Processo nº 1000145-54.2023.8.11.0033
ID: 310542974
Tribunal: TJMT
Órgão: 2ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 1000145-54.2023.8.11.0033
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
NEUDI GALLI
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO Processo n° 1000145-54.2023.8.11.0033 SENTENÇA Vistos. 1. RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública ambiental ajuizada pelo MINI…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO Processo n° 1000145-54.2023.8.11.0033 SENTENÇA Vistos. 1. RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública ambiental ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO em face de LEANDRO TIAGO JAPANI, ambos qualificados. Exposto que o requerido é responsável pelo imóvel rural “Sítio Santa Rita”, localizado no Município de Nova Maringá-MT, onde foram constatadas degradações ambientais consistentes em 16 hectares de floresta nativa considerada de preservação especial sem a devida autorização do órgão competente. Com base nesses sintéticos argumentos, requereu o Ministério Público Estadual, inaudita altera pars, a concessão de tutela de urgência para: “a) seja decretada a indisponibilidade de bens do demandado, até o valor de R$ 206.845,60 [duzentos e seis mil, oitocentos e quarenta e cinco reais e sessenta centavos], com o fim de garantir a efetiva utilidade do provimento final [em proteção ao meio ambiente], promovendo-se as seguintes medidas, sem prejuízo de outras posteriormente indicadas caso esta se mostre insuficientes: a.1) inclusão de ordem de bloqueio via BacenJud; a.2) inclusão de ordem de bloqueio via RenaJud; a.3) expedição de ofício aos Cartórios de Registro de Imóveis de São José do Rio Claro/MT, Lucas do Rio Verde/MT, Diamantino/MT, Nova Mutum/MT, Tapurah/MT e Sorriso/MT para que informem a existência de imóveis registrados em nome do requerido e anotem, assim, a sua indisponibilidade; a.4) expedição de ofício ao Banco Central, para que este noticie a decisão de indisponibilidade às instituições financeiras, em face da existência de possíveis aplicações financeiras e/ou investimentos em nome da promovida, exceto se for possível efetivar o bloqueio imediato dos valores depositados em contas bancarias, em montante suficiente para a garantia do ressarcimento do dano ambiental, independentemente de ofício, por intermédio do sistema BacenJud; b) seja decretado o embargo judicial da área degradada e seja imposta obrigação de não fazer [abstenção de praticar atividades lesivas ao meio ambiente – tutela inibitória], com ordem para que o atual proprietário: b.1) suspenda todas as atividades lesivas ao meio ambiente que estejam sendo realizadas sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, no prazo de 30 [trinta] dias, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 [dez mil reais]; c) seja imposta obrigação de fazer consistente em recompor a área degradada, com a apresentação à SEMA/MT, no prazo de 120 [cento e vinte] dias, a contar da intimação da decisão liminar, de Plano de Recuperação de Área Degradada – PRADA, que atenda as diretrizes indicadas pelo órgão ambiental, e a implementação/execução do PRADA, no prazo de 30 [trinta] dias contados de sua aprovação; d) a cominação de multa diária de R$ 10.000,00 [dez mil reais] para o caso de abstenção do réu em apresentar e/ou implementar o referido projeto, conforme consta do artigo 11 da Lei nº 7.347/1985, a ser recolhida em favor do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá/MT, ou para financiamento de projetos ambientais, inclusive relacionados à fiscalização ambiental, a serem indicados pelo Ministério Público. A recuperação deverá ser acompanhada pelos órgãos estatais responsáveis; e) seja oficiado ao Banco Central, com ordem de suspensão da participação do requerido em linhas de financiamentos em estabelecimentos oficiais de crédito, bem como em incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público” (Id. 108945209). No mérito, postulou pela confirmação dos efeitos da tutela e procedência dos pedidos constantes na exordial, com a consequente condenação da parte requerida a pagamento de indenização a título de compensação pelo dano moral ambiental, e pagamento de indenização a título de danos materiais ambientais no valor de R$ 206.845,60 (duzentos e seis mil oitocentos e quarenta e cinco reais e sessenta centavos) em favor do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá/MT, perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público e perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito. A inicial foi recebida (Id. 108959844), ocasião em que a tutela de urgência requerida foi parcialmente deferida, sendo determinada a suspensão de todas as atividades lesivas ao meio ambiente que estejam sendo realizadas sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, sob pena de multa diária fixada em R$ 1.000,00 (mil reais). Citado (Id. 112225385), o requerido apresentou contestação ao Id. 114130205, alegando, preliminarmente, inépcia da inicial e ilegitimidade passiva. No mérito, pugnou pela improcedência da presente ação alegando a inexistência do fato e que não fora demonstrada a conduta ilícita. O Ministério Público apresentou impugnação à contestação ao Id. 114884867, reiterando os termos delineados na exordial, pugnando pelo afastamento das preliminares arguidas e pelo julgamento antecipado do mérito. Determinada a intimação das partes para indicarem as provas que pretendem produzir (Id. 136482609), a parte autora requereu o julgamento antecipado da lide (Id. 136675691), ao passo em que o requerido protestou pela produção da prova pericial, documental e oral, consistente na oitiva de testemunhas (Id. 139680603). Saneado o processo em decisão de Id. 165458743, sendo fixados os pontos controvertidos, deferida a prova pericial e testemunhal postulada pelo réu. Quesitos pelo autor no Id. 165963894. Proposta de honorários no Id. 167114141. Intimado, o requerido manteve-se inerte quanto à prova pericial, razão pela qual, foi presumida sua desistência e determinada a intimação do demandado para informar seu interesse na prova testemunhal (Id. 185749234), ao que se manteve silente mais uma vez. Vieram os autos conclusos. É o relatório. DECIDO. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Do julgamento antecipado do mérito. Consoante fundamentação infra, a solução do mérito independe da produção de quaisquer outras provas que não aquelas de natureza documental já oportunamente angariadas aos autos, até porque o magistrado é o destinatário último das provas. Há de se considerar, ademais, que, mesmo deferidas as provas por ele postuladas, o requerido manteve-se inerte em todas as subsequentes intimações, deixando de adotar as providências necessárias, quais sejam o recolhimento dos honorários do perito e o arrolamento das testemunhas a serem ouvidas, restando então prejudicadas as referidas provas. Impõe-se, por consequência lógica, o julgamento antecipado do mérito, nos moldes do art. 355, I, do Código de Processo Civil, ao qual ora procedo, inclusive em prestígio à duração razoável do processo. 2.2. Das preliminares. Não há preliminares ou questões processuais outras pendentes a decidir. As partes são legítimas, a representação regular e não há nulidades a declarar. 2.3. Do dano ambiental. De proêmio, insta salientar que a Constituição Federal, promulgada em 1988, consagrou como obrigação do Estado a defesa, preservação e garantia de efetividade do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. In verbis, o art. 225 do diploma constitucional aduz que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Com tal norma, o legislador afirmou o meio ambiente como bem de uso comum do povo, suscitando a necessidade de ações por todos os meios legislativos, administrativos e judiciais que provejam sua proteção. Nas palavras do doutrinador e ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, o meio ambiente deve, portanto, ser considerado patrimônio comum de toda a humanidade para garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras, direcionando todas as condutas do Poder Público estatal no sentido de integral proteção legislativa interna e adesão aos pactos e tratados internacionais protetivos desse direito humano fundamental de 3ª geração, para evitar prejuízo da coletividade em face de uma afetação de certo bem (recurso natural) a uma finalidade individual (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 39. ed. São Paulo: Atlas, 2023). Visando a reparação deste bem coletivo fundamental, o Ministério Público requer a reparação do dano ambiental por desmatamento de 16 hectares de floresta nativa sem autorização do órgão ambiental competente, entre o período de 5 a 14 de novembro de 2020. Por sua vez, a parte requerida alegou que o desmate foi realizado dentro do percentual permitido na legislação para vegetação nativa, sendo de 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas. No caso em análise, a infração se caracteriza pela exploração de áreas de reserva legal, florestas e formações sucessoras de origem nativa sem prévia aprovação do órgão ambiental competente, e apesar da alegação do requerido de ter respeitado os percentuais previstos na legislação ambiental, não há como afastar a responsabilidade do réu diante da comprovação do desmate sem a devida licença outorgada pelo órgão competente, fato esse incontroverso nos autos. Pois bem. Os danos ambientais são regidos pela teoria do risco integral, segundo a qual aquele que explora a atividade econômica ocupa a posição de garantidor da preservação ambiental, sendo sempre considerado responsável pelos danos vinculados à atividade, cabendo apenas a demonstração do dano e do nexo de causalidade. Segundo apontam os doutrinadores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, o nexo de causalidade é o “que liga o resultado danoso ao agente infrator”, sendo “indispensável para que se possa concluir pela responsabilidade jurídica” do agente. Trata-se, portanto, do “liame que une a conduta do agente (positiva ou negativa) ao dano. Por óbvio, somente se poderá responsabilizar alguém cujo comportamento houvesse dado causa ao prejuízo”. O relatório técnico n° 512/2022 (Id. 108945213 - Pág. 9/13) constatou que o desmatamento ocorreu durante novembro de 2020, sendo degradados 16,01 ha de uma área total de 38,1607 hectares, correspondendo a 41,95% da propriedade rural, sem qualquer autorização da Secretaria Estadual do Meio Ambiente. Sendo que, no período em que houve o dano, o possuidor legítimo da propriedade era o requerido Leandro Tiago Japani, conforme contrato particular de compromisso de compra e venda de imóvel firmado em 01 de julho de 2020, que atesta a compra da propriedade pelo réu (Id. 108945227, fls. 15/16) Assim apesar do requerido defender que não se trata de área de reserva legal, ficou evidentemente demonstrado com os relatórios juntados pela parte autora que a área degrada refere-se à porcentagem de 41,95% do imóvel rural, localizado em área de cobertura de floresta na Amazônia Legal, violando expressamente o art. 12, I, “a”, da Lei n° 12.651/2012. Vejamos: Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei: I - localizado na Amazônia Legal: a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas; Ademais, nos termos da Súmula nº 623 do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade pelo dano ambiental deve ser atribuída a quem participou da conduta lesiva, podendo alcançar o possuidor do imóvel, bem como quem desmatou ou quem deixou que o desmate ocorresse. In litteris: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor. (SÚMULA 623, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/12/2018, DJe 17/12/2018) Nesse sentido, também, é a jurisprudência: PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DESMATAMENTO DE FLORESTA NATIVA DO BIOMA AMAZÔNICO SEM AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO AMBIENTAL COMPETENTE – ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA – RESPONSABILIDADE AMBIENTAL OBJETIVA – DANO AMBIENTAL CONFIGURADO – REPARAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO – CABIMENTO – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Quem ilegalmente desmata, ou deixa que desmate, floresta ou vegetação nativa responde objetivamente pela completa recuperação da área degradada, sem prejuízo do pagamento de indenização pelos danos, inclusive por dano moral ambiental coletivo que tenha causado. 2. Considerando que em matéria de dano ambiental foi adotada a teoria da responsabilidade objetiva, sob a modalidade do risco integral, basta comprovação do dano e do nexo causal para haver a responsabilização civil, devidamente evidenciados no caso. 3. Recurso conhecido e não provido. (N.U 0000247-95.2010.8.11.0018, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 17/06/2024, Publicado no DJE 19/06/2024). Dessa forma, o conjunto probatório nos autos constata a responsabilidade do requerido Leandro Tiago Japani na presente demanda, enquanto responsável pelo imóvel em questão. Por conseguinte, é cabível a indenização pecuniária pelo dano cometido, em razão das perdas transitórias de recursos ambientais. Ainda que o réu proceda com a regeneração da área desmatada, é cabível a indenização pecuniária pelo dano cometido, em razão das perdas transitórias de recursos ambientais. A mera regeneração, natural ou artificial, não é capaz de recompor todos os prejuízos causados ao meio ambiente. Nesse sentido, são os excertos de julgados a seguir colacionados: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DESMATAMENTO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - REGENERAÇÃO NATURAL DA ÁREA - SUBSISTÊNCIA DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - ART. 14, § 1º DA LEI 6.938/81. - Os danos causados ao meio ambiente nunca são reparados pela mera regeneração natural, que deve ser buscada, mas é sempre insuficiente, visto que não cobre os prejuízos causados, por exemplo, à flora e à fauna locais, que são, na verdade, irreparáveis e imensuráveis. - Constatado o desmatamento ilegal de área de preservação permanente, mesmo que a área se encontre em processo de regeneração natural ou artificial subsiste a obrigação de indenizar os danos causados, já que a mera recuperação natural da área não é suficiente para recompor a totalidade dos prejuízos causados ao meio ambiente. Tal indenização tem como parâmetros o dano provocado e a condição financeira do agente. Todas as medidas para possibilitar a mais ampla recuperação da área degradada devem ser tomadas pelo agente poluidor. V.V. (TJ-MG 104000401223110011 MG 1.0400.04.012231-1/001(1), Relator: EDIVALDO GEORGE DOS SANTOS, Data de Julgamento: 01/07/2008, Data de Publicação: 08/08/2008) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – INSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DA PARTE DEMONSTRADA – CERCEAMENTO DE DEFESA - NÃO OCORRÊNCIA – PRELIMINAR AFASTADA – DANO AMBIENTAL – SUPRESSÃO DE FLORESTA NATIVA SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE COMPETENTE – COMPROVAÇÃO – FISCALIZAÇÃO PELO IBAMA – AUTO DE INFRAÇÃO – PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – OBRIGAÇÃO PROPTER REM – DEVER DE REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA – DANO MORAL COLETIVO – NÃO EVIDENCIADO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Não há que se falar em cerceamento de defesa quando as partes, devidamente intimadas, deixam injustificadamente de comparecer à audiência de instrução e julgamento, mormente quando, por se tratar de obrigação propter rem, a demonstração de quem causou o dano em nada alterará o resultado. 2. De acordo com a Súmula nº 623 do STJ, as obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual, mesmo que não tenha contribuído para a deflagração do dano. 3. Os documentos emanados pelos órgãos ambientais, no caso em tela, pelo IBAMA, possuem presunção de veracidade, prevalecendo até prova robusta produzida em contrário. 4. A regeneração natural da área degradada não afasta a responsabilidade do agente causador do dano no tocante à reparação dos danos causados e de não mais degradar. 5. A caracterização do dano moral coletivo, em razão de dano ao meio ambiente, requer a demonstração de que o fato transgressor, ultrapasse a esfera individual do agente, e ultrapasse os limites da tolerabilidade a ponto de produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na comunidade local, situação não visualizada na espécie. (TJ-MT 10004299620178110025 MT, Relator: GILBERTO LOPES BUSSIKI, Data de Julgamento: 10/11/2021, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 24/11/2021) Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme em permitir a condenação do poluidor em indenização pecuniária pelo dano ambiental em conjunto com a obrigação de repará-lo in natura. Vejamos: ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. EDIFICAÇÃO IRREGULAR EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E EM TERRENO DE MARINHA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO E LICENÇAS AMBIENTAIS IMPERIOSAS. REPARAÇÃO INTEGRAL DO DANO AMBIENTAL. MEDIDAS PARA RECUPERAÇÃO E COMPENSAÇÃO PELO PERÍODO EM QUE FORAM DESRESPEITADAS AS NORMAS AMBIENTAIS. CABÍVEL A CUMULAÇÃO DAS CONDENAÇÕES IN CASU. PRECEDENTES. I - Na origem, trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra Márcio Soares da Costa objetivando a demolição de barraca de praia irregularmente construída, por se tratar de área de preservação permanente e terreno de marinha, na Praia de Quixaba, no Município de Aracati/CE, bem como a reparação dos danos ambientais e a condenação ao pagamento de indenização ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. II - A sentença acolheu os pedidos, condenando o réu a recuperar a área degradada, com a demolição da edificação irregular e remoção de todos os materiais e entulhos decorrentes de sua ocupação, devendo, para tanto, apresentar Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD), bem como indenização pecuniária em favor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. III - O Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em sede recursal, reformou a decisão para afastar a condenação à reparação do dano ambiental e indenização imposta, remanescendo, apenas, a condenação com relação à demolição da construção irregular. IV - Em relação à apontada afronta a dispositivos da Lei n. 4.771/1965 e Lei n. 6.938/1981, constata-se que o Tribunal a quo, apesar de consignar acerca da irregularidade da edificação inserida nos limites de área de preservação permanente e em terreno de marinha, que perdura por mais de 30 (trinta) anos, entendeu pela improcedência dos pedidos de reparação do dano ambiental e indenização pecuniária. V - Nesse diapasão, o acórdão objurgado se encontra em dissonância com o entendimento consolidado desta Corte segundo o qual, a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente autoriza a cumulação das condenações supracitadas, porquanto, além de devido o pleito cominatório - a fim de restaurar a área degradada, a indenização in casu não corresponde ao dano a ser reparado, mas aos seus efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios. VI - Recurso especial provido para restabelecer integralmente a sentença monocrática. (Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 1869672/CE, Ministro Relator: Francisco Falcão, Segunda Turma, julgamento em 15 de setembro de 2020, publicação em 23 de setembro de 2020) Assim, o dever de indenizar subsiste para a área degradada, em virtude da necessidade de total reparação dos danos ambientais causados, sobretudo quanto aos efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios. 2.4. Do quantum indenizatório - dano ambiental material. O valor da indenização deve considerar a extensão e o conteúdo do dano causado. No caso em apreço, o Ministério Público quantificou de pronto o montante em pecúnia a título de indenização, sendo de R$ 206.845,60 (duzentos e seis mil oitocentos e quarenta e cinco reais e sessenta centavos), atribuindo que o custo de recuperação seria de R$ 12.927,85 (doze mil novecentos e vinte e sete reais e oitenta e cinco centavos) por hectare. Assim, não havendo impugnação quanto ao montante apurado, e se encontrando dentro da razoabilidade e proporcionalidade, entendo que o quantum indenizatório é de R$ 206.845,60 (duzentos e seis mil oitocentos e quarenta e cinco reais e sessenta centavos), que deverá ser revertido em prol do Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá. 2.5. Do dano moral coletivo. O Ministério Público postulou pela condenação do requerido em dano moral coletivo. A Ministra Eliana Calmon, relatora no julgamento do Recurso Especial nº 1.269.494/MG[1], elucida que o dano moral ambiental “deve ser averiguado de acordo com as características próprias aos interesses difusos e coletivos, distanciando-se quanto aos caracteres próprios das pessoas físicas que compõem determinada coletividade ou grupo determinado ou indeterminado de pessoas, sem olvidar que é a confluência dos valores individuais que dão singularidade ao valor coletivo”. Isso porque, esse tipo de dano extrapatrimonial “atinge direitos de personalidade do grupo ou coletividade enquanto realidade massificada, que a cada dia reclama mais soluções jurídicas para sua proteção. É evidente que uma coletividade pode sofrer ofensa à sua honra, à sua dignidade, à sua boa reputação, à sua história, costumes, tradições e ao seu direito a um meio ambiente salutar para si e seus descendentes. Isso não importa exigir que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado. Essas decorrem do sentimento de participar de determinado grupo ou coletividade, relacionando a própria individualidade à ideia do coletivo”[2]. Dessa forma, não é necessária a demonstração de dor, repulsa ou indignação, tal qual aconteceria no dano moral individual. No presente caso, o desmatamento desordenado e irregular é capaz de causar danos à coletividade, de forma que sua aplicação, em conjunto com a reparação aos danos materiais é totalmente possível. Em relação ao quantum indenizatório, em virtude da impossibilidade de se mensurar a extensão do dano moral, faz-se necessário utilizar critérios objetivos para a fixação do valor devido. Nesse sentido, é a ementa de julgado do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL. SÚMULA 284/STF. DANO AMBIENTAL E DEVER DE INDENIZAR. DESMATAMENTO DE FLORESTA NATIVA. SOLIDARIEDADE. LICENÇA OU AUTORIZAÇÃO AMBIENTAL. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. DANO MORAL COLETIVO. CABIMENTO. CRITÉRIO DO METRO QUADRADO OU HECTARE DEGRADADO. SÚMULA 126 DO STJ. ALÍNEA C. PREJUDICADA 1. Cuida-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso com o fito de condenar o ora recorrente a recuperar a área degradada e ressarcir dano ambiental material e moral coletivo. 2. A Corte de origem entendeu que ficou demonstrado nos autos que o recorrente desmatou área rural sem a devida autorização do IBAMA e que houve dano moral coletivo, existindo, portanto, o dever de indenizar. Rever tal conclusão demanda reexame dos fatos e provas constantes dos autos, o que é vedado ao Recurso Especial, nos termos da Súmula 7/STJ. Licença ou autorização posterior ao dano ambiental causado não o legitima, regulariza ou sana, nem o expurga de ilicitude ou faz as vezes de salvo-conduto retroativo. Ademais, a responsabilidade civil objetiva, ilimitada e solidária pelo dano ambiental impõe-se não só ao proprietário mas também a qualquer um que, direta ou indiretamente, contribua, por ação ou omissão, para a degradação ou dela se beneficie, aí incluídos, em pé de igualdade, posseiro, arrendatário, empreiteiro, madeireiro, transportador ou terceiro sem vínculo jurídico com o bem móvel ou imóvel. 3. Quanto à possibilidade de arbitramento de danos morais coletivos, o acórdão estadual está de acordo com a jurisprudência do STJ, que reconhece o seu cabimento, sem necessidade de avaliação individual ou coletiva de sofrimento. "O dano moral coletivo ambiental atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendo desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado." (REsp 1269494/MG, Rel.Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 01/10/2013). Em casos de desmatamento, é correto que o juiz utilize, no arbitramento do dano moral coletivo, critério de metro quadrado ou hectare degradado (conforme o modo de comercialização de imóveis na área, p. ex., terrenos urbanos ou rurais) para, em seguida, após a totalização, chegar ao valor final a ser fixado. 4. Recurso Especial não provido[3]. Também devem ser observados os critérios de proporcionalidade, moderação e razoabilidade, submetidos ao prudente arbítrio judicial, com observância das peculiaridades inerentes aos fatos e circunstâncias que envolvem o caso concreto, bem assim em consonância com a função sancionatória e pedagógica da reparação. Na hipótese em exame, sopesadas as variáveis elencadas pelo Ministério Público, decorrentes da ação agressora do réu, quais sejam: desmatamento de área de floresta nativa sem autorização do órgão ambiental competente, reputa-se razoável, na espécie, fixar o valor da indenização a esse título, no montante correspondente a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Por fim, no que tange à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público (artigo 14, inciso II, da Lei nº 6.938/81) e a perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito (artigo 14, inciso III, da Lei nº 6.938/81), cuja liminar foi indeferida nestes pontos, vê-se que tais medidas tão gravosas afetariam a própria sobrevivência da parte requerida, pois, no mais das vezes, tais recursos são indispensáveis à manutenção da propriedade rural, de modo que as sanções já aplicadas administrativamente e as impostas neste sentença se mostram suficientes para salvaguardar o meio ambiente. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo extinto o processo, com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, e acolho em parte os pedidos formulados na ação, nos termos da fundamentação retro, a fim de condenar o réu: a) Obrigação de fazer - recuperar integralmente as áreas degradadas, por meio da realização do PRAD – Plano de Recuperação da Área Degradada, protocolado na SEMA, no prazo de 60 (sessenta) dias; b) Pagamento a título de indenização por dano material ambiental, no valor de R$ 206.845,60 (duzentos e seis mil oitocentos e quarenta e cinco reais e sessenta centavos), corrigido e acrescido de juros moratórios, conforme Súmulas nºs 43 e 54 do STJ, pela taxa Selic, desde a data da inicial, devendo ser destinada a quantia ao Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá; e c) Pagamento a título de indenização por dano moral coletivo, no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), devendo ser acrescido de juros moratórios desde a data do fato, pela taxa Selic, deduzida a variação do IPCA, e com acréscimo de correção monetária desde a data desta sentença, conforme Súmula nº 362 do STJ, com a aplicação apenas da taxa Selic para efeitos de correção monetária e juros, destinada a quantia ao Fundo Municipal do Meio Ambiente de Nova Maringá. Descabida a condenação em honorários advocatícios, ex vi do art. 18 da Lei nº 7.347/85. Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais. Na eventualidade de recurso de apelação interposto pelas partes, deve a Secretaria, por meio de ato ordinatório, intimar a parte contrária para apresentação de contrarrazões e, em seguida, remeter os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, nos termos do art. 1.010 do Código de Processo Civil e do art. 148, XIX, do Código de Normas Gerais da Corregedoria-Geral da Justiça. Oportunamente, arquivem-se os autos com as cautelas de estilo. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo o necessário. São José do Rio Claro – MT, data da assinatura digital. (assinado digitalmente) PEDRO ANTONIO MATTOS SCHMIDT Juiz de Direito [1] Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 1.269.494/MG, Ministra Relatora: Eliana Calmon, Segunda Turma, 24 de setembro de 2013, publicação em 01 de outubro de 2013. [2] Idem. [3] Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 1555220/MT, Ministro Relator: Herman Benjamin, Segunda Turma, julgamento em 20 de outubro de 2016, publicação em 20 de agosto de 2020.
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