Cleiton Chagas De Araujo e outros x Raizen Combustiveis S.A.
ID: 256565904
Tribunal: TRT18
Órgão: 4ª VARA DO TRABALHO DE ANÁPOLIS
Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO
Nº Processo: 0010668-02.2024.5.18.0054
Data de Disponibilização:
15/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VINICIUS ALFREDO NOGUEIRA
OAB/SP XXXXXX
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MARCUS VINICIUS PERRETTI MINGRONE
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 18ª REGIÃO 4ª VARA DO TRABALHO DE ANÁPOLIS 0010668-02.2024.5.18.0054 : IZADORA ROSA DOLFINI : RAIZEN COMBUSTIVEIS S.A. IN…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 18ª REGIÃO 4ª VARA DO TRABALHO DE ANÁPOLIS 0010668-02.2024.5.18.0054 : IZADORA ROSA DOLFINI : RAIZEN COMBUSTIVEIS S.A. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID c723bba proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: Vistos etc. IZADORA ROSA DOLFINI, qualificada na inicial, ajuizou reclamação trabalhista em desfavor de RAIZEN COMBUSTÍVEIS S.A., qualificada nos autos, alegando que manteve vínculo empregatício no período de 02/08/2017 a 03/10/2023 na função analista de marketing, em razão do qual está pleiteando: conversão do pedido de demissão em rescisão indireta; salário referente ao mês de demissão (fl. 27); aviso prévio; férias proporcionais com 1/3; 13º salários do pacto (fl. 26); multa de 40%; horas extras e reflexos; adicional noturno e reflexos; intervalo intrajornada e reflexos; domingos e feriados em dobro; intervalo interjornada e reflexos; férias em dobro; indenização por dano moral e material (doença); indenização por dano moral e material (decorrente do roubo); guias do seguro-desemprego; multa do artigo 477 da CLT; multa do artigo 467 da CLT; benefícios da gratuidade da Justiça; expedição de ofício e honorários advocatícios, conforme petição inicial de fls. 02-29. Deu à causa o valor de R$530.221,72. Juntou os documentos de fls. 30-351. A Reclamada discordou do juízo 100% digital, mas postulou a realização das audiências de forma telepresencial, mantendo-se a tramitação do feito como autuado n PJE (juízo 100% digital). Defesa da Reclamada, às fls. 612-79, alegando a preliminar de inépcia, a prescrição e a improcedência dos pedidos na reclamação trabalhista, tendo em vista os fatos impeditivos, extintivos e modificativos que sustenta. Foram juntados os documentos de fls. 680-1365. Determinada realização de perícia médica, oportunizou-se a apresentação de quesitos e indicação de assistente técnico (fls. 1366-7). Quesitos apresentados pelas partes com indicação de assistente técnico (fls. 1373-8 e 1379-80). Réplica da Reclamante, às fls. 1381-1402. Laudo do assistente técnico da Reclamada (fls. 1413-33). Documentos apresentados pela Reclamante (fls. 1435-41). Manifestação da Reclamada (fls. 1442-3). Laudo pericial de fls. 1448-55. Impugnação oferecida pela Reclamada (fls. 1458-70). Manifestação da Reclamante (fls. 1471-6). Esclarecimentos do Perito (fls. 1478-82). Manifestação da Reclamada (fls. 1485-1501) e da Reclamante (fls. 1502-5). Novos esclarecimentos do Perito (fls. 1509-11). Manifestação da Reclamante (fls. 1514-18). Impugnação da parte requerida (fls. 1519-29). Foram ouvidos depoimentos pessoais e uma testemunha da Reclamante e uma da Reclamada (fls. 1535-8). Encerrada a instrução processual com a concordância das partes. Razões finais por memoriais pela Reclamante (fls. 1542-5) e pela Reclamada (fls. 1546-52). Inconciliados. DECIDE-SE QUESTÃO PROCESSUAL. Nada a deferir em relação à retificação do polo passivo, pois já consta da inicial e cadastramento processual RAÍZEN S.A. (ID a31b1dd – fl. 362). PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL. A inicial atende, minimamente, ao disposto no artigo 840 da CLT, sendo certo que o princípio da informalidade vigora no processo do trabalho, permitindo até mesmo o jus postulandi, embora não se apresenta da melhor forma devida. Não se vislumbra prejuízo ou dificuldade para a defesa e julgamento da questão posta. O feito tramita sob o rito ordinário, razão pela qual todos os pedidos devem atender ao disposto no § 1º do artigo 840 da CLT, devendo ser certos, determinados e com indicação do valor, sob pena de serem extintos sem resolução de mérito, o que foi feito pelo Reclamante por estimativa. Considerando que a condenação não está limitada aos valores postulados na exordial e que houve estimativa dos valores, conforme entendimento majoritário do Colendo TST, que tem entendido que o cálculo das verbas devidas feito no pedido inicial, conforme artigo 840, § 1º da CLT, não limita os valores da condenação trabalhista, que seria meramente estimativo, que segundo o artigo 12, § 2º, da IN nº 41/2018 do TST o valor declinado na inicial será estimado, não se justifica a limitação da condenação aos valores expressos na inicial porque o empregado não possui documentos para cálculos e indicação de valores exatos e deve ser mitigado o seu conteúdo para não se impedir o exercício do direito constitucional de ação, não sendo outro o entendimento do legislador ordinário. Logo, eventual quantum debeatur deverá ser apurado em liquidação de sentença e a inicial atende, ainda que com deficiências, ao texto legal, sob pena de negativa da prestação jurisdicional. Neste sentido é a jurisprudência. “...RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. APELO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. A controvérsia gira acerca da aplicação do artigo 840, § 1º, da CLT, que foi alterado pela Lei 13.467/2017. No caso em tela, o debate acerca do art. 840, § 1º, da CLT, detém transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. A controvérsia acerca da limitação da condenação, aos valores liquidados apresentados em cada pedido da inicial, tem sido analisado, pela jurisprudência dominante, apenas sob a égide dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil. Por certo que aludidos dispositivos do CPC são aplicados subsidiariamente no processo trabalhista. Entretanto, no que se refere à discussão acerca dos efeitos dos pedidos liquidados, apresentados na inicial trabalhista, os dispositivos mencionados do CPC devem ceder espaço à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 840 da CLT, que foram alterados pela Lei 13.467/2017. Cumpre esclarecer que o TST, por meio da Resolução nº 221, de 21/06/2018, considerando a vigência da Lei 13.467/2017 e a imperativa necessidade de o TST posicionar-se, ainda que de forma não exaustiva, sobre a aplicação das normas processuais contidas na CLT alteradas ou acrescentadas pela Lei 13.467/2017, e considerando a necessidade de dar ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que no seu art. 12, § 2º, normatizou que “para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado (...)”. A Instrução Normativa nº 41/2018 do TST, aprovada mediante Resolução nº 221, em 02/06/2018, registra que a aplicação das normas processuais previstas na CLT, alteradas pela Lei 13.467/2017, com eficácia a partir de 11/11/2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidas sob a égide da lei revogada. Portanto, no caso em tela, em que a inicial foi ajuizada no ano 2018, hão de incidir as normas processuais previstas na CLT alteradas pela Lei 13.467/2017. Assim, a discussão quanto à limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial deve ser considerada apenas como fim estimado, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta Corte. A decisão regional que limitou a condenação aos valores atribuídos aos pedidos na inicial configura ofensa ao art. 840, § 1º, da CLT. Reconhecida a transcendência jurídica do recurso de revista. Recurso de revista conhecido e provido. (TST, processo TST-ARR-1000987-73.2018.5.02.0271, Ac. Unânime da 6ª Turma, Relator Ministro Augusto César Leite de Carvalho, julgamento de 14/10/2020)”. Rejeita-se. PRESCRIÇÃO. A reclamação trabalhista foi ajuizada, em 25/04/2024, estando prescrita a pretensão relativa aos créditos trabalhistas anteriores a 25/04/2019, a teor do artigo 7º, XXIX, da CF/88 e artigo 11 da CLT. Em face da pronúncia da prescrição da pretensão relativa às parcelas anteriores a 25/04/2019, extingue-se o processo, com RESOLUÇÃO DO MÉRITO, com fulcro no artigo 487, II, do CPC, em relação às mesmas. MÉRITO. A Reclamante postula o recebimento de horas extras e reflexos, alegando ter trabalhado das 07h00 às 23h00 em regime de teletrabalho (artigo 62, III, da CLT ou artigo 75, § 3º, da CLT. Diz que havia exigência de elaboração de relatórios e entabulava conversas por meios informatizados e de envio de e-mails de madrugada e nas férias. Pleiteia o recebimento de adicional noturno, horas de intervalo intrajornada e domingos e feriados em dobro. A Reclamada afirma que a Autora possuía ampla liberdade na organização de sua jornada de trabalho, incluindo horários, locais e agenda, sendo incompatível com qualquer controle de jornada e destaca que a Reclamante saía e retornava de sua residência, sem comparecer ao escritório da empresa, e que não havia nenhum mecanismo de controle por parte da empregadora, sendo-lhe aplicável a exceção prevista no artigo 62, inciso I da CLT. Informa que o celular, notebook e veículo fornecidos eram instrumentos de trabalho utilizados também para fins pessoais pela Reclamante (padaria, praia, cinema, academia, ligações particulares), impossibilitando o controle de sua jornada, quando exerceu a função de gerente de território (de 25/04/2019 a 31/03/2021). No período de 01/04/2021 a 03/10/2023, como analista de Planejamento Pleno e Analista de Marketing Sênior, a Autora desempenhava suas atividades remotamente (teletrabalho/home office) sem controle de jornada enquadrando-se no regramento do artigo 62, inciso III da CLT e, a partir, de 01/04/2021, a Reclamante passou a residir em Goiás, onde a Reclamada não possui sede. Nega o trabalho noturno e em finais de semana/feriados e a supressão do intervalo interjornada e intrajornada. Há de se registrar que o contrato de trabalho é um contrato realidade, prevalecendo sobre o contratado (ID bab7621 e 4597a4f). Em depoimento, a Reclamante confessou que não tinha qualquer controle de ponto e que trabalhava em home office: “ … que trabalhava internamente até novembro de 2018 e depois foi trabalhar em Belo Horizonte; que a reclamante atendia no postos Shell; que trabalhava externamente; que não tinha controle de ponto; que fazia roteiro de visitas; que utilizava o carro frota com GPS, celular corporativo e notebook da empresa; que era subordinada ao gerente regional que ficava em Belo Horizonte; que raramente acompanhava as visitas só quando havia negociação mais complexa; que não tinha nenhuma forma de controle de horário; que trabalhou nessa função até abril de 2021 e depois a depoente passou a analista de planejamento sênior; que trabalhou em home office na pandemia de 2021 a 2023 quando pediu demissão; que reunia diretamente com os diretores e o time interno; que criava metas e as acompanhava; que isso tudo era em home office …; que não teve controle de jornada em home office” (fl. 1535). A Reclamante confessou ter trabalhado externamente, atendendo os postos Shell em Belo Horizonte, que fazia o roteiro de visitas; que não tinha controle de ponto; que trabalhou na pandemia em home office de 2021 a 2023 quando pediu demissão” (fl. 1535). O trabalho externo configura situação excepcional, que se verifica apenas quando comprovada a efetiva incompatibilidade entre as tarefas e o controle de jornada. Se é possível o controle do horário, mesmo que indireto, não se aplica a exceção do artigo 62, I, da CLT. No caso, não há nenhum indício de que havia possibilidade de controle de horário direto ou indireto e a prova produzida pela Autora rechaça, fato que foi confessado e sabendo que o GPS é utilizado para fim de localização, assim como qualquer ferramenta destinada ao controle de velocidade não se presta a monitorar a jornada. Nem mesmo a telemetria veicular, instalada nos veículos da frota da Reclamada, como afirmado pelo Preposto, não se confunde com sistema de rastreamento, que também não se presta ao controle de jornada. Mas é sistema voltado a informar sobre a dirigibilidade do veículo, passando informações de velocidade, frenagem, isto é, buscam informar como o veículo está sendo conduzido, principalmente, bem como para fins de segurança por conta da violência em que o país está mergulhado. Seguindo na análise da prova oral, no mesmo sentido foi o depoimento da testemunha, ouvida a convite da Reclamada, Brenda Miranda Nazaré que afirmou não haver nenhum controle de horário (fl. 1537). Em depoimento, o Preposto disse que a Reclamante realizava duas visitas aos postos de combustíveis e quando ficou em home office fazia tratativas por telefone ou videoconferência (fl. 1536). Essa afirmação não foi infirmada pela prova dos autos. Nos termos do artigo 62, III, da CLT os empregados em regime de teletrabalho não estão sujeitos a controle de jornada. No caso, a Reclamante confessou que ficou em home office em Pirassununga-SP até janeiro/2022 e depois pediu para ser transferida para Anápolis-GO para ficar perto do marido, trabalhando fora das dependências da Reclamada e muito longe da fiscalização direta do superior hierárquico. O fato da Autora enviar e-mails como o de fl. 286 e trocar mensagens (fl. 328) fora de um horário administrativo ou no período noturno, por si, não autoriza concluir que trabalhava além da 8ª hora diária ou 44ª semanal, ante a efetiva possibilidade de cumprir sua jornada em horário diversificado. Não há prova de que a Autora iniciava a jornada às 06h00 e finalizasse às 23h00 com informado ao Perito, revelando apenas que a Auiora era pessoa sem controle de horário e desorganizada e que laborava à noite para ter dia livre para fins particulares. O trabalho externo sem controle e realizado em home office, bem como to gtrabalho em todo o pacto fora da possibilidade de controle por ser externo, possibilita a flexibilização dos horários e não há elementos que permitam concluir pelo labor em jornada elastecida ou extenuante, não sendo a hipótese de aplicação da Súmula 338 do C. TST pela inexistência de controle de horário e pela falta de possibilidade real de controle, conforme confessado e demonstrado nos autos à saciedade. Consequentemente, ficam indeferidos os pedidos de horas extras, horas de intervalo intrajornada e interjornada, todos com reflexos e adicional noturno com reflexos, além dos domingos e feriados em dobro porquanto a Autora não tinha controle de horário e nem possibilidade de tê-lo, ante as tarefas desempenhadas e nos horários que ela mesma fazia, sendo que o pedido beira a má-fé. A Autora, em sua petição inicial, alega que, após aproximadamente seis anos de trabalho na Reclamada, desenvolveu Transtorno Misto Ansioso Depressivo (CID F41.2) em decorrência das condições de trabalho desumanas, com cobranças excessivas de metas e resultados humanamente inatingíveis, em um ambiente de terror psicológico. Postula o recebimento de indenização por dano moral e material (pensão). A Reclamada nega o nexo de causalidade entre a enfermidade que acometeu a Reclamante, relacionando o adoecimento a fatores genéticos, fisiológicos e comportamentais e aponta o atestado de “ID. 3320690, datado de 08/2023, que a própria obreira alega ter iniciado o quadro de ansiedade há 03 (três) anos, ou seja, no período da pandemia de COVID-19” (fl. 640). São pressupostos da obrigação de ressarcir: a) o dano, também denominado de prejuízo, que no caso do ressarcimento ou indenização decorrente de acidente de trabalho, é diretamente relacionado e por vezes confunde-se com a perda ou incapacidade laborativa adquirida no curso de relação de emprego; b) o ato ilícito ou o risco, que no caso do acidente de trabalho típico ou por equiparação exige a culpa do empregador, ainda que levíssima e; c) nexo de causalidade entre tais elementos, aqui, também, abrangido o chamado nexo técnico. A conduta positiva ou a conduta omissiva imputável ao empregador que resulta em danos à saúde física ou mental do trabalhador e sua incolumidade, notadamente a inobservância das normas de segurança e medicina do trabalho e a não adoção das medidas tendentes a reduzir ou eliminar os riscos do trabalho constitui ato ilícito ensejador do dever de indenizar o empregado pelos danos experimentados, uma vez que o contrato de emprego faz nascer entre as suas partes uma relação jurídica obrigacional com direitos e deveres ajustados previamente tanto por normas de interesse privado, quanto por normas de interesse público, notadamente as questões de segurança do trabalho e a dignidade do trabalho humano, da qual emerge o direito à integridade física e psíquica como direito fundamental da pessoa e a sua defesa com os meios inerentes a esta defesa. O artigo 7°, XXVIII, da CF/88 é de clareza solar: “Art. 7° - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXVIII – seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”. Logo, a responsabilidade do empregador é aquiliana, ou seja, decorre de culpa ou dolo, não se confundindo com a responsabilidade objetiva da seguradora, que é o INSS, no caso das indenizações tarifadas, conforme entendimento da Súmula 229 do STF. Não se aplica a teoria do risco ao empregador, eis que por expressa disposição constitucional, exige-se do empregador o agir com culpa, ainda que levíssima. Neste sentido é a jurisprudência: “Temos, assim, por força de expresso dispositivo constitucional, duas indenizações por acidente de trabalho, autônomas e cumuláveis. A acidentária, fundada no risco integral, coberta pelo seguro social e que deve ser exigida do INSS. Mas, se o acidente do trabalho (ou doença profissional) ocorrer por dolo ou culpa do empregador, o empregado faz jus à indenização comum ilimitada. Noutras palavras, o seguro contra acidente de trabalho só afasta a responsabilidade do empregador em relação aos acidentes de trabalho que ocorrerem sem qualquer parcela de culpa; se houver culpa, ainda que leve, (e esta deve ser provada), o empregador terá a obrigação de indenizar. Ainda que com matriz constitucional, advogados e juízes costumam referir-se a essa responsabilidade como fundada no Direito Comum, para diferenciá-la daquela outra que decorre diretamente da legislação acidentária” (CAVALIERI, Sérgio Filho. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo : Malheiros, 6a edição, 2006, 161). “Com efeito, o art. 7°, inciso XXVIII, da Carta de 1988 reza que o empregador responderá por indenização por acidente do trabalho quando incorrer em dolo ou culpa. Já aqui a responsabilidade é subjetiva, dependente de culpa do empregador, e a nova regra do parágrafo único do art. 927 do Código Civil mais uma vez não inova, porquanto sendo norma infraconstitucional, não pode modificar a regra insculpida na Constituição Federal, face ao princípio da supremacia da ordem constitucional, fundamento de validade de todo o ordenamento jurídico; lei posterior inferior (Lei 10.406/02, NCC) não revoga lei superior anterior (art. 7°, XXVIII, da CF/88), ou seja, o critério hierárquico lex superior derrogat inferiori sobrepõe-se ao critério cronológico. É importante insistirmos neste ponto. Não só pela abrangência imprimida pela imprecisão dos termos do parágrafo único do art. 927 do NCC, mas sobretudo porque há manifestações no meio jurídico acerca deste tema, algumas, permissa venia, incompreensivelmente pondo em dúvida a permanência do regime constitucional da responsabilidade civil subjetiva nas ações de indenização contra os empregadores por acidente de trabalho. Colocando-se de lado a questão, ainda cambiante, da competência jurisdicional para as ações dessa natureza, se pela via da Justiça Comum ou da Justiça especializada do Trabalho, ponderamos que não se sustenta a interpretação que se proponha a defender a responsabilidade objetiva, com suporte na teoria do risco, para os casos de indenização por acidente do trabalho contra o empregador, seja por dano material ou moral. E não se sustenta, a nosso sentir, porque a tentativa de aplicação do dispositivo nesta hipótese atrairia inexoravelmente a mácula da inconstitucionalidade. Pensar o contrário seria rematada insensatez, quiçá má-fé. Só por emenda à Constituição é que poderia esta intenção do legislador civilista vingar – se é que foi esse o seu desejo” (FRANCO. Otávio Augusto N. De Melo. Código em Vigor – A Responsabilidade e a Nova Legislação no Brasil in Juris Plenum, CD 1. Caxias do Sul: Plenum, ed. 70, março/abril 2003). Também a jurisprudência de renomada é no mesmo sentido: “As indenizações acidentária e do Direito Comum são autônomas e cumuláveis. A primeira, imposta segundo critério objetivo, é exigível do órgão previdenciário nos casos de infortúnios laborais não decorrentes de dolo da vítima. Já a segunda se mostra devida por qualquer pessoa, empregadora ou não, que por culpa, mesmo que leve, ocasione ou contribua para ocorrência do evento danoso” (STJ, Resp. 29.333-2-RJ, 4ª Turma, Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira). Inaplicáveis ao presente caso, portanto, a teoria do risco e o artigo 927, parágrafo único, do CCB, ante a vedação constitucional do artigo 7°, XXVIII, da CF/88. Realizada a perícia médica, conclui-se que o trabalho atuou como concausa para o adoecimento (quesito de n. 09 de fl. 1455), baseando-se o Perito apenas nas informações prestadas pela Reclamante, descritas às fls. 1450-1 do laudo, dentre elas, destaca-se: “que começa às 06:00 da manhã até as 23;00 horas todos os dias, inclusive finais de semanas e feriados, pois os clientes tinham somente como ponto de contato a periciada e por isso tinha que visitar os clientes e os outros revendedores de combustível para que ele pudesse ser revendedor SHEL. Em dezembro 2019 a cerca de 16:00 enquanto estava no carro, foi abordada e assaltada a mão armada e foi levado o carro e pertences da empresa e documentos pessoais da periciada, no outro dia foi lhe dado novo celular para continuar o trabalho e não fizeram CAT e nem encaminhado ao médico do trabalho ou RH.”. Veja-se a resposta ao quesito de “n. 12) De 0 a 10, qual era o grau de estresse decorrente do exercício da função, levando-se em conta os fatores tempo, resultado (produtividade), local de trabalho, exigência superior, horário de distração, etc? Baseado nos depoimentos da perícia sobre as condições de trabalho, que incluíam jornadas extensas, cobrança por metas inatingíveis, falta de intervalos de descanso adequados, e pressão psicológica constante pode ser considerado em grau 8.” (fl. 1452). Nessa mesma linha de entendimento (baseado nos fatos relatados pela Autora), o Perito respondeu aos quesitos (fl. 1452-3): (…) “15) De acordo com os seus conhecimentos técnicos, a doença poderia ter sido evitada caso fosse tomada alguma medida preventiva específica? Sim. Qual seria a medida que evitaria a doença, ou a doença aconteceria independentemente de qualquer medida preventiva? Diminuição da acúmulo de atividade entre reuniões, vendas e cobranças.” (…) “19) Havia pausas para descanso? Somente as que estavam previstas no contrato. Em caso afirmativo, quantas e com qual duração cada?” (…) 8) Concorda o(a) Douto(a) Perito(a) que na gênese dos distúrbios ansiosos e depressivos, de uma maneira em geral, bem como de outras patologias psiquiátricas, deve-se considerar o fator heredo constitucional como preponderante na origem destas patologias? Se a resposta for negativa, justifique. Não. Embora possa haver influência genética, os fatores ambientais, como condições de trabalho e sobrecarga, podem ser determinantes na origem dessas patologias. Outras situações não relacionadas com o trabalho, tais como problemas de ordem familiar, social, entre outros, podem porventura acarretar “stress” em um indivíduo heredo constitucionalmente predisponente, desencadeando as patologias psiquiátricas diagnosticadas? Caso a resposta seja negativa, justificar. Sim, fatores pessoais podem desencadear ou agravar patologias psiquiátricas em indivíduos predispostos. Houve algum acontecimento na vida pessoal-particular da parte reclamante, como doença de ente querido, término de relacionamento, desentendimentos familiares, assalto a mão armada, entre outros, que possa ter contribuído para o quadro psíquico alegado? Sim, o assalto à mão armada noticiado, ocorrido durante o trabalho pode ser fator que contribuiu para o estresse psicológico. (fl. 1454). Cabe analisar aqui, se o fatos relatados pela Autora e que atuaram como concausa foram devidamente provados, uma vez que o encargo probatório é atribuído à Reclamante por força do artigo 818, I, da CLT. A testemunha conduzida pela Autora, Ana Carolina Durville, trabalhou para a Reclamada no período junho/2014 a fevereiro/2019, não sendo contemporânea à Reclamante. Brenda Miranda Daré, testemunha apresentada pela Reclamada, declarou: “que trabalha para a reclamada desde dezembro de 2020; que atualmente trabalha como analista com trade marketing; que trabalhou junto com a reclamante de dezembro de 2020 a agosto de 2021; que não sabe quando a reclamante saiu dessa posição; que trabalhava na mesa equipe, na modalidade de teletrabalho; que não tinha controle de horário; que não tinha que informar o horário de trabalho e a reclamante também não; que a depoente atingia as metas normalmente; que não sabe da reclamante; que na visão da depoente, as metas eram razoáveis; que o gestor da depoente era o Roger Barcelos; que também era gestor da reclamante; que ele tinha tratamento com a depoente cordial, respeitoso e amigo; que não fazia cobranças excessivas para a depoente e nem condutas abusivas em relação a depoente; que não sabe dizer nada em relação a reclamante...” (fl. 1537). Não provou a Reclamante os fatos alegados na inicial e a testemunha ouvida a convite da Reclamada prestou depoimento firme, afirmando que as metas eram razoáveis e atingíveis e que o ambiente laboral era saudável. A jornada extenuante relatada na inicial não foi provada como foi decidido acima e não há comprovação de que os e-mails e mensagens enviados e trocados entre a Reclamante e demais funcionários ou supervisor sobrecarregavam a jornada e impediam a Reclamante de usufruir de seu descanso dentro e entre as jornadas de trabalho, o que não se mostra crível nesse contexto probatório, mormente porque não tinha nenhum controle de horário e porque as metas não eram abusivas. Não se vislumbra da prova produzida fiscalização ostensiva dos superiores hierárquicos ou cobrança de metas inalcançáveis. O depoimento de Brenda Miranda Daré é suficiente para comprovar a possibilidade de cumprimento de metas, posto que razoáveis (fl. 1537) e a Autora não demonstrou a impossibilidade de cumprimento dessas metas, sendo que em seu depoimento pessoal, a Autora disse que criava as metas e as acompanhava, constatando-se dos autos diversas promoções da Reclamante ao logo do contrato (fl. 59), pressupondo alcançar excelentes resultados e, por óbvio, o atingimento das metas impostas, porque ninguém é promovido quando não as atinge. Ao prestar esclarecimentos (ID a0a7f91), o Perito relatou que: “Transtornos psíquicos, como o transtorno misto ansioso-depressivo (CID F41.2), frequentemente têm causas multifatoriais, resultando de uma interação entre condições externas (laborais e extra laborais) e características individuais. A existência de fatores extra laborais não elimina, mas complementa, a análise de outras influências, como o ambiente de trabalho. Ademais, o ambiente laboral exerce influência direta sobre o cotidiano do trabalhador, exacerbando ou minimizando os impactos de fatores externos. No caso da periciada, o laudo constatou que as condições de trabalho contribuíram para a piora de seu quadro psíquico, o que não pode ser desconsiderado. O laudo pericial reconheceu esses fatores, mas destacou que o ambiente laboral atuou como concausa, ou seja, contribuiu significativamente para o agravamento do quadro psíquico, em 25%. A concausa não exige que o trabalho seja o único fator, mas sim que tenha tido influência relevante, o que foi adequadamente demonstrado. Diversamente do que alega a parte Reclamada, o laudo foi fundamentado em uma análise clínica abrangente. O relato da parte periciada não foi aceito de forma acrítica, mas contextualizado com os demais elementos do processo, conforme prática médica pericial usual. A reclamada nega a existência de jornada extenuante e ambiente estressante, argumentos que certamente terá oportunidade de demonstrar em audiência de instrução, contudo, os sintomas apresentados e aos documentos que corroboram que as condições de trabalho, indicam a presença de fatores estressores significativos. Embora os períodos de férias e descanso tenham sido formalmente respeitados, a carga de trabalho e o ambiente laboral durante os períodos ativos contribuíram para a instalação e agravamento do quadro psíquico. Não há contradição entre o respeito às normas formais e a presença de condições laborais que influenciem negativamente a saúde do trabalhador. O fato de a reclamante manter relações de amizade com colegas e sua gestora não exclui a possibilidade de condições laborais adversas. A existência de um ambiente aparentemente amistoso não neutraliza os efeitos de demandas excessivas ou de metas inalcançáveis, que foram analisadas e consideradas na conclusão pericial. A inexistência de registros de inaptidão nos ASOs ou de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) não invalida a conclusão pericial. O reconhecimento da concausa não exige necessariamente a emissão de uma CAT, especialmente em casos de transtornos psíquicos, cuja relação com o trabalho pode ser gradativa e menos evidente em exames clínicos periódicos. Do mesmo modo, a concessão do benefício B-31 não afasta o nexo concausal. O INSS adota critérios administrativos para concessão de benefícios, que não se sobrepõem à análise técnica realizada no âmbito judicial. A perícia judicial é a ferramenta apta a estabelecer a relação entre o trabalho e o adoecimento, sendo legítima e fundamentada a atribuição de concausa. O exame clínico evidenciou ausência de sinais incapacitantes no momento da perícia, mas isso não invalida a conclusão de incapacidade parcial e temporária à época dos fatos. A saúde psíquica é dinâmica, e o quadro pode ter evoluído positivamente desde o afastamento. A atribuição de concausa e incapacidade parcial considerou o período específico em que os sintomas comprometeram a capacidade de enfrentamento das demandas laborais.” Novamente, o médico perito reafirma que as condições laborativas - “interação entre os fatores laborais descritos nos autos, como pressão por metas e sobrecarga, e o agravamento do quadro psíquico da reclamante” - quesito de n. 3 da fl. 1481) atuaram como concausa, agravando o estado de saúde, fatos não provados, estando o laudo baseado nos relatos da Autora. Sobre a cobrança de trabalho no período das férias, a Autora juntou copia dos documentos que provam ter trabalhado no referido período e aqui se considera apenas os e-mails enviados pela e para a Reclamante, desconsiderando os de lista, porque podem ser enviados para todo o grupo sem que prove que a Autora estivesse trabalhando naquele período. A título de amostragem em 2022 encontram-se os e-mails de fls. 172, 165, 171, 169, 170 e fl. 174; em 2023 às fls. 187. Ademais, cabe registrar que a pandemia impactou o estado emocional da população de um modo geral e os laudos de fls. 49 e 1438-41 estão fundamentados apenas nos fatos narrados pela Autora acerca dos efeitos do trabalho sobre sua saúde mental, que não foram provados. Em relação ao assalto, trago trecho do laudo, quando o Perito responde quesitos, às fls. 1510-11: “1. Considerando a descrição do expert judicial, sobre a natureza multifatorial dos transtornos psíquicos, como o transtorno misto ansioso-depressivo (CID F41.2), e a interação entre fatores laborais e extra laborais, o ilustre perito pode detalhar como esses fatores foram avaliados na perícia e qual o peso relativo atribuído a cada um, considerando as características individuais da Reclamante, como histórico pessoal, condições familiares e sociais, bem como as condições do ambiente de trabalho descritas nos autos? Os transtornos psíquicos, em especial o transtorno misto ansioso-depressivo (CID-10: F41.2), são de etiologia multifatorial, podendo resultar de uma combinação de fatores internos (predisposição genética, personalidade, histórico de saúde mental, condições sociais e familiares) e fatores externos (ambiente de trabalho, eventos traumáticos, exigências profissionais e condições ambientais). Na avaliação pericial, os fatores foram ponderados conforme metodologia adotada na Psiquiatria Forense e na Medicina do Trabalho, com base nos seguintes elementos: Na análise do histórico pessoal, familiar e social, a periciada não apresentava registros prévios de transtornos psíquicos incapacitantes antes da relação de trabalho com a reclamada. Foram identificados eventos extra laborais (como o assalto ocorrido em 2019), mas estes não são suficientes para afastar a influência do ambiente de trabalho no agravamento do quadro. A periciada relatou carga elevada de trabalho, pressão por metas e ausência de pausas adequadas, elementos que estão diretamente associados ao agravamento de transtornos ansiosos-depressivos, conforme literatura médica. O histórico laboral aponta aumento dos sintomas de ansiedade e depressão durante o vínculo empregatício, corroborando a relação entre trabalho e adoecimento. Foi atribuído aos fatores extra laborais o peso de 75% e aos extralaborais (concausa): 25% Essa percentualização segue diretrizes técnicas para a avaliação da concausa, considerando a intensidade e a duração da exposição aos fatores laborais que agravaram o quadro.” (SIC). Observa-se em relação ao assalto a ocorrência de fato de terceiro, considerado pela doutrina defeito do nexo causal. Trata-se de evento imprevisível e alheio à esfera de controle da reclamada, equiparável a caso fortuito, que afasta a responsabilidade do empregador, posto que a segurança pública é dever do Estado, cuja omissão não se imputa à Reclamada. Ademais, não há prova de que a autora estivesse trabalhando no momento do infortúnio e a responsabilidade do empregador, no caso, não é objetiva. Apesar de a Autora não ter provado a jornada extenuante, informada na inicial e ao Perito (das 06h00 às 23h00), visto que sempre laborou sem controle de jornada e por isso poderia fixar os horários de trabalho com ampla liberdade, restou provado o labor no período das férias, o que não poderia ser permitido e tolerado pela Reclamada, visto que dessa forma as férias não atingiram o objetivo higiênico de desconexão e descanso. A Reclamante juntou cópia de e-mails, como se verifica em 2022, os de fls. 172, 165, 171, 169, 170 e fl. 174 e em 2023 às fls. 187, o que, inegavelmente, inviabiliza o gozo das férias e sua finalidade principal. A conduta da Reclamada é abusiva ao impedir que a Reclamante pudesse usufruir de suas férias e, embora, não positivado o direito à desconexão, este é assegurado a todo empregado de modo que o trabalhador possa, efetivamente, ter seu período de repouso e descanso preservado. E essa medida deveria ter sido assegura à Reclamante e nesse ponto é suficiente para contribuir para o adoecimento como concausa superveniente. De fato, a doença não foi causada diretamente pelo ambiente laboral ou pelas condições impostas pela Reclamada. Não há prova das metas inatingíveis e da jornada extenuante na rotina diária. Contudo, há prova da privação das férias nos anos de 2022 e 2023, como apontado pela Reclamante em razões finais, o que frustrou o direito à desconexão, ao descanso e ao lazer despreocupado, violando o direito ao gozo de férias, norma de proteção à saúde e higidez do empregado. A prática da Reclamada atua como concausa leve e autoriza responsabilizá-la pelo dano experimentado pela Reclamante, o que fixo no percentual de 5% de contribuição para o adoecimento. E por esse motivo, deixo de acolher o laudo da assistente técnica da Requerida que se baseou apenas nos fatores de ordem pessoal e no fato de terceiro (assalto) como se verifica às fls. 1425-32. Provado o fato danoso, a culpa da Requerida e havendo nexo concausal leve entre a enfermidade que acometeu a Autora e suas atividades, cabe a reparação pelo dano sofrido. A prova do dano moral é dispensável, posto que provado o ato ilícito da 1ª Requerida que resultou no dano sofrido pela Autora, deve responder pelo mesmo, sendo presumíveis os efeitos negativos na órbita subjetiva da Requerente. Ademais, não há como se provar a dor moral, a humilhação individual, a baixa autoestima e o sofrimento psíquico e moral, enquanto estados de espírito, já que inexistente uma medida objetiva para a dor da alma ofendida e atingida no mais profundo do seu ser. Neste sentido é a lição do Dr. Sérgio Cavalieri Filho: “O dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum” (in Programa de Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Malheiros, 4ª edição, 2003, p. 102). Diante do exposto, estão provados o fato lesivo, a ocorrência do dano moral e o evidente nexo de causalidade, impondo-se o dever de indenizar, por ausente qualquer excludente de culpabilidade que favoreça a Reclamada. A indenização além de repor as partes ao status quo ante, tem finalidade pedagógica e, por isso, deve ser tal monta que não gere o enriquecimento de uma das partes em face da outra, mas que também deverá impedir que a Ré volte a reincidir, não podendo ser irrisória diante da potência econômica da parte. Considerando a condição social da Requerente e a capacidade econômica da Requerida, além do tempo decorrido entre a lesão e a sua efetiva reparação, o valor da participação da concausa no adoecimento e atendendo aos pressupostos pedagógicos da indenização por danos morais, fixo a indenização por dano moral no importe de R$ 28.775,13 (três vezes o salário informado no TRCT de fls. 877 – R$ 9.591,71), uma vez que tal valor se revela razoável para coibir novos abusos em férias de empregados e para amenizar o sofrimento moral da Autora, que de resto é irreparável Deixo de aplicar o artigo 223-G da CLT porque a indenização decorrente de acidente/doença do trabalho é fixada com base na extensão do dano, conforme artigos 944 e 950 do Código Civil e não se trata de dano extrapatrimonial decorrente de relação de emprego. Não havendo incapacidade laborativa definitiva, indefere-se o pedido de pensão mensal vitalícia e de danos materiais que não restaram provado, posto que no momento da demissão a pedido estava trabalhando, o que significa que estava apta eu afastamento pelo INSS foi de curto período, quando recebeu auxílio-doença previdenciário e não acidentário. Em razão do labor nos períodos de férias, defere-se a dobra das férias com 1/3 nos gozadas períodos de 15/06/2020 a 28/06/2020, 22/06/2022 a 21/07/2022 e 26/06/2023 a 13/07/2023, não apontando a Reclamante de forma especifica os demais períodos. Indefere-se a dobra das férias gozadas relativas a 11/01/2023 à 22/01/2023 por não provado o labor no respectivo período. A Reclamante relata que, em 04/12/2019, durante sua jornada de trabalho, enquanto utilizava um veículo da empresa para levar um colega para casa, foi vítima de um roubo, enquanto atendia a um telefonema da empresa, perdendo seu veículo e pertences pessoais. Afirma que a Reclamada tomou providências e postula o recebimento de indenização por dano moral e material. Em depoimento pessoal, confessou que estava dando carona a um colega. De fato, o boletim de ocorrência de fls. 53-4 comprova que a Autora foi vítima de assalto, que se caracteriza como fato de terceiro, o que foi acima demonstrado., ou seja, fora do trabalho e em desvio de rota. No caso, a Reclamada não pode ser responsabilizada por dano provocado por outra pessoa em decorrência da violência urbana vivenciada por todos em nosso país. Conquanto provado o dano, o fato de terceiro quebra o nexo causal e não permite o deferimento da reparação patrimonial pretendida, mesmo porque as atividades desempenhadas não autorizam a aplicação da responsabilidade objetiva. Nesse sentido os julgados: DANO MORAL. ASSALTO. FATO DE TERCEIRO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. A responsabilidade civil não se caracteriza quando verificadas quaisquer das excludentes do nexo causal, tais como fato de terceiro, caso fortuito, força maior e culpa exclusiva da vítima. A ocorrência de assalto durante a prestação de serviços constituiu fato de terceiro, que é uma excludente do nexo causal, não podendo a empregadora ser responsabilizada, porque não demonstrada a prática de ato ilícito próprio ou de seus prepostos, razão pela qual se impõe manter a sentença que julgou improcedente o pedido de pagamento da indenização por danos morais. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (12ª Turma). Acórdão: 1001258-89.2022.5.02.0385. Relator(a): CINTIA TAFFARI. Data de julgamento: 29/01/2024. Juntado aos autos em 08/02/2024. Dano moral. Assaltos. O combate à violência é responsabilidade do Estado. Quem exerce a atividade policial é o Estado. Se o Estado, não dá segurança às pessoas, a culpa não é das empresas. A empresa não pode ser responsabilizada por fato de terceiro. Quem causou o dano ao reclamante foi o assaltante, nos termos do artigo 186 do Código Civil. A palavra "aquele" contida no artigo diz respeito a quem causou dano, que não foi o Correio. A empresa não praticou ato ilícito para responder pela indenização por dano moral. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (18ª Turma). Acórdão: 1000594-60.2020.5.02.0601. Relator(a): SERGIO PINTO MARTINS. Data de julgamento: 14/10/2020. Juntado aos autos em 21/10/2020). Indefere-se a indenização por dano moral e material (ressarcimento da importância de R$5.300,00. Indefere-se o pedido de conversão do pedido de demissão de 02/10/2023 (fl. 876), já que a Reclamante é detentora de escolaridade suficiente (confessou ter grau de instrução superior completo – fl. 1535), o que lhe permitia compreender os efeitos jurídicos de sua decisão, não demonstrando a existência de vício de vontade capaz de ensejar sua nulidade, mormente porque sua doença não lhe retira a capacidade de discernimento, mormente porque já estava laborando normalmente. Cabe esclarecer que o pedido de demissão gera efeitos jurídicos imediatos e não mais havendo contrato de trabalho em aberto, não há que se falar em rescisão indireta, pois quando a Reclamante abre mão de não mais permanecer no serviço em razão da gravidade dos acontecimentos/fatos que alega, deve ajuizar imediatamente a reclamação trabalhista, o que não ocorreu. A análise do conjunto probatório demonstra que o pedido de demissão é válido, não sendo maculado por vício de consentimento, o qual sequer foi apontado e cuja prova demanda comprovação inequívoca. De tudo o que foi exposto, não há como invalidar o pedido de demissão, o qual produz efeitos imediatos. Desse modo, julgo improcedente o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho ante ao pedido de demissão válido, formulado pela Autora, que produziu seus regulares efeitos. Indevida a entrega das guias do SD-CD, multa de 40% do FGTS, aviso prévio indenizado, levantamento dos depósitos do FGTS. As férias proporcionais com 1/3 e 13º salário proporcional foram quitados no TRCT de fls. 74-6 e guia de fl. 77. Nada mais a deferir. As verbas rescisórias descritas no TRCT foram quitadas no prazo previsto no § 6º do artigo 477 da CLT. Vale lembrar que o prazo do artigo 477, parágrafo sexto, da CLT é para quitação das parcelas incontroversas, sendo certo que as parcelas postuladas nessa reclamatória trabalhista, caso deferidas, não autorizariam a aplicação da multa do artigo 477, parágrafo oitavo da CLT, ante a quitação do incontroverso no prazo. Rejeita-se. Preenchidos os requisitos do artigo 790, § 3º da CLT, com a redação dada pela Lei 10.537, de 27.08.2002, conforme declaração de fl. 31, a Reclamante faz jus aos benefícios da gratuidade da justiça, já que inexiste prova em contrário aos termos de tal declaração, tendo afirmado em depoimento pessoal que se encontra desempregada. Defere-se. Em face da controvérsia estabelecida nos autos, nada a deferir a título do artigo 467 da CLT. Não foram pagas parcelas a mesmo título das que foram deferidas, de modo que não se pode cogitar de qualquer compensação, além do que já restou determinado. Considerando o grau de zelo profissional, que a prestação de serviços ocorreu no local onde o patrono tem escritório, a natureza da causa, seu valor e sua complexidade e o tempo despendido para o deslinde do feito, fixo os honorários advocatícios a serem suportados pela Reclamada em favor dos advogados da Reclamante em 10% do valor que resultar da liquidação da sentença. Havendo sucumbência recíproca, a Reclamante arcará com honorários sucumbenciais de 10% do valor dos pedidos indeferidos em favor dos patronos da Reclamada. Valendo-me dos princípios da uniformidade das decisões, reformulo posicionamento anteriormente adotado em relação à sucumbência da parte autora. Sendo o Reclamante beneficiário da justiça gratuita, deverá ser observada a decisão do pleno do Supremo Tribunal Federal, de 20/10/2021, no julgamento da ADI 5766/DF, que declarou a inconstitucionalidade parcial do § 4º do artigo 791-A da CLT e o artigo 98, § 2º e § 3º do CPC c/com artigo 769 da CLT, no qual estão abrangidos na gratuidade da justiça os honorários do advogado e do perito. Ou seja, deflui-se dos textos mencionados a manutenção da responsabilidade da parte sucumbente pelo pagamento dos honorários, mas condicionada a exigibilidade à demonstração de que a hipossuficiência da parte autora tenha deixado de subsistir no interregno de dois anos do trânsito em julgado da sentença (parte final do § 4º do artigo 791-A da CLT), findo os quais, a obrigação será extinta. Registre-se ainda que os valores deferidos nesta sentença não autorizam afastar a condição de hipossuficiência atestada pelo Autor. Tendo em vista o trabalho apresentado, bem como o tempo despendido na confecção do laudo, o zelo profissional e o grau de especialização, fixo os honorários periciais devidos ao perito, Dr. Cleiton Chagas de Araújo, no importe de R$3.500,00, a serem suportados pela Reclamada, sucumbente em relação ao objeto da perícia (artigo 790-B, da CLT). Juros de mora e correção monetária na forma das decisões do Excelso Supremo Tribunal Federal no julgamento conjunto da ADC 58, ADC 59, ADI 6021 e ADI 5867, cujo efeito é vinculante (artigo 102, parágrafo 2º, da CF), devendo a atualização dos créditos decorrentes desta condenação observar a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial com juros de 1% e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC, que já contempla a correção monetária e os juros (Isso porque a taxa SELIC é um índice composto, isto é, serve a um só tempo como indexador de correção monetária e também de juros moratórios, nos termos do artigo 406 do Código Civil). A partir de 30/08/2024, com a vigência da Lei 14.905/2024, deverão ser utilizados os parâmetros previstos nos §§ 1º e 3º 406 do CC, observando que, caso a Selic seja negativa, será considerada zero para efeito de cálculo dos juros, conforme o § 3º do referido artigo. Aplica-se ao presente caso a Súmula 439 do TST: “DANOS MORAIS. JUROS DE MORA E ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. Nas condenações por dano moral, a atualização monetária é devida a partir da data da decisão de arbitramento ou de alteração do valor. Os juros incidem desde o ajuizamento da ação, nos termos do art. 883 da CLT”. A condenação não está limitada aos valores postulados na exordial, conforme entendimento majoritário do Colendo TST, que tem entendido que o cálculo das verbas devidas feito no pedido inicial, conforme artigo 840, § 1º da CLT, não limita os valores da condenação trabalhista, que seria meramente estimativo, eis que segundo o artigo 12, § 2º, da IN nº 41/2018 do TST o valor declinado na inicial será estimado, não se justificando a limitação da condenação aos valores expressos na inicial porque o empregado não possui documentos para cálculos e indicação de valores exatos. Logo, o quantum debeatur deverá ser apurado em liquidação de sentença. Nesse sentido, a jurisprudência do C. TST: “...RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. APELO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. A controvérsia gira acerca da aplicação do artigo 840, § 1º, da CLT, que foi alterado pela Lei 13.467/2017. No caso em tela, o debate acerca do art. 840, § 1º, da CLT, detém transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. A controvérsia acerca da limitação da condenação, aos valores liquidados apresentados em cada pedido da inicial, tem sido analisada pela jurisprudência dominante apenas sob a égide dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil. Por certo que aludidos dispositivos do CPC são aplicados subsidiariamente no processo trabalhista. Entretanto, no que se refere à discussão acerca dos efeitos dos pedidos liquidados, apresentados na inicial trabalhista, os dispositivos mencionados do CPC devem ceder espaço à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 840 da CLT, que foram alterados pela Lei 13.467/2017. Cumpre esclarecer que o TST, por meio da Resolução nº 221, de 21/06/2018, considerando a vigência da Lei 13.467/2017 e a imperativa necessidade de o TST posicionar-se, ainda que de forma não exaustiva, sobre a aplicação das normas processuais contidas na CLT alteradas ou acrescentadas pela Lei 13.467/2017, e considerando a necessidade de dar ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que no seu art. 12, § 2º, normatizou que “para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado (...)”. A Instrução Normativa nº 41/2018 do TST, aprovada mediante Resolução nº 221, em 02/06/2018, registra que a aplicação das normas processuais previstas na CLT, alteradas pela Lei 13.467/2017, com eficácia a partir de 11/11/2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidas sob a égide da lei revogada. Portanto, no caso em tela, em que a inicial foi ajuizada no ano 2018, hão de incidir as normas processuais previstas na CLT alteradas pela Lei 13.467/2017. Assim, a discussão quanto à limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial deve ser considerada apenas como fim estimado, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta Corte. A decisão regional que limitou a condenação aos valores atribuídos aos pedidos na inicial configura ofensa ao art. 840, § 1º, da CLT. Reconhecida a transcendência jurídica do recurso de revista. Recurso de revista conhecido e provido. (TST, processo TST-ARR-1000987-73.2018.5.02.0271, Ac. Unânime da 6ª Turma, Relator Ministro Augusto César Leite de Carvalho, julgamento de 14/10/2020)”. POSTO ISTO, rejeito a preliminar de inépcia da inicial, pronuncio a prescrição da pretensão relativa às parcelas anteriores a 25/04/2019 com a EXTINÇÃO DO PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, com fulcro no artigo 487,II do CPC, em relação às mesmas e julgo o pedido na reclamação trabalhista PROCEDENTE, EM PARTE, para condenar RAIZEN COMBUSTÍVEIS S.A. a pagar a IZADORA ROSA DOLFINI: indenização por dano moral no importe de R$ 28.775,13; férias em dobro com 1/3 dos períodos gozados de 15/06/2020 a 28/06/2020, 22/06/2022 a 21/07/2022 e 26/06/2023 a 13/07/2023, conforme se apurar em liquidação de sentença, bem como fica a Reclamada condenada a pagar honorários advocatícios decorrentes da sucumbência de 10% do valor que resultar da liquidação da sentença em favor dos patronos da Reclamante e honorários periciais ao perito, Dr. Cleiton Chagas de Araújo, no importe de R$3.500,00, em 05 dias, após o trânsito em julgado, nos termos da fundamentação, que integra este dispositivo. Honorários advocatícios sucumbenciais pela Autora no importe de 10% sobre o valor dos pedidos indeferidos em prol dos procuradores da Reclamada, sob condição suspensiva, nos termos da fundamentação. Juros e correção monetária na forma da fundamentação. Em atenção ao disposto no artigo 832, § 3º, da CLT, declaro que as parcelas deferidas possuem natureza indenizatória, não constituindo salário de contribuição, com fulcro no artigo 28, § 9º, da Lei 8.212/91 e artigo 214, § 9º, do Decreto 3.048/99. Não há descontos fiscais, na forma do artigo 46, § 2º, da Lei 8.541/92; da Lei 7.713/88 e do artigo 28 da Lei 10.833/2003. Custas pela Reclamada no importe de R$ 1562.00, calculadas sobre R$ 78.100,00 valor arbitrado à condenação. Oficie-se à UNIÃO (INSS), para os devidos fins legais. Intimem-se as partes e o Perito. Nada mais. RENATO HIENDLMAYER Juiz Titular de Vara do Trabalho
Intimado(s) / Citado(s)
- RAIZEN COMBUSTIVEIS S.A.
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