Processo nº 3000468-63.2025.8.06.0075
ID: 282150016
Tribunal: TJCE
Órgão: Núcleo de Justiça 4.0 - Juizados Especiais Adjuntos
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 3000468-63.2025.8.06.0075
Data de Disponibilização:
28/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FERNANDO MOREIRA DRUMMOND TEIXEIRA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Núcleo de Justiça 4.0 - Juizados Especiais Adjuntos WhatsApp: (85) 98239-4389 | E-mail:nucleo4.0jeccadj@tjce.jus.br Processo nº 3000468-63.2025.8.06.0075…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Núcleo de Justiça 4.0 - Juizados Especiais Adjuntos WhatsApp: (85) 98239-4389 | E-mail:nucleo4.0jeccadj@tjce.jus.br Processo nº 3000468-63.2025.8.06.0075 Promovente(s): AUTOR: MANOEL IRAN CANDIDO DE LIMA Promovido(a)(s): REU: SAMSUNG ELETRONICA DA AMAZONIA LTDA SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS ajuizada por MANOEL IRAN CANDIDO DE LIMA em face de SAMSUNG., já qualificados nos presentes autos. Dispensado o relatório, nos termos do art. 38, da Lei 9.099/95. FUNDAMENTAÇÃO O presente feito deve ser julgado antecipadamente, na forma da regra contida no art. 355, I, do CPC/2015, que assim estabelece: "Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas;" In casu, a matéria prescinde de maiores dilações probatórias, especialmente ante a documentação carreada aos autos e o desinteresse das partes em produzirem mais provas. DO MÉRITO Inicialmente, destaco a aplicação do Código de Defesa do Consumidor na relação travada entre as partes, consoante art. 2º e 3º do CDC. Com efeito, o ponto nodal da questão é saber se se a ré agiu de forma regular após a verificação do vício no freezer comprado pelo consumidor. Da análise dos autos, verifico que a autora alega que realizou a compra do produto CELULAR GALAXY NOTE 20 ULTRA no dia 24/09/2021, no valor de R$ 4.999,00. Todavia, após 03 anos e 03 meses de uso, o produto apresentou defeito. Ao falar com a assistência técnica, foi informado teria que pagar o conserto, uma vez que o produto estaria fora do prazo de garantia. A demandada apresentou contestação aduzindo, em síntese, que o produto tem prazo de garantia contratual de 275 dias e prazo de garantia legal de 30 dias, de forma que o produto está fora do prazo de garantia. Pois bem. No mérito, o pleito é procedente. Analisando o caso, vejo que o produto se encontra dentro da garantia legal, já que se trata de vício oculto, de forma que, configurado vício do produto e não verificado qualquer excludente de responsabilidade, é dever do fornecedor resolver o caso a partir de uma das situações previstas no art. 18 do CDC. Nesse contexto, prescreve o artigo 26 do CDC: Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: (...) II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis. § 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços. (...) § 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito. No caso concreto, tendo o consumidor reclamado do defeito junto aos fornecedores logo após a ciência do defeito (destaca-se que não há prova produzida no sentido contrário), resta evidente que o consumidor exerceu seu direito de reclamar do produto (exerceu o prazo de garantia) conforme o estipulado em lei. Aqui, cabe esclarecer que prazo garantia não se confunde com prazo de vida útil do produto. O prazo de garantia se refere ao prazo que o consumidor tem para reclamar que de um vício no produto, sendo que a contagem de tal prazo pode se iniciar com o recebimento do produto (nos casos de vício aparente) ou com a verificação do vício (nos casos de vício oculto). Já o prazo de vida útil do produto é o prazo de durabilidade do produto em si, de forma que, se dentro do prazo de vida útil o produto apresentar algum defeito inerente ao produto, é iniciado, a partir da verificação do defeito, a contagem do prazo decadencial para reclamar do defeito. Na legislação consumerista brasileira, foi adotada, justamente, a teoria da vida útil do produto. Nesse sentido, acosto diversas decisões elucidativas do Tribunal Cidadão e dos Tribunais Estaduais: RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO USADO. VÍCIO DO PRODUTO. CASO CONCRETO QUE APONTA A QUEBRA DA BARRA DE DIREÇÃO SEIS DIAS APÓS A VENDA. CAMINHÃO COM OITO ANOS DE USO. ALEGAÇÃO DE DESGASTE NATURAL. RESPONSABILIDADE DO VENDEDOR. GARANTIA LEGAL. ART. 18 DO CDC. APLICAÇÃO A TODO E QUALQUER PRODUTO INSERIDO NO MERCADO DE CONSUMO - NOVO OU USADO. INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS QUE AFASTARAM A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA. CRITÉRIOS DA FUNCIONALIDADE E DA VIDA ÚTIL DO BEM, VARIÁVEIS CONFORME O CASO. 1. O sistema de garantias por vícios de qualidade previsto no Código de Defesa do Consumidor contempla as garantias contratuais (ofertadas pelo fornecedor), bem como as garantias legais, estas de incidência obrigatória a todo e qualquer produto inserido no mercado de consumo, novo ou usado, independente, portanto, da vontade do fornecedor ou de termo específico. Exegese dos arts. 1º, 18, 24, 25 e 51, I, do CDC. 2. No caso, discute-se a responsabilidade da empresa que vendeu veículo usado (caminhão de transporte de carga com oito anos de uso), em virtude da ruptura da barra de direção enquanto trafegava regularmente, resultando na ocorrência de grave acidente, seis dias após a venda. As instâncias ordinárias, em tal contexto, acabaram por afastar a responsabilidade da concessionária por se tratar de veículo usado, invocando o desgaste natural da peça cuja verificação prévia competiria ao comprador. Tal interpretação, contudo, não encontra amparo no amplo sistema de garantias do Código de Defesa do Consumidor, sendo certo que o desgaste natural, o qual é ínsito aos produtos usados, não deve servir, de maneira automática, à exclusão da garantia legal posta à disposição do consumidor. 3. A responsabilidade do fornecedor envolvendo a venda de produto usado, nesse passo, há que conjugar os critérios da garantia de utilização do bem segundo a funcionalidade do produto (análise do intervalo de tempo mínimo no qual não se espera que haja deterioração do objeto) associado, em se tratando de vício oculto, ao critério de vida útil do bem (a contar da constatação do vício segundo o durabilidade variável de cada bem). 4. Nessa circunstância, a responsabilidade do fornecedor sobressai em razão do dever a este inerente de inserir no mercado de consumo produto adequado ao seu uso, ainda que segundo a sua própria qualidade de bem usado, por um prazo mínimo para o seu uso, a ser aferido, em cada caso, segundo o critério de vida útil do bem. 5. Recurso especial provido. (REsp n. 1.661.913/MG, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20/10/2020, DJe de 10/2/2021.) JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. VÍCIO OCULTO EM PRODUTO DURÁVEL. CRITÉRIO DA VIDA ÚTIL. DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADA. VÍCIO NÃO SANADO EM 30 (TRINTA) DIAS. DIREITO POTESTATIVO AO RESSARCIMENTO DA QUANTIA PAGA. ART. 18, §1º, II, DO CDC. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. I. Trata-se de Recurso Inominado interposto pela parte ré em face de sentença que julgou procedente o pedido inicial para rescindir o contrato celebrado entre as partes e determinar o ressarcimento do valor pago pela autora. Sustenta a recorrente que o prazo de garantia do produto já havia expirado, não sendo possível sua responsabilização no caso. Pede a reforma da sentença. Contrarrazões não apresentadas. II. Recurso cabível e tempestivo. Preparo recolhido. III. Cumpre observar que se aplicam ao caso os ditames do Código de Defesa do Consumidor, pois as partes se enquadram nos conceitos previstos nos artigos 2º e 3º daquele diploma legal. IV. Consta dos autos que, em 9 de dezembro de 2023, a autora adquiriu da ré uma mesa e seis cadeiras no valor de R$ 3.700,00 (três mil e setecentos reais). Em junho de 2024, ao realizar a limpeza, a autora notou um defeito na mesa: os parafusos que ligam o tampo aos pés estavam soltos, causando desequilíbrio. Ao buscar assistência na loja da ré, foi informada que a garantia havia expirado, e não recebeu suporte. V. Dispõe o art. 26, II c/c § 3º, do CDC, que o prazo para reclamar de vícios ocultos em produtos duráveis é de 90 (noventa) dias a contar da data que surgiu o defeito. Não se trata no caso de vício aparente ou de fácil constatação, uma vez que somente surgiu após cerca de 6 (seis) meses de uso do produto, dentro do prazo esperado de vida útil do produto. Cumpre observar que o Código de Defesa do Consumidor, no § 3º do art. 26, adotou, na matéria de vício oculto, o critério da vida útil do bem, e não o critério da garantia, de sorte a tornar possível que o fornecedor se responsabilize pelo vício por período que vá além da garantia contratual. Tal critério possui forte apoio na doutrina e por si só é suficiente para tutelar os interesses do consumidor, garantindo a prevenção e reparação de danos patrimoniais durante todo o período de vida útil do produto. Neste sentido: "O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 26, § 3º, ao tratar dos vícios ocultos, adotou o critério da vida útil do bem, e não o da garantia, podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício mesmo depois de expirada a garantia contratual. Precedentes. No caso, os vícios observados nos produtos adquiridos pela recorrente apareceram durante o período de vida útil do produto, e não foi produzida nenhuma prova de que o mau funcionamento dos eletrodomésticos decorreu de uso inadequado pelo consumidor, a evidenciar responsabilidade da fornecedora." (REsp n. 1.787.287/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 14/12/2021, DJe de 16/12/2021.) VI. Considerando que a ré foi procurada pela autora dentro do prazo de 90 (noventa) dias após perceber o defeito, fato incontroverso, não há que se falar em decadência. Tenda em vista ainda que o vício não foi sanado em 30 (trinta) dias, é direito potestativo da consumidora a resolução do contrato e o ressarcimento da quantia paga, nos termos do art. 18, § 1º, II, do CDC. Portanto, não há reparo a ser realizado na sentença. VII. Recurso CONHECIDO E NÃO PROVIDO. VIII. Condeno a recorrente ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência, os quais fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95. IX. A súmula de julgamento servirá de acórdão, consoante disposto no artigo 46 da Lei nº 9.099/95. (Acórdão 1953420, 0711134-59.2024.8.07.0005, Relator(a): MARILIA DE AVILA E SILVA SAMPAIO, SEGUNDA TURMA RECURSAL, data de julgamento: 09/12/2024, publicado no DJe: 17/12/2024.) RECURSO INOMINADO. RESIDUAL. VÍCIO OCULTO EM APARELHO TELEVISOR. DECADÊNCIA NÃO VERIFICADA. INTELIGÊNCIA DO ART. 26, INCISO II, § 3º, DO CDC. TELEVISÃO QUE PAROU DE FUNCIONAR APÓS MENOS DE 2 ANOS DE USO, AINDA DENTRO DO PERÍODO DE VIDA ÚTIL DO PRODUTO. SUBSTITUIÇÃO DO PRODUTO CABÍVEL. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. MERA RECUSA AO REPARO SOLICITADO PELO CLIENTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 5ª Turma Recursal dos Juizados Especiais - 0027207-86.2023.8.16.0182 - Curitiba - Rel.: JUÍZA DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUÍZAADOS ESPECIAIS MANUELA TALLÃO BENKE - J. 17.02.2025) Apelação. Ação indenizatória por vício em televisor. Aparelho que apresentou defeito de fabricação dentro do período de vida útil do produto. Consumidora que tentou solucionar o problema administrativamente, sem êxito. Responsabilidade solidária da loja e da fabricante. Garantia que se estende pelo prazo de vida útil do produto, conforme entendimento do STJ. Danos materiais devidos, correspondentes ao valor do produto. Danos morais não configurados. Honorários advocatícios razoavelmente arbitrados adequadamente considerando a baixa complexidade da causa. Recursos desprovidos. (TJSP; Apelação Cível 1012938-04.2023.8.26.0196; Relator (a): Pedro Baccarat; Órgão Julgador: 36ª Câmara de Direito Privado; Foro de Franca - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 17/03/2025; Data de Registro: 17/03/2025) A jurisprudência já teve oportunidade de analisar caso bastante semelhante, ao julgar situação vício oculto em um celular comprado em 2021: JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. RECURSO INOMINADO. CIVIL. PROCESSO CIVIL. COMPLEXIDADE DA MATÉRIA NÃO VERIFICADA. DESNECESSIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA. EXISTÊNCIA DE LAUDO DA AUTORIZADA. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. TEORIA DA CAUSA MADURA. APARELHO CELULAR. BEM DE CONSUMO DURÁVEL. ATUALIZAÇÃO DE SOFTWARE. TELA VERDE. VÍCIO OCULTO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO PARA CASSAR A SENTENÇA E, APLICANDO-SE A TEORIA DA CAUSA MADURA, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO. I. Caso em exame 1. Trata-se de recurso inominado interposto pelo AUTOR em face da sentença que julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, com base no artigo 51, inciso II da Lei 9.099/95 c/c art. 485, IV do CPC. 2. Recurso próprio e tempestivo (ID 70028950). 3. Em suas razões recursais, o recorrente alega, em síntese, que a ré deve ser responsabilizada por um defeito oculto (tela verde) no smartphone do autor, mesmo após o término da garantia contratual. Aduz que os Smartphones são projetados para durar mais de três anos, sendo que a própria Samsung reconhece uma vida útil de pelo menos 4 anos e oferece atualizações de segurança por até 5-7 anos para alguns modelos. Assevera que o defeito não decorre do uso normal, mas de um vício oculto já reconhecido e relacionado ao modelo específico, tornando desnecessária uma perícia adicional. Esclarece que a assistência técnica da Samsung já constatou o problema, que é fato incontroverso, e há diversos relatos semelhantes de outros consumidores. Destaca que a ré não impugnou especificamente a existência do vício de fabricação, apenas mencionou o fim da garantia contratual. Argumenta que o prazo para reclamar reparação de vício oculto inicia-se quando o defeito se manifesta (art. 26, §3º do CDC), não tendo ocorrido decadência. Requer a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII do CDC) e a aplicação da Teoria da Causa Madura, permitindo o julgamento direto do mérito pelo Tribunal para que sejam julgados procedentes os pedidos iniciais condenando a ré "à obrigação de pagar a quantia de R$ 4.571,15 (quatro mil quinhentos e setenta e um reais e quinze centavos), valor pago pelo produto objeto da demanda, a ser devidamente corrigido a partir da data da compra e acrescido de juros legais; e.1) Ou, caso assim não seja o entendimento de V. Excelência, subsidiariamente seja a Ré compelida entregar um aparelho celular novo, de igual modelo ou superior" e ao pagamento de indenização por dano moral. 4. Contrarrazões pela manutenção da sentença (ID 70028955). II. Questão em discussão 5. A controvérsia reside em determinar se o juizado especial é competente para analisar e julgar a demanda do autor e qual a responsabilidade do fornecedor por vício apresentado em aparelho celular durante a denominada "vida útil do produto". III. Razões de decidir 6. Na origem, narra o autor que no dia 28/04/2021, o autor adquiriu pela internet, via Magazine Luiza S/A, o aparelho celular Samsung Galaxy S21 ULTRA 5G 256GB AM. Em 10/10/2024, iniciou o procedimento de atualização do sistema do aparelho após notificação enviada pela empresa Ré. Ocorre que, após a recomendação de atualização do "One UI", o display OLED da tela do celular começou a apresentar problema de "linha verde vertical" (Doc. 2), que persiste desde então, evidenciando-se permanente. 7. Das provas coligidas aos autos, verifica-se que na Ordem de Serviço da autoriza restou consignado que o aparelho apresenta "imagem/linha verde" (ID 70028916), e para reparo é necessário "troca do display - R$ 2.250,00 (ID 70028919) " 8. Os juizados especiais cíveis têm competência para conciliação, processo e julgamento das causas de menor complexidade (art. 3º da Lei 9.099/95). 9. A referida complexidade não diz respeito à matéria em si, mas à prova necessária à instrução e julgamento do feito. 10. No caso, o laudo emitido pela assistência técnica da ré atesta a "descrição do defeito: imagem/linha verde" e a descrição do reparo " R$2.250,00 - troca do display" (ID 70028919). 11. Verifica-se, portanto, que é irrelevante a produção da prova pericial, porquanto o documento probatório apresentado pelo autor, Ordem de Serviço nº 4171137507 (ID 70028919) e não impugnado pelo réu é suficiente para o julgamento do mérito. Ademais, é desnecessária a produção de prova técnica, quando os fatos controvertidos puderem ser elucidados por meio de outros elementos de prova. Dessa forma, verifica-se a competência dos Juizados Especiais Cíveis. 12. Considerando que o processo se encontra em condições de imediato julgado (não havendo necessidade juntada de mais provas), cabível a incidência da teoria da causa madura (art. 1.013, § 3º do CPC), razão pela qual passo a analisar o mérito. 13. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de natureza consumerista, devendo a controvérsia ser solucionada sob a ótica do sistema jurídico autônomo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). 14. O CDC estabelece que o fornecedor de serviços responde de forma objetiva em virtude de falha na sua prestação, somente sendo possível a exclusão da responsabilidade na hipótese de comprovação da inexistência de defeito, de caso fortuito ou força maior, de culpa exclusiva da vítima ou de fato de terceiro (art. 14, "caput", §3º, incisos I e II, do CDC); em tais casos, o ônus da prova das excludentes da responsabilidade é do fornecedor do serviço. 15. Na forma do art. 20 do CDC, o fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor. 16. No caso, a ré não refutou a alegação do autor que o defeito "linha verde vertical" decorreu da atualização do software recomendada pelo fabricante. A ré se limitou a defender que o produto estava fora do prazo de garantia. Caberia a ré comprovar a inexistência de defeito no produto fornecido, do serviço prestado, ou culpa exclusiva da consumidor, contudo não o fez. (Art. 373, II, CPC). 17. Ademais, "consoante entendimento jurisprudencial firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, "O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 26, § 3º, ao tratar dos vícios ocultos, adotou o critério da vida útil do bem, e não o da garantia, podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício mesmo depois de expirada a garantia contratual." (REsp n. 1.787.287/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 14/12/2021, DJe de 16/12/2021). Vale dizer que a responsabilidade do fornecedor não se limita pura e simplesmente ao prazo contratual de garantia, o qual é estipulado unilateralmente por ele próprio, devendo ser levada em consideração a natureza do vício que inquinou o produto, mesmo que tenha ele se manifestado somente ao término da garantia. (...) "Os prazos de garantia, sejam eles legais ou contratuais, visam a acautelar o adquirente de produtos contra defeitos relacionados ao desgaste natural da coisa, como sendo um intervalo mínimo de tempo no qual não se espera que haja deterioração do objeto. Depois desse prazo, tolera-se que, em virtude do uso ordinário do produto, algum desgaste possa mesmo surgir. Coisa diversa é o vício intrínseco do produto existente desde sempre, mas que somente veio a se manifestar depois de expirada a garantia. Nessa categoria de vício intrínseco certamente se inserem os defeitos de fabricação relativos a projeto, cálculo estrutural, resistência de materiais, entre outros, os quais, em não raras vezes, somente se tornam conhecidos depois de algum tempo de uso, mas que, todavia, não decorrem diretamente da fruição do bem, e sim de uma característica oculta que esteve latente até então". (REsp n. 984.106/SC, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 4/10/2012, DJe de 20/11/2012). 18. Assim, constatado que o defeito decorreu da atualização do software, durante a vida útil do produto, deve o fornecedor sanar o vício no prazo máximo de trinta dias, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço (art. 18, CDC). No caso, o consumidor optou pela restituição da quantia paga. 19. O dano moral decorre do abalo a qualquer dos atributos da personalidade, em especial à dignidade da vítima. Embora os fatos descritos pela autora tenham causado aborrecimentos, não há prova nos autos de exposição a qualquer situação vexatória ou de que o fato repercutiu em grave prejuízo, de modo a desencadear em reparação por dano moral. Assim, não subsidia a reparação por danos morais, por inexistir violação aos direitos da personalidade. IV. Dispositivo e tese 20. Recurso conhecido e parcialmente provido para cassar a sentença e, aplicando-se a teoria da causa madura, julgar parcialmente procedente para determinar que o réu restitua a quantia paga R$4.571,15 (ID 70028910), mediante a devolução do produto e seus acessórios ao réu. A restituição será feita aplicando a súmula 43 do STJ, com correção monetária pelo INPC desde a manifestação do vício do produto (10/10/2024), acrescida de juros de 1% ao mês desde a citação. 21. A súmula de julgamento servirá de acórdão, conforme regra do art. 46 da Lei n. 9.099/95. (Acórdão 1997758, 0794709-29.2024.8.07.0016, Relator(a): LUIS EDUARDO YATSUDA ARIMA, PRIMEIRA TURMA RECURSAL, data de julgamento: 02/05/2025, publicado no DJe: 23/05/2025.) Ademais, o fornecedor não apresentou qualquer comprovação de eventuais excludentes de responsabilidade, como culpa exclusiva de terceiro ou culpa exclusiva do consumidor. Nessa toada, tenho que, em razão da inversão do ônus da prova para a parte requerida, tenho que a requerida não se desincumbiu do seu ônus de comprovar suas alegações. Por fim, esclareço que eventuais debate sobre o prazo de garantia contratual de 275 dias não é relevante para o deslinde do caso, já que, conforme já fartamente exposto: 1) o produto apresentou um vício oculto; 2) vício oculto surgiu dentro do prazo de vida útil do bem; 3) consumidor exerceu seu direito de decadência dentro do prazo de 90 dias; 4) não foi comprovada qualquer excludente de responsabilidade. Fixada a responsabilidade da promovida, passo a analisar os pedidos trazidos na exordial. Quanto ao pedido de condenação em danos materiais, entendo que merece prosperar. No que concerne aos prejuízos materiais, o dever de indenizar por dano material decorre de eventuais prejuízos ou perdas que atingem o patrimônio corpóreo do consumidor, os chamados danos emergentes, bem como os lucros cessantes. No caso dos autos, o consumidor apresentou a nota fiscal, evidenciando exatamente o valor despendido (ID 136127952). Dito isso, defiro o pedido de indenização por danos materiais. Quanto ao pedido de indenização por danos morais, tenho as diversas tentativas do autor em resolver a demanda administrativamente, o lapso temporal entre a verificação do defeito e o lapso temporal entre o acionamento administrativo do fornecedor e a data da presente sentença (05 meses), sem elementos que indiquem resolução do caso de forma amigável, atrelado ao fato de que se trata de um produto essencial, são motivos justos no que tange à fixação de danos morais. Com efeito, no caso dos autos, entendo que tal pleito se justifica em virtude do descaso da reclamada, que não conseguiu resolver o problema da parte autora, apesar de acionadas extrajudicialmente para tanto, obrigando a parte promovente a ingressar em Juízo para solucionar o caso. O tempo, pela sua escassez, é um bem precioso para o indivíduo, tendo um valor que extrapola sua dimensão econômica, sendo irrecuperável sua perda. Nesse cenário, o conceito de dano moral vem sofrendo ampliação para englobar situações nas quais um contratante se vê obrigado a perder seu tempo livre em razão da conduta abusiva do outro. Nesse contexto, conforme se extrai dos autos, a empresa teve diversas oportunidades de concretizar soluções que gerassem o menor prejuízo possível ao autor. Nesse contexto, é cabível a indenização por danos morais, haja vista a reiteração da falha na prestação de serviços pela ré em questão, que por longo período prestou serviço defeituoso ao consumidor em questão, uma vez que havia tempo hábil para solução do fato, bem como a ré não fez qualquer ação com o intuito de atenuar os abalos sofridos pelo autor. Nos termos do artigo 186 do Código Civil, "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.". Mais especificamente na seara consumerista,o artigo 14 do CDC esclarece que "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.". Logo, dúvidas não restam que a reiteração da falha na prestação de serviços pela parte ré ocasionou na parte autora transtornos que não podem ser considerados mero aborrecimento, motivo pelo qual entendo devida a reparação por danos extrapatrimoniais. Aqui, vale ressaltar, não se trata de mera violação contratual, a qual, por si só, não é capaz de gerar danos morais. Em verdade, se trata de reiterada e consistente violação de cláusulas contratuais, saindo de qualquer espectro de normalidade. Dessa forma, resta inviável considerar como mero erro administrativo, mas sim uma reiterada incidência em violação contratual. Inclusive, cabe destacar que a ré é uma empresa grande no mercado, bastante consolidada e de renome, de forma que é evidente que a ré tem logística preparada para solucionar questões simples, tal qual como se apresenta no caso. Todavia, ao invés de solucionar a demanda administrativamente, optou pelo descaso com a consumidora, gerando claro desvio produtivo, em virtude das tentativas da consumidora de resolver amigavelmente. Com efeito, é cediço que em regra não cabem danos morais do mero inadimplemento contratual. Todavia, nas hipóteses em que não um simples descumprimento de cláusulas contratuais, mas, antes, um desrespeito cabal à personalidade da pessoa do outro contratante, com reflexos em sua tranquilidade e sua dignidade, deve ser reconhecido o direito à reparação extrapatrimonial. A doutrina inclina-se no sentido de conferir à indenização do dano moral caráter dúplice, tanto punitivo do agente, quanto compensatório, em relação à vítima, devendo-se levar em consideração as condições daquele de quem se pleiteia a referida verba e daquele que as pleiteia. Assim, observadas as circunstâncias, e com fulcro nos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, tenho por pertinente a indenização por dano moral no importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais). DISPOSITIVO DIANTE DO EXPOSTO, com fundamento no art. 487, I do CPC-2015, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, com resolução do mérito, para: CONDENAR o réu a restituir, a importância total de R$ 4.999,00, com correção monetária (INPC) e juros de mora de 1% (um) por cento, ambos a partir desembolso; e CONDENAR o demandado ao pagamento de R$ 2.000,00 (dois mil reais) ao autor a título de indenização por danos morais, com correção monetária (INPC) contada da data desta sentença (súmula 362, STJ) e juros de mora de 1% desde a citação. Ressalto que, para evitar o enriquecimento indevido da parte autora, caso seja necessária a realização da restituição do valor pago, o consumidor deverá devolver o bem defeituoso em questão para a parte promovida, sendo da promovida o ônus de retirar junto ao autor e transportar o produto de volta para a loja. Publique-se. Registre-se. Intimem-se as partes, por seus causídicos, da presente sentença. Transitada em julgado, intime-se novamente a parte autora, por seu causídico, para dar início ao cumprimento de sentença, sob pena de arquivamento do feito, independentemente de novo despacho. Expedientes necessários. Núcleo de Justiça 4.0/CE, 26 de maio de 2025. Rodolfo da Rocha Melo Juiz Leigo DESPACHO/DECISÃO Vistos. Homologo a minuta de sentença elaborada pelo Juiz Leigo para que produza os seus jurídicos e legais efeitos, nos termos do art. 40 da Lei nº. 9.099/95. Intimem-se. Registre-se. Núcleo de Justiça 4.0/CE, 26 de maio de 2025. Luiz Eduardo Viana Pequeno Juiz de Direito
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