Processo nº 1003606-64.2022.8.11.0002
ID: 335933376
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1003606-64.2022.8.11.0002
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JORGE HENRIQUE FRANCO GODOY
OAB/MT XXXXXX
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PEDRO MARTINS VERAO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003606-64.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Homicídio Qualificado] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TAD…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003606-64.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Homicídio Qualificado] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Turma Julgadora: [DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [JOILSON JAMES QUEIROZ - CPF: 361.704.881-15 (RECORRENTE), PEDRO MARTINS VERAO - CPF: 045.399.151-34 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (REPRESENTANTE), ITAMAR BAPTISTA BARCELOS - CPF: 629.349.291-91 (VÍTIMA), PEDRO FRANCISCO DA SILVA - CPF: 942.186.921-49 (VÍTIMA), JOSE FERREIRA DE ALMEIDA - CPF: 785.679.121-72 (VÍTIMA), ARELI MANOEL DE OLIVEIRA - CPF: 481.899.951-20 (VÍTIMA), JOSÉ GUMERCINDO DOS SANTOS RIBAS (ASSISTENTE), MAURÍCIO JOSÉ DE OLIVEIRA (ASSISTENTE), DINIZ ALMEIDA QUEIROZ JÚNIOR (ASSISTENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), EDIO GOMES JUNIOR - CPF: 514.643.141-87 (TERCEIRO INTERESSADO), ALDERI DE SOUZA FERREIRA (TERCEIRO INTERESSADO), ADERVAL JOSÉ DOS SANTOS (TERCEIRO INTERESSADO), CARLOS SÉRGIO ANDRÉ (TERCEIRO INTERESSADO), NORECI FERREIRA GOMES (TERCEIRO INTERESSADO), VALDINEI LUIZ ADEMIAS DA SILVA (TERCEIRO INTERESSADO), JORGE HENRIQUE FRANCO GODOY - CPF: 337.204.281-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRIBUNAL DO JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO POR MOTIVO TORPE, MEIO CRUEL, RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA E PARA ASSEGURAR A EXECUÇÃO E A IMPUNIDADE DE OUTRO CRIME. CONDENAÇÃO PELOS CRIMES DO ART. 121, § 2º, II, III, IV E V, C/C ART. 29 DO CP, POR TRÊS VEZES. REJEIÇÃO DA PRELIMINAR DE PRECLUSÃO CONSUMATIVA SUSCITADA PELA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA. RECURSO DEFENSIVO. PLEITO DE ANULAÇÃO DO JULGAMENTO POR DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROVAS DAS QUALIFICADORAS IMPUTADAS. IMPROCEDÊNCIA. DECISÃO DOS JURADOS AMPARADA EM CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO. SOBERANIA DOS VEREDITOS. SUBSIDIARIAMENTE, PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA-BASE POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. INVIABILIDADE. EXISTÊNCIA DE MAUS ANTECEDENTES. PLEITO DE APLICAÇÃO DO ART. 580 DO CPP PARA EXTENSÃO DE EFEITOS DA SENTENÇA AO CORRÉU. INEXISTÊNCIA DE IDENTIDADE FÁTICO-PROCESSUAL. DESCABIMENTO. RECURSO MINISTERIAL. POSTULAÇÃO PELO RECONHECIMENTO DO CONCURSO FORMAL IMPRÓPRIO ENTRE OS TRÊS HOMICÍDIOS. CONFIGURAÇÃO DE DESÍGNIOS AUTÔNOMOS DO AGENTE. INAPLICABILIDADE DA CONTINUIDADE DELITIVA. INCIDÊNCIA DO ART. 70, PARTE FINAL, DO CP. READEQUAÇÃO DO CÁLCULO DA PENA. FIXAÇÃO DA PENA DEFINITIVA EM 70 (SETENTA) ANOS DE RECLUSÃO. RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO. PROVIMENTO AO RECURSO MINISTERIAL. I. CASO EM EXAME Apelação criminal interposta por Joilson James Queiroz contra sentença que o condenou à pena de 46 anos de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática de três homicídios qualificados (art. 121, § 2º, incisos II, III, IV e V, c/c art. 29, por três vezes, todos do Código Penal), com fundamento na decisão do Tribunal do Júri da Comarca de Várzea Grande/MT. Também interpôs recurso o Ministério Público. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (I) Analisar se a decisão do Tribunal do Júri foi manifestamente contrária à prova dos autos, para fins de anulação do julgamento; (II) verificar se a pena-base deve ser reduzida por ausência de fundamentação idônea; (III) Apurar se é possível estender os efeitos da condenação mais benéfica aplicada ao corréu Noreci Ferreira Gomes, com fundamento no art. 580 do CPP; (IV) Analisar se cabe o concurso formal impróprio entre os três homicídios qualificados, com a consequente readequação da pena. III. RAZÕES DE DECIDIR A preliminar de preclusão suscitada pela Procuradoria-Geral de Justiça deve ser rejeitada, pois a apelação por decisão manifestamente contrária à prova dos autos é cabível na segunda fase do procedimento do Júri, nos termos do art. 593, III, “d”, do CPP. A decisão dos jurados está amparada por robusto conjunto probatório, que demonstra a atuação dolosa, voluntária e consciente do réu como mandante das execuções, inclusive com ordens diretas para o afogamento das vítimas, não se tratando de decisão dissociada das provas dos autos. As quatro qualificadoras (motivo torpe, meio cruel, recurso que dificultou a defesa das vítimas e para assegurar a impunidade de outro crime) foram comprovadas por depoimentos convergentes e pelas circunstâncias da execução das vítimas. A pena-base foi fixada com elevação justificada pela existência de maus antecedentes, conforme art. 59 do CP, em consonância com a jurisprudência do STJ, não havendo nulidade ou desproporcionalidade. A extensão dos efeitos da sentença proferida em favor do corréu Noreci Ferreira Gomes não é possível, ante a existência de circunstâncias subjetivas e processuais distintas, tais como o longo período de fuga do apelante e seus antecedentes penais desfavoráveis. O pedido do Ministério Público deve ser acolhido, pois ficou caracterizado o concurso formal impróprio, com dolo autônomo e individualizado em relação a cada uma das três vítimas, sendo inaplicável a continuidade delitiva. Reconhecido o concurso formal impróprio, a pena foi redimensionada para 70 (setenta) anos de reclusão, mediante cúmulo material das penas cominadas a cada homicídio. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso do réu desprovido. Recurso do Ministério Público provido. Tese de julgamento: A decisão do Tribunal do Júri só pode ser anulada quando se revelar manifestamente dissociada das provas dos autos, o que não ocorre quando fundada em versão plausível amparada no conjunto probatório. A existência de maus antecedentes justifica a majoração da pena-base, desde que não utilizados para configurar reincidência, mesmo que se refiram a fato posterior ao crime julgado. A extensão de decisão penal mais benéfica a corréu exige identidade fático-processual e inexistência de circunstâncias de caráter exclusivamente pessoal. Verificado o desígnio autônomo do agente para a prática de cada homicídio, impõe-se o reconhecimento do concurso formal impróprio, com aplicação do cúmulo material. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVIII, “c”; CP, arts. 59, 61, II, “b”, “c”, “d”; 62, III; 70, parte final; 71; 121, § 2º, II, III, IV e V; CPP, arts. 580 e 593, III, “d”. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, AgRg no AREsp 1632897/RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª Turma, j. 16.06.2020; STJ, PExt no AgRg no HC 776112/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, 6ª Turma, j. 13.12.2022; TJMT, N.U 1000170-92.2021.8.11.0015, Rel. Des. Rui Ramos Ribeiro, j. 04.03.2024; TJMT, N.U 1001179-76.2023.8.11.0029, Rel. Des. Jorge Luiz Tadeu Rodrigues, j. 08.10.2024. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Criminal interposto por Joilson James Queiroz em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Várzea Grande/MT, que o condenou à pena de 46 (quarenta e seis) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, pela prática do crime tipificado no art. 121, § 2º, incisos II, III, IV e V, c/c art. 29, por três vezes, todos do Código Penal. Em suas razões recursais (ID 214884685), o apelante pleiteia a anulação do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri, argumentando que a decisão dos jurados foi manifestamente contrária às provas dos autos, bem como, pela ausência de provas das qualificadoras imputadas. Subsidiariamente, pleiteia a reforma da dosimetria da pena, com fixação da pena-base no patamar mínimo previsto em abstrato, ou, alternativamente, a aplicação do art. 580 do CPP, com extensão dos efeitos da sentença proferida em favor do corréu Noreci Ferreira Gomes, que teria sido condenado a 25 anos de reclusão por conduta fático-processual semelhante. Por outro lado, o Ministério Público, em sede de razões recursais (ID. 207639785), insurge-se em relação ao quantum da reprimenda imposta, requerendo o reconhecimento do concurso formal impróprio ou imperfeito entre os homicídios qualificados, nos moldes do art. 70, parte final, do Código Penal, sob o argumento de que houve desígnios autônomos e vontade deliberada de praticar cada um dos crimes, não sendo cabível a exasperação única da pena como se derivassem de um mesmo contexto de ação unívoca. Em contrarrazões, o Ministério Público do Estado pugnou pelo desprovimento do recurso da Defesa (ID. 218651164). A Defesa, em sede de contrarrazões, requereu o desprovimento do recurso ministerial (id. 207639788). A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso em razão da ocorrência da preclusão consumativa. No mérito, opinou pelo desprovimento do recurso interposto pelo apelante e pelo provimento do recurso interposto pelo Parquet (ID. 227993164). É o relatório. À douta revisão. VOTO PRELIMINAR – NÃO CONHECIMENTO DO APELO Em sede de parecer, a Procuradoria Geral de Justiça suscita preliminar de não conhecimento do apelo interposto por Joilson James Queiroz, ao argumento de que este autor ajuizou recursoem sentido estrito em face da decisão de pronúncia que os encaminhou aojulgamentopelo Egrégio Tribunal do Júri, ocasião em que este Sodalício já se posicionou sobre a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade do crime de homicídio, bem como, reconheceu a pertinência das qualificadoras. Logo, no seu entender, a matéria de fato foi reeditada na vertente apelação desta feita sob o viés argumentativo de que o veredicto dos jurados foi manifestamente contrário às provas dos autos, já foi exaustivamente debatida e decidida, tendo-se operado a preclusão judicial ou pro judicato, a obstar a prolação de nova decisão sobre a mesma questão, sob pena de afronta à segurança jurídica. Não obstante os argumentos apresentados, entendo que a preliminar não merece acolhimento, pelos fundamentos que passo a expor. De início, é importante destacar que os processos relacionados à competência do Tribunal do Júri, de natureza predominantemente criminal, seguem um rito escalonado, composto por duas fases principais e distintas. Esse modelo visa assegurar a regularidade do processo e evitar que qualquer acusação seja automaticamente submetida ao julgamento de um corpo de jurados, cuja decisão é orientada pela íntima convicção. A primeira etapa, presidida por um juiz togado, limita-se a verificar a admissibilidade da acusação, mediante análise precária e superficial das provas, com o objetivo de aferir a existência de materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria, ou participação, a teor do art. 413 do Código de Processo Penal. Nesse momento, os “indícios suficientes” devem ser compreendidos como um princípio de prova capaz de situar o réu no contexto criminoso, mesmo que de maneira não plenamente segura, mas o bastante para submetê-lo ao crivo de seus pares, a quem compete sanar eventuais controvérsias. (TJ-MT 00101585420138110042 MT, Relator: GILBERTO GIRALDELLI, Data de Julgamento: 11/04/2022, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação: 13/04/2022) Nesse contexto, é consabido que a sentença de pronúncia não representa um juízo definitivo de culpabilidade, mas apenas autoriza o prosseguimento do processo para julgamento pelo Tribunal do Júri, órgão competente para a análise exauriente dos fatos e provas. Assim, a decisão de pronúncia e os eventuais recursos interpostos contra ela, como o recurso em sentido estrito, não têm como finalidade o esgotamento da matéria probatória. Isso porque, tanto o magistrado sumariante quanto o Tribunal, ao examinarem tais recursos, devem restringir-se à análise da admissibilidade da acusação, sem aprofundar-se na análise das provas, a qual incumbirá ao juiz natural da causa, qual seja, o Colendo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, após a colheita probatória em Plenário, na segunda etapa do procedimento bifásico, denominada judicium causae. Como mencionado, a segunda etapa, conduzida perante o Tribunal do Júri, é responsável pela análise integral e definitiva das provas, ficando a cargo do Conselho de Sentença a decisão sobre a culpabilidade ou inocência do réu, com base na íntima convicção dos jurados. Assim, a verificação de eventual incompatibilidade entre o veredicto dos jurados e as provas constantes nos autos é uma atribuição exclusiva dessa fase, sendo realizada por meio de recurso de apelação, conforme o disposto no art. 593, inciso III, alínea d, do Código de Processo Penal. Não se trata de reexaminar uma questão já decidida em recurso anteriormente interposto, mas sim de avaliar, de maneira mais aprofundada e em cognição exauriente, se a decisão dos jurados está em conformidade com as provas constantes nos autos. Sobre o tema, colaciono o entendimento deste Egrégio Tribunal de Justiça: “Não há que se falar não conhecimento do recurso, ao argumento de que a matéria aqui apresentada já foi analisada em recurso em sentido estrito anteriormente interposto pelo apelante, eis que a decisão de pronúncia analisa indícios de provas acerca da existência de autoria delitiva e não a sua comprovação indene de dúvidas, porquanto compete ao Tribunal do Júri dirimir as referidas questões. Logo, não há reanalise de questão já decidida, e sim verificação em sede de cognição exauriente se o veredicto dos jurados conversa com as provas constantes nos autos” (N.U 0001724-02.2013.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 26/03/2024, publicado no DJE 27/03/2024) “O recurso em sentido estrito analisa indícios de provas acerca da existência de autoria delitiva e não a sua comprovação indene de dúvidas, eis que compete ao Tribunal do Júri dirimir as referidas questões, não havendo, portanto, que se falar em preclusão consumativa o simples fato de o recurso ter mantido a sentença de pronúncia em relação à existência de indícios de autoria delitiva” (N.U 0015551-91.2012.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 11/11/2024, Publicado no DJE 18/11/2024) Ademais, a alegação ministerial de preclusão judicial não se sustenta à luz da sistemática processual penal e do princípio do duplo grau de jurisdição. A existência de decisão anterior em recurso em sentido estrito não impede que o Tribunal examine, em sede de apelação, a regularidade do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri, sobretudo quando se alega que o veredicto é manifestamente contrário às provas. O reconhecimento da admissibilidade da acusação não equivale à análise definitiva da procedência das imputações, razão pela qual a tese de preclusão não se compatibiliza com o rito bifásico que rege os crimes dolosos contra a vida. Por fim, é importante registrar que acolher a preliminar arguida pela Procuradoria de Justiça implicaria violação aos princípios da ampla defesa e do contraditório, bem como, ao princípio da paridade de armas, na medida em que limitaria de forma desproporcional o direito da defesa de recorrer contra eventuais equívocos do Conselho de Sentença, prerrogativa essa que não encontra restrição equivalente para a acusação. Com base nestas considerações, rejeito a preliminar arguida pela acusação. MÉRITO Conheço o recurso, pois presentes os pressupostos de admissibilidade e processamento, bem como, a tempestividade. Infere-se da peça acusatória que: “(...) no dia 20 de março de 2004, por volta das 15:00 horas, na Fazenda São João, localizada na BR 364, entre o município de Várzea Grande e Jangada, CARLOS SÉRGIO ANDRÉ, vulgo “PEZÃO”; EDINHO; VALDINEI, PARAIBA, TOCANGUIRA e EVANDRO, todos empregados da fazenda e responsáveis pela segurança do local, saíram, como de costume, para fazerem a fiscalização das represas de peixes, utilizando um veículo Saveiro de cor banca (apreendida às fls. 77). Vale dizer que todos os empregados portavam arma de fogo (EDINHO, pistola 380; VALDINEI carabina, calibre 38; PARAÍBA, espingarda, calibre 22; TOCANGUIRA, espingarda calibre 12; e, EVANDRO, revólver, calibre 38), com exceção de CARLOS SÉRGIO ANDRÉ, vulgo “PEZÃO”, que estava na função de “segurança” apenas provisoriamente e utilizava uma lanterna para tanto, sendo certo que foi inicialmente contratado para exercer a função de motorista. A fiscalização nas represas de psicultura normalmente se estendia até por volta das 21:00 horas, quando os seguranças retornavam à sede da fazenda. Assim, ao chegarem a uma das últimas represas, por volta das 20:00 horas, o grupo de empregados se dividiu em dois, cada qual indo para um lado da represa. O primeiro formado por: CARLOS SÉRGIO ANDRÉ, vulgo “PEZÃO”, EDINHO e TOCANGUIRA e o segundo formado por: VALDINEI, PARAÍBA e EVANDRO, oportunidade na qual o segundo grupo localizou as vítimas pescando na represa, efetuando, então, de surpresa, disparos de arma de fogo contra as mesmas, tendo agidos imbuídos de animus necandi e em comunhão de ações e desígnios, restando certo que uma das vítimas (ITAMAR) foi atingida fatalmente e outra na região do abdômen. Ao ouvirem os sons de disparos de arma de fogo, o primeiro grupo de seguranças foi na direção do segundo para verificar o que havia ocorrido. Quando estavam todos juntos e com as vítimas, até aquele momento sobreviventes, já dominadas, sob a mira de armas de fogo e amarradas nas mãos e pés, uma às outras, EDINHO telefonou para JOILSON, um dos administradores da fazenda e irmão de JUNIOR, genro do proprietário, João Arcanjo, narrando o ocorrido. EDINHO, se referindo ao episódio, disse “MATAMOS UMA CAPIVARA!!! E TEM TRÊS AMARRADAS, SE QUISER TRÁS UMA FACA PARA TIRAR O COURO!!!” Ao tomar conhecimento dos fatos JOILSON dirigiu-se até o local, lá chegando por volta das 21h00m em companhia do NORECI FERREIRA GOMES, vulgo "CAPITÃO DO MATO", em uma caminhonete da marca Mitsubishi. Nesse momento JOILSON decidiu mandar afogar as vítimas (Areli, José e Pedro), dizendo “JÁ QUE UM ESTÁ MORTO, TEMOS QUE MATAR OS OUTROS PARA NÃO DEIXAR PISTA”. A macabra e impiedosa ordem dada foi imediatamente cumprida por todos os demais denunciados, inclusive o recém-chegado Noreci, vulgo Capitão do Mato, à exceção de Carlos Sérgio André, vulgo Pezão, os quais amarraram todos os três juntos (Areli, José e Pedro), ainda vivos, e os jogaram na lagoa, sem darem ouvidos aos gritos das mesmas, que clamavam por suas vidas. Passado algum tempo e após tentativas de saírem da água, quando eram impedidas pelos denunciados EVANDRO e ALDERI, as vítimas foram retiradas da água quando todos já estavam mortos. Após a constatação dos óbitos, visando ocultar os cadáveres, os “seguranças”, ora denunciados, colocaram os corpos das vítimas no veículo Saveiro, o qual foi conduzido por CARLOS SÉRGIO ANDRÉ, vulgo “PEZÃO”, acompanhado, na cabine, por PARAÍBA e seguiram rumo a uma estrada de terra, sendo seguidos pela caminhonete de JOILSON, ocasião em que PARAÍBA, VALDINEI, TOCANGUIRA e EDINHO dispensaram o primeiro corpo. Andaram mais um pouco e outro corpo foi jogado na beira da estrada, assim procedendo até que os dois últimos corpos foram jogados à margem da estrada. Registre-se, ainda, que Itamar, morto a tiro, foi vitimado por um ataque de surpresa por parte de VALDINEI, ADERVAL (PARAÍBA) e EVANDRO DE TAL, incidindo estes, portanto, na qualificadora do uso do recurso que impossibilitou a defesa da vítima. Por seu turno, todos os denunciados, cumprindo a ordem dada por JOILSON, à exceção de CARLOS (PEZÃO), ao espancarem as vítimas Pedro, José e Areli, causando-lhes os ferimentos descritos pelos exames necroscópicos de fls.155/159 (Areli), fis.160/164 (José) e fls.166/170 (Pedro), quando já se encontravam dominadas, amarradas e sob mira de armas de fogo, jogando-as na lagoa para que morressem afogadas, incidiram nas qualificadoras de emprego de meio cruel, por causarem às vítimas sofrimento além do necessário, e do uso do recurso que impossibilitou a defesa da vítima. Urge consignar que os homicídios contra as vítimas Pedro, José e Areli, foram praticados para assegurar a impunidade do crime praticado contra ltamar, incidindo seus autores, JOILSON (mandante) e os executores ADERVAL (Paraíba), EDIO (Edinho), ALDERI (Tocanguira), NORECI (Capitão do Mato), VALDINEI (Nei) e EVANDRO (Negão), na qualificadora da conexão, prevista pelo inciso V, § 2°do art. 121 do CP. Por fim, ressai nítida dos autos a existência de uma associação entre todos os denunciados para o fim do cometimento de crimes de lesão corporal e mesmo de homicídio contra qualquer pessoa, até mesmo empregados da fazenda que pescasse nos tanques destinados à psicultura, sendo que, quem ousasse fazê-lo, era brutalmente espancado e, depois, era lhe aplicado uma “salmora”. (id. 155439675)” De proêmio, convém registrar que, em observância ao Princípio da Soberania dos Vereditos do Júri, consagrado no art. 5º, inciso XXXVIII, alínea “c”, da Constituição Federal, a decisão do Conselho de Sentença deve ser preservada, somente se admitindo a cassação ou anulação quando manifestamente contrária às provas dos autos (art. 593, III, d, do CPP), ou seja, quando totalmente divorciada do conjunto probatório. Sobre a matéria, o Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que: “a quebra da soberania dos veredictos é apenas admitida em hipóteses excepcionais, em que a decisão do Júri for manifestamente dissociada do contexto probatório, hipótese em que o Tribunal de Justiça está autorizado a determinar novo julgamento” (AgRg no AREsp 1632897/RS, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 16/06/2020). No caso em apreço, ao contrário do que manifestado pela defesa, a decisão exarada pelo Conselho de Sentença não está desamparada de elementos probatórios, ao revés, há expressivo acervo fático a subsidiá-la, em especial pelo Boletim de Ocorrência (Id. 155439393 – Pág. 18/20), pela Certidões de Óbito (Id. 155439395 – Pág. 31/39), pelo Laudo Pericial nº 02-06-001741/2004 (Id. 155439396 – Pág. 18/30), pelos laudos de necropsia das vítimas (id. 155439396 – 31/51), pelos relatórios policiais (id. 155439397 - pág. 20/29, 32/37), além da prova oral produzida. O apelante não foi ouvido na fase extrajudicial, uma vez que se encontrava foragido. Em plenário, o apelante Joilson James Queiroz, negou a prática delitiva, alegando que não trabalhava na Fazenda São João, embora a frequentasse eventualmente, em razão de seu irmão ser genro do proprietário. Afirmou que, na data dos fatos, teria recebido uma ligação do senhor Edinho, que lhe comunicou haver abatido uma capivara e solicitado ajuda para retirar o couro do animal, considerando que costumava caçar na região e possuía experiência com esse tipo de atividade. Relatou que, ao chegar ao local indicado, deparou-se com todas as vítimas já mortas e com um ambiente de tensão, momento em que foi abordado pelos corréus, os quais lhe exigiram dinheiro para facilitar a fuga. Declarou que recusou entregar qualquer quantia, mas que, diante do receio por sua própria vida, sentiu-se pressionado a acompanhar o grupo no descarte dos corpos, temendo sofrer represálias caso se recusasse. Por fim, afirmou que sua participação não foi voluntária, acrescentando que utilizou, por dezoito anos, o nome José Eli Queiroz e, ao ser questionado sobre eventual solicitação de óleo diesel e pneu ao senhor Sebastião Ventura, respondeu não se recordar. Em sede extrajudicial, a testemunha Sebastião Ventura da Silva, declarou que na madrugada do dia 21 de março de 2004, foi acordada por JOILSON, irmão de JÚNIOR, genro de João Arcanjo Ribeiro, o qual lhe perguntou se havia óleo diesel disponível, momento que informou que não teria, explicando que o combustível havia sido colocado no trator. Relatou ainda, que o apelante Joilson era uma das poucas pessoas que possuíam as chaves dos cadeados que trancavam os acessos da fazenda, junto com outros funcionários. Vejamos o depoimento: “(...) Que no Sábado dia 20/03/2004 saíram da sede da fazenda "EDINHO, PARAÍBA, VALDINEI, TOCANGUIRA e EVANDRO para fazer a ronda de rotina; Que depoente achou estranho que nesse dia os indivíduos citados não retornaram no horário de costume, sendo que só retornaram no Domingo dia 21/03/2002 por volta das 04:00hs da manhã; Que o depoente foi acordado por "JOILSON", irmão de JÚNIOR, genro de João Arcanjo Ribeiro; Que JOILSON perguntou ao depoente: " BASTIÃO TEM ÓLEO DIESEL?" e o depoente respondeu: " NÃO TEM ÓLEO, O ÓLEO EU COLOQUEI NO TRATOR"(...); Que nesse momento o depoente ouviu vozes no barracão que fica próximo das casas onde os empregados moram; (...) Que o depoente achou estranho o JOILSON estar esse horário na fazenda São João sendo que o mesmo mora na fazenda OÁSIS que fica á 70 KM (setenta quilômetros) de Cuiabá na BR 163, sentido Serra de São Vicente; Que JOILSON estava em uma caminhonete MITISUBISH de cor chumbo; Que JOILSON não costuma frequentar a fazenda esse horário, causando com isso muita estranheza ao depoente; Que a fazenda SÃO JOÃO tem duas entradas, uma fica na BR 364 e a outra entrada fica na Passagem da Conceição; Que as duas entradas que dá acesso a fazenda fica trancada no cadeado; Que quem possui as chaves dos cadeados são as pessoas de JOILSON, JÚNIOR, EDINHO, PARAÍBA, VALDINEI, TOCANGUIRA e EVANDRO;(...) Que após a ida dos policiais na referida fazenda o depoente desconfiou que algo de estranho aconteceu na madrugada do dia 20 para o dia 21 na fazenda pois a presença do JOILSON fora de hora na fazenda, causou muita estranheza ao depoente , e também a ida dos segurança para Cuiabá retornado como de costume, deixando a fazenda sem nenhum SEGURANÇA; (...) que se depoente ou qualquer outro empregado forem pegos pescando na ferida fazenda iria levar" UMA SALMORA", ou seja uma SURRA, pois eram ameaçados constantemente de morte.(sic) (155439394 - Pag. 32/35) Em juízo, o corréu Carlos Sérgio André, “vulgo pezão”, afirmou que na data dos fatos integrava a equipe de segurança encarregada de realizar rondas nas represas localizadas na propriedade rural denominada Fazenda São João, o qual relatou que entre os integrantes do grupo era o único que não possuía arma de fogo. Declarou que, a equipe foi dividida em dois grupos, sendo um composto por ele, Édio Gomes Júnior e Alderi de Souza Ferreira (conhecido como Tocanguira), e o outro pelos réus Valdinei Luiz Ademias da Silva, Evandro (vulgo Negão) e Aderval José dos Santos (vulgo Paraíba), os quais passaram a patrulhar áreas opostas da propriedade. Afirmou que, durante a ronda, ouviu disparos de arma de fogo vindos da direção onde se encontrava o outro grupo, razão pela qual se dirigiu até o local com seus companheiros e ao chegar no local encontrou a vítima Itamar já sem vida, enquanto Pedro, José e Areli estavam amarrados e sob ameaça, rendidos pelos demais acusados. Acrescentou que, diante da morte de Itamar, Édio ou Valdinei teria feito uma ligação para o corréu Joilson, então gerente da fazenda, a fim de receber instruções sobre como proceder, que nesse momento o apelante compareceu ao local acompanhado de Noreci e, ao tomar ciência dos fatos, ordenou que os sobreviventes fossem afogados, o que teria sido cumprido pelos presentes. Por fim, declarou que, após a execução, Édio buscou um veículo VW Saveiro, onde os corpos das quatro vítimas foram colocados e, posteriormente, descartados à margem da estrada situada fora dos limites da Fazenda São João. O corréu Aderval José dos Santos, “vulgo Paraíba”, em juízo, apresentou versão semelhante àquela prestada pelo corréu Carlos Sérgio André, afirmando que também integrava a equipe de segurança responsável por realizar rondas nas represas da Fazenda São João, na data dos fatos. Informou que, durante a ronda, os integrantes de seu grupo encontraram quatro pessoas pescando na represa e, embora tivesse sido combinado que, em caso de necessidade, os disparos seriam efetuados para o alto, duas das vítimas acabaram sendo atingidas, sendo que uma delas, o senhor Itamar, veio a óbito em razão dos ferimentos. Acrescentou que, ao ouvirem os disparos, os réus Carlos, Alderi e Édio se deslocaram até o local, onde amarraram as vítimas sobreviventes. Relatou ainda, que Édio, ao tomar ciência da morte de Itamar, entrou em contato com o apelante, gerente da fazenda, utilizando linguagem codificada para informá-lo da situação, dizendo que havia uma capivara morta e três amarradas, solicitando que levasse a faca, e cerca de uma hora e meia depois, o apelante teria chegado ao local acompanhado do corréu Noreci. Esclareceu que, nesse momento, Édio teria consultado Joilson sobre o que fazer com as vítimas, ocasião em que ambos teriam decidido que Pedro, José e Areli deveriam ser mortos por afogamento, a fim de evitar que testemunhas revelassem o homicídio ocorrido. Por fim, afirmou que foi o próprio Joilson quem determinou o trajeto a ser seguido para a desova e que ele seria o responsável por assegurar a proteção dos participantes da ação criminosa. Durante o julgamento realizado em 17/11/2010, em plenário do Tribunal do Júri, o corréu Noreci Ferreira Gomes, “vulgo capitão do mato”, declarou que, à época dos fatos, não trabalhava na Fazenda São João, tendo ido ao local apenas como acompanhante do apelante Joilson, que o teria convidado sob o pretexto de retirar o couro de algumas capivaras. Informou que, ao chegar à propriedade rural, deparou-se com dois pescadores já mortos e outros dois amarrados, ocasião em que o apelante Joilson teria determinado ao corréu “Edinho” que finalizasse a ação criminosa e providenciasse a retirada dos corpos da fazenda. Afirmou que não presenciou diretamente a morte das demais vítimas, pois teria retornado ao veículo, contudo, mesmo à distância, conseguia visualizar o apelante e “Edinho” ordenando que as vítimas fossem afogadas, sendo possível, inclusive, ouvir os pedidos de socorro emitidos por elas. Por fim, acrescentou que os corpos das vítimas foram colocados na carroceria de uma caminhonete Saveiro e transportados por uma estrada que passa em frente à fazenda. Durante o julgamento realizado em 17/11/2010, em plenário do Tribunal do Júri, o corréu Valdinei Luiz Ademias da Silva afirmou que, à época dos fatos, integrava a equipe de segurança da Fazenda São João, responsável por realizar rondas nas lagoas da propriedade, e que, no dia do ocorrido, os envolvidos foram divididos em duas equipes, as quais, durante as rondas, constataram a presença das vítimas e ordenaram que parassem, momento em que ocorreram disparos de arma de fogo. Declarou que uma das vítimas foi atingida fatalmente, enquanto outra, embora ferida na região abdominal, permaneceu consciente, e que ambas foram amarradas pelos autores, sendo que, diante da situação, Édio entrou em contato telefônico com Joilson, gerente da fazenda à época, para que este decidisse o que deveria ser feito, tendo dito, durante a ligação, que “as capivaras já estavam amarradas”, ocasião em que, após certo tempo, chegaram ao local o apelante Joilson e o corréu Noreci. Afirmou que, ambos determinaram que as vítimas amarradas fossem lançadas na represa para que morressem afogadas e, diante da resistência delas, Joilson ordenou aos corréus Alderi, Aderval e Evandro que interviessem e as afundassem, o que foi cumprido e resultou na morte das vítimas, acrescentando que chegou a receber ordem direta do apelante para entrar na água e garantir a morte de uma das vítimas que “não queria morrer”, mas recusou-se a obedecer. Por fim, afirmou que, os corpos foram colocados na carroceria de um veículo Saveiro e descartados às margens de uma estrada de terra que passa em frente à Fazenda São João, tudo com a participação de todos os envolvidos. Em plenário, a testemunha Bento Bortoloti Delgado, escrivão da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), afirmou que, após o desaparecimento de quatro pessoas no dia 20, seus corpos foram encontrados entre os dias 21 e 22, o que deu início à investigação conduzida pela especializada. Durante as diligências, apurou-se que Nildo, irmão de um dos envolvidos, informou que seu irmão havia confessado o assassinato de uma das vítimas por disparo de arma de fogo, enquanto as outras três teriam sido afogadas. Declarou que, posteriormente, o réu conhecido como Paraíba apresentou-se espontaneamente na delegacia e revelou que o apelante Joílson, identificado como gerente da fazenda à época, havia sido contatado por Edinho logo após o homicídio do primeiro indivíduo, ocasião em que, utilizando um código previamente estabelecido entre os envolvidos, este comunicou que havia “uma capivara morta e três amarradas”, expressão usada para se referir às vítimas. Relatou ainda, que, o apelante Joílson compareceu ao local aproximadamente duas horas após a ligação, com o veículo de Aderval, momento em que teria determinado a execução das demais vítimas, com o objetivo de eliminar quaisquer vestígios do crime, sendo que as vítimas, ainda amarradas, foram afogadas com violência, e os corpos transportados em uma caminhonete até serem descartados em pontos distintos da estrada. Por fim, afirmou que Joílson ordenou que cada corpo fosse deixado a uma distância aproximada de um quilômetro do outro, tendo como motivação o receio de que os sobreviventes pudessem denunciar os autores, ressaltando que, segundo apurado, atos de violência contra invasores da fazenda eram práticas recorrentes e que o apelante exercia nítida posição de liderança sobre os demais envolvidos. Esse é o contexto probatório retratado nos autos. RECURSO DA DEFESA A defesa pleiteia a anulação do julgamento realizado pelo Tribunal do Júri, argumentando que a decisão dos jurados foi manifestamente contrária às provas dos autos, e que as qualificadoras admitidas pelo conselho de sentença não se acham comprovados nos autos. Subsidiariamente, pleiteia a reforma da dosimetria da pena, com fixação da pena-base no patamar mínimo previsto em abstrato, ou, alternativamente, a aplicação do art. 580 do CPP, com extensão dos efeitos da sentença proferida em favor do corréu Noreci Ferreira Gomes, que teria sido condenado a 25 anos de reclusão por conduta fático-processual semelhante. Assim sendo, verifica-se que, ao revés do que foi sustentado pela defesa, há elementos probatórios consistentes, demonstrando que o apelante determinou a morte das vítimas, assumindo posição de comando nas ações executadas pelos demais corréus. Os elementos probatórios constantes nos autos evidenciam, de forma clara, a atuação dolosa, consciente e voluntária do apelante na prática dos homicídios qualificados, revelando, ainda, o domínio sobre os fatos e sua participação direta nas decisões que culminaram com a execução das vítimas. O Tribunal do Júri acolheu a versão de que o apelante, ao ser informado sobre a morte de uma das vítimas, compareceu ao local dos fatos, assumiu o controle da situação e, de forma deliberada, determinou a execução das demais vítimas, as quais estavam rendidas e amarradas, afastando-se, com isso, qualquer alegação de coação moral irresistível ou de participação não voluntária. A atuação do recorrente não foi pautada por medo, impulso ou instinto de autopreservação, mas por vontade livre e consciente de eliminar testemunhas, o que foi corroborado de forma uníssona pelos demais corréus e pelas provas produzidas em juízo, refutando por completo a tese defensiva de ausência de dolo ou de mera colaboração forçada. A análise da dinâmica dos fatos, aliada às declarações das testemunhas oculares, bem como, ao conjunto probatório constante nos autos, confirma a autoria dos homicídios por parte do réu, afastando qualquer dúvida razoável sobre os elementos materiais e subjetivos do tipo penal. No tocante à qualificadora do motivo torpe (art. 121, § 2º, II, do CP), verifica-se que o acervo probatório colhido, em especial os depoimentos prestados pelos corréus e testemunhas, permite concluir que a execução das vítimas decorreu do propósito deliberado de ocultar o homicídio previamente consumado, além de evitar a responsabilização penal dos autores, sendo motivada exclusivamente pelo receio de que as vítimas sobreviventes denunciassem o crime às autoridades, o que demonstra ausência absoluta de justificativa moral ou social para o desfecho letal. Quanto à qualificadora do emprego de meio cruel (art. 121, § 2º, III, do CP), igualmente se mostra caracterizada, uma vez que as vítimas sobreviventes foram lançadas à represa ainda com as mãos amarradas, tendo sido afogadas de forma violenta, em ato que lhes causou intenso sofrimento físico e psicológico. Conforme declarado por corréus e registrado nos autos, algumas vítimas clamavam por socorro antes de submergirem, o que evidencia a natureza atroz e desumana do método empregado para ceifar suas vidas. Em relação à qualificadora do recurso que dificultou a defesa das vítimas (art. 121, § 2º, IV, do CP), restou igualmente comprovado que a execução foi praticada de forma a impedir qualquer reação por parte das vítimas, que se encontravam rendidas, desarmadas e fisicamente imobilizadas por amarras. A condição de vulnerabilidade absoluta das vítimas inviabilizou qualquer possibilidade de resistência, configurando o emprego de recurso que dificultou, ou até mesmo impossibilitou, a sua defesa. Por fim, no que se refere à qualificadora para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime (art. 121, § 2º, V, do CP), verifica-se que os homicídios das três vítimas sobreviventes foram cometidos com o propósito evidente de garantir a impunidade do crime previamente praticado contra a primeira vítima. O conjunto probatório demonstra que a eliminação dos sobreviventes foi deliberadamente ordenada com o intuito de impedir que os fatos fossem levados ao conhecimento das autoridades, assegurando o silenciamento das testemunhas e dificultando qualquer apuração oficial, circunstância que evidencia o dolo específico necessário à incidência da referida qualificadora. Como já mencionado, a decisão entendida como manifestamente contrária à prova dos autos é aquela em que o Conselho de Sentença despreza completamente o conjunto probatório, conduzindo a um resultado dissociado da realidade apresentada nos autos, o que não se vislumbra no caso presente. Havendo versões contraditórias e uma sendo a escolhida, há que se respeitar a manifestação soberana do Tribunal do Júri, que é o juiz natural da causa, previsto constitucionalmente. Em sendo assim, coexistindo teses opostas e havendo coerência na escolha de uma delas pelo Júri Popular, é vedado ao Tribunal ad quem cassar a decisão proferida pelo Conselho de Sentença, sob pena de ofender o princípio da soberania dos vereditos, previsto no art. 5.º, inc. XXXVIII, alínea “c”, da Constituição Federal. Nesse sentido é o entendimento pacificado neste Egrégio Tribunal de Justiça, consoante se depreende do Enunciado n.º 13 da Jurisprudência Uniformizada da Colenda Turma de Câmaras Criminais Reunidas, in verbis: “Não se caracteriza como manifestamente contrária à prova dos autos a decisão que, optando por uma das versões trazidas a plenário do Tribunal do Júri, não se encontra inteiramente divorciada do conjunto fático-probatório existente no processo”. Nesse contexto, nota-se que a decisão do Conselho de Sentença está amparada pelas provas dos autos e, portanto, não há que se cogitar em nulidade por decisão contrária à prova dos autos. Conclusivamente, entendo que a decisão dos jurados, está baseada em prova contida nos autos, de maneira que não há que se falar em submissão do apelante a novo julgamento pelo Conselho de Sentença. Subsidiariamente, a Defesa do apelante pleiteia a retificação da dosimetria pena, sob o fundamento de ausência de fundamentação idônea para a exasperação da pena-base. Para a adequada análise dos fatos, transcrevo o teor da sentença, na parte que interessa: “(...) A culpabilidade é natural do tipo; o réu registra antecedentes maculados, consubstanciado na condenação registrada na ação penal n°. 0001072-49.2022.8.01.0001, tendo operado o trânsito em julgado em 11/07/2022; não há elementos para se aferir a personalidade e a conduta social do acusado; os motivos e as circunstâncias dos delitos já figuram como qualificadoras e não poderão ser sopesadas nesta fase de dosimetria; as consequências dos delitos são as ordinárias do tipo penal; os comportamentos das vítimas não justificam a desproporcional reação que culminou nas práticas criminosas. Assim, considerando a existência de circunstância judicial desfavorável, consistente em maus antecedentes, caracterizado por uma condenação definitiva, fixo a pena basilar em 14 (quatorze) anos de reclusão. (...) (sic) (id. 207639757)” A sentença apresentou fundamentação suficiente e objetiva para justificar a elevação da pena-base, com base nos critérios do art. 59 do Código Penal, ao reconhecer a existência de maus antecedentes em razão de condenação penal transitada em julgado antes da prolação da sentença ora impugnada, embora os fatos daquela condenação sejam posteriores aos ora analisados. Conforme orientação pacífica do Superior Tribunal de Justiça, a condenação definitiva anterior à sentença, ainda que se refira a fato ocorrido posteriormente ao crime julgado, pode ser validamente considerada como circunstância judicial negativa, apta a caracterizar maus antecedentes, desde que não usada para configurar reincidência, como no presente caso. A majoração da pena-base em 02 (dois) anos, sobre o mínimo legal de 12 (doze) anos, correspondente à fração de 1/6 (um sexto), mostra-se proporcional, moderada e em conformidade com os parâmetros jurisprudenciais para o reconhecimento de apenas uma circunstância judicial desfavorável. Desse modo, não há nulidade ou desproporcionalidade na dosimetria fixada, razão pela qual não merece acolhimento o pedido subsidiário da Defesa quanto à redução da pena-base. Quanto ao pedido subsidiário da defesa, requerendo a aplicação do art. 580 do Código de Processo Penal, com a extensão dos efeitos da sentença proferida em favor do corréu Noreci Ferreira Gomes, condenado na Ação Penal n. 09/2004 à pena de 25 anos de reclusão, sob alegação de similitude fático-processual, não merece acolhimento. Nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal, a extensão de decisão favorável a corréu é admitida apenas quando inexistirem circunstâncias de caráter exclusivamente pessoal e os réus se encontrem em idêntica situação fático-processual, o que não se verifica no presente caso. Com efeito, na Ação Penal n. 09/2004, a condenação de Noreci Ferreira Gomes, foi fundamentada em critérios de política criminal e em circunstâncias subjetivas favoráveis, como a constituição de família, profissão definida e mudança de conduta, o que permitiu a aplicação da fração de 2/3 (dois terços) para o aumento da pena pelo crime continuado. Vejamos: “(...) Considerando que foram três os crimes dolosos contra a vida, cometidos nas mesas circunstâncias de tempo, modo, meios de execução e finalidade, por medida de política criminal e tão somente por este motivo; considerando que hoje o acusado tem família, profissão definida e uma outra maneira de vida, acrescento à pena de quinze anos encontrada para o primeiro homicídio, da fração de dois terços, sendo esta a maior fração cominada pelo Direito Penal aos casos de concurso de crimes. Encontro a pena total de vinte e cinco (25) anos de reclusão, que transformo em definitiva, ante a ausência de outras causas e circunstâncias modificadoras. Para a ocultação, estabeleço a pena base em um (01) ano e dois (02) meses de reclusão e quinze (15) dias multa. Não há circunstâncias legais a serem consideradas. Acrescento a fração de um terço, em virtude da continuidade delitiva, considerando que foram quatro as vítimas deste crime. Encontro a pena definitiva de um (01) ano, seis (06) meses e vinte (20) dias de reclusão e vinte (20) dias-multa. Para o crime de associação encontro a pena base no mínimo legal de um (01) ano de reclusão. Não há circunstâncias legais a serem consideradas. Idem quanto às causas de diminuição e aumento. (...) (sic) (Ação Penal 09/2004, Código 66767 – Primeira Vara Criminal de Várzea Grande) De modo diverso, a sentença imposta ao apelante majorou a pena com base em elementos significativamente mais gravosos, como a motivação desproporcional dos homicídios, os antecedentes criminais desfavoráveis e a forma de execução dos crimes. Com fundamento no parágrafo único do art. 71 do Código Penal, o juízo de origem aplicou a fração máxima de aumento, o dobro, fixando, ao final, a pena definitiva em 46 anos de reclusão. Acrescente-se que o apelante permaneceu foragido por 18 anos, período em que se mudou para o Estado do Acre, passou a frequentar uma igreja e construiu nova vida, utilizando nome falso e ocultando deliberadamente sua verdadeira identidade. Em plenário, ao ser interrogado durante o julgamento pelo Tribunal do Júri, reconheceu que não estava sendo ameaçado e admitiu que decidiu aguardar o decurso de 20 anos para retornar ao Estado de Mato Grosso, acreditando que, ao fim desse período, o crime estaria prescrito. Essa conduta evidencia o propósito consciente de evadir-se da persecução penal e demonstra uma trajetória processual e comportamental que se distancia radicalmente daquela atribuída ao corréu, cuja redução de pena decorreu de elementos favoráveis de reintegração social. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica ao firmar que a extensão de efeitos benéficos de sentença depende de identidade de fundamentos e da inexistência de elementos pessoais que justifiquem distinção: "Nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal, a decisão judicial benéfica a um dos corréus deve ser estendida aos demais que se encontrem em idêntica situação fático-processual, quando inexistirem circunstâncias de caráter exclusivamente pessoal que justifiquem a diferenciação." (STJ, PExt no AgRg no HC 776112/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe 14/04/2023) Diante disso, não há respaldo legal para o acolhimento do pleito da defesa, tendo em vista a ausência de paridade entre os elementos que embasaram a dosimetria da pena aplicada aos réus. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO O parquet requer o reconhecimento do concurso formal impróprio ou imperfeito entre os homicídios qualificados, nos moldes do art. 70, caput, parte final, do Código Penal, sob o argumento de que houve desígnios autônomos e vontade deliberada de praticar cada um dos crimes, não sendo cabível a exasperação única da pena como se derivassem de um mesmo contexto de ação unívoca. Razão lhe assiste. No caso em tela, embora o juiz a quo tenha aplicado a regra da continuidade delitiva, entendo que deve incidir a regra do concurso formal impróprio. No concurso formal impróprio (ou imperfeito), a conduta dolosa do agente e os crimes concorrentes derivam de desígnios autônomos, ou seja, o agente almeja a produção de todos os resultados. Conforme o doutrinador Cleber Masson, o concurso formal impróprio ou imperfeito, previsto na parte final do art. 70 do Código Penal, ocorre quando o agente, mediante uma única conduta, prática dois ou mais crimes, com desígnios autônomos, ou seja, com intenção dolosa e distinta em relação a cada resultado. Ainda que a ação seja una, a vontade do agente se dirige a múltiplas vítimas ou bens jurídicos, tornando incabível a exasperação da pena, aplicando-se, nesse caso, a regra do cúmulo material (MASSON, Cleber, Direito Penal - Parte Geral (arts. 1º a 120) - Vol. 1 - 19ª Edição 2025, p.628). Por outro lado, a continuidade delitiva, disciplinada no art. 71, caput, do Código Penal, pressupõe a pluralidade de condutas que resultam em crimes da mesma espécie, praticados em condições semelhantes de tempo, lugar, modo de execução e outras circunstâncias análogas. Trata-se de ficção jurídica favorável ao réu, que permite o tratamento penal mais benéfico, aplicando-se uma só das penas, aumentada de um sexto até dois terços, como se os delitos posteriores fossem mera continuação do primeiro (MASSON, Cleber, Direito Penal - Parte Geral (arts. 1º a 120) - Vol. 1 - 19ª Edição 2025, p.629). O art. 70, caput, do Código Penal prevê o concurso formal de crimes, sendo a segunda parte destinada ao concurso formal improprio ou imperfeito: “Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, prática dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.” No caso em apreço, o acervo probatório colacionado aos autos demonstra que o apelante tinha a intenção deliberada de matar Pedro Francisco da Silva, José Ferreira de Almeida e Areli Manoel de Oliveira, revelando dolo direto em relação às três vítimas. Com base nos depoimentos colhidos ao longo da instrução, extrai-se que o apelado Joílson agiu com desígnios autônomos, o que afasta a aplicação da continuidade delitiva e impõe o reconhecimento do concurso formal impróprio, nos moldes do art. 70, caput, do Código Penal. As declarações prestadas pelos corréus são harmônicas no sentido de que o apelado foi informado sobre a morte da primeira vítima por ligação telefônica realizada por “Edinho”. Após tomar ciência do ocorrido, Joílson deslocou-se até a fazenda e, de forma consciente e deliberada, assumiu o comando da ação criminosa. Constatando a presença de sobreviventes, determinou que fossem mortos por afogamento, ordem que foi prontamente executada pelos demais envolvidos. Ainda que os crimes tenham sido perpetrados em sequência temporal e espacial próxima, não se identifica unidade de desígnio ou continuidade subjetiva. Ao contrário, verifica-se que o apelante, ao se inteirar da situação, deliberou de forma autônoma e específica pela eliminação das testemunhas, dirigindo sua vontade dolosa a cada um dos resultados. A existência de decisões distintas e a individualização da intenção homicida em relação a cada vítima impedem o reconhecimento da continuidade delitiva, que exige pluralidade de condutas e circunstâncias objetivas semelhantes de tempo, lugar e modo de execução, conforme estabelece o art. 71 do Código Penal. Nesse sentido, coleciono jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal de justiça: “(...) 1. O Tribunal estadual, apreciando o conjunto fático-probatório, entendeu configurado o concurso formal impróprio. Descreveu que "o réu, que estava em companhia das três vítimas na varanda de sua casa, se apoderou de um podão e desferiu diversos golpes contra cada uma delas. Tal contexto revela que ele agiu com animus necandi em relação às três vítimas, tendo sido a morte delas parte de um plano delitivo comum, que se fracionou em vários atos", concluindo restar caracterizada a atuação subjetiva mediante desígnios autônomos. (...) (STJ - AgRg no HC: 915030 MG 2024/0181859-2, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 02/09/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/09/2024) (...) Não há como substituir o concurso formal por continuidade delitiva, já que as tentativas de homicídio praticadas possuíam desígnios autônomos. (...) (N.U 1000170-92.2021.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 04/03/2024, publicado no DJE 04/03/2024) (...) 4. O concurso formal impróprio resta caracterizado quando a ação única do agente for dolosa e ele tiver desígnios autônomos quanto aos dois ou mais resultados, isto é, se ele tiver intensão (dolo direto) ou assumir o risco (dolo eventual) de produzir ambos ou, mais resultados. (...) (N.U 1001179-76.2023.8.11.0029, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 08/10/2024, publicado no DJE 08/10/2024) (...) O recorrente, condenado por dois homicídios qualificados, almeja a reforma da sentença a fim de alterar a dosimetria da pena, sob alegação de que o concurso entre os crimes deveria ser classificado como concurso próprio. Portanto, as circunstâncias fáticas e probatórias restam evidenciadas, fato que os homicídios foram cometidos possuem designo autônomo, não havendo que se falar em concurso formal próprio. Sobre a análise da dosimetria da pena consta corretamente, sendo o concurso formal na modalidade imprópria assim, configurando com a aplicação de sanções adequadas. (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 00008092720138110042, Relator.: RUI RAMOS RIBEIRO, Data de Julgamento: 22/04/2025, Segunda Câmara Criminal, Data de Publicação: 25/04/2025) Diante do exposto, impõe-se o reconhecimento do concurso formal impróprio, com a consequente soma das penas aplicáveis a cada homicídio Passo à nova dosimetria da pena do apelado JOILSON JAMES QUEIROZ. Delito tipificado no art. 121, § 2º, incisos II, III, IV e V, do Código Penal: Pena de detenção, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos de reclusão. 1 - Primeira fase: Circunstâncias judiciais (art. 59 do Código Penal). A culpabilidade do acusado, diante do modo pelo qual o delito foi praticado, é normal e inerente ao tipo penal infringido. O acusado registra antecedentes criminais, sendo reincidente, conforme demonstram as certidões carreadas aos autos. A conduta social pode ser tida como normal. Os motivos e as consequências são inerentes ao próprio tipo infringido e o comportamento da vítima não contribuiu para a prática do crime. Quanto às circunstâncias do crime, não há nada a indicar uma maior exasperação da pena. Tudo isso sopesado, fixo a pena-base em 14 (quatorze) anos de reclusão. 2 - Segunda fase - Circunstâncias legais (arts. 61, 62, 65 e 67 do Código Penal): Considerando, que estão presentes: a) a agravante do crime praticado com emprego de meio cruel (art. 61, II, ‘d’, do CP); b) a agravante do crime praticado mediante recurso que dificultou a defesa da vítima (art. 61, II, ‘c’, do CP); c) a agravante do crime praticado para assegurar a impunidade de outro crime (art. 61, II, ‘b’, do CP); e d) agravante expressa no art. 62, III, do CP, na medida em que a ordem para o afogamento das três vítimas (Areli, José e Pedro) foi emanada diretamente pelo réu, na qualidade de gerente da propriedade rural, aos seus subordinados. Assim, ficando a pena em 23 (vinte e três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão. 3 - Terceira fase: Circunstâncias Especiais de Aumento e/ou Diminuição da Pena (art. 68, parágrafo único, do Código Penal): Observa-se que ausentes causas modificativas, torno a pena definitiva 23 (vinte e três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão. Passo a analisar o concurso de crimes: Embora inicialmente tenha sido reconhecida a continuidade delitiva, conforme já fundamentado neste voto, trata-se, na verdade, de hipótese de concurso formal impróprio, nos termos da parte final do art. 70 do Código Penal. Dessa forma, procede-se à soma das penas fixadas para cada um dos três homicídios qualificados, totalizando a pena definitiva em 70 (setenta) anos de reclusão. Conclusivamente, fixo o regime FECHADO, para início de cumprimento da pena, por decorrência legal, com fundamento no art. 33, § 2º, alínea “a”, do Código Penal. Diante do exposto, CONHEÇO o recurso interposto pelo acusado JOILSON JAMES QUEIROZ e, NEGO-LHE PROVIMENTO. Quanto ao recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, DOU-LHE PROVIMENTO para aplicar o concurso formal impróprio, redimensionando a pena do acusado para 70 (setenta) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025
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