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"1000290-04.2024.8.26.0407" - Resultados da Busca – Página 159 de 159

Ministério Público Do Trabalho e outros x Michel Aparecido Moreira (Animacão), e outros

ID: 337599143

Tribunal: TRT2 Órgão: 12ª Vara do Trabalho de São Paulo - Zona Sul Classe: AçãO DE CUMPRIMENTO Nº Processo: 1000290-43.2025.5.02.0712

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO SINDICATO DOS TRABALHADORES EM ESTABELECIMENTOS DE PET SHOPS DO ESTADO DE SAO PAULO

Polo Passivo:

MICHEL APARECIDO MOREIRA (ANIMACãO), MICHEL APARECIDO MOREIRA - ME

Notificação

Advogados:

EDUARDO TADEU FRANCEZ BRASIL

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

CAIO AMADEU

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO - ZONA SUL ACum 1000290-43.2025.5.02.0712 AUTOR: SINDICATO DOS TRABALHADORES EM … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO - ZONA SUL ACum 1000290-43.2025.5.02.0712 AUTOR: SINDICATO DOS TRABALHADORES EM ESTABELECIMENTOS DE PET SHOPS DO ESTADO DE SAO PAULO RÉU: MICHEL APARECIDO MOREIRA - ME E OUTROS (1) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 5058e5e proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: S E N T E N Ç A SINDICATO DOS TRABALHADORES EM ESTABELECIMENTOS DE PET SHOPS DO ESTADO DE SÃO PAULO - SINDPETSHOP, qualificado à fl. 01 da inicial, ajuizou Ação de Cumprimento em face de MICHEL APARECIDO MOREIRA (animacão), CNPJ 09.002.315/0001-42 e MICHEL APARECIDO MOREIRA (animacão) – CNPJ nº 09.002.315/0002-23, pleiteando a condenação solidária das Rés ao pagamento das verbas de fls. 25/26 (Id. 7b1a408). Deu à causa o valor de R$ 3.500,00. As Rés contestaram, asseverando serem indevidas as postulações e, com as cautelas de praxe, requereu a improcedência dos pedidos contidos na inicial. Juntaram-se documentos e procurações. Manifestação do MPT. Convertido o julgamento em diligência. Sem outras provas a produzir, foi encerrada a instrução processual. Restou prejudicada proposta conciliatória. Razões finais. Assim relatados, decido. Fundamentos Direito Intertemporal Em respeito à disposição do art. 6º da LICC, e considerando que data de distribuição da presente demanda é posterior a 11.11.17, aplicam-se as regras processuais introduzidas à Consolidação das Leis do Trabalho por meio da Lei nº 13.467/2017, ressalvado o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, nos termos do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal de 1988. Justiça Gratuita A declaração firmada pelo obreiro ou por seu advogado goza de presunção de validade e é suficiente para a concessão das benesses da gratuidade da justiça, nos termos do art. 99, §3º do CPC, de aplicação subsidiária, diante da ausência de provas em sentido contrário. A referida declaração gera os efeitos da presunção tão somente em relação a pessoas naturais. Para pessoas jurídicas, como é o caso do Autor, há necessidade de efetiva comprovação da insuficiência de recursos (Súmula nº 463, item II, do Tribunal Superior do Trabalho). O requerente se limitou a aduzir que faria jus ao benefício sob o fundamento de que reverteria os benefícios da arrecadação de contribuições em prol da categoria e em razão de exercer função social sem fins lucrativos. Ora, o pressuposto para o gozo da justiça gratuita é a hipossuficiência de recursos. Irrelevante a natureza associativa da entidade sindical ou se exerce a representação de empregados por força legal. Nada obsta que, ainda assim, tenha condições para arcar com as eventuais custas e despesas processuais. Não trouxe nenhum elemento de prova nesse sentido. Não há nenhum indício de existência de passivos superiores aos ativos ou dados concretos que pudessem demonstrar o preenchimento dos requisitos legais para a gratuidade processual. Ademais, o valor da causa é relativamente baixo e o Autor é sindicato representativo de importante categoria profissional e com base territorial em todo o Estado de São Paulo (artigo 1º de seu estatuto social - Id. f201d40). Circunstâncias que denotam que o Autor não faz jus ao benefício requerido. Pelo exposto, indefiro a justiça gratuita a Autor. Ilegitimidade “Ad Causam” O art. 8º, III, da Constituição Federal, instituiu a legitimação extraordinária do sindicato para defender judicialmente os direitos da categoria que representa, sem qualquer distinção entre associados e não associados. Os efeitos da extensão das negociações coletivas e as decisões prolatadas nas ações que visam o cumprimento de acordos ou convenções coletivas são de caráter cogente, alcançando todos aqueles que, mesmo não filiados ao Sindicato, se enquadrem no ramo de atividade profissional, por ele representado. Afasto a preliminar. Prescrição A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XXIX, prevê a prescrição bienal, após a extinção do contrato de trabalho, e a prescrição quinquenal, interrompida pelo ajuizamento da reclamatória. No mesmo sentido, o prazo prescricional previsto no art. 206, §5º do Código Civil ou no art. 1742 do CTN, é também o de 5 (cinco) anos. Restam inexigíveis judicialmente as lesões por inadimplemento de parcelas vencidas anteriormente a 25.02.2020, pelo decurso do prazo de cinco anos. Assim, quanto a estas, declaro a prescrição incidente, extinguindo os pleitos respectivos com resolução de mérito (art. 487, II, do Código de Processo Civil). Grupo Econômico/Responsabilidade Solidária No caso em comento, 1ª e 2ª Rés não contestaram a alegação da prefacial acerca do grupo econômico que lhes foi erigida. Ademais, apresentaram defesa em conjunto, representadas pelo mesmo patrono. Situação que implica a presunção dos fatos narrados na exordial com suporte no art. 341 do Código de Processo Civil. Com efeito, a identidade societária é total entre as empresas acionadas, atuando as mesmas no mesmo ramo econômico. Por tais fundamentos, reconheço a responsabilidade solidária de 1ª e 2ª Rés nos termos do art. 2º, § 2º, da CLT. Descumprimento de Convenções Coletivas de Trabalho O Sindicato-Autor alega que a Ré descumpriu As Convenções Coletivas de Trabalho da Categoria, tendo o mesmo listado as cláusulas que entendeu descumpridas. De sua parte as Rés, impugnam o enquadramento sindical pretendido e ausência ou impossibilidade de cumprimento das convenções coletivas. O art. 511 da CLT, recepcionado pela Constituição Federal de 1988, contém em seus parágrafos 1º e 2º as definições legais de categoria econômica e profissional: § 1º - A solidariedade de interesses econômicos dos que empreendem atividades idênticas, similares ou conexas constitui o vínculo social básico que se denomina categoria econômica. § 2º - A similitude de condições de vida oriunda da profissão ou trabalho em comum, em situação de emprego na mesma atividade econômica ou em atividades econômicas similares ou conexas, compõe a expressão social elementar compreendida como categoria profissional. Já no § 4º se encontram definidas as fronteiras de autonomia de vontade dos trabalhadores e das sociedades capitalistas na organização de suas entidades: § 4º - Os limites de identidade, similaridade ou conexidade fixam as dimensões dentro das quais a categoria econômica ou profissional é homogênea e a associação é natural. Não é, assim, completamente livre, no que interessa à organização coletiva do trabalho, a associação da companhia à entidade empresarial que melhor lhe convier, ou do trabalhador a qualquer sindicato, exigindo-se que sejam os que melhor se enquadrem a seu perfil. No caso dos autos, o SINDPETSHOP, de acordo com seu estatuto social, representa “a categoria Profissional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Pet Shops. Compreende-se na representação do sindicato, toda a categoria de trabalhadores, assim discriminados: Recepcionistas, Atendentes, Adestradores, Banhadores, Tosadores, Esteticistas de animais domésticos e trato de animais domésticos, que trabalhem ou sejam empregados em estabelecimentos de Pet Shops, Canis, Escolas de Adestradores, Clínicas Veterinárias e Hospitais Veterinários (excluídos Enfermeiros e Médicos Veterinários), Hotéis para animais domésticos, excluindo-se da representação os profissionais veterinários e aqueles que tenham suas funções ligados diretamente ao comércio, tendo como sua base territorial todo o Estado de São Paulo”. As convenções coletivas que o Sindicato Autor pretende ver aplicadas foram firmadas com o SINDHOVEST que vem a ser Sindicato dos Hospitais, Clínicas, Consultórios, Centros de Diagnósticos e Laboratórios de Análises Clínicas e Estabelecimentos Veterinários do Estado de São Paulo. As atividades econômicas da empresa de acordo com seu objeto social (contrato social - Id. c83f66b) são as seguintes: Cláusula Terceira A sociedade terá por objeto o exercício das seguintes atividades econômicas Prestação de serviços de Clínica Veterinária, Banho e Tosa para animais domésticos, Alojamento para animais domésticos, Planos de Saúde para animais domésticos, Comércio varejista de artigos e acessórios para animais domésticos, Comércio varejista de medicamentos de uso veterinário, Fabricação de alimentos para animais. Parágrafo único: Em estabelecimento eleito como Sede (Matriz) serão exercidas as atividades de Prestação de serviços de Clínica Veterinária, Banho e Tosa para animais domésticos, Alojamento para animais domésticos, Planos de Saúde para animais domésticos, Comércio varejista de artigos e acessórios para animais domésticos, Comércio varejista de medicamentos de uso veterinário, Fabricação de alimentos para animais. As Rés podem ser simultaneamente classificadas como Clínicas Veterinárias e Pet Shops de acordo com as atividades que desempenham. Assim, de um lado, os empregados das Rés estão representados pelo SINDPETSHOP por serem trabalhadores em Clínicas Veterinárias e empresas que comercializam produtos, como alimentos e medicamentos, e serviços, como banho e tosa, destinados a animais domésticos, os chamados Pet Shops. De outro lado, as Rés estão representadas pelo SINDHOVEST porque são empresas que atuam no ramo dos Hospitais, Clínicas, Consultórios, Centros de Diagnósticos e Laboratórios de Análises Clínicas e Estabelecimentos Veterinários do Estado de São Paulo. Destarte, reconheço o enquadramento sindicado pretendo na prefacial, sendo aplicáveis aos contratos de trabalho dos empregados das Rés as convenções coletivas juntadas aos autos com a inicial. O caso dos autos conta com uma particularidade, as convenções coletivas da categoria excluem do âmbito de sua aplicação os enfermeiros e médicos veterinários, adotando o entendimento de que são categorias diferenciadas. Assim, as funções em foco no caso dos autos são as desempenhadas por auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes. A fim de se delimitar a execução nestes autos, restou determinada a juntada pelas Rés da relação dos empregados (auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes) junto ao CAGED, com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025 nos 02 (dois) estabelecimentos mencionados na petição inicial, no prazo de 05 (cinco) dias. A prova relativa ao cumprimento das Convenções Coletivas de Trabalho era ônus das Rés por serem as mesmas representadas pelo sindicato patronal que se comprometeu a respeitar os instrumentos coletivos de trabalho juntados com a prefacial, sendo que de tal encargo, as mesmas não se desincumbiram a contento. As folhas de pagamento de abril/2025 demonstram que mesmo após o ajuizamento da ação, as Rés não aplicaram os reajustes salariais previstos na convenção coletiva da categoria. Os salários pagos não observaram os pisos salariais previstos nas convenções coletivas da categoria para as funções supramencionadas, o que resta claro pela análise da CCT 2024/2025. Não há comprovação nos autos do cumprimento do fornecimento de cesta básica/auxílio-refeição previsto nas convenções coletivas da categoria, tendo as Rés juntado aos autos folhas de pagamento sem a indicação do pagamento de valores sob tais rubricas. Não foram juntados recibos relativos aos benefícios em comento. No que diz respeito às horas extraordinárias, o adicional de sobrejornada previsto nas convenções coletivas da categoria é o de 100%. Houve sistemático pagamento de horas extras com adicional de 50%, restando descumpridos os instrumentos coletivos da categoria. O adicional noturno previsto nas convenções coletivas da categoria é no importe de 50%. As Rés efetuam o pagamento no percentual de 30%, o que é aquém do previsto nos instrumentos coletivos da categoria. As Rés confessam que não contrataram seguro de vida e acidente pessoais, aduzindo “dificuldades para a contratação de seguradoras e, consequentemente, disponibilização das apólices”. Não há como serem aceitos tais argumentos, uma vez que desprovidos de provas. Outrossim, as normas coletivas da categoria preveem a obrigatoriedade na contratação de seguro de vida. Ajuizada a presente ação há poucos meses do encerramento da vigência da CCT 2024/2025, perdeu o objeto a pretensão autoral acerca da obrigação de fazer relativa à contratação de seguro de vida e acidente pessoais. Não há comprovação nos autos de divulgação das convenções coletivas da categoria dentro dos estabelecimentos por meio da afixação das mesmas em quadro de aviso na forma preconizada nos instrumentos coletivos da categoria. Nada a ser deferido em relação à cláusula relativa a adicional de insalubre, não havendo fundamentos acerca do descumprimento da mesma na petição inicial. Por todo o exposto, condeno as Rés ao pagamento das seguintes verbas: a) diferenças salariais e reflexos decorrentes dos pisos e reajustes salariais previstos nas convenções coletivas da categoria aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; b) diferenças de horas extraordinárias e reflexos decorrentes da aplicação do adicional de horas extras normativo às horas extras constantes das folhas de pagamento/recibos salariais, aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; c) diferenças de adicional noturno e reflexos decorrentes da aplicação do adicional normativo ao adicional noturno constante das folhas de pagamento/recibos salariais, aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; d) benefícios cesta básica e auxílio-refeição aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observado o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; e) multas normativas pelo descumprimento das cláusulas das convenções coletivas da categoria relativas a piso salarial, reajuste, cesta básica, vale-refeição, adicional de horas extras, adicional noturno e divulgação da CCT, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria, e; f) multas normativas pela ausência de contratação do seguro de vida e acidentes pessoais, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria. Dispositivo Em razão do quanto exposto e à vista do que mais dos autos consta, restando vencidas anteriormente a 20.02.2020, em virtude da prescrição quinquenal, nos termos do art. 487, II, do Código de Processo Civil, julgo PROCEDENTES EM PARTE os demais pedidos formulados por SINDICATO DOS TRABALHADORES EM ESTABELECIMENTOS DE PET SHOPS DO ESTADO DE SÃO PAULO – SINDPETSHOP para condenar MICHEL APARECIDO MOREIRA (animacão), CNPJ 09.002.315/0001-42 e MICHEL APARECIDO MOREIRA (animacão) – CNPJ nº 09.002.315/0002-23, solidariamente, ao pagamento/cumprimento das seguintes verbas/obrigações deferidas na fundamentação que passa a fazer parte integrante deste "decisum": a) diferenças salariais e reflexos decorrentes dos pisos e reajustes salariais previstos nas convenções coletivas da categoria aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; b) diferenças de horas extraordinárias e reflexos decorrentes da aplicação do adicional de horas extras normativo às horas extras constantes das folhas de pagamento/recibos salariais, aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; c) diferenças de adicional noturno e reflexos decorrentes da aplicação do adicional normativo ao adicional noturno constante das folhas de pagamento/recibos salariais, aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; d) benefícios cesta básica e auxílio-refeição aos empregados substituídos nas funções de auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025, nos 02 (dois) estabelecimentos indicados na petição inicial, observado o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria; e) multas normativas pelo descumprimento das cláusulas das convenções coletivas da categoria relativas a piso salarial, reajuste, cesta básica, vale-refeição, adicional de horas extras, adicional noturno e divulgação da CCT, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria, e; f) multas normativas pela ausência de contratação do seguro de vida e acidentes pessoais, observados o período imprescrito e os termos e a vigência das convenções coletivas de trabalho da categoria. A fim de se evitar discussões futuras, esclareço que a execução ficará limitada aos empregados (auxiliares veterinários, tosadores, banhistas e atendentes), com contrato de trabalho em vigor no período de 01.05.2024 a 30.04.2025 nos 02 (dois) estabelecimentos mencionados cujos endereços foram informados na petição inicial, no prazo de 05 (cinco) dias, nos termos do despacho de Id. b0d7319. Tal se dá inclusive pela inviabilidade de averiguação de descumprimento de normas coletivas relativamente a empregados dispensados antes de tal interregno com base na documentação encartada aos autos por ambas as partes. A fim de se dar efetividade à prestação jurisdicional, uma vez efetuado o pagamento pelas Rés, deverá o Sindicato ser intimado a comprovar nos autos, a transferência dos respectivos valores aos empregados da empresa das verbas que lhes são devidas, no prazo de 90 (noventa) dias, sob pena de configuração de apropriação indébita e litigância de má-fé. Em caso de alegação de não comparecimento do empregado, deverá o Sindicato Autor comprovar o envio de correspondência à residência dos mesmos e aos respectivos locais de prestação de serviços. Este Juízo consigna, desde já, que a possibilidade de liberação direta de valores aos empregados da empresa relativamente às verbas que lhes são devidas será apreciada por ocasião do cumprimento da sentença, levando-se em consideração tal procedimento a fim de não sobrecarregar a Secretaria em razão do número de empregados que vier a ser apurado em regular liquidação de sentença. A atualização dos créditos deferidos neste Julgado será feita conforme decisão do STF no julgamento conjunto das ADCs 58 e 59 e ADIns 5.867 e 6.021. Trata-se de decisão com efeito vinculante, restando superada a controvérsia quanto ao tema. Assim, o IPCA-E será adotado como índice de correção monetária tão somente na fase pré-judicial, acrescido de juros moratórios previstos no caput do artigo 39, da Lei 8.177/1991 (juros TRD). Após o ajuizamento, deverá ser aplicada a SELIC como índice único, a qual já contempla em seu bojo tanto os juros quanto a correção monetária. A contribuição previdenciária incidirá sobre as verbas de natureza salarial (art. 832, § 3º, CLT, com a redação da Lei 10.035/2000), assim consideradas apenas as parcelas integrantes do salário de contribuição, conforme previsto no artigo 28 da Lei n. 8.212/91. Isto posto, determino os descontos previdenciários incidentes, devidos mês a mês (Súmula 368, III, C. TST), a cargo do empregador (tanto em relação à sua cota, quanto em relação à cota do empregado), que deverá comprovar nos autos os recolhimentos devidos sobre as verbas deferidas, sendo que, com relação à cota do empregado, está o empregador autorizado a deduzir a cota-parte do empregado dos valores a serem pagos a este último, a teor do disposto na Orientação Jurisprudencial da SDI 1 nº 363, limitado ao teto de contribuição. Determino a dedução dos descontos fiscais sobre o valor total da condenação e de acordo com o que determina a Instrução Normativa 1.127 da Secretaria da Receita Federal do Brasil, devendo ser calculado sobre o principal tributável, corrigido monetariamente, excluídos os juros de mora (OJ 400 da SDI-1 do C. TST), as verbas indenizatórias e previdenciárias e os valores relativos ao FGTS, nos termos do § 2º do artigo 46 da Lei n. 8.541/92, do inciso V do artigo 6º da Lei n. 7.713/88 e do Provimento n. 01/96 da Corregedoria Geral do C. TST. Deverá ser observada a tabela de progressividade quanto ao imposto de renda, em razão da alteração advinda com o artigo 12-A no corpo da lei 7.713/88, por força da Lei 12.350/10 (regulamentada pela Instrução Normativa RFB nº 1127/2001 e demais alterações na apuração do IR tais como o art. 37 da Instrução Normativa RFB nº 1.500/2014 e Instrução Normativa RFB nº 1.558/2015), também já incorporada ao verbete 368, II, do C. TST. Para que não pairem dúvidas, cabe mencionar que a Instrução Normativa disciplina a questão de maneira geral, sendo que a OJ 400 rege apenas a exceção relativa aos juros de mora, não havendo nenhuma incompatibilidade entre ambas. Nos termos do art.791-A, §§ 2° e 3°, da CLT c/c art. 86, parágrafo único do CPC, condeno as Rés ao pagamento de honorários advocatícios, em favor dos advogados do Autor no importe de 15% sobre o valor que resultar da condenação em liquidação da sentença. Indevidos honorários em favor das Rés ante a sucumbência mínima experimentada pela parte autora (art. 86, parágrafo único, Código de Processo Civil). Custas pelas Rés, no importe de R$ 70,00, calculadas sobre o valor arbitrado para a condenação de R$ 3.500,00. Intimem-se. Nada mais. JOSÉ DE BARROS VIEIRA NETO JUIZ FEDERAL DO TRABALHO 11 de julho de 2025 JOSE DE BARROS VIEIRA NETO Juiz do Trabalho Titular Intimado(s) / Citado(s) - MICHEL APARECIDO MOREIRA - ME - MICHEL APARECIDO MOREIRA (animacão),

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Processo nº 1002647-72.2022.8.11.0009

ID: 312207264

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002647-72.2022.8.11.0009

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002647-72.2022.8.11.0009 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Da… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002647-72.2022.8.11.0009 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Fornecimento de Energia Elétrica, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA] Parte(s): [ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA - CPF: 056.152.788-11 (APELADO), CASSIO BOCCHI GARCIA - CPF: 048.181.681-06 (ADVOGADO), JHENNYFER KAROLYNE FERREIRA LIMA - CPF: 028.140.681-21 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS – ENERGIA ELÉTRICA – MICROGERAÇÃO DISTRIBUÍDA FOTOVOLTAICA – MEDIDOR DEFEITUOSO – ERRO NA CONTABILIZAÇÃO DA ENERGIA GERADA E INJETADA NA REDE – COMPENSAÇÃO INADEQUADA – SUBSTITUIÇÃO DO MEDIDOR COM IMEDIATA REGULARIZAÇÃO DAS FATURAS – CONCESSIONÁRIA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DA PROVA – RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS A MAIOR E DOS CRÉDITOS ENERGÉTICOS INDEVIDAMENTE UTILIZADOS – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A relação entre concessionária de energia elétrica e usuária de sistema de microgeração distribuída, para fins de compensação energética, não se enquadra no conceito estrito de relação de consumo, porém submete-se ao regime de responsabilidade objetiva próprio das prestadoras de serviços públicos. A alteração substancial nos valores faturados após a substituição do medidor, com redução significativa das tarifas sem modificação no padrão de consumo ou geração de energia, configura indício robusto de falha no equipamento anterior. A insuficiência metodológica da perícia realizada no medidor substituído, que utilizou carga de apenas 1 kWh para avaliar equipamento que mensalmente registrava aproximadamente 5.000 kWh, compromete a confiabilidade do resultado obtido. A discrepância entre os registros de leitura do medidor quando de sua retirada (107.204 kWh para energia consumida e 88.661 kWh para energia injetada) e os valores iniciais apresentados no laudo de verificação metrológica (110.584 kWh e 91.191 kWh, respectivamente) suscita dúvida substancial quanto à idoneidade do exame técnico. O reconhecimento pela própria concessionária de falha na aferição, com a concessão de indenização na fatura posterior à substituição do equipamento, corrobora a ocorrência de irregularidade no medidor anterior. Não tendo a concessionária se desincumbido satisfatoriamente do ônus de comprovar que as variações de consumo decorreram de fatores climáticos ou alterações de rotina no imóvel e não de falha no equipamento de medição, mantém-se a sentença que determinou a restituição dos valores pagos a maior e dos créditos energéticos indevidamente utilizados. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação cível interposto por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A visando reformar a decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Colíder, que, nos autos da ação de reparação de danos materiais nº 1002647-72.2022.8.11.0009, movida por MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA, julgou parcialmente procedente os pedidos iniciais nos seguintes termos: “Isto posto, JULGA-SE PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos iniciais para: a) CONDENAR a parte autora na obrigação de fazer para que contabilize corretamente a geração própria de energia da autora, sob pena de estabelecimento de multa; b) CONDENAR a requerida a restituir da diferença entre o valor pago a maior pelas faturas incorretas de agosto/2021 até agosto/2022, quando houve a substituição do medidor defeituoso, corrigido na forma do art. 323, § 2º, da Resolução n. 1.000, de 07/12/2021 e; c) CONDENAR a requerida a restituir o crédito/saldo de kWh indevidamente utilizado nas faturas de outubro/2020, dezembro/2020, fevereiro/2021 a agosto/2021, que foram acumulados entre os meses de março a setembro de 2020. Em consequência, extingue-se o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I do CPC. Condena-se a parte requerida no pagamento das custas e despesas processuais e os honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, fixando-os em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” Irresignada, a concessionária interpôs recurso de apelação (Id. 284847516), sustentando, em síntese, a regularidade dos procedimentos adotados e a inexistência de falha na prestação do serviço. Argumentou que o medidor foi devidamente inspecionado e aprovado pelo INMETRO, atestando seu correto funcionamento, e que a variação de consumo registrada decorreria de fatores alheios à sua responsabilidade, como mudanças climáticas e alteração de rotina no imóvel. A parte apelada apresentou contrarrazões (Id. 284847521), refutando os argumentos recursais e pugnando pela manutenção integral da sentença. Destacou as inconsistências do laudo de verificação metrológica e a redução significativa nos valores das faturas após a substituição do medidor, indicando o defeito no equipamento anterior. Requereu, ainda, a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais para 16% sobre o valor da condenação. É o relatório. Peço dia para julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS Relator V O T O R E L A T O R 1. Da admissibilidade recursal Ab initio, impende proceder ao exame dos pressupostos de admissibilidade recursal, verificando se estão presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos necessários ao conhecimento do recurso de apelação interposto. O apelo é tempestivo, conforme certificado nos autos, tendo sido interposto dentro do prazo legal. O preparo foi devidamente recolhido e a parte recorrente possui legitimidade e interesse recursal, porquanto sucumbente na demanda originária. Presentes, portanto, todos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso. 2. Do mérito recursal In casu, a controvérsia central gravita em torno da existência ou não de falha no medidor de energia elétrica instalado na unidade consumidora da apelada, que teria deixado de registrar adequadamente a energia produzida pelo sistema de microgeração fotovoltaica, resultando em faturamentos indevidos e na utilização indevida de créditos energéticos acumulados. 2.1. Da natureza da relação jurídica Prima facie, impende consignar que, conforme corretamente pontuado pelo juízo sentenciante, a relação jurídica estabelecida entre as partes não se enquadra no conceito estrito de relação de consumo, uma vez que a apelada não é destinatária final da energia elétrica fornecida, utilizando-a como insumo em sua atividade empresarial. Não obstante, a concessionária de energia elétrica, na condição de prestadora de serviço público essencial, submete-se ao regime de responsabilidade objetiva, independentemente da configuração ou não de relação de consumo, conforme estabelecido na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional. Tal responsabilidade prescinde da demonstração de dolo ou culpa para sua caracterização, sendo necessária apenas a comprovação do dano e do nexo causal entre este e a conduta da prestadora do serviço. Vejamos a jurisprudência: “EMENTA - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INCÊNDIO EM PROPRIEDADE RURAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA MANUTENÇÃO DA REDE ELÉTRICA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS MANTIDA. DANOS MATERIAIS NÃO COMPROVADOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI 14.905/2024. RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO. RECURSO DA CONCESSIONÁRIA PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelações interpostas por ambas as partes contra sentença proferida em sede de cumprimento de sentença de ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por ACLEVIS APARECIDA SOUZA DA SILVA em desfavor da ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a concessionária ao pagamento de R$ 40.000,00 por danos morais, acrescidos de correção pelo IPCA-E e juros de 1% ao mês desde o evento danoso. A autora apelou pleiteando também a condenação por danos materiais, enquanto a ré sustentou a ausência de responsabilidade, a inexistência de nexo causal, a culpa de terceiro, a inaplicabilidade dos danos morais, a necessidade de redução da indenização e a reforma da sucumbência e dos critérios de atualização monetária e juros. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há seis questões em discussão: (i) definir se a responsabilidade da concessionária de energia elétrica é objetiva ou subjetiva; (ii) verificar a existência de conduta ilícita, dano e nexo causal; (iii) estabelecer se há dano moral indenizável e a adequação do valor fixado; (iv) apurar se estão comprovados os danos materiais alegados; (v) determinar o regime de sucumbência aplicável; e (vi) fixar os critérios legais para incidência de correção monetária e juros. III. RAZÕES DE DECIDIR A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica decorre da teoria do risco administrativo, sendo objetiva nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, o que afasta a exigência de demonstração de culpa. Comprovado que o incêndio foi causado pelo contato de árvores com fios energizados, sendo a manutenção da rede elétrica e o manejo da vegetação obrigações da concessionária, configura-se a omissão específica ensejadora do dever de indenizar. Laudo do Corpo de Bombeiros constitui prova idônea quanto à origem do incêndio, sendo corroborado por outros elementos dos autos, inexistindo provas de excludentes de responsabilidade. O dano moral configura-se in re ipsa, diante da gravidade do incêndio e da perturbação à esfera íntima da autora, e o valor arbitrado (R$ 40.000,00) é proporcional e razoável. Não comprovado de forma objetiva o quantum dos danos materiais alegados, ausentes documentos fiscais ou estimativas técnicas válidas, razão pela qual é mantida a improcedência desse pedido. Tendo a autora obtido parcialmente êxito (apenas quanto aos danos morais), reconhece-se a sucumbência recíproca, com repartição proporcional das despesas e honorários, observada a gratuidade de justiça. Com base na Lei 14.905/2024, aplicam-se imediatamente a taxa SELIC para os juros moratórios e o IPCA como índice de correção monetária. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso da autora desprovido. Recurso da concessionária parcialmente provido. Tese de julgamento: A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, inclusive nos casos de omissão específica. A falha na manutenção da rede elétrica que permite o contato de vegetação com fios energizados configura omissão específica e enseja responsabilidade civil da concessionária. O dano moral decorrente de incêndio em propriedade rural causado por falha na prestação do serviço de energia elétrica configura-se in re ipsa. A indenização por danos materiais exige prova objetiva do prejuízo e de seu valor, não bastando estimativas unilaterais sem respaldo documental. A sucumbência recíproca impõe a divisão proporcional das custas e honorários entre as partes, observada a gratuidade de justiça. A partir da vigência da Lei 14.905/2024, aplica-se a taxa SELIC como índice único para os juros de mora e o IPCA como índice de correção monetária. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 389, parágrafo único, e 406, § 1º (com redação da Lei 14.905/2024); CPC, arts. 14, 15, 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: TJMT, AC nº 1001121-47.2021.8.11.0028, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 24.05.2023; STJ, AgInt no AREsp 2.070.372/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 4ª Turma, j. 09.09.2024.” (N.U 1000290-07.2022.8.11.0014, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/06/2025, Publicado no DJE 10/06/2025) (Negrito nosso) Insta salientar que, mesmo no regime de responsabilidade objetiva, admite-se a incidência de excludentes, notadamente o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, situações estas que, se comprovadas, têm o condão de elidir o dever de indenizar que, em princípio, recai sobre a prestadora do serviço. 2.2. Da inversão do ônus da prova A parte autora, ora apelada, pleiteou em sua petição inicial a inversão do ônus da prova, enquanto a requerida, ora apelante, contestou tal pedido, alegando não estarem presentes os requisitos autorizadores. Sobre esta questão específica, cumpre esclarecer que, independentemente da configuração ou não de relação de consumo, a distribuição do ônus probatório deve observar as disposições do artigo 373 do Código de Processo Civil, bem como a teoria da carga dinâmica das provas, segundo a qual o encargo probatório recai sobre aquele que se encontra em melhores condições de produzi-la. Vejamos a jurisprudência: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS PROBATÓRIO. ARTIGO 373, §1º, DO CPC. INCÊNDIO DE GRANDES PROPORÇÕES EM PROPRIEDADE RURAL. MAIOR FACILIDADE DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA NA PRODUÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por concessionária de energia elétrica contra decisão que inverteu o ônus da prova com base na Teoria da Distribuição Dinâmica. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside em determinar se há justificativa para a inversão do ônus probatório, com base no artigo 373, §1º, do Código de Processo Civil. III. Razões de decidir 3. A inversão do ônus da prova foi fundamentada na maior capacidade da agravante na produção de provas técnicas e documentais, em especial registros de imagens de satélite, relatórios de manutenção de equipamentos e demais elementos sob seu controle. 4. O fato de o recorrido ser um grande produtor rural não afasta a sua vulnerabilidade técnica frente à concessionária, que detém pleno conhecimento dos sistemas elétricos e de sua gestão. 5. A jurisprudência desta Câmara reconhece a aplicabilidade da Teoria da Carga Dinâmica do Ônus da Prova em situações análogas. 6. A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada, nos termos do artigo 373, §1º, do CPC, não havendo que se falar em onerosidade excessiva ou impossibilidade de produção probatória pela agravante. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido.” (N.U 1029379-49.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Vice-Presidência, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 05/03/2025) (Negrito nosso) No caso concreto, considerando a evidente hipossuficiência técnica da apelada frente à concessionária de energia, bem como o fato de que o objeto da controvérsia (funcionamento adequado ou não do medidor) está intrinsecamente relacionado à atividade técnica da apelante, mostra-se razoável atribuir-lhe o ônus de comprovar que o equipamento funcionava corretamente ou que as variações de consumo registradas decorriam de fatores alheios à sua responsabilidade. 2.3. Da análise do mérito Adentrando ao cerne da controvérsia, cumpre perquirir se, no caso concreto, houve efetivamente falha no medidor de energia que deixou de registrar corretamente a energia produzida pelo sistema fotovoltaico da apelada. Da análise acurada dos elementos fático-probatórios carreados aos autos, verifica-se que diversos aspectos convergem para a conclusão de que, de fato, o medidor apresentava funcionamento inadequado. Primeiramente, observa-se uma alteração significativa e abrupta no padrão de faturamento após a substituição do medidor em agosto de 2022. As faturas, que até então apresentavam valores elevados, chegando a superar R$ 3.000,00 (três mil reais), passaram a registrar montantes substancialmente inferiores a R$ 1.000,00 (mil reais), conforme documentação acostada aos autos. Tal alteração no padrão de faturamento, coincidente com a substituição do equipamento de medição, constitui forte indício de que o medidor anterior não estava realizando a leitura adequada da energia produzida pelo sistema fotovoltaico da apelada. Impende destacar que a redução nos valores faturados ocorreu sem que houvesse qualquer alteração significativa no padrão de consumo da unidade consumidora ou na capacidade produtiva do sistema fotovoltaico, conforme demonstrado pelos relatórios de produção e histórico de consumo juntados aos autos. Em segundo lugar, impende analisar criticamente o demonstrativo de compensação apresentado pela apelante para sustentar que "a unidade está consumindo mais energia do que tem injetado". Referido documento, contudo, foi gerado com base nas leituras realizadas pelo próprio medidor questionado, o que compromete sua confiabilidade como elemento probatório. Com efeito, se o cerne da controvérsia reside justamente na incorreção das leituras realizadas pelo medidor, não se pode tomar como válido um demonstrativo baseado nessas mesmas leituras. Em terceiro lugar, cumpre analisar a validade e a confiabilidade do laudo de verificação metrológica apresentado pela apelante para sustentar o regular funcionamento do medidor substituído. Nesse aspecto, identificam-se quatro inconsistências significativas que comprometem substancialmente a força probante do referido documento técnico: 1) O teste foi realizado utilizando carga de apenas 1 kWh, dimensão manifestamente insuficiente para avaliar o comportamento de um equipamento que, mensalmente, registrava aproximadamente 5.000 kWh. A discrepância entre a carga utilizada no teste e aquela habitualmente registrada pelo medidor é de tal magnitude que torna questionável a conclusão alcançada pelo procedimento; 2) Verifica-se incongruência nos registros de leitura do medidor. Quando da sua retirada, conforme anotação constante da fatura de agosto/2022, o medidor antigo (E0004136329) apresentava leitura final de 107.204 kWh para energia ativa consumida e 88.661 kWh para energia injetada. Contudo, o laudo de verificação metrológica, emitido em 24/08/2022, registrou leituras iniciais de 110.584 kWh e 91.191 kWh, respectivamente, evidenciando uma inexplicável variação positiva em ambos os registros no intervalo entre a retirada do equipamento e sua análise em laboratório; 3) O medidor substituído encontrava-se em uso há aproximadamente dez anos, conforme relatório de ocorrências da unidade consumidora juntado aos autos. O extenso período de utilização do equipamento, sem substituição ou manutenção documentada, constitui elemento adicional que corrobora a plausibilidade de deterioração em seu funcionamento; 4) A própria apelante reconheceu a existência de falha na aferição, tanto que concedeu indenização à apelada no valor de R$ 491,76 (quatrocentos e noventa e um reais e setenta e seis centavos), conforme demonstra a fatura de dezembro/2022 (Id. 106879788, pág. 14). Tal circunstância, por si só, é suficiente para fragilizar significativamente a tese defensiva da concessionária quanto à regularidade do equipamento substituído. Por outro lado, a apelada logrou êxito em demonstrar, mediante laudo técnico elaborado por profissional habilitado e relatórios do sistema fotovoltaico, que seu sistema de microgeração mantinha capacidade produtiva regular e compatível com as especificações técnicas do projeto, sendo capaz de gerar aproximadamente 5.000 kWh mensais. Tal documentação técnica, embora produzida unilateralmente, não foi objeto de impugnação específica pela apelante. Merece destaque o fato de que o sistema de microgeração fotovoltaica opera de forma que parte da energia gerada é imediatamente consumida pela própria unidade (autoconsumo), sem passar pelo medidor da concessionária, enquanto o excedente é injetado na rede de distribuição, gerando créditos para compensação futura. A falha no medidor, portanto, pode afetar tanto o registro da energia injetada quanto o da energia consumida da rede, impactando significativamente o faturamento final. A apelante sustenta em seu recurso que as variações de consumo poderiam decorrer de fatores alheios à sua responsabilidade, como mudanças climáticas e alteração de rotina no imóvel. Contudo, não apresentou qualquer elemento probatório concreto a corroborar tal alegação. Os relatórios de produção do sistema fotovoltaico, por sua vez, demonstram que a geração de energia manteve-se relativamente estável no período questionado, afastando a hipótese de variações significativas decorrentes de fatores climáticos. Nesse contexto, aplicando-se as regras de distribuição do ônus probatório, verifica-se que, enquanto a apelada apresentou elementos consistentes a corroborar sua tese (relatórios de produção, laudo técnico, redução significativa das faturas após a substituição do medidor), a apelante não logrou demonstrar satisfatoriamente que o medidor funcionava regularmente ou que a variação de faturamento decorria exclusivamente de fatores alheios à sua responsabilidade. Vale ressaltar que a concessionária de serviço público tem o dever de empregar tecnologia adequada e equipamentos que garantam níveis satisfatórios de regularidade, continuidade, eficiência e segurança do serviço prestado, conforme preceituam os princípios norteadores da prestação de serviços públicos. No caso em apreço, a convergência de múltiplos elementos probatórios forma um conjunto harmônico que conduz à conclusão de que, efetivamente, o medidor substituído apresentava funcionamento inadequado, deixando de registrar corretamente a energia produzida pela unidade consumidora da apelada. Tal falha no equipamento de medição constitui manifesto defeito na prestação do serviço, gerando para a concessionária o dever de reparar os danos dele decorrentes, nos termos da responsabilidade objetiva que lhe é aplicável. Vejamos a jurisprudência: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – SERVIÇOS ENERGÉTICOS – GERAÇÃO DE ENERGIA FOTOVOLTAICA ATRAVÉS DE PLACAS SOLARES –APARELHO MEDIDOR FORNECIDO PELA CONCESSIONÁRIA DEMANDADA QUE NÃO REGISTRA CORRETAMENTE A PRODUÇÃO DE ENERGIA GERADA – LAUDO PERICIAL QUE CORROBORA COM ALEGAÇÃO AUTORAL – FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – VALOR INDENIZATÓRIO – REDUÇÃO – ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. O consumidor brasileiro pode gerar sua própria energia elétrica a partir de fontes renováveis ou cogeração qualificada. O réu tem o ônus de provar a existência de um fato que impeça, modifique ou extinga o direito do autor. (Art. 373, II do CPC). Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. (Inteligência dos artigos 186 e 927). 4. A ausência de registro da energia gerada pelos painéis fotovoltaicos de titularidade do consumidor é capaz de configurar dano moral, em decorrência do abalo patrimonial suportado. 5. Percebendo-se o descompasso entre o valor indenizatório e a extensão do prejuízo moral experimentado, deve ser feita a adequação jurídica da indenização estabelecida a tal título.” (N.U 1002484-47.2021.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/12/2024, Publicado no DJE 26/12/2024) Diante disso, revela-se escorreita a determinação contida na sentença recorrida, no sentido de que a apelante proceda à restituição dos valores pagos a maior nas faturas emitidas no período compreendido entre agosto/2021 e agosto/2022, bem como à reposição do crédito energético indevidamente utilizado nas faturas de outubro/2020, dezembro/2020 e fevereiro/2021 a agosto/2021. Quanto à forma de cálculo da restituição, o magistrado sentenciante determinou que fosse observado o disposto no art. 323, § 2º, da Resolução n. 1.000, de 07/12/2021, da Agência Nacional de Energia Elétrica, metodologia que se mostra adequada e proporcional à natureza da relação jurídica estabelecida entre as partes. Por conseguinte, não merece acolhimento a pretensão recursal da concessionária apelante, devendo ser mantida in totum a sentença de primeiro grau. Dispositivo. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO. Em atenção às disposições do art. 85, §11º, do CPC, majoro os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1002647-72.2022.8.11.0009

ID: 312207292

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002647-72.2022.8.11.0009

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA

Acórdão

Advogados:

JHENNYFER KAROLYNE FERREIRA LIMA

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CASSIO BOCCHI GARCIA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002647-72.2022.8.11.0009 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Da… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002647-72.2022.8.11.0009 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Fornecimento de Energia Elétrica, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA] Parte(s): [ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA - CPF: 056.152.788-11 (APELADO), CASSIO BOCCHI GARCIA - CPF: 048.181.681-06 (ADVOGADO), JHENNYFER KAROLYNE FERREIRA LIMA - CPF: 028.140.681-21 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS – ENERGIA ELÉTRICA – MICROGERAÇÃO DISTRIBUÍDA FOTOVOLTAICA – MEDIDOR DEFEITUOSO – ERRO NA CONTABILIZAÇÃO DA ENERGIA GERADA E INJETADA NA REDE – COMPENSAÇÃO INADEQUADA – SUBSTITUIÇÃO DO MEDIDOR COM IMEDIATA REGULARIZAÇÃO DAS FATURAS – CONCESSIONÁRIA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DA PROVA – RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS A MAIOR E DOS CRÉDITOS ENERGÉTICOS INDEVIDAMENTE UTILIZADOS – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A relação entre concessionária de energia elétrica e usuária de sistema de microgeração distribuída, para fins de compensação energética, não se enquadra no conceito estrito de relação de consumo, porém submete-se ao regime de responsabilidade objetiva próprio das prestadoras de serviços públicos. A alteração substancial nos valores faturados após a substituição do medidor, com redução significativa das tarifas sem modificação no padrão de consumo ou geração de energia, configura indício robusto de falha no equipamento anterior. A insuficiência metodológica da perícia realizada no medidor substituído, que utilizou carga de apenas 1 kWh para avaliar equipamento que mensalmente registrava aproximadamente 5.000 kWh, compromete a confiabilidade do resultado obtido. A discrepância entre os registros de leitura do medidor quando de sua retirada (107.204 kWh para energia consumida e 88.661 kWh para energia injetada) e os valores iniciais apresentados no laudo de verificação metrológica (110.584 kWh e 91.191 kWh, respectivamente) suscita dúvida substancial quanto à idoneidade do exame técnico. O reconhecimento pela própria concessionária de falha na aferição, com a concessão de indenização na fatura posterior à substituição do equipamento, corrobora a ocorrência de irregularidade no medidor anterior. Não tendo a concessionária se desincumbido satisfatoriamente do ônus de comprovar que as variações de consumo decorreram de fatores climáticos ou alterações de rotina no imóvel e não de falha no equipamento de medição, mantém-se a sentença que determinou a restituição dos valores pagos a maior e dos créditos energéticos indevidamente utilizados. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação cível interposto por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A visando reformar a decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Colíder, que, nos autos da ação de reparação de danos materiais nº 1002647-72.2022.8.11.0009, movida por MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA, julgou parcialmente procedente os pedidos iniciais nos seguintes termos: “Isto posto, JULGA-SE PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos iniciais para: a) CONDENAR a parte autora na obrigação de fazer para que contabilize corretamente a geração própria de energia da autora, sob pena de estabelecimento de multa; b) CONDENAR a requerida a restituir da diferença entre o valor pago a maior pelas faturas incorretas de agosto/2021 até agosto/2022, quando houve a substituição do medidor defeituoso, corrigido na forma do art. 323, § 2º, da Resolução n. 1.000, de 07/12/2021 e; c) CONDENAR a requerida a restituir o crédito/saldo de kWh indevidamente utilizado nas faturas de outubro/2020, dezembro/2020, fevereiro/2021 a agosto/2021, que foram acumulados entre os meses de março a setembro de 2020. Em consequência, extingue-se o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I do CPC. Condena-se a parte requerida no pagamento das custas e despesas processuais e os honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, fixando-os em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” Irresignada, a concessionária interpôs recurso de apelação (Id. 284847516), sustentando, em síntese, a regularidade dos procedimentos adotados e a inexistência de falha na prestação do serviço. Argumentou que o medidor foi devidamente inspecionado e aprovado pelo INMETRO, atestando seu correto funcionamento, e que a variação de consumo registrada decorreria de fatores alheios à sua responsabilidade, como mudanças climáticas e alteração de rotina no imóvel. A parte apelada apresentou contrarrazões (Id. 284847521), refutando os argumentos recursais e pugnando pela manutenção integral da sentença. Destacou as inconsistências do laudo de verificação metrológica e a redução significativa nos valores das faturas após a substituição do medidor, indicando o defeito no equipamento anterior. Requereu, ainda, a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais para 16% sobre o valor da condenação. É o relatório. Peço dia para julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS Relator V O T O R E L A T O R 1. Da admissibilidade recursal Ab initio, impende proceder ao exame dos pressupostos de admissibilidade recursal, verificando se estão presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos necessários ao conhecimento do recurso de apelação interposto. O apelo é tempestivo, conforme certificado nos autos, tendo sido interposto dentro do prazo legal. O preparo foi devidamente recolhido e a parte recorrente possui legitimidade e interesse recursal, porquanto sucumbente na demanda originária. Presentes, portanto, todos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso. 2. Do mérito recursal In casu, a controvérsia central gravita em torno da existência ou não de falha no medidor de energia elétrica instalado na unidade consumidora da apelada, que teria deixado de registrar adequadamente a energia produzida pelo sistema de microgeração fotovoltaica, resultando em faturamentos indevidos e na utilização indevida de créditos energéticos acumulados. 2.1. Da natureza da relação jurídica Prima facie, impende consignar que, conforme corretamente pontuado pelo juízo sentenciante, a relação jurídica estabelecida entre as partes não se enquadra no conceito estrito de relação de consumo, uma vez que a apelada não é destinatária final da energia elétrica fornecida, utilizando-a como insumo em sua atividade empresarial. Não obstante, a concessionária de energia elétrica, na condição de prestadora de serviço público essencial, submete-se ao regime de responsabilidade objetiva, independentemente da configuração ou não de relação de consumo, conforme estabelecido na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional. Tal responsabilidade prescinde da demonstração de dolo ou culpa para sua caracterização, sendo necessária apenas a comprovação do dano e do nexo causal entre este e a conduta da prestadora do serviço. Vejamos a jurisprudência: “EMENTA - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INCÊNDIO EM PROPRIEDADE RURAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA MANUTENÇÃO DA REDE ELÉTRICA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS MANTIDA. DANOS MATERIAIS NÃO COMPROVADOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI 14.905/2024. RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO. RECURSO DA CONCESSIONÁRIA PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelações interpostas por ambas as partes contra sentença proferida em sede de cumprimento de sentença de ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por ACLEVIS APARECIDA SOUZA DA SILVA em desfavor da ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a concessionária ao pagamento de R$ 40.000,00 por danos morais, acrescidos de correção pelo IPCA-E e juros de 1% ao mês desde o evento danoso. A autora apelou pleiteando também a condenação por danos materiais, enquanto a ré sustentou a ausência de responsabilidade, a inexistência de nexo causal, a culpa de terceiro, a inaplicabilidade dos danos morais, a necessidade de redução da indenização e a reforma da sucumbência e dos critérios de atualização monetária e juros. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há seis questões em discussão: (i) definir se a responsabilidade da concessionária de energia elétrica é objetiva ou subjetiva; (ii) verificar a existência de conduta ilícita, dano e nexo causal; (iii) estabelecer se há dano moral indenizável e a adequação do valor fixado; (iv) apurar se estão comprovados os danos materiais alegados; (v) determinar o regime de sucumbência aplicável; e (vi) fixar os critérios legais para incidência de correção monetária e juros. III. RAZÕES DE DECIDIR A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica decorre da teoria do risco administrativo, sendo objetiva nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, o que afasta a exigência de demonstração de culpa. Comprovado que o incêndio foi causado pelo contato de árvores com fios energizados, sendo a manutenção da rede elétrica e o manejo da vegetação obrigações da concessionária, configura-se a omissão específica ensejadora do dever de indenizar. Laudo do Corpo de Bombeiros constitui prova idônea quanto à origem do incêndio, sendo corroborado por outros elementos dos autos, inexistindo provas de excludentes de responsabilidade. O dano moral configura-se in re ipsa, diante da gravidade do incêndio e da perturbação à esfera íntima da autora, e o valor arbitrado (R$ 40.000,00) é proporcional e razoável. Não comprovado de forma objetiva o quantum dos danos materiais alegados, ausentes documentos fiscais ou estimativas técnicas válidas, razão pela qual é mantida a improcedência desse pedido. Tendo a autora obtido parcialmente êxito (apenas quanto aos danos morais), reconhece-se a sucumbência recíproca, com repartição proporcional das despesas e honorários, observada a gratuidade de justiça. Com base na Lei 14.905/2024, aplicam-se imediatamente a taxa SELIC para os juros moratórios e o IPCA como índice de correção monetária. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso da autora desprovido. Recurso da concessionária parcialmente provido. Tese de julgamento: A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, inclusive nos casos de omissão específica. A falha na manutenção da rede elétrica que permite o contato de vegetação com fios energizados configura omissão específica e enseja responsabilidade civil da concessionária. O dano moral decorrente de incêndio em propriedade rural causado por falha na prestação do serviço de energia elétrica configura-se in re ipsa. A indenização por danos materiais exige prova objetiva do prejuízo e de seu valor, não bastando estimativas unilaterais sem respaldo documental. A sucumbência recíproca impõe a divisão proporcional das custas e honorários entre as partes, observada a gratuidade de justiça. A partir da vigência da Lei 14.905/2024, aplica-se a taxa SELIC como índice único para os juros de mora e o IPCA como índice de correção monetária. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 389, parágrafo único, e 406, § 1º (com redação da Lei 14.905/2024); CPC, arts. 14, 15, 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: TJMT, AC nº 1001121-47.2021.8.11.0028, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 24.05.2023; STJ, AgInt no AREsp 2.070.372/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 4ª Turma, j. 09.09.2024.” (N.U 1000290-07.2022.8.11.0014, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/06/2025, Publicado no DJE 10/06/2025) (Negrito nosso) Insta salientar que, mesmo no regime de responsabilidade objetiva, admite-se a incidência de excludentes, notadamente o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, situações estas que, se comprovadas, têm o condão de elidir o dever de indenizar que, em princípio, recai sobre a prestadora do serviço. 2.2. Da inversão do ônus da prova A parte autora, ora apelada, pleiteou em sua petição inicial a inversão do ônus da prova, enquanto a requerida, ora apelante, contestou tal pedido, alegando não estarem presentes os requisitos autorizadores. Sobre esta questão específica, cumpre esclarecer que, independentemente da configuração ou não de relação de consumo, a distribuição do ônus probatório deve observar as disposições do artigo 373 do Código de Processo Civil, bem como a teoria da carga dinâmica das provas, segundo a qual o encargo probatório recai sobre aquele que se encontra em melhores condições de produzi-la. Vejamos a jurisprudência: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS PROBATÓRIO. ARTIGO 373, §1º, DO CPC. INCÊNDIO DE GRANDES PROPORÇÕES EM PROPRIEDADE RURAL. MAIOR FACILIDADE DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA NA PRODUÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por concessionária de energia elétrica contra decisão que inverteu o ônus da prova com base na Teoria da Distribuição Dinâmica. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside em determinar se há justificativa para a inversão do ônus probatório, com base no artigo 373, §1º, do Código de Processo Civil. III. Razões de decidir 3. A inversão do ônus da prova foi fundamentada na maior capacidade da agravante na produção de provas técnicas e documentais, em especial registros de imagens de satélite, relatórios de manutenção de equipamentos e demais elementos sob seu controle. 4. O fato de o recorrido ser um grande produtor rural não afasta a sua vulnerabilidade técnica frente à concessionária, que detém pleno conhecimento dos sistemas elétricos e de sua gestão. 5. A jurisprudência desta Câmara reconhece a aplicabilidade da Teoria da Carga Dinâmica do Ônus da Prova em situações análogas. 6. A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada, nos termos do artigo 373, §1º, do CPC, não havendo que se falar em onerosidade excessiva ou impossibilidade de produção probatória pela agravante. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido.” (N.U 1029379-49.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Vice-Presidência, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 05/03/2025) (Negrito nosso) No caso concreto, considerando a evidente hipossuficiência técnica da apelada frente à concessionária de energia, bem como o fato de que o objeto da controvérsia (funcionamento adequado ou não do medidor) está intrinsecamente relacionado à atividade técnica da apelante, mostra-se razoável atribuir-lhe o ônus de comprovar que o equipamento funcionava corretamente ou que as variações de consumo registradas decorriam de fatores alheios à sua responsabilidade. 2.3. Da análise do mérito Adentrando ao cerne da controvérsia, cumpre perquirir se, no caso concreto, houve efetivamente falha no medidor de energia que deixou de registrar corretamente a energia produzida pelo sistema fotovoltaico da apelada. Da análise acurada dos elementos fático-probatórios carreados aos autos, verifica-se que diversos aspectos convergem para a conclusão de que, de fato, o medidor apresentava funcionamento inadequado. Primeiramente, observa-se uma alteração significativa e abrupta no padrão de faturamento após a substituição do medidor em agosto de 2022. As faturas, que até então apresentavam valores elevados, chegando a superar R$ 3.000,00 (três mil reais), passaram a registrar montantes substancialmente inferiores a R$ 1.000,00 (mil reais), conforme documentação acostada aos autos. Tal alteração no padrão de faturamento, coincidente com a substituição do equipamento de medição, constitui forte indício de que o medidor anterior não estava realizando a leitura adequada da energia produzida pelo sistema fotovoltaico da apelada. Impende destacar que a redução nos valores faturados ocorreu sem que houvesse qualquer alteração significativa no padrão de consumo da unidade consumidora ou na capacidade produtiva do sistema fotovoltaico, conforme demonstrado pelos relatórios de produção e histórico de consumo juntados aos autos. Em segundo lugar, impende analisar criticamente o demonstrativo de compensação apresentado pela apelante para sustentar que "a unidade está consumindo mais energia do que tem injetado". Referido documento, contudo, foi gerado com base nas leituras realizadas pelo próprio medidor questionado, o que compromete sua confiabilidade como elemento probatório. Com efeito, se o cerne da controvérsia reside justamente na incorreção das leituras realizadas pelo medidor, não se pode tomar como válido um demonstrativo baseado nessas mesmas leituras. Em terceiro lugar, cumpre analisar a validade e a confiabilidade do laudo de verificação metrológica apresentado pela apelante para sustentar o regular funcionamento do medidor substituído. Nesse aspecto, identificam-se quatro inconsistências significativas que comprometem substancialmente a força probante do referido documento técnico: 1) O teste foi realizado utilizando carga de apenas 1 kWh, dimensão manifestamente insuficiente para avaliar o comportamento de um equipamento que, mensalmente, registrava aproximadamente 5.000 kWh. A discrepância entre a carga utilizada no teste e aquela habitualmente registrada pelo medidor é de tal magnitude que torna questionável a conclusão alcançada pelo procedimento; 2) Verifica-se incongruência nos registros de leitura do medidor. Quando da sua retirada, conforme anotação constante da fatura de agosto/2022, o medidor antigo (E0004136329) apresentava leitura final de 107.204 kWh para energia ativa consumida e 88.661 kWh para energia injetada. Contudo, o laudo de verificação metrológica, emitido em 24/08/2022, registrou leituras iniciais de 110.584 kWh e 91.191 kWh, respectivamente, evidenciando uma inexplicável variação positiva em ambos os registros no intervalo entre a retirada do equipamento e sua análise em laboratório; 3) O medidor substituído encontrava-se em uso há aproximadamente dez anos, conforme relatório de ocorrências da unidade consumidora juntado aos autos. O extenso período de utilização do equipamento, sem substituição ou manutenção documentada, constitui elemento adicional que corrobora a plausibilidade de deterioração em seu funcionamento; 4) A própria apelante reconheceu a existência de falha na aferição, tanto que concedeu indenização à apelada no valor de R$ 491,76 (quatrocentos e noventa e um reais e setenta e seis centavos), conforme demonstra a fatura de dezembro/2022 (Id. 106879788, pág. 14). Tal circunstância, por si só, é suficiente para fragilizar significativamente a tese defensiva da concessionária quanto à regularidade do equipamento substituído. Por outro lado, a apelada logrou êxito em demonstrar, mediante laudo técnico elaborado por profissional habilitado e relatórios do sistema fotovoltaico, que seu sistema de microgeração mantinha capacidade produtiva regular e compatível com as especificações técnicas do projeto, sendo capaz de gerar aproximadamente 5.000 kWh mensais. Tal documentação técnica, embora produzida unilateralmente, não foi objeto de impugnação específica pela apelante. Merece destaque o fato de que o sistema de microgeração fotovoltaica opera de forma que parte da energia gerada é imediatamente consumida pela própria unidade (autoconsumo), sem passar pelo medidor da concessionária, enquanto o excedente é injetado na rede de distribuição, gerando créditos para compensação futura. A falha no medidor, portanto, pode afetar tanto o registro da energia injetada quanto o da energia consumida da rede, impactando significativamente o faturamento final. A apelante sustenta em seu recurso que as variações de consumo poderiam decorrer de fatores alheios à sua responsabilidade, como mudanças climáticas e alteração de rotina no imóvel. Contudo, não apresentou qualquer elemento probatório concreto a corroborar tal alegação. Os relatórios de produção do sistema fotovoltaico, por sua vez, demonstram que a geração de energia manteve-se relativamente estável no período questionado, afastando a hipótese de variações significativas decorrentes de fatores climáticos. Nesse contexto, aplicando-se as regras de distribuição do ônus probatório, verifica-se que, enquanto a apelada apresentou elementos consistentes a corroborar sua tese (relatórios de produção, laudo técnico, redução significativa das faturas após a substituição do medidor), a apelante não logrou demonstrar satisfatoriamente que o medidor funcionava regularmente ou que a variação de faturamento decorria exclusivamente de fatores alheios à sua responsabilidade. Vale ressaltar que a concessionária de serviço público tem o dever de empregar tecnologia adequada e equipamentos que garantam níveis satisfatórios de regularidade, continuidade, eficiência e segurança do serviço prestado, conforme preceituam os princípios norteadores da prestação de serviços públicos. No caso em apreço, a convergência de múltiplos elementos probatórios forma um conjunto harmônico que conduz à conclusão de que, efetivamente, o medidor substituído apresentava funcionamento inadequado, deixando de registrar corretamente a energia produzida pela unidade consumidora da apelada. Tal falha no equipamento de medição constitui manifesto defeito na prestação do serviço, gerando para a concessionária o dever de reparar os danos dele decorrentes, nos termos da responsabilidade objetiva que lhe é aplicável. Vejamos a jurisprudência: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – SERVIÇOS ENERGÉTICOS – GERAÇÃO DE ENERGIA FOTOVOLTAICA ATRAVÉS DE PLACAS SOLARES –APARELHO MEDIDOR FORNECIDO PELA CONCESSIONÁRIA DEMANDADA QUE NÃO REGISTRA CORRETAMENTE A PRODUÇÃO DE ENERGIA GERADA – LAUDO PERICIAL QUE CORROBORA COM ALEGAÇÃO AUTORAL – FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – VALOR INDENIZATÓRIO – REDUÇÃO – ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS LEGAIS – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. O consumidor brasileiro pode gerar sua própria energia elétrica a partir de fontes renováveis ou cogeração qualificada. O réu tem o ônus de provar a existência de um fato que impeça, modifique ou extinga o direito do autor. (Art. 373, II do CPC). Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. (Inteligência dos artigos 186 e 927). 4. A ausência de registro da energia gerada pelos painéis fotovoltaicos de titularidade do consumidor é capaz de configurar dano moral, em decorrência do abalo patrimonial suportado. 5. Percebendo-se o descompasso entre o valor indenizatório e a extensão do prejuízo moral experimentado, deve ser feita a adequação jurídica da indenização estabelecida a tal título.” (N.U 1002484-47.2021.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/12/2024, Publicado no DJE 26/12/2024) Diante disso, revela-se escorreita a determinação contida na sentença recorrida, no sentido de que a apelante proceda à restituição dos valores pagos a maior nas faturas emitidas no período compreendido entre agosto/2021 e agosto/2022, bem como à reposição do crédito energético indevidamente utilizado nas faturas de outubro/2020, dezembro/2020 e fevereiro/2021 a agosto/2021. Quanto à forma de cálculo da restituição, o magistrado sentenciante determinou que fosse observado o disposto no art. 323, § 2º, da Resolução n. 1.000, de 07/12/2021, da Agência Nacional de Energia Elétrica, metodologia que se mostra adequada e proporcional à natureza da relação jurídica estabelecida entre as partes. Por conseguinte, não merece acolhimento a pretensão recursal da concessionária apelante, devendo ser mantida in totum a sentença de primeiro grau. Dispositivo. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO. Em atenção às disposições do art. 85, §11º, do CPC, majoro os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1023447-71.2024.8.11.0003

ID: 331080012

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1023447-71.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1023447-71.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). D… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1023447-71.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA] Parte(s): [ANDRESSA MAIRA MACEDO DE JESUS - CPF: 042.892.311-95 (APELADO), DENISE RODEGUER - CPF: 330.525.518-84 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - RECUPERAÇÃO DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA - SUPOSTA IRREGULARIDADE NO RAMAL DE ENTRADA - PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO UNILATERAL - AUSÊNCIA DE OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA - INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA - SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO POR DÉBITO PRETÉRITO - IMPOSSIBILIDADE - TEMA 699 DO STJ - INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS - LEI Nº 14.905/24 - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS - PERCENTUAL MÁXIMO JÁ FIXADO - INAPLICABILIDADE DO ART. 85, §11, DO CPC - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE. A responsabilidade pela demonstração da existência de fraude no medidor de energia elétrica e seu nexo causal com a conduta do consumidor incumbe à concessionária, sobretudo por se tratar de relação de consumo submetida aos ditames do CDC, com possibilidade de inversão do ônus da prova. A simples apresentação de fotografias de suposta irregularidade no ramal de entrada, sem realização de perícia técnica e sem comprovação da efetiva alteração no registro de consumo, mostra-se insuficiente para legitimar a cobrança de recuperação de consumo, mormente quando o procedimento administrativo não observa as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Conforme entendimento fixado pelo STJ no Tema 699, a suspensão do fornecimento de energia elétrica por débito de recuperação de consumo somente é admitida quando preenchidos cumulativamente os seguintes requisitos: a) apuração da irregularidade em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa; b) limitação do período de recuperação a 90 dias anteriores à constatação da fraude; c) execução do corte em até 90 dias após o vencimento do débito. A ausência de qualquer desses requisitos torna ilegal a suspensão do serviço essencial. A interrupção indevida do fornecimento de energia elétrica, serviço essencial à dignidade da pessoa humana, configura dano moral in re ipsa, dispensando-se a comprovação específica do prejuízo. O valor de R$ 10.000,00 arbitrado a título de indenização mostra-se adequado aos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade, atendendo às finalidades compensatória e pedagógica do instituto. Em observância à Lei nº 14.905/24, a atualização monetária e juros de mora devem seguir regime diferenciado: até 27/08/2024, aplicam-se correção monetária pelo IPCA-E desde o arbitramento (Súmula 362/STJ) e juros de mora de 1% ao mês desde a citação; a partir de 28/08/2024, incide exclusivamente a taxa SELIC, que engloba correção monetária e juros. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação apresentado por ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra ANDRESSA MAIRA MACEDO DE JESUS, com o objetivo de reformar a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT no bojo da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais, n.º 1023447-71.2024.8.11.0003 que julgou procedentes os pedidos da autora, nos seguintes termos: “Ex positis, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial. Declaro inexistentes os débitos, objetos desta lide. Observando o critério de razoabilidade, condições econômicas da requerida, bem como da requerente, evitando-se o enriquecimento sem causa, condeno a ré a pagar à autora, a título de ressarcimento pelo dano moral que lhe causou, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Nos termos da Súmula n° 362 do eg. STJ, a contagem da correção monetária deve incidir desde a data do arbitramento. Por se tratar de ilícito contratual, o cômputo dos juros de mora inicia-se a partir da citação válida. Condeno a requerida nos pagamentos das custas processuais e honorários advocatícios, a favor do patrono da autora, em verba que fixo em 20% (vinte por cento) do valor atualizado da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC. Transitada em julgado, ao arquivo com baixa e anotações.” Em suas razões recursais (Id. 289084410), a apelante sustenta que a sentença merece reforma. Alega que não compete à recorrente descobrir quem foi o autor da irregularidade, mas sim apurar que ela prejudicou o registro do real consumo no imóvel da parte recorrida. Afirma que a irregularidade está relacionada a um desvio de energia no ramal de entrada, o que foi devidamente comprovado por meio das fotos juntadas. Sustenta que seguiu todo o procedimento previsto na Resolução n. 1.000/2021 da ANEEL. Quanto aos danos morais, sustenta que não há qualquer elemento de prova nos autos que demonstre a prática de ato ilícito passível de indenização. Por fim, requer a aplicação do índice de correção monetária e juros observando a nova redação da Lei 14.905/24. Em contrarrazões (Id. 289084414), a apelada pugna pelo desprovimento do recurso, alegando que a empresa recorrente reproduziu o teor de sua contestação, sem demonstrar o desacerto da sentença e de seus fundamentos. Afirma ainda que o dano moral não se configurou apenas pela cobrança de valores indevidos, mas também pela atitude truculenta da ré, que procedeu com a retirada total do padrão e fios de energia da residência da autora, permanecendo a consumidora por 3 dias sem o fornecimento de energia elétrica. É o relatório. Peço dia para julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS Relator V O T O R E L A T O R Eminentes pares. 1. Admissibilidade do recurso. Conheço do recurso, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade. A controvérsia gira em torno da legitimidade da cobrança de valores referentes a supostas irregularidades constatadas no medidor de energia elétrica da unidade consumidora da parte apelada, bem como a ocorrência de danos morais indenizáveis em razão da suspensão do fornecimento de energia elétrica. 2. Da relação de consumo e suas implicações probatórias Inicialmente, cumpre destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes configura relação de consumo, submetendo-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, conforme pacífica jurisprudência. Nesse contexto, a responsabilidade da concessionária é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, cabendo ao consumidor apenas a demonstração do dano e do nexo de causalidade. Vejamos a jurisprudência: “EMENTA - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INCÊNDIO EM PROPRIEDADE RURAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA MANUTENÇÃO DA REDE ELÉTRICA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS MANTIDA. DANOS MATERIAIS NÃO COMPROVADOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI 14.905/2024. RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO. RECURSO DA CONCESSIONÁRIA PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelações interpostas por ambas as partes contra sentença proferida em sede de cumprimento de sentença de ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por ACLEVIS APARECIDA SOUZA DA SILVA em desfavor da ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a concessionária ao pagamento de R$ 40.000,00 por danos morais, acrescidos de correção pelo IPCA-E e juros de 1% ao mês desde o evento danoso. A autora apelou pleiteando também a condenação por danos materiais, enquanto a ré sustentou a ausência de responsabilidade, a inexistência de nexo causal, a culpa de terceiro, a inaplicabilidade dos danos morais, a necessidade de redução da indenização e a reforma da sucumbência e dos critérios de atualização monetária e juros. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há seis questões em discussão: (i) definir se a responsabilidade da concessionária de energia elétrica é objetiva ou subjetiva; (ii) verificar a existência de conduta ilícita, dano e nexo causal; (iii) estabelecer se há dano moral indenizável e a adequação do valor fixado; (iv) apurar se estão comprovados os danos materiais alegados; (v) determinar o regime de sucumbência aplicável; e (vi) fixar os critérios legais para incidência de correção monetária e juros. III. RAZÕES DE DECIDIR A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica decorre da teoria do risco administrativo, sendo objetiva nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, o que afasta a exigência de demonstração de culpa. Comprovado que o incêndio foi causado pelo contato de árvores com fios energizados, sendo a manutenção da rede elétrica e o manejo da vegetação obrigações da concessionária, configura-se a omissão específica ensejadora do dever de indenizar. Laudo do Corpo de Bombeiros constitui prova idônea quanto à origem do incêndio, sendo corroborado por outros elementos dos autos, inexistindo provas de excludentes de responsabilidade. O dano moral configura-se in re ipsa, diante da gravidade do incêndio e da perturbação à esfera íntima da autora, e o valor arbitrado (R$ 40.000,00) é proporcional e razoável. Não comprovado de forma objetiva o quantum dos danos materiais alegados, ausentes documentos fiscais ou estimativas técnicas válidas, razão pela qual é mantida a improcedência desse pedido. Tendo a autora obtido parcialmente êxito (apenas quanto aos danos morais), reconhece-se a sucumbência recíproca, com repartição proporcional das despesas e honorários, observada a gratuidade de justiça. Com base na Lei 14.905/2024, aplicam-se imediatamente a taxa SELIC para os juros moratórios e o IPCA como índice de correção monetária. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso da autora desprovido. Recurso da concessionária parcialmente provido. Tese de julgamento: A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, inclusive nos casos de omissão específica. A falha na manutenção da rede elétrica que permite o contato de vegetação com fios energizados configura omissão específica e enseja responsabilidade civil da concessionária. O dano moral decorrente de incêndio em propriedade rural causado por falha na prestação do serviço de energia elétrica configura-se in re ipsa. A indenização por danos materiais exige prova objetiva do prejuízo e de seu valor, não bastando estimativas unilaterais sem respaldo documental. A sucumbência recíproca impõe a divisão proporcional das custas e honorários entre as partes, observada a gratuidade de justiça. A partir da vigência da Lei 14.905/2024, aplica-se a taxa SELIC como índice único para os juros de mora e o IPCA como índice de correção monetária. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 389, parágrafo único, e 406, § 1º (com redação da Lei 14.905/2024); CPC, arts. 14, 15, 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: TJMT, AC nº 1001121-47.2021.8.11.0028, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 24.05.2023; STJ, AgInt no AREsp 2.070.372/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 4ª Turma, j. 09.09.2024.” (N.U 1000290-07.2022.8.11.0014, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/06/2025, Publicado no DJE 10/06/2025) (Negrito nosso) No caso em apreço, verifica-se que a apelante, concessionária de serviço público de fornecimento de energia elétrica, sustenta a regularidade da cobrança relacionada à recuperação de consumo em razão da constatação de irregularidade no medidor da unidade consumidora da apelada, consistente em desvio de energia no ramal de entrada, o que teria prejudicado o registro do real consumo. 3. Da regularidade do procedimento de constatação da irregularidade A apelante argumenta que a inspeção foi realizada em conformidade com a Resolução n. 1.000/2021 da ANEEL, tendo sido acompanhada por um dos moradores do imóvel, embora este tenha se recusado a assinar o Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI). Aduz, ainda, que notificou a consumidora sobre o procedimento de inspeção e o débito decorrente, possibilitando a apresentação de recurso administrativo. A Resolução n. 1.000/2021 da ANEEL, que substituiu a Resolução n. 414/2010, estabelece em seu art. 591 que a distribuidora deve comprovar a ocorrência de irregularidade através de documentos que demonstrem a existência de elementos indicativos de manipulação do medidor, devendo assegurar ao consumidor o direito à ampla defesa, inclusive quanto à participação efetiva no processo de apuração. Determina ainda a necessidade de elaboração do Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI), documento que deve ser elaborado na presença do consumidor ou de quem o represente, contendo informações específicas sobre a irregularidade identificada. Ao analisar detidamente os autos, constato que, de fato, a concessionária apelante juntou aos autos fotografias (Id. 289084410) que demonstrariam a existência de irregularidade no ramal de entrada. Contudo, não se pode olvidar que o ônus da prova acerca da existência de fraude e da responsabilidade do consumidor incumbe à concessionária de energia elétrica, considerando sua condição de fornecedora de serviços, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, que estabelece a possibilidade de inversão do ônus da prova em favor do consumidor. Vejamos a jurisprudência: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS PROBATÓRIO. ARTIGO 373, §1º, DO CPC. INCÊNDIO DE GRANDES PROPORÇÕES EM PROPRIEDADE RURAL. MAIOR FACILIDADE DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA NA PRODUÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por concessionária de energia elétrica contra decisão que inverteu o ônus da prova com base na Teoria da Distribuição Dinâmica. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside em determinar se há justificativa para a inversão do ônus probatório, com base no artigo 373, §1º, do Código de Processo Civil. III. Razões de decidir 3. A inversão do ônus da prova foi fundamentada na maior capacidade da agravante na produção de provas técnicas e documentais, em especial registros de imagens de satélite, relatórios de manutenção de equipamentos e demais elementos sob seu controle. 4. O fato de o recorrido ser um grande produtor rural não afasta a sua vulnerabilidade técnica frente à concessionária, que detém pleno conhecimento dos sistemas elétricos e de sua gestão. 5. A jurisprudência desta Câmara reconhece a aplicabilidade da Teoria da Carga Dinâmica do Ônus da Prova em situações análogas. 6. A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada, nos termos do artigo 373, §1º, do CPC, não havendo que se falar em onerosidade excessiva ou impossibilidade de produção probatória pela agravante. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido.” (N.U 1029379-49.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 05/03/2025) (Negrito nosso) Na hipótese vertente, observo que a apelante não se desincumbiu a contento de seu ônus probatório, pois não comprovou de forma robusta e inequívoca que a irregularidade apontada tenha efetivamente ocasionado prejuízos ao registro correto do consumo de energia elétrica na unidade consumidora da apelada. Com efeito, o próprio procedimento de constatação da irregularidade revela-se frágil, eis que realizado unilateralmente pela concessionária, sem a comprovação de que tenha sido assegurado à consumidora o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa no âmbito administrativo, princípios estes que possuem assento constitucional e são de observância obrigatória inclusive em procedimentos administrativos, conforme art. 5º, LV, da Constituição Federal. Nesse sentido, embora a apelante alegue que a inspeção foi acompanhada por um dos moradores do imóvel, reconhece que este se recusou a assinar o TOI, circunstância que, por si só, já sugere a existência de controvérsia quanto ao procedimento adotado e seus resultados. No entanto, não há nos autos evidência de que tenha sido facultada ao consumidor sua participação em eventual perícia ou avaliação técnica do equipamento, como determina a regulamentação aplicável. 4. Da necessidade de comprovação técnica da irregularidade Ademais, não foi realizada perícia técnica no medidor, procedimento que seria essencial para comprovar de maneira inequívoca a existência de irregularidade e sua eventual relação com consumo não registrado. A apelante argumenta que a perícia seria dispensável por se tratar de irregularidade externa ao aparelho, verificável por meio de registro fotográfico. Contudo, tal argumento não prospera, uma vez que a simples visualização de fotografias não é suficiente para comprovar tecnicamente que o desvio alegado efetivamente comprometeu o registro do consumo e em qual extensão. O precedente qualificado Tema 699 do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que a cobrança de débitos pretéritos de energia elétrica, apurados em decorrência de suposta fraude no medidor, deve observar rigorosamente os princípios do contraditório e da ampla defesa. Confira-se a ementa do Tema 699: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. SERVIÇOS PÚBLICOS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. FRAUDE NO MEDIDOR DE CONSUMO. CORTE ADMINISTRATIVO DO SERVIÇO. DÉBITOS DO CONSUMIDOR. CRITÉRIOS. ANÁLISE DA CONTROVÉRSIA SUBMETIDA AO RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) 1. A concessionária sustenta que qualquer débito, atual ou antigo, dá ensejo ao corte administrativo do fornecimento de energia elétrica, o que inclui, além das hipóteses de mora do consumidor, débitos pretéritos relativos à recuperação de consumo por fraude do medidor. In casu, pretende cobrar débito oriundo de fraude em medidor, fazendo-o retroagir aos cinco anos antecedentes. TESE CONTROVERTIDA ADMITIDA 2. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (atualmente 1036 e seguintes do CPC/2015), admitiu-se a seguinte tese controvertida: "a possibilidade de o prestador de serviços públicos suspender o fornecimento de energia elétrica em razão de débito pretérito do destinatário final do serviço". PANORAMA GERAL DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ SOBRE CORTE DE ENERGIA POR FALTA DE PAGAMENTO 3. São três os principais cenários de corte administrativo do serviço em decorrência de débitos de consumo de energia elétrica por inadimplemento: a) consumo regular (simples mora do consumidor); b) recuperação de consumo por responsabilidade atribuível à concessionária; e c) recuperação de consumo por responsabilidade atribuível ao consumidor (normalmente, fraude do medidor). 4. O caso tratado no presente recurso representativo da controvérsia é o do item "c" acima, já que a apuração de débitos pretéritos decorreu de fato atribuível ao consumidor: fraude no medidor de consumo. 5. Não obstante a delimitação supra, é indispensável à resolução da controvérsia fazer um apanhado da jurisprudência do STJ sobre a possibilidade de corte administrativo do serviço de energia elétrica. 6. Com relação a débitos de consumo regular de energia elétrica, em que ocorre simples mora do consumidor, a jurisprudência do STJ está sedimentada no sentido de que é lícito o corte administrativo do serviço, se houver aviso prévio da suspensão. A propósito: REsp 363.943/MG, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Primeira Seção, DJ 1º.3.2004, p. 119; EREsp 302.620/SP, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Franciulli Netto, Primeira Seção, DJ 3.4.2006, p. 207; REsp 772.486/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ 6.3.2006, p. 225; AgRg no Ag 1.320.867/RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 19.6.2017; e AgRg no AREsp 817.879/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 12.2.2016. 7. Quanto a débitos pretéritos, sem discussão específica ou vinculação exclusiva à responsabilidade atribuível ao consumidor pela recuperação de consumo (fraude no medidor), há diversos precedentes no STJ que estipulam a tese genérica de impossibilidade de corte do serviço: EREsp 1.069.215/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 1º.2.2011; EAg 1.050.470/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 14.9.2010; REsp 772.486/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ 6.3.2006, p. 225; AgRg nos EDcl no AREsp 107.900/RS, Rel. Ministro Ari Pargendler, Primeira Turma, DJe 18.3.2013; AgRg no REsp 1.381.468/RN, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 14.8.2013; AgRg no REsp 1.536.047/GO, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 15.9.2015; AgRg no AREsp 273.005/ES, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 26.3.2013; AgRg no AREsp 257.749/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 8.2.2013; AgRg no AREsp 462.325/RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 15.4.2014; AgRg no AREsp 569.843/PE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 11.11.2015; AgRg no AREsp 484.166/RS, Rel. Ministro Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 8.5.2014; EDcl no AgRg no AREsp 58.249/PE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 25.4.2013; AgRg no AREsp 360.286/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 11.9.2013; AgRg no AREsp 360.181/PE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 26.9.2013; AgRg no AREsp 331.472/PE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 13.9.2013; AgRg no AREsp 300.270/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 24.9.2015; AgRg no REsp 1.261.303/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 19.8.2013; EDcl no REsp 1.339.514/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 5.3.2013; AgRg no AREsp 344.523/PE, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 14.10.2013; AgRg no AREsp 470/RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 4.10.2011; e AgRg no Ag 962.237/RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 27.3.2008. CORTE ADMINISTRATIVO POR FRAUDE NO MEDIDOR 8. Relativamente aos casos de fraude do medidor pelo consumidor, a jurisprudência do STJ veda o corte quando o ilícito for aferido unilateralmente pela concessionária. A contrario sensu, é possível a suspensão do serviço se o débito pretérito por fraude do medidor cometida pelo consumidor for apurado de forma a proporcionar o contraditório e a ampla defesa. Nesse sentido: AgRg no AREsp 412.849/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 10.12.2013; AgRg no AREsp 370.548/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 4.10.2013; AgRg no REsp 1.465.076/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 9.3.2016; REsp 1.310.260/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 28.9.2017; AgRg no AREsp 187.037/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 8.10.2012; AgRg no AREsp 332.891/PE, Relator Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13.8.2013; AgRg no AREsp 357.553/PE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 26.11.2014; AgRg no AREsp 551.645/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 3.10.2014; AgInt no AREsp 967.813/PR, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 8.3.2017; AgInt no REsp 1.473.448/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 1º.2.2017; AgRg no AREsp 345.130/PE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 10.10.2014; AgRg no AREsp 346.561/PE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 1º.4.2014; AgRg no AREsp 448.913/PE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 3.9.2015; AgRg no AREsp 258.350/PE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 8.6.2016; AgRg no REsp 1.478.948/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 20.3.2015; AgRg no AREsp 159.109/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 18.4.2013; AgRg no AREsp 295.444/RS, Rel. Ministra Marga Tessler (Desembargadora Federal Convocada do TRF/4ª Região), Primeira Turma, DJe de 17.4.2015; AgRg no AREsp 322.763/PE, Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Federal Convocada do TRF/3ª Região), Segunda Turma, DJe 23.8.2016; e AgRg AREsp 243.389/PE, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 4.2.2013. RESOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA 9. Como demonstrado acima, em relação a débitos pretéritos mensurados por fraude do medidor de consumo causada pelo consumidor, a jurisprudência do STJ orienta-se no sentido do seu cabimento, desde que verificada com observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. 10. O não pagamento dos débitos por recuperação de efetivo consumo por fraude ao medidor enseja o corte do serviço, assim como acontece para o consumidor regular que deixa de pagar a conta mensal (mora), sem deixar de ser observada a natureza pessoal (não propter rem) da obrigação, conforme pacífica jurisprudência do STJ. 11. Todavia, incumbe à concessionária do serviço público observar rigorosamente os direitos ao contraditório e à ampla defesa do consumidor na apuração do débito, já que o entendimento do STJ repele a averiguação unilateral da dívida. 12. Além disso, o reconhecimento da possibilidade de corte de energia elétrica deve ter limite temporal de apuração retroativa, pois incumbe às concessionárias o dever não só de fornecer o serviço, mas também de fiscalizar adequada e periodicamente o sistema de controle de consumo. 13. Por conseguinte e à luz do princípio da razoabilidade, a suspensão administrativa do fornecimento do serviço - como instrumento de coação extrajudicial ao pagamento de parcelas pretéritas relativas à recuperação de consumo por fraude do medidor atribuível ao consumidor - deve ser possibilitada quando não forem pagos débitos relativos aos últimos 90 (noventa) dias da apuração da fraude, sem prejuízo do uso das vias judiciais ordinárias de cobrança. 14. Da mesma forma, deve ser fixado prazo razoável de, no máximo, 90 (noventa) dias, após o vencimento da fatura de recuperação de consumo, para que a concessionária possa suspender o serviço. TESE REPETITIVA 15. Para fins dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fica assim resolvida a controvérsia repetitiva: Na hipótese de débito estrito de recuperação de consumo efetivo por fraude no aparelho medidor atribuída ao consumidor, desde que apurado em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, é possível o corte administrativo do fornecimento do serviço de energia elétrica, mediante prévio aviso ao consumidor, pelo inadimplemento do consumo recuperado correspondente ao período de 90 (noventa) dias anterior à constatação da fraude, contanto que executado o corte em até 90 (noventa) dias após o vencimento do débito, sem prejuízo do direito de a concessionária utilizar os meios judiciais ordinários de cobrança da dívida, inclusive antecedente aos mencionados 90 (noventa) dias de retroação. RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 16. Na hipótese dos autos, o Tribunal Estadual declarou a ilegalidade do corte de energia por se lastrear em débitos não relacionados ao último mês de consumo. 17. Os débitos em litígio são concernentes à recuperação de consumo do valor de R$ 9.418,94 (nove mil, quatrocentos e dezoito reais e noventa e quatro centavos) por fraude constatada no aparelho medidor no período de cinco anos (15.12.2000 a 15.12.2005) anteriores à constatação, não sendo lícita a imposição de corte administrativo do serviço pela inadimplência de todo esse período, conforme os parâmetros estipulados no presente julgamento. 18. O pleito recursal relativo ao cálculo da recuperação de consumo não merece conhecimento por aplicação do óbice da Súmula 7/STJ. 19. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.” (REsp n. 1.412.433/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 25/4/2018, DJe de 28/9/2018.) (negrito nosso) No caso em exame, a própria apelante reconhece em suas razões recursais que "a prova de que tenha sido a recorrida quem adulterou o medidor é praticamente impossível", o que corrobora a fragilidade da imputação de responsabilidade à consumidora pelo pagamento dos valores cobrados a título de recuperação de consumo. 5. Da ilegalidade da suspensão do fornecimento por débitos pretéritos. Por outro lado, considerando que o serviço de fornecimento de energia elétrica é essencial, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que é ilegal a suspensão do fornecimento de energia elétrica em razão de débitos pretéritos, sendo admitida apenas em caso de inadimplemento de conta regular, relativa ao mês de consumo. Nesse sentido, foi editado o Tema 699 dos recursos repetitivos, já analisados acima. Assim, para que seja legítima a suspensão do fornecimento, é imprescindível que o débito decorra de efetiva fraude no medidor, apurada mediante procedimento regular e com observância do contraditório e da ampla defesa, o que, conforme já explanado, não restou suficientemente comprovado nos autos. A apelante alega que a suspensão do fornecimento de energia ocorreu em conformidade com o Tema 699 do STJ, por se referir aos 90 dias anteriores à constatação da irregularidade. Todavia, tal argumento não pode prosperar, pois o referido entendimento exige, como pressuposto inafastável, que a irregularidade tenha sido apurada em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, o que, como visto, não ocorreu no presente caso. 6. Da configuração do dano moral Ademais, conforme alegado pela apelada em suas contrarrazões (Id. 289084414), a suspensão do fornecimento de energia não se limitou a uma mera interrupção temporária, mas teria envolvido a retirada total do padrão e fios de energia da residência, mantendo a consumidora por três dias sem o fornecimento desse serviço essencial. Embora tal alegação tenha sido apresentada apenas em sede recursal, sem possibilidade de contraditório pleno ou comprovação nos autos (art. 1.014 do CPC), mesmo a simples interrupção do serviço essencial por débito pretérito já configura conduta desproporcional e abusiva por parte da concessionária, conforme entendimento consolidado no STJ. Nesse contexto, configurada a ilegalidade da cobrança e da suspensão do fornecimento de energia elétrica, é de se reconhecer o dano moral sofrido pela consumidora, cuja ocorrência, in casu, decorre do próprio fato (dano in re ipsa), dispensando-se a comprovação específica de prejuízo. Com efeito, a privação de serviço essencial como o fornecimento de energia elétrica caracteriza evidente abalo que ultrapassa o mero dissabor cotidiano, configurando efetivo dano moral passível de indenização. A situação se agrava quando considerada a essencialidade do serviço para a dignidade da pessoa humana, sendo a energia elétrica indispensável para a conservação de alimentos, higiene pessoal, segurança, iluminação, entre outras necessidades básicas. Quanto ao valor da indenização por danos morais, o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) fixado na sentença atende aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, considerando a gravidade da conduta da concessionária, o caráter essencial do serviço, o período de privação e a finalidade pedagógica da medida, não comportando, assim, qualquer redução. 7. Da aplicação da Lei nº 14.905/24 sobre atualização monetária e juros No tocante ao pedido de aplicação do índice de correção monetária e juros conforme a nova redação da Lei nº 14.905/24, cabe ressaltar que referida lei alterou substancialmente o art. 406 do Código Civil, estabelecendo que, a partir de sua vigência em 28 de agosto de 2024, os juros de mora, quando não convencionados, corresponderão à taxa referencial do Sistema de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o índice de atualização monetária (IPCA), conforme disposto no art. 406, §1º do Código Civil. Sendo norma de ordem pública atinente a critérios de atualização monetária e juros, aplica-se imediatamente aos processos em curso, sem prejuízo dos atos jurídicos perfeitos. Assim, quanto aos juros e correção monetária que fluem até 27 de agosto de 2024, aplicam-se os critérios anteriormente vigentes, com correção monetária pelo IPCA-E a partir do arbitramento da indenização, nos termos da Súmula 362 do STJ, e juros de mora de 1% ao mês, conforme art. 406 do CC na redação anterior, contados a partir da citação, por se tratar de responsabilidade contratual. Para o período a partir de 28 de agosto de 2024, aplica-se a taxa SELIC nos termos da nova legislação, que já engloba atualização monetária e juros moratórios, conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.795.982/SP. Considerando que, no caso em tela, o fato gerador da condenação ocorreu anteriormente à vigência da Lei nº 14.905/24, deverá ser observada a regra de transição acima mencionada para a atualização do valor da condenação. Em síntese, diante do conjunto probatório constante nos autos e da aplicação da legislação e jurisprudência pertinentes, conclui-se que a sentença de primeiro grau não merece reforma quanto à declaração de inexistência dos débitos relacionados à recuperação de consumo e à condenação da concessionária ao pagamento de indenização por danos morais, devendo apenas ser ajustada a forma de atualização do valor da condenação, conforme acima explicitado. Dispositivo. Ante o exposto, conheço do recurso e DOU PARCIAL PROVIMENTO, somente para alterar a sentença quanto aos critérios de atualização monetária e juros de mora, em observância à Lei nº 14.905/24, determino que: (a) até 27 de agosto de 2024, a correção monetária incidirá pelo IPCA-E a partir do arbitramento da indenização, nos termos da Súmula 362/STJ, e os juros de mora à taxa de 1% ao mês a partir da citação, por se tratar de responsabilidade contratual; (b) a partir de 28 de agosto de 2024, incidirá exclusivamente a taxa SELIC, englobando tanto a correção monetária quanto os juros moratórios, conforme nova redação do art. 406, §1º do Código Civil. Inaplicável à hipótese a majoração prevista no art. 85, §11 do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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Processo nº 1023447-71.2024.8.11.0003

ID: 331080021

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1023447-71.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ANDRESSA MAIRA MACEDO DE JESUS

Acórdão

Advogados:

DENISE RODEGUER

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1023447-71.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). D… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1023447-71.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). DIRCEU DOS SANTOS Turma Julgadora: [DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA] Parte(s): [ANDRESSA MAIRA MACEDO DE JESUS - CPF: 042.892.311-95 (APELADO), DENISE RODEGUER - CPF: 330.525.518-84 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - RECUPERAÇÃO DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA - SUPOSTA IRREGULARIDADE NO RAMAL DE ENTRADA - PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO UNILATERAL - AUSÊNCIA DE OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA - INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA - SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO POR DÉBITO PRETÉRITO - IMPOSSIBILIDADE - TEMA 699 DO STJ - INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS - LEI Nº 14.905/24 - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS - PERCENTUAL MÁXIMO JÁ FIXADO - INAPLICABILIDADE DO ART. 85, §11, DO CPC - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE. A responsabilidade pela demonstração da existência de fraude no medidor de energia elétrica e seu nexo causal com a conduta do consumidor incumbe à concessionária, sobretudo por se tratar de relação de consumo submetida aos ditames do CDC, com possibilidade de inversão do ônus da prova. A simples apresentação de fotografias de suposta irregularidade no ramal de entrada, sem realização de perícia técnica e sem comprovação da efetiva alteração no registro de consumo, mostra-se insuficiente para legitimar a cobrança de recuperação de consumo, mormente quando o procedimento administrativo não observa as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Conforme entendimento fixado pelo STJ no Tema 699, a suspensão do fornecimento de energia elétrica por débito de recuperação de consumo somente é admitida quando preenchidos cumulativamente os seguintes requisitos: a) apuração da irregularidade em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa; b) limitação do período de recuperação a 90 dias anteriores à constatação da fraude; c) execução do corte em até 90 dias após o vencimento do débito. A ausência de qualquer desses requisitos torna ilegal a suspensão do serviço essencial. A interrupção indevida do fornecimento de energia elétrica, serviço essencial à dignidade da pessoa humana, configura dano moral in re ipsa, dispensando-se a comprovação específica do prejuízo. O valor de R$ 10.000,00 arbitrado a título de indenização mostra-se adequado aos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade, atendendo às finalidades compensatória e pedagógica do instituto. Em observância à Lei nº 14.905/24, a atualização monetária e juros de mora devem seguir regime diferenciado: até 27/08/2024, aplicam-se correção monetária pelo IPCA-E desde o arbitramento (Súmula 362/STJ) e juros de mora de 1% ao mês desde a citação; a partir de 28/08/2024, incide exclusivamente a taxa SELIC, que engloba correção monetária e juros. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação apresentado por ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra ANDRESSA MAIRA MACEDO DE JESUS, com o objetivo de reformar a sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT no bojo da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais, n.º 1023447-71.2024.8.11.0003 que julgou procedentes os pedidos da autora, nos seguintes termos: “Ex positis, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial. Declaro inexistentes os débitos, objetos desta lide. Observando o critério de razoabilidade, condições econômicas da requerida, bem como da requerente, evitando-se o enriquecimento sem causa, condeno a ré a pagar à autora, a título de ressarcimento pelo dano moral que lhe causou, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Nos termos da Súmula n° 362 do eg. STJ, a contagem da correção monetária deve incidir desde a data do arbitramento. Por se tratar de ilícito contratual, o cômputo dos juros de mora inicia-se a partir da citação válida. Condeno a requerida nos pagamentos das custas processuais e honorários advocatícios, a favor do patrono da autora, em verba que fixo em 20% (vinte por cento) do valor atualizado da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC. Transitada em julgado, ao arquivo com baixa e anotações.” Em suas razões recursais (Id. 289084410), a apelante sustenta que a sentença merece reforma. Alega que não compete à recorrente descobrir quem foi o autor da irregularidade, mas sim apurar que ela prejudicou o registro do real consumo no imóvel da parte recorrida. Afirma que a irregularidade está relacionada a um desvio de energia no ramal de entrada, o que foi devidamente comprovado por meio das fotos juntadas. Sustenta que seguiu todo o procedimento previsto na Resolução n. 1.000/2021 da ANEEL. Quanto aos danos morais, sustenta que não há qualquer elemento de prova nos autos que demonstre a prática de ato ilícito passível de indenização. Por fim, requer a aplicação do índice de correção monetária e juros observando a nova redação da Lei 14.905/24. Em contrarrazões (Id. 289084414), a apelada pugna pelo desprovimento do recurso, alegando que a empresa recorrente reproduziu o teor de sua contestação, sem demonstrar o desacerto da sentença e de seus fundamentos. Afirma ainda que o dano moral não se configurou apenas pela cobrança de valores indevidos, mas também pela atitude truculenta da ré, que procedeu com a retirada total do padrão e fios de energia da residência da autora, permanecendo a consumidora por 3 dias sem o fornecimento de energia elétrica. É o relatório. Peço dia para julgamento. Des. DIRCEU DOS SANTOS Relator V O T O R E L A T O R Eminentes pares. 1. Admissibilidade do recurso. Conheço do recurso, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade. A controvérsia gira em torno da legitimidade da cobrança de valores referentes a supostas irregularidades constatadas no medidor de energia elétrica da unidade consumidora da parte apelada, bem como a ocorrência de danos morais indenizáveis em razão da suspensão do fornecimento de energia elétrica. 2. Da relação de consumo e suas implicações probatórias Inicialmente, cumpre destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes configura relação de consumo, submetendo-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, conforme pacífica jurisprudência. Nesse contexto, a responsabilidade da concessionária é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, cabendo ao consumidor apenas a demonstração do dano e do nexo de causalidade. Vejamos a jurisprudência: “EMENTA - DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INCÊNDIO EM PROPRIEDADE RURAL. CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA MANUTENÇÃO DA REDE ELÉTRICA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS MANTIDA. DANOS MATERIAIS NÃO COMPROVADOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI 14.905/2024. RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO. RECURSO DA CONCESSIONÁRIA PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelações interpostas por ambas as partes contra sentença proferida em sede de cumprimento de sentença de ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada por ACLEVIS APARECIDA SOUZA DA SILVA em desfavor da ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a concessionária ao pagamento de R$ 40.000,00 por danos morais, acrescidos de correção pelo IPCA-E e juros de 1% ao mês desde o evento danoso. A autora apelou pleiteando também a condenação por danos materiais, enquanto a ré sustentou a ausência de responsabilidade, a inexistência de nexo causal, a culpa de terceiro, a inaplicabilidade dos danos morais, a necessidade de redução da indenização e a reforma da sucumbência e dos critérios de atualização monetária e juros. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há seis questões em discussão: (i) definir se a responsabilidade da concessionária de energia elétrica é objetiva ou subjetiva; (ii) verificar a existência de conduta ilícita, dano e nexo causal; (iii) estabelecer se há dano moral indenizável e a adequação do valor fixado; (iv) apurar se estão comprovados os danos materiais alegados; (v) determinar o regime de sucumbência aplicável; e (vi) fixar os critérios legais para incidência de correção monetária e juros. III. RAZÕES DE DECIDIR A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica decorre da teoria do risco administrativo, sendo objetiva nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, o que afasta a exigência de demonstração de culpa. Comprovado que o incêndio foi causado pelo contato de árvores com fios energizados, sendo a manutenção da rede elétrica e o manejo da vegetação obrigações da concessionária, configura-se a omissão específica ensejadora do dever de indenizar. Laudo do Corpo de Bombeiros constitui prova idônea quanto à origem do incêndio, sendo corroborado por outros elementos dos autos, inexistindo provas de excludentes de responsabilidade. O dano moral configura-se in re ipsa, diante da gravidade do incêndio e da perturbação à esfera íntima da autora, e o valor arbitrado (R$ 40.000,00) é proporcional e razoável. Não comprovado de forma objetiva o quantum dos danos materiais alegados, ausentes documentos fiscais ou estimativas técnicas válidas, razão pela qual é mantida a improcedência desse pedido. Tendo a autora obtido parcialmente êxito (apenas quanto aos danos morais), reconhece-se a sucumbência recíproca, com repartição proporcional das despesas e honorários, observada a gratuidade de justiça. Com base na Lei 14.905/2024, aplicam-se imediatamente a taxa SELIC para os juros moratórios e o IPCA como índice de correção monetária. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso da autora desprovido. Recurso da concessionária parcialmente provido. Tese de julgamento: A responsabilidade civil das concessionárias de energia elétrica é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da CF/1988, inclusive nos casos de omissão específica. A falha na manutenção da rede elétrica que permite o contato de vegetação com fios energizados configura omissão específica e enseja responsabilidade civil da concessionária. O dano moral decorrente de incêndio em propriedade rural causado por falha na prestação do serviço de energia elétrica configura-se in re ipsa. A indenização por danos materiais exige prova objetiva do prejuízo e de seu valor, não bastando estimativas unilaterais sem respaldo documental. A sucumbência recíproca impõe a divisão proporcional das custas e honorários entre as partes, observada a gratuidade de justiça. A partir da vigência da Lei 14.905/2024, aplica-se a taxa SELIC como índice único para os juros de mora e o IPCA como índice de correção monetária. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 389, parágrafo único, e 406, § 1º (com redação da Lei 14.905/2024); CPC, arts. 14, 15, 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: TJMT, AC nº 1001121-47.2021.8.11.0028, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 24.05.2023; STJ, AgInt no AREsp 2.070.372/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 4ª Turma, j. 09.09.2024.” (N.U 1000290-07.2022.8.11.0014, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/06/2025, Publicado no DJE 10/06/2025) (Negrito nosso) No caso em apreço, verifica-se que a apelante, concessionária de serviço público de fornecimento de energia elétrica, sustenta a regularidade da cobrança relacionada à recuperação de consumo em razão da constatação de irregularidade no medidor da unidade consumidora da apelada, consistente em desvio de energia no ramal de entrada, o que teria prejudicado o registro do real consumo. 3. Da regularidade do procedimento de constatação da irregularidade A apelante argumenta que a inspeção foi realizada em conformidade com a Resolução n. 1.000/2021 da ANEEL, tendo sido acompanhada por um dos moradores do imóvel, embora este tenha se recusado a assinar o Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI). Aduz, ainda, que notificou a consumidora sobre o procedimento de inspeção e o débito decorrente, possibilitando a apresentação de recurso administrativo. A Resolução n. 1.000/2021 da ANEEL, que substituiu a Resolução n. 414/2010, estabelece em seu art. 591 que a distribuidora deve comprovar a ocorrência de irregularidade através de documentos que demonstrem a existência de elementos indicativos de manipulação do medidor, devendo assegurar ao consumidor o direito à ampla defesa, inclusive quanto à participação efetiva no processo de apuração. Determina ainda a necessidade de elaboração do Termo de Ocorrência e Inspeção (TOI), documento que deve ser elaborado na presença do consumidor ou de quem o represente, contendo informações específicas sobre a irregularidade identificada. Ao analisar detidamente os autos, constato que, de fato, a concessionária apelante juntou aos autos fotografias (Id. 289084410) que demonstrariam a existência de irregularidade no ramal de entrada. Contudo, não se pode olvidar que o ônus da prova acerca da existência de fraude e da responsabilidade do consumidor incumbe à concessionária de energia elétrica, considerando sua condição de fornecedora de serviços, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, que estabelece a possibilidade de inversão do ônus da prova em favor do consumidor. Vejamos a jurisprudência: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. TEORIA DA DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA DO ÔNUS PROBATÓRIO. ARTIGO 373, §1º, DO CPC. INCÊNDIO DE GRANDES PROPORÇÕES EM PROPRIEDADE RURAL. MAIOR FACILIDADE DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA NA PRODUÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por concessionária de energia elétrica contra decisão que inverteu o ônus da prova com base na Teoria da Distribuição Dinâmica. II. Questão em discussão 2. A controvérsia reside em determinar se há justificativa para a inversão do ônus probatório, com base no artigo 373, §1º, do Código de Processo Civil. III. Razões de decidir 3. A inversão do ônus da prova foi fundamentada na maior capacidade da agravante na produção de provas técnicas e documentais, em especial registros de imagens de satélite, relatórios de manutenção de equipamentos e demais elementos sob seu controle. 4. O fato de o recorrido ser um grande produtor rural não afasta a sua vulnerabilidade técnica frente à concessionária, que detém pleno conhecimento dos sistemas elétricos e de sua gestão. 5. A jurisprudência desta Câmara reconhece a aplicabilidade da Teoria da Carga Dinâmica do Ônus da Prova em situações análogas. 6. A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada, nos termos do artigo 373, §1º, do CPC, não havendo que se falar em onerosidade excessiva ou impossibilidade de produção probatória pela agravante. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido.” (N.U 1029379-49.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 05/03/2025) (Negrito nosso) Na hipótese vertente, observo que a apelante não se desincumbiu a contento de seu ônus probatório, pois não comprovou de forma robusta e inequívoca que a irregularidade apontada tenha efetivamente ocasionado prejuízos ao registro correto do consumo de energia elétrica na unidade consumidora da apelada. Com efeito, o próprio procedimento de constatação da irregularidade revela-se frágil, eis que realizado unilateralmente pela concessionária, sem a comprovação de que tenha sido assegurado à consumidora o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa no âmbito administrativo, princípios estes que possuem assento constitucional e são de observância obrigatória inclusive em procedimentos administrativos, conforme art. 5º, LV, da Constituição Federal. Nesse sentido, embora a apelante alegue que a inspeção foi acompanhada por um dos moradores do imóvel, reconhece que este se recusou a assinar o TOI, circunstância que, por si só, já sugere a existência de controvérsia quanto ao procedimento adotado e seus resultados. No entanto, não há nos autos evidência de que tenha sido facultada ao consumidor sua participação em eventual perícia ou avaliação técnica do equipamento, como determina a regulamentação aplicável. 4. Da necessidade de comprovação técnica da irregularidade Ademais, não foi realizada perícia técnica no medidor, procedimento que seria essencial para comprovar de maneira inequívoca a existência de irregularidade e sua eventual relação com consumo não registrado. A apelante argumenta que a perícia seria dispensável por se tratar de irregularidade externa ao aparelho, verificável por meio de registro fotográfico. Contudo, tal argumento não prospera, uma vez que a simples visualização de fotografias não é suficiente para comprovar tecnicamente que o desvio alegado efetivamente comprometeu o registro do consumo e em qual extensão. O precedente qualificado Tema 699 do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que a cobrança de débitos pretéritos de energia elétrica, apurados em decorrência de suposta fraude no medidor, deve observar rigorosamente os princípios do contraditório e da ampla defesa. Confira-se a ementa do Tema 699: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. SERVIÇOS PÚBLICOS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. FRAUDE NO MEDIDOR DE CONSUMO. CORTE ADMINISTRATIVO DO SERVIÇO. DÉBITOS DO CONSUMIDOR. CRITÉRIOS. ANÁLISE DA CONTROVÉRSIA SUBMETIDA AO RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) 1. A concessionária sustenta que qualquer débito, atual ou antigo, dá ensejo ao corte administrativo do fornecimento de energia elétrica, o que inclui, além das hipóteses de mora do consumidor, débitos pretéritos relativos à recuperação de consumo por fraude do medidor. In casu, pretende cobrar débito oriundo de fraude em medidor, fazendo-o retroagir aos cinco anos antecedentes. TESE CONTROVERTIDA ADMITIDA 2. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (atualmente 1036 e seguintes do CPC/2015), admitiu-se a seguinte tese controvertida: "a possibilidade de o prestador de serviços públicos suspender o fornecimento de energia elétrica em razão de débito pretérito do destinatário final do serviço". PANORAMA GERAL DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ SOBRE CORTE DE ENERGIA POR FALTA DE PAGAMENTO 3. São três os principais cenários de corte administrativo do serviço em decorrência de débitos de consumo de energia elétrica por inadimplemento: a) consumo regular (simples mora do consumidor); b) recuperação de consumo por responsabilidade atribuível à concessionária; e c) recuperação de consumo por responsabilidade atribuível ao consumidor (normalmente, fraude do medidor). 4. O caso tratado no presente recurso representativo da controvérsia é o do item "c" acima, já que a apuração de débitos pretéritos decorreu de fato atribuível ao consumidor: fraude no medidor de consumo. 5. Não obstante a delimitação supra, é indispensável à resolução da controvérsia fazer um apanhado da jurisprudência do STJ sobre a possibilidade de corte administrativo do serviço de energia elétrica. 6. Com relação a débitos de consumo regular de energia elétrica, em que ocorre simples mora do consumidor, a jurisprudência do STJ está sedimentada no sentido de que é lícito o corte administrativo do serviço, se houver aviso prévio da suspensão. A propósito: REsp 363.943/MG, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, Primeira Seção, DJ 1º.3.2004, p. 119; EREsp 302.620/SP, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Franciulli Netto, Primeira Seção, DJ 3.4.2006, p. 207; REsp 772.486/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ 6.3.2006, p. 225; AgRg no Ag 1.320.867/RJ, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 19.6.2017; e AgRg no AREsp 817.879/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 12.2.2016. 7. Quanto a débitos pretéritos, sem discussão específica ou vinculação exclusiva à responsabilidade atribuível ao consumidor pela recuperação de consumo (fraude no medidor), há diversos precedentes no STJ que estipulam a tese genérica de impossibilidade de corte do serviço: EREsp 1.069.215/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 1º.2.2011; EAg 1.050.470/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 14.9.2010; REsp 772.486/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ 6.3.2006, p. 225; AgRg nos EDcl no AREsp 107.900/RS, Rel. Ministro Ari Pargendler, Primeira Turma, DJe 18.3.2013; AgRg no REsp 1.381.468/RN, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 14.8.2013; AgRg no REsp 1.536.047/GO, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 15.9.2015; AgRg no AREsp 273.005/ES, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 26.3.2013; AgRg no AREsp 257.749/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 8.2.2013; AgRg no AREsp 462.325/RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 15.4.2014; AgRg no AREsp 569.843/PE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 11.11.2015; AgRg no AREsp 484.166/RS, Rel. Ministro Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 8.5.2014; EDcl no AgRg no AREsp 58.249/PE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 25.4.2013; AgRg no AREsp 360.286/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 11.9.2013; AgRg no AREsp 360.181/PE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 26.9.2013; AgRg no AREsp 331.472/PE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 13.9.2013; AgRg no AREsp 300.270/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 24.9.2015; AgRg no REsp 1.261.303/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 19.8.2013; EDcl no REsp 1.339.514/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 5.3.2013; AgRg no AREsp 344.523/PE, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 14.10.2013; AgRg no AREsp 470/RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 4.10.2011; e AgRg no Ag 962.237/RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 27.3.2008. CORTE ADMINISTRATIVO POR FRAUDE NO MEDIDOR 8. Relativamente aos casos de fraude do medidor pelo consumidor, a jurisprudência do STJ veda o corte quando o ilícito for aferido unilateralmente pela concessionária. A contrario sensu, é possível a suspensão do serviço se o débito pretérito por fraude do medidor cometida pelo consumidor for apurado de forma a proporcionar o contraditório e a ampla defesa. Nesse sentido: AgRg no AREsp 412.849/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 10.12.2013; AgRg no AREsp 370.548/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 4.10.2013; AgRg no REsp 1.465.076/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 9.3.2016; REsp 1.310.260/RS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 28.9.2017; AgRg no AREsp 187.037/PE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 8.10.2012; AgRg no AREsp 332.891/PE, Relator Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13.8.2013; AgRg no AREsp 357.553/PE, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 26.11.2014; AgRg no AREsp 551.645/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 3.10.2014; AgInt no AREsp 967.813/PR, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 8.3.2017; AgInt no REsp 1.473.448/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 1º.2.2017; AgRg no AREsp 345.130/PE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 10.10.2014; AgRg no AREsp 346.561/PE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 1º.4.2014; AgRg no AREsp 448.913/PE, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 3.9.2015; AgRg no AREsp 258.350/PE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 8.6.2016; AgRg no REsp 1.478.948/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 20.3.2015; AgRg no AREsp 159.109/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 18.4.2013; AgRg no AREsp 295.444/RS, Rel. Ministra Marga Tessler (Desembargadora Federal Convocada do TRF/4ª Região), Primeira Turma, DJe de 17.4.2015; AgRg no AREsp 322.763/PE, Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Federal Convocada do TRF/3ª Região), Segunda Turma, DJe 23.8.2016; e AgRg AREsp 243.389/PE, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 4.2.2013. RESOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA 9. Como demonstrado acima, em relação a débitos pretéritos mensurados por fraude do medidor de consumo causada pelo consumidor, a jurisprudência do STJ orienta-se no sentido do seu cabimento, desde que verificada com observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. 10. O não pagamento dos débitos por recuperação de efetivo consumo por fraude ao medidor enseja o corte do serviço, assim como acontece para o consumidor regular que deixa de pagar a conta mensal (mora), sem deixar de ser observada a natureza pessoal (não propter rem) da obrigação, conforme pacífica jurisprudência do STJ. 11. Todavia, incumbe à concessionária do serviço público observar rigorosamente os direitos ao contraditório e à ampla defesa do consumidor na apuração do débito, já que o entendimento do STJ repele a averiguação unilateral da dívida. 12. Além disso, o reconhecimento da possibilidade de corte de energia elétrica deve ter limite temporal de apuração retroativa, pois incumbe às concessionárias o dever não só de fornecer o serviço, mas também de fiscalizar adequada e periodicamente o sistema de controle de consumo. 13. Por conseguinte e à luz do princípio da razoabilidade, a suspensão administrativa do fornecimento do serviço - como instrumento de coação extrajudicial ao pagamento de parcelas pretéritas relativas à recuperação de consumo por fraude do medidor atribuível ao consumidor - deve ser possibilitada quando não forem pagos débitos relativos aos últimos 90 (noventa) dias da apuração da fraude, sem prejuízo do uso das vias judiciais ordinárias de cobrança. 14. Da mesma forma, deve ser fixado prazo razoável de, no máximo, 90 (noventa) dias, após o vencimento da fatura de recuperação de consumo, para que a concessionária possa suspender o serviço. TESE REPETITIVA 15. Para fins dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fica assim resolvida a controvérsia repetitiva: Na hipótese de débito estrito de recuperação de consumo efetivo por fraude no aparelho medidor atribuída ao consumidor, desde que apurado em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, é possível o corte administrativo do fornecimento do serviço de energia elétrica, mediante prévio aviso ao consumidor, pelo inadimplemento do consumo recuperado correspondente ao período de 90 (noventa) dias anterior à constatação da fraude, contanto que executado o corte em até 90 (noventa) dias após o vencimento do débito, sem prejuízo do direito de a concessionária utilizar os meios judiciais ordinários de cobrança da dívida, inclusive antecedente aos mencionados 90 (noventa) dias de retroação. RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 16. Na hipótese dos autos, o Tribunal Estadual declarou a ilegalidade do corte de energia por se lastrear em débitos não relacionados ao último mês de consumo. 17. Os débitos em litígio são concernentes à recuperação de consumo do valor de R$ 9.418,94 (nove mil, quatrocentos e dezoito reais e noventa e quatro centavos) por fraude constatada no aparelho medidor no período de cinco anos (15.12.2000 a 15.12.2005) anteriores à constatação, não sendo lícita a imposição de corte administrativo do serviço pela inadimplência de todo esse período, conforme os parâmetros estipulados no presente julgamento. 18. O pleito recursal relativo ao cálculo da recuperação de consumo não merece conhecimento por aplicação do óbice da Súmula 7/STJ. 19. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.” (REsp n. 1.412.433/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 25/4/2018, DJe de 28/9/2018.) (negrito nosso) No caso em exame, a própria apelante reconhece em suas razões recursais que "a prova de que tenha sido a recorrida quem adulterou o medidor é praticamente impossível", o que corrobora a fragilidade da imputação de responsabilidade à consumidora pelo pagamento dos valores cobrados a título de recuperação de consumo. 5. Da ilegalidade da suspensão do fornecimento por débitos pretéritos. Por outro lado, considerando que o serviço de fornecimento de energia elétrica é essencial, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que é ilegal a suspensão do fornecimento de energia elétrica em razão de débitos pretéritos, sendo admitida apenas em caso de inadimplemento de conta regular, relativa ao mês de consumo. Nesse sentido, foi editado o Tema 699 dos recursos repetitivos, já analisados acima. Assim, para que seja legítima a suspensão do fornecimento, é imprescindível que o débito decorra de efetiva fraude no medidor, apurada mediante procedimento regular e com observância do contraditório e da ampla defesa, o que, conforme já explanado, não restou suficientemente comprovado nos autos. A apelante alega que a suspensão do fornecimento de energia ocorreu em conformidade com o Tema 699 do STJ, por se referir aos 90 dias anteriores à constatação da irregularidade. Todavia, tal argumento não pode prosperar, pois o referido entendimento exige, como pressuposto inafastável, que a irregularidade tenha sido apurada em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, o que, como visto, não ocorreu no presente caso. 6. Da configuração do dano moral Ademais, conforme alegado pela apelada em suas contrarrazões (Id. 289084414), a suspensão do fornecimento de energia não se limitou a uma mera interrupção temporária, mas teria envolvido a retirada total do padrão e fios de energia da residência, mantendo a consumidora por três dias sem o fornecimento desse serviço essencial. Embora tal alegação tenha sido apresentada apenas em sede recursal, sem possibilidade de contraditório pleno ou comprovação nos autos (art. 1.014 do CPC), mesmo a simples interrupção do serviço essencial por débito pretérito já configura conduta desproporcional e abusiva por parte da concessionária, conforme entendimento consolidado no STJ. Nesse contexto, configurada a ilegalidade da cobrança e da suspensão do fornecimento de energia elétrica, é de se reconhecer o dano moral sofrido pela consumidora, cuja ocorrência, in casu, decorre do próprio fato (dano in re ipsa), dispensando-se a comprovação específica de prejuízo. Com efeito, a privação de serviço essencial como o fornecimento de energia elétrica caracteriza evidente abalo que ultrapassa o mero dissabor cotidiano, configurando efetivo dano moral passível de indenização. A situação se agrava quando considerada a essencialidade do serviço para a dignidade da pessoa humana, sendo a energia elétrica indispensável para a conservação de alimentos, higiene pessoal, segurança, iluminação, entre outras necessidades básicas. Quanto ao valor da indenização por danos morais, o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) fixado na sentença atende aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, considerando a gravidade da conduta da concessionária, o caráter essencial do serviço, o período de privação e a finalidade pedagógica da medida, não comportando, assim, qualquer redução. 7. Da aplicação da Lei nº 14.905/24 sobre atualização monetária e juros No tocante ao pedido de aplicação do índice de correção monetária e juros conforme a nova redação da Lei nº 14.905/24, cabe ressaltar que referida lei alterou substancialmente o art. 406 do Código Civil, estabelecendo que, a partir de sua vigência em 28 de agosto de 2024, os juros de mora, quando não convencionados, corresponderão à taxa referencial do Sistema de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o índice de atualização monetária (IPCA), conforme disposto no art. 406, §1º do Código Civil. Sendo norma de ordem pública atinente a critérios de atualização monetária e juros, aplica-se imediatamente aos processos em curso, sem prejuízo dos atos jurídicos perfeitos. Assim, quanto aos juros e correção monetária que fluem até 27 de agosto de 2024, aplicam-se os critérios anteriormente vigentes, com correção monetária pelo IPCA-E a partir do arbitramento da indenização, nos termos da Súmula 362 do STJ, e juros de mora de 1% ao mês, conforme art. 406 do CC na redação anterior, contados a partir da citação, por se tratar de responsabilidade contratual. Para o período a partir de 28 de agosto de 2024, aplica-se a taxa SELIC nos termos da nova legislação, que já engloba atualização monetária e juros moratórios, conforme entendimento consolidado pelo STJ no REsp 1.795.982/SP. Considerando que, no caso em tela, o fato gerador da condenação ocorreu anteriormente à vigência da Lei nº 14.905/24, deverá ser observada a regra de transição acima mencionada para a atualização do valor da condenação. Em síntese, diante do conjunto probatório constante nos autos e da aplicação da legislação e jurisprudência pertinentes, conclui-se que a sentença de primeiro grau não merece reforma quanto à declaração de inexistência dos débitos relacionados à recuperação de consumo e à condenação da concessionária ao pagamento de indenização por danos morais, devendo apenas ser ajustada a forma de atualização do valor da condenação, conforme acima explicitado. Dispositivo. Ante o exposto, conheço do recurso e DOU PARCIAL PROVIMENTO, somente para alterar a sentença quanto aos critérios de atualização monetária e juros de mora, em observância à Lei nº 14.905/24, determino que: (a) até 27 de agosto de 2024, a correção monetária incidirá pelo IPCA-E a partir do arbitramento da indenização, nos termos da Súmula 362/STJ, e os juros de mora à taxa de 1% ao mês a partir da citação, por se tratar de responsabilidade contratual; (b) a partir de 28 de agosto de 2024, incidirá exclusivamente a taxa SELIC, englobando tanto a correção monetária quanto os juros moratórios, conforme nova redação do art. 406, §1º do Código Civil. Inaplicável à hipótese a majoração prevista no art. 85, §11 do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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Processo nº 1000290-05.2025.8.11.0013

ID: 276763637

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA DE PONTES E LACERDA Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS Nº Processo: 1000290-05.2025.8.11.0013

Data de Disponibilização: 22/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ERICA DE PAULA OLIVEIRA

Intimação

Advogados:

RENAN CALDAS MARTINS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA DE PONTES E LACERDA SENTENÇA Processo: 1000290-05.2025.8.11.0013. Vistos. I – RELATÓRIO O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, no uso de suas at… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA DE PONTES E LACERDA SENTENÇA Processo: 1000290-05.2025.8.11.0013. Vistos. I – RELATÓRIO O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, no uso de suas atribuições constitucionais e em exercício nesta comarca ofereceu denúncia em desfavor de ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA, devidamente qualificada na denúncia, como incursa nas sanções do artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso VI, ambos da Lei nº 11.343/2006, pela prática da seguinte conduta delituosa (id. 182131225): Extrai-se do inquérito policial que, no dia 10 de janeiro de 2025, por volta das 18h15min, em residência particular, localizada na Avenida Minas Gerais, n.º 3052, Apartamento 01, Bairro Residencial Vera, Pontes e Lacerda/MT, Érica de Paula Oliveira, com consciência e vontade, juntamente com a adolescente Maryane Amaral dos Santos (17 anos de idade), guardavam / transportavam / mantinham em depósito / forneciam / vendiam drogas, para fins de traficância, sendo encontrado um total de 2.584,70 g (dois mil gramas quinhentos e oitenta e quatro gramas e setenta centigramas) de maconha, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar (Termo de Exibição e Apreensão, id. 181260279 e Laudo Pericial, id. 181260852). HISTÓRICO DOS FATOS Depreende-se do inquérito policial que, no dia 10 de janeiro de 2025, Érica de Paula Oliveira e a adolescente Maryane Amaral dos Santos (17 anos de idade) guardavam e tinham em depósito um total de 2.584,70 g (dois mil gramas quinhentos e oitenta e quatro gramas e setenta centigramas) de maconha, destinados ao tráfico de entorpecentes (venda, fornecimento, entrega e comercialização). Ocorre que, na data supracitada, uma equipe da Polícia Civil recebeu a denúncia de que, em um apartamento próximo à praça do Bairro Santo Antônio, uma mulher, juntamente com sua filha, estariam realizando tráfico de drogas. Neste diapasão, enquanto diligenciavam até o local com o intuito de localizar a suspeita, a guarnição avistou duas jovens (Nathalia Gabriely Oliveira Ferreira e Maryane Amaral dos Santos) próximo à praça que, ao avistarem os policiais, aparentaram nervosismo. Então, ante a fundada suspeita, os agentes da lei prosseguiram com a abordagem, sendo encontrado junto da menina posteriormente identificada como Maryane Amaral dos Santos, 01 (uma) porção considerável de maconha. Ato contínuo, após se negarem a dizer onde ficavam suas casas e serem encaminhadas até a delegacia, parte da equipe retornou até o local para tentar localizar a residência de elas teriam saído. Desse modo, ao retornarem ao local, os policiais visualizaram a denunciada Érica de Paula Oliveira saindo dos apartamentos e andando até o local onde as jovens estavam. A partir daí, realizaram a sua abordagem e disseram que a sua filha estava na Delegacia, ocasião em que a increpada jogou um aparelho celular no solo, por duas vezes, danificando-o. Por conta disso, ante a fundada suspeita, os policiais questionaram a increpada sobre a existência de substâncias ilícitas na residência, tendo ela confirmado. Desse modo, os policiais foram até a residência, onde a increpada indicou onde estariam os ilícitos, sendo encontrado diversas porções grandes de maconha, além de vários rolos de papel filme, uma balança de precisão e dinheiro em notas de pequeno valor. Assim, ante o estado de flagrância, foi dado voz de prisão a increpada Érica de Paula Oliveira, sendo conduzida até a delegacia de polícia para que fossem tomadas as providências pertinentes. A denúncia foi oferecida em 29 de janeiro de 2025 (id. 182131225). Notificado, a ré apresentou defesa prévia (id. 183516973). Houve o recebimento da denúncia, determinando-se o prosseguimento do feito, com designação de audiência de instrução e julgamento (id. 184217348). Em audiência de instrução realizou-se a oitiva das testemunhas/informantes Maryane Amaral dos Santos, Paulo Suady Ferreira Vieira, Regina Lídia Uliana de Souza, Rodrigo de Oliveira Mendonça, Nathalia Gabriely Oliveira Ferreira, Lucileide Gomes Silva e Clarissa dos Santos Moreira. Ao fim, procedeu-se ao interrogatório da ré. Na fase do artigo 402 do Código de Processo Penal, as partes nada requereram. O Ministério Público, em alegações finais orais, requereu a procedência total da ação, condenando-se a ré ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06. Outrossim, pontuou a necessidade da aplicação da majorante referente à participação do menor no crime. A defesa, também em alegações finais orais, requereu a aplicação da minorante do tráfico privilegiado, bem como reconhecimento da atenuante da confissão espontânea. Por fim, pugnou o afastamento da majorante do artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06. Após, os autos vieram conclusos. É o breve relatório. DECIDO. II – FUNDAMENTAÇÃO A) DAS QUESTÕES PRELIMINARES E PREJUDICIAIS DE MÉRITO Presentes as condições da ação e os pressupostos processuais de existência e validade, bem como inexistentes questões preliminares ou prejudiciais capazes de inviabilizar a análise do mérito da causa, além de não vislumbrar quaisquer nulidades que possam macular os atos e o processo como um todo, o presente caso merece um provimento jurisdicional de cunho material. B) DO MÉRITO Adentrando ao mérito da presente demanda, temos que a denúncia descreve a prática, por ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA, do delito tipificado no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso VI, ambos da Lei nº 11.343/06, o qual possui a seguinte descrição típica: Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: (...) VI - sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação; A materialidade delituosa encontra-se demonstrada pelo Auto de Prisão em Flagrante Delito (id. 181260276), Boletim de Ocorrência (id. 181260277), Termo de Exibição e Apreensão (id. 181260279), Laudo Pericial de Drogas (id. 181260852), e pelos depoimentos colhidos em sede policial e em audiência de instrução e julgamento. Inicialmente, acerca da pertinência da apreciação dos elementos informativos obtidos durante o inquérito policial, é hígida a jurisprudência: (...) o art. 155 do Código de Processo Penal preconiza estar vedada a condenação do réu fundada exclusivamente em elementos de informação colhidos durante o inquérito e não submetidos ao crivo do contraditório e da ampla defesa, ressalvadas as provas cautelares e não repetíveis. Entretanto, segundo reiterada jurisprudência desta Corte, em atendimento ao princípio da livre persuasão motivada, tais provas, desde que corroboradas por elementos de convicção produzidos na fase judicial, podem ser valoradas na formação do juízo condenatório, como ocorreu no caso concreto (...). (STJ, Agravo Regimental no Habeas Corpus, nº 342.690/RO, 5ª Turma, unânime, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 13/04/2021, publicado no DJ em 16/04/2021). Com efeito, tal conclusão afirma o próprio princípio do livre convencimento motivado, assente no artigo 155 do Código de Processo Penal. Quanto àquele, encontra-se o magistério de Eugênio Pacelli e Douglas Fischer: O processo penal já conheceu tempos obscuros ao longo da história. A complexidade da função judicante, de quem se espera e a quem se atribui o encargo de decidir questões de fato e de direito, por si só, já autorizaria a adoção de maiores cautelas para a formação do convencimento judicial. Houve tempo, aliás, em que, no afã de se controlar ao máximo os poderes do juiz, se chegou à estipulação de critérios formais – e objetivos – para a obtenção de uma decisão condenatória. Trata-se da chamada prova tarifada, na qual o juízo condenatório somente poderia ser obtido se atingido determinado número de provas. Cada uma delas (meios de prova) tinha valor previamente fixado no ordenamento, de tal modo que ao juiz não se reservava liberdade para o julgamento. (...) É livre o convencimento quando o juiz não se vê obrigado a fazer prevalecer um ou outro meio de prova, como se, previamente, houvesse uma definição quanto à superioridade de um deles. Não há, nesse sentido, uma hierarquia legal quanto aos meios de prova (PACELLI e FISCHER, Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência. 15ª ed. São Paulo: Juspodivm, 2023. p. 503). Com isto posto, torno aos depoimentos e interrogatórios obtidos em sede policial e audiência de instrução. Paulo Suady Ferreira Vieira, Investigador de Polícia Civil, quando ouvido em audiência de instrução e julgamento, relatou, em suma: de início, ressalta que possui um grande grupo de informantes na cidade de Pontes e Lacerda/MT, sendo que na data do fato recebeu a informação de que estaria ocorrendo tráfico de entorpecentes na praça; Os IPCs se deslocaram até o local e, quando estavam chegando próximo à praça, visualizaram duas mulheres, jovens, que ao avistar a viatura demonstraram nervosismo; Em que pese fosse uma viatura descaracterizada, ela é amplamente conhecida na cidade como pertencente à Polícia Civil; Diante do nervosismo e do fato de que havia uma policial mulher dentro da viatura, optaram pela abordagem; No início da abordagem, questionaram as duas jovens e a adolescente confirmou que trazia consigo entorpecente, sendo encontrada uma porção de maconha em sua posse; A partir daí, as jovens não quiseram mais responder às perguntas dos investigadores; Ambas foram conduzidas para a delegacia, e posteriormente o ora depoente e outros investigadores retornaram à praça; Lá estando, viram uma mulher quase no meio da rua com o telefone na mão, conversando; O ora depoente reconheceu que se tratava de ÉRICA; Aproximou-se dela com a viatura e se identificou como sendo da Polícia Civil; ÉRICA disse que estava procurando por sua filha, ao que foi informada de que a sua filha tinha sido conduzida à delegacia; Ato contínuo, ÉRICA destruiu seu aparelho celular atirando-o ao chão; Diante disso, desceram e fizeram a detenção de ÉRICA; Perguntaram-lhe se havia mais entorpecentes, ao que respondeu afirmativamente, esclarecendo que estavam na sua residência; Após serem levados até a casa de ÉRICA pela mesma, encontraram no interior da residência várias porções já divididas, inclusive com nomes de destinatários; O esposo de ÉRICA está preso; Foi feita a busca no local, sendo encontrado mais de 2,5 kg de entorpecente no local; Na sequência, ÉRICA foi encaminhada para a delegacia; A jovem que estava com a droga na primeira abordagem era a namorada da filha de ÉRICA; A denúncia inicial apenas se referia ao comércio de entorpecentes na praça em questão; Todavia, esclarece o depoente que já havia um informe no sentido de que ÉRICA estava realizando a distribuição de entorpecentes; Não se recorda de ÉRICA ter apresentado justificativas acerca do entorpecente; Os entorpecentes estavam de fácil acesso; Salvo engano, moravam no local ÉRICA e suas duas filhas; Foi encontrada uma balança de precisão e plástico insulfilm. Regina Lídia Uliana de Souza, Investigadora de Polícia Civil, quando ouvida em audiência de instrução e julgamento, relatou, em suma: obtiveram informação no sentido de que havia alguém comercializando drogas na praça; Trata-se de uma praça em que há bastante crianças na parte da tarde; Desse modo, enquanto faziam ronda pela praça, viram duas menores caminhando; Constatou certo nervosismo por parte de ambas, na medida em que a viatura se aproximava; Resolveram realizar a abordagem e questionou se havia algo de ilícito com elas; De pronto, uma das duas meninas disse que sim; Verificou o bolso traseiro da suspeita e encontrou uma porção considerável de substância análoga à maconha; Em revista na outra menina, não encontrou nada de ilícito; Foram para a delegacia para identificar as suspeitas e chamar os responsáveis; Nesse momento da abordagem, as meninas se negaram a informar quem seria o fornecedor da droga; Ambas as meninas, durante a abordagem, ficaram em silêncio; A ora depoente retornou para a delegacia com a menina, enquanto outros policiais permaneceram no local realizando diligências; De acordo com o que informaram no dia, os outros policiais conseguiram encontrar a mãe de uma das suspeitas — que estava buscando por ela na rua —, sendo feita a abordagem de ÉRICA próximo à residência, e na casa foram encontradas mais coisas; Quando abordaram as suspeitas, o fizeram na rua detrás da praça; Nessa altura, a praça tinha bastante crianças e mães brincando, visto que há um playground lá; Abordaram as meninas devido ao nervosismo que demonstraram com a aproximação da viatura (ficaram olhando para trás); Apenas Maryane confessou no momento estar em posse de entorpecente, enquanto a outra menina permaneceu em silêncio; Não participou da prisão em flagrante de ÉRICA em sua residência. Rodrigo de Oliveira Mendonça, Investigador de Polícia Civil, quando ouvido em audiência de instrução e julgamento, relatou, em suma: receberam uma denúncia de que estava ocorrendo tráfico de drogas na região próxima à pracinha; A equipe composta pelo ora depoente e outros investigadores foi até o local; Estavam chegando na região da praça quando notaram duas mulheres que passaram a demonstrar nervosismo; Optaram por abordar, sendo que a IPC Regina fez a revista e encontrou entorpecente; Feitas as perguntas de praxe, preferiram permanecer em silêncio; Conduziram as suspeitas à delegacia e a IPC Regina permaneceu lá com elas; Enquanto isso, o restante da equipe retornou ao local e, lá estando, avistaram uma senhora saindo de um apartamento em direção ao mesmo ponto em que as meninas foram abordadas; Ela estava mexendo no celular; O IPC Paulo a abordou, perguntando se estava procurando alguém; Ao saber que sua filha estava no CISC, a mulher jogou o celular no chão duas vezes; Então, desceram do veículo e contiveram a suspeita, a algemando, e colocaram-na na viatura; Questionando a suspeita, ela confirmou que havia drogas em sua casa; Disse ainda que tinha uma filha menor, de 10 (dez) anos, na casa; Diante disso, desalgemaram a vítima e entraram sem apontar armas; Em varredura nos cômodos da casa, viram plástico insulfilm e encontraram drogas no quarto; Toda a droga já estava envelopada e contendo o nome do destinário; Diante disso, conduziram a suspeita para a delegacia; Quando a IPC Regina abordou as duas meninas, já havia encontrado uma porção de droga no bolso de uma delas; Posteriormente, descobriram que das duas meninas, uma era filha de ÉRICA e a outra era sua namorada; Não possui certeza, mas aparentemente a droga em posse das meninas e a droga encontrada na residência de ÉRICA eram da mesma qualidade e natureza; O celular de ÉRICA sequer chegou a ser encaminhado para a perícia, haja vista que foi destruído pela mesma; Quando encontrado o entorpecente na casa de ÉRICA, ela não apresentou nenhuma justificativa; O IPC Paulo já conhecia a ora acusada devido a ser esposa de um detento de Pontes e Lacerda/MT; Chegaram à conclusão de que a ora acusada integra organização criminosa devido ao fato da droga estar separada e com os nomes dos destinatários, sendo todos eles integrantes do Comando Vermelho; O modus operandi da acusada é característico do recomendado pela facção criminosa, como quebrar o celular ao ser abordado, identificação de outros integrantes como destinatários das porções de droga. Maryane Amaral dos Santos, quando ouvida em audiência de instrução e julgamento na condição de informante, relatou, em suma: é namorada de Nathalia, e na época já iria completar um ano de namoro; Nathalia morava junto com a ora informante na casa dos pais dela; Saíram para a casa de ÉRICA por volta de 17h00min, ficando lá por pouco tempo; Saíram e voltaram, e então ÉRICA chegou; Depois de conversarem saíram para entregar “o negócio”, isto é, a droga; A droga era de Nathalia, sendo que pegaram na casa de ÉRICA e entregariam para uma outra pessoa; Quem pediu para fazer esta entrega foi a Nathalia; Buscaram a droga na casa de ÉRICA, que não sabia que estava lá; A droga estava dentro de uma máquina; Não verificou se havia outros entorpecentes na casa, visto que apenas ficou na sala da casa, e quem entrou no quarto foi Nathalia; Não lembra se Nathalia pegou a droga com ÉRICA já estando também na casa; Sabe que Nathalia vendeu a droga através de mensagens, mas não sabe informar se ela fazia isso costumeiramente; Nathalia usava drogas; ÉRICA trabalhava fazendo diária numa conveniência de um restaurante, com bastante frequência; Além de ÉRICA, moravam na casa as outras duas filhas dela, de 16 e 10 anos de idade; Não sabia se tinha uma balança de precisão na casa de ÉRICA; Não sabe como Nathalia adquiriu o entorpecente; ÉRICA não sabia da venda de drogas por parte de Nathalia; Nathalia e ÉRICA tinham uma boa relação; Pelo que sabe, ÉRICA desconhecia a circunstância de Nathalia ser usuária de drogas; A droga estava no bolso da ora informante, e não no de Nathalia; Geralmente, a ora informante e Nathalia iam visitar a casa de ÉRICA; No dia anterior aos fatos, haviam visitado. Nathalia Gabriely Oliveira Ferreira, quando ouvida em audiência de instrução e julgamento na condição de informante, relatou, em suma: é filha de ÉRICA; Na data dos fatos, morava com a sua sogra, sendo que estando na companhia de sua namorada, decidiram ir até a casa da genitora da ora informante; Não se recorda do horário; Acredita que sua mãe não estava em casa; Ficaram na casa de sua genitora até o início da noite, aguardando a chegada de ÉRICA; Conversaram um pouco e decidiram sair rumo à pracinha; Estavam “indo andar”; Quanto ao entorpecente, esclarece que estava consigo, todavia não esclarece se o pegou na casa de sua genitora ou já saiu em posse dele da casa de sua sogra; Entregou o entorpecente para sua namorada pois não tinha bolso; Tinha pego o entorpecente naquela data; Não se recorda onde pegou o entorpecente; Não sabe dizer se havia outro entorpecente na casa de sua genitora; Sobre o seu depoimento em delegacia, mais especificamente quanto a venda da droga na praça, não se recorda se esse era o motivo pelo qual estava na praça, visto que ficou muito nervosa; [...]; Sua mãe não lhe fez um pedido de que levassem a droga até um homem que estaria em um carro, tendo dito isso em delegacia por medo de ficar presa ou apanhar; Não viu a droga em outros lugares na casa de sua mãe; Sua mãe trabalhava no Posto Iguaçu; O entorpecente que trazia consigo na praça era seu, visto que é usuária; Sobre o entorpecente que foi encontrado na casa de sua mãe, esclarece que acredita que ÉRICA estava apenas o guardando; Justifica que o bairro era comandado pela facção criminosa Comando Vermelho, de forma que obriga pessoas a guardarem entorpecente; Tem uma boa relação com a sua mãe; Nunca usou entorpecente em frente à sua genitora; Atualmente reside sozinha, e sua namorada ajuda a pagar as despesas; Não esclarece as circunstâncias em que adquiriu a droga; Não usava drogas em frente de sua namorada, e não sabe se ela é usuária; Não iria usar droga na pracinha; Pagou aproximadamente R$ 1000,00 (mil reais) pela droga, com o dinheiro que recebia de sua mãe e como cuidadora de crianças. Clarissa dos Santos Moreira, quando ouvida em audiência de instrução e julgamento, relatou, em suma: morava na residência em frente à residência da ora acusada; ÉRICA morou cerca de 8 (oito) a 9 (nove) meses lá; A depoente era proprietária da casa em que ÉRICA morava; Nesse lapso temporal, não notou qualquer movimentação suspeita, indicativa de traficância; Quem a ora depoente via chegando na casa era a própria acusada e uma criança na faixa de 10 (dez) anos; Não notou a presença de Nathalia na casa; ÉRICA trabalhava em um mercado novo, próximo à praça; Nunca houve reclamações de vizinhos referente a entorpecentes; A única coisa que a ora depoente constatou é que ÉRICA fumava cigarro; Pelo que sabe da ora acusada como mãe, não tem nada que desabone sua conduta; Não estava presente quando da prisão da ora acusada, visto que nessa época ÉRICA já estava alugando uma outra casa; O aluguel da casa de ÉRICA era R$ 800,00 (oitocentos reais). Lucileide Gomes Silva, quando ouvida em audiência de instrução e julgamento, relatou na condição de informante, em suma: pelo que conhece da ré, é uma boa mãe e trabalhadora; Nunca soube que ÉRICA traficava ou tinha qualquer envolvimento com organização criminosa onde ela morava; É avó de um dos filhos de ÉRICA; Atualmente está com a guarda de Ketlyn, mas não possui condições de seguir na guarda dela; Não possui convivência com Nathalia, que é a outra filha de ÉRICA; Nunca ouviu sobre Nathalia traficar ou ser usuária; Visitava ÉRICA nas vezes em que ia ver a sua neta, na casa dela; Nunca notou nada suspeito; ÉRICA trabalhou num posto e também fazia faxina. Quando de seu interrogatório judicial, a ré ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA pontuou, em suma: a droga não era sua, pois lhe pediram para guardá-la, sendo que seria buscada no mesmo dia por volta de 22h00min; Foi obrigada a guardar a droga; Quem lhe obrigou foi o Comando Vermelho; O esposo da ora acusada está preso, de forma que “eles conseguem todas as nossas informações aqui fora”; Foi a primeira vez que guardou drogas; Havia recebido a droga por volta de 13h00min daquele dia, em uma mochila preta ou marrom; Do jeito que a mochila foi entregue, colocou-a atrás da porta do quarto; Não sabia que Nathalia iria visitá-la naquele dia, tendo aparecido de surpresa; Nunca usou drogas e ensinou seus filhos a não usarem drogas; O marido da ora acusada é faccionado, mas ela não; Nega que parte da droga estivesse dentro da mochila e outra parte sobre a cama, argumentando que foi o próprio policial que colocou ali para tirar foto; A respeito da balança de precisão, aduz “(...) tenho, não vou negar, porque eu sou mulher de preso”; Nunca mexeu com droga; A pessoa que deixou a droga na sua casa disse que ligaria e retornaria posteriormente; Nega ter entregado a droga para os adolescentes; Sempre deu dinheiro para as suas filhas; Nunca desconfiou que sua filha estava fazendo uso de entorpecentes; Não aceitou guardar o entorpecente, mas foi obrigada pelo Comando Vermelho; Temia, então, por seu marido e suas filhas; Acredita que o entorpecente encontrado com sua filha não era o mesmo que estava na casa; Quebrou o celular quando da sua prisão pois era o celular em que o Comando Vermelho iria lhe telefonar. Pois bem. Consta dos autos que em data de 10 de janeiro de 2025, por volta das 18h15min, em residência particular, sita à Avenida Minas Gerais, nº 3052, Apartamento 01, Bairro Residencial Vera, neste Município e Comarca de Pontes e Lacerda/MT, a ora acusada ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA, com consciência e vontade, juntamente com a adolescente Maryane Amaral dos Santos (17 anos de idade), guardavam/transportavam/mantinham em depósito/forneciam/vendiam drogas para fins de traficância, sendo encontrado um total de 2.584,70 g (dois mil gramas quinhentos e oitenta e quatro gramas e setenta centigramas) de maconha, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. De fato, exsurge do caderno inquisitivo e do teor das oitivas realizadas em audiência de instrução que a linha investigativa originou-se das informações repassadas anonimamente à Polícia Civil dando conta da traficância ocorrendo nas imediações da praça em que foram abordadas, inicialmente, as adolescentes Maryane Amaral dos Santos e Nathalia Gabriely Oliveira Ferreira, e posteriormente a ora acusada ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA. Nesta linha de raciocínio, verifica-se que na data de 10 de janeiro de 2025, por volta das 18h15min, os Investigadores de Polícia Civil Regina Lídia Uliana de Souza, Paulo Suady Ferreira Vieira e Rodrigo de Oliveira Mendonça encontravam-se patrulhando a aludida praça, constando que havia presença de crianças e genitores brincando por lá. Nas imediações da praça, visualizaram as ora informantes Nathalia Gabriely Oliveira Ferreira (filha da ré) e Maryane Amaral dos Santos (sua namorada). Ocorre que as menores de idade demonstraram acentuado nervosismo ao constatar a presença da polícia, o que justificou a abordagem. Em revista pessoal, a Investigadora de Polícia Civil Regina Lídia UIiana de Souza encontrou entorpecente no bolso de Maryane, sendo que ambas as menores optaram por permanecer em silêncio e foram conduzidas à Delegacia de Polícia, onde permaneceram na companhia da mencionada IPC. Após, os IPCs Paulo Suady Ferreira Vieira e Rodrigo de Oliveira Mendonça retornaram à praça, sendo que logo avistaram a ré ÉRICA andando no meio da rua e olhando para seu celular. Diante disso, fizeram contato e esclareceram que a sua filha encontrava-se na delegacia. Ato contínuo, ÉRICA lançou seu aparelho celular ao chão duas vezes, destruindo-o. Ao ser presa e questionada se possuía entorpecentes na sua residência, confirmou. Dentro da casa encontraram os policiais plástico insulfilm, uma balança de precisão e uma vultuosa quantia de substância análoga à maconha, perfazendo o montante de 2.504,70 g (dois mil gramas quinhentos e oitenta e quatro gramas e setenta centigramas). Em sede policial, a filha da ré e ora informante Nathalia Gabriely Oliveira Ferreira esclareceu que sua genitora havia lhe entregado o entorpecente para que o repassasse para uma terceira pessoa que estaria em um carro nas imediações da praça. Tal versão foi alterada quando de sua oitiva em Juízo — quando sustentou que o entorpecente lhe pertencia e havia trazido da casa de sua sogra —, todavia vem de encontro da dinâmica exposta pelos policiais ouvidos no feito e do próprio depoimento de sua namorada, a adolescente Maryane Amaral dos Santos. Derradeiramente, consta dos autos o interrogatório judicial de ÉRICA, em que, em suma, argumenta que o entorpecente realmente estava em sua residência, alegando coação moral irresistível, visto que foi obrigada a armazená-lo pela facção criminosa Comando Vermelho. Aduziu ainda que os apetrechos apreendidos em sua casa em nada se relacionam com a droga, e que destruiu seu próprio celular pois esse é o proceder determinado pela facção nesta situação. Em conclusão, mais razão há em entender-se conforme a versão apresentada pelos policiais civis ouvidos em Juízo, no sentido de que ÉRICA realmente estava armazenando e comercializando a droga por sua vontade livre, em consonância com os apetrechos encontrados na casa e com a narrativa inicial apresentada pelas adolescentes Nathalia e Maryane. Vale citar que na esteira da jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça — e, na mesma senda, o e. TJMT —, revela-se perfeitamente admissível a utilização de depoimentos dos policiais que participaram da ocorrência (inclusive em caso de flagrante), mormente corroborados pelas demais provas encartadas nos autos, sendo da defesa o ônus da comprovação da eventual parcialidade dos agentes. Veja-se: "O depoimento dos policiais prestado em Juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do réu, notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade dos agentes, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova" (AgRg no HC 672.359/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 28/06/2021). “PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 306 DA LEI N. 9503/96 (CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - CTB). CONDUZIR VEÍCULO AUTOMOTOR COM CAPACIDADE PSICOMOTORA ALTERADA EM RAZÃO DA INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL. 1) VIOLAÇÃO AO ARTIGO 207 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP. INOCORRÊNCIA. DEPOIMENTO TESTEMUNHAL DE POLICIAL QUE PARTICIPOU DO FLAGRANTE. 1.1) ÓBICE DO REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO, VEDADO CONFORME SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. 2) VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CPP. INOCORRËNCIA. ABSOLVIÇÃO. ÓBICE DO REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO, VEDADO CONFORME SÚMULA N. 7 DO STJ. 3) AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Segundo entendimento reiterado do Superior Tribunal de Justiça, os depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante são meio idôneo e suficiente para a formação do édito condenatório, quando em harmonia com as demais provas dos autos, e colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, como ocorreu na hipótese (AgRg no REsp 1771679/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, DJe 27/3/2019). (...) (STJ - AgRg no AREsp: 1317916 PR 2018/0153947-3, Relator: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 25/06/2019, QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/08/2019). APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO – CONDENAÇÃO –INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO – NÃO RECONHECIMENTO – DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS MILITARES - HARMONIA NO CONJUNTO PROBATÓRIO – ARESTO DO STJ – ENUNCIADO CRIMINAL Nº 8 DO TJMT – NÃO COMPROVAÇÃO DO FLAGRANTE FORJADO – ALEGAÇÃO ISOLADA – recurso desprovido. “Os depoimentos dos policiais, a respeito das funções que desempenham na qualidade de agentes públicos, possuem presunção de veracidade e os atos por eles praticados no exercício do cargo gozam de presunção de legitimidade, motivo pelo qual seus testemunhos constituem relevantes elementos probatórios.” (STJ, 00011028220198070014) “[...]Comprovado nos autos que o réu incorreu em uma das condutas do art. 33 da Lei 11.343/06, diante da prova oral colhida e demais circunstâncias que envolveram a ação delituosa, tais como a apreensão de grande quantidade de droga, impossível a absolvição. Os depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante são meio idôneos e suficientes para a formação do édito condenatório, quando em harmonia com as demais provas dos autos e colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.” (TJMT, N.U 1001782-65.2021.8.11.0015) Harmonia entre a prova material colhida na fase policial e as produzidas sob o contraditório judicial, sobretudo depoimento de policiais militares atuantes na prisão em flagrante. Não se reconhece o flagrante forjado diante da falta de lastro probatório ou, sequer, indícios de sua ocorrência. (TJ-MT 10005421820218110055 MT, Relator: MARCOS MACHADO, Data de Julgamento: 21/09/2021, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 27/09/2021) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. CONDENAÇÃO. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. TESTEMUNHO DOS POLICIAIS. VALOR PROBANTE. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. As instâncias ordinárias, soberanas na análise do material probatório da lide, entenderam comprovadas a autoria e a materialidade delitiva. Para que fosse possível a análise da pretensão absolutória, seria imprescindível o reexame dos elementos fáticos, o que não se admite na estreita via do habeas corpus, que possui rito célere e cognição sumária. 2. O pedido de absolvição por ausência de provas suficientes para sustentar a condenação implica no reexame aprofundado de todo o acervo fático- probatório, providência totalmente incompatível com os estreitos limites do habeas corpus ( AgRg no HC n. 650.949/RJ, Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, DJe 25/10/2021). 3. É pacífica a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que os depoimentos prestados por policiais têm valor probante, na medida em que seus atos são revestidos de fé pública, sobretudo quando se mostram coerentes [...] e ausentes quaisquer indícios de motivos pessoais para a incriminação injustificada do investigado, como na espécie. Precedentes. ( AgRg no AREsp n. 1.997.048/ES, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 21/2/2022). 4. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no HC: 716902 SP 2022/0001609-8, Data de Julgamento: 02/08/2022, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/08/2022) Em suma, não havendo margem para a negativa de sua autoria ou da materialidade delitiva, passa a acusada a sustentar uma versão de todo inverossímil. É infrutífera tentativa de afastar sua responsabilidade criminal, como já lecionava Nicola Framarino Dei Malatesta: O amor a si próprio, como motivo de suspeita contra o acusado, afirmando-se como interesse pessoal na causa, tem importância grandíssima no depoimento que ele faz em vantagem própria, sobre o próprio fato ou sobre o fato alheio excluindo o próprio. É este o motivo de suspeita que surge contra todas as desculpas, diretas ou indiretas, do acusado. (A Lógica das Provas em Matéria Criminal, Volume II, tradução de Waleska Girotto Silverberg, Editora Conan, 1995, p. 137). Feita esta exposição, cumpre debruçarmo-nos acerca de dois temas, quais sejam, a alegação de coação moral irresistível e a destruição do aparelho celular pela ré ÉRICA. Como ensina Cleber Masson (Direito Penal - Parte Geral - Vol. 1: art. 1º a 120. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025, p. 391), “Na coação moral, o coator, para alcançar o resultado ilícito desejado, ameaça o coagido, e este, por medo, realiza a conduta criminosa. Essa intimidação recai sobre sua vontade, viciando-a, de modo a retirar a exigência legal de agir de maneira diferente. Exclui-se a culpabilidade, em face da inexigibilidade de conduta diversa.” Prossegue o autor (op. cit., p. 391-392) elencando como requisitos da exculpante a) ameaça do coator, ou seja, a promessa de mal grave e iminente, o qual o coagido não é obrigado a suportar; b) inevitabilidade do perigo na posição em que se encontra o coagido; 3) caráter irresistível da ameaça; d) presença de ao menos três pessoas envolvidas (coator, coagido e vítima). In casu, não se constata, sequer, a comprovação — cujo ônus recai sobre a ré, a teor do art. 156, caput, do CPP —da existência de ameaça de mal grave e iminente, visto que a alegação de que foi forçada pelo Comando Vermelho a armazenar a droga encontra-se em desacordo com as provas constantes dos autos (p.ex. diante da localização de apetrechos para comercialização, entrega da droga para as menores, e fracionamento do entorpecente na residência), além de se tratar de alegação genérica. De mais a mais, deve-se atentar que, ainda que assim não fosse, não se pode admitir a inevitabilidade do perigo em casos tais, mormente seja de conhecimento comum que a segurança pública, dever do estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida através dos órgãos da polícia (ex. vi. art. 144, caput e incisos I a VI, da CF/88). Sob este prisma, queda-se inconteste que o Ministério Público satisfez a exigência de demonstração de autoria e materialidade delitivas, além da culpa da acusada, ao passo que esta mostrou-se incapaz de ilidir as provas apresentadas pela acusação. Aliás, tal conclusão deriva da própria regra geral de distribuição do ônus da prova prevista no artigo 156, caput, do Código de Processo Penal. Nesse sentido orienta-se a doutrina e a jurisprudência: O processo penal versa sobre fatos imputados ao réu pelo titular da ação penal. Contra os fatos alegados pelo autor da ação, que deduz a pretensão punitiva em juízo, por meio da denúncia ou da queixa, conforme o caso, é que se defenderá o acusado. Entretanto, somente poderão ser adotados na fundamentação das decisões os fatos que houverem sido efetivamente provados. As regras do ônus da prova visam determinar, em cada situação, a quem incumbe a produção de provas acerca de cada fato. Quanto a isso, a regra geral vigente entre nós é a do brocardo latino actori incumbit probatio, que em vernáculo se traduz no cânon segundo o qual cabe ao autor a prova do que alegar. O ônus probatório, portanto, representa um encargo que tem a parte de provar as suas alegações, buscando criar no juiz a convicção acerca da veracidade. Em regra, cabe ao acusador provar os elementos que compõe a imputação levada a juízo. (...) A regra mencionada, entretanto, não vige solitária. É complementada por outra, consubstanciada no dizer latino et reus in incipiendo fit actor, que se traduz na exigência de que o acusado demonstre os fatos que alegue com o fim de elidir a pretensão do autor. Sintetizando o que há em comum entre as duas regras, chega-se a uma terceira, segundo a qual a prova dos fatos alegados cabe a quem faz a alegação. A regra encontra-se consubstanciada no art. 156, caput, do Código de Processo penal. Assim, ao Ministério Público e ao querelante cabe a prova da autoria, da materialidade delitiva e também da culpa em sentido estrito, enquanto ao acusado cumprirá provar causa excludente de ilicitude, de culpabilidade, ou de punibilidade, por ele articulada, bem como eventual álibi. (MOUGENOT BONFIM, Edilson. Curso de Processo Penal. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2024, p. 289, destaquei). Na medida em que o art. 156, caput, 1ª parte, estabelece que a prova cabe àquele que afirma determinado ato, fato ou circunstância, não distinguindo acusação ou a defesa, infere-se que não é verdade o que é apregoado por alguns no sentido de que somente o autor da ação penal tenha esta incumbência. Tudo dependerá da natureza da alegação. Neste contexto, à acusação caberá provar a existência do fato imputado e sua autoria, a tipicidade da conduta, os elementos subjetivos de dolo ou culpa, a existência de circunstâncias agravantes e qualificadoras. Já à defesa, por outro lado, incumbirá a prova de eventuais causas excludentes de ilicitude, de culpabilidade e de tipicidade, circunstâncias atenuantes, minorantes e privilegiadoras que tenha alegado. (AVENA, Norberto. Processo Penal 15ª ed. Rio de Janeiro: Método, 2023, p. 445-446). APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – MEDICAMENTOS DE CONTROLE ESPECIAL – CONDENAÇÃO – RECURSO DA DEFESA – ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – IMPROCEDÊNCIA – CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO QUE DEMONSTRA A MATERIALIDADE E A AUTORIA DELITIVAS – DEFESA NÃO SE DESIMCUMBIU DO ÔNUS DE PROVAR A ALEGAÇÃO FEITA PARA EXIMIR A RESPONSABILIDADE DO RÉU – INCIDÊNCIA DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – INVIABILIDADE – NÃO PREENCHIMENTO CUMULATIVO DOS REQUISITOS LEGAIS EXIGIDOS – AÇÃO PENAL EM ANDAMENTO QUE DEMONSTRA A DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Não há falar em absolvição, quando comprovadas a materialidade e a autoria do delito de tráfico de drogas, haja vista que ficou demonstrado nos autos que o acusado era o proprietário dos medicamentos sujeitos a controle especial apreendidos nos correios, sem a devida autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal, a prova da alegação incumbirá a quem a fizer, de modo que a defesa não se desincumbiu do ônus de comprovar a alegação do réu de que terceiros teriam utilizados seus dados pessoais, inclusive bancários, para a prática delitiva, sem o seu conhecimento. Inviável a incidência da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 (tráfico privilegiado) quando as provas produzidas demonstrarem que o réu se dedica às atividades criminosas, uma vez que possui ação penal em andamento em seu desfavor pela prática do delito de associação para o tráfico de drogas, ainda que se refira a fato criminoso praticado posteriormente. (TJ-MT - APR: 00295077220158110042, Relator: PEDRO SAKAMOTO, Data de Julgamento: 25/04/2023, Segunda Câmara Criminal, Data de Publicação: 28/04/2023) Superada a controvérsia acima, deve-se atentar que a conduta da ré ÉRICA consistente em destruir o próprio aparelho celular que continha informações relevantes ao deslinde do processo penal — mormente a existência de conversas com integrantes da facção criminosa Comando Vermelho (como sustenta a própria ré em Juízo) —, configura a figura incriminadora disposta no artigo 347, parágrafo único, do Código Penal. Senão, vejamos. Realmente, importa observar que nenhum óbice há na classificação da infração penal de forma diversa à constante da denúncia — vale dizer, no caso concreto, enquadrando-se o fato já descrito na denúncia no art. 347, parágrafo único, do Código Penal —, porquanto configurada hipótese de emendatio libelli, conforme dispõe o artigo 383, caput, do Código de Processo Penal: “Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave.” A respeito: (...) 1. É lícito ao juiz alterar a tipificação jurídica da conduta do réu no momento da sentença, sem modificar os fatos descritos na denúncia, conforme a inteligência do art. 383 do CPP, sendo despicienda a abertura de prazo para aditamento (CPP, art. 384). 2. Não constitui ofensa ao princípio da correlação entre denúncia e sentença condenatória o ato do magistrado singular, nos termos do art. 383 do Código de Processo Penal, atribuir aos fatos descritos na peça acusatória definição jurídica diversa daquela proposta pelo órgão da acusação. (STJ, Agravo Regimental no Habeas Corpus nº 770.256-SP, 5ª Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 27/10/2022, publicado no DJ em 04/11/2022). Cumpre observar, todavia, que no Penal vigora o princípio do jura novit curia, isto é, o princípio da livre dicção do direito – o Juiz conhece o direito. Em outras palavras, vigora o princípio do narra mihi factum dabo tibi jus (narra-me o fato e te darei o direito). (...) Se a peça acusatória descrever o fato criminoso perfeitamente, mesmo tenha havido uma errada classificação da infração, não será obstáculo a que se profira sentença condenatória. Afinal de contas, o réu não se defende da capitulação do fato, mas sim deste (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 842). Como observa Guilherme de Souza Nucci (Código Penal Comentado. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2025, p. 1359), “ (...) “inovar” significa introduzir uma novidade. O objeto da conduta é coisa, lugar ou pessoa envolvida em processo judicial. Exige-se que a inovação tenha capacidade de enganar, constituindo efetivamente uma modificação no estado natural das coisas.”. Ainda, quanto ao elemento normativo do tipo, reconhece-se que “(...) “artificiosamente” significa usar um recurso engenhoso, malícia ou ardil.” (NUCCI, Guilherme de Souza, op. cit. p. 1360). Neste prisma, constata-se que ÉRICA efetivamente possuía o dolo específico do tipo consistente na vontade de induzir a erro o magistrado, eis que objetivava alterar a situação fática existente quando da prisão, excluindo os vestígios de seu envolvimento com a facção criminosa Comando Vermelho. Por fim, nem se argumente que tal conduta estaria respaldada pelo direito de não-autoincriminação da ré, visto, a uma, que inexistem direitos absolutos, e a duas, que a conduta da acusada efetivamente ofende o bem jurídico tutelado pela norma, qual seja, a administração da justiça. Encerrando a discussão de mérito, destaco que restou comprovado, conforme argumentação supra, que a ré realizou o crime de tráfico de drogas com envolvimento de duas adolescentes (Nathalia e Maryane), sendo uma delas sua própria filha, atribuindo-lhes diretamente a função de entrega do entorpecente para terceiro. Diante disso, deve incidir a majorante do artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06. Forte nestes argumentos, há de ser prolatado édito condenatório em desfavor da ora acusada ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA, eis que confirmada a prática dos delitos dispostos no artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso VI, ambos da Lei nº 11.343/2006, e artigo 347, § 1º, do Código Penal, na forma do artigo 69, caput, do mesmo diploma normativo. III – DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na denúncia, para CONDENAR a acusada ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA como incursa nas sanções do artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso VI, ambos da Lei nº 11.343/2006, e artigo 347, § 1º, do Código Penal, na forma do artigo 69, caput, do mesmo diploma normativo. Condeno ainda a acusada ao pagamento das custas processuais. IV – INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA Tráfico de drogas Art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 A) Circunstâncias judiciais De proêmio, há de ver-se que, tratando-se do delito de tráfico de drogas, “O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.” (art. 42, da Lei de Drogas). Deste modo, considerando a natureza e quantidade (mais de 2,5 kg) do entorpecente apreendido, valoro negativamente. Nesta toada: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – PLEITO DE REANÁLISE DA DOSIMETRIA DA PENA – REDUÇÃO DA PENA-BASE AO MÍNIMO LEGAL AO ARGUMENTO DE QUE A GRANDE QUANTIDADE DE DROGA INTEGRA O PRÓPRIO TIPO PENAL – INVIABILIDADE – CIRCUNSTÂNCIA PREPONDERANTE CONTIDA NO ARTIGO 42 DA LEI 11.343/2006 QUE POSSIBILITA A EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL – ALEGAÇÃO DE DESPROPORCIONALIDADE NO QUANTUM MAJORADO – IMPROCEDÊNCIA – PARÂMETRO ADEQUADO E PROPORCIONAL – RECURSO DESPROVIDO EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. A apreensão de aproximadamente 10 (dez) quilogramas de maconha constitui motivação idônea para justificar a fixação da pena-base acima do mínimo legal, nos termos do artigo 42 da Lei n. 11.343/2006. Conquanto a fixação da pena-base não se dê por critérios puramente objetivos e matemáticos, tampouco pela observância de valores previamente definidos em lei, admitindo-se, portanto, o exercício de discricionariedade da autoridade judiciária, deve o magistrado respeitar a razoabilidade entre o aumento operado e as circunstâncias valoradas negativamente. O aumento da pena-base em fração inferior a 1/6 (um sexto), fundamentado na quantidade expressiva de droga apreendida em poder do réu [aproximadamente 10kg], não se mostra desproporcional. (TJ-MT - APL: 00138068420178110015 MT, Relator: ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Data de Julgamento: 19/06/2018, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 21/06/2018) APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS –CONDENAÇÃO – APELO DEFENSIVO – REDUÇÃO DA PENA -BASE – DESCABIMENTO – PREPONDERÂNCIA DO ARTIGO 42 DA LEI ANTIDROGAS – QUANTIDADE E DIVERSIDADE DE DROGAS – AUMENTO DE APENAS UM ANO DE FORMA PROPORCIONAL E RAZOÁVEL – APLICAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂENA – FALTA DE INTERESSE RECURSAL – PRETENSÃO APLICADA PELO JUIZ SINGULAR – PENA INTERMEDIÁRIA REDIMENSIONADA AO MÍNIMO LEGAL – APLICAÇÃO DA BENESSE PREVISTA NO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI ANTIDROGAS – INVIABILIDADE – DEDICAÇÃO EXCLUSIVA AO TRÁFICO DE DROGAS – ABRANDAMENTO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA – DESCABIMENTO – REGIME MAIS GRAVOSO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO – INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 33, §§ 2º E 3º, CONCATENADO AO DISPOSTO NO ARTIGO 42 DA LEI ANTIDROGAS – OBSERVÂNCIA DA SÚMULA 719 DO STF – RECURSO DESPROVIDO. Conquanto a pena tenha sido recrudescida em um ano acima do mínimo cominado ao tipo penal, a apreensão de drogas de natureza diversa – 115g de cocaína e 17g de maconha – que, embora não seja exorbitante, também não é irrisória, justifica o acréscimo, porque observada a preponderância do disposto no artigo 42 da Lei n. 11.343/2006, além do que, na segunda fase dosimétrica, a reprimenda foi reconduzida ao mínimo legal, por força da atenuante da confissão espontânea. Conquanto o indivíduo seja primário e sem antecedentes criminais, bem como a quantidade de drogas não seja exorbitante, ele deixa de ser merecedor da benesse prevista no artigo 33, § 4º, da Lei Antidrogas, porque vinha se dedicando há tempos à traficância, como único meio de vida. A identificação do regime inicial para o cumprimento da pena deve observar os critérios do artigo 33, §§ 2º e 3º do Código Penal, bem como do artigo 42 da Lei 11.343/2006, quando se tratar de delitos previstos nessa Lei, de modo que, conquanto as penas fixadas não ultrapassem o limite de oito anos de reclusão (art. 33, § 2º, b, CP), a apreensão de considerável quantidade de drogas de natureza diversa, como circunstância judicial desfavorável, e a dedicação exclusiva ao tráfico de drogas, são fatores preponderantes e autorizam o regime inicial de cumprimento de pena mais gravoso. (TJ-MT 10005601920228110018 MT, Relator: PEDRO SAKAMOTO, Data de Julgamento: 25/10/2022, Segunda Câmara Criminal, Data de Publicação: 28/10/2022) Quanto à culpabilidade, o grau de censura da conduta perpetrada é acentuado, haja vista a quantidade da droga, todavia, tal já foi valorado à luz do artigo 42 da Lei de Drogas. A acusada não possui antecedentes criminais passíveis de valoração negativa. Não há elementos suficientes nos autos para aferir a conduta social da ré nem sua personalidade. Quanto aos motivos do crime, em que pese reprováveis, são ordinários à espécie. As circunstâncias assumiram caráter relevante, mas serão analisadas quando da 3ª fase de dosimetria. No que tange às consequências do crime, tampouco fogem à órbita natural do delito. Não há que analisar-se o comportamento da vítima na presente hipótese. Diante do exposto, sopesando-se as diretrizes estabelecidas no art. 42, da Lei de Drogas e no artigo 59 do Código Penal, diante da quantidade e qualidade da droga, circunstâncias judiciais negativas, utilizando-se do intervalo entre a pena mínima e a pena máxima, fixo a pena-base em 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. B) Agravantes e/ou Atenuantes Ausentes agravantes ou atenuantes aplicáveis à hipótese, já que a ré não confessou a conduta do tráfico, justificando-a com uma alegação de causa excludente de culpabilidade, não merece ser reconhecida, pois trataria-se no máximo de uma confissão parcial/qualificada, que não vendo sendo aceita como atenuante de pena, conforme HC 213573 AgR – STF e STF, Ag. Reg. No Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 190.420/ES, Relª. Minª. Rosa Weber, 1ª Turma, j. 29/03/2021. Assim sendo, fica a pena-intermediária no patamar de 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. C) Causas especiais de aumento e/ou diminuição de pena Presente a majorante do artigo 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, conforme exposto anteriormente. Quanto ao cabimento do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006), resta obstado diante da exigência de não dedicar-se à atividades criminosas, haja vista que a elevada quantia de entorpecente e o envolvimento com facção criminosa afastam a benesse. Destarte, aumento a pena de 1/4 (um quarto) sobre o intervalo da pena mínima e pena máxima, justificando esse patamar de aumento pela adolescente tratar-se da namorada da própria filha da ré, envolvendo contexto familiar, e assim queda-se a pena final para o delito em 09 (nove) anos, 2 (dois) meses de reclusão, e 1.350 (mil, trezentos e cinquenta) dias-multa. Fraude processual Art. 347, parágrafo único, do Código Penal A) Circunstâncias judiciais Quanto à culpabilidade, o grau de censura da conduta perpetrada é ordinário. A acusada não possui antecedentes criminais passíveis de valoração negativa. Não há elementos suficientes nos autos para aferir a conduta social do réu nem sua personalidade. Quanto aos motivos do crime, em que pese reprováveis, são ordinários à espécie. As circunstâncias não assumiram caráter relevante. No que tange às consequências do crime, tampouco fogem à órbita natural do delito. Não há que analisar-se o comportamento da vítima na presente hipótese. Diante do exposto, sopesando-se as diretrizes estabelecidas no artigo 59 do Código Penal, considerando a existência de 1 (uma) circunstância judicial negativa, fixo a pena-base em 3 (três) meses de detenção, e 10 (dez) dias-multa. B) Agravantes e/ou Atenuantes Ausentes agravantes ou atenuantes aplicáveis à hipótese. Assim sendo, fica a pena-intermediária no patamar de 3 (três) meses de detenção, e 10 (dez) dias-multa. C) Causas especiais de aumento e/ou diminuição de pena Incide a majorante do parágrafo único do art. 347 do CP. Destarte, queda-se a pena final para o delito em 6 (seis) meses de detenção e 20 (vinte) dias-multa. D) Da pena definitiva Não havendo outros elementos ensejadores de aumento ou diminuição da pena, fica o réu condenado definitivamente à pena de 09 (nove) anos, 2 (dois) meses de reclusão, e 1.350 (mil, trezentos e cinquenta) dias-multa e 6 (seis) meses de detenção e 20 (vinte) dias-multa. Fixo para cada dia-multa o montante equivalente a 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos. E) Regime Inicial A ré deverá cumprir a sanção privativa de liberdade em REGIME FECHADO, conforme dispõe a redação conferida pelo artigo 33, § 2º, alínea “a”, e § 3º, do Código Penal, face ao quantum de pena aplicado e à reincidência. Deixo de realizar a detração penal, pois não terá o condão de alterar o regime inicial de pena. F) Substituição da pena e suspensão condicional da pena privativa de liberdade Mostra-se incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, ante ao quantum de pena aplicado (art. 44, inc. I, do Código Penal). Pelo mesmo motivo, mostra-se prejudicada a suspensão condicional da pena, nos termos do artigo 77, caput, do Código Penal. G) Da custódia cautelar Considerando-se que a ré ÉRICA DE PAULA OLIVEIRA, durante todo o lapso temporal em que respondeu ao feito, o fez segregada cautelarmente, não advindo qualquer alteração fático-jurídica a ensejar sua soltura, e sendo condenado na presente sentença ao cumprimento de pena privativa de liberdade em regime fechado, há que permanecer presa preventivamente, ressalvada a cláusula rebus sic stantibus (CPP, art. 316, caput). H) Da reparação dos danos No caso em análise, não houve durante a instrução processual requerimentos ou debates específicos acerca do valor mínimo a ser fixado a título de indenização civil, por esse motivo, deixo de fixá-la. V – DAS DISPOSIÇÕES FINAIS Condeno a ré, ainda, ao pagamento das custas processuais (art. 804, do CPP), a serem apuradas após o trânsito em julgado da sentença, haja vista a não comprovação, nos presentes autos, da condição de hipossuficiência. Quanto à intimação do réu, aplica-se o disposto no Provimento n. 4/2025 da Corregedoria- Geral de Justiça deste Estado: "Art. 369. (....) §2º Deverão ser intimados da sentença condenatória, necessariamente, o Ministério Público e a Defesa Técnica, correndo o prazo processual do último ato, observadas as regras do art. 392 do Código de Processo Penal: I – A intimação da pessoa condenada criminalmente ocorrerá pessoalmente apenas quando estiver privada de liberdade; II – Em caso de acusado solto, bastará a intimação de sua Defesa Técnica, sendo ela pública, constituída ou dativa”. Transitada em julgado a presente sentença: a. Providencie-se a liquidação das custas processuais, intimando-se o réu para pagá-las no prazo legal; b. Oficie-se ao Egrégio Tribunal Regional Eleitoral em razão da suspensão dos direitos políticos do apenado enquanto durarem todos os efeitos desta sentença, tal como disposto no artigo 15, inciso III, da Constituição Federal, e no enunciado da Súmula n. 09 do Tribunal Superior Eleitoral. c. Cumpra-se, no que aplicáveis, as disposições contidas no Código de Normas. d. Diligências necessárias. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Oportunamente, arquivem-se. Pontes e Lacerda/MT, 16 de maio de 2025. Djéssica Giseli Küntzer Juíza de Direito

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Cosma Do Brasil Produtos E Servicos Automotivos Ltda. x Deivid Aresi Negrini e outros

ID: 314856102

Tribunal: TST Órgão: 3ª Turma Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA Nº Processo: 0020251-63.2023.5.04.0271

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA.

Polo Passivo:

DEIVID ARESI NEGRINI TOP GUARDA SEGURANCA PATRIMONIAL LTDA

Acórdão

Advogados:

THIAGO TORRES GUEDES

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LUCIELI BREDA

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MARCELO MAC DONALD REIS

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TISSIANO DA ROCHA JOBIM

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

VERA LUCIA DE VASCONCELLOS BOLZAN

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 3ª TURMA Relator: ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ag AIRR 0020251-63.2023.5.04.0271 AGRAVANTE: COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AU… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 3ª TURMA Relator: ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ag AIRR 0020251-63.2023.5.04.0271 AGRAVANTE: COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA. AGRAVADO: DEIVID ARESI NEGRINI E OUTROS (1) Poder Judiciário Justiça do Trabalho Tribunal Superior do Trabalho PROCESSO Nº TST-Ag-AIRR - 0020251-63.2023.5.04.0271 A C Ó R D Ã O 3ª Turma GMABB/ra/ AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA PRIVADA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST. Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida (Súmula 422, I, do TST). Na espécie, a parte não impugnou o fundamento nuclear da decisão agravada, consistente no óbice da Súmula 126 do TST. Agravo de que não se conhece. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES CONSTANTES NA INICIAL. 1. Pretensão recursal para limitar a condenação aos valores mencionados na exordial. 2. Esta e. Corte, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 3. Decisão Regional em conformidade com este entendimento. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº TST-Ag-AIRR - 0020251-63.2023.5.04.0271, em que é AGRAVANTE COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA. e são AGRAVADOS DEIVID ARESI NEGRINI e TOP GUARDA SEGURANCA PATRIMONIAL LTDA. A parte reclamada interpõe agravo em face da decisão monocrática proferida pelo Relator, em que se negou seguimento ao agravo de instrumento. Contraminuta não apresentada. É o relatório. V O T O 1. CONHECIMENTO Por meio de decisão monocrática, foi negado seguimento ao agravo de instrumento, mediante os fundamentos a seguir reproduzidos: I - RELATÓRIO Trata-se de agravo(s) de instrumento interposto(s) em face da decisão que negou seguimento ao(s) recurso(s) de revista. É o relatório. II - FUNDAMENTAÇÃO Observados os requisitos extrínsecos de admissibilidade recursal, CONHEÇO. Este é o conteúdo da decisão agravada, por meio da qual foi denegado seguimento ao(s) recurso(s) de revista: PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Superada a apreciação dos pressupostos extrínsecos, passo à análise do recurso. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Valor da Causa. Alegação(ões): -violação do(s) art(s).840, §1º, da CLT e 492 do CPC. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Não admito o recurso de revista noitem. A atual, iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho está consolidada no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados na petição inicial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante, independentemente da existência de ressalva na petição inicial indicando que o valores atribuídos aos pedidos têm caráter estimativo, como se observa: EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. (...) 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado , não havendo limitação da condenação àquele montante. (...) 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos. (sublinhei, TST-Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Rel. Min. Alberto Bastos Balazeiro, SBDI-I, DEJT 07/12/2023). Nesse mesmo sentido, as seguintes decisões proferidas pelas C. Turmas do TST: Ag-AIRR-11336-76.2019.5.15.0071, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 06/10/2023; RRAg-8-81.2021.5.12.0001, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 06/10/2023; RRAg-1000435-10.2019.5.02.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 06/10/2023; RR-1001021-41.2021.5.02.0401, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado Jose Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 13/10/2023; e RR-20647-73.2019.5.04.0661, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 06/10/2023. Desse modo, se o ajuizamento se deu após a vigência da Lei 13.467/17, independentemente da existência de ressalva expressa, os valores atribuídos aos pedidos formulados na petição inicial são meramente estimativos. Assim, estando a decisão recorrida em consonância com a atual, iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, tem-se por inviável o seguimento do recurso de revista, ante o disposto no § 7º do art. 896 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.015/2014, e na Súmula 333 do TST. Nego seguimento ao recurso quanto ao item "Limites da condenação. Valores descritos na peça inaugural. Violação do §1º do art. 840 da CLT". Responsabilidade Solidária / Subsidiária / Tomador de Serviços / Terceirização. Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Multa do Artigo 467 da CLT. Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Multa do Artigo 477 da CLT. Contrato Individual de Trabalho / CTPS / Anotação / Baixa / Retificação. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Penalidades Processuais / Multa por Descumprimento de Ordem Judicial. Contrato Individual de Trabalho / FGTS. Alegação(ões): - contrariedade à(s) Súmula(s) 331 do Tribunal Superior do Trabalho. - violaçãodo(s)art(s).5º, II,da Constituição Federal. -violação do(s) art(s).884 do CC, 4º-A da Lei nº 6.019/74. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Não admito o recurso de revista no item. A decisão recorrida é expressa ao consignar a recorrente como tomadora dos serviços prestados pelo autor. Para se chegar a conclusão diversa, na forma pretendida pela parte, seria necessário o reexame de fatos e provas, o que é obstado, em sede de recurso de revista, pelo entendimento vertido na Súmula 126 do TST. Ademais, a decisão recorrida está em conformidade com a Súmula 331, IV e VI, do TST, o que inviabiliza o seguimento do recurso de revista, inclusive por dissenso jurisprudencial (§ 7º do art. 896 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.015/2014,e Súmula 333 da aludida Corte Superior), tampouco permitindo verificar afronta aos dispositivos invocados. Inviável o exame de admissibilidade do recurso de revista quando a decisão, quanto à anotação da CPTS e à multa diária pelo descumprimento, já que foi atendido o postulado pela parte recorrente. Quanto ao FGTS, a parte apenas discorre acerca das razões de sua insurgência e propugna a reforma da decisão. Não traz aresto para confronto, não indica dispositivo legal ou constitucional que entenda violado, tampouco aponta contrariedade a Orientação Jurisprudencial de Seção de Dissídios Individuais ou a Súmula do TST e, ainda, contrariedade a Súmula Vinculante do STF. A ausência de situação prevista no art. 896 da CLT obsta o prosseguimento do recurso de revista. CONCLUSÃO Nego seguimento. De início, saliento que deixo de examinar eventual transcendência da causa, em respeito aos princípios da economia, celeridade e razoável duração do processo, bem como em razão da ausência de prejuízo para as partes, notadamente após a declaração de inconstitucionalidade do art. 896-A, § 5º, da CLT pelo Tribunal Pleno do TST no julgamento da ArgInc-1000845-52.2016.5.02.0461, ocasião em que se restou assentado que toda e qualquer decisão do Relator que julga agravo de instrumento comporta agravo interno para a respectiva Turma, independentemente de seu fundamento ser, ou não, a ausência de transcendência. Nas razões recursais, alega-se que o(s) recurso(s) de revista comportaria(m) trânsito, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade extrínsecos e os intrínsecos previstos no art. 896 da CLT. Todavia, do percuciente cotejo das razões recursais com o acórdão do Tribunal Regional, não resultou evidenciado o desacerto da decisão agravada, que merece ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, ora incorporados. O exame de admissibilidade efetuado pelo Tribunal de origem, a teor do art. 896, § 1º, da CLT, importa em exame minucioso dos requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso de revista, de modo que inexiste óbice a prestigiar a fundamentação ali adotada, quando convergente com o entendimento deste juízo ad quem, como na espécie. Nesse agir, a prestação jurisdicional atende, simultaneamente e de forma compatibilizada, a garantia da fundamentação das decisões (art. 93, IX, da Constituição) e o respeito à razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da mesma Carta), além de em nada atentar contra os postulados constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV). Ressalte-se, no exame AI-QO nº 791.292-PE (Precedente em repercussão geral) o Supremo Tribunal Federal concluiu suficientemente fundamentada a decisão que "endossou os fundamentos do despacho de inadmissibilidade do recurso de revista, integrando-os ao julgamento do agravo de instrumento" (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe – 13/08/2010), uma vez que a excepcional fundamentação per relationem se justifica em virtude do devido enfrentamento, pelo juízo primeiro de admissibilidade, dos argumentos deduzidos no recurso. Nesse sentido, inclusive, é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Inexiste violação do art. 93, IX, da Constituição Federal. A jurisprudência desta Suprema Corte é no sentido de que o referido dispositivo exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento. Enfrentadas todas as causas de pedir veiculadas pela parte, capazes de, em tese, influenciar o resultado da demanda, fica dispensado o exame detalhado de cada argumento suscitado, considerada a compatibilidade entre o que alegado e o entendimento fixado pelo órgão julgador. 2. Este Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência consolidada quanto à regularidade da fundamentação per relationem como técnica de motivação das decisões judiciais. Precedentes. 3. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 4. A teor do art. 85, § 11, do CPC, o “tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”. 5. Agravo interno conhecido e não provido. (RE 1397056 ED-AgR, Relator(a): ROSA WEBER (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 13/03/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 27-03-2023 PUBLIC 28-03-2023) Anote-se que não se trata da mera invocação de motivos hábeis a justificar qualquer decisão ou do não enfrentamento dos argumentos da parte (incisos III e IV do art. 489, § 1º, do CPC/2015), mas de análise jurídica ora efetuada por este Relator, que, no caso concreto, adota a conclusão da decisão agravada quanto à insuficiência dos argumentos da parte para demonstrar algum dos requisitos inscritos no art. 896 da CLT. Nessa esteira, inclusive, é a jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça, órgão judicial precípuo para a interpretação da legislação processual comum infraconstitucional: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. 1. Inexiste ofensa aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022, II, do CPC/2015 quando o Tribunal de origem se manifesta de modo fundamentado acerca das questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, porquanto julgamento desfavorável ao interesse da parte não se confunde com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 2. Esta Corte admite a adoção da fundamentação per relationem, hipótese em que o ato decisório se reporta a outra decisão ou manifestação existente nos autos e as adota como razão de decidir. Precedentes do STJ e do STF. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 2.029.485/MA, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 19/4/2023.) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. AÇÃO CONDENATÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. TRANSCRIÇÃO DE TRECHOS DA SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. OMISSÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. PARÂMETROS FIXADOS EM TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. ERRO DE CÁLCULO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7, STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Não se verifica a alegada violação do art. 1.022 do CPC/2015, na medida em que a eg. Corte de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas. De fato, embora não tenha examinado individualmente cada um dos argumentos suscitados pela parte, adotou fundamentação suficiente, decidindo integralmente a controvérsia. Precedentes. 2. Nos termos do entendimento jurisprudencial adotado por este Superior Tribunal de Justiça, é admitido ao Tribunal de origem, no julgamento da apelação, utilizar, como razões de decidir, os fundamentos delineados na sentença (fundamentação per relationem), medida que não implica negativa de prestação jurisdicional, não gerando nulidade do acórdão, seja por inexistência de omissão seja por não caracterizar deficiência na fundamentação. Precedentes. (...) 5. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 2.122.110/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 24/4/2023.) Não destoa desse entendimento este Tribunal Superior do Trabalho, conforme se infere dos seguintes julgados da 3ª Turma: "A) AGRAVO DE INSTRUMENTO. INSTRUÇÃO NORMATIVA 40/TST. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. HORAS EXTRAS. INVALIDADE DO SISTEMA DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA. BANCO DE HORAS. NÃO CONFIGURAÇÃO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 126/TST. MOTIVAÇÃO POR ADOÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. TÉCNICA PER RELATIONEM. A decisão regional fica mantida por seus próprios fundamentos, registrando-se que a motivação por adoção dos fundamentos da decisão recorrida não se traduz em omissão no julgado ou em negativa de prestação jurisdicional - até mesmo porque transcritos integralmente. Isso porque a fundamentação utilizada pela instância ordinária se incorpora à decisão proferida pela Corte revisora - e, portanto, a análise dos fatos e das provas, bem como do enquadramento jurídico a eles conferido. Dessa forma, considerando-se que o convencimento exposto na decisão recorrida é suficiente para definição da matéria discutida em Juízo, com enfrentamento efetivo dos argumentos articulados pela Parte Recorrente, torna-se viável a incorporação formal dessa decisão por referência. Ou seja, se a decisão regional contém fundamentação suficiente - com exame completo e adequado dos fatos discutidos na lide e expressa referência às regras jurídicas que regem as matérias debatidas -, a adoção dos motivos que compõem esse julgamento não implica inobservância aos arts. 93, IX, da CF/88; e 489, II, do CPC/2015. Assim, a prolação de julgamentos pela técnica da motivação relacional não viola os princípios e garantias constitucionais do devido processo legal (art. 5º, LIV), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV), além de preservar o direito à razoável celeridade da tramitação processual (art. 5º, LXXVIII). Revela-se, na prática, como ferramenta apropriada de racionalização da atividade jurisdicional. Nesse sentido, inclusive, posiciona-se a jurisprudência desta Corte Superior e do STF, segundo a qual a confirmação integral da decisão agravada não implica ausência de fundamentação, não eliminando o direito da parte de submeter sua irresignação ao exame da instância revisora. Agravo de instrumento desprovido. (...) (RRAg-10166-30.2021.5.15.0029, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 30/06/2023). "AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. NULIDADE DA DECISÃO AGRAVADA. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM . A fundamentação per relationem não importa em ofensa à garantia da fundamentação dos julgados, servindo, ao revés, de homenagem aos princípios da celeridade e da duração razoável do processo. Diante da ausência de comprovação dos requisitos intrínsecos de admissibilidade do recurso de revista (art. 896 da CLT), não se cogita de reforma da decisão que negou provimento ao agravo de instrumento. Agravo a que se nega provimento" (Ag-AIRR-1000163-07.2020.5.02.0090, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 28/04/2023). Em igual sentido colhem-se recentes julgados de todas as demais Turmas do TST: Ag-AIRR-488-25.2021.5.09.0007, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 13/06/2023; Ag-AIRR-10959-26.2018.5.18.0211, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-11355-09.2020.5.15.0084, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-1178-65.2019.5.22.0006, 5ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-1000562-31.2019.5.02.0006, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado José Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 19/05/2023; Ag-AIRR-498-82.2017.5.09.0242, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 30/06/2023; Ag-AIRR-120700-09.2006.5.02.0262, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 29/05/2023. Frise-se, ainda, que a disposição contida no art. 1.021, § 3º, do CPC/2015 se dirige ao agravo interno e, não, ao agravo de instrumento. Note-se, por fim, que a presente técnica de decisão, por si só, em nada obstaculiza o acesso da parte agravante aos demais graus de jurisdição. Nesse contexto, observado que os recursos de revista efetivamente não comportam trânsito, ante o não preenchimento dos requisitos de admissibilidade, impõe-se NEGAR PROVIMENTO ao(s) agravo(s) de instrumento. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 118, X, do Regimento Interno do TST, CONHEÇO do(s) agravo(s) de instrumento e, no mérito, NEGO-LHE(S) PROVIMENTO. Na minuta de agravo, devolvem-se a este Tribunal as insurgências concernentes aos tópicos "responsabilidade subsidiária” e “limitação da condenação ao valor dado à causa” em que a parte reclamada insiste no processamento do recurso de revista. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA PRIVADA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST Do cotejo da decisão agravada com as razões do agravo de instrumento, verifica-se que a parte agravante não impugnou de forma direta e específica a fundamentação da decisão agravada quanto ao tema, consistente no óbice da Súmula 126, do TST. Não atendido, portanto, o princípio da dialeticidade, revelando-se aplicável, à hipótese, a Súmula nº 422, item I, do TST: "Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida". Nesse sentido, eis os seguintes precedentes desta 3ª turma: "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. LEIS Nos 13.015/2014 E 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RITO SUMARÍSSIMO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST . Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida (Súmula 422, I, do TST). Na espécie, a parte não impugnou o fundamento nuclear da decisão agravada, consistente na inobservância do requisito inscrito no art. 896, § 9º, da CLT. Agravo de instrumento não conhecido" (AIRR-100524-43.2023.5.01.0067, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 18/10/2024). AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017 . 1. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. 2. HORAS EXTRAS. CARGO DE CONFIANÇA. 3. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. 4. DIFERENÇAS DE FGTS. APELO DESFUNDAMENTADO QUANTO AOS TEMAS. AUSÊNCIA DE ATAQUE AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO DENEGATÓRIA. SÚMULA 422/TST. A finalidade do agravo de instrumento é a de destrancar o apelo inadmitido pela instância ordinária, objetivando demonstrar a inadequação da decisão denegatória, com explícita insurgência quanto ao óbice processual que não permitiu o processamento regular do recurso principal, em observância ao princípio da dialeticidade. Dessa forma, é necessária a objeção específica aos fundamentos da decisão denegatória . Na hipótese, ao interpor o agravo de instrumento, a Parte Agravante não impugna, especificamente, os fundamentos adotados na decisão denegatória (artigo 896, § 1º-A, I, da CLT e Súmula 126/TST ), de modo a apresentar argumentos que viabilizassem o provimento do seu apelo. Assim, não preenchido o requisito fixado pelo art. 1.016, III, do CPC/2015, o recurso não atende, em sua integralidade, ao pressuposto extrínseco da adequação, nos termos da Súmula 422, I/TST. TST. Julgados desta Corte. Agravo de instrumento não conhecido no aspecto. (AIRR-1000790-91.2019.5.02.0204, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 24/03/2023). "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE . RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E REGIDO PELO CPC/2015 E PELA IN Nº40/2016 DO TST. PRECLUSÃO. NÃO RENOVAÇÃO DOS ARGUMENTOS TRAZIDOS NO RECURSO DE REVISTA. PRINCÍPIO DA DELIMITAÇÃO RECURSAL. AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE. Tratando-se o agravo de instrumento de recurso autônomo, a parte deve, além de impugnar os fundamentos adotados na decisão recorrida, apontar de forma clara e precisa os motivos que justificam a acessibilidade à vereda extraordinária. Com efeito, em que pesem as razões do agravo de instrumento estejam vinculadas às do recurso de revista, deve-se demonstrar os elementos necessários à exata compreensão da controvérsia e à delimitação recursal. No caso, verifica-se que o recurso não alcança o conhecimento, porquanto a parte não renova os argumentos trazidos no recurso de revista em relação aos temas ali arguidos, limitando-se a impugnar genericamente o despacho denegatório do seu apelo revisional. Assim, em observância ao princípio da delimitação recursal, não se conhece do agravo de instrumento, tendo em vista a preclusão consumativa operada, estando, pois, desfundamentado o apelo. Incidência da Súmula 422, I, do TST . Agravo de instrumento não conhecido" (AIRR-11065-92.2021.5.15.0137, 3ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 03/03/2023). Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do agravo no aspecto. Quanto ao tema remanescente, preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade, CONHEÇO do agravo. 2. MÉRITO LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES CONSTANTES NA INICIAL. Sobre o aspecto, a parte indica ofensa aos arts. 840 §1º, da CLT e 492 do CPC, aduzindo que “a redação do dispositivo não autoriza a indicação de valor estimativo (...) havendo liquidação dos pedidos pelo reclamante, consoante novel redação do art. 840 da CLT, deve ser observada, em liquidação, a limitação de cada uma das parcelas deferidas aos valores fixados na inicial”. O e. TRT consignou, quanto ao tema: Limite da condenação aos valores dos pedidos. Requer a recorrente seja a condenação limitada aos valores atribuídos aos pedidos na inicial. Aduz que a nova redação do § 1º do artigo 840 da CLT estabelece os requisitos da petição inicial, dentre eles, desde 11/11/2017, o valor líquido de cada pedido. Ao exame. Releva ponderar, inicialmente, que segundo a melhor exegese do artigo 840, parágrafo 1º, da CLT, o valor atribuído a cada pedido formulado na petição inicial pela parte autora decorre de mera estimativa, não sendo exigível que a parte realize a liquidação respectiva a cada pedido, o que somente deverá ocorrer na fase processual de liquidação. Nessa linha de raciocínio, do ponto de vista hermenêutico, mostra-se inviável considerar o referido valor como limitador do valor da condenação, para os efeitos legais. Ademais, os valores indicados na petição inicial não consideram a atualização monetária e a incidência de juros, sendo necessária a liquidação para apurar-se o valor total devido à época do pagamento, mormente porque foram acolhidos em parte os pleitos da inicial. Destarte, em consonância com o parágrafo 2º do artigo 12 da Resolução nº 221 do Tribunal Superior do Trabalho, o valor atribuído a cada pedido formulado na petição inicial terá caráter meramente estimativo, não podendo ser considerado como limitador do valor da condenação, a ser apurado na fase processual de liquidação. Nego provimento. O §1º do art. 840 da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, dispõe que: "deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor", sem fazer distinção entre os ritos processuais. A análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados, permite chegar à conclusão de que, tendo a reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, de um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo art. 5º, LV, da CF. Trata-se, portanto, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetividade ao referido artigo celetista. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste, nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa, qualquer delimitação em sentido contrário. Com efeito, o artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida, assim dispõe: Art. 291. A toda causa será atribuído valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediatamente aferível. Veja-se que o artigo 291 do CPC apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula nº 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do art. 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos arts. 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. Por fim, não se ignora que a Eg. SDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Logo, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada após a vigência da Lei nº 13.467/2017, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não sendo necessária qualquer ressalva e/ou indicação de se tratarem de valores estimados, eis que já devem ser assim considerados por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os já mencionados princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Nesse sentido, cito os seguintes precedentes desta Corte: "EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho . 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu , preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta "uma breve exposição dos fatos", uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi , em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos" (Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 07/12/2023). "RECURSO DE REVISTA. LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITES DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. INAFASTABILIDADE DO JUS POSTULANDI E DOS PRINCÍPIOS DO AMPLO ACESSO À JURISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV, DA CF), DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA (ART. 1º, III, DA CF), PROTEÇÃO SOCIAL DO TRABALHO (ART. 1º, IV, DA CF), DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA (ART. 5º, LV DA CF), DA IMEDIAÇÃO (ART. 820, DA CLT), DA INFORMALIDADE, SIMPLICIDADE, DISPOSITIVO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 141, §2º E 492, DO CPC. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. DESNECESSIDADE DE INDICAÇÃO DE RESSALVA QUANTO AO CARÁTER ESTIMADO DOS VALORES. 1. Trata-se de recurso de revista com fulcro no art. 896, c, da CLT, em que se pretende a reforma do acórdão regional recorrido quanto à limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. Aponta violação aos arts. 879, da CLT e divergência jurisprudencial. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho, 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu , preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta "uma breve exposição dos fatos", uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular ' fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi , em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela parte recorrente em seu recurso de revista, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita . 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC . 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita , submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil" . 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 15/05/2020, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não sendo necessária qualquer ressalva e/ou indicação de se tratarem de valores estimados, eis que já devem ser assim considerados por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-528-30.2020.5.12.0016, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 17/02/2023). "AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017. JULGAMENTO ULTRA PETITA - LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR INDICADO NA PETIÇÃO INICIAL. De acordo com o novel art. 840, § 1º, da CLT, com redação inserida pela Lei nº 13.467/17, " Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante ". Respeitados os judiciosos posicionamentos em contrário, a melhor exegese do referido dispositivo legal é que os valores indicados na petição traduzem mera estimativa, e não limites, à condenação, sobretudo porque, a rigor, é inviável a liquidação, já no início da demanda, de todos os pedidos deduzidos na inicial. Não se deve perder de vista os postulados que informam o processo do trabalho, em especial os princípios da proteção, do valor social do trabalho, do acesso ao Poder Judiciário, da oralidade e da simplicidade dos atos processuais trabalhistas. Sem embargo, exigir que o trabalhador aponte precisamente a quantia que lhe é devida é investir contra o próprio jus postulandi trabalhista. A propósito, não se faz necessária qualquer ressalva na petição inicial de que tais valores representam mera estimativa à liquidação do julgado, não havendo que se falar, portanto, em julgamento ultra petita na hipótese em que quantia liquidada perpasse o montante pleiteado. Agravo interno a que se nega provimento " (Ag-AIRR-11209-69.2021.5.15.0039, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 22/09/2023). (g.n.) "(...) II - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. A controvérsia gira em torno da aplicação do artigo 840, § 1º, da CLT, que foi alterado pela Lei 13.467/2017. No caso em tela, o debate acerca do art. 840, § 1º, da CLT, detém transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. Transcendência reconhecida. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. A controvérsia acerca da limitação da condenação aos valores liquidados apresentados em cada pedido da inicial tem sido analisada, pela jurisprudência dominante, apenas sob a égide dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil. Por certo que aludidos dispositivos do CPC são aplicados subsidiariamente no processo trabalhista. Entretanto, no que se refere à discussão acerca dos efeitos dos pedidos liquidados, apresentados na inicial trabalhista, os dispositivos mencionados do CPC devem ceder espaço à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 840 da CLT, que foram alterados pela Lei 13.467/2017 . Cumpre esclarecer que o TST, por meio da Resolução nº 221, de 21/06/2018, considerando a vigência da Lei 13.467/2017 e a imperativa necessidade de o TST posicionar-se, ainda que de forma não exaustiva, sobre a aplicação das normas processuais contidas na CLT alteradas ou acrescentadas pela Lei 13.467/2017, e considerando a necessidade de dar ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que no seu art. 12, § 2º, normatizou que "para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado (...)". A Instrução Normativa nº 41/2018 do TST, aprovada mediante Resolução nº 221, em 02/06/2018, registra que a aplicação das normas processuais previstas na CLT, alteradas pela Lei 13.467/2017, com eficácia a partir de 11/11/2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidadas sob a égide da lei revogada. Portanto, no caso em tela, em que a inicial foi ajuizada no ano 2020 , hão de incidir as normas processuais previstas na CLT alteradas pela Lei 13.467/2017. Assim, a discussão quanto à limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial deve ser considerada apenas como fim estimado, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta Corte. Esse foi o entendimento do Regional . Há precedentes. Agravo de instrumento não provido" (Ag-AIRR-10068-79.2020.5.03.0040, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 22/09/2023). "(...) 2. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. VALORES PLEITEADOS NA INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ART. 840, § 1º, DA CLT. VALORESDECLINADOS REFLETEM MERA ESTIMATIVA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. RECONHECIMENTO. I. Esta Corte Superior entende que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 do TST . Precedentes. II. No caso, o Tribunal Regional entendeu que os valores da condenação deverão ser limitados aos valores apresentados nos pedidos trazidos na reclamação trabalhista. III . A presente ação foi ajuizada em 2018, na vigência da Lei n.º 13.467/2017. Após as alterações promovidas no art. 840, § 1º, da CLT, pela Lei nº 13.467/2017, e a par da jurisprudência precedente à referida modificação legislativa, o TST aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que regulamenta a aplicação das normas processuais contidas na CLT, alteradas ou acrescentadas pela Reforma Trabalhista, cujo artigo 12, § 2º, dispõe que " § 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado , observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil ". Com efeito, é razoável que os valores objeto da condenação sejam apurados definitivamente em liquidação, quando, então, será possível aferir, com base nos documentos e demais informações trazidas aos autos, o quantum realmente devido, razão pela qual não se pode limitar a condenação aos valores expressos na petição inicial, porquanto meramente estimativos. Nessa medida, a decisão regional que limitou a condenação aos valores dos pedidos indicados na petição inicial viola o art. 840, § 1º, da CLT. IV. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-1000290-38.2018.5.02.0502, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 15/09/2023). "(...) RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. Há transcendência jurídica da causa, nos termos do inciso IV do § 1º do art. 896-A da CLT, uma vez que a inviabilidade da limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na inicial é questão nova disciplinada por dispositivo da CLT alterado pela Lei 13.467/2017 (art. 840, § 1º, da CLT) e normatizado pelo parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta c. Corte. 2. A causa se refere à determinação de que, por ocasião da liquidação de sentença, os valores apurados não poderiam ultrapassar os valores líquidos atribuídos pelo reclamante na petição inicial. 3 . Com a Reforma Trabalhista, foi alterado o §1º do art. 840 da CLT. Visando a orientar a aplicação das normas processuais introduzidas pela Lei nº 13.467/2017, foi editada por esta Corte a Instrução Normativa nº 41, que assim dispôs sobre a aplicação do art. 840, § 1º, da CLT: "§ 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". Desse modo, e considerando que a reclamação trabalhista foi ajuizada na vigência da Lei nº 13.467/2017, não há se falar em limitação da condenação aos valores estipulados nos pedidos apresentados de forma líquida na inicial, uma vez que estes são apenas estimativas do valor monetário dos pleitos realizados pela parte reclamante. Assim, tem-se que os valores estipulados na inicial são apenas para fins estimativos. Precedentes. Assim, os valores atribuídos aos pedidos elencados na inicial são apenas para fins estimativos, de modo que o valor efetivamente devido ao reclamante deve ser apurado em regular liquidação de sentença . Recurso de Revista conhecido e provido" (RRAg-1001301-63.2018.5.02.0030, 8ª Turma, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 04/07/2022). Nesse contexto, não tendo sido apresentados argumentos suficientes à reforma da decisão agravada, deve ser desprovido o agravo. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – não conhecer do agravo quanto ao tema “responsabilidade subsidiária” e II – conhecer do agravo quanto ao tema “limitação da condenação aos valores constantes na inicial” e, no mérito, negar-lhe provimento. Brasília, 27 de junho de 2025. ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ministro Relator Intimado(s) / Citado(s) - DEIVID ARESI NEGRINI

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Cosma Do Brasil Produtos E Servicos Automotivos Ltda. x Deivid Aresi Negrini e outros

ID: 314856146

Tribunal: TST Órgão: 3ª Turma Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA Nº Processo: 0020251-63.2023.5.04.0271

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA.

Polo Passivo:

DEIVID ARESI NEGRINI TOP GUARDA SEGURANCA PATRIMONIAL LTDA

Acórdão

Advogados:

THIAGO TORRES GUEDES

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LUCIELI BREDA

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MARCELO MAC DONALD REIS

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TISSIANO DA ROCHA JOBIM

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VERA LUCIA DE VASCONCELLOS BOLZAN

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 3ª TURMA Relator: ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ag AIRR 0020251-63.2023.5.04.0271 AGRAVANTE: COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AU… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 3ª TURMA Relator: ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ag AIRR 0020251-63.2023.5.04.0271 AGRAVANTE: COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA. AGRAVADO: DEIVID ARESI NEGRINI E OUTROS (1) Poder Judiciário Justiça do Trabalho Tribunal Superior do Trabalho PROCESSO Nº TST-Ag-AIRR - 0020251-63.2023.5.04.0271 A C Ó R D Ã O 3ª Turma GMABB/ra/ AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA PRIVADA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST. Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida (Súmula 422, I, do TST). Na espécie, a parte não impugnou o fundamento nuclear da decisão agravada, consistente no óbice da Súmula 126 do TST. Agravo de que não se conhece. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES CONSTANTES NA INICIAL. 1. Pretensão recursal para limitar a condenação aos valores mencionados na exordial. 2. Esta e. Corte, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 3. Decisão Regional em conformidade com este entendimento. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº TST-Ag-AIRR - 0020251-63.2023.5.04.0271, em que é AGRAVANTE COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA. e são AGRAVADOS DEIVID ARESI NEGRINI e TOP GUARDA SEGURANCA PATRIMONIAL LTDA. A parte reclamada interpõe agravo em face da decisão monocrática proferida pelo Relator, em que se negou seguimento ao agravo de instrumento. Contraminuta não apresentada. É o relatório. V O T O 1. CONHECIMENTO Por meio de decisão monocrática, foi negado seguimento ao agravo de instrumento, mediante os fundamentos a seguir reproduzidos: I - RELATÓRIO Trata-se de agravo(s) de instrumento interposto(s) em face da decisão que negou seguimento ao(s) recurso(s) de revista. É o relatório. II - FUNDAMENTAÇÃO Observados os requisitos extrínsecos de admissibilidade recursal, CONHEÇO. Este é o conteúdo da decisão agravada, por meio da qual foi denegado seguimento ao(s) recurso(s) de revista: PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Superada a apreciação dos pressupostos extrínsecos, passo à análise do recurso. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Valor da Causa. Alegação(ões): -violação do(s) art(s).840, §1º, da CLT e 492 do CPC. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Não admito o recurso de revista noitem. A atual, iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho está consolidada no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados na petição inicial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante, independentemente da existência de ressalva na petição inicial indicando que o valores atribuídos aos pedidos têm caráter estimativo, como se observa: EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. (...) 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado , não havendo limitação da condenação àquele montante. (...) 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos. (sublinhei, TST-Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Rel. Min. Alberto Bastos Balazeiro, SBDI-I, DEJT 07/12/2023). Nesse mesmo sentido, as seguintes decisões proferidas pelas C. Turmas do TST: Ag-AIRR-11336-76.2019.5.15.0071, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 06/10/2023; RRAg-8-81.2021.5.12.0001, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 06/10/2023; RRAg-1000435-10.2019.5.02.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 06/10/2023; RR-1001021-41.2021.5.02.0401, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado Jose Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 13/10/2023; e RR-20647-73.2019.5.04.0661, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 06/10/2023. Desse modo, se o ajuizamento se deu após a vigência da Lei 13.467/17, independentemente da existência de ressalva expressa, os valores atribuídos aos pedidos formulados na petição inicial são meramente estimativos. Assim, estando a decisão recorrida em consonância com a atual, iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, tem-se por inviável o seguimento do recurso de revista, ante o disposto no § 7º do art. 896 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.015/2014, e na Súmula 333 do TST. Nego seguimento ao recurso quanto ao item "Limites da condenação. Valores descritos na peça inaugural. Violação do §1º do art. 840 da CLT". Responsabilidade Solidária / Subsidiária / Tomador de Serviços / Terceirização. Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Multa do Artigo 467 da CLT. Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Multa do Artigo 477 da CLT. Contrato Individual de Trabalho / CTPS / Anotação / Baixa / Retificação. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Penalidades Processuais / Multa por Descumprimento de Ordem Judicial. Contrato Individual de Trabalho / FGTS. Alegação(ões): - contrariedade à(s) Súmula(s) 331 do Tribunal Superior do Trabalho. - violaçãodo(s)art(s).5º, II,da Constituição Federal. -violação do(s) art(s).884 do CC, 4º-A da Lei nº 6.019/74. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Não admito o recurso de revista no item. A decisão recorrida é expressa ao consignar a recorrente como tomadora dos serviços prestados pelo autor. Para se chegar a conclusão diversa, na forma pretendida pela parte, seria necessário o reexame de fatos e provas, o que é obstado, em sede de recurso de revista, pelo entendimento vertido na Súmula 126 do TST. Ademais, a decisão recorrida está em conformidade com a Súmula 331, IV e VI, do TST, o que inviabiliza o seguimento do recurso de revista, inclusive por dissenso jurisprudencial (§ 7º do art. 896 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.015/2014,e Súmula 333 da aludida Corte Superior), tampouco permitindo verificar afronta aos dispositivos invocados. Inviável o exame de admissibilidade do recurso de revista quando a decisão, quanto à anotação da CPTS e à multa diária pelo descumprimento, já que foi atendido o postulado pela parte recorrente. Quanto ao FGTS, a parte apenas discorre acerca das razões de sua insurgência e propugna a reforma da decisão. Não traz aresto para confronto, não indica dispositivo legal ou constitucional que entenda violado, tampouco aponta contrariedade a Orientação Jurisprudencial de Seção de Dissídios Individuais ou a Súmula do TST e, ainda, contrariedade a Súmula Vinculante do STF. A ausência de situação prevista no art. 896 da CLT obsta o prosseguimento do recurso de revista. CONCLUSÃO Nego seguimento. De início, saliento que deixo de examinar eventual transcendência da causa, em respeito aos princípios da economia, celeridade e razoável duração do processo, bem como em razão da ausência de prejuízo para as partes, notadamente após a declaração de inconstitucionalidade do art. 896-A, § 5º, da CLT pelo Tribunal Pleno do TST no julgamento da ArgInc-1000845-52.2016.5.02.0461, ocasião em que se restou assentado que toda e qualquer decisão do Relator que julga agravo de instrumento comporta agravo interno para a respectiva Turma, independentemente de seu fundamento ser, ou não, a ausência de transcendência. Nas razões recursais, alega-se que o(s) recurso(s) de revista comportaria(m) trânsito, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade extrínsecos e os intrínsecos previstos no art. 896 da CLT. Todavia, do percuciente cotejo das razões recursais com o acórdão do Tribunal Regional, não resultou evidenciado o desacerto da decisão agravada, que merece ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, ora incorporados. O exame de admissibilidade efetuado pelo Tribunal de origem, a teor do art. 896, § 1º, da CLT, importa em exame minucioso dos requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso de revista, de modo que inexiste óbice a prestigiar a fundamentação ali adotada, quando convergente com o entendimento deste juízo ad quem, como na espécie. Nesse agir, a prestação jurisdicional atende, simultaneamente e de forma compatibilizada, a garantia da fundamentação das decisões (art. 93, IX, da Constituição) e o respeito à razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da mesma Carta), além de em nada atentar contra os postulados constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV). Ressalte-se, no exame AI-QO nº 791.292-PE (Precedente em repercussão geral) o Supremo Tribunal Federal concluiu suficientemente fundamentada a decisão que "endossou os fundamentos do despacho de inadmissibilidade do recurso de revista, integrando-os ao julgamento do agravo de instrumento" (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe – 13/08/2010), uma vez que a excepcional fundamentação per relationem se justifica em virtude do devido enfrentamento, pelo juízo primeiro de admissibilidade, dos argumentos deduzidos no recurso. Nesse sentido, inclusive, é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Inexiste violação do art. 93, IX, da Constituição Federal. A jurisprudência desta Suprema Corte é no sentido de que o referido dispositivo exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento. Enfrentadas todas as causas de pedir veiculadas pela parte, capazes de, em tese, influenciar o resultado da demanda, fica dispensado o exame detalhado de cada argumento suscitado, considerada a compatibilidade entre o que alegado e o entendimento fixado pelo órgão julgador. 2. Este Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência consolidada quanto à regularidade da fundamentação per relationem como técnica de motivação das decisões judiciais. Precedentes. 3. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 4. A teor do art. 85, § 11, do CPC, o “tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”. 5. Agravo interno conhecido e não provido. (RE 1397056 ED-AgR, Relator(a): ROSA WEBER (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 13/03/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 27-03-2023 PUBLIC 28-03-2023) Anote-se que não se trata da mera invocação de motivos hábeis a justificar qualquer decisão ou do não enfrentamento dos argumentos da parte (incisos III e IV do art. 489, § 1º, do CPC/2015), mas de análise jurídica ora efetuada por este Relator, que, no caso concreto, adota a conclusão da decisão agravada quanto à insuficiência dos argumentos da parte para demonstrar algum dos requisitos inscritos no art. 896 da CLT. Nessa esteira, inclusive, é a jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça, órgão judicial precípuo para a interpretação da legislação processual comum infraconstitucional: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. 1. Inexiste ofensa aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022, II, do CPC/2015 quando o Tribunal de origem se manifesta de modo fundamentado acerca das questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, porquanto julgamento desfavorável ao interesse da parte não se confunde com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 2. Esta Corte admite a adoção da fundamentação per relationem, hipótese em que o ato decisório se reporta a outra decisão ou manifestação existente nos autos e as adota como razão de decidir. Precedentes do STJ e do STF. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 2.029.485/MA, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 19/4/2023.) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. AÇÃO CONDENATÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. TRANSCRIÇÃO DE TRECHOS DA SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. OMISSÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. PARÂMETROS FIXADOS EM TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. ERRO DE CÁLCULO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7, STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Não se verifica a alegada violação do art. 1.022 do CPC/2015, na medida em que a eg. Corte de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas. De fato, embora não tenha examinado individualmente cada um dos argumentos suscitados pela parte, adotou fundamentação suficiente, decidindo integralmente a controvérsia. Precedentes. 2. Nos termos do entendimento jurisprudencial adotado por este Superior Tribunal de Justiça, é admitido ao Tribunal de origem, no julgamento da apelação, utilizar, como razões de decidir, os fundamentos delineados na sentença (fundamentação per relationem), medida que não implica negativa de prestação jurisdicional, não gerando nulidade do acórdão, seja por inexistência de omissão seja por não caracterizar deficiência na fundamentação. Precedentes. (...) 5. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 2.122.110/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 24/4/2023.) Não destoa desse entendimento este Tribunal Superior do Trabalho, conforme se infere dos seguintes julgados da 3ª Turma: "A) AGRAVO DE INSTRUMENTO. INSTRUÇÃO NORMATIVA 40/TST. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. HORAS EXTRAS. INVALIDADE DO SISTEMA DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA. BANCO DE HORAS. NÃO CONFIGURAÇÃO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 126/TST. MOTIVAÇÃO POR ADOÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. TÉCNICA PER RELATIONEM. A decisão regional fica mantida por seus próprios fundamentos, registrando-se que a motivação por adoção dos fundamentos da decisão recorrida não se traduz em omissão no julgado ou em negativa de prestação jurisdicional - até mesmo porque transcritos integralmente. Isso porque a fundamentação utilizada pela instância ordinária se incorpora à decisão proferida pela Corte revisora - e, portanto, a análise dos fatos e das provas, bem como do enquadramento jurídico a eles conferido. Dessa forma, considerando-se que o convencimento exposto na decisão recorrida é suficiente para definição da matéria discutida em Juízo, com enfrentamento efetivo dos argumentos articulados pela Parte Recorrente, torna-se viável a incorporação formal dessa decisão por referência. Ou seja, se a decisão regional contém fundamentação suficiente - com exame completo e adequado dos fatos discutidos na lide e expressa referência às regras jurídicas que regem as matérias debatidas -, a adoção dos motivos que compõem esse julgamento não implica inobservância aos arts. 93, IX, da CF/88; e 489, II, do CPC/2015. Assim, a prolação de julgamentos pela técnica da motivação relacional não viola os princípios e garantias constitucionais do devido processo legal (art. 5º, LIV), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV), além de preservar o direito à razoável celeridade da tramitação processual (art. 5º, LXXVIII). Revela-se, na prática, como ferramenta apropriada de racionalização da atividade jurisdicional. Nesse sentido, inclusive, posiciona-se a jurisprudência desta Corte Superior e do STF, segundo a qual a confirmação integral da decisão agravada não implica ausência de fundamentação, não eliminando o direito da parte de submeter sua irresignação ao exame da instância revisora. Agravo de instrumento desprovido. (...) (RRAg-10166-30.2021.5.15.0029, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 30/06/2023). "AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. NULIDADE DA DECISÃO AGRAVADA. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM . A fundamentação per relationem não importa em ofensa à garantia da fundamentação dos julgados, servindo, ao revés, de homenagem aos princípios da celeridade e da duração razoável do processo. Diante da ausência de comprovação dos requisitos intrínsecos de admissibilidade do recurso de revista (art. 896 da CLT), não se cogita de reforma da decisão que negou provimento ao agravo de instrumento. Agravo a que se nega provimento" (Ag-AIRR-1000163-07.2020.5.02.0090, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 28/04/2023). Em igual sentido colhem-se recentes julgados de todas as demais Turmas do TST: Ag-AIRR-488-25.2021.5.09.0007, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 13/06/2023; Ag-AIRR-10959-26.2018.5.18.0211, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-11355-09.2020.5.15.0084, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-1178-65.2019.5.22.0006, 5ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-1000562-31.2019.5.02.0006, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado José Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 19/05/2023; Ag-AIRR-498-82.2017.5.09.0242, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 30/06/2023; Ag-AIRR-120700-09.2006.5.02.0262, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 29/05/2023. Frise-se, ainda, que a disposição contida no art. 1.021, § 3º, do CPC/2015 se dirige ao agravo interno e, não, ao agravo de instrumento. Note-se, por fim, que a presente técnica de decisão, por si só, em nada obstaculiza o acesso da parte agravante aos demais graus de jurisdição. Nesse contexto, observado que os recursos de revista efetivamente não comportam trânsito, ante o não preenchimento dos requisitos de admissibilidade, impõe-se NEGAR PROVIMENTO ao(s) agravo(s) de instrumento. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 118, X, do Regimento Interno do TST, CONHEÇO do(s) agravo(s) de instrumento e, no mérito, NEGO-LHE(S) PROVIMENTO. Na minuta de agravo, devolvem-se a este Tribunal as insurgências concernentes aos tópicos "responsabilidade subsidiária” e “limitação da condenação ao valor dado à causa” em que a parte reclamada insiste no processamento do recurso de revista. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA PRIVADA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST Do cotejo da decisão agravada com as razões do agravo de instrumento, verifica-se que a parte agravante não impugnou de forma direta e específica a fundamentação da decisão agravada quanto ao tema, consistente no óbice da Súmula 126, do TST. Não atendido, portanto, o princípio da dialeticidade, revelando-se aplicável, à hipótese, a Súmula nº 422, item I, do TST: "Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida". Nesse sentido, eis os seguintes precedentes desta 3ª turma: "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. LEIS Nos 13.015/2014 E 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RITO SUMARÍSSIMO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST . Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida (Súmula 422, I, do TST). Na espécie, a parte não impugnou o fundamento nuclear da decisão agravada, consistente na inobservância do requisito inscrito no art. 896, § 9º, da CLT. Agravo de instrumento não conhecido" (AIRR-100524-43.2023.5.01.0067, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 18/10/2024). AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017 . 1. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. 2. HORAS EXTRAS. CARGO DE CONFIANÇA. 3. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. 4. DIFERENÇAS DE FGTS. APELO DESFUNDAMENTADO QUANTO AOS TEMAS. AUSÊNCIA DE ATAQUE AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO DENEGATÓRIA. SÚMULA 422/TST. A finalidade do agravo de instrumento é a de destrancar o apelo inadmitido pela instância ordinária, objetivando demonstrar a inadequação da decisão denegatória, com explícita insurgência quanto ao óbice processual que não permitiu o processamento regular do recurso principal, em observância ao princípio da dialeticidade. Dessa forma, é necessária a objeção específica aos fundamentos da decisão denegatória . Na hipótese, ao interpor o agravo de instrumento, a Parte Agravante não impugna, especificamente, os fundamentos adotados na decisão denegatória (artigo 896, § 1º-A, I, da CLT e Súmula 126/TST ), de modo a apresentar argumentos que viabilizassem o provimento do seu apelo. Assim, não preenchido o requisito fixado pelo art. 1.016, III, do CPC/2015, o recurso não atende, em sua integralidade, ao pressuposto extrínseco da adequação, nos termos da Súmula 422, I/TST. TST. Julgados desta Corte. Agravo de instrumento não conhecido no aspecto. (AIRR-1000790-91.2019.5.02.0204, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 24/03/2023). "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE . RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E REGIDO PELO CPC/2015 E PELA IN Nº40/2016 DO TST. PRECLUSÃO. NÃO RENOVAÇÃO DOS ARGUMENTOS TRAZIDOS NO RECURSO DE REVISTA. PRINCÍPIO DA DELIMITAÇÃO RECURSAL. AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE. Tratando-se o agravo de instrumento de recurso autônomo, a parte deve, além de impugnar os fundamentos adotados na decisão recorrida, apontar de forma clara e precisa os motivos que justificam a acessibilidade à vereda extraordinária. Com efeito, em que pesem as razões do agravo de instrumento estejam vinculadas às do recurso de revista, deve-se demonstrar os elementos necessários à exata compreensão da controvérsia e à delimitação recursal. No caso, verifica-se que o recurso não alcança o conhecimento, porquanto a parte não renova os argumentos trazidos no recurso de revista em relação aos temas ali arguidos, limitando-se a impugnar genericamente o despacho denegatório do seu apelo revisional. Assim, em observância ao princípio da delimitação recursal, não se conhece do agravo de instrumento, tendo em vista a preclusão consumativa operada, estando, pois, desfundamentado o apelo. Incidência da Súmula 422, I, do TST . Agravo de instrumento não conhecido" (AIRR-11065-92.2021.5.15.0137, 3ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 03/03/2023). Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do agravo no aspecto. Quanto ao tema remanescente, preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade, CONHEÇO do agravo. 2. MÉRITO LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES CONSTANTES NA INICIAL. Sobre o aspecto, a parte indica ofensa aos arts. 840 §1º, da CLT e 492 do CPC, aduzindo que “a redação do dispositivo não autoriza a indicação de valor estimativo (...) havendo liquidação dos pedidos pelo reclamante, consoante novel redação do art. 840 da CLT, deve ser observada, em liquidação, a limitação de cada uma das parcelas deferidas aos valores fixados na inicial”. O e. TRT consignou, quanto ao tema: Limite da condenação aos valores dos pedidos. Requer a recorrente seja a condenação limitada aos valores atribuídos aos pedidos na inicial. Aduz que a nova redação do § 1º do artigo 840 da CLT estabelece os requisitos da petição inicial, dentre eles, desde 11/11/2017, o valor líquido de cada pedido. Ao exame. Releva ponderar, inicialmente, que segundo a melhor exegese do artigo 840, parágrafo 1º, da CLT, o valor atribuído a cada pedido formulado na petição inicial pela parte autora decorre de mera estimativa, não sendo exigível que a parte realize a liquidação respectiva a cada pedido, o que somente deverá ocorrer na fase processual de liquidação. Nessa linha de raciocínio, do ponto de vista hermenêutico, mostra-se inviável considerar o referido valor como limitador do valor da condenação, para os efeitos legais. Ademais, os valores indicados na petição inicial não consideram a atualização monetária e a incidência de juros, sendo necessária a liquidação para apurar-se o valor total devido à época do pagamento, mormente porque foram acolhidos em parte os pleitos da inicial. Destarte, em consonância com o parágrafo 2º do artigo 12 da Resolução nº 221 do Tribunal Superior do Trabalho, o valor atribuído a cada pedido formulado na petição inicial terá caráter meramente estimativo, não podendo ser considerado como limitador do valor da condenação, a ser apurado na fase processual de liquidação. Nego provimento. O §1º do art. 840 da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, dispõe que: "deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor", sem fazer distinção entre os ritos processuais. A análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados, permite chegar à conclusão de que, tendo a reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, de um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo art. 5º, LV, da CF. Trata-se, portanto, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetividade ao referido artigo celetista. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste, nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa, qualquer delimitação em sentido contrário. Com efeito, o artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida, assim dispõe: Art. 291. A toda causa será atribuído valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediatamente aferível. Veja-se que o artigo 291 do CPC apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula nº 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do art. 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos arts. 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. Por fim, não se ignora que a Eg. SDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Logo, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada após a vigência da Lei nº 13.467/2017, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não sendo necessária qualquer ressalva e/ou indicação de se tratarem de valores estimados, eis que já devem ser assim considerados por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os já mencionados princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Nesse sentido, cito os seguintes precedentes desta Corte: "EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho . 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu , preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta "uma breve exposição dos fatos", uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi , em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos" (Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 07/12/2023). "RECURSO DE REVISTA. LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITES DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. INAFASTABILIDADE DO JUS POSTULANDI E DOS PRINCÍPIOS DO AMPLO ACESSO À JURISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV, DA CF), DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA (ART. 1º, III, DA CF), PROTEÇÃO SOCIAL DO TRABALHO (ART. 1º, IV, DA CF), DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA (ART. 5º, LV DA CF), DA IMEDIAÇÃO (ART. 820, DA CLT), DA INFORMALIDADE, SIMPLICIDADE, DISPOSITIVO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 141, §2º E 492, DO CPC. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. DESNECESSIDADE DE INDICAÇÃO DE RESSALVA QUANTO AO CARÁTER ESTIMADO DOS VALORES. 1. Trata-se de recurso de revista com fulcro no art. 896, c, da CLT, em que se pretende a reforma do acórdão regional recorrido quanto à limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. Aponta violação aos arts. 879, da CLT e divergência jurisprudencial. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho, 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu , preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta "uma breve exposição dos fatos", uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular ' fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi , em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela parte recorrente em seu recurso de revista, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita . 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC . 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita , submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil" . 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 15/05/2020, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não sendo necessária qualquer ressalva e/ou indicação de se tratarem de valores estimados, eis que já devem ser assim considerados por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-528-30.2020.5.12.0016, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 17/02/2023). "AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017. JULGAMENTO ULTRA PETITA - LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR INDICADO NA PETIÇÃO INICIAL. De acordo com o novel art. 840, § 1º, da CLT, com redação inserida pela Lei nº 13.467/17, " Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante ". Respeitados os judiciosos posicionamentos em contrário, a melhor exegese do referido dispositivo legal é que os valores indicados na petição traduzem mera estimativa, e não limites, à condenação, sobretudo porque, a rigor, é inviável a liquidação, já no início da demanda, de todos os pedidos deduzidos na inicial. Não se deve perder de vista os postulados que informam o processo do trabalho, em especial os princípios da proteção, do valor social do trabalho, do acesso ao Poder Judiciário, da oralidade e da simplicidade dos atos processuais trabalhistas. Sem embargo, exigir que o trabalhador aponte precisamente a quantia que lhe é devida é investir contra o próprio jus postulandi trabalhista. A propósito, não se faz necessária qualquer ressalva na petição inicial de que tais valores representam mera estimativa à liquidação do julgado, não havendo que se falar, portanto, em julgamento ultra petita na hipótese em que quantia liquidada perpasse o montante pleiteado. Agravo interno a que se nega provimento " (Ag-AIRR-11209-69.2021.5.15.0039, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 22/09/2023). (g.n.) "(...) II - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. A controvérsia gira em torno da aplicação do artigo 840, § 1º, da CLT, que foi alterado pela Lei 13.467/2017. No caso em tela, o debate acerca do art. 840, § 1º, da CLT, detém transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. Transcendência reconhecida. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. A controvérsia acerca da limitação da condenação aos valores liquidados apresentados em cada pedido da inicial tem sido analisada, pela jurisprudência dominante, apenas sob a égide dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil. Por certo que aludidos dispositivos do CPC são aplicados subsidiariamente no processo trabalhista. Entretanto, no que se refere à discussão acerca dos efeitos dos pedidos liquidados, apresentados na inicial trabalhista, os dispositivos mencionados do CPC devem ceder espaço à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 840 da CLT, que foram alterados pela Lei 13.467/2017 . Cumpre esclarecer que o TST, por meio da Resolução nº 221, de 21/06/2018, considerando a vigência da Lei 13.467/2017 e a imperativa necessidade de o TST posicionar-se, ainda que de forma não exaustiva, sobre a aplicação das normas processuais contidas na CLT alteradas ou acrescentadas pela Lei 13.467/2017, e considerando a necessidade de dar ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que no seu art. 12, § 2º, normatizou que "para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado (...)". A Instrução Normativa nº 41/2018 do TST, aprovada mediante Resolução nº 221, em 02/06/2018, registra que a aplicação das normas processuais previstas na CLT, alteradas pela Lei 13.467/2017, com eficácia a partir de 11/11/2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidadas sob a égide da lei revogada. Portanto, no caso em tela, em que a inicial foi ajuizada no ano 2020 , hão de incidir as normas processuais previstas na CLT alteradas pela Lei 13.467/2017. Assim, a discussão quanto à limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial deve ser considerada apenas como fim estimado, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta Corte. Esse foi o entendimento do Regional . Há precedentes. Agravo de instrumento não provido" (Ag-AIRR-10068-79.2020.5.03.0040, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 22/09/2023). "(...) 2. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. VALORES PLEITEADOS NA INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ART. 840, § 1º, DA CLT. VALORESDECLINADOS REFLETEM MERA ESTIMATIVA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. RECONHECIMENTO. I. Esta Corte Superior entende que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 do TST . Precedentes. II. No caso, o Tribunal Regional entendeu que os valores da condenação deverão ser limitados aos valores apresentados nos pedidos trazidos na reclamação trabalhista. III . A presente ação foi ajuizada em 2018, na vigência da Lei n.º 13.467/2017. Após as alterações promovidas no art. 840, § 1º, da CLT, pela Lei nº 13.467/2017, e a par da jurisprudência precedente à referida modificação legislativa, o TST aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que regulamenta a aplicação das normas processuais contidas na CLT, alteradas ou acrescentadas pela Reforma Trabalhista, cujo artigo 12, § 2º, dispõe que " § 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado , observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil ". Com efeito, é razoável que os valores objeto da condenação sejam apurados definitivamente em liquidação, quando, então, será possível aferir, com base nos documentos e demais informações trazidas aos autos, o quantum realmente devido, razão pela qual não se pode limitar a condenação aos valores expressos na petição inicial, porquanto meramente estimativos. Nessa medida, a decisão regional que limitou a condenação aos valores dos pedidos indicados na petição inicial viola o art. 840, § 1º, da CLT. IV. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-1000290-38.2018.5.02.0502, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 15/09/2023). "(...) RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. Há transcendência jurídica da causa, nos termos do inciso IV do § 1º do art. 896-A da CLT, uma vez que a inviabilidade da limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na inicial é questão nova disciplinada por dispositivo da CLT alterado pela Lei 13.467/2017 (art. 840, § 1º, da CLT) e normatizado pelo parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta c. Corte. 2. A causa se refere à determinação de que, por ocasião da liquidação de sentença, os valores apurados não poderiam ultrapassar os valores líquidos atribuídos pelo reclamante na petição inicial. 3 . Com a Reforma Trabalhista, foi alterado o §1º do art. 840 da CLT. Visando a orientar a aplicação das normas processuais introduzidas pela Lei nº 13.467/2017, foi editada por esta Corte a Instrução Normativa nº 41, que assim dispôs sobre a aplicação do art. 840, § 1º, da CLT: "§ 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". Desse modo, e considerando que a reclamação trabalhista foi ajuizada na vigência da Lei nº 13.467/2017, não há se falar em limitação da condenação aos valores estipulados nos pedidos apresentados de forma líquida na inicial, uma vez que estes são apenas estimativas do valor monetário dos pleitos realizados pela parte reclamante. Assim, tem-se que os valores estipulados na inicial são apenas para fins estimativos. Precedentes. Assim, os valores atribuídos aos pedidos elencados na inicial são apenas para fins estimativos, de modo que o valor efetivamente devido ao reclamante deve ser apurado em regular liquidação de sentença . Recurso de Revista conhecido e provido" (RRAg-1001301-63.2018.5.02.0030, 8ª Turma, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 04/07/2022). Nesse contexto, não tendo sido apresentados argumentos suficientes à reforma da decisão agravada, deve ser desprovido o agravo. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – não conhecer do agravo quanto ao tema “responsabilidade subsidiária” e II – conhecer do agravo quanto ao tema “limitação da condenação aos valores constantes na inicial” e, no mérito, negar-lhe provimento. Brasília, 27 de junho de 2025. ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ministro Relator Intimado(s) / Citado(s) - TOP GUARDA SEGURANCA PATRIMONIAL LTDA

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Cosma Do Brasil Produtos E Servicos Automotivos Ltda. x Deivid Aresi Negrini e outros

ID: 314856062

Tribunal: TST Órgão: 3ª Turma Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA Nº Processo: 0020251-63.2023.5.04.0271

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA.

Polo Passivo:

DEIVID ARESI NEGRINI TOP GUARDA SEGURANCA PATRIMONIAL LTDA

Acórdão

Advogados:

THIAGO TORRES GUEDES

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LUCIELI BREDA

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

MARCELO MAC DONALD REIS

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

TISSIANO DA ROCHA JOBIM

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

VERA LUCIA DE VASCONCELLOS BOLZAN

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 3ª TURMA Relator: ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ag AIRR 0020251-63.2023.5.04.0271 AGRAVANTE: COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AU… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO 3ª TURMA Relator: ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ag AIRR 0020251-63.2023.5.04.0271 AGRAVANTE: COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA. AGRAVADO: DEIVID ARESI NEGRINI E OUTROS (1) Poder Judiciário Justiça do Trabalho Tribunal Superior do Trabalho PROCESSO Nº TST-Ag-AIRR - 0020251-63.2023.5.04.0271 A C Ó R D Ã O 3ª Turma GMABB/ra/ AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA PRIVADA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST. Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida (Súmula 422, I, do TST). Na espécie, a parte não impugnou o fundamento nuclear da decisão agravada, consistente no óbice da Súmula 126 do TST. Agravo de que não se conhece. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES CONSTANTES NA INICIAL. 1. Pretensão recursal para limitar a condenação aos valores mencionados na exordial. 2. Esta e. Corte, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 3. Decisão Regional em conformidade com este entendimento. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº TST-Ag-AIRR - 0020251-63.2023.5.04.0271, em que é AGRAVANTE COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA. e são AGRAVADOS DEIVID ARESI NEGRINI e TOP GUARDA SEGURANCA PATRIMONIAL LTDA. A parte reclamada interpõe agravo em face da decisão monocrática proferida pelo Relator, em que se negou seguimento ao agravo de instrumento. Contraminuta não apresentada. É o relatório. V O T O 1. CONHECIMENTO Por meio de decisão monocrática, foi negado seguimento ao agravo de instrumento, mediante os fundamentos a seguir reproduzidos: I - RELATÓRIO Trata-se de agravo(s) de instrumento interposto(s) em face da decisão que negou seguimento ao(s) recurso(s) de revista. É o relatório. II - FUNDAMENTAÇÃO Observados os requisitos extrínsecos de admissibilidade recursal, CONHEÇO. Este é o conteúdo da decisão agravada, por meio da qual foi denegado seguimento ao(s) recurso(s) de revista: PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Superada a apreciação dos pressupostos extrínsecos, passo à análise do recurso. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Valor da Causa. Alegação(ões): -violação do(s) art(s).840, §1º, da CLT e 492 do CPC. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Não admito o recurso de revista noitem. A atual, iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho está consolidada no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados na petição inicial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante, independentemente da existência de ressalva na petição inicial indicando que o valores atribuídos aos pedidos têm caráter estimativo, como se observa: EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. (...) 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado , não havendo limitação da condenação àquele montante. (...) 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos. (sublinhei, TST-Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Rel. Min. Alberto Bastos Balazeiro, SBDI-I, DEJT 07/12/2023). Nesse mesmo sentido, as seguintes decisões proferidas pelas C. Turmas do TST: Ag-AIRR-11336-76.2019.5.15.0071, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 06/10/2023; RRAg-8-81.2021.5.12.0001, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 06/10/2023; RRAg-1000435-10.2019.5.02.0066, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 06/10/2023; RR-1001021-41.2021.5.02.0401, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado Jose Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 13/10/2023; e RR-20647-73.2019.5.04.0661, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 06/10/2023. Desse modo, se o ajuizamento se deu após a vigência da Lei 13.467/17, independentemente da existência de ressalva expressa, os valores atribuídos aos pedidos formulados na petição inicial são meramente estimativos. Assim, estando a decisão recorrida em consonância com a atual, iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, tem-se por inviável o seguimento do recurso de revista, ante o disposto no § 7º do art. 896 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.015/2014, e na Súmula 333 do TST. Nego seguimento ao recurso quanto ao item "Limites da condenação. Valores descritos na peça inaugural. Violação do §1º do art. 840 da CLT". Responsabilidade Solidária / Subsidiária / Tomador de Serviços / Terceirização. Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Multa do Artigo 467 da CLT. Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Multa do Artigo 477 da CLT. Contrato Individual de Trabalho / CTPS / Anotação / Baixa / Retificação. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Penalidades Processuais / Multa por Descumprimento de Ordem Judicial. Contrato Individual de Trabalho / FGTS. Alegação(ões): - contrariedade à(s) Súmula(s) 331 do Tribunal Superior do Trabalho. - violaçãodo(s)art(s).5º, II,da Constituição Federal. -violação do(s) art(s).884 do CC, 4º-A da Lei nº 6.019/74. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: (...) Não admito o recurso de revista no item. A decisão recorrida é expressa ao consignar a recorrente como tomadora dos serviços prestados pelo autor. Para se chegar a conclusão diversa, na forma pretendida pela parte, seria necessário o reexame de fatos e provas, o que é obstado, em sede de recurso de revista, pelo entendimento vertido na Súmula 126 do TST. Ademais, a decisão recorrida está em conformidade com a Súmula 331, IV e VI, do TST, o que inviabiliza o seguimento do recurso de revista, inclusive por dissenso jurisprudencial (§ 7º do art. 896 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.015/2014,e Súmula 333 da aludida Corte Superior), tampouco permitindo verificar afronta aos dispositivos invocados. Inviável o exame de admissibilidade do recurso de revista quando a decisão, quanto à anotação da CPTS e à multa diária pelo descumprimento, já que foi atendido o postulado pela parte recorrente. Quanto ao FGTS, a parte apenas discorre acerca das razões de sua insurgência e propugna a reforma da decisão. Não traz aresto para confronto, não indica dispositivo legal ou constitucional que entenda violado, tampouco aponta contrariedade a Orientação Jurisprudencial de Seção de Dissídios Individuais ou a Súmula do TST e, ainda, contrariedade a Súmula Vinculante do STF. A ausência de situação prevista no art. 896 da CLT obsta o prosseguimento do recurso de revista. CONCLUSÃO Nego seguimento. De início, saliento que deixo de examinar eventual transcendência da causa, em respeito aos princípios da economia, celeridade e razoável duração do processo, bem como em razão da ausência de prejuízo para as partes, notadamente após a declaração de inconstitucionalidade do art. 896-A, § 5º, da CLT pelo Tribunal Pleno do TST no julgamento da ArgInc-1000845-52.2016.5.02.0461, ocasião em que se restou assentado que toda e qualquer decisão do Relator que julga agravo de instrumento comporta agravo interno para a respectiva Turma, independentemente de seu fundamento ser, ou não, a ausência de transcendência. Nas razões recursais, alega-se que o(s) recurso(s) de revista comportaria(m) trânsito, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade extrínsecos e os intrínsecos previstos no art. 896 da CLT. Todavia, do percuciente cotejo das razões recursais com o acórdão do Tribunal Regional, não resultou evidenciado o desacerto da decisão agravada, que merece ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, ora incorporados. O exame de admissibilidade efetuado pelo Tribunal de origem, a teor do art. 896, § 1º, da CLT, importa em exame minucioso dos requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso de revista, de modo que inexiste óbice a prestigiar a fundamentação ali adotada, quando convergente com o entendimento deste juízo ad quem, como na espécie. Nesse agir, a prestação jurisdicional atende, simultaneamente e de forma compatibilizada, a garantia da fundamentação das decisões (art. 93, IX, da Constituição) e o respeito à razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, da mesma Carta), além de em nada atentar contra os postulados constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV). Ressalte-se, no exame AI-QO nº 791.292-PE (Precedente em repercussão geral) o Supremo Tribunal Federal concluiu suficientemente fundamentada a decisão que "endossou os fundamentos do despacho de inadmissibilidade do recurso de revista, integrando-os ao julgamento do agravo de instrumento" (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe – 13/08/2010), uma vez que a excepcional fundamentação per relationem se justifica em virtude do devido enfrentamento, pelo juízo primeiro de admissibilidade, dos argumentos deduzidos no recurso. Nesse sentido, inclusive, é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Inexiste violação do art. 93, IX, da Constituição Federal. A jurisprudência desta Suprema Corte é no sentido de que o referido dispositivo exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento. Enfrentadas todas as causas de pedir veiculadas pela parte, capazes de, em tese, influenciar o resultado da demanda, fica dispensado o exame detalhado de cada argumento suscitado, considerada a compatibilidade entre o que alegado e o entendimento fixado pelo órgão julgador. 2. Este Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência consolidada quanto à regularidade da fundamentação per relationem como técnica de motivação das decisões judiciais. Precedentes. 3. As razões do agravo interno não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 4. A teor do art. 85, § 11, do CPC, o “tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”. 5. Agravo interno conhecido e não provido. (RE 1397056 ED-AgR, Relator(a): ROSA WEBER (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 13/03/2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 27-03-2023 PUBLIC 28-03-2023) Anote-se que não se trata da mera invocação de motivos hábeis a justificar qualquer decisão ou do não enfrentamento dos argumentos da parte (incisos III e IV do art. 489, § 1º, do CPC/2015), mas de análise jurídica ora efetuada por este Relator, que, no caso concreto, adota a conclusão da decisão agravada quanto à insuficiência dos argumentos da parte para demonstrar algum dos requisitos inscritos no art. 896 da CLT. Nessa esteira, inclusive, é a jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça, órgão judicial precípuo para a interpretação da legislação processual comum infraconstitucional: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. 1. Inexiste ofensa aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022, II, do CPC/2015 quando o Tribunal de origem se manifesta de modo fundamentado acerca das questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, porquanto julgamento desfavorável ao interesse da parte não se confunde com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 2. Esta Corte admite a adoção da fundamentação per relationem, hipótese em que o ato decisório se reporta a outra decisão ou manifestação existente nos autos e as adota como razão de decidir. Precedentes do STJ e do STF. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 2.029.485/MA, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 19/4/2023.) AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. AÇÃO CONDENATÓRIA. PROCESSUAL CIVIL. TRANSCRIÇÃO DE TRECHOS DA SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. OMISSÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. PARÂMETROS FIXADOS EM TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. ERRO DE CÁLCULO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7, STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Não se verifica a alegada violação do art. 1.022 do CPC/2015, na medida em que a eg. Corte de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas. De fato, embora não tenha examinado individualmente cada um dos argumentos suscitados pela parte, adotou fundamentação suficiente, decidindo integralmente a controvérsia. Precedentes. 2. Nos termos do entendimento jurisprudencial adotado por este Superior Tribunal de Justiça, é admitido ao Tribunal de origem, no julgamento da apelação, utilizar, como razões de decidir, os fundamentos delineados na sentença (fundamentação per relationem), medida que não implica negativa de prestação jurisdicional, não gerando nulidade do acórdão, seja por inexistência de omissão seja por não caracterizar deficiência na fundamentação. Precedentes. (...) 5. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 2.122.110/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 24/4/2023.) Não destoa desse entendimento este Tribunal Superior do Trabalho, conforme se infere dos seguintes julgados da 3ª Turma: "A) AGRAVO DE INSTRUMENTO. INSTRUÇÃO NORMATIVA 40/TST. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. HORAS EXTRAS. INVALIDADE DO SISTEMA DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA. BANCO DE HORAS. NÃO CONFIGURAÇÃO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 126/TST. MOTIVAÇÃO POR ADOÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. TÉCNICA PER RELATIONEM. A decisão regional fica mantida por seus próprios fundamentos, registrando-se que a motivação por adoção dos fundamentos da decisão recorrida não se traduz em omissão no julgado ou em negativa de prestação jurisdicional - até mesmo porque transcritos integralmente. Isso porque a fundamentação utilizada pela instância ordinária se incorpora à decisão proferida pela Corte revisora - e, portanto, a análise dos fatos e das provas, bem como do enquadramento jurídico a eles conferido. Dessa forma, considerando-se que o convencimento exposto na decisão recorrida é suficiente para definição da matéria discutida em Juízo, com enfrentamento efetivo dos argumentos articulados pela Parte Recorrente, torna-se viável a incorporação formal dessa decisão por referência. Ou seja, se a decisão regional contém fundamentação suficiente - com exame completo e adequado dos fatos discutidos na lide e expressa referência às regras jurídicas que regem as matérias debatidas -, a adoção dos motivos que compõem esse julgamento não implica inobservância aos arts. 93, IX, da CF/88; e 489, II, do CPC/2015. Assim, a prolação de julgamentos pela técnica da motivação relacional não viola os princípios e garantias constitucionais do devido processo legal (art. 5º, LIV), do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV), além de preservar o direito à razoável celeridade da tramitação processual (art. 5º, LXXVIII). Revela-se, na prática, como ferramenta apropriada de racionalização da atividade jurisdicional. Nesse sentido, inclusive, posiciona-se a jurisprudência desta Corte Superior e do STF, segundo a qual a confirmação integral da decisão agravada não implica ausência de fundamentação, não eliminando o direito da parte de submeter sua irresignação ao exame da instância revisora. Agravo de instrumento desprovido. (...) (RRAg-10166-30.2021.5.15.0029, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 30/06/2023). "AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. NULIDADE DA DECISÃO AGRAVADA. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM . A fundamentação per relationem não importa em ofensa à garantia da fundamentação dos julgados, servindo, ao revés, de homenagem aos princípios da celeridade e da duração razoável do processo. Diante da ausência de comprovação dos requisitos intrínsecos de admissibilidade do recurso de revista (art. 896 da CLT), não se cogita de reforma da decisão que negou provimento ao agravo de instrumento. Agravo a que se nega provimento" (Ag-AIRR-1000163-07.2020.5.02.0090, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 28/04/2023). Em igual sentido colhem-se recentes julgados de todas as demais Turmas do TST: Ag-AIRR-488-25.2021.5.09.0007, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 13/06/2023; Ag-AIRR-10959-26.2018.5.18.0211, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-11355-09.2020.5.15.0084, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-1178-65.2019.5.22.0006, 5ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 23/06/2023; Ag-AIRR-1000562-31.2019.5.02.0006, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado José Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 19/05/2023; Ag-AIRR-498-82.2017.5.09.0242, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 30/06/2023; Ag-AIRR-120700-09.2006.5.02.0262, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 29/05/2023. Frise-se, ainda, que a disposição contida no art. 1.021, § 3º, do CPC/2015 se dirige ao agravo interno e, não, ao agravo de instrumento. Note-se, por fim, que a presente técnica de decisão, por si só, em nada obstaculiza o acesso da parte agravante aos demais graus de jurisdição. Nesse contexto, observado que os recursos de revista efetivamente não comportam trânsito, ante o não preenchimento dos requisitos de admissibilidade, impõe-se NEGAR PROVIMENTO ao(s) agravo(s) de instrumento. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 118, X, do Regimento Interno do TST, CONHEÇO do(s) agravo(s) de instrumento e, no mérito, NEGO-LHE(S) PROVIMENTO. Na minuta de agravo, devolvem-se a este Tribunal as insurgências concernentes aos tópicos "responsabilidade subsidiária” e “limitação da condenação ao valor dado à causa” em que a parte reclamada insiste no processamento do recurso de revista. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPRESA PRIVADA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST Do cotejo da decisão agravada com as razões do agravo de instrumento, verifica-se que a parte agravante não impugnou de forma direta e específica a fundamentação da decisão agravada quanto ao tema, consistente no óbice da Súmula 126, do TST. Não atendido, portanto, o princípio da dialeticidade, revelando-se aplicável, à hipótese, a Súmula nº 422, item I, do TST: "Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida". Nesse sentido, eis os seguintes precedentes desta 3ª turma: "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. LEIS Nos 13.015/2014 E 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RITO SUMARÍSSIMO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS EXPENDIDOS NO DESPACHO DENEGATÓRIO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SÚMULA Nº 422 DO TST . Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida (Súmula 422, I, do TST). Na espécie, a parte não impugnou o fundamento nuclear da decisão agravada, consistente na inobservância do requisito inscrito no art. 896, § 9º, da CLT. Agravo de instrumento não conhecido" (AIRR-100524-43.2023.5.01.0067, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 18/10/2024). AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017 . 1. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. 2. HORAS EXTRAS. CARGO DE CONFIANÇA. 3. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. 4. DIFERENÇAS DE FGTS. APELO DESFUNDAMENTADO QUANTO AOS TEMAS. AUSÊNCIA DE ATAQUE AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO DENEGATÓRIA. SÚMULA 422/TST. A finalidade do agravo de instrumento é a de destrancar o apelo inadmitido pela instância ordinária, objetivando demonstrar a inadequação da decisão denegatória, com explícita insurgência quanto ao óbice processual que não permitiu o processamento regular do recurso principal, em observância ao princípio da dialeticidade. Dessa forma, é necessária a objeção específica aos fundamentos da decisão denegatória . Na hipótese, ao interpor o agravo de instrumento, a Parte Agravante não impugna, especificamente, os fundamentos adotados na decisão denegatória (artigo 896, § 1º-A, I, da CLT e Súmula 126/TST ), de modo a apresentar argumentos que viabilizassem o provimento do seu apelo. Assim, não preenchido o requisito fixado pelo art. 1.016, III, do CPC/2015, o recurso não atende, em sua integralidade, ao pressuposto extrínseco da adequação, nos termos da Súmula 422, I/TST. TST. Julgados desta Corte. Agravo de instrumento não conhecido no aspecto. (AIRR-1000790-91.2019.5.02.0204, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 24/03/2023). "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE . RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E REGIDO PELO CPC/2015 E PELA IN Nº40/2016 DO TST. PRECLUSÃO. NÃO RENOVAÇÃO DOS ARGUMENTOS TRAZIDOS NO RECURSO DE REVISTA. PRINCÍPIO DA DELIMITAÇÃO RECURSAL. AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE. Tratando-se o agravo de instrumento de recurso autônomo, a parte deve, além de impugnar os fundamentos adotados na decisão recorrida, apontar de forma clara e precisa os motivos que justificam a acessibilidade à vereda extraordinária. Com efeito, em que pesem as razões do agravo de instrumento estejam vinculadas às do recurso de revista, deve-se demonstrar os elementos necessários à exata compreensão da controvérsia e à delimitação recursal. No caso, verifica-se que o recurso não alcança o conhecimento, porquanto a parte não renova os argumentos trazidos no recurso de revista em relação aos temas ali arguidos, limitando-se a impugnar genericamente o despacho denegatório do seu apelo revisional. Assim, em observância ao princípio da delimitação recursal, não se conhece do agravo de instrumento, tendo em vista a preclusão consumativa operada, estando, pois, desfundamentado o apelo. Incidência da Súmula 422, I, do TST . Agravo de instrumento não conhecido" (AIRR-11065-92.2021.5.15.0137, 3ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 03/03/2023). Ante o exposto, NÃO CONHEÇO do agravo no aspecto. Quanto ao tema remanescente, preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade, CONHEÇO do agravo. 2. MÉRITO LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES CONSTANTES NA INICIAL. Sobre o aspecto, a parte indica ofensa aos arts. 840 §1º, da CLT e 492 do CPC, aduzindo que “a redação do dispositivo não autoriza a indicação de valor estimativo (...) havendo liquidação dos pedidos pelo reclamante, consoante novel redação do art. 840 da CLT, deve ser observada, em liquidação, a limitação de cada uma das parcelas deferidas aos valores fixados na inicial”. O e. TRT consignou, quanto ao tema: Limite da condenação aos valores dos pedidos. Requer a recorrente seja a condenação limitada aos valores atribuídos aos pedidos na inicial. Aduz que a nova redação do § 1º do artigo 840 da CLT estabelece os requisitos da petição inicial, dentre eles, desde 11/11/2017, o valor líquido de cada pedido. Ao exame. Releva ponderar, inicialmente, que segundo a melhor exegese do artigo 840, parágrafo 1º, da CLT, o valor atribuído a cada pedido formulado na petição inicial pela parte autora decorre de mera estimativa, não sendo exigível que a parte realize a liquidação respectiva a cada pedido, o que somente deverá ocorrer na fase processual de liquidação. Nessa linha de raciocínio, do ponto de vista hermenêutico, mostra-se inviável considerar o referido valor como limitador do valor da condenação, para os efeitos legais. Ademais, os valores indicados na petição inicial não consideram a atualização monetária e a incidência de juros, sendo necessária a liquidação para apurar-se o valor total devido à época do pagamento, mormente porque foram acolhidos em parte os pleitos da inicial. Destarte, em consonância com o parágrafo 2º do artigo 12 da Resolução nº 221 do Tribunal Superior do Trabalho, o valor atribuído a cada pedido formulado na petição inicial terá caráter meramente estimativo, não podendo ser considerado como limitador do valor da condenação, a ser apurado na fase processual de liquidação. Nego provimento. O §1º do art. 840 da CLT, com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, dispõe que: "deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor", sem fazer distinção entre os ritos processuais. A análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados, permite chegar à conclusão de que, tendo a reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, de um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo art. 5º, LV, da CF. Trata-se, portanto, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetividade ao referido artigo celetista. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste, nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa, qualquer delimitação em sentido contrário. Com efeito, o artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida, assim dispõe: Art. 291. A toda causa será atribuído valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico imediatamente aferível. Veja-se que o artigo 291 do CPC apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula nº 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do art. 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos arts. 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. Por fim, não se ignora que a Eg. SDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Logo, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada após a vigência da Lei nº 13.467/2017, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não sendo necessária qualquer ressalva e/ou indicação de se tratarem de valores estimados, eis que já devem ser assim considerados por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os já mencionados princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Nesse sentido, cito os seguintes precedentes desta Corte: "EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho . 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu , preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta "uma breve exposição dos fatos", uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi , em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos" (Emb-RR-555-36.2021.5.09.0024, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 07/12/2023). "RECURSO DE REVISTA. LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITES DA LIDE. IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT. INAFASTABILIDADE DO JUS POSTULANDI E DOS PRINCÍPIOS DO AMPLO ACESSO À JURISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV, DA CF), DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA (ART. 1º, III, DA CF), PROTEÇÃO SOCIAL DO TRABALHO (ART. 1º, IV, DA CF), DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA (ART. 5º, LV DA CF), DA IMEDIAÇÃO (ART. 820, DA CLT), DA INFORMALIDADE, SIMPLICIDADE, DISPOSITIVO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 141, §2º E 492, DO CPC. APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. DESNECESSIDADE DE INDICAÇÃO DE RESSALVA QUANTO AO CARÁTER ESTIMADO DOS VALORES. 1. Trata-se de recurso de revista com fulcro no art. 896, c, da CLT, em que se pretende a reforma do acórdão regional recorrido quanto à limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. Aponta violação aos arts. 879, da CLT e divergência jurisprudencial. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho, 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu , preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta "uma breve exposição dos fatos", uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular ' fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi , em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela parte recorrente em seu recurso de revista, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita . 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im) possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC . 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita , submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que "Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil" . 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao "valor estimado da causa" acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial "com indicação de seu valor" a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de "valor certo" da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 15/05/2020, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não sendo necessária qualquer ressalva e/ou indicação de se tratarem de valores estimados, eis que já devem ser assim considerados por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-528-30.2020.5.12.0016, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 17/02/2023). "AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017. JULGAMENTO ULTRA PETITA - LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR INDICADO NA PETIÇÃO INICIAL. De acordo com o novel art. 840, § 1º, da CLT, com redação inserida pela Lei nº 13.467/17, " Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante ". Respeitados os judiciosos posicionamentos em contrário, a melhor exegese do referido dispositivo legal é que os valores indicados na petição traduzem mera estimativa, e não limites, à condenação, sobretudo porque, a rigor, é inviável a liquidação, já no início da demanda, de todos os pedidos deduzidos na inicial. Não se deve perder de vista os postulados que informam o processo do trabalho, em especial os princípios da proteção, do valor social do trabalho, do acesso ao Poder Judiciário, da oralidade e da simplicidade dos atos processuais trabalhistas. Sem embargo, exigir que o trabalhador aponte precisamente a quantia que lhe é devida é investir contra o próprio jus postulandi trabalhista. A propósito, não se faz necessária qualquer ressalva na petição inicial de que tais valores representam mera estimativa à liquidação do julgado, não havendo que se falar, portanto, em julgamento ultra petita na hipótese em que quantia liquidada perpasse o montante pleiteado. Agravo interno a que se nega provimento " (Ag-AIRR-11209-69.2021.5.15.0039, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 22/09/2023). (g.n.) "(...) II - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. A controvérsia gira em torno da aplicação do artigo 840, § 1º, da CLT, que foi alterado pela Lei 13.467/2017. No caso em tela, o debate acerca do art. 840, § 1º, da CLT, detém transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. Transcendência reconhecida. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. A controvérsia acerca da limitação da condenação aos valores liquidados apresentados em cada pedido da inicial tem sido analisada, pela jurisprudência dominante, apenas sob a égide dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil. Por certo que aludidos dispositivos do CPC são aplicados subsidiariamente no processo trabalhista. Entretanto, no que se refere à discussão acerca dos efeitos dos pedidos liquidados, apresentados na inicial trabalhista, os dispositivos mencionados do CPC devem ceder espaço à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 840 da CLT, que foram alterados pela Lei 13.467/2017 . Cumpre esclarecer que o TST, por meio da Resolução nº 221, de 21/06/2018, considerando a vigência da Lei 13.467/2017 e a imperativa necessidade de o TST posicionar-se, ainda que de forma não exaustiva, sobre a aplicação das normas processuais contidas na CLT alteradas ou acrescentadas pela Lei 13.467/2017, e considerando a necessidade de dar ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que no seu art. 12, § 2º, normatizou que "para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado (...)". A Instrução Normativa nº 41/2018 do TST, aprovada mediante Resolução nº 221, em 02/06/2018, registra que a aplicação das normas processuais previstas na CLT, alteradas pela Lei 13.467/2017, com eficácia a partir de 11/11/2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidadas sob a égide da lei revogada. Portanto, no caso em tela, em que a inicial foi ajuizada no ano 2020 , hão de incidir as normas processuais previstas na CLT alteradas pela Lei 13.467/2017. Assim, a discussão quanto à limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial deve ser considerada apenas como fim estimado, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta Corte. Esse foi o entendimento do Regional . Há precedentes. Agravo de instrumento não provido" (Ag-AIRR-10068-79.2020.5.03.0040, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 22/09/2023). "(...) 2. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. VALORES PLEITEADOS NA INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ART. 840, § 1º, DA CLT. VALORESDECLINADOS REFLETEM MERA ESTIMATIVA. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. RECONHECIMENTO. I. Esta Corte Superior entende que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 do TST . Precedentes. II. No caso, o Tribunal Regional entendeu que os valores da condenação deverão ser limitados aos valores apresentados nos pedidos trazidos na reclamação trabalhista. III . A presente ação foi ajuizada em 2018, na vigência da Lei n.º 13.467/2017. Após as alterações promovidas no art. 840, § 1º, da CLT, pela Lei nº 13.467/2017, e a par da jurisprudência precedente à referida modificação legislativa, o TST aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que regulamenta a aplicação das normas processuais contidas na CLT, alteradas ou acrescentadas pela Reforma Trabalhista, cujo artigo 12, § 2º, dispõe que " § 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado , observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil ". Com efeito, é razoável que os valores objeto da condenação sejam apurados definitivamente em liquidação, quando, então, será possível aferir, com base nos documentos e demais informações trazidas aos autos, o quantum realmente devido, razão pela qual não se pode limitar a condenação aos valores expressos na petição inicial, porquanto meramente estimativos. Nessa medida, a decisão regional que limitou a condenação aos valores dos pedidos indicados na petição inicial viola o art. 840, § 1º, da CLT. IV. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-1000290-38.2018.5.02.0502, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 15/09/2023). "(...) RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. Há transcendência jurídica da causa, nos termos do inciso IV do § 1º do art. 896-A da CLT, uma vez que a inviabilidade da limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na inicial é questão nova disciplinada por dispositivo da CLT alterado pela Lei 13.467/2017 (art. 840, § 1º, da CLT) e normatizado pelo parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta c. Corte. 2. A causa se refere à determinação de que, por ocasião da liquidação de sentença, os valores apurados não poderiam ultrapassar os valores líquidos atribuídos pelo reclamante na petição inicial. 3 . Com a Reforma Trabalhista, foi alterado o §1º do art. 840 da CLT. Visando a orientar a aplicação das normas processuais introduzidas pela Lei nº 13.467/2017, foi editada por esta Corte a Instrução Normativa nº 41, que assim dispôs sobre a aplicação do art. 840, § 1º, da CLT: "§ 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil". Desse modo, e considerando que a reclamação trabalhista foi ajuizada na vigência da Lei nº 13.467/2017, não há se falar em limitação da condenação aos valores estipulados nos pedidos apresentados de forma líquida na inicial, uma vez que estes são apenas estimativas do valor monetário dos pleitos realizados pela parte reclamante. Assim, tem-se que os valores estipulados na inicial são apenas para fins estimativos. Precedentes. Assim, os valores atribuídos aos pedidos elencados na inicial são apenas para fins estimativos, de modo que o valor efetivamente devido ao reclamante deve ser apurado em regular liquidação de sentença . Recurso de Revista conhecido e provido" (RRAg-1001301-63.2018.5.02.0030, 8ª Turma, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 04/07/2022). Nesse contexto, não tendo sido apresentados argumentos suficientes à reforma da decisão agravada, deve ser desprovido o agravo. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – não conhecer do agravo quanto ao tema “responsabilidade subsidiária” e II – conhecer do agravo quanto ao tema “limitação da condenação aos valores constantes na inicial” e, no mérito, negar-lhe provimento. Brasília, 27 de junho de 2025. ALBERTO BASTOS BALAZEIRO Ministro Relator Intimado(s) / Citado(s) - COSMA DO BRASIL PRODUTOS E SERVICOS AUTOMOTIVOS LTDA.

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Processo nº 0004860-09.2024.8.17.3250

ID: 255788975

Tribunal: TJPE Órgão: 2ª Vara Cível e Regional da Infância e Juventude da Comarca de Santa Cruz do Capibaribe Classe: AÇÃO CIVIL PÚBLICA INFÂNCIA E JUVENTUDE Nº Processo: 0004860-09.2024.8.17.3250

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

L. G. D. S. F.

Decisão

Advogados:

MONIELLE SILVA DOS SANTOS

OAB/SE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 2ª Vara Cível e Regional da Infância e Juventude da Comarca de Santa Cruz do Capibaribe Rod Rodovia PE 160, KM 12, SANTA CRUZ DO CAPIBARIBE - PE - C… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 2ª Vara Cível e Regional da Infância e Juventude da Comarca de Santa Cruz do Capibaribe Rod Rodovia PE 160, KM 12, SANTA CRUZ DO CAPIBARIBE - PE - CEP: 55190-000 - F:(81) 37598281 Processo nº 0004860-09.2024.8.17.3250 AUTOR(A): 1º PROMOTOR DE JUSTIÇA CIVEL DE SANTA CRUZ DO CAPIBARIBE RÉU: L. G. D. S. F. DECISÃO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, pela 1ª Promotoria de Justiça Cível de Santa Cruz do Capibaribe, ajuizou a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA em face de LAÉRCIO GLICÉRIO DA SILVA FILHO, sob a alegação de que o demandado violou seus deveres funcionais como conselheiro tutelar. Narra a petição inicial que a rede de proteção à criança em Santa Cruz do Capibaribe, formada pelo Conselho Tutelar, Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS) e Casa de Acolhimento Maristela Monteiro (CAMM) noticiou que o demandado, por sucessivas vezes, violou seus deveres funcionais.Dentre as condutas praticadas, em tese, pelo demandado, aponta a utilização da estrutura física do Conselho Tutelar e coação de subordinados visando finalidade de propaganda eleitoral, a ausência de cordialidade com seus colaboradores, com um comportamento agressivo, ausência à sede do Conselho Tutelar, mesmo nos dias fixados para atendimento à população, falta de submissão de suas decisões ao referendo do colegiado do órgão, inclusive nos casos de aplicação de medidas de proteção para tutela dos interesses de crianças e adolescentes, e ausência aos plantões do órgão, prejudicando a realização dos trabalhos. Relata, a título exemplificativo, que, no dia 28 de agosto de 2024, o demandado pediu ao digitador do Conselho Tutelar a realização de ajuste em santinhos para distribuição na Campanha Eleitoral de 2024, em benefício de diversos candidatos, ainda durante o horário do expediente, inclusive especificando as dimensões daquilo que queria, mediante utilização de computador da respectiva unidade de trabalho, uso de bem público em benefício privado que teria ocorrido em outra ocasião. Já no dia 18 de agosto de 2024, por volta das 4h da manhã, ao apresentar duas crianças para acolhimento na Casa de Acolhimento Maristela Monteiro (CAMM), diante de questionamentos acerca das circunstâncias do caso concreto, em comportamento não cordial, teria afirmado à cuidadora que quem mandava na casa era ele, bem como que a advogada, a diretora e a equipe técnica do local não detinham conhecimento acerca das leis, asseverando que ninguém o impediria de acolher os infantes, nem o obrigaria a comunicar o fato à família das crianças. Após, em 21 de setembro de 2024, por volta de 13h30, a autoridade policial teria solicitado a presença do conselheiro plantonista, que era o demandado, porém não teria obtido nenhuma resposta, somente vindo a responder aos chamados de seus pares por volta das 17h19, quando a situação já havia sido resolvida pelo colegiado do conselho, haja vista a necessidade de um urgente acolhimento institucional. Assevera, ainda, a petição inicial que, durante uma das ações do Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), referente a duas crianças que estavam doentes, com náuseas, conduzidas em um carro de reciclagem por seus pais, o demandado teria abordado de maneira inadequada o patriarca da família, subindo o tom de voz e sugerindo que possuiria uma arma de fogo e a utilizaria caso fosse necessário, bem assim teria se dirigido com ameaça a uma assistente social, diante da morte de pessoa em situação de rua. A seguir, em 27 de outubro de 2024, o demandado teria acolhido duas crianças, uma delas lactantes, somente porque estavam em posto de saúde, na companhia de seus pais, sem documentos, realizando pedido de ajuda financeira, à revelia do colegiado do Conselho Tutelar e das orientações da autoridade policial, destacando, segundo narra o Promotor de Justiça, que possuía muitos mandatos como Conselheiro Tutelar, bem assim que tomaria as decisões sozinho, a revelia do entendimento de outros profissionais. Narram, ainda, as denúncias que o Conselheiro estaria utilizando o telefone do Conselho Tutelar para uso próprio. Aponta a peça de ingresso que o Conselheiro Tutelar foi advertido acerca da quebra de seus deveres funcionais, mas continuou a praticar condutas vedadas pela ordenamento jurídico, descumprindo sobremodo as recomendações do autor da ação civil pública, a ensejar a necessidade de tutela jurisdicional. Diante desses fatos, requer: 1. Com base no artigo 12 da Lei nº 7.347/85 e do artigo 213, § 1º, da Lei nº 8.069/90, a concessão de tutela provisória de urgência para se determinar o afastamento do Demandado de suas funções como conselheiro tutelar de Santa Cruz do Capibaribe até decisão final, sem vencimentos, mesmo porque inviável a permanência dele no cargo em razão dos fatos acima elencados, sob pena de continuar causando prejuízos ao atendimento e à proteção dos direitos das crianças e adolescentes de Santa Cruz do Capibaribe; 2. Concedida a tutela provisória de urgência, que se determine ao Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente - COMDECA a imediata convocação do suplente, conforme ordem de classificação obtida no respectivo pleito, bem como seja tal medida comunicada à Secretaria Municipal afetada para suspender também o pagamento de remuneração ao Demandado a partir de então; 3. A citação do demandado para contestar a presente ação, sob pena de decretação de revelia com a produção dos efeitos que, em regra, são inerentes; 4. Seja decretado sigilo quanto aos documentos anexos devidamente identificados como tal (arts. 189, II e III do CPC e 206 do ECA), eis que referentes aos casos individuais de crianças e adolescentes atendidos pelo conselho tutelar; 5. A notificação do Município de Santa Cruz do Capibaribe para, querendo, vir integrar a lide, na forma do §2º do art. 5º da Lei Federal n. 7.347; 6. A PROCEDÊNCIA dos pedidos veiculados na presente Ação, com o AFASTAMENTO DEFINITIVO do demandado, assim como DESTITUIÇÃO do cargo de conselheiro do Conselho Tutelar de Santa Cruz do Capibaribe e a DECLARAÇÃO DE INABILITAÇÃO para futuras eleições para o cargo. Com a inicial, juntou documentos: registro audiovisual de impressão de documentos, registro audiovisual contendo um questionamento sobre eventual escuta, não especificada, relatório social, no qual a assistente social Rozenilda Maria Silva relata que o demandado teria afirmado que um morador de rua teria falecido em decorrência da falta de ação do município, inclusive de modo ríspido, com tom de voz alterado, sugerindo que uma residência fosse invadida, a fim de resgatar crianças em situação de risco, além de ter ameaçado o pai de crianças doentes, conduzidas em um carro de reciclagem, indicando que possuiria arma de fogo e a usaria, fato testemunhado por dois agentes públicos, Boletim de Ocorrência nº 24I0319168597, no qual Rozenilda Maria da Silva alega que foi desacatada pelo demandado, cadastro de pessoas em situação de rua, referente ao morador de rua citado pelo demandado, captura de tela de conversa pelo WhatsApp, no qual uma pessoa não identificada envia mensagem, em tese, à Promotoria de Justiça de Santa Cruz do Capibaribe, alegando que o demandado teria saído antes das 12h, com um celular que é de propriedade do Conselho Tutelar, relatório noticiando o acolhimento de crianças, sob o relato de suposta denúncia de que seu pai estaria realizando extorsão ou pedidos em posto de saúde e não teria documentos pessoais delas, sendo uma delas lactante, além de possível atuação em Jataúba, para explicações sobre ação de guarda, ofício, em que dois conselheiros tutelares alertam que o demandado não atendera a chamado da autoridade policial, durante o plantão, mensagem na qual se noticia a remessa de arquivo de audiovisual demonstrando a utilização de equipamentos do Conselho Tutelar para fins privados, mensagem em que se noticia o envio de arquivo de áudio, no qual o demandado teria solicitado que o digitador do Conselho Tutelar produzisse material de campanha eleitoral a pedido do demandado e ofício, no qual a Casa de Acolhimento Maristela Monteiro (CAMM) noticia que o demandado teria agido de forma agressiva ao ser questionado sobre o acolhimento de duas crianças, afirmando que mandava na instituição, acompanhado dos documentos referentes ao abrigamento das crianças. A seguir, a parte autora juntou endereço eletrônico para acesso a arquivo de áudio, no qual se verifica o pedido para a produção de 10 (dez) adesivos, com a voz do demandado exigindo a confeccção do material (ID. 189358452). Declarada a suspeição do Juiz Titular da 2ª Vara Cível e Regional da Infância e Juventude da Comarca de Santa Cruz do Capibaribe/PE, por motivo de foro íntimo (ID. 189406113). Após providências relacionadas à comunicação da declaração de suspeição, houve remessa dos autos a este Juízo. Determinada a intimação pessoal do demandado, para manifestação sobre os fatos narrados (ID. 191664653). Devidamente intimado, o demandado requereu a habilitação de sua advogada nos autos (ID. 194186137). Requerida dilação de prazo para manifestação (ID. 194187674). Certificada a habilitação da advogada e seu cadastro como visualizadora do processo (ID. 194345441). Expedida intimação acerca da habilitação nos autos (ID. 194345453). Requerida nova dilação de prazo (ID. 194450999). Petição da parte autora pela apreciação do pedido liminar (ID. 194582363). Petição da parte ré, na qual reitera o pedido de dilação de prazo (ID. 194699556). A seguir, a parte autora juntou novos documentos, que demonstrariam outras irregularidades atribuídas ao demandado no exercício da função de conselheiro tutelar (ID. 200817769), assinado por outros Conselheiros Tutelares, que narram ausência do Conselheiro à plantão de sua responsabilidade, tendo justificado a colega que atendeu à ligações com atraso porque estaria em inauguração de escola. Narram os documentos, ainda, que a população local estaria insatisfeita com inércia do conselheiro Laércio. Narrou, por fim, possível prevaricação ou similar por parte do Conselheiro que mesmo ciente de estupro de vulnerável sofrido por criança de 3 anos, durante seu plantão, deixou de registrar boletim de ocorrência a respeito do fato. Autos conclusos. É o relatório. Decido. Inicialmente, destaco que, nos termos da regra do art. 9º, § 1º, da Lei nº 11.419/2006, no processo eletrônico, todas as citações, intimações e notificações das partes serão feitas eletronicamente, implicando, quando possibilitarem acesso a conteúdo da íntegra do processo, vista pessoal do interessado para todos os fins legais, que impede a dilação de prazos processuais, sob pena de violação à duração razoável do processo e ao devido processo legal. A esse respeito, destaco o seguinte julgado: DIREITO ADMINISTRATIVO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO AJUIZADA POR MUNICÍPIO CONTRA PESSOA JURÍDICA E ACIONISTAS. CONSTRUÇÃO DE ESCOLA INFANTIL. PLANO NACIONAL DE EDUCACAO - PROINFÂNCIA . INEXECUÇÃO CONTRATUAL. RESSARCIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA . RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INVIABILIDADE NO CASO CONCRETO . PRECEDENTE DESTE TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL JULGADO PELA SISTEMÁTICA DO ARTIGO 942 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 1. O acesso integral aos autos eletrônicos, mediante intimação, equivale a vista pessoal, implicando ciência de todos os atos até então proferidos (Lei nº 11.419/2006); 2 . No processo eletrônico, a intimação é para acesso aos autos, e não para determinada decisão, a não ser que, de forma inequívoca, seja somente para algum ato em especial, circunstância que deve estar demonstrada de forma inequívoca. Assim, ao acessar os autos a parte tem o dever de tomar ciência de todas as decisões até então proferidas, sob pena de restarem preclusas. Precedente deste Tribunal Regional Federal: Agravo de Instrumento nº 5036791-35.2017 .4.04.0000, 4ª Turma, rel. Des . Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 14-12-2017; 3. O contexto em que se deu o inadimplemento contratual por parte da empresa Gatron, empresa que firmou o contrato, as eventuais omissões atribuíveis a entidades integrantes da administração pública, e bem assim a discussão sobre a responsabilidade dos sócios constituem temas comprováveis por documentos, mostrando-se desnecessária a produção de prova testemunhal e perícia contábil, pelo que deve ser afastada a alegação de cerceamento de defesa; 4. Evidenciada a inexecução contratual, a empresa que se obrigou a construir a escola deve ser condenada a reparar os danos decorrentes do não cumprimento do pacto celebrado com o município; 5. A aplicação da teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica é reservada a casos específicos, até porque baseada em pressupostos mais genéricos, prescindindo da demonstração de fraude ou de abuso de direito, como acontece, por exemplo, em muitas situações nas relações consumeristas (artigo 28 da Lei 8 .078/90), ou mesmo nos casos de danos causados ao meio-ambiente (artigo 225, § 3º, da Constituição Federal, c/c artigo 14, § 1º, da Lei 6.938/81); 6. Em se tratando de inexecução contratual, as pessoas jurídicas que integram o quadro societário da empresa que contratou a obra somente podem responder pelo dano se evidenciados os requisitos da teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica, a qual foi consagrada no artigo 50 do Código Civil mesmo antes da alteração promovida pela Lei 13.874/2019; 7 . No caso concreto não há elementos a justificar a aplicação da disregard doctrine em sua modalidade ampla (teoria maior), seja sob a ótica subjetiva (fraude/abuso de direito), seja sob a ótica objetiva (confusão patrimonial); 8. O que ocorreu foi o descumprimento de contrato por pessoa jurídica, pelo que seus sócios, sejam pessoas físicas ou jurídicas, tendo responsabilidade submetida aos termos da lei, não respondem automaticamente por eventuais atos ilícitos por ela praticados; 9. Meras presunções não se prestam a amparar decreto de desconsideração da personalidade jurídica; 10. Na hipótese sub judice não há prova de efetiva de confusão patrimonial, ou sequer de que a pessoa jurídica tenha sido constituída com objetivo fraudulento, em especial para causar danos ao poder público, nos estritos termos do artigo 50 do Código Civil, não se prestando a tanto o fato de existirem diversos outros processos similares em tramitação no Rio Grande do Sul, de ter sido a obra abandonada e de a contratação ter envolvido a aplicação de metodologia inovadora; 11 . A despeito da relevância da obra, destinada ao atendimento de crianças, e bem assim do alegado uso de tecnologia construtiva inovadora, trata-se de caso em que houve inadimplemento contratual. Não podem ser ignorados, apenas pelas características da contratação, os preceitos relacionados à personalidade que integram nosso ordenamento jurídico, seja por força da Constituição Federal, seja mais especificamente por força do Código Civil. 12. Obra pública sempre pressupõe situação diferenciada . Incontendível, ademais, a importância das áreas da educação infantil e de atendimento a crianças. Mas áreas outras, como as da segurança e a da saúde (em destaque no momento de pandemia ora vivenciado), apresentam igualmente indiscutível relevância. Daí porque não se pode não se pode, por conta da relevância da obra, desconsiderar a personalidade jurídica do contratante para responsabilizar as pessoas dos sócios, sem que presentes os requisitos previstos no Código Civil para tanto; 13. Precedente deste Tribunal Regional Federal julgado pela sistemática do artigo 942 do Código de Processo Civil: AC 5012806-77 .2017.4.04.7100, 4ª Turma, rel . para acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 6-9-2021. (TRF-4 - APL: 50112195920184047108, Relator.: VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 21/09/2022, TERCEIRA TURMA) Ao examinar o feito, percebo que o demandado postulou a habilitação de sua advogada no dia 3 de fevereiro de 2025 (ID. 194186137), o que foi realizado pela Diretoria Regional do Agreste em 4 de fevereiro de 2025, inclusive mediante necessário cadastro como visualizadora dos autos (ID. 194345441), com intimação do ato de concessão de acesso aos autos no mesmo dia, 4 de fevereiro de 2025 (ID. 194345453), ocasião em que fora deflagrado o prazo de 15 (quinze) dias para manifestação acerca do pedido liminar formulado pela parte autora, que foi totalmente ignorado. Nada obstante o decurso de longo período de tempo, a parte demandada se limitou a requerer sucessivas dilações de prazo para manifestação sobre o pedido liminar, sem apresentar nenhuma fundamentação idônea, como excesso de documentos ou dificuldades em seu acesso, de modo que inexiste a justa causa para o deferimento dos pedidos formulados pelo demandado, sobremodo quando se considera que sua habilitação ocorreu há 2 (dois) meses, o que permitia sua participação na formação do convencimento deste juízo, diante da regra do art. 493 do Código de Processo Civil. Sobre o assunto, destaco que a ausência de demonstração de justa causa impede a dilação de prazos, conforme iterativa jurisprudência. Possibilitar dilação de prazo processual quando não havia impedimento à apresentação de manifestação prévia do ora demandado, com a devida vênia, seria possibilitar que a parte se beneficiasse de sua própria torpeza, dado que teve acesso aos autos desde fevereiro de 2024, todavia resolveu não apresentar manifestação, o que pode configurar indevido atraso na entrega da prestação jurisdicional caso admitida, em clara violação ao conteúdo do art. 4º do Código de Processo Civil. Na linha da jurisprudência do Tribunal de Justiça de Pernambuco, somente nos casos de inexistência de certidão sobre a data de habilitação e liberação do acesso autos, é possível prorrogar o prazo para manifestação da parte, porquanto a situação implicará violação direta aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, o que não ocorre no presente feito, no qual não há documentos com sigilio oponível às partes e há comprovação da regular habilitação, inclusive com intimação desta: EMENTA. AGRAVO DE INSTRUMENTO . AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.REGULARIDADE DA CITAÇÃO. PROCESSO DISTRIBUÍDO EM SEGREDO DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE DE ACESSO AOS AUTOS .NECESSIDADE DE HABILITAÇÃO DO ADVOGADO E RETIRADA DO SIGILO - NÃO APRESENTAÇÃO DE DEFESA - JUSTA CAUSA EXISTENTE – RECURSO PROVIDO. 1. No caso em análise, tem-se que a citação por edital se deu em consonância com o devido processo legal, frente à impossibilidade de localização do réu por meios convencionais. Outrossim, ainda que se considere inválida a citação editalícia deste, verifico que o agravante foi citado pessoalmente em 25 de abril de 2022, tendo sido juntado o mandato nesta mesma data (ID 103852661 – autos de origem) . 2. Quanto a alegação de prejuízo por parte do agravante, ante a ausência de conhecimento do conteúdo do processo, entendo que merece prosperar, visto que os autos foram classificados como em "segredo de justiça" e, a alteração da classe só foi determinada na decisão que decretou a revelia deste. 3. Neste ponto, faz-se mister destacar que, que a mera juntada do pedido de habilitação no PJE não permite concluir que o advogado do agravante teve acesso ao conteúdo dos autos, devido ao rito sigiloso . 4. Desta feita, nos casos de inexistência de certidão informando quando ocorreu a habilitação e a liberação do acesso autos, o prazo para a apresentação de defesa deve correr da data da intimação do réu para ciência da decisão que retira o segredo de justiça. Isto porque, a ausência de comprovação de disponibilização dos autos, constitui violação direta aos princípios constitucionais de ampla defesa e contraditório, sendo indevida, por essa razão, a decretação da revelia do agravante. 5 . Recurso a que dá provimento. (TJ-PE - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 0001882-61 .2022.8.17.9480, Relator.: VALERIA BEZERRA PEREIRA WANDERLEY, Data de Julgamento: 27/03/2024, Gabinete do Desa . Valéria Bezerra Pereira Wanderley 2ª TCRC) Diante dessas considerações, considerando que a parte demandada teve prazo superior a dois meses para apresentar manifestação prévia, INDEFIRO o pedido de dilação de prazo. Prosseguindo, destaco que, nos termos dos arts. 11 e 12 da Lei nº 7.347/1985, na ação que tenha por objeto cumprir a obrigação de fazer ou a obrigação de não fazer, o juiz determinará cumprimento da prestação da atividade ou a cessação de uma atividade nociva, sob pena de execução específica ou cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, admitida a concessão de mandado liminar. Ainda que a lei seja omissa acerca dos requisitos para concessão de medida liminar em ação civil pública, é iterativo o entendimento de que deve ser aplicado o regime das tutelas provisórias previsto no Código de Processo Civil, conforme permitido pelo art. 19 da Lei nº 7.347/1985. Sobre o ponto, confira-se o seguinte excerto doutrinário: Não há no artigo em comento referência a quais requisitos seriam necessários para a concessão do mandado liminar, de modo a se aplicar, então, o regime geral (nessa linha: TRF-4R, AG 5006809-15.2013.404.0000/RS, 3.ª Turma, rel. Des. Federal Fernando Quadros da Silva, j. 05.06.2013, a. 06.06.2013). Assim, conta-se, basicamente, com dois requisitos: a probabilidade e o perigo – ou, conforme o caso, uma espécie de perigo. Enquanto provimento de urgência, a decisão liminar não é baseada em cognição exauriente. Permite-se que seja proferida com fundamento na verossimilhança das alegações, e não na certeza. Ou seja, é suficiente que as alegações de fato sejam verossímeis, já que exigir que o juiz chegue à certeza é incompatível com a própria situação material de perigo. É nesse sentido que a “tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito” (art. 300, caput, do CPC). Igualmente, é significando a probabilidade do direito – verossimilhança – que se deve interpretar o § 3.º do art. 84 do CDC, o qual dispõe que, “sendo relevante o fundamento da demanda”, pode ocorrer a antecipação de tutela. Quanto ao perigo, vale inicialmente notar que o CPC dispõe que a tutela de urgência será concedida quando, além da probabilidade, houver “o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo” (art. 300, caput). Certamente, para que não se indefira a liminar por se entender que possui natureza diversa da requerida, a previsão tem o intuito de simplificar, unificando os requisitos das espécies de tutela de urgência – embora haja procedimentos diversos para cada uma ser concedida em caráter antecedente (arts. 303 a 310). Porém, com base na diferenciação que foi feita entre tutela antecipada e tutela cautelar (ver o item 4.2), é possível notar uma distinção entre dois tipos de perigo, de maneira que para a liminar satisfativa seja necessário um perigo de demora (para evitar a tardividade da tutela ao final concedida), enquanto para a liminar cautelar, um perigo de dano (para evitar a infrutuosidade da tutela ao final concedida) (v., sobre isso, TESSER, 2014, passim). Ainda, cabe anotar que, na análise do preenchimento deste segundo requisito para concessão da liminar – mormente na de natureza satisfatória e não obstante a relevância desta –, é necessário verificar se não há um “perigo de demora inverso”, ou seja, se não será gerado um risco igualmente ou mais grave para o réu (e até mesmo para terceiros), o que tem impacto ainda mais acentuado em situações coletivas. Nesse sentido, já decidiu o STJ: “I – A questão versa acerca de decisão liminar, proferida em sede de ação civil pública, determinando que os recorrentes modificassem o sistema de telefonia pré-pago, visando acabar com a prescrição dos créditos telefônicos. II – Neste panorama, a utilização do artigo 273 do CPC [de 1973], sem atinência às consequências impostas aos ora recorrentes, implica na hipótese da incidência de periculum in mora inverso. Para a execução do acórdão informado pelo presente apelo nobre, far-se-ia necessária uma alteração no sistema técnico implantado, o que implicaria em efetivo prejuízo para os recorrentes em face mesmo da mudança no planejamento, que segundo os recorrentes importa em investimentos da ordem de R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais) para os próximos dois anos. […]” (REsp 736.439/PB, 1.ª Turma, rel. Min. Francisco Falcão, j. 16.05.2006, DJ 01.06.2006). Igualmente o STF, embora analisando requerimento de efeito suspensivo a recurso, já se deparou com situação que ensejaria um periculum in mora inverso, “consistente na exposição dos consumidores, da sociedade em geral e, em particular, da condição objetiva da livre concorrência, ao risco da continuidade do funcionamento de empresa para tanto inabilitada”. (AC 1.657-MC/RJ, Pleno, rel. Min. Joaquim Barbosa, rel. p/ acórdão Min. Cezar Peluso, j. 27.06.2007, DJe 30.08.2007). A questão, a propósito, guarda pertinência com o perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (a seguir). (MOREIRA, Egon Bockmann et al. Comentários à Lei de Ação Civil Pública: comentada e atualizada, artigo por artigo, à luz da jurisprudência e da doutrina. 3. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2024) Nesse contexto, conforme dispõe o art. 300 do Código de Processo Civil, para a concessão de tutela de urgência será necessário analisar os requisitos da probabilidade do direito invocado, perigo da demora ou risco ao resultado útil do processo, bem como a ausência de perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão: Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. § 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. § 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. A tutela de urgência, tal como prevista no Código de Processo Civil, busca resguardar situações nas quais a demora no reconhecimento do direito prejudica a parte. Nesse caso, há, portanto, a necessidade da demonstração do perigo da demora e da verossimilhança das alegações, como afirma Nelson Nery Júnior: Requisitos para a concessão da tutela de urgência: periculum in mora. Duas situações, distintas e não cumulativas entre si, ensejam a tutela de urgência. A primeira hipótese autorizadora dessa antecipação é o periculum in mora, segundo expressa disposição do CPC 300. Esse perigo, como requisito para a concessão da tutela de urgência, é o mesmo elemento de risco que era exigido, no sistema do CPC/1973, para a concessão de qualquer medida cautelar ou em alguns casos de antecipação de tutela. Requisitos para a concessão da tutela de urgência: fumus boni iuris. Também é preciso que a parte comprove a existência da plausibilidade do direito por ela afirmado (fumus boni iuris). Assim, a tutela de urgência visa assegurar a eficácia do processo de conhecimento ou do processo de execução (Nery. Recursos7 n. 3.5.2.9, p. 452). Discricionariedade do juiz. Demonstrados o fumus boni iuris e o periculum in mora, ao juiz não é dado optar pela concessão ou não da tutela de urgência, pois tem o dever de concedê-la. É certo que existe certa dose de subjetividade na aferição da existência dos requisitos objetivos para a concessão. Mas não menos certo é que não se pode falar em poder discricionário do juiz nesses casos, pois não lhe são dados pela lei mais de um caminho igualmente legítimo, mas apenas um (Nery. Recursos7, n. 3.5.2.9, p. 454, tomando como parâmetro a antiga medida cautelar, mas em parâmetro que, a julgar pela estruturação dada à atual tutela de urgência, se aplica a ela). (JÚNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil – Novo CPC – Lei 13.105/2015. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 912/913). Ainda, é de se salientar que a pretensão de afastamento de conselheiro tutelar não atrai a incidência do art. 1º, § 3º, e do art. 2º da Lei nº 8.437/1992, porque não há pessoa jurídica de direito público no polo passivo da demanda, sendo que todos os efeitos a serem suportados pela Administração Pública decorrem da mera eficácia ultra partes de eventual pronunciamento deste Poder Judiciário. Nesse sentido, a jurisprudência vem entendendo que não há litisconsórcio com ente público no presente caso: Apelação Cível – Ação Civil Pública – Perda da função de conselheiro tutelar – Processo redistribuído da 16ª Vara da Infância e Juventude para a 3ª Vara Privativa da Fazenda Pública – Processamento do feito com fulcro na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa) – Ausência de ente público como litisconsorte na demanda – Incompetência absoluta das Varas Privativas da Fazenda Pública – Reconhecimento de ofício – Sentença nula – Remessa dos autos a uma das varas cíveis comuns da Comarca de Aracaju - Recurso conhecido e provido. (Apelação Cível Nº 201500701479 Nº único: 0000447-31.2012.8.25.0087 - 1ª CÂMARA CÍVEL, Tribunal de Justiça de Sergipe - Relator(a): Elvira Maria de Almeida Silva - Julgado em 30/06/2015) (TJSE. Acórdão. Processo nº 0000447-31.2012.8.25.0087. Órgão Julgador: 1ª Câmara Cível. Relator (a): Elvira Maria de Almeida Silva. Data do julgamento: 29/06/2015.) Diante dessas breves considerações, passo ao exame das condutas narradas pela parte autora, a partir do requisito da probabilidade do direito, com posterior exame do conjunto da postulação, do perigo de dano e do risco de irreversibilidade, ou não, da medida liminar. 1. Utilização da função de conselheiro tutelar para exercício de atividade político-partidária Narra a petição inicial que o demandado, por diversas vezes, utilizou o Conselho Tutelar para exercício de atividade de natureza político-partidária, coagindo subordinados para criação de publicidade impressa em favor de candidatos, requisitando a colocação de informações que lhe identificassem. Aponta que, além da utilização de trabalhos dos servidores públicos vinculados ao Conselho Tutelar, computadores do mencionado órgão foram utilizados com finalidade político-partidária, para criação de material de propaganda, em total desacordo com a legislação eleitoral. É, em síntese, a imputação realizada pela parte autora. Nos termos do art. 73, I, da Lei nº 9.504/1997, é proibida, aos agentes públicos, servidores ou não, a conduta de ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios ou dos Municípios, ressalvada a realização de convenção para a escolha de candidatos. Ademais, conforme regra do art. 73, § 7º, também da Lei nº 9.504/1997, as condutas enumeradas no dispositivo são aptas a configurar atos de improbidade administrativa, citados no art. 11, I, da Lei nº 8.429/1992, e se sujeitam às disposições daquele diploma legal, em especial às cominações previstas no art. 12, III, também da Lei nº 8.429/1992, de que ressoa evidente a gravidade da imputação. Não se pode esquecer que a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que a Lei nº 14.230/2021, que reformou a Lei nº 8.429/1992, não afastou a caracterização, como ato ímprobo, das condutas do art. 73 da Lei nº 9.504/1997, que se agregam ao rol taxativo do art. 11 da Lei nº 8.429/1992, considerando que se trata de legislação especial, cuja necessidade de proteção pelo ordenamento jurídico é prevista diretamente pelo legislador ordinário. Confira-se, por oportuno, o julgado mencionado: ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 1.199/STF. RETROATIVIDADE DA LEI 14.230/2021. REVOGAÇÃO DO INCISO I DO ART. 11 DA LEI 8.429/1992. IRRELEVÂNCIA. CONTINUIDADE TÍPICO-NORMATIVA. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TIPICIDADE DAS CONDUTAS PREVISTAS NOS INCISOS I E II C/C §7º DO ART. 73 DA LEI 9.504/1997. ALTERAÇÃO DAS PENALIDADES RELATIVAS AO INCISO III DO ART. 12 DA LIA. AFASTAMENTO DA PENA DE SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. PARCIAL PROVIMENTO DO AGRAVO. 1. Consoante o quanto pacificado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), as normas benéficas da Lei 14.230/2021 se aplicam a processos sem trânsito em julgado da decisão condenatória. Expansão da aplicação do Tema 1.199/STF para além da revogação da modalidade culposa, alcançando as condenações com base no art. 11 da 8.429/1992. 2. Caso concreto em que a conduta de utilizar o telefone fornecido pela Câmara Legislativa para fins particulares e eleitorais mantém-se típica expressamente nos incisos I e II do art. 73 da Lei Eleitoral, combinado com o seu parcial e tacitamente alterado §7º. 3. A revogação do inciso I do art. 11 da LIA e a atual taxatividade prevista no caput desse dispositivo não alteram a tipicidade dos atos ímprobos previstos na legislação esparsa, resguardando-se a vontade do legislador constitucional e ordinário no sentido de que os atos de improbidade administrativa, na forma e gradação previstas em lei, importarão o sancionamento do agente ímprobo. Incidência do princípio da continuidade típico-normativa. 4. O §7º do art. 73 da Lei 9.504/1997, a prever que as condutas enumeradas no seu caput caracterizam atos de improbidade administrativa, não se combaliu com a promulgação da Lei 14.230/2021, pois o rol de condutas proibidas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais previsto no caput do art. 73 da Lei Eleitoral se agrega ao rol taxativo previsto no art. 11 da LIA, em que pese esteja alocado em lei extravagante. Expressa incidência do §1º do art. 1º e do §2º do art. 11 da LIA. Hipóteses cuja tipicidade se mantém à luz do §7º do art. 73 da Lei 9.504/1997. A revogação da previsão generalizante presente no inciso I do art. 11 da LIA não afeta as hipóteses específicas taxativamente previstas nos incisos do caput do art. 73 da LE. 5. A Lei 14.230/2021, em que pese não tenha alterado a tipicidade da conduta do demandado, alterou em seu benefício, de modo significativo, o inciso III do art. 12 da LIA, não mais sendo possível aplicar a pena de suspensão de direitos políticos. 6. Agravo interno parcialmente provido para conhecer do agravo e dar parcial provimento ao recurso especial, mantendo a condenação, mas afastando a pena de suspensão de direitos políticos. (STJ - AgInt no AREsp: 1479463 - SP (2019/0091816-0), Relator: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 03/12/2024, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/12/2024) De outra parte, conforme a norma do art. 346 da Lei nº 4.737/1965, constitui crime, punível com a detenção de até seis meses e ao pagamento de 30 (trinta) a 60 (sessenta) dias-multa, utilizar os serviços de quaisquer repartições, federais, estaduais ou municipais, autarquias, fundações do estado, sociedade de economia mista, entidade mantida ou subvencionada pelo Poder Público, ou que realiza contrato com este, inclusive o respectivo prédio e suas dependências, para benefício de partido ou, ainda, de organização de caráter político. Conquanto o dispositivo normativo somente faça referência à utilização da estrutura administrativa em benefício de um determinado partido ou de coligação, é assente o entendimento de que sua incidência também é cabível quando o beneficiário for candidato, dado que o objetivo visado pelo legislador é proteger a probidade administrativa, reprimindo desvios de finalidade e a violação à imparcialidade que se espera da Administração Pública. Nessa mesma compreensão, é o magistério de Rodrigo López Zilio: O comando normativo estatui que é crime o uso de estrutura de governo em benefício de partido ou organização de caráter político. Em verdade, o tipo penal emprega a nomenclatura "serviço de qualquer repartição" - expressão que tem sentido amplo, alcançando não apenas bens imóveis (salas, ginásios, etc.), como também móveis (veículos), utensílios diversos (computador, telefone), além de recursos humanos (servidores, empregados, estagiários, etc.) e financeiros. Vale dizer, sendo afeto à administração pública ou por ela custeado, o bem ou serviço não pode ser utilizado em benefício de partido ou candidato sob pena de infração ao art. 346 do Código Eleitoral. (ZILIO, Rodrigo López. Direito eleitoral. 8. ed. São Paulo: JusPodivm, 2022). A possível prática de ato de improbidade administrativa e crime prejudicam a idoneidade moral esperada daquele que é conselheiro tutelar, conforme art. 135 do Estatuto da Criança e do Adolescente, autorizando a suspensão das funções realizadas pelo agente em colaboração com o Poder Público, a fim de garantir a própria confiança da população nas instituições, como já foi reconhecido na jurisprudência: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. TUTELA DE URGÊNCIA. SUSPENSÃO DA POSSE DE MEMBRO DO CONSELHO TUTELAR. AUSÊNCIA DE IDONEIDADE MORAL. SUPOSTA PRÁTICA DE CRIME ELEITORAL E TRÁFICO DE DROGAS. CIRCUNSTÂNCIAS QUE AUTORIZAM A CONCESSÃO DA LIMINAR PELO JUÍZO A QUO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A concessão de tutela de urgência pressupõe o preenchimento dos requisitos dispostos no art. 300, do Código de Processo Civil, mediante a probabilidade do direito alegado e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. 2. No caso concreto, as evidências apresentadas pelo Promotor de Justiça, no sentido de suposta prática de crime eleitoral e tráco de drogas, indicam que a candidata não possui idoneidade moral para exercer a função de membro do Conselho Tutelar, o que autoriza a concessão de tutela de urgência para suspender a nomeação e posse da mesma, nos termos do art. 133 do Estatuto da criança e da juventude. 3. Recurso não provido. (TJ-AM - AI: 40003607820208040000 AM 4000360-78.2020.8.04.0000, Relator: Jomar Ricardo Saunders Fernandes, Data de Julgamento: 20/08/2020, Conselho da Magistratura, Data de Publicação: 20/08/2020) AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESTITUIÇÃO DO CARGO DE CONSELHEIRA TUTELAR. 1. Preliminar de conversão do agravo de instrumento em retido afastada. 2. O Conselheiro Tutelar pode, a qualquer tempo, ter seu mandato suspenso ou cassado, no caso de descumprimento de suas atribuições, prática de atos ilícitos ou conduta incompatível com a função, conforme dispõe o art. 12 da Resolução 75/2001 do Conselho Nacional da Criança e do Adolescente. 3. Documentos acostados à ação civil pública que demonstram que a agravante adota conduta que prejudica o cumprimento das atribuições do Conselho Tutelar. REJEITARAM A PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. (TJRS, Agravo de Instrumento, Nº 70058981226, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em: 28-08-2014) A partir do exame dos autos, percebo que a parte autora demonstrou a plausibilidade de possível prática de ato de improbidade e de crime pelo requerido, ao menos para efeito de juízo de cognição sumária, que se baseia na verossimilhança das alegações a partir da aparência da prova, porquanto o áudio juntado aos autos, no qual se verifica a voz do demandado, demonstra que ele pede um serviço relacionado a adesivos (ID. 189358452) e servidores públicos, que possuem fé de ofício, afirmaram que existia um pedido reiterado para produção de santinhos com os serviços humanos e técnicos do Conselho Tutelar (ID. 189342188). Confira-se, a propósito, o áudio juntado, em que há clara referência à produção de adesivos, corroborando o relato: Laércio: Mateus, isso aqui, o que eu quero fazer, dez... pra eu mandar pra tu, visse? Mateus: Dez o quê? Laércio: Aquilo que eu tava dizendo a tu. Mateus: E aqueles não prestou não foi? [...] Laércio: Olha aí, tá vendo aí, esses adesivos aí? Mateus, eu quero que faça essa coisinha aqui. Olha, assim? Tu sabe sabe fazer? Mateus: Dois? Laércio: Sim, porque ele tá... ele aqui tá... ele tá... ele tá dez por trinta. Mateus: Hum. Laércio: Né? Dez por trinta, entendeu? Por dez, né? Mateus: É. Laércio: Por dez. Exatamente, dois na mesma folha. Vê se você consegue fazer. Mateus: Uma folha de A4 completa? Laércio: Se é assim, quer que fica assim, é? Mateus: Não, eu quero que ele fica... eu quero que ele fica assim. Não, folha de A4 completa. Laércio: Aí... aí dá dois aqui no tamanho. Mateus: Mas eu vou pegar um celular, só tá aí no... Laércio: Tu tá entendendo o que é que eu quero? Oi? Mateus: Cabe dois numa folha. Laércio: Cabe dois numa folha dessa. De canto a canto, pode só fazer? Pode agora? Mateus: Mas não vai ser mudar nada, só fazer. Laércio: Só fazer, só fazer. Laércio: Aí eu... olha como é que eu ia... olha como é que eu ia olhar. Só fazer. Laércio: De canto a canto, sabe? Mateus: Não sei como é que vai ficar. Se vai dar certo. Laércio: Só deixar... só deixar um risquinho no meio que vai dar uns cinco centímetros, só pra eu cortar na impressora assim, sabe? Mateus: Entendi, entendi, entendi. Laércio: Deixa eu botar na minha pasta aqui. [...] Portanto, diante dessas considerações, presente a probabilidade do direito no que se refere à primeira conduta. 2. Comportamento agressivo com a rede de apoio e com a população Alega o órgão ministerial que o ora demandado apresenta, de modo reiterado, um comportamento agressivo com toda a rede de apoio, formada pelo Conselho Tutelar (CT), pelo Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS) e pela Casa de Acolhimento Maristela Monteiro (CAMM), sugerindo que mandava nos citados órgãos, inclusive mediante utilização de tom de voz alterado com Rozenilda Maria da Silva. Assevera, inclusive, que esse comportamento não se restringe àqueles que desempenham funções públicas, dado que o ora demandado, durante busca ativa no Bairro Santo Agostinho, Santa Cruz do Capibaribe, ao visualizar veículo para transporte de reciclagem, com tração animal, que levava duas crianças doentes, fez gestos indicativos de que teria uma arma, bem como de utilização desta, para coagir o genitor. É o resumo da postulação quanto ao ponto. Na linha do art. 55, III, da Lei Municipal nº 3.662/2023, constitui dever do conselheiro tutelar tratar com urbanidade todo interessado, testemunha, funcionário e auxiliar do Conselho Tutelar e dos demais integrantes dos órgãos de defesa de direitos da criança e do adolescente, o que consubstancia o dever de urbanidade, que é indispensável de quaisquer agentes estatais, a fim de garantir a necessária realização dos fins primários esperados. Eventuais excessos no exercício da função, com abuso dos deveres previstos na legislação, não podem ser admitidos, sob pena de permitir sobreposição do interesse privado em detrimento do interesse público, situação que compromete o exercício da atividade de conselheiro tutelar, autorizando a suspensão do exercício do função estatal, conforme jurisprudência iterativa dos Tribunais de Justiça: EMENTA: APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE DESTITUIÇÃO DE CONSELHEIRO TUTELAR - MUNICÍPIO DE PIRAPORA- AFASTAMENTO POR PENALIDADE - PREVISÃO NA LEGISLAÇÃO MUNICIPAL - MANUTENÇÃO DA DECISÃO - DESPROVIMENTO DO RECURSO. - A função de conselheiro tutelar é de natureza honorífica cabendo à legislação municipal tratar de remuneração, bem como todo o regramento atinente à matéria, além da vedação de condutas e respectivas sanções conforme se extrai da leitura do art. 134 do Estatuto da Criança e do Adolescente e do artigo 41 da Resolução nº 170 do Conanda. - No âmbito do Município de Pirapora a Lei nº 1.888/2007 dispõe sobre a função pública de Conselheiro Tutelar. Estabelece seus deveres e proibições. - Demonstrado que não foram cumpridos os deveres de Conselheiro tutelar previstos no artigo 15, da Lei nº 1.888/2007, havendo excesso no exercício da função, abuso de suas atribuições especificas e ausência de conduta moral ilibada, fundamental para o exercício da função de membro do Conselho Tutelar, escorreita é a condenação de perda do cargo. - Negaram provimento ao recurso. (TJMG. Acórdão. Processo nº 0058832-15.2017.8.13.0512. Órgão Julgador: 8ª Câmara Cível. Relator (a): Ângela de Lour Rodrigues. Data de publicação: 27/02/2019.) Ainda, é de se destacar que a conduta de deixar explícito que teria uma arma de fogo, utilizando essa medida para um eventual atendimento de crianças que pertencem a famílias carentes, a fim de provocar o genitor a realizar determinada conduta, é medida extremamente grave, que pode configurar eventual crime de ameaça (art. 147 do Código Penal) ou, ainda, de abuso de autoridade (art. 33, parágrafo único, da Lei nº 13.869/2019), não sendo preciso exortar maiores digressões sobre a repercussão da conduta para o fim de afastar o conselheiro, considerando que já expostas no item anterior. A partir do exame dos autos, percebo a existência de documentos que demonstram, ao menos neste juízo de cognição sumária, que o demandado praticou as condutas narradas, porquanto devidamente esclarecidas em relatório subscrito no âmbito do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), segundo o qual sobressai a ausência de urbanidade com assistente social e ameaça contra um pai de família que transportava filhos doentes, fato presenciado por outros agentes públicos (ID. 189342183), além de ofício expedido pela Casa de Acolhimento Maristela Monteiro (CAMM), noticiando que o demandado se comportava como senhor da coisa pública. Há, ainda, nos autos, documentação assinada por outros Conselheiros Tutelares narrando irregularidades. Transcrevo, por oportuno, trecho do relatório referenciado, acerca da ameaça perpetrada (ID. 189342183): [...] Em outro momento esse solicitou apoio da nossa equipe a busca ativa no bairro Santo Agostinho, onde encontramos a demanda em um carro de reciclagem puxado por animais, no momento, o casal se encontrava com duas crianças doentes, com náuseas. No momento, o conselheiro tutelas Laércio, achou de bom tom levantar o tom para o patriarca da família, e na sequencia, puxou sua bolsa, deixando explicito que o mesmo possuía uma arma e que usaria se fosse necessário. Saliento que, fazendo uma analise da situação, essa atitude não era necessária e que a família não apresentava riscos. Durante todo o constrangimento causado por Laércio, testemunharam Wanessa Maraysa, que trabalha no equipamento (81 9 9132-9830), e Jussara Veruska, que também trabalha no local (81 9 9925-7578). Segue em anexo toda a documentação referente aos atendimentos realizados em referência ao falecido, Tiago Aprigio dos Santos, e sua parentela no ano de 2022 a 2024. [...] Portanto, também presente a probabilidade do direito no ponto. 3. Não comparecimento à sede do Conselho Tutelar nos dias de atendimento De acordo com o relato da exordial, o ora demandado não comparece, de modo reiterado, à sede do Conselho Tutelar, mesmo nos dias de atendimento à população, o que prejudica o regular desempenho das funções do mencionado órgão inserido no sistema de proteção à infância. Em que pese a alegação, que pode configurar falta grave, além de ato ímprobo, pelo recebimento irregular de valores devidos em razão do exercício da função, a inicial não veio instruída com elementos concludentes acerca do fato, porquanto não foram juntados documentos relativos à frequência do Conselheiro Tutelar, tampouco o Ministério Público de Pernambuco iniciou o inquérito civil para ouvir os demais agentes estatais, a fim de confirmar a suposta falta funcional. Com efeito, a partir da análise dos autos, o único elemento que acusa a ausência do ora demandado é uma mensagem eletrônica encaminhada por pessoa não especificada à Promotoria de Justiça de Santa Cruz do Capibaribe, a qual não permite a visualização da habitualidade da conduta, prejudicando a tese suscitada na inicial. A esse respeito, confira-se o seguinte julgado: AGRAVO DE INSTRUMENTO – Ação Civil Pública – Decisão que deferiu a liminar requerida na inicial, suspendendo a nomeação e a posse do agravante no cargo de Conselheiro Tutelar – Decisão que comporta reforma – Ausência dos requisitos autorizadores da concessão de tutela de urgência – Probabilidade do direito, perigo de dano e risco ao resultado útil do processo não verificados – Alegada a inidoneidade moral do agravante com base em notitia criminis da prática de assédio sexual contra dois adolescentes, efetivado por meio de aplicativos de mensagens (SMS, WhatsApp e Messenger) – Denúncia, contudo, que não encontra respaldo em qualquer elemento concreto que corrobore as declarações das denunciantes – Supostas mensagens trocadas entre os adolescentes e o agravante que foram deletadas dos aparelhos envolvidos – Uma das denunciantes, ademais, que é suplente do agravante, algo a impor maior cautela na apuração dos fatos, dado o interesse que, em tese, possui na procedência da ação de piso – Agravo de Instrumento provido. (TJ-SP - AI: 22877835120198260000 SP 2287783-51.2019.8 .26.0000, Relator.: Renato Genzani Filho, Data de Julgamento: 20/03/2020, Câmara Especial, Data de Publicação: 20/03/2020) Portanto, ausente a probabilidade do direito no ponto. 4. Ausência de submissão de decisões individuais ao colegiado Para a parte autora, o demandado, de modo reiterado, deixa de submeter as suas decisões singulares de aplicação de medidas de proteção à criança, ao adolescente, pais ou responsáveis ao colegiado do Conselho Tutelar, salientando acolhimento realizado no dia 18 de agosto de 2024, quando o conselheiro teria encaminhado duas crianças à Casa de Acolhimento Maristela Monteiro (CAMM), à revelia do colegiado, alegando que ninguém conheceria das leis. Ademais, no dia 27 de outubro de 2024, promoveu o acolhimento de duas crianças, sendo uma delas lactante, mesmo após ser orientado pela autoridade policial em sentido contrário, somente porque recebeu denúncia de que os pais destas teriam praticado extorsões ou pedidos de ajuda em posto de saúde, bem assim não estavam com os documentos dos infantes, de modo que não haveria prova do vínculo. É, em breve síntese, o relato. A regra do art. 56, XIII, da Lei Municipal nº 3.662/2023 estipula que é vedado ao conselheiro tutelar deixar de submeter ao colegiado as decisões individuais referentes à aplicação de medidas protetivas a crianças, adolescentes, pais ou responsáveis previstas nos arts. 101 e 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo que sua violação é medida também grave, porque, nada obstante a independência funcional, as medidas drásticas devem ser analisadas em conjunto, a fim de minimizar a chance de erros. Sobre o ponto, destaco julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo, que considera referida conduta como desidiosa e passível de destituição do conselheiro tutelar: Apelação. Ação Civil Pública. Improbidade Administrativa. Edição da Lei nº 14.230/21. Aplicação da tese definida pelo STF no Tema 1.119. Desrespeito ao princípio da legalidade e moralidade. Conselheiro Tutelar que no exercício da função procedeu de forma desidiosa, deixando de registrar vários casos que lhe foram submetidos e de levá-los ao conhecimento do colegiado. Conduta descrita no artigo 11 da Lei nº 8.429/92 que deve ser afastada em razão da edição da Lei nº 14.230/21 que modificou a sua redação. Rol do art. 11 que passou a ser taxativo. Sentença reformada. Dado provimento ao recurso do requerido e não conhecido o recurso do autor. (TJSP. Acórdão. Processo nº 0002821-86.2014.8.26.0292. Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Público. Relator (a): Paola Lorena. Data de publicação: 11/09/2023.) Ao examinar o feito, percebo que documento, subscrito por quatro conselheiros tutelares, demonstram que, de fato, o ora demandado deixa de submeter suas decisões de aplicação de medidas de proteção ao colegiado, agindo à revelia da norma jurídica que rege sua atuação, nada obstante sujeito à legalidade estrita, causando prejuízos a crianças em situação de risco, tal como se verifica do acolhimento da criança ainda na fase de lactação (ID. 189342185). Na ocasião, os próprios conselheiros tutelares destacaram o agir açodado do demandado (ID. 189342185): Excelentíssimo Promotor de Justiça Dr Thiago Sales Boulhosa. Cumprimentando-o cordialmente, viemos, através do presente, informar que no dia 27 de Outubro de 2024 ás 16:38, o Conselheiro Plantonista Laércio Glicério, enviou um áudio para o grupo do conselho tutelar informando que havia acolhido duas crianças na casa de acolhimento, uma com 03 meses LACTANTE e a outra com 03 anos de idade, informou ainda que o motivo do acolhimento foi que recebeu uma denúncia que fazem 4 semanas que os pais estavam com as crianças no posto de saúde, pedindo com as crianças e extorquindo as pessoas, que acionou a policia militar e foram até o local, que ao chegar os genitores informaram que não tinham documentos, o Sr Laércio informou que sem documentos ninguém prova quem é quem, que abrigou as crianças e levou os pais a delegacia de polícia, que o delegado liberou os pais, que o Conselheiro ia esperar eles aparecerem com os documentos para entregar as crianças e que no dia seguinte, iria ao conselho tutelar pedir ao Conselheiro Abraão informar ao judiciário pois não sabia digitar. Na ocasião, o Sr Laércio foi questionado porque não acionou o colegiado para que fosse tomada uma decisão em conjunto, o mesmo indagou que quando não estivesse de plantão nem falasse com ele, pois não é obrigado a atender telefone, que não sabe porque incomodou tanto, o conselheiro Thiago informou ao Sr Laércio que informasse ao Judiciário, que o acolhimento dos infantes teria ocorrido de uma decisão isolada do Conselheiro, o Sr Laércio mencionou que as decisões quem toma é ele e quem assume as broncas dele é ele, que está conselheiro a nove anos e agora mais 4 anos, que quando toma as decisões come as broncas, que acha que não fez nada errado, que quando toma certos tipos de decisão apenas informa a decisão tomada. Ao chegar na casa de acolhimento o Sr Laércio mencionou que foi orientado pelo delegado a não acolher as crianças, tendo em vista uma ser lactante, que não teria motivos para tal acolhimento, que o Conselheiro falou que acolheu porque quem manda é ele, o mesmo relato também fez aos demais conselheiros. Portanto, também no ponto, presente a probabilidade do direito. 5. Omissão de atuação em plantões do Conselho Tutelar Defende a parte autora que o demandado, por diversas vezes, deixa de atuar no plantão para o qual está escalado, o que acarreta prejuízos à rede de proteção à criança e ao adolescente no município, porquanto impossível a aplicação de medidas urgentes à defesa desses grupos em formação. Como exemplo, destaca que, no dia 21 de setembro de 2024, o Delegado Marcos Alexandre efetuou contato com o ora demandado, solicitando sua presença na delegacia de polícia, porém não obteve êxito, porque as chamadas não eram atendidas, mesmo quando dirigidas ao telefone pessoal do conselheiro. É o relato da imputação. A norma do art. 55, II, da Lei Municipal nº 3.662/2023 estabelece ser dever do conselheiro tutelar cumprir seus horários de trabalho, inclusive no período em que estiver de sobreaviso, medida que se compatibiliza com sua função, de defender todos interesses daqueles que estiverem em situação de vulnerabilidade e que é comprometida na hipótese de inobservância do citado compromisso, sendo falta grave, que acarreta a destituição do mandado. Sobre o ponto, o Tribunal de Justiça de Pernambuco já decidiu que o conselheiro tutelar que deixa de participar de seu plantão não possui idoneidade para o cargo: EMENTA: CRIANÇA E ADOLESCENTE. ELEIÇÃO DO CONSELHO TUTELAR. PROCESSO DE ESCOLHA DE CONSELHEIROS . CONDENAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU EM AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. IDONEIDADE MORAL AFASTADA. PROVA DO MAU DESEMPENHO DAS ATIVIDADES DE CONSELHEIRO TUTELAR. UTILIZAÇÃO POR ANALOGIA DO PRECEDENTE DO RE Nº 560900 . SITUAÇÃO EXCEPCIONALÍSSIMA E DE INDISCUTÍVEL GRAVIDADE. APELO DESPROVIDO. 1. Caso em que o demandante propôs a ação alegando que teve sua candidatura a reeleição PARA Conselheiro Tutelar indeferida em razão de ter sido condenado em 1º grau em ação de improbidade administrativa, alegando violação da presunção de inocência . 2. Tratando-se o cargo de Conselheiro Tutelar de um cargo técnico, que busca efetivar os direitos das crianças e adolescentes, o Estatuto foi rígido ao estabelecer os critérios para os ocupantes dos mesmos, estabelecendo a necessidade de idoneidade moral. 3. Ao assim estabelecer, o ECA possibilitou a análise da vida particular e pública do interessado no cargo, e suas condutas, que devem ser contrastadas com a atividade que deseja exercer, tudo com a finalidade de garantir o melhor interesse das crianças e dos adolescentes . 4. Ao ter sido condenado em ação de improbidade administrativa, ainda que apenas em primeiro grau, pendente julgamento de apelação, à perda do cargo de Conselheiro Tutelar por: a) utilizar, por diversas vezes o veículo do Conselho Tutelar para fins pessoais, por si mesmo ou através de seus familiares; b) frequentemente não comparecer à sede do Conselho Tutelar, mesmo nos dias previamente estabelecido para funções de atendimento à população; c) não atuar nos períodos de plantão, mesmo quando é acionado, ficando frequentemente indisponível para contatos telefônicos nesse período; o impetrante revelou sua inidoneidade para o cargo. 5. Valendo-me por analogia do precedente do STF no RE 560900, mesmo não se tratando de caso em que tenha havido condenação por colegiado ou definitiva, o caso é excepcionalíssimo e de indiscutível gravidade, revelando a correção do afastamento do impetrante do pleito . 6. Apelação desprovida. (TJ-PE - AC: 00434754820198172990, Relator.: ITAMAR PEREIRA DA SILVA JUNIOR, Data de Julgamento: 15/03/2023, Gabinete do Des. Sílvio Neves Baptista Filho (Processos Vinculados - 3ª CDP)) A partir do exame dos autos, verifico que, em ofício subscrito por dois conselheiros tutelares, foi noticiado ao órgão do Ministério Público que o demandado, de modo habitual, deixa de participar de seus plantões, situação que implica inegável risco à proteção de crianças e adolescentes, que não terão a necessária intervenção do órgão de proteção durante uma urgência, que não pode passar despercebida no caso concreto. Transcrevo, por oportuno, o ofício encaminhado (ID. 189342186): Cumprimentando-o cordialmente, viemos, através do presente, informar que no dia 21/09/2024, por volta das 13:30 da tarde, o Delegado Marcos Alexandre, para o celular funcional do Conselho Tutelar 1, solicitando a presença na delegacia do Conselheiro Tutelar (plantonista), porém não obteve êxito, posteriormente o Delegado entrou em contato com o CT2 informando a situação. A Conselheira Tutelar do CT 2 entrou em contato com o CT1, pois a demanda seria do Bairro Malhada do Meio, o telefone institucional chamou diversas vezes, porém o Conselheiro Plantonista Laércio Glicério não atendeu, foram feitas ligações para seu número pessoal as quais foram infrutíferas. Mediante informações este CT ligou para o Conselheiro Laércio, contato institucional e particular, porém sem sucesso, a Conselheira Alexsandra Pereira se deslocou até a delegacia, acionou os demais conselheiros do CT1 pois seria necessária uma decisão do colegiado sobre um possível acolhimento, prontamente houve o apoio dos demais conselheiros, inclusive com a presença do CT Thiago Braga que esteve na delegacia. Como é sabido, não é um fato isolado que ocorre quando o Conselheiro Tutelar ora mencionado está de plantão, estamos na iminência que ocorra constantemente, motivo pelo qual esse CT comunica a esta Promotoria de Justiça. Informamos ainda que o Conselheiro Laércio Glicério apenas retornou à ligação para o CT2 às 17:19hr. Sem mais para o momento, renovamos votos de estima, consideração e apreço Como se vê, não se trata de conduta isolada do conselheiro, mas sim habitual, de modo que também está presente, no ponto, a probabilidade do direito. 6. Fatos posteriores ao ajuizamento da ação Após o ajuizamento da ação, a parte autora juntou ofício encaminhado pelo Conselho Tutelar, o qual noticia reiteração de condutas desidiosas do demandado, que acarretaram prejuízos à proteção de crianças e adolescentes, além de desprestígio da instituição perante a sociedade. A primeira conduta narrada se refere à recusa do conselheiro tutelar em comunicar às autoridades um possível caso de abuso sexual cometido contra criança de 3 (três) anos e 8 (oito) meses, atendida em Unidade de Pronto Atendimento (UPA), fato ocorrido durante o plantão do demandado, nada obstante a insistência dos demais conselheiros tutelares para adoção de todo o procedimento legal previsto na legislação. A segunda conduta narrada consiste em omissão do conselheiro tutelar na entrega de uma adolescente à sua guardiã, considerando que sua avó viajaria para outra unidade da federação, o que implicaria a necessidade de tutela de seus interesses por outro adulto, situação que teria sido ignorada completamente pelo demandado, mesmo após comparecimento de uma outra conselheira tutelar à sua residência, requerendo a adoção de providências. A terceira conduta narrada é consubstanciada em mais uma ausência do demandado a seus plantões, em prejuízo dos trabalhos do Conselho Tutelar, sendo ressaltado que a conselheira tutelar plantonista de outro Conselho Tutelar de Santa Cruz do Capibaribe teve que deixar seu posto para atender a uma ocorrência que seria de responsabilidade do demandado, acarretando a ausência de resposta regular da rede de proteção a uma adolescente que necessitava de atendimento médico. A quarta conduta narrada foi de ausência de atendimento por meio dos canais telefônicos do Conselho Tutelar, em dia no qual escalado o demandado para dar andamento às urgências, quando sua omissão acarretou a ausência de averiguação do relato de que uma criança teria sido espancada em um bar por sua genitora, sendo que, quando confrontado, o conselheiro teria dito apenas que nem sempre vê as mensagens. A quinta conduta narrada, foi, mais uma vez, de ausência de atendimento por meio dos canais telefônicos do órgão de proteção da infância, omissão que acarretou a ausência de averiguação do relato de agressão praticada contra uma adolescente, que teria como sujeito ativo o pai desta, e que implicou a ausência de orientação a uma popular que teria prestado assistência à vítima logo após o fato. Os eventos teriam a seguinte cronologia: (a) primeira conduta, em 4 de março de 2025; (b) segunda conduta, em 21 de março de 2025; (c) terceira conduta, em 23 de março de 2025; (d) quarta conduta, em 24 de março de 2025; (e) quinta conduta, em 24 de março de 2025. É, em breve síntese, o resumo dos fatos novos mencionados pelo Ministério Público. Quanto ao ponto, destaco, inicialmente, que a possibilidade de exame de fatos novos no curso do processo, desde que relevantes à solução da lide, é medida expressamente autorizada pelo art. 493 do Código de Processo Civil, sobremodo quando a intelecção desses fatos não implicar alteração da causa de pedir, mas sim servirem à sua confirmação, como novo instrumento de ratificação da pretensão submetida ao Poder Judiciário. Isso se justifica porque, no momento da decisão, é dever do órgão julgador observar o estado de fato atual da relação jurídico-processual, medida que visa garantir não apenas a justiça das decisões, enquanto instrumento conformador do processo legal em sua feição substancial, mas também possibilitar a efetividade da tutela jurisdicional, considerando a contemporaneidade dos fatos da vida que foram suscitados perante o Poder Judiciário. Não é outro o entendimento da doutrina especializada: A tutela jurisdicional deve retratar o contexto litigioso que existe entre as partes da maneira como esse se afigura no momento de sua concessão. Daí a razão pela qual nosso Código de Processo Civil empresta relevo ao direito objetivo e ao direito subjetivo supervenientes à postulação em juízo (arts. 342, I, e 492, CPC). O direito subjetivo superveniente é aquele que advém de fato constitutivo, modificativo ou extintivo da situação substancial alegada em juízo posterior à propositura da ação. O fato superveniente que deve ser levado em consideração para a resolução da causa é aquele que não importa em alteração da causa de pedir, sob pena de violação, a pretexto de aplicação do art. 492, CPC, do art. 329, CPC (STJ, 1.ª Turma, REsp 188.784/RS, rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. 04.10.2001, DJ 25.02.2002, p. 208). Assim, por exemplo, já se decidiu que “a liquidação judicial de entidade, superveniente ao julgamento dos embargos, é fato que deve ser considerado no regime jurídico das obrigações quando da fase de seu pagamento”, sendo essa “hipótese típica da aplicabilidade do art. 462, CPC” (STJ, 1.ª Turma, REsp 710.081/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 14.03.2006, DJ 27.03.2006, p. 183). O fato superveniente deve ser considerado independentemente de quem irá se beneficiar com a sua apreciação (STJ, 2.ª Turma, AgRg no REsp 548.700/PE, rel. Min. Eliana Calmon, j. 03.08.2006, DJ 17.08.2006, p. 336). (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado. 11. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2025). De outra parte, ainda que assim não fosse, é oportuno destacar que a parte demandada ainda não apresentou a peça de defesa na presente ação civil pública, de maneira que não há se falar em estabilização da demanda e, consequentemente, em vedação à arguição de fatos novos, conforme expressamente previsto no art. 329, I, do Código de Processo Civil, que dispensa a eventual anuência do réu para modificação da causa de pedir ou do pedido antes de sua citação. Fixadas essas premissas, é de se observar que o demandado, já no corrente ano, durante quase todo o mês passado, manteve a mesma sistemática de omissões no exercício de seu dever funcional, prejudicando não só as atividades do Conselho Tutelar, mas o próprio sistema de proteção de crianças e adolescentes, que ficou desfalcado para atendimento a situações com o inegável recorte de urgência, o que foi relatado não somente por um conselheiro tutelar, mas sim por três agentes públicos, que subscreveram, em conjunto, o ofício juntado aos autos pela parte autora. E, no presente caso, não se pode dizer que ocorreu omissão sem importância, dado que o primeiro relato feito acusa a ausência de regular comunicação aos órgãos competentes de violência sexual praticada em desfavor de criança com cerca de 3 (três) anos e 8 (oito) meses, em total situação de vulnerabilidade, dado que sua genitora se recusou, sem indicar motivos, a fazer a exposição dos abusos à autoridade policial. Veja-se, a propósito, o relato formalizado (ID. 200817773, p 1): Venho, através do presente informar que, PONTO I. no dia 04 de março do corrente ano, o presente Conselho foi acionado pela assistente social da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) acerca da admissão de uma criança de 03 anos e oito meses, possivelmente vítima de abuso sexual, na referida unidade hospitalar. O Conselheiro Laércio Glicério dirigiu-se à unidade hospitalar mencionada, contudo, no dia seguinte, os conselheiros plantonistas informaram ao Conselheiro Laércio que a genitora da menor não havia comparecido à delegacia para formalizar a denúncia. Em subsequente contato com a genitora, no dia 05 de março, esta reiterou a sua decisão de não realizar o registro na delegacia. Frente aos fatos narrados, salientou-se reiteradamente ao Conselheiro a necessidade de dirigir-se à delegacia a fim de registrar o ocorrido, especialmente considerando que o evento se deu durante um plantão de sua responsabilidade, o que apenas se concretizou em 12 de março de 2025, conforme registrado no boletim de ocorrência (em anexo). Nobre magistrado, sublinha-se que a ausência de comunicação deste episódio ao Ministério Público, através de notícia de fato, decorreu da inércia do mencionado Conselheiro, não tendo sido adotada qualquer providência no caso em apreço A conduta do conselheiro, com todo respeito a compreensões divergentes, escapa da mera esfera de transgressão às normas administrativas que regem sua função e pode implicar, ao menos em tese, a prática de crime de prevaricação, porque há inegável omissão no exercício de ato de ofício, ainda por razões que dependem de necessária apuração, considerando a falta de notícias acerca de investigação criminal, gerando risco potencial de novas práticas de abuso sexual contra hipervulnerável. Com efeito, não se pode esquecer que a ausência de intervenção rápida da rede assistencial, em casos de violência sexual, é medida que maximiza os danos já extensos que atingem crianças e adolescentes, que podem continuar no mesmo ciclo de violência inicialmente detectado, precisamente porque não afastadas dos agressores, o que eleva o grau de reprovabilidade de atuação do profissional. Ora, a necessidade de atendimento rápido às situações de violência sexual não é só um direito humano, mas medida inserida no texto constitucional como obrigação da sociedade e dos órgãos estatais, enquanto desenho da política de defesa e de tutela de crianças e adolescentes, a fim de não só reduzir os danos já incalculáveis decorrentes do ato, mas de coibir que essas práticas atinjam terceiros. A imperatividade de atuação é, nesse contexto, um dos pilares da política de proteção. Não por outro motivo, o texto da Constituição Federal estabelece que constitui "dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão" (art. 227 da CFRB/1988). Admitir a continuidade de atuação de conselheiro tutelar que resolve se manter inerte diante de situação tão grave, em que pese alertado por seus pares da necessidade de rápida intervenção, é possibilitar a violação direta ao princípio de vedação à proteção deficiente, vetor das políticas públicas de estado, situação que não pode ser ignorada pelos órgãos públicos, sob pena de possibilitar que o ordenamento jurídico perca sua eficácia. A jurisprudência tem reconhecido que a conivência com abuso sexual afasta a idoneidade para exercício da função de conselheiro tutelar, autorizando a suspensão do mandato: DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHEIRA TUTELAR. AFASTAMENTO LIMINAR E DESTITUIÇÃO DA FUNÇÃO. DECISÃO MANTIDA. 1. No caso devolvido ao exame, reside a controvérsia sobre o afastamento liminar de Conselheira Tutelar da 5º Microrrregião do Município de Porto Alegre, em razão de sua suposta conivência com crimes de abuso sexual praticados por seu companheiro frente a suas filhas, no resguardo de seu lar.2. No que importa à composição da espécie, ressalto que o expediente administrativo ministrado pela Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de Porto Alegre colacionado aos autos apresenta perceptíveis elementos os quais - num juízo perfunctório, em virtude do atual estado do processo - incitam a probabilidade jurídica do pedido a justificar, por ora, o afastamento imediato da Conselheira Tutelar, uma vez que atinge frontalmente sua presução de idoneidade moral, princípio basilar ético e pressuposto essencial ao exercício de seu cargo honorífico.3. De mesmo modo, face à gravidade das denúncias elencadas no expediente, evidente o perigo de dano que eventual manutenção da agravante em suas funções - dentre as quais visam justamente a salvaguardar crianças e adolescentes em situação de risco - poderá acarretar no atendimento aos vulneráveis.4. Decisão de piso mantida. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO. (TJRS. Acórdão. Órgão Julgador: 3ª Câmara Cível. Relator (a): Nelson Antonio Monteiro Pacheco. Data do julgamento: 25/04/2024.) Mas não é só. A total ausência de compromisso do demandado, noticiada por seus pares, acarretou falta de imperativa intervenção do Conselho Tutelar em casos de guarda, de necessidade de atendimento médico e de agressões sofridas por outras duas pessoas ainda em formação, o que demonstra, ao menos neste momento processual, um total descaso com uma função tão essencial na sociedade. A propósito, o trecho do ofício que menciona as citadas omissões nos deveres funcionais (ID. 200817773, pp. 1-3): No dia 21 de março de 2025, sexta-feira, os conselheiros plantonistas Alexsandra e Thiago comunicaram ao Conselheiro Laércio Glicério sobre a necessidade de plantão no dia seguinte devido a uma troca com a conselheira Maria Aparecida. Foi informado que a adolescente Maria Eduarda seria entregue à Sra. Valdinere Bezerra, uma vez que a mesma se encontra sob os cuidados da avó materna, a qual viajaria para o estado de São Paulo na madrugada do domingo seguinte. No sábado, dia 22 de março de 2025, a conselheira Alexsandra compareceu pessoalmente à residência do conselheiro e solicitou que este se dirigisse ao endereço da Sra. Valdineide Bezerra juntamente com a adolescente, a fim de recolher o termo de responsabilidade assinado que havia sido deixado com a Sra. Valdinere. Adicionalmente, a conselheira posteriormente enviou um áudio (em anexo) reiterando as orientações. No domingo, a conselheira Alexsandra entrou em contato telefônico com o conselheiro Laércio para verificar se tudo havia ocorrido conforme o combinado, contudo, foi informada de que não havia sido realizado o contato. Diante dessa resposta, a conselheira ressaltou que, caso houvesse qualquer incidente com a adolescente, a responsabilidade não recairia sobre ela e que tal evento seria comunicado ao Ministério Público. Em contrapartida, o conselheiro afirmou (áudio em anexo) que não é incumbência do conselho e que não estava preocupado com tal questão. Despeito da data de 23/03/2025, às 19:44, a conselheira plantonista do Conselho Tutelar II comunicou, por meio do grupo dos conselheiros, sua deslocação para atender a uma demanda localizada no bairro São José, atribuída ao âmbito de competência do Conselho I. Tal decisão fundamentou-se no insucesso das tentativas de contato com o Conselheiro Laércio, tanto por seu telefone pessoal quanto pelo institucional, mediante diversas chamadas e mensagens. Nesse contexto, na presença da guarda municipal, a conselheira Alexsandra dirigiu-se ao local da ocorrência, onde aguardavam a chegada da viatura do SAMU. Assim que o SAMU se fez presente, a conselheira prontamente acompanhou a adolescente e sua genitora até a Unidade de Pronto Atendimento. Após o atendimento médico, as conduziu de volta à residência da genitora. Cabe ressaltar que somente após as 21 horas o conselheiro Laércio retornou à ligação para a conselheira Alexsandra, que, naquele momento, encontrava-se na UPA, e alega que não atendeu ao telefonema. Informo ainda que o conselheiro plantonista estava em uma inauguração de uma escola (conforme foto em anexo) Ainda na dala de 24 de março de 2025, em atendimento presencial, compareceu no Conselho Tutelar a Senhora conhecida como Gl, contato 81 9 8916 7193, que relatou ler tentado efetuar uma denúncia via telefone institucional do Conselho Tutelar no dia 22 de março de 2025, sábado, às 23:23 horas. Ocorre que o Conselheiro Laércio não respondeu à mensagem, vindo a entrar em contato com a denunciante no dia 23 de março de 2025, ás 10:43 horas. (print em anexo), A denunciante relata que o contalo no sábado à noite objetivava Informar ao Conselho Tutelar que, às 22:30 do mesmo dia, uma adolescente de aproximadamente 13 anos chegou desacompanhada em sua residência, informando que havia saldo de casa e que não pretendia retornar, pois o pai, alcoolizado, teria a agredido. O pai fol buscá-la em sua casa, porém ela se recusou a acompanhá-lo. A referida pessoa solicitou esclarecimentos sobre como proceder diante dessa situação. Porém não obteve êxito mediante a inércia do Conselheiro. Não há como acolher a justificativa de quem nem sempre é possível visualizar mensagens quando se está escalado no plantão do órgão para o qual foi nomeado, que demanda intervenção rápida daquele inserido no sistema de proteção, sobretudo quando se tem um quadro habitual de omissões, inclusive com preterição da função pública para o comparecimento a eventos, já que se narrou a presença do demandado em inauguração de escola no dia 23 de março de 2025, quando adolescente precisava de atendimento médico. A conduta do demandado, inclusive, tem prejudicado a necessária confiança na rede de proteção, conforme se verifica do relato que ora transcrevo, constante do ofício juntado pelo Ministério Público Estadual (ID. 200817773, p. 2): Pelo motivo do "não atendimento" ao telefonema. Eu estava lá era pra essa vagabunda ter apanhado mais O filho dela de 11 anos foi entregar uma chave pra ela umas sete horas e ela falou pra o filho q era pra ter levado a chave de seis horas Ela bateu várias vezes na cara do filho E saiu de dentro do bar al fora foi q bateu no filho Ficou todo mundo pedindo pra ela não fazer aquilo A mulher desse senhor de camisa listrada foi até ela e pediu pra ela parar Ela simplesmente foi da tapa no homem Pq sabia que o homem não podia revidar Juntou um monte de mulher e o pau comeu Sei que ela depois arrumou uma faca e queria entrar no bar Chegou uma viatura e algemaram ela Resumindo ela tem várias passagens por conta de agressão contra os filhos Acionei o conselho tutelar até hj não mim responderam uns irresponsáveis que só estão ali por um salário que recebem Aí quando acontece de uma criança ser morta eles aparecem falando que as pessoas não fazem denúncia As sucessivas omissões do ora demandado, noticiadas por diversos conselheiros, que possuem fé de ofício, implicam o reconhecimento de conduta incompatível com o exercício do cargo, prejudicando a confiança outorgada pela comunidade, que já foi demonstrada pelo relato de um popular, autorizando seu afastamento liminar do cargo, considerando que são elementos de prova contundentes, ao menos neste juízo perfunctório, devendo ser prestigiado, na espécie, o interesse público primário. Nesse exato sentido, confira-se o seguinte julgado: APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Sentença que decretou a perda do mandato de conselheiro tutelar. Cerceamento de defesa decorrente do julgamento antecipado do mérito não configurado. Descumprimento de atribuições de conselheiro tutelar que implicam no reconhecimento de conduta incompatível com a confiança outorgada pela comunidade. Inteligência do artigo 136, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Sentença de procedência mantida. Recurso desprovido. (TJSP. Acórdão. Processo nº 1000290-08.2021.8.26.0666. Órgão Julgador: Câmara Especial. Relator (a): Dimas Rubens Fonseca (Pres. da Seção de Direito Pr. Data de publicação: 28/07/2021.) De tal forma, os fatos novos noticiados confirmam as alegações iniciais e corroboram a probabilidade do direito para o necessário afastamento do conselheiro tutelar demandado. 7. Do conjunto da postulação A partir do conjunto da postulação, perceptível que os fatos narrados na petição inicial, corroborados pelos documentos que a acompanham, são relacionados a acontecimentos de caráter pessoal, decorrentes da falta de urbanidade com terceiros e servidores públicos, e a acontecimentos de caráter profissional, pela utilização de bens públicos para fins privados, ameaças nas atividades de trabalho e omissão em plantões, prejudicando crianças e adolescentes, os quais fundamentam a arguição do órgão do Ministério Público pelo afastamento do conselheiro tutelar de suas funções. Tais fatos, ao menos neste juízo preambular, demonstram que o demandado pecou quanto aos requisitos para o exercício do cargo de conselheiro tutelar, que possui inegável repercussão social, sobremodo porque se volta à proteção daqueles que não possuem desenvolvimento completo e estão em situação de risco, exigindo maior dedicação de todos os atores estatais, que, em conjunto, formam uma rede de acolhimento. Não se pode esquecer que o art. 131 do Estatuto da Criança e do Adolescente reconhece o Conselho Tutelar como um órgão permanente e autônomo, de natureza não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento de direitos da criança e do adolescente, sendo, por tal razão, órgão representativo da comunidade, que deve atuar como guardião de toda a garantia fundamental do estado democrático de direito. Por ser órgão não jurisdicional é, de modo consequente, órgão administrativo, a ser regido pelo conjunto de princípios que informam a atuação da Administração Pública, conforme art. 37 da Constituição Federal. Sua autonomia, é bom que se diga desde já, se refere à independência funcional no que diz respeito à matéria de sua competência, não escapando, porém, de uma indissociável observância ao princípio da legalidade estrita. Assim, quando de sua atuação funcional, os conselheiros tutelares deverão observar os princípios do devido proceder administrativo, tais como acessibilidade dos elementos do expediente, permissão de ampla instrução probatória de seus feitos de natureza própria, motivação de decisões, revisibilidade de decisões, lealdade, boa-fé e verdade material, a fim de evitar indevido arbítrio daqueles de quem se espera a proteção dos vulneráveis. Portanto, o agente investido no cargo de conselheiro tutelar tem de ter a consciência de que presta um serviço com um inegável e indissociável caráter público relevante, com atuação submetida à legalidade estrita, observando os requisitos mínimos à investidura e atuação no cargo, que são a reconhecida idoneidade moral, idade superior a vinte e um anos e residência no local onde pretende exercer suas funções. Nesse sentido, confira-se o art. 133 do Estatuto da Criança e do Adolescente: Art. 133. Para a candidatura a membro do Conselho Tutelar, serão exigidos os seguintes requisitos: I - reconhecida idoneidade moral; II - idade superior a vinte e um anos; III - residir no município. A exigência legal da idoneidade moral para candidatura ao cargo de conselheiro tutelar deve, por decorrência lógica da investidura, acompanhar o agente público durante todo o período em que estiver no exercício da função pública, cabendo fazer o destaque que idoneidade não é conceito de ordem meramente jurídica, pois antecede esta consideração, dado corresponder, em todo caso, à retidão da pessoa, que é elevada no círculo social. Nesse sentido, já decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DESTITUIÇÃO JUDICIAL DE CONSELHEIRO TUTELAR - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CABIMENTO - PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO - DESNECESSIDADE - DIREITO À DEFESA QUE PODE SER EXERCIDO NA VIA JUDICIAL - PRÁTICA DE ATOS INCOMPATÍVEIS COM A FUNÇÃO EXERCIDA NO CONSELHO TUTELAR - PEDIDO JULGADO PROCEDENTE - BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA - DEFERIMENTO - SUSPENSÃO DO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS - RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1 - A perda do mandato de Conselheiro Tutelar, por ordem constitucional, e consoante a previsão da legislação municipal de regência, depende da prévia apuração de infringência às regras do Estatuto da Criança e do Adolescente, em procedimento que assegure ao interessado o pleno exercício do direito de defesa. 2 - É despicienda a instauração de processo administrativo se a destituição do Conselheiro é postulada pelo Ministério Público em sede de ação civil pública, porquanto o contraditório e a ampla defesa do particular podem ser exercidos na demanda judicial. 3 - O Ministério Público é parte legítima e a ação civil pública é instrumento adequado ao intento da destituição judicial de Conselheiro Tutelar, por se tratar de interesse difuso relacionado à infância e à juventude, tutelado pelo órgão ministerial . Precedente do col. Superior Tribunal de Justiça. 4 - Apurada a prática de atos incompatíveis com a idoneidade moral exigida para o exercício das funções de Conselheiro Tutelar, consubstanciados no mau atendimento dos munícipes e na omissão de regular desempenho dos misteres do encargo público, é devida a ordem de destituição. 5 - Evidenciada a hipossuficiência financeira do demandado, é de se lhe deferir os benefícios da justiça gratuita, suspendendo-se, assim, o pagamento das custas processuais . Inteligência do art. 12 da Lei nº. 1.060/50 . (TJ-MG - AC: 10517120017085001 MG, Relator.: Sandra Fonseca, Data de Julgamento: 31/03/2015, Câmaras Cíveis / 6ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 13/04/2015) Dessa forma, considerando o Conselho Tutelar como órgão encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento de direitos da criança e do adolescente, integrando, portanto, a rede de proteção da municipalidade, não se pode admitir um agir de todo equivocado daquele que exerce a função pública, permitindo que realize ameaças durante sua atuação perante as diversas pessoas, bem assim que pratique atos de improbidade administrativa, ainda que pendentes de confirmação no curso do processo judicial, porém já evidentes a partir do exame da inicial. De tal modo, não havendo aparente contradição entre os documentos que instruem os autos, subscritos por servidores públicos, que possuem fé de ofício, presente a verossimilhança necessária ao afastamento do demandado de suas funções. 8. Do perigo na demora Nas ações civis públicas com pedido de suspensão do mandato de conselheiro tutelar, o perigo na demora decorre da própria verificação da probabilidade do direito, porquanto a manutenção de pessoa que não possui atributos para o exercício das prerrogativas inerentes ao cargo acarretaria situação de risco às crianças e aos adolescentes, destinatários das políticas públicas do sistema de proteção da infância Nesse cenário, considerando que a submissão de crianças e adolescentes, que já se encontram em estado vulnerável, pode ser maximizada pelo exercício do cargo pelo requerido, é evidente o perigo na demora, a justificar o deferimendo da medida liminar, especialmente porque as denúncias foram assinadas inclusive por outros conselheiros tutelares e pelo CREAS. Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - AFASTAMENTO DE CONSELHEIRO TUTELAR - POSSIBILIDADE - INDÍCIOS QUE RECOMENDAM O AFASTAMENTO - DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. I - Os documentos trazidos aos autos apresentam, a princípio, bastantes razões para afastar a presunção de idoneidade moral do conselheiro, a qual deve ser detidamente analisada no momento processual próprio. Em sede de cognição sumária, a prudência recomenda o afastamento do Agravante, até que se tenham maiores elementos de prova, como forma de preservar, como dito, o próprio réu, bem como o relevante múnus público que este exerce. II - Estando presentes os requisitos do artigo 273, I, do CPC, deve ser deferida a tutela antecipatória pretendida. III - Recurso conhecido e desprovido. (Agravo de Instrumento Nº 201500817343 Nº único: 0005197-41.2015.8.25.0000 - 2ª CÂMARA CÍVEL, Tribunal de Justiça de Sergipe - Relator(a): Iolanda Santos Guimarães - Julgado em 15/02/2016) (TJSE. Acórdão. Processo nº 0005197-41.2015.8.25.0000. Órgão Julgador: 2ª Câmara Cível. Relator (a): Alexandre Mussoi Moreira, Julgado Em 18/12/2013, Data de Publicação: Diário da Justiça do Dia 20/01/2014) Agravo de Instrumento. Ação Civil Pública. Membro do Conselho Tutelar. Prática de Ato Incompatível Com A Função. Afastamento Cautelar Em Demanda Proposta Para Tituí. Data do julgamento: 14/02/2016.) Portanto, presente também o perigo na demora. 9. Da inexistência de irreversibilidade dos efeitos da medida Como a decisão possui natureza provisória, caso afastados os elementos que evidenciam a ausência de idoneidade do conselheiro tutelar, possível sua revisão a qualquer tempo, restabelecendo seu mandado e o exercício de suas funções, de modo que não há se falar em medida irreversível. Vale dizer que, quando da defesa, a parte ré poderá apresentar documentos destinados a contrapor aqueles juntados aos autos, bem assim que ainda haverá toda instrução do processo, ocasião em que poderá demonstrar o eventual desacerto deste afastamento liminar. Sobre o ponto, destaco o seguinte julgado: EMENTA: AGRAVO. LIMINAR. CONSELHEIRO TUTELAR. USO DO CARGO PARA PROMOÇÃO PESSOAL . AFASTAMENTO. POSSIBILIDADE. - Não logrou êxito o agravante em demonstrar que a denúncia contra ele foi infundada ou "...de cunho totalmente político". Esta questão está em aberto na instrução do processo - Afasta-se, de igual modo, a alegação de que o afastamento, com suspensão de vencimentos, configure ato irreversível e proibido pelo artigo 300, parágrafo 3º, do CPC, pois, se for considerado ilegal, eventuais valores não pagos poderão vir a ser cobrados; e, ainda, porque a irreversibilidade para o serviço público, caso confirmada a conduta ímproba do requerido, é muito maior do que a que ele afirma sofrer. Os efeitos do seu afastamento são apenas financeiros, que podem ser repostos; já os efeitos para a população, em razão da denúncia, caso esta se confirme, atingem os princípios da moralidade, legalidade e até mesmo impessoalidade da administração pública - A questão da possibilidade do exercício da advocacia em conjunto com as funções de Conselheiro Tutelar é questão ainda não apreciada em primeiro grau, havendo normas que vedam esse exercício a serem examinadas com mais profundidade, não sendo o principal tema a ser aqui levado em conta. (TJ-MG - AI: 10686180013829001 MG, Relator.: Wander Marotta, Data de Julgamento: 28/06/2018, Data de Publicação: 04/07/2018) Portanto, também não há se falar em medida irreversível. 10. Do pedido de suspensão de remuneração Ao final da peça de ingresso, o Ministério Público Estadual postula a suspensão da remuneração do demandado, que é medida devida a partir do deferimento de eventual tutela de urgência de afastamento de seu cargo, com necessária comunicação aos órgãos responsáveis pelo pagamento. No que se refere à suspensão da remuneração do conselheiro tutelar, o Tribunal de Justiça de Pernambuco já decidiu pela imposssibilidade de sua aplicação em sede liminar, considerando a proibição da regra do art. 20 da Lei nº 8.429/1992, que condiciona a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos ao trânsito em julgado de eventual sentença de ordem condenatória. Nesse sentido, confira-se o seguinte aresto: EMENTA: PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE DESTITUIÇÃO DO CARGO DE CONSELHEIRO TUTELAR FUNDADA EM ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – CONCESSÃO DE LIMINAR – POSSÍVEL O AFASTAMENTO DO CONSELHEIRO TUTELAR DO EXERCÍCIO DO CARGO, ANTE OS FORTES INDÍCIOS DE INIDONEIDADE NA FUNÇÃO, MAS SEM PREJUÍZO DE SEU SUBSÍDIO – INTELIGÊNCIA DO ART. 20 DA LEI 8.429/98 – REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA – AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO – DECISÃO UNÂNIME. (TJ-PE - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 00055150720188179000, Relator.: GABRIEL DE OLIVEIRA CAVALCANTI FILHO, Data de Julgamento: 31/10/2018, Gabinete do Des . Gabriel de Oliveira Cavalcanti Filho (6ª CC)) Assim, incabível o pedido de suspensão da remuneração do demandado. 11. Conclusão Diante dessas considerações, DEFIRO, em parte, a medida liminar postulada pelo Ministério Público Estadual, para o afastamento do conselheiro tutelar LAÉRCIO GLICÉRIO DA SILVA FILHO de suas funções, até o final da presente demanda ou de ulterior deliberação, ficando vedadas as práticas de quaisquer atos inerentes ao cargo, sob pena de multa de R$ 1.000,00 (mil reais) por cada ato, além da responsabilização por crime de desobediência, devendo entregar todas as credenciais relacionadas ao exercício do cargo, a exemplo de carteira funcional, ao próprio Conselho Tutelar (CT), mantendo, todavia, seus vencimentos. Ciência ao Ministério Público Estadual. Mantenha-se o feito em segredo de justiça (art. 189, I, do CPC). NOTIFIQUE-SE o presidente do Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente (COMDECA), além do Município de Santa Cruz do Capibaribe, para que promovam a nomeação e a posse provisória do suplente, para assim não existir comprometimento da composição colegiada do Conselho Tutelar. EXPEÇA-SE ofício ao Conselho Tutelar, para ciência da presente decisão e comunicar a este juízo em caso de prática de atos funcionais pelo conselheiro tutelar suspenso. NOTIFIQUE-SE o Município de Santa Cruz do Capibaribe, para, querendo, integrar a lide no prazo de 15 dias. JUNTE-SE a certidão de antecedentes criminais do requerido, providência à cargo da Diretoria Regional do Agreste. CITE-SE o requerido, por mandado, para responder à presente demanda, no prazo de até 15 (quinze), sob pena de lhe ser decretada a revelia (art. 344 do CPC). Apresentada contestação, INTIME-SE a parte autora e eventuais litisconsortes, para réplica, em 30 (trinta) dias. A seguir, voltem-me os autos conclusos, para decisão de saneamento e organização do processo (art. 357 do CPC). Nos termos da Recomendação nº 03/2016-CM/TJPE, ESTA DECISÃO POSSUI FORÇA DE MANDADO, de OFÍCIO e de CARTA, não devendo ser devolvida ou feita nova conclusão até seu integral cumprimento. Santa Cruz do Capibaribe/PE, datado e assinado eletronicamente. Juíza de Direito

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