabelecimento de um conjunto normativo sólido de direitos e princípios, visando especialmente à aplicação de norma única às relações de trabalho assim concebidas. A questão que se põe é saber quais impactos a Convenção sobre Trabalho Marítimo traz para o cenário justrabalhista brasileiro, bem assim quais conflitos normativos podem surgir entre as disposições da Convenção e as leis brasileiras aplicáveis à contratação de brasileiros para exercerem atividades em embarcações estrangeiras. De início, destaque-se que, já no preâmbulo da Convenção fica nítido o desejo Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho em criar um documento único e coerente que incorpore tanto quanto possível todas as normas atualizadas das Convenções e Recomendações internacionais existentes sobre Trabalho Marítimo, bem como princípios fundamentais de outras Convenções internacionais sobre trabalho, particularmente nas seguintes: a) a Convenção sobre o Trabalho Forçado, 1930 (nº 29); b) a Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Proteção do Direito Sindical, 1948 (nº 87); c) Convenção sobre o Direito de Sindicalização e de Negociação Coletiva, 1949 (nº 98); d) a Convenção sobre Igualdade de Remuneração, 1951 (nº 100); e) a Convenção sobre a Abolição do Trabalho Forçado, 1957 (nº 105); f) a Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), 1958 (nº 111); g) a Convenção sobre a Idade Mínima, 1973 (nº 138); e h) a Convenção sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil, 1999 (nº 182). Tendo sido ratificada e estando em vigor no Brasil, Convenção referida obriga o Estado brasileiro em todos os seus termos, não obstante sua aplicabilidade encontrar-se limitada pela possibilidade de o Poder Judiciário aplicar tanto outras convenções internacionais do trabalho pertinentes (como a própria Constituição da OIT) quanto normas do direito interno brasileiro, tais a Constituição e a CLT, à luz do "diálogo das fontes" já referido e do princípio internacional pro homine. Esse entendimento vem expresso, como já se disse, no próprio preâmbulo da Convenção, ao relembrar "o parágrafo 8º do Artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, que determina que, de modo algum a adoção de qualquer Convenção ou Recomendação pela Conferência ou a ratificação de qualquer Convenção por qualquer Membro poderá afetar lei, decisão, costume ou acordo que assegure condições mais favoráveis aos trabalhadores do que as condições previstas pela Convenção ou Recomendação" (BRASIL, 2021). A mesma ideia - aplicação da norma mais favorável aos trabalhadores - se repete em vários outros dispositivos da Convenção, que não excluem a aplicação de normas mais favoráveis para todo o texto do tratado (v.g., art. V, parágrafo 7º; Regra 4.5, parágrafo 1º; Diretriz B4.5, parágrafo 3º). (MAZZUOLI, Valério. In Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, Brasília, v. 26, n. 2, 2022. P. 96 e 104-105) Portanto, a competência para julgamento das pretensões é do Poder Judiciário brasileiro, bem como se aplica a legislação nacional. Sentença mantida quanto a tais temas." A negativa de prestação jurisdicional se configura com a ausência de posicionamento expresso, no julgado, acerca de questão suscitada pelos litigantes e que seja essencial e indispensável à solução da controvérsia. Na hipótese dos autos, constata-se que as matérias relevantes para o deslinde da questão foram examinadas e a prestação jurisdicional foi entregue de forma amplamente fundamentada, uma vez que a Turma apreciou, de modo satisfatório, os fundamentos fáticos e jurídicos que embasaram a sua decisão, analisando as questões suscitadas pelas partes, bem como as provas aptas a fundamentar o seu convencimento, o que afasta a hipótese de afronta dos arts. 93, IX, da CF, 832 da CLT e 489 do CPC. Nesse contexto, as alegações das recorrentes são meras manifestações de inconformismo meritório. No mais, em face do óbice imposto pela Súmula 459 do TST, resta inviável a análise de ofensa dos demais textos legais e constitucionais suscitados. 2.1 DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO (8826) / JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA Alegação(ões): - violação do(s) inciso XXXVI do caput do artigo 5º; inciso XXVI do artigo 7º; artigos 8 e 178 da Constituição Federal. - violação da(o) artigos 8 e 611-A da Consolidação das Leis do Trabalho; §2º do artigo 651 da Consolidação das Leis do Trabalho; artigo 840 do Código Civil; §6º do artigo 5º da Lei nº 7347/1985; artigos 2 e 14 da Lei nº 7064/1982; inciso II do artigo 3º da Lei nº 7064/1982. - divergência jurisprudencial. - violação ao art. 94, da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (aprovada pelo Decreto Legislativo nº 5/1987 e promulgada pelo Decreto nº 99.165/1990) e Convenção 97, da OIT. violação arts. 274,279 e 281 do código de Bustamante e Convenção 97 da OIT (ratificada pelo Brasil). As recorrentes se insurgem contra o reconhecimento da competência da Justiça brasileira para apreciar a demanda, bem como suscitam a inaplicabilidade da legislação trabalhista brasileira à hipótese vertente. Alegam que a decisão colegiada deixou de observar que as relações de trabalho, a bordo dos navios das recorrentes sempre foram regulamentadas por acordos coletivos internacionais mais favoráveis aos trabalhadores e TACs firmados com o MPT, e que, embora o Regional tenha reconhecido que o autor foi contratado para laborar a bordo de navio de cruzeiro, em águas internacionais e nacionais, concluiu que a contratação foi realizada no Brasil e, portanto, sujeita à legislação brasileira. A Turma julgadora, no que diz respeito ao tema, destacou (ID 76daa5a): "1.2.1 COMPETÊNCIA JURISDICIONAL E LEGISLAÇÃO APLICÁVEL No caso em apreço, restou comprovado que a autora fora recrutada, selecionada, treinada e contratada em solo brasileiro como tripulante de navio cruzeiro internacional, consoante depoimento do preposto ("que há obrigatoriedade da realização de exames médicos para todos os tripulantes antes do embarque, e a reclamante apresentou os exames médicos, os quais posteriormente são ressarcidos pela empresa" - fls. 1985), da testemunha ouvida em juízo ("que o curso e a realização de exames só são feitas após aprovação para trabalhar; (...) que então após exames médicos e certificação, recebem um contrato via email, o qual é assinado e enviado de volta; que o referido contrato já vem assinado pela empresa, e então manda de volta com "a nossa assinatura";") e documentos anexados aos autos, notadamente e-mails trocados entre o autor e a empresa Rosa dos Ventos (fls. 73), contrato de tripulação, entre outros instrumentos contratuais acessórios (285/329). Desse modo, as provas documentais e oral acima referidas ratificam a tese obreira de que a contratação ocorreu em solo brasileiro, ainda mais considerando que o art. 9º, da LINDB, dispõe que as obrigações serão regidas pela lei do país em que se constituírem, bem como o art. 435 do CC dita que é considerado celebrado o contrato no lugar em que fora proposto. Ao tratar sobre a eficácia espacial das normas trabalhistas, estuda-se o direito internacional do trabalho, ou seja, a norma que será aplicada ao empregado contratado no Brasil, para prestar serviços no exterior. Por oportuno, reporto-me ao acórdão de minha relatoria, prolatado nos autos da ação trabalhista nº 0130108-10.2015.5.13.0001, em que consta transcrição de parecer da lavra do Ministro aposentado do TST, Pedro Paulo Teixeira Manus, assim redigido: O Direito Internacional Privado nunca busca solucionar uma lide, mas apenas indicar qual a norma adequada para aplicar-se a um caso concreto. Ou seja, trata-se de mera indicação de qual direito, dentre aqueles que tenham conexão com a lide sub judice, deverá ser aplicado na solução de um determinado caso. Para buscar qual a norma adequada, o DIP se utiliza dos chamados "elementos de conexão". Estes servem para buscar qual a razão ou elemento que conecta uma situação jurídica a mais de um ordenamento jurídico, ou seja, analisa-se se o motivo que gera dúvida no que tange à lei aplicável é forte o suficiente para "deslocar" a relação jurídica para a égide de um outro sistema normativo, no caso, estrangeiro. É importante destacar que os elementos de conexão diferenciam-se conforme as normas de Direito Internacional Privado de cada Estado. Assim, cada Estado fixa em seu ordenamento interno quais seriam as razões que fariam com que uma norma internacional pudesse ser adotada, em "prejuízo" da norma de direito interno. (...) Para se chegar à lei que será aplicada ao caso concreto, deve-se, então, saber qual elemento de conexão irá prevalecer. (...) (...) Alguns países, geralmente pequenos, obtêm no chamado "Registro Aberto", fonte considerável de suas receitas. Alguns desses países chegam a não possuir contato algum com o mar. No entanto, o fato de uma embarcação estar registrada nesses países não impede que se aplique legislação mais benéfica aos trabalhadores. Desse modo, a Lei nº 7.064/1982 elegeu como elemento de conexão ou de atração aplicável, em razão do princípio do centro da gravidade da relação jurídica, o local da constituição do contrato ou da contratação. Portanto, há de se preconizar a possibilidade de submeter os contratos laborais dos tripulantes brasileiros à égide da legislação pátria, e não ao regramento dos contratos internacionais, considerando sempre a aplicação da norma mais benéfica. Há de prevalecer a norma internacional quando mais favorável ao empregado, entretanto, essa não é a hipótese em tela. De acordo com o art. 3º, da Lei nº 7.064/1982, aplica-se, independentemente da legislação do local da prestação de serviços, a lei brasileira quando mais favorável no conjunto de normas em relação a cada matéria. Assim sendo, com base no princípio da norma mais favorável (art. 7º, caput, da CF), o Juiz do Trabalho, como forma de decidir o conflito, aplicará a legislação do país que for mais benéfica ao trabalhador. Portanto, serão garantidos aos empregados contratados no Brasil para prestarem serviços no exterior os direitos da legislação trabalhista brasileira, desde que mais favorável. Desse modo, na forma do art. 3º, II, da Lei nº 7.064/1982, o conflito de direito internacional privado, concernente à aplicação da norma trabalhista, resolve-se pelo princípio da norma mais favorável, consideradas em conjunto, as disposições regulativas de cada matéria ou instituto, consagrando-se a teoria do conglobamento mitigado ou por institutos, ainda que a prestação de serviços ocorra no exterior, nessa trilha o TST cancelou a Súmula nº 207. Hodiernamente, a referida lei é estendida a todos os empregados (brasileiros e estrangeiros) contratados no Brasil para prestar serviços no exterior. Com essa alteração da lei, abrangendo todos os empregados, a Súmula nº 207 do TST foi cancelada, pois atualmente há lei específica que trata sobre todos os empregados contratados no Brasil para prestarem serviços no exterior. Hoje vigora, portanto, o princípio da norma mais favorável. Se a lei estrangeira for mais favorável, será ela aplicada, o que não restou caracterizado nos autos. Cabe frisar que deverá ser respeitada a Teoria do Conglobamento Mitigado ou Conglobamento por Institutos, pois o intérprete aplicará, no conjunto, cada um dos institutos jurídicos mais benéficos previstos na legislação. Acerca do tema, citam-se as lições de Maurício Godinho Delgado, in verbis: Em 2009, pela Lei n. 11.962 (Diário Oficial de 06.07.09) felizmente, eliminou-se a censurada diferenciação, ao se estenderem as regras da Lei n. 7.064/1982 a todos os trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviços no exterior (novo art. 1B da Lei n. 7.064, conforme redação conferida pela Lei n. 11.962/09). A extensão, como se percebe, atinge não somente os dispositivos regentes da transferência e retorno para o Brasil, mas também o próprio universo normativo regulador do contrato durante o período de permanência do obreiro no exterior. Nessa medida, o critério da territorialidade deixa de se aplicar às transferências de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no estrangeiro: tais contratos passam a se submeter à legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto na Lei n. 7.064/82, quando mais favorável do que a legislação territorial estrangeira, observado o conjunto de normas em relação a cada matéria (art. 3º, II, Lei n. 7.064). (DELGADO, Maurício Godinho. p. 241) À luz dos princípios da persuasão racional e da primazia da realidade constata-se que a reclamante comprovou ter sido recrutada, selecionada, treinada e contratada no Brasil para ativar-se a bordo de navios cruzeiros, tanto em navegação de cabotagem, como em águas internacionais, sendo aplicável a legislação brasileira, com esteio nos arts. 1º, caput; 2º, inciso III e 3º, inciso II, todos da Lei nº 7.064/1982, considerando que o referido diploma legal preconiza os princípios do centro de gravidade da relação jurídica, que tem como elemento de conexão ou de atração o local de constituição do contrato, e da norma mais favorável. Extrai-se dos artigos supracitados que, independentemente do princípio da territorialidade (lex loci executionis), deve-se observar a legislação brasileira quando se revelar mais favorável do que a norma do país da prestação de serviços. O contexto fático e probatório demonstrou que a obreira fora recrutada, selecionada, treinada e contratada no Brasil para ativar-se a bordo de navios cruzeiros, tanto em águas nacionais, como internacionais, por grupo econômico sediado no Brasil (MSC), e comprovado que a legislação pátria se revela mais benéfica, não restam dúvidas de que o ordenamento jurídico brasileiro regula o pacto laboral ora discutido, sobrepondo-se aos instrumentos normativos internacionais e títulos executivos extrajudiciais, a exemplo do TAC acostado aos autos, porque estes são mais prejudiciais na regulação do pacto laboral em análise. Outrossim, o art. 9º da LINDB dispõe que as obrigações serão regidas pela lei do país em que se constituírem, bem como o art. 435, do CC dita que é considerado celebrado o contrato no lugar em que fora proposto. Além do que a lei do pavilhão ou da bandeira, em seu caráter absoluto, está ontologicamente ligada a embarcações militares oficiais, com o escopo de resguardar a soberania da nação, e não a "bandeiras mercantes de conveniência", em que a bandeira do navio é distinta da nacionalidade do empregador, como é a hipótese de navios privados estrangeiros, que somente representarão prolongamento do território do país cuja bandeira ostentem, se navegarem em alto-mar, não sendo extensão do território do país de sua bandeira quando navegam em águas territoriais brasileiras. Destarte, a matéria em lide deve ser resolvida à luz da Lei nº 7.064/1982, cujo teor dispõe sobre a situação de trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviços no exterior, como é o caso da reclamante, contratada no Brasil para prestar serviços em navio cruzeiro em águas brasileiras e internacionais. Nesse panorama, imperioso concluir que, contratada a autora no Brasil, a relação de trabalho mantida entre as partes deve ser regida pela legislação brasileira, em homenagem aos princípios da norma mais favorável à empregada e do centro de gravidade da relação jurídica. Por outro lado, a Tese da Repercussão Geral nº 210 não modifica o panorama delineado, visto que tal decisão não tratou de matéria trabalhista. Sobre o tema, cito julgado do C. TST: I - AGRAVO DE INSTRUMENTO DA PARTE RECLAMADA. RECURSO DE REVISTA . LEI 13.015/2014. EMPREGADO CONTRATADO PARA PRESTAR SERVIÇO EM NAVIO DE CRUZEIRO INTERNACIONAL. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. Inicialmente registra-se que a Tese de Repercussão Geral 210 do STF trata de extravio de bagagem de passageiro , e não de direito do trabalho. Assim, não há falar em contrariedade à referida tese de repercussão geral. Na hipótese, depreende-se do acórdão recorrido que a reclamante, brasileira, foi contratada no Brasil para trabalhar como camareira em navio em temporada mista, para percorrer águas nacionais e internacionais. Assim, inafastável a aplicação da jurisdição nacional, consoante artigo 651, § 2º, da CLT. Acresça-se que, com o cancelamento da Súmula nº 207 do TST (Res. 181/2012, DEJT de 19, 20 e 23/4/2012), consolidou-se neste Tribunal o entendimento de que a Lei 7.064/1982 assegura ao empregado brasileiro que labora no exterior a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho sempre que ficar evidenciado ser essa mais favorável que a legislação territorial, nos termos do artigo 3º, inciso II, da Lei nº 7.064/82. Precedentes. Incidência do disposto na Súmula 333 do TST e no art. 896,§ 7º , da CLT . Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...) (RRAg-143-32.2017.5.09.0029, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 06/08/2021) Na mesma trilha é a jurisprudência deste Regional: RECURSO ADESIVO DAS RECLAMADAS. MARÍTIMO. TRABALHO EM CRUZEIRO. COMPETÊNCIA. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. Tratando-se de vínculo de emprego com execução em águas nacionais e internacionais e havendo tanto a contratação e quanto o início do labor ocorrido em águas brasileiras, considera-se competente a justiça brasileira para análise da questão, bem como aplicável ao caso a legislação nacional, por observância ao disposto no art. 3º, II, da Lei nº 7.064/1982, da qual se extrai o princípio do centro de gravidade da relação jurídica, considerando aplicável a norma mais favorável ao empregado e não a Lei do Pavilhão. Recurso a que se nega provimento. (...) (TRT 13ª Região - 2ª Turma - Recurso Ordinário Trabalhista nº 0000327-19.2017.5.13.0015, Redator(a): Desembargador(a) Edvaldo De Andrade, Julgamento: 02/09/2020, Publicação: DJe 03/09/2020) MARÍTIMO. CONTRATO DE EMPREGO CELEBRADO NO BRASIL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS A BORDO DE NAVIO DESTINADO A CRUZEIROS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. Tendo o reclamante sido selecionado e contratado em território nacional, para exercer o labor nos navios pertencentes ao grupo econômico em águas nacionais e internacionais, é aplicável a legislação brasileira, na forma do artigo 3º, inciso II, da Lei n. 7.064/1982, em respeito ao princípio da norma mais favorável e ao centro de gravidade, e não em obediência à Lei do Pavilhão. Recurso parcialmente provido, apenas para que seja determinada a dedução das horas extras comprovadamente pagas. (TRT 13ª Região - 2ª Turma - Recurso Ordinário Trabalhista nº 0000467-74.2018.5.13.0029, Redator(a): Desembargador(a) Francisco De Assis Carvalho E Silva, Julgamento: 16/10/2019, Publicação: DJe 22/10/2019) Doutra banda, a ratificação da Convenção nº 186 da OIT - que trata do trabalho marítimo, internalizada por meio do Decreto nº 10.671/2021, publicado em 12.04.2021, obrigando a República Federativa do Brasil, no plano jurídico internacional, a contar de 07.05.2021 - é irrelevante. Isso porque, o preâmbulo da mencionada norma internacional realça que, nos termos do artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, "de modo algum a adoção de qualquer Convenção ou Recomendação pela Conferência ou a ratificação de qualquer Convenção por qualquer Membro poderá afetar lei, decisão, costume ou acordo que assegure condições mais favoráveis aos trabalhadores do que as condições previstas pela Convenção ou Recomendação". Sobre o tema - ainda que em obter dictum, em decisão prolatada antes da internalização da Convenção nº 186 da OIT -, assim já se manifestou o C. TST: (...) COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL. LABOR EM NAVIO DE CRUZEIRO INTERNACIONAL. TRABALHO EM ÁGUAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. (...) 1 - Há transcendência jurídica quando se constata em exame preliminar a divergência entre Turmas do TST sobre a matéria. 2 - Inaplicável ao caso dos autos a tese firmada pelo STF em repercussão geral (Tema 210: "Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor" ), uma vez que se discutiu questão sobre indenização por danos morais por extravio de bagagens em voos internacionais, matéria distinta da examinada no presente caso. 3 - A jurisprudência majoritária do TST, quanto à hipótese de trabalhador brasileiro contratado para desenvolver suas atividades em navios estrangeiros em percursos em águas nacionais e internacionais, é de que nos termos do art. 3º, II, da Lei nº 7.064/82, aos trabalhadores nacionais contratados no País ou transferidos do País para trabalhar no exterior, aplica-se a legislação brasileira de proteção ao trabalho naquilo que não for incompatível com o diploma normativo especial, quando for mais favorável do que a legislação territorial estrangeira - sendo competente a Justiça do Trabalho para processar e julgar o feito. 4 - O Pleno do TST cancelou a Súmula nº 207 porque a tese de que "A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação" não espelhava a evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial sobre a matéria. E após o cancelamento da Súmula nº 207 do TST, a jurisprudência majoritária se encaminhou para a conclusão de que somente em princípio, à luz do Código de Bustamante, também conhecido como "Lei do Pavilhão" (Convenção de Direito Internacional Privado em vigor no Brasil desde a promulgação do Decreto nº 18.871/29), aplica-se às relações de trabalho desenvolvidas em alto mar a legislação do país de inscrição da embarcação. Isso porque, em decorrência da Teoria do Centro de Gravidade, ( most significant relationship ), as normas de Direito Internacional Privado deixam de ser aplicadas quando, observadas as circunstâncias do caso, verificar-se que a relação de trabalho apresenta uma ligação substancialmente mais forte com outro ordenamento jurídico. Trata-se da denominada "válvula de escape", segundo a qual impende ao juiz, para fins de aplicação da legislação brasileira, a análise de elementos tais como o local das etapas do recrutamento e da contratação e a ocorrência ou não de labor também em águas nacionais. 5 - Nos termos do art. 3º da Lei n° 7.064/1982, a antinomia aparente de normas de direito privado voltadas à aplicação do direito trabalhista deve ser resolvida pelo princípio da norma mais favorável, considerando o conjunto de princípios, regras e disposições que dizem respeito a cada matéria (teoria do conglobamento mitigado). 6 - Não se ignora a importância das normas de Direito Internacional oriundas da ONU e da OIT sobre os trabalhadores marítimos (a exemplo da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto n° 4.361/2002, e da Convenção n° 186 da OIT sobre Direito Marítimo - MLC, não ratificada pelo Brasil). Contudo, deve-se aplicar a legislação brasileira em observância a Teoria do Centro de Gravidade e ao princípio da norma mais favorável, que norteiam a solução jurídica quanto há concorrência entre normas no Direito Internacional Privado, na área trabalhista. Doutrina. 7 - Cumpre registrar que o próprio texto da Convenção n° 186 da OIT sobre Direito Marítimo - MLC, não ratificada pelo Brasil, esclarece que sua edição levou em conta "o parágrafo 8º do Artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, que determina que, de modo algum a adoção de qualquer Convenção ou Recomendação pela Conferência ou a ratificação de qualquer Convenção por qualquer Membro poderá afetar lei, decisão, costume ou acordo que assegure condições mais favoráveis aos trabalhadores do que as condições previstas pela Convenção ou Recomendação" . 8 - Não afronta o princípio da isonomia a aplicação da legislação brasileira mais favorável aos trabalhadores brasileiros e a aplicação de outra legislação aos trabalhadores estrangeiros no mesmo navio. Nesse caso há diferenciação entre trabalhadores baseada em critérios objetivos (regência legislativa distinta), e não discriminação fundada em critérios subjetivos oriundos de condições e/ou características pessoais dos trabalhadores. 9 - No caso, o TRT reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar ao presente feito ao registrar que "mesmo a pré-contratação (aliada a outros fatores) em território nacional viabilizaria a aplicação das regras trabalhistas ao contrato de trabalho, conforme linha jurisprudencial nesse sentido, tal como o julgado do C. TST supratranscrito. Além disso, as rés reconhecem em defesa que a embarcação passava tanto por águas brasileiras, como internacionais, o que traduz forte indício de que, durante todo o período, a autora prestou serviços em favor das reclamadas. Assim, porque a contratação se efetivou no Brasil, e, durante parte do pacto, as rotas efetuadas foram em território brasileiro, tem-se que a legislação aplicável é a CLT, sendo competente a Justiça do trabalho para o exame e julgamento dos pedidos. 10 - Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR-445-63.2015.5.09.0245, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 24/03/2023) (grifei) Na mesma linha de raciocínio é o magistério de Valério Mazzuoli: As lois de police são exemplificadas na doutrina jusprivatistas internacional exatamente com as leis trabalhistas, especialmente em razão de não se compreender como uma norma estrangeira possa melhor proteger um empregado contratado no Brasil, bem assim levando em conta que a nossa consolidação laboral é (em muitos casos, e especialmente neste) mais benéfica a tais empregados aqui contratados (MAZZUOLLI, 2019). Se compararmos as normas internacionais com as normas constitucionais e infraconstitucionais brasileiras relativas à proteção dos trabalhadores que exercem atividades em empresas estrangeiras de cruzeiro, nota-se nitidamente que as normas brasileiras - Constituição Federal e CLT - são mais favoráveis às regras internacionais potencialmente aplicáveis. (...) Relação da Convenção nº 186 da OIT com as normas brasileiras de proteção ao trabalhador No plano internacional, é a Convenção nº 186 da OIT (2006) - chamada de Maritime Labor Convention ou Convenção sobre Trabalho Marítimo - a responsável por regular o trabalho marítimo e estabelecer os princípios a ele aplicáveis. A Convenção nº 186 é norma de hard law e, uma vez em vigor no Estado, tem aplicabilidade direta no plano interno, devendo ser observada pelo Poder Judiciário local. O Brasil depositou, junto ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho, em 7 de maio de 2020, o instrumento de ratificação da Convenção sobre Trabalho Marítimo, tendo o seu texto sido promulgado internamente pelo Decreto nº 10.671, de 9 de abril de 2021. A Convenção entrou em vigou para a República Federativa do Brasil, no plano jurídico externo, em 7 de maio de 2021, nos termos de seu art. VIII, parágrafo 3º, segundo o qual "esta Convenção entrará em vigor 12 meses a contar da data em que houver sido registrada a ratificação por pelo menos 30 Membros, que em conjunto possuam no mínimo 33% da arqueação bruta da frota mundial"(BRASIL, 2021). A Convenção em tela pretende ser a grande carta laboral internacional do trabalho marítimo, pelo estabelecimento de um conjunto normativo sólido de direitos e princípios, visando especialmente à aplicação de norma única às relações de trabalho assim concebidas. A questão que se põe é saber quais impactos a Convenção sobre Trabalho Marítimo traz para o cenário justrabalhista brasileiro, bem assim quais conflitos normativos podem surgir entre as disposições da Convenção e as leis brasileiras aplicáveis à contratação de brasileiros para exercerem atividades em embarcações estrangeiras. De início, destaque-se que, já no preâmbulo da Convenção fica nítido o desejo Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho em criar um documento único e coerente que incorpore tanto quanto possível todas as normas atualizadas das Convenções e Recomendações internacionais existentes sobre Trabalho Marítimo, bem como princípios fundamentais de outras Convenções internacionais sobre trabalho, particularmente nas seguintes: a) a Convenção sobre o Trabalho Forçado, 1930 (nº 29); b) a Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Proteção do Direito Sindical, 1948 (nº 87); c) Convenção sobre o Direito de Sindicalização e de Negociação Coletiva, 1949 (nº 98); d) a Convenção sobre Igualdade de Remuneração, 1951 (nº 100); e) a Convenção sobre a Abolição do Trabalho Forçado, 1957 (nº 105); f) a Convenção sobre a Discriminação (Emprego e Profissão), 1958 (nº 111); g) a Convenção sobre a Idade Mínima, 1973 (nº 138); e h) a Convenção sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil, 1999 (nº 182). Tendo sido ratificada e estando em vigor no Brasil, Convenção referida obriga o Estado brasileiro em todos os seus termos, não obstante sua aplicabilidade encontrar-se limitada pela possibilidade de o Poder Judiciário aplicar tanto outras convenções internacionais do trabalho pertinentes (como a própria Constituição da OIT) quanto normas do direito interno brasileiro, tais a Constituição e a CLT, à luz do "diálogo das fontes" já referido e do princípio internacional pro homine. Esse entendimento vem expresso, como já se disse, no próprio preâmbulo da Convenção, ao relembrar "o parágrafo 8º do Artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho, que determina que, de modo algum a adoção de qualquer Convenção ou Recomendação pela Conferência ou a ratificação de qualquer Convenção por qualquer Membro poderá afetar lei, decisão, costume ou acordo que assegure condições mais favoráveis aos trabalhadores do que as condições previstas pela Convenção ou Recomendação" (BRASIL, 2021). A mesma ideia - aplicação da norma mais favorável aos trabalhadores - se repete em vários outros dispositivos da Convenção, que não excluem a aplicação de normas mais favoráveis para todo o texto do tratado (v.g., art. V, parágrafo 7º; Regra 4.5, parágrafo 1º; Diretriz B4.5, parágrafo 3º). (MAZZUOLI, Valério. In Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, Brasília, v. 26, n. 2, 2022. P. 96 e 104-105) Portanto, a competência para julgamento das pretensões é do Poder Judiciário brasileiro, bem como se aplica a legislação nacional. Sentença mantida quanto a tais temas." No tocante à competência da Justiça do Trabalho, o órgão julgador decidiu em conformidade com a jurisprudência do C. TST, no sentido de que, hipótese de empregado contratado no Brasil para prestar serviços a bordo de navio estrangeiro em águas nacionais e internacionais, a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar os conflitos trabalhistas. Nesse sentido, cito julgados de todas as Turmas do C. TST: Ag-AIRR-1000507-39.2021.5.02.0482, Relator Ministro: Amaury Rodrigues Pinto Junior, Data de Julgamento: 25/10/2023, 1ª Turma , Data de Publicação: DEJT 27/10/2023; Ag-AIRR-245-06.2019.5.07.0008, Relatora Ministra: Maria Helena Mallmann, Data de Julgamento: 29/11/2023, 2ª Turma , Data de Publicação: DEJT 01/12/2023; AIRR-1141-92.2018.5.07.0005, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 13/09/2023, 3ª Turma , Data de Publicação: DEJT 15/09/2023; Ag-RRAg-AIRR-1631-89.2015.5.07.0015, Relator Ministro: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 28/03/2023, 4ª Turma , Data de Publicação: DEJT 31/03/2023; Ag-RRAg-749-88.2021.5.13.0003, Relator Ministro: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 25/10/2023, 5ª Turma , Data de Publicação: DEJT 27/10/2023; Ag-AIRR-10646-29.2020.5.15.0001, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 04/10/2023, 6ª Turma , Data de Publicação: DEJT 06/10/2023; Ag-AIRR-1790-57.2014.5.07.0018, Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 25/10/2023, 7ª Turma , Data de Publicação: DEJT 03/11/2023 e Ag-ARR-1000257-31.2018.5.02.0443, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 05/12/2023, 8ª Turma , Data de Publicação: DEJT 18/12/2023. Quanto à legislação aplicável ao presente caso, o acórdão também está em consonância com a jurisprudência do C. TST. Vejamos: “(…) 2 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. EMPREGADO ARREGIMENTADO NO BRASIL. NAVIO DE CRUZEIRO INTERNACIONAL. LABOR EM ÁGUAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS. NORMA MAIS FAVORÁVEL. ART. 3º, II, DA LEI Nº 7.064/82. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. 2.1. Tendo em vista a finalidade precípua desta instância extraordinária na uniformização de teses jurídicas, a existência de entendimento sumulado ou representativo de iterativa e notória jurisprudência, em consonância com a decisão recorrida, configura impeditivo ao processamento do recurso de revista, por imperativo legal. 2.2. No caso dos autos, conforme consignado pelo Tribunal Regional, o reclamante foi recrutado no Brasil para trabalhar em navios que trafegam em águas nacionais e internacionais. O Tribunal Regional decidiu ser aplicável a legislação brasileira e afastou a incidência das regras de direito internacional privado (Lei do Pavilhão ou da Bandeira), em razão da aplicação do princípio da norma mais favorável. Ressaltou que não foi comprovado, nos autos, ser a lei estrangeira mais favorável. Ressaltou que não foi comprovado, nos autos, ser a lei estrangeira mais favorável. 2.3. Em recente julgado, em composição plena, a SBDI-1 desta Corte decidiu que deve ser aplicada a legislação trabalhista brasileira no conjunto de normas em relação a cada matéria, quando o empregado é contratado no Brasil para trabalhar em cruzeiro internacional, nos termos do art. 3º, II, da Lei nº 7.064/82 e da Convenção 186 da OIT, incorporada ao Direito Brasileiro pelo Decreto nº 10.671/2021. Precedentes. Estando a decisão regional em conformidade com a jurisprudência desta Corte, incide o óbice do art. 896, § 7º, da CLT. Mantém-se a decisão recorrida. Agravo conhecido e desprovido" (Ag-ARR-959-75.2017.5.13.0005, 5ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 14/04/2025). ‘RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. CONTRATAÇÃO NO BRASIL PARA LABORAR A BORDO DE NAVIO DE CRUZEIROS MARÍTIMOS NO BRASIL E NO EXTERIOR. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 3º DA LEI 7.064/1982. Debate-se acerca da aplicação da legislação brasileira, notadamente o artigo 3º da Lei 7.064/1982 ao contrato celebrado no Brasil para realização de trabalho a bordo de navio de cruzeiros marítimos tanto no Brasil como no exterior, isto é, prestação de serviços executada durante o percurso do cruzeiro em águas brasileiras e internacionais. Inicialmente, pontua-se que o caso dos autos não se assemelha àquele decidido pelo STF no julgamento do Tema 210 em repercussão geral acerca da ‘limitação de indenizações por danos decorrentes de extravio de bagagem com fundamento na Convenção de Varsóvia’, consoante se infere do precedente da 2ª Turma do STF, no ARE 1377979 AgR /PR - PARANÁ, Relator: Min. Roberto Barroso; bem como na Reclamação nº 36.850/DF, Relator: Min. Ricardo Lewandowski. Além de as Convenções de Varsóvia e de Montreal não concorrerem com regras de direitos humanos (nem disso cogitou o colendo STF), é válido lembrar, sob o autorizado escólio de André de Carvalho Ramos (in ‘Teoria Geral dos Direitos Humanos’), que ‘toda a exegese do Direito Internacional dos Direitos Humanos, consagrada pela jurisprudência internacional, tem como epicentro o princípio da interpretação pro homine, que impõe a necessidade de que a interpretação normativa seja feita sempre em prol da proteção dada aos indivíduos’. A própria Constituição da OIT, em no seu art. 19, item 8, estabelece que ‘[e]m caso algum, a adoção, pela Conferência, de uma convenção ou recomendação, ou a ratificação, por um Estado-Membro, de uma convenção, deverão ser consideradas como afetando qualquer lei, sentença, costumes ou acordos que assegurem aos trabalhadores interessados condições mais favoráveis que as previstas pela convenção ou recomendação’. A Convenção 186 da OIT, ao consolidar um conjunto de convenções e recomendações internacionais existentes sobre trabalho marítimo, relembra expressamente na sua introdução o teor do item 8 do artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho. No direito comparado, o princípio jurídico do centro de gravidade (most significant relationship), pormenorizado quanto à sua origem e conceituação em acórdão deste Tribunal no Proc. TST-AIRR-1653-58.2017.5.09.0004, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT de 17/12/2021), tem significativa importância ao caso, ao preconizar que as normas de Direito Internacional Privado deixam de ser aplicadas quando, observadas as circunstâncias do caso, verificar-se que a relação de trabalho apresenta uma ligação substancialmente mais forte com outro ordenamento jurídico. Nesse cenário, quanto à situação de trabalhador brasileiro contratado para desenvolver suas atividades em navios estrangeiros em percursos em águas nacionais e internacionais, a jurisprudência predominante desta Corte Superior entende que, nos termos do art. 3º, II, da Lei 7.064/1982, aos trabalhadores nacionais contratados no país ou transferidos do país para trabalhar no exterior, aplica-se a legislação brasileira de proteção ao trabalho naquilo que não for incompatível com o diploma normativo especial, quando for mais favorável do que a legislação territorial estrangeira. Nesse contexto, deve ser aplicado o art. 3º da Lei 7.064/1982, na esteira do entendimento majoritário desta Corte Superior acerca da matéria. Recurso de embargos conhecido e provido’ (E-RR-10614-63.2019.5.15.0064, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 07/12/2023). Diante disso, o seguimento do recurso resulta é obstado sob quaisquer alegações, consoante a disposição do art. 896, § 7º da CLT e entendimento cristalizado na Súmula n. 333 do TST, em razão dos quais não ensejam recurso de revista decisões superadas por iterativa, notória e atual jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho. Nego seguimento. CONCLUSÃO a) DENEGO seguimento ao recurso de revista. Publique-se. b) Não havendo a interposição de agravo de instrumento, certifique-se o trânsito em julgado e, ato contínuo, independentemente de nova conclusão, encaminhem-se os autos à Vara de origem. c) Interposto agravo de instrumento, independentemente de nova conclusão, notifique-se a parte agravada para, querendo, apresentar contrarrazões ao recurso de revista e contraminuta ao agravo de instrumento, no prazo de 08 dias. d) Decorrido o lapso temporal do contraditório, remetam-se os autos ao Tribunal Superior do Trabalho. GVP/MCR/RABWF JOAO PESSOA/PB, 23 de maio de 2025. RITA LEITE BRITO ROLIM Desembargador Federal do Trabalho
Intimado(s) / Citado(s)
- ALINE KYARA SOARES LINS
- MSC CRUZEIROS DO BRASIL LTDA.
- MSC CRUISES S.A.
- MSC MALTA SEAFARERS COMPANY LIMITED
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