Processo nº 1029138-49.2024.8.11.0041
ID: 295578181
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ESPECIALIZADA DO MEIO AMBIENTE
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 1029138-49.2024.8.11.0041
Data de Disponibilização:
11/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CAMILA PORFIRO GONCALVES
OAB/MT XXXXXX
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EDGAR CAMPOS DE AZEVEDO
OAB/MT XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA NÚCLEO DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA (NAE) SENTENÇA Processo nº 1029138-49.2024.811.0041 Autora: Rosana da Silva Requerido: ESTADO DE …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA NÚCLEO DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA (NAE) SENTENÇA Processo nº 1029138-49.2024.811.0041 Autora: Rosana da Silva Requerido: ESTADO DE MATO GROSSO Vistos, Cuida-se de Ação Anulatória de dois Autos de Infração nº 1086002324 e 0888004623 e de dois Termos de Embargo nº 1086002424 e 0888004723 c/c Pedido de Liminar proposta por Rosana da Silva em face do ESTADO DE MATO GROSSO, em que a autora defende a nulidade dos dois autos de infrações e a suspensão dos dois Termos de Embargos números 1086002424 e 0888004723 originados do Auto de Infração nº 0888004623 lavrado em 12/12/2023 por “Danificar 21,3307 Ha de vegetação nativa, objeto de especial preservação, sem autorização da autoridade ambiental competente” e do outro Auto de Infração nº 1086002324 lavrado em 05/04/2024 por “supostamente, destruir 3,6662 ha de vegetação nativa, objeto de especial preservação, sem autorização da autoridade ambiental competente”. Alega ser pequena produtora rural, residente e domiciliada na propriedade localizada na Gleba Japuranã, Distrito de Nova Bandeirantes/MT, com área total de 81,3598 hectares, registrada no SIMCAR nº MT-5106158-362B1DFE77EA4C57AFCDA4118055AD5C e que a propriedade corresponde a um único módulo fiscal, bem como que localizar em área de assentamento (Assentamento Trescinco, localizado e, Nova Bandeirantes/MT) e explorada mediante trabalho familiar para fins de subsistência. Sustenta que os referidos atos administrativos são ilegais, pois, a propriedade se enquadra como pequena propriedade rural trabalhada em regime de economia familiar, atraindo a proteção legal disposta no art. 16 do Decreto 6.514/2008, de 22.7.2008 que veda o embargo em caso de atividades de subsistência e que a imposição do embargo tem comprometido gravemente sua capacidade de subsistência, impedindo a circulação de mercadorias (pequenas produções), o acesso a crédito rural e a comercialização de sua produção pecuária (bovinos), bem como que o fundamento legal da autuação – destruição de vegetação “objeto de especial preservação” – careceria de definição normativa clara, configurando violação ao princípio da legalidade (art. 5º, II, da CF/88) e que a área embargada não apresenta as características de “floresta nativa” ou de vegetação protegida, tendo sido aberta desde 2014, conforme imagens de satélite e histórico de ocupação por terceiros (grileiros), objeto de ação de reintegração de posse (processo nº 1001034-62.2022.8.11.0091). Relata que a imagem utilizada pela SEMA, em que supostamente afirma que a área discutida era de “floresta fechada” não condiz com a realidade e que embora tenha sido usada no ano de 2022 se trata de imagem antiga, ou seja, de imagem anterior a 2014 quando a área foi aberta. Alternativamente, informa ter sido multada em 05.04.2024 por desmatar 3,6662 hectares, no valor de R$ 18.331,00 (dezoito mil e trezentos e trinta e um reais), sendo, R$ 5.000,00 (cinco mil reais por hectares desmatados) e ter sido multada ainda, em 12.12.2023, por supostamente desmatar 21,3307 hectares, no valor de R$ 106.653,50 (cento e seis mil e seiscentos e cinquenta e três reais e cinquenta centavos). Relata que, além disso, esta última multa (R$ 106.653,50 ) ainda foi majorada em 50% por suspostamente o fato ter sido consumado mediante uso fogo, totalizando R$ 159.980,25 (cento e cinquenta e nove mil e novecentos e oitenta reais e vinte e cinco centavos), bem assim, que a somatória das duas multas importou no valor total de R$ 178.311,25 (cento e setenta e oito mil e trezentos e onze reais e vinte e cinco centavos). Sustenta que os valores violam os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como da legalidade (artigo 6º da Lei 9.605/980) e defende, em pedido alternativo, a redução do valor total de R$ 178.311,25 (cento e setenta e oito mil e trezentos e onze reais e vinte e cinco centavos) para R$ 1.249,85 (mil e duzentos e quarenta e nove reais e oitenta e cinco centavos) sendo tomado por base R$ 50,00 reais por hectares desmatadas (21,3307 + 3,6662 = 24,9969). Ao final, pleiteia o deferimento da gratuidade da justiça e a concessão de tutela de urgência para obter a imediata suspensão dos dois termos de embargos números 1086002424 (3,6662 ha) e 0888004723 (21,3307 hectares, bem como o levantamento) e a imediata retirada do seu nome da lista de áreas embargadas. No mérito, pediu a procedência da ação e a anulação dos dois Autos de Infrações nº 0888004623 e nº 1086002324 e dois Termos de Embargos números 086002424 (3,6662 ha) e 0888004723 (21,3307 hectares). Alternativamente, defendeu a redução do valor da multa, de R$ 178.311,25 (cento e setenta e oito mil e trezentos e onze reais e vinte e cinco centavos) para o montante de R$ 1.249,85 (mil e duzentos e quarenta e nove reais e oitenta e cinco centavos) tendo por base R$ 50,00 reais por hectares desmatadas (21,3307 + 3,6662 = 24,9969) e a condenação do requerido ao pagamento de custas e honorários advocatícios. A autora deu à causa o valor der R$ 178.311,25 (cento e setenta e oito mil e trezentos e onze reais e vinte e cinco centavos) – id. 161847502. A petição inicial foi instruída com cópias dos Autos de Infrações e respectivos Relatórios Técnicos, be3m como dos dois Termos de Embargos, todos emitidos pela SEMA; Laudo Técnico elaborado a pedido a autora e cópia da Ação de Reintegração de Posse nº 1001034-62.2022.8.11.0091 proposta por Rosana da Silva em face de José Antonio Alves Candido e Juliano de Oliveira Gonçalves, contendo: mapa do assentamento e da sua localização/declaração da Associação e comprovante de energia. Em 15.7.2024 foi deferida a gratuidade da justiça para a autora (id. 162222600). Em 22.7.2024 o requerido Estado de Mato Grosso manifestou contra o pedido de tutela de urgência (id. 163076703). Foi deferido o pedido de tutela de urgência em 8.10.2024 (id. 171737517). Contestação no id. 176339776, tendo o Estado de Mato Grosso sustentado preliminar de falta de interesse de agir pelo fato do procedimento administrativo ainda não ter sido julgado pelo órgão ambiental. Alternativamente, defendeu a suspensão desta ação até a finalização do referido procedimento administrativo. No mérito, pediu a improcedência da ação. Em 28.11.2024 o Estado de Mato Grosso juntou cópia do processo administrativo (id. 176893507). Não houve apresentação de impugnação à contestação, tendo a autora deixado decorrer o prazo sem nada postular. Intimadas para especificar as provas que pretendiam produzir, ambas as partes deixaram decorrer o prazo e nada requereram. O Ministério Público manifestou pela improcedência da ação (id. 188193759). É o relatório. Decide-se. De início, passa-se ao julgamento antecipado do mérito, forte no artigo 355, inciso I do CPC, por tratar de análise de matéria que não necessita de dilação probatória, fato este que afasta eventual alegação de cerceamento de defesa ou violação ao princípio do contraditório, porquanto verifica a existência de elementos suficientes para embasar a convicção do julgador. Ademais, ambas as partes intimadas a especificar as provas que pretendia produzir deixaram decorrer o prazo sem nada requerer, o que significar dizer que renunciaram ao direito de produzir novas provas. Conforme já consignado, cuida-se de Ação Anulatória de dois Autos de Infração nº 1086002324 e 0888004623 e de dois Termos de Embargo nº 1086002424 e 0888004723 c/c Pedido de Liminar proposta por Rosana da Silva em face do ESTADO DE MATO GROSSO, em que a autora defende a nulidade dos dois Termos de Embargos números 1086002424 e 0888004723 originados do Auto de Infração nº 0888004623 lavrado em 12/12/2023 por “Danificar 21,3307 Ha de vegetação nativa, objeto de especial preservação, sem autorização da autoridade ambiental competente” e do outro Auto de Infração nº 1086002324 lavrado em 05/04/2024 por “supostamente, destruir 3,6662 ha de vegetação nativa, objeto de especial preservação, sem autorização da autoridade ambiental competente”. Na contestação, o requerido sustentou preliminar de falta de interesse de agir ou subsidiariamente a suspensão do processo. No mérito, defendeu a improcedência da ação (id. 1176339776). Passa-se, assim a análise da preliminar de falta de interesse de agir. Em que pese a alegação, não comporta acolhimento. Sucede que o fato do processo administrativo ainda não ter sido finalizado não retira o interesse para a propositura da ação judicial, notadamente por tratar de instâncias independentes (judicial e administrativa) e nem impõe suspensão do processo judicial. Neste sentido, veja a orientação da Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo do nosso Tribunal de Justiça: “PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA –AMBIENTAL – AUTO DE INFRAÇÃO LAVRADO PELO IBAMA – PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL, DE ILEGITIMIDADE ATIVA E DE INÉPCIA DA INICIAL – REJEITADAS – DANO AMBIENTAL – DESMATAMENTO NA ÁREA DA FLORESTA AMAZÔNICA – COMPROVAÇÃO – FISCALIZAÇÃO PELO IBAMA – AUTO DE INFRAÇÃO – PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DEVER DE RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA – DANO MORAL COLETIVO – NÃO OCORRÊNCIA – PROVIMENTO PARCIAL. A conduta praticada pelo recorrente não atinge bem ou interesse da autarquia federal (IBAMA), não incorrendo nas hipóteses previstas no artigo 109, I, da Constituição da República Federativa do Brasil. Logo, compete à Justiça estadual o processamento e o julgamento da ação civil de reparação do dano ambiental, consistente no desmatamento em área de floresta amazônica. Não há falar em ilegitimidade passiva, se não há provas robustas de que a parte não praticou a lesão ambiental. A petição inicial não é inepta, por ausência de interesse de agir, visto que a pendência de julgamento de processo administrativo não obsta a propositura de ação, ante a independência existente entre as instâncias administrativa e judicial, bem assim porque não comprovou a inexistência do dano ambiental. A responsabilidade civil pela degradação do meio ambiente independe de qualquer consideração subjetiva, a respeito do causador do dano, pois é regra assente que os danos causados ao meio ambiente acarretam responsabilidade objetiva, ou seja, sem análise de culpa por parte do agente. Comprovada a ocorrência de desmatamento, sem autorização do órgão competente, deve ser mantida a sentença que determinou a recuperação da área degradada. A condenação do Requerido ao pagamento de indenização, a título de dano moral coletivo, exige a demonstração de que a infração ambiental causou repulsa a toda a coletividade. Em vista de o dano ambiental não ultrapassar o limite do tolerável para a coletividade, deve ser afastada a tese de ocorrência do dano moral coletivo. (N.U 1000629-06.2017.8.11.0025, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARCIO VIDAL, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 24/10/2022, Publicado no DJE 01/11/2022).” (g.n.). A não finalização do processo administrativo também não impõe a pretendida suspensão deste processo. Aliás, não se verifica nenhuma das hipóteses de suspensão de processo enumeradas no art. 313 do CPC. Assim, rejeita-se a preliminar de falta de interesse de agir e o pedido subsidiário de suspensão deste processo. No mérito, tem-se que a prova revela que a autora foi autuada duas vezes pela SEMA, conforme o Auto de Infração nº 0888004623 lavrado em 12/12/2023 por “Danificar 21,3307 Ha de vegetação nativa, objeto de especial preservação, sem autorização da autoridade ambiental competente” e o outro Auto de Infração nº 1086002324 lavrado em 05/04/2024 por “supostamente, destruir 3,6662 ha de vegetação nativa, objeto de especial preservação, sem autorização da autoridade ambiental competente”, tendo sido lavrado ainda dois Termos de Embargos números 1086002424 e 0888004723 das áreas degradadas e também aplicado multa no valor total de R$ 178.311,25 (cento e setenta e oito mil e trezentos e onze reais e vinte e cinco centavos), sendo R$ 18.331,00 (dezoito mil e trezentos e trinta e um reais) pelo desmate de 3,6662 hectares e R$ 106.653,50 (cento e seis mil e seiscentos e cinquenta e três reais e cinquenta centavos) pelo desmate de 21,3307 hectares, cujo último valor (R$ 106.653,50 ) foi acrescido de 50% pelo fato ter sido consumado com uso de fogo, totalizando, assim, a última multa em R$ 159.980,25 (cento e cinquenta e nove mil e novecentos e oitenta reais e vinte e cinco centavos). O total das áreas autuadas/embargadas é de 24,996 hectares e foram embargadas todas as atividades existentes na área eventual e irregularmente desmatada. Conforme a prova não desconstituída o imóvel rural tem 81,3598 hectares. No que diz respeito os autos de infrações e ao valor da multa, tem-se que, a princípio, estão amparadas em documentos que demonstram, em tese, as irregularidades neles apontadas, e em previsão legal, respectivamente. Registra-se que os dois Autos de Infrações e os respectivos dois Relatórios Técnicos consignam que além do monitoramento por imagens também foi feita visita in loco e tiradas fotografias, tendo sido constatado, como neles registrado, a degradação ambiental decorrente do desmate em vegetação nativa, inclusive, mediante uso de fogo, sem autorização do órgão competente. Logo, quanto a estes dois aspectos, ou seja, invalidade dos autos de autuações e discussão sobre o valor da multa, não comportam acolhimento, porquanto estão amparados em documentos que, a princípio, atestam suas regularidades, e em previsão legal, respectivamente. Observa-se que, em que pese a alegação de que para o arbitramento da multa o órgão ambiental tinha que tomar por base apenas o valor de R$ 50,00 (cinquenta reais) por hectares desmatadas, tem-se que o arbitramento teve por fundamento a regra do art. 50 do Decreto Federal nº 6.514/08, que dispõe: “Art. 50. Destruir ou danificar florestas ou qualquer tipo de vegetação nativa ou de espécies nativas plantadas, objeto de especial preservação, sem autorização ou licença da autoridade ambiental competente: Multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por hectare ou fração.”. E o fato de tratar de pequena propriedade rural destinada a subsistência não impede, por si só, a autuação e aplicação de sanções decorrentes de eventual degradação ambiental, embora com limitações. Sobre o assunto: “DIREITO AMBIENTAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESMATAMENTO DE VEGETAÇÃO NATIVA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. INFRAÇÃO AMBIENTAL. PEQUENO PRODUTOR RURAL. EMBARGO DE ÁREA. ATIVIDADE DE SUBSISTÊNCIA. SUSPENSÃO DO EMBARGO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. O recurso trata de Agravo de Instrumento interposto pelo Estado de Mato Grosso contra decisão que acolheu embargos de declaração e deferiu tutela de urgência, determinando a suspensão do termo de embargo sobre imóvel rural da agravada, localizado em área de preservação permanente, para possibilitar a continuidade da atividade rural até o julgamento de mérito. II. Questão em discussão 2.A questão principal é verificar se a atividade desenvolvida pela recorrida caracteriza-se como de subsistência, enquadrada no regime de economia familiar, de modo a justificar a suspensão do embargo ambiental sobre a área autuada. III. Razões de decidir 3. O imóvel da recorrida está inserido em assentamento rural, com certificado do INCRA e enquadramento no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), evidenciando a prática de agricultura familiar em regime de economia de subsistência. 4. A legislação (Decreto n . 6.514/2008, art. 16) isenta atividades de subsistência do embargo em áreas irregularmente desmatadas, quando comprovada a pequena propriedade rural e a finalidade da produção. 5. Constatou-se que a agravada se enquadra como agricultora familiar, cumprindo os requisitos legais. Embora isso não afaste outras penalidades, como multas, a suspensão do embargo da área é medida justa diante da relevância da subsistência e da reversibilidade do embargo. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "A atividade de subsistência realizada em pequena propriedade rural, inserida em projeto de assentamento e devidamente certificada como agricultura familiar, é isenta de embargo ambiental, conforme o art. 16 do Decreto n. 6 .514/2008. Dispositivos relevantes citados: Decreto n. 6.514/2008, art . 16; Lei n. 11.326/2006, art. 3º . Jurisprudência relevante citada: STF, RE 567.985, Rel. Min. Gilmar Mendes, j . 18/04/2013.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 10166898520248110000, Relator.: ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 26/11/2024, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 03/12/2024).” (g.n.). Aliás, o laudo técnico apresentado pela autora (id. 161849157, p. 8) relata que os Embargos/Interdição ocorreram em parte de área consolidada, o que não afastou totalmente, assim, a informação posta nos autos de infrações e relatórios de que a degradação aconteceu, em área onde não deveria ter ocorrido. Veja o fragmento do citado laudo técnico apresentado pela autora (id. 161849157, p. 8): “Como exposto, há sobreposição do embargo com a Uso Consolidado de 8,644 hectares, ou seja, parte do embargo está contida em área apta a uso, julgo pela consolidação da área.” E saber se a degradação ocorreu ou não sobre vegetação nativa, como relatado pelo órgão ambiental e questionado pela autora, e ainda, se o valor da multa há quer diminuído, são questões que demandavam a instrução do processo, que não ocorreu em razão da falta de interesse de ambas as partes na produção de outras provas. Ainda que o laudo técnico apresentado pela autora relate que a área já estava aberta em 2014 por grileiros para fins de pecuária, e que a área embargada não tem característica de floresta, tem-se que este documento não se mostrou suficiente para comprovar a alegação da autora. E neste sentido, ou seja, no caso de alegação de não ter ocorrido degradação sobre vegetação nativa e de falta desta comprovação, veja a orientação do e. Tribunal de Justiça Estadual: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – AUTUAÇÃO PELO IMBAMA POR DESMATE DE VEGETAÇÃO NATIVA SEM AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO AMBIENTAL E SEM LICENÇA AMBIENTAL – DANO AMBIENTAL – RESPONSABILIDADE OBJETIVA CONSAGRADA – DECISÃO DO COLENDO STJ SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS – ALEGAÇÃO DE QUE NÃO SE TRATAVA DE MATA NATIVA MAS DE LIMPEZA DE PASTOS – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO – TRANSFERÊNCIA DE POSSE A TERCEIROS APÓS A PROLAÇÃO DA SENTENÇA – IRRELEVÂNCIA – SUPOSTA REGULARIZAÇÃO ATUAL NÃO EVIDENCIADA – PEQUENA PROPRIEDADE – ART. 67 DA LEI 12651/2012 - DESMATE CONSTATADO DO ANO DE 2010 – NÃO DEMONSTRAÇÃO DE QUE O DESMATE OCORREU ANTES DE 22/7/2008 – RECURSO DESPROVIDO – SENTENÇA MANTIDA. Em se tratando de dano ambiental, a responsabilidade é objetiva, conforme entendimento pacificado, inclusive tema de recurso repetitivo pelo Colendo STJ. “ ... 1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar;...” (REsp 1374284/MG, , julgado em 27/08/2014, DJe 05/09/2014) A alegação de que não se tratou de retirada de vegetação nativa, mas de limpeza de pastos é desprovida de qualquer elemento probatório. A transferência da posse do imóvel a terceiros após a prolação da sentença não tem o condão de tornar impossível o cumprimento dela. A inscrição no CAR não comprova a recomposição da área desmatada. A pequena propriedade rural a que se refere o art. 67 da Lei 12651/2012, é amparada por referido artigo quanto à reserva legal e a presente ação trata de desmate constatado em 2010, sem prévia autorização. (TJ-MT - Apelação: 0000522-27.2011.8 .11.0077, Relator.: VANDYMARA G. R. P . ZANOLO, Data de Julgamento: 10/10/2016, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Data de Publicação: 17/10/2016).” (g.n.). Independentemente da arguição de ainda não se ter estabelecido regime jurídico próprio ou objeto de especial preservação à Floresta Amazônica, este fato também não retira a obrigação de reparação dos danos constatados pelo órgão ambiental, notadamente se ocorridos em vegetação nativa como relatado pelos autos de autuações, relatórios técnicos e visita in loco, que não foram desqualificados. Logo, a alegação desprovida de efetiva comprovação não tem o condão de afastar a presunção de legitimidade dos autos de infrações. E era ônus da autora, nos termos do art. 373, I, do CPC, demonstrar os fatos constitutivos de seu direito quanto aos pedidos de nulidade dos dois autos de infração/diminuição da multa e a omissão importa suportar os ônus dela decorrentes. Todavia, quanto ao pedido de suspensão dos Embargos/Interdições, importante registrar que é certo que o dano ambiental, em razão de sua complexidade e necessidade de proteção urgente, desafia a aplicação de medidas cautelares, inclusive, severas, conforme prescreve o art. 225, §3º, da Constituição Federal, que estabelece que condutas lesivas ao meio ambiente sujeitam os infratores a sanções penais e administrativas, sendo estas previstas na Lei Federal 9.605/1998 (dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências) e inclui, dentre as sanções, a possibilidade de embargo de obras ou atividades (art. 72, VII e IX). No âmbito do Estado de Mato Grosso, a Lei Complementar Estadual n. 232/2006, que altera o “Código Estadual do Meio Ambiente, e dá outras providências”, também estabelece em seu art. 102, dentre outras sanções às infrações administrativas, o embargo de obra e atividade (VII) e a suspensão parcial ou total de atividades (IX). Entretanto, mostra-se de relevo anotar que o Código Florestal (Lei 12.651/2012) ao tratar de infrações ambientais e da atividade de subsistência familiar, também dispõe sobre a pequena propriedade ou posse rural familiar e sobre a imposição de embargo ambiental em área de subsistência, conforme se vê do art. 3º, V, e art. 51, §º, que prescrevem: “Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: [...]. V - pequena propriedade ou posse rural familiar: aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentos e projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art. 3º da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006;” (g.n.). “Art. 51. O órgão ambiental competente, ao tomar conhecimento do desmatamento em desacordo com o disposto nesta Lei, deverá embargar a obra ou atividade que deu causa ao uso alternativo do solo, como medida administrativa voltada a impedir a continuidade do dano ambiental, propiciar a regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da área degradada. §1º O embargo restringe-se aos locais onde efetivamente ocorreu o desmatamento ilegal, não alcançando as atividades de subsistência ou as demais atividades realizadas no imóvel não relacionadas com a infração. (g.n.). Também o Decreto Federal n. 6.514/2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências, em seu art. 16, excetua expressamente as atividades de subsistência do embargo. Veja: Veja o disposto no citado art. 16. do Decreto n. 6.514/2008: “No caso de áreas irregularmente desmatadas ou queimadas, o agente autuante embargará quaisquer obras ou atividades nelas localizadas ou desenvolvidas, excetuando as atividades de subsistência.” (g.n.). Desta feita, tem-se que a política ambiental nacional visou à manutenção do sustento familiar em relativização a proteção ao meio ambiente, sendo necessário, entretanto, comprovar o exercício dessa atividade. E a prova revela que a área de propriedade da autora, denominada Sitio Água Viva inscrita no INCRA com o nº 387, se refere a área do Assentamento localizado na Gleba Japuranã, Distrito de Nova Bandeirantes/MT, com área total de 81,3598 hectares, registrada no SIMCAR nº MT-5106158-362B1DFE77EA4C57AFCDA4118055AD5C que a propriedade corresponde a um único módulo fiscal (0,81). A Declaração de Regularidade Ocupacional firmada pelo INCRA comprova que a autora é agricultora e assentada na área denominada Sitio Agua Viva desde o ano de 2006, localizado no Município de Nova Ubiratã (MT) destinado à reforma agrária (id. 161847522). Assim, tem-se que a autora enquadra no conceito de agricultora familiar previsto no art. 3º da Lei n. 11.326, de 24 de julho de 2006, que estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais e dispõe: “Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; (Redação dada pela Lei nº 12.512, de 2011). IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. § 1º O disposto no inciso I do caput deste artigo não se aplica quando se tratar de condomínio rural ou outras formas coletivas de propriedade, desde que a fração ideal por proprietário não ultrapasse 4 (quatro) módulos fiscais. § 2º São também beneficiários desta Lei: I - silvicultores que atendam simultaneamente a todos os requisitos de que trata o caput deste artigo, cultivem florestas nativas ou exóticas e que promovam o manejo sustentável daqueles ambientes; II - aquicultores que atendam simultaneamente a todos os requisitos de que trata o caput deste artigo e explorem reservatórios hídricos com superfície total de até 2ha (dois hectares) ou ocupem até 500m³ (quinhentos metros cúbicos) de água, quando a exploração se efetivar em tanques-rede; III - extrativistas que atendam simultaneamente aos requisitos previstos nos incisos II, III e IV do caput deste artigo e exerçam essa atividade artesanalmente no meio rural, excluídos os garimpeiros e faiscadores; IV - pescadores que atendam simultaneamente aos requisitos previstos nos incisos I, II, III e IV do caput deste artigo e exerçam a atividade pesqueira artesanalmente. V - povos indígenas que atendam simultaneamente aos requisitos previstos nos incisos II, III e IV do caput do art. 3º; (Incluído pela Lei nº 12.512, de 2011). VI - integrantes de comunidades remanescentes de quilombos rurais e demais povos e comunidades tradicionais que atendam simultaneamente aos incisos II, III e IV do caput do art. 3º . (Incluído pela Lei nº 12.512, de 2011). § 3º O Conselho Monetário Nacional - CMN pode estabelecer critérios e condições adicionais de enquadramento para fins de acesso às linhas de crédito destinadas aos agricultores familiares, de forma a contemplar as especificidades dos seus diferentes segmentos. (Incluído pela Lei nº 12.058, de 2009) § 4º Podem ser criadas linhas de crédito destinadas às cooperativas e associações que atendam a percentuais mínimos de agricultores familiares em seu quadro de cooperados ou associados e de matéria-prima beneficiada, processada ou comercializada oriunda desses agricultores, conforme disposto pelo CMN. (Incluído pela Lei nº 12.058, de 2009).” (g.n.). De mais a mais, a alegação de tratar de pequena propriedade rural destinada exclusivamente para a subsistência familiar também não foi desconstituída pelo requerido, que, inclusive, não quis produzir provas. E nestes casos de pequena propriedade rural destinada à subsistência a orientação do e. Tribunal de Justiça Estadual é no sentido de que a “A suspensão do Termo de Embargo que impede atividades agrícolas de subsistência em pequena propriedade rural é medida que se justifica para garantir o direito ao trabalho e à dignidade da pessoa humana, fundamentos constitucionais que se sobrepõem à mera aplicação formal de sanções ambientais” e de que “A interdição de atividades produtivas em propriedades rurais destinadas à subsistência familiar deve ser precedida de adequada instrução probatória e ampla defesa, conforme estabelece a legislação ambiental e agrária.”, conforme ementa lançada no Agravo de Instrumento nº 1005388-44.2024.8.11.0000, julgado em 18.9.2024 pela e. Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, ora transcrita: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA – PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR – REJEIÇÃO – PROCESSO ADMINISTRATIVO NÃO FINALIZADO – ACESSO AO JUDICIÁRIO – LEGITIMIDADE – SUSPENSÃO DE TERMO DE EMBARGO – AGRICULTURA FAMILIAR – ATIVIDADE DE SUBSISTÊNCIA – PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL – FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE – PERICULUM IN MORA INVERSO – DECISÃO MANTIDA. 1 - O interesse de agir não está condicionado ao esgotamento da via administrativa, especialmente quando os atos administrativos impugnados causam prejuízo imediato e irreparável à subsistência da parte agravada. 2 - A suspensão do Termo de Embargo que impede atividades agrícolas de subsistência em pequena propriedade rural é medida que se justifica para garantir o direito ao trabalho e à dignidade da pessoa humana, fundamentos constitucionais que se sobrepõem à mera aplicação formal de sanções ambientais. 3 - A interdição de atividades produtivas em propriedades rurais destinadas à subsistência familiar deve ser precedida de adequada instrução probatória e ampla defesa, conforme estabelece a legislação ambiental e agrária. 4 - O risco de periculum in mora inverso justifica a manutenção da decisão que suspendeu o embargo, evitando danos irreparáveis à parte agravada, especialmente considerando a reversibilidade da medida. (N.U 1005388-44.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA APARECIDA RIBEIRO, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 18/09/2024, Publicado no DJE 26/09/2024).” (g.n.). No mesmo entendimento, de ser inadmissível a imposição de embargo/interdição quando se tratar de pequena propriedade rural destinada a subsistência familiar, veja outros julgados do nosso e. Tribunal de Justiça: “AGRAVO DE INSTRUMENTO — AÇÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO SANCIONATÓRIO — PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE NOVA UBIRATà — REJEITADA. IMPOSIÇÃO DE EMBARGO/INTERDIÇÃO DA ÁREA DEGRADADA — ATIVIDADE DE SUBSISTÊNCIA FAMILIAR — COMPROVAÇÃO — ARTIGO 16, CABEÇA, PARTE FINAL, DO DECRETO Nº 6.514, DE 22 DE JULHO DE 2008 — OBSERVÂNCIA — ÍNDICIOS SUFICIENTES DA EXISTÊNCIA DE IRREGULARIDADE NO PROCESSO ADMINISTRATIVO AMBIENTAL — SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO NÃO TRIBUTÁRIO — DEFERIMENTO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA — POSSIBILIDADE. A Vara Especializada do Meio Ambiente com sede na Capital tem competência territorial nas Comarcas de Cuiabá, Várzea Grande e Santo Antônio de Leverger, nos termos do artigo 1º da Resolução nº 3, de 29 de setembro de 2016, do Tribunal Pleno deste Tribunal, de modo a afastar a preliminar de incompetência absoluta do Juízo da Vara Única da Comarca de Nova Ubiratã para processar e julgar a demanda. Presentes indícios suficientes da existência de irregularidade na notificação do infrator no processo administrativo ambiental, com demonstração do prejuízo decorrente do cerceamento de defesa, bem como que a atividade desenvolvida por ele é de subsistência familiar, a que se refere o artigo 16, cabeça, do Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, possível o deferimento de tutela provisória de urgência consistente na suspensão da exigibilidade do crédito da Fazenda Pública e do termo de embargo/interdição da área degradada. Recurso não provido. (Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Recurso de Agravo de Instrumento nº. 1000098-82.2023.8.11.0000, Relator Desembargador Luiz Carlos da Costa, julgado em 18-7-2023, publicado em 1º-8-2023).” (g.n.). No mesmo norte: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ANULATÓRIA – MATÉRIA AMBIENTAL – COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA 2ª VARA DA COMARCA DE COMODORO (MT) – PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA REJEITADA – DESMATAMENTO SEM AUTORIZAÇÃO – EMBARGO DE OBRA OU ATIVIDADE – ART. 16 DO DECRETO N. 6.514/2008 – EXCEÇÃO PARA ATIVIDADES DE SUBSISTÊNCIA – CONFIGURAÇÃO DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL FAMILIAR – DECISÃO LIMINAR CONCEDIDA PELO JUÍZO A QUO – MANUTENÇÃO – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A Resolução TJ-MT/OE n. 02/2019 não confere competência à Vara Especializada de Meio Ambiente da Comarca de Cuiabá (MT) para julgar questões ambientais fora de sua jurisdição territorial específica, restringindo-se às Comarcas de Cuiabá, Várzea Grande e Santo Antônio de Leverger. 2. O desmatamento sem autorização do órgão ambiental competente constitui infração administrativa que pode legitimar a lavratura de auto de infração e a imposição de embargo. Contudo, a legislação ambiental (Decreto n. 6.514/2008, art. 16) e o Código Florestal (Lei n. 12.651/2012, art. 3º, V e art. 51, §1º) estabelecem exceção ao embargo para atividades de subsistência familiar em pequenas propriedades rurais. 3. Deve ser mantida a decisão do juízo de origem que, em análise sumária própria da fase processual, constatou a probabilidade do direito da parte agravada, determinando a suspensão do embargo. 4. Recurso não provido. (N.U 1009903-25.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 14/08/2024, Publicado no DJE 19/08/2024).” (g.n.). Veja ainda, o fragmento da recente decisão que, em caso análogo, desproveu o Agravo de Instrumento nº 1003857-83.2025.811.0000 julgado monocraticamente pelo Des. Mario Roberto Kono de Oliveira em 17.2.2025 e concluiu pela impossibilidade de embargo sobre pequena propriedade rural destinada a subsistência familiar: “DECIDO. Como se sabe, em sede de agravo de instrumento cumpre tão somente analisar se houve acerto ou desacerto na decisão atacada, e se estão presentes ou não os requisitos necessários para a concessão da medida pretendida, de forma que resta inviabilizada a incursão em matéria não analisada na decisão agravada, sob pena de configurar supressão de instância. Da decisão agravada, em apertada síntese, restou deliberado que: “[...] A pretensão posta na tutela – a possibilidade de suspensão dos efeitos do Termo de Embargo n. 1095032124 – deve ser analisada, inicialmente, sob o prisma do Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), que, por sua vez, dispõe sobre a pequena propriedade ou posse rural familiar, assim como sobre a imposição de embargo ambiental: Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: [...] V - pequena propriedade ou posse rural familiar: aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural, incluindo os assentamentos e projetos de reforma agrária, e que atenda ao disposto no art. 3º da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006; [...] Art. 51. O órgão ambiental competente, ao tomar conhecimento do desmatamento em desacordo com o disposto nesta Lei, deverá embargar a obra ou atividade que deu causa ao uso alternativo do solo, como medida administrativa voltada a impedir a continuidade do dano ambiental, propiciar a regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da área degradada. § 1º O embargo restringe-se aos locais onde efetivamente ocorreu o desmatamento ilegal, não alcançando as atividades de subsistência ou as demais atividades realizadas no imóvel não relacionadas com a infração. [sem destaque no original] Dispõe o art. 3º da Lei nº 11.326, de julho de 2006: “Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; (Redação dada pela Lei nº 12.512, de 2011) IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.” Por sua vez, a Lei 11.329/2006 (Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais), mencionada no art. 3, inciso V, do Código Florestal, dispõe que se considera agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, que regulamentada pelo Decreto 9.064/2017 (trata das questões de Reforma Agrária), estabelece alguns requisitos que devem ser, simultaneamente, atendidos para a caracterização da Unidade Familiar de Produção Agrária – UFPA: Art. 3º A UFPA e o empreendimento familiar rural deverão atender aos seguintes requisitos: I - possuir, a qualquer título, área de até quatro módulos fiscais; II - utilizar, no mínimo, metade da força de trabalho familiar no processo produtivo e de geração de renda; III - auferir, no mínimo, metade da renda familiar de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; e IV - ser a gestão do estabelecimento ou do empreendimento estritamente familiar. § 1º O disposto no inciso I do caput não se aplica à UFPA e ao empreendimento familiar rural compostos por extrativistas, pescadores, povos indígenas, integrantes de comunidades remanescentes de quilombos e demais comunidades tradicionais. § 2º Na hipótese de pescadores artesanais, de aquicultores, de maricultores e de extrativistas que desenvolvam tais atividades não combinadas com produção agropecuária, para fins do cumprimento do inciso I do caput, a área do estabelecimento será considerada igual a zero. [sem destaque no original] Sobre o tema, igualmente dispõe o art. 16, do Decreto n. 6.514/2008 que: Art. 16. No caso de áreas irregularmente desmatadas ou queimadas, o agente autuante embargará quaisquer obras ou atividades nelas localizadas ou desenvolvidas, excetuando as atividades de subsistência. [sem destaque no original] Logo, vê-se que a política ambiental nacional visou à manutenção do sustento familiar em relativização a proteção ao meio ambiente, sendo necessário, entretanto, comprovar o exercício dessa atividade. Com efeito, em uma análise sumária própria desta fase processual, os documentos atrelados a inicial demonstram a boa aparência do direito da parte requerente e a razoabilidade de sua pretensão a uma medida de urgência, destinada ao imediato atendimento de seu pedido liminar. Conforme o Auto de Infração n. 1095032124 e Termo de Embargo n. 1095032224, ambos lavrados em 03/07/2024 (Id. 177375710 - Pág. 1 a 3), o impetrante foi autuado pela suposta conduta de “destruir, através de desmatamento a corte raso, 16,78 hectares de vegetação nativa em área objeto de especial preservação, sem autorização do órgão ambiental competente” em sua propriedade rural Estancia Três Corações, localizada no Município de Terra Nova do Norte (MT). Ao perquirir a existência dos requisitos para o enquadramento legal da área/atividade embargada em atividade de subsistência familiar, infere-se que a área do imóvel rural possui 72.7562 ha, consoante consta no Auto de Infração n. 1095032124 e Termo de Embargo n. 1095032224 (Id. 177375710 - Pág. 1 a 3), dimensão essa que está enquadrada em um módulo fiscal para o Município de Terra Nova do Norte (MT), de acordo com o INCRA (https://pro-pgt-incra.estaleiro.serpro.gov.br/pgt/indices-basicos). Além disso, consta dos autos a Declaração de Aptidão do PRONAF (Id. 177375702), a Matrícula do Imóvel (Id. 177375700) e o Título de Domínio, sob Condição Resolutiva (Id. 177375699), sendo o acervo probatório que dá suporte ao pedido liminar, mormente por demonstrar, de plano, que a parte requerente se enquadra como agricultora e empreendedora apta a explorar atividade rural em regime de economia familiar/subsistência (art. 3º, da Lei n. 11.236/06). Portanto, não obstante o desrespeito às normas aplicáveis à supressão de vegetação nativa em área objeto de especial preservação, sem autorização do órgão ambiental competente, configurar infração administrativa, legitimando, a princípio, a lavratura dos Autos de Infração, não se mostra admissível à imposição de embargo/interdição da área autuada. Por fim, não se verifica o periculum in mora inverso haja vista que a medida é perfeitamente reversível se julgada improcedente ao final.” Infere-se da decisão agravada que, o juízo de origem considerou que a área em que os ilícitos ambientais supostamente ocorreram trata-se de área para fins de agricultura familiar, conceituada no artigo 3º, da Lei n. 11.326/06. Veja-se: “Art. 3º Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III – tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família.” Nesse sentido, estando o imóvel da parte Agravada enquadrado no conceito de agricultor familiar, este não haveria de ser embargado, conforme preleciona o artigo 16, da Lei n. 6.514/2008, como cito: “Art. 16. No caso de áreas irregularmente desmatadas ou queimadas, o agente autuante embargará quaisquer obras ou atividades nelas localizadas ou desenvolvidas, excetuando as atividades de subsistência.” A propósito: “ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. COMPROVAÇÃO. IBAMA. AUTO DE INFRAÇÃO E TERMO DE EMBARGO. ANULAÇÃO. ÁREA DESMATADA. ÁREA DE SUBSITÊNCIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Remessa oficial e apelação interposta pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, contra sentença que concedeu parcialmente a segurança, para determinar à autoridade impetrada o levantamento do Termo de Embargo n. 627283-E. 2. O mandamus enseja a apresentação de prova pré-constituída do fato que demonstre o direito líquido e certo invocado pelo impetrante, para deixar evidente a violação em vista da impossibilidade de dilação probatória. Precedentes (STJ - MS: 18483 DF 2012/0091973-2, Relator: Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Data de Julgamento: 12/06/2013, SI - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 28/06/2013) 3. Reza o art. 16 do Decreto n. 6.514/2008: "No caso de áreas irregularmente desmatadas ou queimadas, o agente atuante embargará quaisquer obras ou atividades nelas localizadas ou desenvolvidas, excetuando as atividades de subsistência". 4. No caso, do conjunto probatório trazido aos autos, evidencia-se que a propriedade rural embargada, realmente é destinada para a subsistência do apelado e de sua família, haja vista declaração emitida pela Empresa Mato-Grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural S/A. 5. Não pode o IBAMA tolher o direito de subsistência do apelado e da sua família, ante a constatação de destruição de sete hectares de vegetação nativa de bioma amazônico. 6. A concessão do mandamus não obsta a punição por demais penalidades eventualmente cabíveis, bem como o regular procedimento administrativo. 7. Apelação e remessa oficial a que se nega provimento. (TRF-1 - AMS: 00049237120144013603, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES, Data de Julgamento: 15/06/2016, QUINTA TURMA, Data de Publicação: 24/06/2016)”. “APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. IBAMA. AUTO DE INFRAÇÃO E TERMO DE EMBARGO. ANULAÇÃO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. ÁREA DESMATADA. ÁREA DE SUBSITÊNCIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. POSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO STF. 1. O juiz sentenciante julgou a ação com base nos fundamentos jurídicos em relação à matéria posta em discussão, não ocorrendo julgamento extra petita, a análise por fundamentos diversos do adotado pelo réu. 2. A supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo só poderá ocorrer quando for respeitada a área de reserva legal, áreas de preservação permanente, dentre outras exigências legais, todas aferidas quando da caracterização da área e detalhamento da atividade, em sede de licenciamento ambiental junto ao órgão competente, sem o qual será ilícita a supressão (inteligência do Código Florestal, em consonância com art. 225, § 4º da CF). 3. Lado outro, esta Corte Regional entende que o art. 16 do Decreto 6.514/08, ao regular a aplicação da medida de embargo pelo agente ambiental no ato da fiscalização dispondo que, no caso de áreas irregularmente desmatadas ou queimadas, ele embargará quaisquer obras ou atividades nelas localizadas ou desenvolvidas, sujeitando-se os infratores às diversas penalidades previstas no ordenamento (multas, embargos, interdições, restrições das atividades etc), deve-se excetuar as atividades de subsistência, em regime de economia familiar, em respeito aos institutos do mínimo existencial e da dignidade da pessoa humana e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Desse modo, cuidando-se de pequena propriedade destinada a atividade rural de subsistência, é indevido o embargo (TRF1 AI, Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, DJ de 20/04/2020). 4. Quanto à condenação em honorários em favor da DPU, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu ser possível a condenação da União ao pagamento de honorários em favor da Defensoria Pública da União ( AR 1.937, Ministro Gilmar Mendes, DJ de 30/06/2017), tendo em vista que a edição das Emendas Constitucionais 74/2013 e 80/2014 provocou relevante alteração do quadro normativo vigente à época em que fixada a tese do tema 134 da repercussão geral. Isso porque a nova redação do art. 134 da Constituição reforçou o papel institucional da Defensoria Pública, bem como sua autonomia funcional, administrativa e orçamentária, de modo a permitir uma atuação de maior destaque da instituição, inclusive contra entes públicos, notadamente em ações coletivas, tal qual reconhecido por aquela Corte na ADI 3.943, Ministra Cármen Lúcia, DJ de 07/05/2015. No caso, portanto, deve o IBAMA ser condenado ao pagamento dos honorários de sucumbência em favor da DPU. 5. Apelação do IBAMA não provida. (TRF-1 - AC: 00077505020164013000, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ AMILCAR MACHADO, Data de Julgamento: 27/04/2021, SÉTIMA TURMA, Data de Publicação: PJe 11/05/2021 PAG PJe 11/05/2021 PAG)”. Nesta quadra processual, os indícios se firmam no sentido de que a parte Agravada se enquadra como agricultor familiar, em que a propriedade rural, frise-se, não é maior que quatro módulos fiscais e, estando a servir os interesses deste sob regime de economia familiar, aliado ao fato da reversibilidade da medida, é de se concluir pela suspensão do termo de embargo, possibilitando a continuidade de suas atividades, como decidido pelo juízo “a quo”. Com efeito, diante da necessidade de sobrevivência, e em confronto a situação econômica e ao contexto social no qual o pretenso infrator está inserido, é de se presumir que, não se poderia exigir outra conduta de quem recebe a terra para explorá-la em regime de economia familiar e trata de, sem assistência e meios adequados, explorá-la. Noutro giro, advirto ao Agravado que, não promova novos desmates sem, contudo, observar o que estabelece as leis de regência. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo-se incólume a decisão recorrida, nos termos da fundamentação supra.” (grifo próprio e nosso). Ante o exposto, julga-se parcialmente procedente a ação, para o fim especifico de determinar a suspensão dos Termos de Embargo/Interdição n. 0888004723 (Id. 161847511) e n. 10886002424 (Id. 161847512), objetos da lide, lançados sobre o imóvel rural Sitio Agua Viva, localizado no Município de Nova Ubiratã (MT) e a exclusão do nome da autora, bem como do citado imóvel da lista de áreas embargadas do sítio eletrônico da SEMA/MT, ficando autorizada a continuidade da atividade rural desempenhada no local. Confirma-se a tutela deferida no id. 171737517. Deixa-se de acolher os pedidos de nulidade dos dois Autos de Infrações e de diminuição do valor da multa arbitrada pelo órgão ambiental. Julga-se extinto o processo com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC). Tendo em vista o acolhimento de apenas um dos três pedidos formulados na petição inicial (anulação dos autos de infrações, suspensão dos Termos de Embargos/Interdição e diminuição do valor da multa), condena-se ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa, ficando a cargo da autora o pagamento de 90%, observado tratar de beneficiária da gratuidade da justiça, e a cargo do requerido os 10% remanescentes (art. 86 do CPC). Deixa-se de condenar as partes ao pagamento de custas processuais, por ser a autora beneficiária da gratuidade da justiça e existir quanto ao requerido vedação para tanto (art. 3º, I, Lei Estadual n. 7.603/2001 com a redação dada pela Lei Estadual n. 11.077/2020). Deixa-se também de remeter os autos ao e. Tribunal de Justiça para reexame necessário, por tratar de ação em que o proveito econômico não ultrapassa o limite previsto no inciso II, do §3º, do art. 496, do CPC. Após o trânsito em julgado e procedidas as anotações necessárias, ao arquivo. P.R.I. Cuiabá, datado e assinado digitalmente. PORTARIA CGJ N. 7/2025-GAB-CGJ, DE 15 DE JANEIRO DE 2025
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