Processo nº 0000548-31.2013.4.01.3904
ID: 343253842
Tribunal: TRF1
Órgão: Gab. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0000548-31.2013.4.01.3904
Data de Disponibilização:
05/08/2025
Advogados:
EDISON MESSIAS DE ALMEIDA
OAB/PA XXXXXX
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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0000548-31.2013.4.01.3904 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000548-31.2013.4.01.3904 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: VICENTE DE PAULA PED…
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0000548-31.2013.4.01.3904 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000548-31.2013.4.01.3904 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: VICENTE DE PAULA PEDROSA DA SILVA e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: EDISON MESSIAS DE ALMEIDA - PA9516-A POLO PASSIVO:MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - MPF RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0000548-31.2013.4.01.3904 RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Trata-se de recurso de apelação interposto por Vicente de Paula Pedrosa da Silva, Valter Barbosa Guimarães Júnior, Espólio de Antonio Agostinho Abdoral Lopes, Maria de Nazaré Souza Lopes e Marcus Antônio de Souza Abdoral Lopes, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Castanhal/PA, que nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal, julgou procedente o pedido, condenando os apelantes pela prática dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10, caput, e XI, e art. 11, caput, e II, da Lei 8.429/1992, com a aplicação das sanções previstas no art. 12 do mesmo Diploma (ID. 22437976, fls. 157/183). Nas razões, os apelantes arguem preliminares de inépcia da inicial, que não teria atendido o art. 319, III, do CPC, e afronta ao princípio da correlação. Quanto ao mérito, sustentam que o débito relativo a contribuições previdenciárias foi objeto de parcelamento pelo município, consoante prova acostada ao feito, o que afasta o dolo necessário para a configuração de ato de improbidade administrativa, que somente se perfaz com “desonestidade, má fama, incorreção, má conduta, má índole, mau caráter”, elementos não comprovados nos autos. Ressaltam que não ficou demonstrado desvio de recursos públicos ou prejuízo ao erário e que todos os valores repassados para o município foram direcionados para despesas em atividades meio da educação, como aquisição de combustível para os automóveis utilizados pela Secretaria de Educação, pagamento de aluguel do imóvel onde funcionava a pasta, além de energia elétrica do local (ID. 22437976, fls. 188/218). Contrarrazões (ID. 22437975, fls. 9/15). O Ministério Público Federal (PRR1) oficia pelo não provimento da apelação (ID. 22437975, fls. 19/27). Em petições intercorrentes, os apelantes apresentam questão de ordem, na qual requerem a “extinção do feito”, considerando as disposições da Lei 14.230/2021, que devem ser aplicadas retroativamente, em especial para reconhecimento da prescrição intercorrente, nos termos do art. 23, § 4º, I, § 8º, II e § 5º, todos da LIA. Em outra vertente, ratificam os fundamentos acerca da ausência de prova do dolo específico e do prejuízo, elementos exigidos pela citada lei para reconhecimento de atos de improbidade administrativa (ID. 188020037 e ID. 259384024). É o relatório. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0000548-31.2013.4.01.3904 VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL FAUSTO MENDANHA GONZAGA, Relator convocado: Afasto as preliminares de inépcia e afronta ao princípio da correlação, uma vez que a inicial apresentada pelo MPF atendeu de maneira suficiente o disposto no art. 319 do CPC, narrando os fatos até então apurados, bem como os fundamentos jurídicos do pedido. A peça permitiu o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa. Ademais, a arguição se confunde com o mérito, pois os apelantes se insurgem alegando ausência de elementos suficientes para determinar o ajuizamento da ação e tampouco a condenação. Quanto à alegada prescrição intercorrente, no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal fixou, dentre outras, a seguinte tese após exame da Lei 14.230/2021: 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. Sendo assim, o novo regime prescricional da Lei de Improbidade não possui eficácia retroativa, não sendo aplicável aos processos anteriores à data da publicação das modificações legais. Quanto ao mérito, consta em síntese, que Relatório de Inspeção do Tribunal de Contas dos Municípios do Pará indiciou uma série de irregularidades na aplicação de recursos do FUNDEF no exercício de 2006, durante a gestão do primeiro apelante, que ocupava o cargo de prefeito. Valter Barbosa era o secretário de finanças e Antonio Agostinho Abdoral Lopes era secretário de educação. Na sentença, o Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, asseverando que: 2.1.1 Ausência de comprovantes de recolhimento ao INSS da contribuição previdenciária devida sobre as folhas de pagamento e os recibos emitidos (...) Em defesa, os demandados pontuaram a inexistência de débito de natureza previdenciária, haja vista o parcelamento da dívida. À prova de suas alegações, localizam-se as certidões negativas de débitos emitidas em 2010, 2011 e 2013 (fls. 1901/1903), além de autorização de débito parcelado em conta (fl. 1907). O apurado pela Controladoria-Geral da União aliado à ulterior adesão à parcelamento dos débitos previdenciários reforça o contexto probatório pela existência da conduta atribuída na inicial aos requeridos, na condição de ordenadores das despesas executadas com recursos do Fundo em questão. Diante de tal quadro, competiria aos demandados, a teor do art. 373, inciso II do CPC, demonstrar a não ocorrência das imputações feitas ou a existência de justa causa para a prática. Os réus, entretanto, se limitaram a apontar a realização de parcelamento posterior do débito, sem destacar em qual finalidade foram, contemporaneamente, utilizadas as contribuições retidas. Ou seja, não demonstrada a impossibilidade de atendimento da obrigação legal. (...) Subsiste, portanto, hígida a conduta em tela, razão pela qual necessário aferir o possível enquadramento em alguma das hipóteses previstas na Lei n° 8.429/92. Nesse sentido, a análise e interpretação da lei de improbidade administrativa exige ponderação do julgador, ante a gravidade das sanções nela previstas, sendo certo que, caso não evidenciado o malferimento dos princípios constitucionais aliado a má intenção do administrador, indevido se torna o enquadramento da conduta como ímproba. No caso, inviável a subsunção da conduta à hipótese contida no art. 10, inciso X da Lei n° 8.429/92 (agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público), em razão da ausência de comprovação do efetivo prejuízo patrimonial ocasionado aos cofres públicos. Como antes mencionado, o débito previdenciário oriundo da omissão de repasse dos valores retidos sobre as folhas de pagamentos e recibos emitidos constam como objeto de parcelamento administrativo. Não fosse suficiente, igualmente se mostra inadequado o enquadramento na espécie ímproba citada, haja vista que, no caso em apreço, houve a devida arrecadação do tributo (contribuição previdenciária), que apenas deixou de ser repassado à Previdência Social. A atuação em desacordo com a disciplina legal exigível na espécie, contudo, constitui conduta tipificada tanto no caput do art. 11 da Lei 8.429/92, quanto no respectivo inciso II. (...) 2.1.2 Ausência de identificação do destino dos recursos do FUNDEF transferidos eletronicamente O Relatório de Auditoria da Controladoria-Geral da União, utilizado como suporte à pretensão inicial, imputa aos demandados a ausência de comprovação do destino de transferências no valor de R$ 313.558,71. Segundo a CGU, os demandados não teriam se manifestado quanto à destinação de duas transferências nos valores de R$ 74.300,00 e R$ 2.503,10, bem como, quanto aos demais valores tidos como não comprovados, destacou que os auditores concluíram não coincidirem com a utilização alegada pelo agente executor ou não ter havido comprovação por meio de documentos hábeis (fls. 34/37). Conforme laudo pericial, os valores cuja destinação não teria sido identificada seriam apenas os R$ 74.300,00 e R$ 2.503,10 (fl. 2754). Quanto aos valores restantes para se alcançar o montante apontado pela CGU, o perito refere "dificuldade para se identificar a procedência de algumas afirmações, por falta de exposição de forma clara, com memória de cálculo (listagens, relações individualizada) de valores que resultaram nos montantes apontados como pendentes de esclarecimentos por parte do Gestor". Oportunizado às partes impugnar o laudo, os demandados se manifestaram pela sua aceitação; de seu turno, o MPF informou que o faria em alegações finais, não tendo ali refutado em qualquer medida o trabalho do perito relativo à constatação em apreço, devendo prevalecer a conclusão aposta naquele trabalho técnico, ou seja, a ausência de comprovação apenas do montante de R$ 76.803,10 (correspondente ao somatório dos importes de R$ 74.300,00 e R$ 2.503,10). Convém assinalar a impossibilidade de se acatar a importância total impugnada pela CGU, haja vista que, de fato, padece o relatório de indeterminação dos cálculos procedidos para a fixação do valor. Não fosse tal inconsistência da tese inicial, ainda restaria a observação realizada pelo perito de que "os valores aplicados/pagos, não precisam necessariamente ser os mesmos que os valores transferidos de conta para conta, em virtude de que há uma movimentação dinâmica de valores, envolvendo saldos anteriores, transferências tanto recebidas como enviadas, apuração de saldos etc." (fl. 2755). Certo, por último, que a deficiência da imputação inicial, insuficiente, ressalte-se, mesmo para a realização do trabalho pericial, e não esclarecida no regular transcurso do feito, não pode ser interpretada em desfavor dos réus. Desta forma, ante a completa ausência de elementos capazes de indicar a efetiva destinação de parte dos recursos recebidos, qual seja, R$ 76.803,10, para a finalidade pública legitimamente esperada, cabível a subsunção da conduta ao tipo do artigo 10, caput, da Lei n° 8.429/92, entendimento reforçado ainda pelo fato de o elemento subjetivo necessário para a respectiva tipificação dispensar a demonstração de dolo, contentando-se com a adoção de comportamento a titulo de culpa. (...) 2.1.4 Despesas executadas em desacordo com a legislação do FUNDEF (...) A tese defensiva sustentou que as despesas impugnadas harmonizam-se com os gastos em educação ou guardam afinidade às atividades próprias da educação, havendo ainda itens residuais de valores inexpressivos, as quais não teriam maior relevância para caracterização de improbidade administrativa. Cabe destacar, ademais, que, em manifestação do agente executor perante a CGU, houve questionamento apenas quanto à inclusão das despesas com combustíveis, sob a assertiva de que "utilizados efetivamente em veículos disponibilizados para a SEMED executar os trabalhos periódicos de acompanhamento técnico pedagógico nas escolas da zona rural e mesmo na zona urbana.". Quanto à conduta em apreço, respondeu o perito ao quesito apresentado pelos réus (fl. 2761): "Entender que tais despesas não podem ser abarcadas pelo disposto no inciso V, do art. 70 da Lei n° 9.394/96, comporta subjetividade que esta Perícia prefere não opinar, uma vez que os órgãos de controle têm as suas próprias convicções sobre a matéria.". (...) Não fosse suficiente, diante da assunção, ao menos parcial, da conduta quando da auditoria realizada pela CGU e da inexistência de comprovação, durante o transcurso processual, da restituição dos valores à conta específica do FUNDEF para que fossem realizadas despesas com vistas à consecução dos objetivos básicos das instituições educacionais de todos os níveis (Art. 70, Lei n° 9.394/96), tem-se que os réus não se desincumbirann do ônus de ilidir a imputação inicial. A consciência da utilização indevida dos valores afetos às finalidades da Lei de Diretrizes e Bases (Lei n° 9.394/96) demonstra o dolo necessário à caracterização dos atos de improbidade que causam lesão ao erário. Em relação à demonstração do efetivo prejuízo aos cofres públicos, do relatório de auditoria da CGU, às fls. 39/42, verifica-se o resumo das despesas realizadas. A lesão ao erário, conforme ali indicado, totaliza o montante de R$ 30.506,21 (trinta mil, quinhentos e seis reais e vinte e um centavos). Por conseguinte, resta evidenciado o enquadramento da conduta analisada no tipo previsto no art. 10, inciso XI, da Lei nº 8.429/92 (Negritos no original e sublinhados nossos). Verifica-se que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, que poderá ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199). O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...). Do que se extrai do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo dolo seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11. Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa prevista no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo. Essa revogação não alcançará ações iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992 que tiverem transitado em julgado. Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR. Não obstante, por meio de interpretação lógico-sistemática, infere-se que é possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da Constituição Federal, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos. O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso. Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré. Feitas tais considerações, extrai-se que os apelantes foram condenados pela prática das condutas previstas no art. 10, caput, e XI, da LIA, cujo caput, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, estava assim redigido: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: Com a redação dada pela nova lei, o dispositivo passou a prever o que segue: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: Destaque-se que a reiterada jurisprudência desta Corte orienta que para configurar o ato de improbidade que causa dano ao erário, deverá ser comprovado o dolo dirigido para a prática da conduta que, por seu turno, deve acarretar perda patrimonial efetiva, não sendo mais admitida a configuração de dano presumido. Precedentes: AC 0011852-47.2014.4.01.3304 e AC 0027450-02.2009.4.01.3600. Consolidado também o entendimento de que a simples inobservância dos requisitos legais no que diz respeito à destinação da verba não autoriza, por si só, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992. A atenta análise da sentença demonstra que a condenação se baseou em conduta culposa e na presunção de dano decorrente da suposta não comprovação do destino da verba, ou da utilização em despesas que não seriam elegíveis. A responsabilização se fundou em omissão, negligência e desídia. Destaque-se que o próprio sentenciante menciona a ausência de prova do dolo de causar dano ao erário, mas apenas da conduta culposa no que diz respeito à ausência de comprovação do destino de verbas, salientando que o perito judicial observou expressamente que "os valores aplicados/pagos, não precisam necessariamente ser os mesmos que os valores transferidos de conta para conta, em virtude de que há uma movimentação dinâmica de valores, envolvendo saldos anteriores, transferências tanto recebidas como enviadas, apuração de saldos etc." Além disso, quanto à adequada destinação de recursos, reconheceu que os valores foram de fato utilizados para pagamentos de despesas do município, embora inelegíveis pelo FUNDEF, o que demonstra a inexistência de prejuízo ao erário. No que concerne às despesas objetivamente irregulares, como o pagamento de conta de celular de uso pessoal do então prefeito e energia elétrica de prédios não vinculados à educação fundamental, os valores diluídos no total da verba enviada pelo FUNDEF não se mostram suficientes para comprovar dolo necessário à configuração de ato de improbidade. Dessa forma, a ausência de elementos probatórios consistentes afasta a caracterização do dolo ou do dano material efetivo, pressupostos indispensáveis para a tipificação do ato de improbidade previsto no art. 10, caput, e XI, da Lei 8.429/1992. Nos termos dos precedentes desta Corte, “tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova” (AC 0001413-80.2015.4.01.4002). Verifica-se que não foi comprovada a existência de dolo específico ou de má-fé por parte dos apelantes, mas apenas o descumprimento de procedimentos legais, o que, embora reprovável sob a ótica da legalidade administrativa, não se reveste, por si só, dos elementos configuradores do ato ímprobo, notadamente a intenção deliberada de causar lesão ao patrimônio público. A efetiva ocorrência de lesão aos cofres públicos é necessária quando se trata de dano ao erário, posto que é requisito objetivo para a configuração do tipo, sendo incabível o dano presumido (dano in re ipsa). No caso concreto, o MPF não se desincumbiu do ônus de comprovar a perda patrimonial concreta. O STJ decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. A propósito: ADMINISTRATIVO. ATO ÍMPROBO. DANO PRESUMIDO. ALTERAÇÃO LEGAL EXPRESSA. NECESSIDADE DE EFETIVO PREJUÍZO. MANUTENÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. 1. Em sessão realizada em 22/2/2024, a Primeira Seção, por unanimidade, cancelou o Tema 1.096 do STJ, o qual fora outrora afetado para definir a questão jurídica referente a "definir se a conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente configura ato de improbidade que causa dano presumido ao erário (in re ipsa)". 2. Após o referido cancelamento, ressurgiu a necessidade desta Primeira Turma enfrentar a seguinte controvérsia jurídica: com a expressa necessidade (tratada nas alterações trazidas pela Lei 14.320/2021) de o prejuízo ser efetivo (não mais admitindo o presumido), como ficam os casos anteriores (à alteração legal), ainda em trâmite, em que a discussão é sobre a possibilidade de condenação por ato ímprobo em decorrência da presunção de dano? 3. Os processos ainda em curso e que apresentem a supracitada controvérsia devem ser solucionados com a posição externada na nova lei, que reclama dano efetivo, pois sem este (o dano efetivo), não há como reconhecer o ato ímprobo. 4. Não se desconhece os limites impostos pelo STF, ao julgar o Tema 1199, a respeito das modificações benéficas trazidas pela Lei 14.320/2021 às ações de improbidade ajuizadas anteriormente, isto é, sabe-se que a orientação do Supremo é de que a extensão daquele tema se reservaria às hipóteses relacionadas à razão determinante do precedente, o qual não abrangeu a discussão ora em exame. 5. In casu, não se trata exatamente da discussão sobre a aplicação retroativa de alteração normativa benéfica, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido, sendo este (o dano presumido) admitido após construção pretoriana, a partir da jurisprudência que se consolidara no STJ até então e que vinha sendo prolongadamente aplicada. 6. Esse entendimento (repita-se, fruto de construção jurisprudencial, e não decorrente de texto legal) não pode continuar balizando as decisões do STJ se o próprio legislador deixou expresso não ser cabível a condenação por ato ímprobo mediante a presunção da ocorrência de um dano, pois cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão. 7.Recurso especial desprovido. Embargos de declaração prejudicados. (REsp 1.929.685/TO, Primeira Turma, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 02/09/2024.) No mesmo sentido a jurisprudência desta Corte: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/1992. APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI 14.230/2021. TEMA 1199. ART. 10, CAPUT, E ART. 11, VI, AMBOS DA LIA. NÃO COMPROVAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DO DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES. ATO DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. (...) 4. A Lei 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo e comprovado prejuízo ao Erário e a demonstração do elemento subjetivo (dolo) para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10, bem como não mais se admite a responsabilização por ato lesivo na forma culposa. 5. O dano in re ipsa não mais serve como fundamento para condenação em ato ímprobo, uma vez que, como já mencionado, o art. 10, caput, da LIA, passou a exigir a comprovação do efetivo dano ao erário para configuração do ato ímprobo. (...) 7. Não há prova de que os recursos federais repassados pelo FNDE foram aplicados em fins alheios ao interesse público ou em proveito próprio do citado ex-prefeito ou de terceiro, também não há prova que demonstre a existência de irregularidades na utilização dos recursos federais repassados ao Ente Municipal. 8. O réu/apelado foi condenado tão somente porque deixou de prestar contas ao FNDE, não havendo prova de que ele teria deixado de prestar contas para ocultar irregularidades. Assim, não é o caso de sua condenação pela prática de ato ímprobo descrito no art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992. 9. Posicionamento do STF, em recente julgado, entendeu que as alterações da Lei 14.230/2021 devem ser aplicadas às ações em curso, excetuando-se apenas aquelas em que já houve o trânsito em julgado (ARE 803568 AgR-segundo-EDv-ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 22/08/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 05-09-2023 PUBLIC 06-09-2023). 10. Recurso de apelação não provido. (AC 1001217-78.2018.4.01.3100, TRF1, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Solange Salgado da Silva, PJe 24/05/2024.) Ademais, é de conhecimento geral que o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. A jurisprudência também é firme no sentido de que a improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé. A propósito: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA DE LICITAÇÃO. PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA. SUPERFATURAMENTO NÃO EVIDENCIADO. PROGRAMA PAB FIXO. APLICAÇÃO DE RECURSOS EM PROCEDIMENTOS DE MÉDIA E ALTA COMPLEXIDADE. IRREGULARIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO. DOLO NÃO DEMONSTRADO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO AFASTADA. PROVIMENTO DAS APELAÇÕES. SENTENÇA REFORMADA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. (...) 7. Não há nos autos demonstração de inexecução do objeto do Programa, ou de danos efetivos aos cofres públicos. Os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos malsãos, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o condão de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública, o que não ficou comprovado. 8. O fato de terem sido apurados, pela CGU, em relação a alguns itens confrontados, valores menores do que os praticados pela farmácia contratada, não comprova ipso facto a existência de superfaturamento: não há evidências de fraude na coleta de preços, mediante combinação e/ou ajuste entre os demandados, com o dolo de causar enriquecimento ilícito, desvio de verbas ou perda patrimonial efetiva. 9. Ao autor competia, em prova pericial, demonstrar que os preços oficiais, nos quais se baseou a Controladoria, deveriam ser amplamente utilizados e, ainda, que os valores orçados pelo estabelecimento farmacêutico teriam sido inadequados ou incompatíveis com os preços praticados no mercado (levando-se em conta o fato de o município estar localizado fora da região metropolitana). 10. No que diz com a imputação de conduta ímproba ao ex-prefeito em razão da aplicação das verbas do Programa de Atendimento Básico - PAB em despesas não elegíveis (serviços de média e alta complexidade), embora o fato seja indicativo de irregularidade formal, não comprova a existência de improbidade, à míngua de demonstração de dano. Não obstante a impropriedade vê-se que restou mantida a destinação pública de tais recursos, uma vez que aplicados em benefício da população. 11. A ausência de registro do nome dos pacientes e dos exames efetuados nas notas fiscais expedidas e nos respectivos empenhos afeiçoa-se à mera irregularidade, que não se eleva à categoria de atos de improbidade administrativa, mormente porque não evidenciada a prática de conduta dolosa. 12. Não se pode confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei n. 8.429/92, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, em especial, a legalidade e a moralidade, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público. Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ato ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. 13. Os relatórios da CGU têm muita importância como início de prova, para dar base à propositura da ação, mas, documentos unilaterais elaborados sem os auspícios do contraditório, por si só, não são aptos (em princípio) a conduzir a uma condenação por atos de improbidade, devendo, mesmo como peças administrativas revestidas de presunção juris tantum de legitimidade, receber o apoio de outros meios de prova, que não foram produzidos. 14. Tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII - CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. 15. Preliminar de prescrição afastada. Apelações providas. Sentença reformada. Improcedência (in totum) da ação. (AC 0027450-02.2009.4.01.3600, TRF1, Quarta Turma, Rel. Des. Fed. Olindo Menezes, e-DJF1 20/04/2023.) Sendo assim, ausente a demonstração inequívoca da ocorrência de dano ao erário, bem como não comprovado o dolo específico, não se configura a prática de ato de improbidade administrativa tipificado no art. 10 da LIA. A sentença condenou os apelantes, ainda, pela prática do ato ímprobo previsto no art. 11, II, da LIA, que, entretanto, foi revogado pela Lei 14.230/2021, tornando atípica a conduta imputada. Consigne-se que para a condenação inexiste hoje a possibilidade de enquadramento da conduta somente no caput do art. 11, porque tal dispositivo, isoladamente, não traz em si nenhum ato ou conduta que possa ser considerada ímproba e, portanto, somente se configura caso vinculado a algum de seus incisos. Precedentes do TRF 1ª Região: AC 0011428-36.2009.4.01.3900, AC 0004242-33.2016.4.01.3312 e EDAC 0003493-86.2016.4.01.4000. Cabe asseverar que os incisos do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa, após o advento da Lei 14.230/2021, passaram a ostentar caráter taxativo e não meramente exemplificativo como anteriormente, de sorte que a configuração da improbidade por violação aos princípios da administração pública somente ocorrerá ante a perfeita subsunção do fato específico aos tipos legais, devendo ficar cabalmente demonstrado que a conduta violou “os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade”, o que não se vê no caso dos autos. Nesse contexto, esta Corte, em casos de condenação pelo art. 11, caput e seus incisos revogados, tem assim se posicionado: DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. AFASTAMENTO DAS CONDUTAS CULPOSAS. ART. 11, CAPUT. REVOGAÇÃO. CONDUTA INEXISTENTE. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. A Lei 8.429/1992, alterada pela Lei 14.230/2021, passou a vigorar na data da sua publicação, em 26/10/2021. As controvérsias em torno da aplicação imediata das novas disposições legais devem ser analisadas em relação às questões de natureza processual e material. Às questões de ordem processual são aplicáveis as leis em vigor no momento em que prolatado o decisum na instância a quo, em obediência ao princípio tempus regit actum (art. 14 do CPC e, por analogia, art. 2º do CPP). Já às questões de natureza material, a nova lei tem aplicação imediata aos feitos em andamento, nos termos do art. 1º, § 4º, que dispõe: aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador. O direito administrativo sancionador, como sub-ramo do Direito Administrativo, expressa o poder punitivo do Estado ante o administrado, seja ele o próprio servidor público ou o particular. Daí decorre sua aplicação aos atos de improbidade administrativa — notadamente para reconhecer a aplicação imediata de seus preceitos a condutas antes tidas como suficientes para caracterizar o ato de improbidade, e agora tidas como irrelevantes, ou atípicas. A opção legislativa de revogar alguns preceitos da lei de improbidade administrativa é válida, pois decorre de previsão constitucional contida no art. 37, § 4º, o qual preceitua que os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. Desde a alteração promovida pela Lei 14.230/2021, os incisos do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa deixaram de lado o caráter exemplificativo e passaram a ostentar caráter taxativo, motivo pelo qual somente será configurada a improbidade por violação aos princípios, a prática das condutas expressamente indicadas no rol do referido dispositivo legal. Os incisos I e II do art. 11 da Lei 8.429/1992 foram revogados. A referida norma se aplica ao caso concreto, visto que atinge as ações em curso, considerando que o artigo 1º, §4º, determina expressamente a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador que comporta aplicação retroativa. Desde a vigência plena da Lei 14.230/2021, a conduta imputada aos requeridos deixou de ser típica (art. 11, caput, da Lei 8.429/1992). Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AG 1033687-14.2022.4.01.0000, Terceira Turma, Rel. Des. Fed. Maria do Carmo Cardoso, PJe 14/06/2023.) Deste modo, deve ser afastada a condenação com base no art. 11, caput e II, da LIA, em razão das alterações legislativas promovidas pela Lei 14.230/2021. Ainda que assim não fosse, ficou demonstrado nos autos que os débitos previdenciários do exercício do ano de 2006 foram objeto de parcelamento integralmente quitado, segundo se afere do laudo pericial judicial (ID. 22437974, fls. 166/169). Ante o exposto, rejeito as preliminares e dou provimento às apelações, para julgar improcedente o pedido deduzido na ação de improbidade administrativa. É o voto. Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0000548-31.2013.4.01.3904 APELANTE: VICENTE DE PAULA PEDROSA DA SILVA, MARIA DE NAZARE SOUSA LOPES, VALTER BARBOSA GUIMARAES JUNIOR, MARCUS ANTONIO DE SOUZA ABDORAL LOPES Advogado do(a) APELANTE: EDISON MESSIAS DE ALMEIDA - PA9516-A APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA INICIAL E PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE REJEITADAS. ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021. RETROATIVIDADE. POSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. STF, ARE 843.989/PR. TEMA 1.199. ART. 10 CAPUT E XI DA LIA. EFETIVO DANO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADO. DANO PRESUMIDO. DOLO ESPECÍFICO NÃO DEMONSTRADO. ATO ÍMPROBO NÃO CONFIGURADO. ART. 11, II, DA LEI 8.429/1992. REVOGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO PELO CAPUT. ATIPICIDADE. SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS DE APELAÇÃO PROVIDOS. 1. Apelação interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de improbidade administrativa, para condenar ex-gestores do Município de Igarapé-Açu/PA por irregularidades no recolhimento ao INSS de contribuição previdenciária e na aplicação de verbas do FUNDEF no exercício de 2006, por atos de improbidade administrativa previstos nos arts. 10, caput, XI e 11, caput, II, da LIA. 2. Há três questões centrais em discussão: (i) verificar a suposta inépcia da inicial e a ocorrência de prescrição intercorrente; (ii) verificar se houve prática de ato de improbidade administrativa por dano ao erário decorrente, para condenação por ato ímprobo previsto no art. 10, caput, e XI da LIA; e (iii) analisar a subsistência da condenação com base no art. 11, II, da LIA após as alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021. 3. Considera-se apta a exordial que atende as disposições do art. 319 do CPC, afastando-se a preliminar. 4. No julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que “O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” 5. A redação dada pela Lei 14.230/2021 ao art. 10 da LIA exige a demonstração de dano efetivo ao erário, não se admitindo a mera presunção de prejuízo (dano in re ipsa), conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.929.685/TO. 6. O dolo é requisito indispensável para a tipificação de atos de improbidade administrativa, conforme fixado pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR (Tema 1.199) e pelo STJ no REsp 2.107.601/MG. Além disso, o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei. 7. No caso concreto, a prova constante nos autos é insuficiente para demonstrar a existência de dolo ou dano patrimonial efetivo decorrente das irregularidades apontadas. 8. A inexistência de prova robusta do dolo específico ou de má-fé dos apelantes, aliada à ausência de demonstração de prejuízo material, inviabiliza a configuração do ato ímprobo previsto no art. 10, caput, e XI, da LIA, posto que a negligência administrativa, por si só, não autoriza a imposição das sanções da referida lei. 9. Houve a revogação do art. 11, II, da LIA, tornando atípica a conduta imputada. Além disso, inexiste a possibilidade de enquadramento da conduta somente no caput do art. 11, que isoladamente, não traz nenhum ato ou conduta que possa ser considerada ímproba, subsistindo apenas quando vinculado a algum de seus incisos. 10. Preliminares rejeitadas. Apelações providas. ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, rejeitar as preliminares e dar provimento às apelações. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 22/07/2025 (data do julgamento). Juiz Federal FAUSTO MENDANHA GONZAGA Relator convocado
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