Processo nº 1002240-10.2024.8.11.0005
ID: 334942581
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1002240-10.2024.8.11.0005
Data de Disponibilização:
25/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002240-10.2024.8.11.0005 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Indenização por Dano Material…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002240-10.2024.8.11.0005 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Indenização por Dano Material, Interpretação / Revisão de Contrato, Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [DIOMILCE MARLI SILVA COLLA - CPF: 474.119.371-34 (APELANTE), LUCIANA OLIVEIRA CARVALHO - CPF: 736.895.481-87 (ADVOGADO), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (APELADO), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE(S): DIOMILCE MARLI SILVA COLLA. APELADO(S): BANCO PAN S.A. EMENTA: DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC). CONTRATAÇÃO REGULAR. TRANSCURSO DE LONGO LAPSO TEMPORAL. BOA-FÉ OBJETIVA. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de Apelação interposto por consumidora visando à declaração de nulidade de contrato de cartão de crédito consignado (RMC), firmado em 2009, sob a alegação de vício de consentimento, com pedidos de indenização por danos morais e repetição de indébito. Sentença de primeiro grau que julgou improcedentes os pedidos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se a contratação do cartão de crédito consignado ocorreu com vício de consentimento por erro; (ii) saber se há direito à repetição de indébito diante dos descontos efetuados em folha; (iii) saber se houve falha no dever de informação por parte da instituição financeira; (iv) saber se há responsabilidade civil por dano moral decorrente da contratação impugnada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os documentos constantes nos autos comprovam que a contratação foi realizada mediante ficha cadastral com indicação clara da modalidade "cartão de crédito consignado", assinada pela autora, inexistindo vício de consentimento. 4. O lapso temporal de 15 anos entre a contratação e o ajuizamento da demanda caracteriza a aplicação da teoria da supressio, reforçando a estabilização do vínculo contratual e a presunção de ciência da parte contratante. 5. A conduta da parte autora, que utilizou o crédito por longo período e apenas após anos passou a questionar sua validade, configura comportamento contraditório vedado pela boa-fé objetiva (venire contra factum proprium). 6. Ausente comprovação de dano extrapatrimonial ou de cobrança indevida apta a ensejar indenização por dano moral. 7. Inexistindo pagamento indevido ou cobrança abusiva demonstrada, descabe a restituição de valores. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso de Apelação desprovido. Tese de julgamento: "1. A contratação de cartão de crédito consignado com autorização expressa para desconto em folha, quando realizada mediante instrumento formal e sem vício de consentimento, é válida e eficaz, não ensejando nulidade nem repetição de indébito. 2. A longa inércia do consumidor em questionar a avença contratual, diante da ausência de irregularidade flagrante, autoriza a incidência da teoria da supressio e da vedação ao comportamento contraditório." Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III e 14, §3º; CC/2002, arts. 113, 187 e 422; CPC/2015, arts. 373, II, e 487, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.509.952/MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 02.12.2019 – reafirmação da inexistência de falha quando há assinatura expressa e transparência mínima; STJ, REsp 1.717.144/SP, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 4ª Turma, j. 14.12.2021; STJ, AgInt no AREsp 1.795.243/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 09.06.2021; TJMT, ApC 1001598-74.2023.8.11.0004, Rel. Des. Marilsen Andrade Addario, j. 03.04.2024; TJMT, ApC 1007736-85.2022.8.11.0006, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 08.11.2023; TJMT, Apelação Cível nº 1000357-57.2023.8.11.0041 Rel.ª Des.ª Antônia Siqueira Gonçalves, j. 29.11.2023. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Diamantino, que, nos autos da Ação Declaratória n. 1002240-10.2024.8.11.0005, julgou improcedentes os pedidos contidos na exordial, que visava a declaração de nulidade do contrato de cartão de crédito consignado, bem como, a condenação do banco apelado em danos morais e, ainda a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente, nos seguintes moldes: “[...] Sem delongas, o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor, fundada na teoria do risco da atividade. Além disso, se o consumidor nega a responsabilidade pela obrigação em discussão, por se tratar de dívida inexigível, compete à parte reclamada comprovar a sua validade, ônus que se desincumbiu a teor do disposto no art. 373, II, do Código de Processo Civil. Ex positis, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos iniciais, nos moldes do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. CONDENO a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que nos termos do art. 85, §2º, do CPC, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, cuja cobrança fica suspensa em razão do deferimento de justiça gratuita, nos termos do §3º, do art. 98 do CPC.” (grifo nosso). O Apelante, em suas razões de recurso, aponta os seguintes argumentos de reforma: 1. Evidente indução a erro no momento da contratação, uma vez ter contratado pensando ser empréstimo consignado e não cartão de crédito consignado, mormente por sua falta de instrução; 2. Da não utilização do cartão plástico. 3. Conduta evidentemente ilícita que impõe ao Apelado o dever de indenizar em danos morais e materiais; 4. Da devolução do excedente descontado a título de juros remuneratórios na modalidade cartão de crédito consignado – Fixação conforme a média da Taxa de Juros do empréstimo consignado. 5. Pleiteia a condenação do banco apelado em repetição do indébito. Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de que seja reformada a sentença atacada para fins de julgar procedentes os pedidos da inicial, determinando a conversão do contrato entabulado entre as partes e condenar o Apelado ao pagamento de danos. (ID. 296571879) A parte apelada apresentou suas contrarrazões (ID 296571883), pleiteando, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso por ferir o princípio da dialeticidade, no mérito, rebate as alegações da apelante, defendendo o desprovimento recursal. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R APELANTE(S): DIOMILCE MARLI SILVA COLLA. APELADO(S): BANCO PAN S.A. VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado, trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Diamantino, que, nos autos da Ação Declaratória n. 1002240-10.2024.8.11.0005, julgou improcedentes os pedidos contidos na exordial, que visava a declaração de nulidade do contrato de cartão de crédito consignado, bem como, a condenação do banco apelado em danos morais e, ainda a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente, nos seguintes moldes: “[...] Sem delongas, o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor atribui ao fornecedor de serviços a responsabilidade objetiva quanto aos danos causados ao consumidor, fundada na teoria do risco da atividade. Além disso, se o consumidor nega a responsabilidade pela obrigação em discussão, por se tratar de dívida inexigível, compete à parte reclamada comprovar a sua validade, ônus que se desincumbiu a teor do disposto no art. 373, II, do Código de Processo Civil. [...] Ex positis, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos iniciais, nos moldes do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. CONDENO a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que nos termos do art. 85, §2º, do CPC, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, cuja cobrança fica suspensa em razão do deferimento de justiça gratuita, nos termos do §3º, do art. 98 do CPC.” (grifo nosso). O Apelante, em suas razões de recurso, afirma que houve uma indução a erro no momento da contratação, posto que estava pensando contratar um empréstimo consignado e não um cartão de crédito consignado. Pois bem. De plano, reputo aplicável à espécie os ditames previstos na Lei nº. 8.078/90, em vista da evidente natureza consumerista da relação jurídica entabulada entre as partes, nos precisos termos do art. 2º e 3º do mencionado diploma legal, aplicando-se lhe todas as prerrogativas inerentes ao consumidor, notadamente a inversão do ônus da prova. Nesse sentido, o enunciado nº. 297, da Súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Assim, nos termos do artigo 14, parágrafo terceiro, do CDC, a responsabilidade civil dos bancos é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos seus clientes pelos defeitos dos serviços prestados, só havendo exclusão do nexo causal quando o fornecedor comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros. VOTO-PRELIMINAR 1. Preliminares arguidas em sede de contrarrazões pela parte BANCO PAN S.A. 1.1. Preliminar de não conhecimento do recurso por ausência de dialeticidade Rejeito tal preliminar, eis que, as razões recursais abordam, detalhadamente, todos os pontos fático-jurídicos expostos no r. decisum fustigado, e não mera reprodução da peça inicial e impugnatória. Ademais, não há ausência de dialeticidade se as razões expostas pelo apelante combatem fundamentos da sentença, como determina o art. 1.010, II do Código de Processo Civil. Por tais razões rejeito a preliminar. É como voto. 1.2. Da procuração genérica. Cuida-se de preliminar suscitada pela parte apelante, na qual se alega a nulidade da procuração acostada aos autos pela parte autora, sob o argumento de que o mandato é genérico, por tempo indeterminado, desprovido de delimitação de finalidade, o que, segundo sustenta, violaria os princípios da segurança jurídica e da regularidade da representação processual. Todavia, a tese aventada pela apelante não merece prosperar. Conforme disposto nos arts. 103 a 107 do Código de Processo Civil, especialmente o art. 105, a outorga de poderes ao advogado, por instrumento particular devidamente assinado pela parte, é suficiente para constituir a regular representação nos autos. Eis a redação do referido dispositivo legal: Art. 105. A procuração geral para o foro, outorgada por instrumento público ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinar declaração de hipossuficiência econômica, que devem constar de cláusula específica. § 1º A procuração pode ser assinada digitalmente, na forma da lei. § 2º A procuração deverá conter o nome do advogado, seu número de inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil e endereço completo. § 3º Se o outorgado integrar sociedade de advogados, a procuração também deverá conter o nome dessa, seu número de registro na Ordem dos Advogados do Brasil e endereço completo. § 4º Salvo disposição expressa em sentido contrário constante do próprio instrumento, a procuração outorgada na fase de conhecimento é eficaz para todas as fases do processo, inclusive para o cumprimento de sentença. No presente caso, a análise do instrumento de mandato acostado aos autos evidencia que a parte autora outorgou poderes à sua patrona para o foro em geral, em conformidade com os requisitos legais. Trata-se de procuração com poderes gerais e típicos para o exercício da representação processual, nos exatos moldes autorizados pelo art. 105 do CPC. Ademais, não se vislumbra qualquer demonstração de prejuízo à parte adversa decorrente da utilização do instrumento de mandato em questão, tampouco se aponta a prática de atos que exigiriam poderes especiais não conferidos no documento. A alegação de que a procuração permitiria o ajuizamento de “inúmeras demandas” a partir de um mesmo documento constitui argumento genérico e destituído de prova concreta nos autos, não se prestando a infirmar a regularidade da representação. Assim sendo, constatando-se que a procuração confere poderes para o foro em geral, devidamente firmada pela parte autora, não há que se falar em nulidade processual. A petição inicial foi subscrita por procurador regularmente constituído, não se verificando qualquer mácula ao contraditório, à ampla defesa ou à regularidade formal do processo. Por tais razões, rejeito a preliminar em referência. É como voto. 1.3. Da ocorrência das prejudiciais de mérito - prescrição e decadência. No que concerne a arguição preliminar da ocorrência das prejudiciais de mérito, a saber, prescrição e decadência, sabe-se que segundo orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e precedentes deste Sodalício, em se tratando de prestações de trato sucessivo, o prazo para ambos se inicia a partir da data de vencimento da última parcela. Nesse sentido é a jurisprudência hodierna: EMENTA CIVL E PROCESSO CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO EM DOBRO E POR DANOS MORAIS – PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – VIOLAÇÃO – INOCORRÊNCIA – PRELIMINAR – REJEIÇÃO – DECADÊNCIA – PRESCRIÇÃO – PREJUDICIAIS DE MÉRITO – NÃO ACOLHIMNETO – CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) –EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – CONVERSÃO – SAQUE DE LIMITE DE CARTÃO DE CRÉDITO – DEVER DE INFORMAÇÃO – VIOLAÇÃO – ILEGALIDADE CONSTATAÇÃO – TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – ADEQUAÇÃO À MÉDIA PRATICADA NA ÉPOCA DO SAQUE – RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO – FORMA SIMPLES – DANO MORAL – NÃO CONFIGURAÇÃO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Quando as razões recursais combatem os termos da sentença e encontram-se associadas aos temas abordados, a preliminar de não conhecimento do Apelo, por ausência de dialeticidade, deve ser rejeitada. 2. Sabe-se que, nos casos de revisão contratual de contratos bancários, com pedido de restituição de valores pagos indevidamente, o prazo prescricional se amolda à previsão decenal do artigo 205 do Código Civil. 3. Nas hipóteses que envolvem prestações de trato sucessivo, o pacto se renova ao longo do tempo, de forma automática, devido aos descontos efetuados mensalmente e, portanto, a cada novo desconto, o período de decadência é renovado e o termo inicial para contagem do prazo decadencial é o vencimento da última parcela. (N.U 1002401-39.2023.8.11.0010, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/03/2024, Publicado no DJE 03/04/2024) (grifo nosso) Assim não se observa nos autos a ocorrência da prescrição e/ou decadência, considerando que o empréstimo ainda vem sendo descontado em folha. Portanto, rejeito as preliminares de prescrição e decadência. É como voto. 1.4. Da ilegitimidade passiva parcial do Banco Pan. A parte apelante sustenta que a operação, objeto da lide, foi arrematada, em 07/2013, pelo Banco Pan, ora apelante, em leilão da carteira de cartão consignado do Banco Cruzeiro do Sul. Desse modo, sustenta que é parte ilegítima para responde sobre questões anteriores à arrematação. Contudo, na eventualidade de se manter a legitimidade da apelante, em decorrência de eventuais débitos realizados pela recorrente após a arrematação da carteira, sustenta que continua não sendo responsável pelo período antecessor ao da referida arrematação. Pois bem. Em que pese as teses da recorrente, verifica-se que não devem prosperar. Isso porque, apesar dos documentos contidos nos autos demonstrarem que a contratação do cartão teria sido realizada em meados de 2008, ou seja, antes da aquisição da carteira de clientes pelo Banco Pan, a pretensão inicial diz respeito à migração de cartão que se encontra ainda ativo e com descontos realizados em favor do Banco Pan (o que se extrai das faturas juntadas aos autos que demonstram a continuidade da relação jurídica), o que justifica a presença da ora apelante no polo passivo. Ademais, como é cediço, o Código de Defesa do Consumidor, no art. 7º, parágrafo único, prevê a responsabilidade solidária entre os diversos fornecedores envolvidos numa mesma contratação, se esta estiver regida pelas normas consumeristas, conforme cito: Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade. Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. Sobre o tema, bem esclarece a doutrina de Cláudia Lima Marques: O CDC impõe a solidariedade em matéria de defeito no serviço (art. 14 do CDC) em contraponto aos arts. 12 e 13 do CDC, comresponsabilidade objetiva imputada nominalmente a alguns agentes econômicos. Também nos arts. 18 e 20 a responsabilidade é imputada a toda a cadeia, não importando quem contratou com o consumidor. (MARQUES, Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed..São Paulo: RT, 2006; p. 223). Além disso, por força do contido no art. 88, combinado com o art. 13, parágrafo único, ambos do Código de Defesa do Consumidor, em se tratando de relação de consumo, não há falar em litisconsórcio passivo necessário ou denunciação à lide. Vejamos: Art. 13. [...] Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso. [...] Art. 88. Na hipótese do art. 13, parágrafo único deste código, a ação de regresso poderá ser ajuizada em processo autônomo, facultada a possibilidade de prosseguir-se nos mesmos autos, vedada a denunciação da lide. [Grifo nosso] Nesse sentido é a tese firmada, pelo Superior Tribunal de Justiça, no Tema Repetitivo 315: Tese firmada: A parte autora pode eleger apenas um dos devedores solidários para figurar no pólo passivo da demanda. (...) A possibilidade de escolha de um dos devedores solidários afasta a figura do litisconsórcio compulsório ou necessário. ((REsp n. 1.145.146/RS, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 9/12/2009, DJe de 1/2/2010.) [Grifo nosso] A propósito, cito ementa de julgado deste Egrégio Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL COM PEDIDO DE CONVERSÃO DO CONTRATO C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS – ARREMATAÇÃO DA CARTEIRA DE CLIENTES DO BANCO CRUZEIRO DO SUL – LEGITIMIDADE RECONHECIDA – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA – DECISÃO REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. “Preliminar de ilegitimidade que não merece acolhida. Aquisição da carteira de crédito pelo Banco Pan, fato que não se presta a eximir a responsabilidade da apelante, da relação jurídica entabulada com a autora, à luz do princípio da facilitação da defesa do consumidor, porquanto havendo sucessão no crédito, é solidária a responsabilidade das empresas participantes. Hipótese atrai a incidência do artigo 109 do CPC: "A alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes. (TJ-RJ - APL: 00135151820138190075, Relator: Des(a). MARIANNA FUX, Data de Julgamento: 01/07/2021, VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 24/11/2017)" (N.U 1007736-85.2022.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/11/2023, Publicado no DJE 15/11/2023) [Grifo nosso] Assim, em que pese o contrato objeto da lide tenha sido firmado no ano de 2007, junto ao Banco Cruzeiro do Sul, verifica-se que, ao assumir a titularidade da operação e dar seguimento às cobranças em folha de pagamento, o Banco Pan S.A. passou a responder pelos termos da avença, mesmo em relação aos valores cobrados antes da arrematação. Portanto, rejeita-se a preliminar suscitada pela apelante. É como voto. VOTO-MÉRITO 2.1. Engano na contratação – Cartão de Crédito X Empréstimo consignado. A parte Apelante afirma que foi induzida a erro no momento da contratação, afirmando veementemente que foi "ludibriada, visto que o contrato é extremamente confuso, além do que foi negado o fornecimento por via administrativa, não cumprindo o dever de informação e transparência.”. Analisando os autos, não é crível que tal engano possa ter ocorrido da forma como afirma nos autos. Compulsando os autos, verifica-se a existência de elementos capazes de comprovar a inexistência de vício de consentimento no negócio entabulado, isto porque, os documentos constantes no presente caderno processual estão denominados indicando a modalidade contratual questionado, cartão de crédito consignado. Ao que se nota, o contrato assinado constante em ID. 296571867, há informação em caixa alta e letras garrafais é “FICHA CADASTRAL CARTÃO CONSIGNADO BANCO CRUZEIRO DO SUL”, devidamente assinado pela parte apelante, cuja assinatura assemelha-se as constantes nos documentos pessoais da parte. Tais elementos satisfazem suficientemente o dever de informação e, ainda demonstram a anuência do consumidor, o que a meu sentir afasta a tese de vício de consentimento na contratação do crédito. Outro elemento que corrobora as alegações da parte apelada, enfraquecendo o pleito recursal, reside no extenso lapso temporal entre a data da contratação e o ajuizamento da presente demanda. Conforme no referido contrato, a celebração do negócio ocorreu em setembro de 2009, mas somente em 2024 o apelado manifestou, supostamente, sua discordância quanto à modalidade contratual, após aproximadamente 15 (quinze) anos de vigência. Diante de tais nuances fáticas, é possível concluir pela incidência da teoria da supressio, diante da inequívoca estabilização do vínculo jurídico contratual. Nesse sentido, consigne-se o entendimento acolhido pelo c. STJ acerca do instituto em análise, ad litteris: CIVIL. RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. RESCISÃO INJUSTIFICADA PELA REPRESENTADA. PRETENSÃO DE COBRANÇA DAS COMISSÕES PAGAS A MENOR. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. OCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE COBRANÇA DAS VERBAS RESCISÓRIAS. INEXISTÊNCIA. JUSTO MOTIVO PARA A RESCISÃO UNILATERAL. AUSÊNCIA. CORREÇÃO MONETÁRIA INCIDENTE SOBRE AS VERBAS RESCISÓRIAS. TERMO INICIAL. RESCISÃO DO CONTRATO. COMISSÕES PAGAS A MENOR. SUPRESSIO. BASE DE CÁLCULO DAS VERBAS RESCISÓRIAS. CADA UMA DAS COMISSÕES CORRIGIDAS MONETARIAMENTE. (…) 4.2. A boa-fé objetiva induz deveres acessórios de conduta, impondo às partes comportamentos obrigatórios implicitamente contidos em todos os contratos, a serem observados para que se concretizem as justas expectativas oriundas da própria celebração e execução da avença, mantendo-se o equilíbrio da relação. Uma das funções exercidas pela boa-fé objetiva consiste na limitação ao exercício de direitos subjetivos, daí derivando o instituto da supressio, que visa a tutelar a estabilidade do comportamento. Essa figura viabiliza o reconhecimento da perda do direito subjetivo em razão da inatividade do seu titular por um período suficiente para criar na outra parte a sensação plausível de ter havido renúncia àquela prerrogativa. 4.3. Na espécie, ao longo de toda a relação negocial em que se implementaram as reduções das comissões deforma unilateral pela recorrida (representada), em nenhum momento houve insurgência por parte da recorrente (representante), que somente propugnou pelas diferenças das comissões após a rescisão unilateral do contrato pela recorrida. Ou seja, apesar das diminuições das comissões, a recorrente permaneceu no exercício da representação comercial por quase 22 (vinte e dois) anos, despertando na recorrida a justa expectativa de que não haveria exigência posterior. Diante desse panorama, o princípio da boa-fé objetiva torna inviável a pretensão da recorrente de exigir retroativamente valores a título de diferenças, que sempre foram dispensadas. (…). (REsp 1838752/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/10/2021, DJe 22/10/2021) Sob a mesma perspectiva, o Ministro Antônio Carlos Ferreira, da egrégia Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.717.144-SP (Informativo nº. 765), assentou: “O instituto da supressio não se confunde com a extinção dos direitos, de exigência ou formativos, pela prescrição ou pela decadência, embora tais institutos tenham como ponto comum seu fundamento na necessidade de estabilização das relações jurídicas. A supressio consubstancia-se na impossibilidade de se exercer um direito por parte de seu titular em razão de seu não exercício por certo período variável de tempo e que, em razão dessa omissão, gera da parte contrária uma expectativa legítima de que não seria mais exigível. Portanto, pelo não exercício do direito passível de ser exercido por um lapso temporal - não determinável a priori - a outra parte da relação obrigacional confia que a situação se estabilizou e que não será compelida a cumpri-la, revelando-se, pois, certo abrandamento do princípio pacta sunt servanda, não mais tomado no sentido absoluto típico de sua formulação liberal.” Além disso, pelo que se verifica dos autos, trata-se de pessoa capaz que possui experiência de crédito que a possibilita melhor discernir entre as modalidades de crédito contratada, isto porque, o mais recente histórico de crédito carreados aos autos, observa-se que a apelante possui 7 (sete) descontos em folha sob a rubrica de “EMPRESTIMO” e 2 (dois) sob a rubrica de “CARTÃO CRÉDITO”, elemento que enfraquece a tese de vício de consentimento. A parte Apelante firmou contrato de Cartão de Crédito e não de empréstimo consignado. Inclusive, com destacou a parte Apelante, as modalidades/benefícios referentes ao cartão de crédito e empréstimo são distintas, de modo que descabe alegar que foi engano, fato que até poderia ser mais crível se fossem modalidades semelhantes. Ademais a modalidade contratual em comento prevê a reserva/desconto de uma reserva de margem consignável não superior a 10% (dez por cento) do valor dos vencimentos da contratante, cabendo ao consumidor adimplir o valor que ultrapassar a importância da reserva, sem notícia nos autos que o consumidor tenha adimplido o valor excedente. Mesmo diante de tudo isso, somente após aproximadamente quinze anos vem ao Poder Judiciário para pleitear a declaração de inexistência do contrato, a restituição de valores e a condenação do Apelado ao pagamento de indenização por danos morais, sob a alegação de ter sido enganado. Conduta que em nosso ordenamento jurídico há vedação quanto ao comportamentocontraditório, ou seja, quando os atos praticados se contradizem com o que foi compactuado anteriormente. Este princípio, no brocardo latino denominado como Venire Contra Factum Proprium, veda o comportamento contraditório, inesperado, que causa surpresa a outra parte. Explico. Sua aplicação decorre da boa-fé objetiva e da lealdade contratual, exigíveis de todos os contratantes, portanto, aplicando-se a boa-fé contratual, não pode agora afirmar vício de consentimento no momento da contratação se os atos praticados durante o contrato demonstram incoerência. Portanto, se restou evidenciado que a parte Apelante se beneficiou do contrato, assinado mediante termo de adesão, com a devida autorização/aquiescência para desconto em folha de pagamento/benefício, à espécie, descabe falar em vício de consentimento quando da contratação. A propósito: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – IMPROCEDÊNCIA – EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMC –PRELIMINAR – NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE – REJEIÇÃO – MÉRITO – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO/ESCLARECMENTO QUANTO A CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – DESCABIMENTO – CRÉDITO LIBERADO NA CONTA DA AUTORA – AQUIESCÊNCIA COM OS TERMOS CONTRATADOS – REGULARIDADE DOS DESCONTOS POR MAIS DE SETE ANOS – VEDAÇÃO DO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO – VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM - AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS – NÃO CONSTATAÇÃO – ÍNDICES AQUÉM DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – RECURSO DESPROVIDO. Rejeita-se a preliminar de não conhecimento do recurso por ausência de dialeticidade, em razão de a recorrente ter atendido aos requisitos previstos no artigo 1.010 do CPC/15, trazendo os fundamentos de fato e de direito, havendo pedido expresso de reforma da sentença para que a ação seja julgada procedente. Se restou evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, visto que após a juntada do contrato e das faturas de cartão de crédito pelo requerido, em nenhum momento negou a autora o recebimento do crédito a ele correspondente e tampouco a utilização do cartão, há que ser mantida a sentença de improcedência da lide. Não há como acolher a tese de que a autora não contratou empréstimo na modalidade Cartão de Crédito Consignado, se restou incontroverso o depósito do crédito em sua conta bancária e os descontos do valor mínimo das respectivas faturas durante mais de três (3) anos – data a partir da qual somente tomou as primeiras medidas cabíveis para obstar os débitos, o que evidencia a inexistência de fraude, ante a vedação ao venire contra factum proprium. Não há falar-se em ilegalidade dos juros remuneratórios contratados, se estes encontram-se aquém da taxa média para operações da mesma espécie divulgadas pelo Banco Central (RESp. 1.061.530/RS, sob o rito de recurso repetitivo).- (N.U 1001598-74.2023.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 03/04/2024, Publicado no DJE 09/04/2024) (grifo nosso) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA POR VÍCIO DE CONSENTIMENTO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS –EMPRÉSTIMOCONSIGNADONA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA COMPRAS EM ESTABELECIMENTOS – CIÊNCIA DA MODALIDADE DEEMPRÉSTIMOADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Verificando-se que a contratação doempréstimose deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou deonerosidadeexcessiva, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de saques e compras em vários estabelecimentos, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações deempréstimosconsignados. (N.U 1024408-80.2022.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/03/2024, Publicado no DJE 28/03/2024) (grifo nosso) Tais nuances do contexto fático-probatório devem ser ponderadas eis que, o induzimento a erro não se evidenciou nos autos, pois, como dito alhures, os elementos volitivos e cognitivos para a celebração do contrato, ficaram comprovado nos autos. Dessa forma, restou demonstrado que a parte consumidora estava ciente de que se tratava de contratação de cartão de crédito, com pagamento do valor mínimo da fatura por meio de consignação em folha de pagamento, justificando-se a continuidade dos descontos, sem prova nos autos que o consumidor tenha realizado o pagamento integral de cada fatura, deixando apenas ser realizado o desconto mínimo, dilatando a obrigação contratual, postergando, desse modo, a data-limite dos descontos. Ademais, a simples utilização do cartão, mediante solicitação de saques, é suficiente para desfigurar a espécie empréstimo consignado, desmitificando a tese arguida pela parte apelante. No mesmo sentido é o entendimento do Tribunal de Justiça: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C.C. INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR SAQUES E COMPRAS EM ESTABELECIIMENTOS – VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO, TRANSPARÊNCIA E VÍCIO DE VONTADE NÃO CONFIGURADOS – AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO – DANOS MORAIS INDEVIDOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. I - Não há que se falar em indução a erro do consumidor na contratação de cartão de crédito consignado, quando demonstrado a utilização efetiva do referido cartão. Juntado aos autos as faturas do cartão de crédito, demonstrando a utilização do cartão pela parte, não só correspondente a saques, que por si só já desvirtua o empréstimo consignado, como em compras diversas, não havendo se falar em violação ao direito de informação. II - As faturas constituem provas mais que suficientes, de que o autor/apelante utilizou do cartão de crédito disponibilizado pelo requerido/apelado, não havendo como desconsiderar a transação bancária. III - Optando o apelante ao desconto mínimo, o não pagamento do valor integral da fatura acaba por acarretar a incidência de encargos financeiros sobre o saldo devedor, conforme discriminados nas próprias faturas, motivo pelo qual os descontos continuam sendo devidos. (TJ-MT - AC: 10005785020228110047, Relator: SEBASTIAO DE MORAES FILHO, Data de Julgamento: 10/05/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/05/2023) (grifo nosso). No que tange a tese de onerosidade excessiva, saliento que ao Código de Defesa do Consumidor adotou a Teoria da Base Objetiva, conforme entendimento firmado no Informativo n. 556 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: A teoria da base objetiva ou da base do negócio jurídico tem sua aplicação restrita às relações jurídicas de consumo, não sendo aplicável às contratuais puramente civis. A teoria da base objetiva difere da teoria da imprevisão por prescindir da imprevisibilidade de fato que determine oneração excessiva de um dos contratantes. Pela leitura do art. 6°, V, do CDC, basta a superveniência de fato que determine desequilíbrio na relação contratual diferida ou continuada para que seja possível a postulação de sua revisão ou resolução, em virtude da incidência da teoria da base objetiva. O requisito de o fato não ser previsível nem extraordinário não é exigido para a teoria da base objetiva, mas tão somente a modificação nas circunstâncias indispensáveis que existiam no momento da celebração do negócio, ensejando onerosidade ou desproporção para uma das partes. Com efeito, a teoria da base objetiva tem por pressuposto a premissa de que a celebração de um contrato ocorre mediante consideração de determinadas circunstâncias, as quais, se modificadas no curso da relação contratual, determinam, por sua vez, consequências diversas daquelas inicialmente estabelecidas, com repercussão direta no equilíbrio das obrigações pactuadas. Nesse contexto, a intervenção judicial se daria nos casos em que o contrato fosse atingido por fatos que comprometessem as circunstâncias intrínsecas à formulação do vínculo contratual, ou seja, sua base objetiva. Em que pese sua relevante inovação, a referida teoria, ao dispensar, em especial, o requisito de imprevisibilidade, foi acolhida em nosso ordenamento apenas para as relações de consumo, que demandam especial proteção. Ademais, não se admite a aplicação da teoria do diálogo das fontes para estender a todo direito das obrigações regra incidente apenas no microssistema do direito do consumidor. De outro modo, a teoria da quebra da base objetiva poderia ser invocada para revisão ou resolução de qualquer contrato no qual haja modificação das circunstâncias iniciais, ainda que previsíveis, comprometendo em especial o princípio pacta sunt servanda e, por conseguinte, a segurança jurídica. Por fim, destaque-se que, no tocante às relações contratuais puramente civis, quer dizer, ao desamparo das normas protetivas do CDC, a adoção da teoria da base objetiva, a fim de determinar a revisão de contratos, poderia, em decorrência da autuação jurisdicional, impor indesejáveis prejuízos reversos àquele que teria, em tese, algum benefício com a superveniência de fatos que atinjam a base do negócio. REsp 1.321.614-SP, Rel. Número 556 Brasília, 23 de fevereiro a 4 de março de 2015. TERCEIRA TURMA DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. HIPÓTESE DE INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA BASE OBJETIVA OU DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO. 1 originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015. (grifo nosso) Logo, para caracterizar o estremecimento nas bases objetivas requer-se a existência de fato superveniente que desequilibre a relação entre as partes, todavia, não se observa no conjunto fático-probatório a ocorrência de tal elemento capaz a ensejar quebra nas bases da relação jurídica, eis que, a modalidade contratual em comento prevê a reserva/desconto de uma reserva de margem consignável previamente estabelecida, cabendo ao consumidor adimplir o valor que ultrapassar a importância da reserva, ou seja, a totalidade do valor mensal, sem notícia nos autos que o consumidor tenha adimplido o valor excedente. A simples impossibilidade de cumprimento da avença não é suficiente para validar a aplicação da teoria da quebra da base objetiva do negócio jurídico. Desse modo, não sendo comprovado a conduta ilícita da instituição financeira no caso dos autos, deve ser mantida a sentença na integralidade, não havendo que se falar em ocorrência de danos morais e materiais no caso dos autos. 2.2. Da não utilização do cartão plástico. A Apelante argumenta em seu recurso que não houve utilização do cartão de crédito para compras no comércio e tal fundamento comprovaria que esta foi enganada no momento da contratação, todavia, não é o que se verifica das provas analisadas. Não obstante, mesmo diante de todas estas comprovações a Apelante quer afirmar que houve indução a erro e prova disso é o fato de não ter utilizado o cartão plástico, contudo, a ausência de utilização não descaracteriza a contratação que se encontra evidente pelos documentos juntados. Saliento, a simples utilização do cartão, mediante solicitação de saques, é suficiente para descaracterizar o empréstimo consignado, desmitificando a tese arguida pela parte apelante. Este e. Tribunal de Justiça assim decidiu: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C.C. INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR SAQUES E COMPRAS EM ESTABELECIIMENTOS – VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO, TRANSPARÊNCIA E VÍCIO DE VONTADE NÃO CONFIGURADOS – AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO – DANOS MORAIS INDEVIDOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. I - Não há que se falar em indução a erro do consumidor na contratação de cartão de crédito consignado, quando demonstrado a utilização efetiva do referido cartão. Juntado aos autos as faturas do cartão de crédito, demonstrando a utilização do cartão pela parte, não só correspondente a saques, que por si só já desvirtua o empréstimo consignado, como em compras diversas, não havendo se falar em violação ao direito de informação. II - As faturas constituem provas mais que suficientes, de que o autor/apelante utilizou do cartão de crédito disponibilizado pelo requerido/apelado, não havendo como desconsiderar a transação bancária. III - Optando o apelante ao desconto mínimo, o não pagamento do valor integral da fatura acaba por acarretar a incidência de encargos financeiros sobre o saldo devedor, conforme discriminados nas próprias faturas, motivo pelo qual os descontos continuam sendo devidos. (grifo nosso) (TJ-MT - AC: 10005785020228110047, Relator: SEBASTIAO DE MORAES FILHO, Data de Julgamento: 10/05/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/05/2023) Além disso, em análise da Impugnação à Contestação apresentada pela Apelante nos autos, verifica-se que esta possuía conhecimento da disponibilização do cartão plástico que seria de uso para “compras e saques”, portanto, malgrado alegue não ter realizado compras no comércio, realizou saques. Todavia, conforme as faturas juntadas aos autos, verifica-se a utilização do cartão de crédito pela parte apelante, oportunidade em que colaciono a fatura de ID nº 296571876. Motivo pelo qual rejeito a tese aduzida pela parte apelante. 2.3. Da devolução do excedente descontado a título de juros remuneratórios na modalidade cartão de crédito consignado – Fixação conforme a média da Taxa de Juros do empréstimo consignado. Referente ao debate acerca dos juros remuneratórios do contrato em discussão, entendo que não merece acolhimento a tese recursal, isto porque, alega a parte apelante a existência de abusividade na cobrança da taxa de juros, arguindo a necessidade de aplicação da taxa média de mercado conforme a modalidade crédito pessoal, todavia, não há como aplicar modalidade de juros de modalidade contratual diversa daquela inicialmente contratada (cartão de crédito consignado). Nesse sentido se manifesta o Tribunal de Justiça de Mato Grosso: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA COMPRAS EM VÁRIOS ESTABELECIMENTOS, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – JUROS REMUNERATÓRIOS – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de contratação na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que o autor utiliza-se do cartão para realização de saques e compras em vários estabelecimentos, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (TJ-MT - AC: 10043014020218110006, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 22/03/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/03/2023) (grifo nosso). Ademais, o apontamento genérico de abusividade dos juros remuneratório não autoriza o conhecimento da referida tese. Nesse sentido se manifesta a jurisprudência hodierna: ESTADO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 1000371-94.2019.8.11. 0002 Apelação nº 1000371-94.2019.8.11.0002 Apelante: Higor Souza Rodrigues Apelado: Banco Bradesco S.A. Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Várzea Grande EMENTA APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - CRÉDITO EM CONTA CORRENTE - CONTRATAÇÃO COMPROVADA PELO BANCO E NÃO DESCONSTITUÍDA NEM NEGADA PELO REQUERIDO - SENTENÇA PROCEDÊNCIA - ALEGAÇÕES GENÉRICAS DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL - REVISÃO - IMPOSSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Em sede de ação de cobrança de crédito bancário, a contestação apresentada pelo requerido que traz apenas alegações genéricas acerca de suposta abusividade contratual não autoriza a apreciação do pedido revisional. (TJ-MT - AC: 10003719420198110002 MT, Relator: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 22/07/2020, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/07/2020) (grifo nosso). Nessa esteira a Súmula 381 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, está assim ementada: Súmula 381. Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas. Diante dessas considerações, concluo pela rejeição da presente tese recursal, mantendo a taxa de juros do contrato pactuado entre as partes. 2.4. Pleiteia a condenação do banco apelado em repetição do indébito. Em relação ao pleito em comento, anoto que já rejeitei o reconhecimento de responsabilidade civil do banco apelante no tópico 1, bem como, ausente prova robusta acerca da ventilada abusividade contratual, por consequência resta prejudicado o pleito por repetição do indébito. Conclusão Com essas considerações, conheço e recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO, para manter na integralidade a r. sentença objurgada. Em face do disposto no art. 85, §11º do Código de Processo Civil, majoro os honorários sucumbenciais para o importe de 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, ressalvando-se eventual benefício de Justiça Gratuita deferido em favor da parte apelante. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025
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